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FACULDADE INTEGRADA DE SANTA MARIA CURSO DE PSICOLOGIA SONIA A. BORGES DE QUADROS PSICOLOGIA ANOMALÍSTICA: UMA REVISÃO NARRATIVA BRASILEIRA SANTA MARIA, RS 2017

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FACULDADE INTEGRADA DE SANTA MARIA

CURSO DE PSICOLOGIA

SONIA A. BORGES DE QUADROS

PSICOLOGIA ANOMALÍSTICA: UMA REVISÃO NARRATIVA

BRASILEIRA

SANTA MARIA, RS

2017

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SONIA A. BORGES DE QUADROS

PSICOLOGIA ANOMALÍSTICA: UMA REVISÃO NARRATIVA

BRASILEIRA

Artigo apresentado à Disciplina TCC II, do Curso de Psicologia da Faculdade Integrada de Santa Maria – FISMA, como requisito parcial para obtenção do grau de Psicóloga.

Orientadora: Profª Ms. Lilian Ester Winter

SANTA MARIA, RS

2017

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PSICOLOGIA ANOMALÍSTICA: UMA REVISÃO NARRATIVA BRASILEIRA

Sonia Quadros1 Lilian Ester Winter2

RESUMO

O presente estudo teve como objetivo realizar uma pesquisa bibliográfica, a fim de verificar os estudos científicos existentes, desenvolvidos no Brasil, a respeito da Psicologia Anomalística, divulgados, especificadamente, no período de 2007 a 2017. O estudo diz respeito a uma revisão de literatura, na modalidade de revisão narrativa, apresentando um caráter descritivo-discursivo. A pesquisa bibliográfica foi realizada a partir da busca, na modalidade online, de produções científicas na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), bem como na base de dados The Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Os descritores selecionados foram “Psicologia Anomalística”; “Experiências Anômalas” e “Experiências Espirituais”. Optou-se pelo período mencionado, embora considerado longo para alguns leitores, pela necessidade de se conseguir artigos científicos com dados atuais e relevantes. Os artigos científicos analisados, apresentados e discutidos, narram a importância da produção na área da Psicologia Anomalística, uma vez que esta contribui, de forma significativa, para a compreensão das experiências religiosas e anômalas, ou seja, da relação entre vivências anomalísticas e processos psicológicos. Este estudo proporcionou, também, o conhecimento de critérios utilizados para a identificação e a distinção entre experiências anômalas saudáveis e transtornos mentais de fundo religioso. Evidenciou-se um destaque com relação às experiências ufológicas como não sendo pertencentes ao grupo dos transtornos mentais, da mesma forma que as experiências relatadas sobre as luzes anômalas que ocorrem em Minas Gerais que, para alguns estudiosos, têm cunho religioso, enquanto para outros são apenas produto da memória individual e coletiva de moradores idosos da região. O estudo apontou que pessoas que se definem como não religiosas, apenas espirituais, têm maior número de experiências anômalas ao longo da vida. Como resultado, constatou-se a necessidade de aprimoramento dos critérios psicológicos que possam diferenciar uma experiência anômala de um transtorno mental, sob a justificativa de que, de acordo com o resultado, haverá o encaminhamento para tratamento ou não, ou até mesmo para internação em uma instituição de saúde mental, conforme o caso.

Palavras - chave: Psicologia anomalística. Experiências anômalas. Experiências

espirituais.

1 Autora. Aluna do Curso de Psicologia da Faculdade Integrada de Santa Maria – FISMA. 2 Orientadora. Professora da Faculdade Integrada de Santa Maria – FISMA.

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ABSTRACT

This study aimed to carry out a literature research to verify the existing scientific studies, developed in Brazil, about the Anomalistic Psychology, specifically published in the period between 2007 to 2017. The study concerns a literature review, in the form of narrative review, showing a descriptive-discursive character. The bibliographic research was carried out based on the online search of scientific productions in the Virtual Health Library (VHL), as well as in the Scientific Electronic Library Online (SCIELO). The key words selected were "Anomalistic Psychology"; "Anomalous Experiences" and "Spiritual Experiences." The period chosen was the one mentioned, although it is considered long for some readers, by the necessity of obtaining scientific articles with current and relevant data. The analyzed, presented and discussed scientific articles, show the importance of production in the area of the Anomalistic Psychology, since it contributes significantly to the understanding of religious and anomalous experiences, that is, the understanding of the relation between anomalistic experiences and psychological processes. This study also provided the knowledge of criteria used to identify and distinguish between healthy anomalous experiences and religiously based mental disorders. It was evidenced that the ufological experiences don’t belong to the group of mental disorders, as well as the experiences reported about the anomalous lights that happen in Minas Gerais (Brazil), which for some scholars are religious, while other think it is only product of elderly residents’ individual and collective memory of the region. The study pointed out that people who define themselves as non-religious, only spiritual, have a greater number of anomalous experiences throughout their life. As a result, it was verified the need to improve the psychological criteria that can distinguish an anomalous experience from a mental disorder, with the justification that, according to the result, there will be a medical referral for treatment or not, or even for hospitalization in a mental health institution. Key-words: Anomalistic Psychology. Anomalous Experiences. Spiritual Experiences.

INTRODUÇÃO

O presente estudo desenvolveu-se tendo como temática a Psicologia e as

Experiências Anômalas (EAs). A questão da Psicologia e das Experiências Anômalas

tem despertado a curiosidade de muitos acadêmicos e profissionais, principalmente

das áreas da Psiquiatria e da Psicologia. Muitas experiências anômalas têm sido

explicadas pela religião e pela espiritualidade, entretanto, a intenção, neste trabalho,

é efetuar uma busca de produções científicas que embasam a temática.

Discorrer sobre Religião/religiosidade é abordar “experiência religiosa”,

desvelando o objeto religioso em conjunto com um sujeito concreto. “A manifestação

da religião é perceptível, como experiência religiosa (vivência) frente ao mistério, ao

sagrado e ao inexplicável. O sentido religioso é o sentido do todo; é uma experiência

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vivida no limite, uma revelação que permanece oculta” (HOLANDA, 2017, p. 134). Foi

nesse contexto que as experiências anômalas contribuíram para o surgimento de uma

nova área na Psicologia - a Psicologia Anomalística. Essa parte da Psicologia estuda

as vivencias e processos psicológicos referentes às percepções extra-sensoriais,

entre elas, a capacidade de mover objetos, além de interferir na realidade de outras

formas, “por meio do pensamento, experiências fora do corpo, lembranças de vidas

passadas, experiências de quase morte, contatos com alienígenas, curas espirituais,

êxtases místicos, entre outras” (CARDEÑA, LYNN, KRIPPNER, 2013, p. 64).

O estudo da Psicologia Anomalística ajuda a esclarecer questões relacionadas

à espiritualidade pelo viés da dimensão humana e acadêmica. Essa circunstância é

vista como uma busca por respostas a indagações no que se refere à compreensão

do que representam as experiências anômalas e sua implicação na vida dos sujeitos.

O estudo desse conhecimento se torna complexo na medida em que as experiências

anômalas que provocam a compreensão são direcionadas a agentes externos e/ou

de difícil operacionalização e delimitação (MACHADO et. al., 2016).

No Brasil, os estudos sobre as experiências anômalas iniciaram e tiveram um

crescimento considerável em sua produção acadêmica a partir do ano de 2009, com

a implantação da disciplina “Experiências Anômalas e Introdução Crítica: a Psicologia

anomalística e suas relações com a Psicologia Social”, pelo Instituto de Psicologia da

Universidade de São Paulo, coordenada pelo Prof. Dr. Wellington Zangari, principal

divulgador desse estudo no Brasil (MACHADO, 2009).

A Psicologia Anomalística surgiu em fins da década de 1970, início da década

de 1980, mesmo diante de um contexto descrente com relação às narrativas de

ocorrências de eventos paranormais. Conforme elucidam Zangari et. al. (2017),

relatos de experiências relacionadas à interação anômala com o ambiente

(extramotora) e entre mentes (extrassensorial), ou seja, experiências sem a

intermediação de mecanismos já conhecidos anseiam, na maioria dos casos, pela

compreensão dessas experiências, mesmo que seja no campo das explicações

religiosas.

Entre as principais experiências anômalas já relatadas, sobressaem-se as

percepções extrassensoriais; a capacidade de mover objetos e de influenciar a

realidade de outras formas através do pensamento (psicocinesia); as experiências

fora do corpo; as lembranças de vidas passadas; as experiências de quase morte; os

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contatos com alienígenas; as curas espirituais; os êxtases místicos, entre outras. A

maioria dessas experiências recebe explicação pautada na espiritualidade e na

religiosidade (CARDEÑA, LYNN, KRIPPNER, 2013).

O termo espiritualidade é considerado polêmico, inclusive na Psicologia

apresenta poucos pesquisadores e, consequentemente, poucos estudos publicados

sobre o tema. Pesquisas que envolvem as experiências anômalas oferecem novas

possibilidades de compreensão dos sujeitos partindo de um olhar multidimensional,

ou seja, em sua dimensão somática, psíquica, social, espiritual entre outras, o que

amplia conhecimentos de forma holística do ser humano. Há quem o utilize para

referir-se a um domínio existente para além do plano físico, ao suposto mundo de

entidades espirituais. É sob esse mote que diversas correntes religiosas encontram

justificativa para relacionar experiências/eventos anômalos, aos quais chamam de

espiritualidade no sentido de mundo, à dimensão espiritual que se manifestaria no

plano humano, natural, terreno. Em uma perspectiva acadêmica, o termo

espiritualidade é utilizado, na maioria das vezes, para identificar uma dimensão

humana existencial e/ou transcendente, relacionada às crenças e aos valores

organizados, ou não, em torno de uma doutrina religiosa específica (MACHADO et al.,

2016).

De outra perspectiva, de acordo com Machado et. al. (2006), tem-se o termo

religiosidade, o qual compreende-se estar relacionado à esfera da prática, a alguma

religião/doutrina específica, sendo que, nesse caso, a espiritualidade estaria

relacionada a uma dimensão humana mais ampla, unida ao que dá significado a vida,

que motiva a existência sem, necessariamente, referir-se a algo para além do plano

humano. A respeito desta questão, Machado (2009), em estudos realizados no âmbito

da temática, afirma que:

a escolha de uma atribuição de causalidade religiosa depende de uma predisposição do experienciador para interpretações religiosas e de um repertório ou vocabulário religioso. Todos temos acesso a informações sobre sistemas religiosos, e os conhecemos pelo menos até certo ponto. Mas, embora explicações religiosas sejam acessíveis, nem todos explicam tudo em termos religiosos. Faz diferença o peso que se dá a cada uma das explicações disponíveis. [...] a imagem daquilo ou daqueles a quem são feitas as atribuições são fundamentais na medida em que estão ligadas à construção de sentidos ao longo da vida, sentidos esses que se refletem na linguagem dos sujeitos. A escolha de uma atribuição religiosa ou “naturalista”, de uma explicação de base afetiva ou racional vai depender do

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contexto cultural e de diferenças individuais (MACHADO, 2009, p. 252).

Portanto, a escolha religiosa se dá a partir do esforço de quem quer convencer

o outro e do entendimento de quem está sendo convencido, sendo que, entre os dois

existe a influência das diferenças culturais e individuais.

Vale ressaltar, aqui, que registros das tradições sagradas da humanidade

também citam Experiências Anômalas. Na Bíblia, o Velho Testamento faz alusão aos

profetas nomeados por Jeová, os quais narravam habilidades anômalas. Entre essas

habilidades estavam o ouvir e o ver a distância; alcançar curas milagrosas e profetizar

eventos. No Novo Testamento, apontamentos aludem que Jesus concretizou três

ressurreições, oito milagres sobre a natureza e vinte e três curas inexplicáveis, além

de ter o poder de “ler os pensamentos” daqueles que o rodeavam, conhecer eventos

à distância, caminhar sobre as águas, transformar água em vinho e acalmar as

tempestades. Tais registros apontam que os apóstolos de Jesus manifestavam

experiências, possivelmente anômalas, chamadas pela Bíblia de dons espirituais ou

de carismas, o que sugere que foram outorgados pela graça de Deus (ZANGARI;

MACHADO; MARALDI, 2015).

Estudos experimentais como, por exemplo, os de Zangari, Machado e Maraldi

(2015), tendo como foco as Experiências Anômalas relacionadas à Psicologia,

exploraram estados modificados de consciência e produziram resultados

significativos. Por outro lado, alguns estudos, como os de Martins e Zangari (2012) e

de Martins (2015), por exemplo, têm enfatizado a importância de se considerar certas

experiências anômalas como muito próximas das experiências religiosas clássicas.

As experiências de abdução por alienígenas ou de visões de naves alegadamente

tripuladas por seres ultramundanos seriam exemplos dessas experiências.

Para Medeiros (2014), as Experiências Fora do Corpo (EFC) são definidas

por seu alto teor espiritual/religioso, sendo, muitas vezes, entendidas como mediunidade e tendo trazido, diversas vezes, conteúdos morais sobre a necessidade da caridade ou mesmo sobre o entendimento da EFC como forma de praticar a caridade (MEDEIROS, 2014, p.45).

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Nesse entendimento, as experiências fora do corpo são vistas como algo

relacionado à espiritualidade/religiosidade, tendo como finalidade contribuir para o

bem-estar da humanidade.

No passado, existiam psicólogos que entendiam a espiritualidade e a

religiosidade como equivalentes. Dessa forma, ambas eram percebidas sob a

perspectiva da religião e vice-versa. Entretanto, a partir da década de 1980, outras

configurações de fé, denominadas como espirituais, expandiram-se e tornaram-se

populares. Com isso, muitos indivíduos passaram a se definir apenas como

espiritualizados, sendo fiéis ou não a uma afiliação religiosa em particular, mas

considerando apenas a busca por um sentido, por uma completude ou por um

significado na vida (MARALDI, 2011, 2014; SHIMABUCURO, 2010).

Modernamente, por outro lado, religiosidade e espiritualidade são consideradas

questões distintas. A religiosidade parece estar atrelada a templos, por exemplo;

enquanto a espiritualidade define-se como tudo aquilo que leva à plenitude. Ao voltar-

se para certas experiências anômalas, pesquisadores as têm comparado às

experiências religiosas.

Na literatura encontram-se estudos contendo relatos importantes a respeito de

Experiências Anômalas. Dentre esses, evidencia-se a investigação de eventuais

correlações entre crenças/posturas pessoais, a frequência e o feitio de experiências

anômalas; além de disposições humanas facilitadoras ou limitadoras de determinadas

experiências ou mesmo de eventuais eventos físicos anômalos (MACHADO, 2009).

Estudando a prevalência e a relevância das Experiências Anômalas do tipo

extra sensório motor, analisando uma amostra da população brasileira, Machado

(2009) constatou não haver diferenças estatisticamente importantes no nível de

religiosidade entre pessoas que descrevem experiências anômalas

(experienciadores) e as que não relatam tais espécies de experiências (não

experienciadores). Nos mesmos estudos, ainda, o autor verificou que os

experienciadores estavam mais inclinados a certos tipos de crença, como a crença na

reencarnação, por exemplo, que os não experienciadores.

Em seus estudos, Menezes Júnior e Moreira-Almeida (2009) elencaram nove

critérios distintivos entre Experiências Anômalas saudáveis e transtornos mentais de

conteúdo religioso, identificando-os como a ausência de sofrimento psicológico, a

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ausência de prejuízos sociais e ocupacionais, a duração curta da experiência, a

atitude crítica preservada, a compatibilidade com o grupo cultural ou religioso do

paciente, a ausência de comorbidades, o controle sobre a experiência, o crescimento

pessoal ao longo do tempo e a atitude de ajuda aos outros.

A Psicologia Anomalística é capaz de esclarecer dúvidas relacionadas à

espiritualidade, seja quanto à acepção da dimensão humana, seja quanto ao âmbito

acadêmico. Tal ajuda deve ser compreendida como a procura por respostas a

perguntas ainda em aberto. Esclarecer se torna difícil na medida em que as

Experiências Anômalas desafiam a compreensão e; além disso, podem rumar para

agentes externos e/ou de difícil operacionalização e delimitação (MACHADO et. al.,

2016).

Por outro lado, mais importante que colocar-se contra ou a favor da existência

de fenômenos parapsicológicos autênticos, é compreender o que tais experiências,

alegações e crenças, permitem conhecer de seus experienciadores e como tais

experiências impactam suas vidas e seus grupos. Além disso, compreender essas

experiências é fundamental para que se possa evidenciar sua importância para a

Psicologia. Esse ponto de vista tem motivado a formação de grupos de pesquisadores

tanto no exterior, quanto no Brasil, tendo como resultado uma produção sui generis

no campo das Experiências Anômalas (ZANGARI et. al., 2017).

As produções referidas são significativas para, pelo menos, três campos em

cada uma das três facetas das Experiências Anômalas, sendo essas conhecidas

como:

(1) sua relação com a religiosidade; (2) sua aparente “inexplicabilidade” em termos psicológicos; e (3) sua dimensão mais prosaica ou psicológica convencional. Diante disso, “fica evidente a importância desse campo para a Psicologia da Religião, para a Parapsicologia e para a Psicologia Anomalística “cética” (ZAGARI et al., 2017, p. 177).

Portanto, o estudo das EAs mostra-se relevante tanto para a Psicologia da

Religião, quanto para a Parapsicologia e para a Psicologia Anomalística descrente,

em razão da possibilidade já mencionada de compreender o que tais experiências,

alegações e crenças nos permitem conhecer de seus experienciadores e como tais

experiências impactam suas vidas e seus grupos, considerando estes fenômenos

como parte da existência humana.

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Com base nas evidências apresentadas, o presente estudo tem como objetivo

geral realizar uma pesquisa bibliográfica, a fim de verificar os estudos científicos

desenvolvidos no Brasil, a respeito da Psicologia Anomalística, divulgados no período

compreendido entre 2007 e 2017. Ademais, entre os objetivos específicos, buscou-se

identificar, também, quais os temas mais estudados na área da Psicologia

Anomalística, para verificar e conhecer os resultados encontrados nas pesquisas da

área.

MÉTODO

O presente estudo caracterizou-se como uma pesquisa narrativa. Cordeiro et.

al. (2007) destacam que, quando comparada à revisão sistemática, a revisão narrativa

ou tradicional apresenta uma temática mais aberta, dificilmente partindo de uma

questão de pesquisa bem definida, o que não exige um protocolo rígido para sua

confecção. Além disso, a busca das fontes não é pré-determinada, sendo

frequentemente menos abrangente. A forma de seleção dos artigos é arbitrária,

provendo o autor de informações sujeitas ao viés de seleção, com grande interferência

da percepção subjetiva.

Para tanto, a busca bibliográfica foi realizada de modo online, na plataforma

Biblioteca Virtual em Saúde (BIREME – ABVS), bem como na The Scientific Electronic

Library Online (SCIELO). A busca pelas produções científicas ocorreu nos meses de

agosto e setembro de 2017, tendo como descritores: “Psicologia Anomalística”,

“Experiências anômalas” e “Experiências espirituais”, sendo a delimitação temporal de

publicação das produções selecionadas o período de julho de 2007 a julho de 2017.

Optou-se por esse período de dez anos por ter sido julgado tempo necessário para a

obtenção de artigos científicos com dados atuais e relevantes a respeito da temática

envolvendo a Psicologia Anomalística e devido, também, a uma busca prévia

realizada que acabou por mostrar que, nos últimos anos, a produção se mostrou mais

substancial.

Os critérios de inclusão elencados para o estudo consideraram artigos na

íntegra com disponibilidade de acesso ao texto completo em suporte eletrônico, e

dissertações e teses disponíveis nas plataformas acessadas, publicadas em

periódicos nacionais, contemplando a temática e objetivo do estudo e estando no

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período temporal selecionado. Os critérios de exclusão, por sua vez, foram de artigos

sem a abordagem da temática do estudo e desprovidos de contribuição para

implementação do objetivo do mesmo, não contemplando os dez anos de delimitação

temporal selecionado, bem como artigos não disponíveis na íntegra na plataforma

online ou publicados na literatura científica fora do âmbito nacional. Para posterior

análise dos dados, adotou-se como mote a análise de conteúdo em três etapas,

proposta por Bardin (2011).

Por meio da busca dos artigos, foram encontrados, a partir dos descritores

elencados, 322 (trezentos e vinte e dois) artigos, tendo sido excluídos, destes, 304

(trezentos e quatro) por não abordarem a temática e não se enquadrarem no objetivo

do estudo e outros 12 (doze) por não estarem disponíveis para consulta online. Desse

modo, 06 (seis) artigos científicos compuseram esta revisão narrativa, contendo os

critérios de seleção elencados, os quais foram identificados pela letra “A” de artigo,

precedida do número ordinal respectivo à sua classificação.

Na Tabela 1, apresentada abaixo, o número de artigos encontra-se distribuído

por Banco de Dados.

Descritor LILACS MEDLINE SCIELO TOTAL

Psicologia

anomalística

3

20

4

27

Experiências

anômalas

16

34

57

107

Experiências

espirituais

22

41

125

188

Total 41 95 186 322

Tabela 1 - elaborada pela autora (2017), a partir dos respectivos Banco de Dados.

Analise dos dados

No exercício de análise dos dados, adotou-se a proposta de análise de

conteúdo. Bardin (2011) a define como sendo

um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando a obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2011, p. 47).

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O autor recomenda o procedimento da análise de conteúdo em três fases

principais, compostas primeiramente pela pré-análise, em seguida pela exploração do

material e, por fim, pelo tratamento dos resultados - a inferência e a interpretação.

Bardin (2011), ao propor a análise em três frases, descreve cada uma delas. A

primeira fase, chamada de pré-análise, é denominada a fase de organização, tendo

como integrante a leitura “flutuante”, ou seja, um primeiro contato com os documentos

que serão submetidos à análise, a escolha deles, a formulação das hipóteses e dos

objetivos, a elaboração dos indicadores que orientarão a interpretação e a preparação

formal do material.

Na segunda fase, ou fase de exploração do material, são escolhidas as

unidades de codificação. A partir da escolha das unidades, o passo seguinte deverá

ser a classificação em blocos que expressem determinadas categorias, que

confirmem ou modifiquem àquelas, presentes nas hipóteses, e referenciais teóricos

inicialmente propostos.

Por fim, a terceira fase do processo de análise do conteúdo é o tratamento dos

resultados – a inferência e interpretação. Após, passa-se à interpretação de conceitos

e de proposições. Durante a interpretação dos dados,

é preciso voltar atentamente aos marcos teóricos, pertinentes à investigação, pois eles dão o embasamento e as perspectivas significativas para o estudo. A relação entre os dados obtidos e a fundamentação teórica, é que dará sentido à interpretação (BARDIN, 2011, p. 146).

Ao serem concluídas essas fases, o processo de Análise de Conteúdo é

concluído; entretanto, deve-se considerar que há variações na maneira de conduzir

esse processo.

RESULTADOS

Após ter sido realizada a seleção e a leitura dos artigos, os resultados

encontrados foram organizados de forma descritiva, por meio da construção de dois

quadros sinópticos. No primeiro quadro, foram inseridos a identificação, o título, o

nome do(s) autor(es), o periódico em que o artigo foi publicado e seu ano de

publicação; o que facilitou a síntese das temáticas desenvolvidas. Já no segundo

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quadro, apresenta-se a caracterização dos estudos selecionados, expondo o(s)

objetivo(s), métodos, principais resultados e conclusões da pesquisa.

Nos resultados, observou-se que, em relação ao ano de publicação, em 2017

foi publicado um artigo (A1); em 2016 foram duas as publicações (A2; A3); em 2013,

uma publicação (A4); em 2012 também uma publicação (A5); e em 2010, outra

publicação (A6), totalizando, assim, os 06 (seis) artigos analisados, apresentados e

discutidos neste estudo.

Identificação

Título

Autor(es)

Periódico publicado e

Qualis

Ano de publicação

A1

Psicologia da Religião e Psicologia

Anomalística: aproximações pela produção recente

ZANGARI, Wellington; MACHADO, Fatima Regina; MARALDI, Everton de Oliveira; MARTIN, Leonardo

Breno.

Rev. Pistis Prax. Teol. Pastor.

Curitiba.

Qualis, B4

2017

A2

Contribuições da psicologia para a compreensão das relações entre a espiritualidade, a religiosidade e as

experiências anômalas

MACHADO, Fátima Regina et. al.

Revista Clareira

– Revista de Filosofia da

Religião Amazônica.

Qualis – B4

2016

A3

Experiências anômalas tipicamente

contemporâneas e psicologia: uma

revisão da literatura.

MARTINS, Leonardo

Breno.

Bol. - Acad. Paul. Psicol.

Qualis – B2

2016

A4

Personalidade, religiosidade e

qualidade de vida em indivíduos que

apresentam experiências

anômalas em grupos religiosos

ALMINHANA, Letícia Oliveira; MENEZES JR.,

Adair; MOREIRA-ALMEIDA, Alexander.

J. Bras. Psiquiatr.

Qualis – B1

2013

A5

Relações entre experiências

anômalas tipicamente contemporâneas,

transtornos mentais e experiências espirituais.

MARTINS, Leonardo Breno; ZANGARI,

Wellington.

Rev. psiquiatr. Clín.

Qualis – B1

2012

A6

Experiências anômalas (extra-

sensório-motoras) na vida cotidiana e sua

associação com

MACHADO, Fatima

Regina.

Boletim Academia Paulista de Psicologia.

2010

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crenças, atitudes e bem-estar subjetivo.

Qualis – B2

Quadro 1 - Síntese dos artigos incluídos no estudo referente Psicologia anomalística, elaborada pela autora (2017)

Percebe-se por meio dos resultados apresentados no Quadro 1, que os artigos

selecionados contemplam os descritores propostos para o estudo, ou seja:

A partir da análise dos artigos selecionados, constatou-se harmonia, equilíbrio

e coerência entre os mesmos, considerando-se aqueles pautados em uma pesquisa

bibliográfica/revisão de literatura, no total de três artigos, e os outros três artigos,

realizados por meio de pesquisas de campo.

O quadro abaixo busca apresentar os resultados constatados:

Identificação

Objetivo(s)

Método Principais resultados e

conclusões

A1

Artigo tem como objetivo apresentar, de

modo conciso, uma visão geral da produção

em Psicologia da Religião oriunda de

estudos da Psicologia Anomalística.

Pesquisa bibliográfica

/ Revisão de Literatura

A avaliação da produção recente nas áreas da Psicologia da

Religião e da Psicologia Anomalística, permite afirmar que esse campo imbrincado, dada a natureza aparentemente comum de seus objetos de estudo, tem feito contribuições significativas em vários aspectos, tanto das experiências religiosas quanto das experiências anômalas.

A2

Discutir diversas interfaces entre

experiências anômalas, espiritualidade, religiosidade e construção de

conhecimento em psicologia, ressaltando suas controvérsias e

direções promissoras.

Pesquisa bibliográfica

/ Revisão de Literatura

Os estudos em Psicologia Anomalística podem, certamente,

ajudar a desvendar (se não completamente, pelo menos em

parte) questionamentos relacionados à espiritualidade, no

sentido de dimensão humana, num âmbito acadêmico. Tal ajuda não deve ser compreendida como “busca premeditada” em prol da

confirmação de crenças, mas uma procura por respostas a perguntas ainda em aberto. A tarefa se torna complexa na

medida em que as experiências anômalas desafiam a

compreensão e facilmente são

PSICOLOGIA ANOMALÍSTICA

(A1, A2, A3 e A6)

EXPERIÊNCIAS ANÔMALAS

(A1, A3 e A5)

EXPERIÊNCIAS ESPIRITUAIS

(A1, A2, e A4)

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14

remetidas a agentes externos e/ou de difícil operacionalização e

delimitação.

A3

Esta revisão de

literatura abarca temas como perfis psicológicos

e a saúde mental dos protagonistas,

dinâmicas psicossociais em grupos e outros

contextos marcados por essas experiências,

suas dimensões religiosas e espirituais,

entre outros.

Pesquisa bibliográfica

/ Revisão de literatura

Concluiu-se que o estudo das

experiências anômalas tipicamente contemporâneas

presta diversas contribuições à construção de conhecimento em

psicologia e em ciências próximas, além de sinalizar

diversas lacunas explicativas a seu respeito e sobre fenômenos

psicológicos mais amplos.

A4

Investigar os perfis de personalidade, a

qualidade de vida (QV) e a religiosidade em

pessoas que apresentam EAs.

Pesquisa de

campo

(Cento e quinze sujeitos que

procuraram centros espíritas de Juiz de

Fora/MG e que apresentavam EAs

foram entrevistados: dados

sociodemográficos; ITC-R (140) – (Inventário de

Temperamento e Caráter, revisado e

reduzido); DUREL-P (Duke University Religious Index,

versão em português), e WHOQOL-BREF

(Avaliação da Qualidade de Vida da Organização Mundial da Saúde – versão

brasileira abreviada)).

Os indivíduos com EAs (Experiências Anômalas) que

buscam auxílio parecem constituir uma população de risco para

transtornos mentais ou problemas emocionais em geral, sendo

preciso desenvolver abordagens adequadas e mais estudos sobre

o tema.

A5

Investigar amostras brasileiras de pessoas

que alegam experiências anômalas

caracteristicamente contemporâneas quanto

a dimensões psicopatológicas.

Pesquisa de campo

(Trata-se de um

estudo quantitativo e qualitativo, com dados colhidos entre 2010 e 2011, a respeito de

possíveis dimensões psicopatológicas das

experiências óvni simples e complexas. Foi aplicada a versão

detalhada do Mini International

Neuropsychiatric Interview (MINI

PLUS)16, que permite investigar 23 categorias

diagnósticas do DSM-IV e correspondentes na CID-10 ao longo da

vida.)

Houve evidência de que as experiências são tipicamente

saudáveis, embora haja indicadores de características pré-mórbidas na infância e na

adolescência dos protagonistas das experiências mais

complexas. Além disso, encontrou-se certa correlação

com o perfil "esquizotípico saudável", que ainda é pouco compreendido. Apesar de não

terem sido encontradas evidências de transtornos mentais

nas amostras investigadas, alguns temas que tocam nas complexas relações entre as experiências investidas e a

cultura em que emergem foram discutidos.

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15

A6

Pesquisa com objetivos de verificar a

prevalência e a relevância psicossocial

de experiências anômalas extra-

sensório-motoras (ou experiências psi),

comparar variáveis demográficas, práticas, crenças, religiosidade e

níveis de bem-estar subjetivo de EXPs

(experienciadores de psi) e NEXPs (não

experienciadores de psi) e verificar as atribuições

de causalidade feitas pelos EXPs às suas experiências e suas

implicações.

Pesquisa de campo

(utilizou-se o Método survey interseccional.

Instrumentos: Questionário de Prevalência e

Relevância de Psi (QPRP) elaborado e

validado semanticamente para

esta pesquisa; e a Escala de Bem-Estar Subjetivo (EBES) de

Albuquerque e Troccoli.

Participantes: população de

conveniência de 306 universitários e/ou

trabalhadores/ empresários que

estudam e/ou trabalham na Grande

São Paulo com idades entre 18 e 66 anos.)

82,7% dos participantes alegaram ter vivenciado ao menos uma

experiência psi e a grande maioria indicou influência dessas experiências em atitudes, crenças

e tomadas de decisão. Tal influência está relacionada às

atribuições de causalidade para as experiências psi e são coerentes com a crença,

adesão/postura religiosa dos EXPs. Não houve diferença

significante entre EXPs (experienciadores de psi) e

NEXPs (não experienciadores de psi) quanto a gênero, renda, estado civil, adesão religiosa,

religiosidade e consulta à profissionais de saúde mental.

Diferenças significantes pontuais quanto a crenças e práticas

mostram que EXPs são mais abertos a experiências psi que

NEXPs. EXPs pontuaram significantemente mais em “afetos

negativos” do que os NEXPs, o que sugere que EXPs têm um nível de bem-estar subjetivo (BES) mais baixo do que os NEXPs. São resultados não conclusivos que apontam

tendências a serem consideradas pelos psicólogos em sua prática profissional e investigadas em

próximos estudos.

Quadro 2 - Caracterização dos artigos selecionados, elaborado pela autora (2017).

DISCUSSÃO

Ao se lançar um olhar analítico sobre os 06 (seis) artigos científicos

selecionados nas bases de dados pesquisadas, verificou-se que a temática

“Psicologia anomalística” é abordada em 04 (quatro) artigos; enquanto as temáticas

“Experiências anômalas” e “Experiências espirituais” são citadas em 03 (três) artigos

diferentes. Após uma leitura criteriosa dos referidos artigos, e seguindo a análise

proposta por Bardin (2011), construíram-se as categorias exigidas pelo estudo.

Psicologia anomalística

A partir das informações que se encontram registradas no Quadro 2, percebeu-

se que no artigo A1, intitulado “Psicologia da Religião e Psicologia Anomalística:

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aproximações pela produção recente”, os autores apresentam uma visão geral da

produção em Psicologia da Religião oriunda de estudos da Psicologia Anomalística

(ZANGARI et. al., 2017).

Zangari et. al. (2017) relatam, no referido artigo (A1), que por volta do final da

década de 1970 e início da década de 1980, houve o surgimento da Psicologia

Anomalística com uma perspectiva descrente frente às alegações de ocorrências de

eventos paranormais. No entanto, a produção abordando esse tema tem crescido nos

últimos anos, uma vez decorrência de incentivos nessa área de estudo, em nível

acadêmico, tendo em vista a criação de alguns centros de pesquisa no país.

No artigo A1, os autores ressaltam a importância da produção na área da

Psicologia anomalística para três campos, ou seja, (1) para sua relação com a

religiosidade; (2) por sua aparente “inexplicabilidade” em termos psicológicos; e (3)

por sua dimensão mais trivial ou psicológica convencional. Desse modo, fica evidente

a importância desse campo para a Psicologia da Religião, para a Parapsicologia e

para a Psicologia Anomalística “cética”. No referido estudo, os autores concluíram que

a avaliação da produção recente nas áreas da Psicologia da Religião e da Psicologia

Anomalística permite afirmar que esse campo tem feito contribuições significativas em

vários aspectos, tanto das experiências religiosas quanto das experiências anômalas

(ZANGARI et. al., 2017).

No artigo A2, por sua vez, nomeado “Contribuições da psicologia para a

compreensão das relações entre a espiritualidade, a religiosidade e as experiências

anômalas”, a autora reforça a informação de que as experiências anômalas motivaram

o surgimento de uma nova área na Psicologia, a qual ficou conhecida como Psicologia

Anomalística. A referida área se ocupa do estudo psicológico das vivências

anomalísticas e de processos psicológicos relacionados, como respectivos correlatos

neuronais, crenças, influências sociais, entre outros. Nesse estudo, Machado (2016)

conclui serem essas experiências as percepções extrassensoriais, a capacidade de

mover objetos e influenciar a realidade de outras formas através do pensamento

(psicocinesia), as experiências “fora do corpo”, as lembranças de “vidas passadas”,

as experiências de “quase morte”, os contatos com “alienígenas”, as curas

“espirituais”, a êxtases místicos, as principais experiências anômalas vivenciadas

(MACHADO, 2016).

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No artigo A3, “Experiências anômalas tipicamente contemporâneas e

psicologia: uma revisão da literatura”, o autor, Martins (2016), reconhece ser a

experiência humana um dos principais temas de interesse da Psicologia. A esse tema,

o autor acrescenta as experiências anômalas, as quais têm sido, segundo ele, cada

vez mais pesquisadas, expandindo o leque de experiências humanas familiares à

ciência. Martins (2016) reconhece que, da mesma forma que a Psicologia

Anomalística se ocupa de visões de pretensos seres sobrenaturais, alegadas viagens

a mundos espirituais, estados alterados de consciência e presumidas percepções

além do tempo e do espaço cotidianos, é legítimo que se ocupe, também, de alegadas

interações com seres anômalos tidos pelos protagonistas como "alienígenas" ou

termos afins, assim como de propaladas viagens no interior de suas naves,

experiências "paranormais" induzidas à ocasião e diversas outras formas de vivências

estranhas relacionadas (MARTINS, 2016).

Entretanto, pondera o autor (A3) que as experiências invasivas tendem a ser

elaboradas pelos protagonistas como ameaças concretas à sua integridade física e

psicológica, assim como os alienígenas da ficção científica e dos cenários projetados

pela ciência para contato futuro com a humanidade são frequentemente tomados

como invasores e destruidores em potencial. Sendo assim, conclui que experiências

complexas como as abduções encenam a arquetípica jornada do herói, nas quais

protagonistas experimentam amadurecimento através de um processo de "morte" de

antigos padrões psicológicos e "renascimento" com novos padrões (MARTINS, 2016).

Por fim, no artigo A6, intitulado “Experiências anômalas (extra-sensório-

motoras) na vida cotidiana e sua associação com crenças, atitudes e bem-estar

subjetivo”, Machado (2010) elucida que a Psicologia Anomalística envolve estudos da

pesquisa psi e das outras experiências anômalas, com enfoque especial no sujeito

dessas experiências, ou seja, nos aspectos psicológicos envolvidos nessas vivências

e/ou resultantes delas. A autora faz a divisão das experiências psi em dois grandes

grupos, sendo um o das experiências extra-sensoriais e outro o das extra-motoras,

sendo que esses dois grupos, por sua vez, apresentam subdivisões. As experiências

extra-sensoriais correspondem ao que se chama de percepção extra-sensorial ou

ESP (do inglês extrasensory perception), conhecida popularmente como “sexto

sentido”. Essas experiências dizem respeito à suposta comunicação direta, imediata

(sem a utilização de qualquer mediação física conhecida) entre duas ou mais mentes

(telepatia) – conhecida como transmissão de pensamento; ao conhecimento imediato

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18

de eventos distantes, cuja fonte de informação seria o próprio ambiente (clarividência);

e à obtenção de informações imediatas do futuro (precognição) (MACHADO, 2010).

A partir disso, Machado (2010) relata ter realizado uma pesquisa do tipo survey

interseccional, com o objetivo de verificar a prevalência de experiências anômalas

extra-sensório-motoras (ou experiências psi) comparando características

demográficas, práticas, crenças, religiosidade e níveis de bem-estar subjetivo (BES)

de experienciadores (EXPs) e não experienciadores (NEXPs) de psi. Dos 306

entrevistados (idades de 18 a 66 anos), 253 (82,7%) afirmaram ter vivenciado pelo

menos uma experiência anômala extra-sensório-motora (ESP); 227 (74,2%) disseram

ter passado por pelo menos uma experiência anômala extra-sensorial e 171 (55,9%)

afirmaram ter vivenciado ao menos uma experiência anômala extramotora (PK). Ao

comparar os dados que obteve com pesquisas já realizadas, a autora percebeu que a

quantidade de experiências psicocinéticas vivenciadas no Brasil é superior à relatada

na literatura especializada. Nesse estudo, a autora concluiu que a prevalência de

experiências psi encontrada mostra que essas vivências ocorrem de modo bastante

expressivo, podendo provocar mudanças em crenças e atitudes, além da relevância

social na vida cotidiana dos EXPs (MACHADO, 2010).

Experiências anômalas

No artigo A1, Zangari et. al. (2017) afirmam que interpretações dadas às

experiências anômalas têm se mostrado influentes ou decisivas, tanto na vida

particular de indivíduos e de grupos, quanto historicamente na edificação de sistemas

de crenças. Experiências anômalas têm alimentado crenças, além de ter sido,

frequentemente, consideradas ou utilizadas como uma espécie de validação para

determinadas religiões. Essa situação ocorre quando eventos anômalos são

interpretados como resultantes de algo além do seu experienciador, o que facilmente

leva à busca de explicações sobrenaturais. No artigo A1, os autores citam que no

survey interseccional realizado por Machado (2009), os participantes que indicaram

ter vivenciado ao menos um tipo de experiência anômala dos tipos ESP (do inglês

extrasensory perception) ou PK (experiência anômala extramotora) (82,7%, N = 306)

fizeram atribuições de causalidade para suas experiências tendo apontado mudanças

de atitude e tomadas de decisão associadas a essas experiências, entre elas, a

mudança de religião. O referido estudo mostrou, ainda, reforçam os autores, que

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dentre os participantes que alegaram ter vivenciado algum tipo de experiência ESP

ou PK, os católicos foram os que menos consideram que sua religião os ajude a lidar

com suas experiências, o que pode justificar o fato de participantes ex-católicos terem

adotado religiões mediúnicas (ZANGARI et. al., 2017).

No mesmo artigo, (A1), os autores citam estudo o estudo de Menezes Júnior e

Moreira-Almeida (2009), os quais apontam nove critérios distintivos entre experiências

anômalas saudáveis e transtornos mentais de conteúdo religioso, compreendidos

como: a ausência de sofrimento psicológico; a ausência de prejuízos sociais e

ocupacionais; a curta duração da experiência; a atitude crítica preservada; a

compatibilidade com o grupo cultural ou religioso do paciente; a ausência de

comorbidades; o controle sobre a experiência; o crescimento pessoal ao longo do

tempo e uma atitude de ajuda aos outros (ZANGARI et. al., 2017). Zangari et. al.

(2017) citam, ainda, um estudo realizado por Kennedy, Kanthamani e Palmer (1994),

no qual 59% da amostra afirmou ter vivenciado experiências psi e/ou

transcendentais/espirituais. Tal estudo evidenciou que vivenciar experiências

anômalas traz benefícios aos experienciadores, promovendo bem-estar.

No artigo A3, já caracterizado anteriormente, o autor (MARTINS, 2016) cita a

pesquisa em que Martins e Zangari (2012) discutem relações entre transtornos

mentais, experiências espirituais e experiências anômalas, incluindo alienígenas, na

qual foram investigados 46 adultos brasileiros que relataram diferentes tipos de

contatos com esses seres extraterrestres. Para apurar a presença ou não de

transtornos mentais em seu histórico e eventuais aproximações entre esses e suas

experiências ufológicas, os pesquisadores utilizaram-se do instrumento diagnóstico

Mini International Neuropsychiatric Interview, versão detalhada (MINI PLUS) e

validada para o contexto brasileiro, além dos nove critérios qualitativos distintivos

entre experiências anômalas saudáveis e transtornos mentais elaborados por

Menezes Júnior e Moreira-Almeida (2009), já citados no artigo A1. Entrevistas

qualitativas buscaram levantar aspectos relevantes da biografia dos participantes,

como ajustamento social e significados atribuídos aos episódios com alienígenas. Em

conformidade com a literatura internacional, nesse caso, as experiências ufológicas

não evidenciaram transtornos mentais. Ademais, o perfil psicológico conhecido como

"esquizotipia saudável" evidenciou desempenhar um papel entre abduzidos e

contatados da amostra, de modo a lhes favorecer a ocorrência de tais experiências

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precoces ambíguas como alucinações e ideias não convencionais. A esquizotipia

saudável diz respeito, justamente, ao perfil psicológico mais propenso a experimentar

alucinações, delírios e outros "sintomas positivos" comuns às psicoses, mas sem a

presença dos "sintomas negativos", como anedonia e ansiedade social (MARTINS,

2016).

Ainda no artigo A3, Martins (2016) refere-se a estudos divulgados por Marçolla

e Mahfoud (2002), nos quais os autores abordam as experiências relatadas sobre as

luzes anômalas em Caeté, Minas Gerais. Para os estudiosos, as experiências

referentes às luzes anômalas são típicas de moradores idosos e tendem a ser

elaboradas em termos religiosos como divinos, malignos ou misteriosos, inomináveis.

Sua veracidade não é questionada pelos protagonistas. Alguns estudiosos referem-

se aos relatos como produto das memórias individual e coletiva. A memória individual

reforça o vínculo social, resgata e presentifica a tradição. A memória coletiva sanciona

a individual, oferece-lhe contexto e complementa lacunas. Taylor (1997) complementa

afirmando que a dimensão do sagrado fornece à razão contexto para reconhecer

plausibilidade nas experiências, as quais, sem isso, soariam implausíveis (MARTINS,

2016).

No artigo A5, nomeado “Relações entre experiências anômalas tipicamente

contemporâneas, transtornos mentais e experiências espirituais”, Martins e Zangari

(2012) referem que, quanto à relevância científica, as experiências anômalas são

pessoal e culturalmente impactantes, além de altamente prevalentes. Além disso,

evidenciam que, em um estudo com voluntários brasileiros, 82,7% dos 306

participantes afirmaram ter vivenciado ao menos uma experiência anômala das

investigadas na pesquisa. Entretanto, as teorias científicas desconsideram tais

experiências. Há, também, uma relevância clínica, se consideramos que muitos

protagonistas recebem diagnósticos equivocados de profissionais de saúde

despreparados para lidar com as experiências ditas anômalas. Porém, algumas

experiências anômalas e alguns temas associados têm sido objeto de interesse

científico, com pesquisas em diversos domínios, incluindo diagnóstico diferencial e

adaptação de instrumentos relacionados (MARTINS; ZANGARI, 2012).

No mesmo artigo (A5), encontra-se a informação de que uma categoria de

experiências anômalas, de características contemporâneas, não tem recebido

atenção adequada por parte dos pesquisadores no que se refere à sua prevalência e

à sua relevância cultural, científica e clínica. Dessa categoria fazem parte as visões

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de "seres alienígenas", "objetos voadores não identificados" (óvnis) e experiências

correlatas complexas e pessoalmente impactantes, como alegados sequestros

("abduções") e "canalização" de mensagens ditas alienígenas, episódios aqui

chamados genericamente de "experiências óvni" (MARTINS; ZANGARI, 2012).

Os relatos sobre "alienígenas", dizem Martins e Zangari (2012), fazem parte da

categoria contemporânea mais importante de narrativas sobre luzes anômalas em

termos de mobilização social, sendo o ícone óvni a quintessência das lendas

modernas. Essas experiências apresentam significativa prevalência na população

geral em diversos países, variando entre 5% e 25%. O Brasil figura na mídia nacional

e internacional como um dos recordistas em episódios do gênero.

Experiências espirituais

No artigo A1, Zangari et. al. (2017) relatam a existência de estudos enfatizando

a importância de se considerar certas experiências anômalas como experiências

religiosas clássicas. Os autores citam os estudos de Medeiros (2014), que afirma que

as vivências anômalas

se definem por seu alto teor espiritual/religioso, sendo muitas vezes entendida como mediunidade e trazendo, em diversas vezes, conteúdos morais, como sobre a necessidade da caridade ou mesmo entendendo a EFC como forma de praticar a caridade. (MEDEIROS, 2014, p.45).

Os autores citam, ainda, no âmbito do estudo das crenças paranormais, os

achados de Paiva et. al. (2012), em que membros das religiões sincréticas e de

religiões cristãs clássicas, apresentaram padrões totalmente diferentes quanto às

crenças paranormais. O estudo levou em conta a diferenciação entre “crenças

paranormais clássicas” e “crenças paranormais religiosas”. Entre as primeiras

estariam a crença em percepção extrassensorial, a crença em extraterrestres, em déjà

vu e em curas paranormais. Dentre as últimas estariam, por sua vez, as crenças em

deuses, no demônio, nos anjos, no céu, no inferno e na vida após a morte (ZANGARI

et. al., 2017).

No mesmo artigo (A1), os autores ressaltam um estudo realizado por Williams

et. al. (2009) apontando para uma diferença significativa de atitude entre grupos que

mantêm crenças paranormais clássicas e que mantêm crenças paranormais religiosas

tradicionais. Assim, foi possível demonstrar que a correlação entre crenças

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paranormais dependerá do sistema simbólico da religião investigada, de tal forma que

é possível prever que sistemas religiosos que incluem crenças espiritualistas

tenderam a apresentar mais crenças paranormais clássicas que sistemas religiosos

que não incluam tais crenças espiritualistas (ZANGARI et. al., 2017).

Machado et al. (2016), no artigo A2, afirmam ser “Espiritualidade” um termo

cujo sentido é multiplicado por diferentes perspectivas que o utilizam. Há quem use o

termo para designar um domínio para além do plano físico, que corresponderia ao

suposto mundo de entidades espirituais. Por outro lado, numa perspectiva acadêmica,

o termo é cada vez mais utilizado para se referir a uma dimensão humana existencial

e/ou transcendente, ligada a crenças e valores organizados ou não em torno de uma

doutrina religiosa específica. Houve um tempo em que os psicólogos da religião

tendiam a compreender espiritualidade e religiosidade como equivalentes. Contudo, a

partir da década de 1980, numerosas formas de fé denominadas como “espirituais”,

mas que não se afirmavam “religiosas”, obtiveram expansão e popularidade, talvez

como expressão de vários fatores atuando em conjunto, incluindo um declínio de

instituições religiosas tradicionais, o surgimento de formas individualizadas de fé, uma

ênfase maior na experiência do sagrado do que em um sistema instituído de crenças

e práticas, e um crescente pluralismo religioso reforçado, em parte, pelo processo de

globalização. Ao invés de se definirem como religiosos, muitos indivíduos passaram a

se definir apenas como “espiritualizados”, valorizando não uma afiliação religiosa em

particular, mas a busca por sentido, completude ou significado na vida (MACHADO et

al., 2016).

Indivíduos que se definem como espirituais, mas não religiosos, costumam

relatar grande número de experiências anômalas. As experiências anômalas podem

estimular a busca por interpretações religiosas. Na Bíblia são muitos os relatos de

eventos “paranormais”, como sonhos premonitórios, visões proféticas e curas

cientificamente inexplicáveis (MACHADO et al., 2016).

Por fim, no artigo A4, intitulado “Personalidade, religiosidade e qualidade de

vida em indivíduos que apresentam experiências anômalas em grupos religiosos”,

Alminhana et. al. (2013) realizaram um estudo com o intuito de melhor compreender

o tipo de população que busca ajuda em grupos religiosos no Brasil e que apresenta

experiências anômalas. Ao final, o estudo apresentou características de

personalidade, religiosidade e qualidade de vida (QV) em pessoas que buscaram

instituições espíritas e apresentavam experiências anômalas (EAs). Além disso,

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investigou comparativamente se a população estudada possuía características mais

próximas de populações gerais ou de amostras de pacientes psiquiátricos. O principal

achado deste estudo foi observar que em todas as características (sociodemográficas,

perfil de personalidade, religiosidade e QV) os indivíduos com EAs parecem se

encontrar em uma espécie de "limiar" entre os dados obtidos de uma população geral

e os de amostras com transtornos mentais. Cerca de 40% dos que buscaram auxílio

nos centros espíritas não se declararam espíritas, o que reflete que esse tipo de

assistência é buscado por um público diversificado. A evidência aponta para o perfil

religioso eclético do brasileiro, bem como para a importância do papel que os grupos

espíritas têm no cuidado da saúde do país. Os altos níveis de religiosidade

organizacional e privada podem refletir estratégias de coping religiosos com as EAs.

A menor religiosidade intrínseca pode se dever a crises em relação às crenças mais

íntimas causadas pelas EAs (ALMINHANA et. al., 2013).

Na referida pesquisa do Artigo A4, os autores concluíram mencionando a

necessidade de uma melhor identificação de critérios que ajudem a diferenciar quando

uma EA é sintoma de um transtorno mental, de quando ela é uma experiência não

patológica e até mesmo associada a melhor saúde e bem-estar. Além disso,

evidenciaram a importância em se desenvolver e aprimorar abordagens que integrem

e aproveitem a capilaridade oferecida pelos grupos religiosos para a triagem e,

conforme a situação, condução do caso ou encaminhamento para profissional de

saúde mental (ALMINHANA et. al., 2013).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da revisão narrativa realizada a partir da proposta do presente estudo,

foi possível verificar e conhecer alguns resultados de pesquisas desenvolvidas na

área da Psicologia Anomalística, incluindo Experiências Anômalas e Espirituais

realizadas no Brasil, na última década.

O objetivo proposto no estudo visava realizar uma pesquisa bibliográfica, do

tipo narrativa, a fim de verificar os estudos científicos existentes a respeito da

Psicologia Anomalística, divulgados no período compreendido entre 2007 e 2017. A

partir disso, a proposta era compreender, de modo mais específico, de que forma

estão sendo tratadas as vivências e os processos psicológicos relacionados às

percepções extra-sensoriais.

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Os artigos científicos analisados, apresentados e discutidos, narraram a

importância da produção na área da Psicologia Anomalística, uma vez que esta

contribui de forma significativa para a compreensão das experiências religiosas e

anômalas, ou seja, da relação entre vivências anomalísticas e processos psicológicos.

O estudo apontou, ainda, algumas evidências nas pesquisas publicadas de que a

quantidade de experiências relatadas, em nível nacional, é superior à divulgada na

literatura. Pelo olhar da Psicologia, tais vivências são capazes de ocasionar alterações

e influências em crenças e atitudes, além de possuírem relevância social na vida das

pessoas que experienciam vivências anômalas.

O presente estudo proporcionou, também, o conhecimento de critérios

utilizados para identificação e distinção entre experiências anômalas saudáveis e

transtornos mentais de fundo religioso, o que é de grande relevância para a pratica

clínica. Encontrou-se destaque dado para as experiências ufológicas, consideradas

não pertencentes ao grupo dos transtornos mentais, da mesma forma que as

experiências relatadas a respeito das luzes anômalas, ocorridas em Minas Gerais, as

quais, para alguns estudiosos, têm cunho religioso, enquanto para outros são

consideradas apenas produto da memória individual e coletiva de moradores idosos

da região. O estudo apontou que pessoas que se definem como não religiosas, sendo

apenas espirituais, apresentam maior número de experiências anômalas ao longo da

vida.

Por fim, ficou evidenciada a necessidade de aprimoramento dos critérios

psicológicos que diferenciem uma experiência anômala de um transtorno mental, sob

a justificativa de que, de acordo com o resultado, efetivar-se-á a condução do caso

para o especialista ou encaminhamento para tratamento em instituições de saúde

mental.

Ademais, com base no que foi evidenciado durante a pesquisa, destaca-se a

importância de a Psicologia buscar desmistificar e difundir os estudos na área da

Psicologia Anomalística, uma vez que no âmbito acadêmico essa temática, na maioria

das vezes, não é conhecida, mas tem sido uma das novas áreas que desponta de

estudos a respeito de uma das dimensões humanas que, por muito tempo, estava

afastada da ciência.

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