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Ingeniería Industrial. Actualidad y Nuevas Tendencias Año 10, Vol. V, N° 18 ISSN: 1856-8327 Basso et al., Identificando Oportunidades de Melhoria por meio do Lean Thinking, p. 71-82 71 Identificando oportunidades de melhoria em uma maternidade hospitalar por meio do Lean Thinking Identifying opportunities for improvement in a maternity through Lean Thinking Natália Basso Werle; Tarcisio Abreu Saurin; Marlon Soliman Palavras chave: Lean Thinking, lean healthcare, maternidade, mapeamento do fluxo de valor Key Words: Lean Thinking, lean healthcare, maternity, value stream mapping RESUMO Lean Healthcare é uma filosofia gerencial que visa o aumento da satisfação tantos do pacientes, quanto dos demais stakeholders. Tendo em vista os inúmeros beneficios que o Lean Heathcare proporciona a uma organização, este trabalho objetivou aplicar os conceitos do Lean Thinking em uma maternidade de um hospital privado de grande porte, para auxiliar no aumento da satisfação de todos os clientes. Por meio de observações de campo, definição dos requisitos de valor e diagnóstico da situação atual, foram analisadas as principais perdas encontradas no processo, começando no check-in da paciente até sua alta hospitalar. As perdas encontradas foram classificadas quanto ao seu tipo, valor percebido pelo paciente, fonte de evidência, impacto na performance do fluxo de valor e por fim a proposição de contramedida para cada situação encontrada. Essa pesquisa evidenciou situações recorrentes de superlotação, pois essa maternidade possui um fluxo de valor empurrado, portanto três contramedidas principais foram propostas que sugerem a análise específica de tarefas que afetam diretamente os requisitos de valor do paciente. ABSTRACT Lean Healthcare is a management philosophy that aims to increase both patient and other stakeholders satisfaction. In view of the numerous benefits that Lean Heathcare provides to an organization, this study aimed to apply the concepts of Lean Thinking in a maternity ward of a large private hospital, to help increase the satisfaction of all customers. Through field observations, defining the value requirements and diagnosis of the current situation, the main losses encountered in the process were analyzed, starting at patient check-in until its discharge. The losses were classified as to their type, value perceived by the patient, evidence of source, impact on the value stream performance and finally the countermeasure proposition for each situation encountered. This research showed recurring situations of overcrowding, since this maternity has a pushed value stream, so three main countermeasures have been proposed that suggest the specific analysis of tasks that directly affect the patient's value requirements.

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Identificando oportunidades de melhoria em uma maternidade

hospitalar por meio do Lean Thinking

Identifying opportunities for improvement in a maternity through Lean Thinking

Natália Basso Werle; Tarcisio Abreu Saurin; Marlon Soliman

Palavras chave: Lean Thinking, lean healthcare, maternidade, mapeamento do fluxo de valor

Key Words: Lean Thinking, lean healthcare, maternity, value stream mapping

RESUMO

Lean Healthcare é uma filosofia gerencial que

visa o aumento da satisfação tantos do

pacientes, quanto dos demais stakeholders.

Tendo em vista os inúmeros beneficios que o

Lean Heathcare proporciona a uma

organização, este trabalho objetivou aplicar os

conceitos do Lean Thinking em uma

maternidade de um hospital privado de

grande porte, para auxiliar no aumento da

satisfação de todos os clientes. Por meio de

observações de campo, definição dos

requisitos de valor e diagnóstico da situação

atual, foram analisadas as principais perdas

encontradas no processo, começando no

check-in da paciente até sua alta hospitalar. As

perdas encontradas foram classificadas quanto

ao seu tipo, valor percebido pelo paciente,

fonte de evidência, impacto na performance

do fluxo de valor e por fim a proposição de

contramedida para cada situação encontrada.

Essa pesquisa evidenciou situações recorrentes

de superlotação, pois essa maternidade possui

um fluxo de valor empurrado, portanto três

contramedidas principais foram propostas que

sugerem a análise específica de tarefas que

afetam diretamente os requisitos de valor do

paciente.

ABSTRACT

Lean Healthcare is a management philosophy

that aims to increase both patient and other

stakeholders satisfaction. In view of the

numerous benefits that Lean Heathcare

provides to an organization, this study aimed

to apply the concepts of Lean Thinking in a

maternity ward of a large private hospital, to

help increase the satisfaction of all customers.

Through field observations, defining the value

requirements and diagnosis of the current

situation, the main losses encountered in the

process were analyzed, starting at patient

check-in until its discharge. The losses were

classified as to their type, value perceived by

the patient, evidence of source, impact on the

value stream performance and finally the

countermeasure proposition for each situation

encountered. This research showed recurring

situations of overcrowding, since this

maternity has a pushed value stream, so three

main countermeasures have been proposed

that suggest the specific analysis of tasks that

directly affect the patient's value

requirements.

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INTRODUÇÃO

Atualmente o Brasil é o maior mercado de

produtos e serviços de saúde na América

Latina e sua população vem exigindo,

cada vez mais, melhores padrões de

serviços e atendimento na área da saúde

(Buss e Pellegrini, 2006). Apesar de este

mercado ser promissor, a situação da

saúde alcança níveis precários, o Brasil

ainda é um dos países que menos investe

em saúde publica. Se a falta de

investimentos não fosse suficiente, o país

sofre com a má gestão dos recursos

públicos na saúde, além de fraude e

corrupção (Bravo, 2000; Buss e Pellegrini,

2006).

Neste cenário uma nova tendência vem

surgindo, os pacientes vêm clamando por

serviços de qualidade e os hospitais por

técnicas de gestão mais apuradas. Assim,

ferramentas antes utilizadas apenas na

manufatura, começaram a ser adaptadas

para os ambientes hospitalares (Souza,

2009; Mannon, 2014). Técnicas já

consagradas na Europa e principalmente

nos Estados Unidos surgem no Brasil

como uma nova forma de repensar a

saúde, como é o caso do Lean Healthcare,

que promete não só melhorar esta carência

em gestão, como também a qualidade dos

serviços prestados (Souza, 2009; Poksinska

et. al., 2013). Considerado uma filosofia

gerencial, o Lean Healthcare é baseado no

Lean Thinking e é caracterizado por

buscar uma elevada satisfação de todos os

stakeholders, além da busca pela melhoria

contínua, o que se encaixa perfeitamente

para auxiliar na melhora da situação atual

da saúde no país (Dahlgaard et. al. 2011).

Considerando essa situação, este trabalho

busca identificar oportunidades de

melhoria em uma maternidade hospitalar

por meio do Lean Thinking. Diferente dos

trabalhos de King et. al. (2006) que

estudou como redesenhar o fluxo de

pacientes na emergência de um hospital

por meio do Lean Thinking, ou de Wojtys

et. al. (2009), que apresentou uma forma

de utilização do Lean para melhorar o

agendamento de consultas, este trabalho

focou no setor de maternidade com o

objetivo de auxiliar no aumento da

satisfação dos usuários, melhorar a

ocupação de leitos e a qualidade dos

serviços prestados. Este objetivo foi

baseado no fato de que essa maternidade

possui uma demanda maior do que

capacidade instalada e também pela

questão de não haver estudo semelhante

utilizando o Lean Healthcare em

maternidades.

Lean Thinking

O termo “Lean” surgiu no final dos anos

80 por meio de uma pesquisa

desenvolvida pelo Massachusetts Institute

of Technology (MIT) e ficou conhecido por

meio da companhia japonesa Toyota como

Lean Manufacturing (Produção Enxuta).

Este termo foi associado a um estilo

totalmente novo de gerenciamento focado

na eliminação de todos os tipos de perdas

(desperdícios) na produção de bens (Jones,

2004).

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Ao aprofundar os estudos e

conhecimentos do modelo de gestão Lean,

Womack e Jones (2010) atribuíram o

sucesso da Toyota não apenas ao Lean

Manufacturing, mas ao que eles

chamaram de Lean Thinking (Mentalidade

Enxuta). Esta mentalidade por sua vez, é

uma filosofia de estratégia de negócio para

aumentar a satisfação dos clientes por

meio da otimização dos recursos. A

filosofia Lean procura fornecer aos clientes

preços mais baixos, melhoria nos fluxos de

valor e envolvimento constante das

pessoas na busca pela melhoria contínua e

pela satisfação total de todos os clientes

(internos e externos). Desta forma, o Lean

passou a ser utilizado não apenas na

manufatura e produção de bens, mas

também na área de prestação de serviços,

como, por exemplo, o Lean Healthcare.

Lean Healthcare

De acordo com Dahlgaard et al. (2011), o

Lean Healthcare é uma filosofia gerencial

para desenvolver uma cultura hospitalar

caracterizada por elevada satisfação tanto

dos pacientes quanto dos demais

stakeholders envolvidos por meio da

melhoria contínua, onde todos os

colaboradores participam ativamente na

identificação e redução de atividades que

não agregam valor (desperdício). Souza

(2009) ainda complementa que Lean

Healthcare é uma forma efetiva de

melhorar a eficácia das organizações de

saúde.

Uma revisão sistemática da literatura

realizada por Plytiuk et. al. (2012) mostra

como a discussão do Lean Healthcare é

uma temática recente. Conforme os

critérios de busca utilizados pelos autores,

foi encontrado um total de 242 artigos

referentes ao tema até o ano de 2011. Os

resultados mostram que 79,34% das

publicações ocorreram no período de

2007-2011, enquanto que o período 2001-

2006 correspondeu por 19,83%, e apenas

0,83% das publicações são anteriores ao

ano 2000 (Plytiuk et. al., 2012).

Dohan et. al. (2014) apresenta com sucesso

uma das principais ferramentas do Lean, o

Value Stream Mapping (VSM), também

conhecido como Mapeamento do Fluxo de

Valor (MFV), aplicado às organizações da

área de saúde. Em seu livro, além de

mostrar como realizar o mapeamento do

fluxo de valor, ele também apresenta um

estudo de caso em um hospital localizado

em Ontario no Canadá e como a

ferramenta foi utilizada na eliminação de

perdas e otimização dos processos.

Apesar das evidências de sucesso

encontradas até o momento, o Lean

Healthcare ainda possui um vasto campo

a ser pesquisado. Radnor et al. (2012)

acreditam que, atualmente, o nível de

desenvolvimento e compreensão do Lean

Healthcare seja equivalente aos eventos

que marcaram o final da década de 80 e

início dos anos 90 do Lean Manufacturing,

demonstrando a dimensão da lacuna de

conhecimento que ainda precisa ser

preenchida.

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METODOLOGIA

Esse estudo foi desenvolvido por meio das

cinco etapas metodológicas sequenciais

conforme mostra a Figura 1.

Figura 1. Etapas Metodológicas

A pesquisa foi elaborada no setor de

maternidade de um hospital privado de

grande porte da cidade de Porto Alegre,

que dispõe de trinta e dois leitos de

internação e limita-se ao caso das

pacientes eletivas ou de urgência onde

ocorre nascimento. Esta delimitação torna-

se importante, uma vez que pacientes

atendidas pelo setor em situações onde

não há nascimento (consultas, exames,

internação clínicas) não irão ocupar leitos

da maternidade e, portanto, estão fora do

escopo estabelecido para o estudo.

Para conhecer em profundidade os

processos que ocorrem dentro deste

escopo, conduziu-se um estudo

exploratório por meio de observações de

campo. Os pesquisadores inseriram-se nos

ambientes onde ocorre a agregação de

valor, percorrendo os caminhos da

paciente e conhecendo também os

processos de apoio. Foram realizadas sete

incursões, totalizando aproximadamente

18 horas de observações. Além da

maternidade, foram contemplados os

setores de registro (check-in); centro

obstétrico; agendamento; hotelaria;

distribuição de leitos; e portaria. Os dados

foram registrados em notas de campo.

Oportunamente, dados foram coletados

também a partir de conversas informais

com os técnicos de enfermagem,

enfermeiros e médicos das áreas.

A definição dos requisitos de valor foi

realizada a partir das trocas de informação

entre os pesquisadores e os profissionais

das áreas visitadas, adotando-se como

balizador a perspectiva da paciente que se

enquadra no escopo delimitado para a

pesquisa.

Para o diagnóstico da situação atual,

utilizou-se a ferramenta do MFV proposta

originalmente por Rother; Shook (1999)

onde foi possível visualizar a maneira pela

qual o valor é transferido para o cliente

final e também os caminhos percorridos

pelas informações.

Após o diagnóstico, os problemas e os

desperdícios encontrados foram

classificados de acordo com as sete perdas

identificadas por Shingo (1996) e Ohno

(1997), as quais podem ser por:

superprodução; espera; transporte;

superprocessamento; movimentação;

estoque; e defeitos. A análise das perdas e

problemas também cruzou os dados com

Definição dos

limites do

sistema

Definição dos

requisitos de

valor

Diagnóstico

da situação

atual

Análise

das

perdas

Proposição

de

contramedidas

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os requisitos de valor da paciente, e

demonstrou qualitativamente e

quantitativamente o impacto sobre o fluxo

de valor.

Por último, a etapa de proposição de

contramedidas teve como finalidade

levantar possibilidades de ações para

atenuar as perdas e os problemas

identificados no fluxo de valor e nos

processos mapeados. Espera-se com esta

etapa estabelecer norteadores que

permitam entregar valor da melhor forma

possível para os clientes do setor

analisado.

RESULTADOS

Definição dos requisitos de valor

Os requisitos de valor sob a perspectiva do

paciente foram levantados em relação às

informações adquiridas entre os

profissionais consultados, em relação ao

que o paciente espera quando procura

pelo serviço de maternidade do hospital.

Nesse sentido, seis requisitos de valor

foram apontados, como seguem:

Segurança do tratamento: a

paciente espera que o seu período de pós-

parto e de internação ocorra de maneira

eficiente, no sentido dela sentir confiança

nos cuidados que os profissionais

disponibilizam para realizar o seu

atendimento e também no seu tratamento;

Informações sobre o tratamento e

evolução: o principal objetivo nesse ponto,

é receber as informações devidas

referentes à gravidade da situação clínica

da paciente após cada interferência médica

e também saber como os meios e os

recursos utilizados para o seu tratamento,

interferem e ajudam na melhora do seu

quadro clínico;

Orientações e esclarecimentos: as

pacientes, principalmente aquelas que

estão esperando o seu primeiro filho,

esperam receber ajuda e orientações

quanto aos cuidados necessários com o

recém-nascido em relação à amamentação,

banhos, trocas de fralda e demais

necessidades;

Conforto: em relação às instalações

físicas e a disponibilidade de leito no

momento certo;

Cordialidade e respeito: a paciente

espera receber um atendimento

humanizado, com a atenção e o cuidado

devido dos profissionais no seu

acompanhamento e evolução;

Disponibilidade da equipe

assistencial: dispor de assistência e

atendimento no momento que a paciente

precisar e quando ela desejar.

A partir desses requisitos, estabeleceram-

se os critérios de julgamento para

identificar como os processos hospitalares

agregam valor ou produzem desperdícios

ao longo da jornada da paciente.

Diagnóstico da situação atual

Para tornar mais visível e compreensível o

fluxo de atravessamento percorrido pela

paciente, utilizou-se a ferramenta de

Mapeamento de Fluxo de Valor (MFV),

onde o resultado encontra-se na Figura 2.

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Figura 2. Fluxo de Valor da Paciente da Maternidade (estado atual)

O fluxo inicia com o agendamento eletivo

do médico obstetra que reserva um horário

para a sua paciente, com dois meses de

antecedência da provável data do parto,

no portal da página da internet do

hospital. Essa agenda está disponível para

a janela de horários das 06:00h até as

22:00h, sempre nos horários pares. O setor

de Agendamento é responsável pela

programação diária eletiva e pelo retorno

de confirmação ao médico da data

marcada para a sua paciente.

Essa situação via agendamento prévio,

contempla a realização de até oito partos

no dia. Já os horários ímpares, são

destinados para as pacientes que chegam

em situação de emergência e precisam

realizar o parto naquele momento. Nesse

caso, existe a possibilidade diária de

realização de mais oito procedimentos,

portanto, na janela de horários informada,

dezesseis partos são possíveis de serem

realizados num único dia. Nos demais

horários, antes das 06:00h e depois das

22:00h, também ocorrem nascimentos, mas

em menor frequência. Em torno de 370

partos são realizados por mês nessa

maternidade.

A paciente entra no fluxo do processo, no

dia agendado para o seu procedimento de

parto ou antes da data marcada, na

situação de emergência. No caso de parto

eletivo, com hora marcada, o hospital

recomenda que a paciente chegue com

duas horas de antecedência, para, na

primeira hora, realizar o check-in e na hora

seguinte, seguir com os preparativos de

pré-parto.

O primeiro processo, tanto para a paciente

eletiva como para a paciente de

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emergência, é no setor de Check-in, onde,

para a primeira paciente, ocorre o

Cadastro de Internação, que contempla o

seu cadastro completo no sistema com

informações de registro e do plano de

saúde e também ocorre a confecção de

uma pulseira de identificação. Essa etapa

demora de 30 a 40 min para ocorrer. Já a

paciente de emergência, passa pelo setor

de Check-in para solicitar atendimento e

informar a sua situação clínica. O

profissional que lhe atende, confecciona

uma pulseira de identificação e repassa as

informações clínicas ao Centro Obstétrico

(CO) para preparação da equipe e do leito

(dentre os seis disponíveis). Esse primeiro

atendimento, acontece entre três e cinco

minutos. Logo após, o CO chama essa

paciente para atendimento e enquanto

isso, o Check-in prepara o cadastro

completo no sistema com a documentação

deixada por ela, bem como também

elabora o Boletim de Emergência.

No CO, o setor de Triagem atende essa

ocorrência para medição dos sinais vitais e

verificação da gravidade da situação em,

no máximo, 15 minutos. Em seguida

ocorre a etapa da Consulta onde o médico

verifica a necessidade de internação dessa

paciente para a realização do parto. Em

caso positivo, o CO informa ao Check-in

da necessidade de internação, para onde o

familiar da paciente se encaminha para dar

andamento ao Cadastro de Internação.

Enquanto isso, a paciente inicia a etapa de

Preparação, onde pode haver um tempo

de espera, no caso de ter que aguardar

pela vinda do próprio médico obstetra da

paciente.

A etapa de Procedimento com a realização

do parto cesariano (que corresponde a

cerca de 80% dos casos) ocorre

normalmente em uma hora. Logo após o

nascimento, existe a tarefa de Admissão do

Recém-Nascido (RN) onde acontece a

primeira avaliação pelo pediatra, a

limpeza, o teste de Apgar, as primeiras

medições e o cadastro no sistema para

solicitação de leito e confecção da pulseira

de identificação do bebê. Em seguida, o

recém-nascido retorna para a sua mãe e

eles passam pelo processo de Recuperação

(em um dos sete leitos destinados para

isso) em relação à anestesia e aos cuidados

pós-parto.

Após quatro horas acomodados em um

leito de recuperação, os pacientes estão

aptos para serem encaminhados para um

leito de internação, entretanto, a espera

por esse leito costuma levar entre oito e

vinte horas. Nessa etapa existe a formação

de uma fila de espera que é priorizada de

acordo com o tipo de leito (privativo ou

semi-privativo, conforme cobertura de

custos do plano de saúde) e pela ordem de

nascimento do bebê. Quando ocorre a

liberação de um leito, os pacientes são

encaminhados para esse quarto, onde

permanecem de 48 horas (no caso do

procedimento de parto normal) até 72

horas (no caso do procedimento de parto

cesariano), também conforme cobertura de

custos do plano de saúde.

A etapa de Tratamento (internação pós-

parto) conta com a disponibilidade de 32

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leitos. Quando os pacientes completam

esse período de internação, eles recebem a

alta médica que inicia o processo da alta

administrativa, essa etapa gera a

documentação de Prescrição de Alta, a

Nota de Alta, o Plano Educacional e a

Carteira de Vacinação do RN. Após o

fechamento da conta dos pacientes no

sistema, eles realizam a alta hospitalar

completando assim os processos do fluxo

de atravessamento da maternidade.

Análise das perdas

A base de dados disponibilizada para

análise foi referente ao período de Janeiro

a Dezembro de 2014, onde ocorreram 4.204

partos. Ao observar o mapa do fluxo de

valor da paciente na situação atual,

verificou-se que após a etapa de

Recuperação, ocorre a formação de uma

fila de pacientes aguardando por um leito

de internação. Por meio das observações

de campo e dos dados coletados nas

conversas informais com os profissionais

da área, também foi comprovado que o

quadro de superlotação do setor é

recorrente, pelo fato de que esse processo

possui características de um fluxo de valor

empurrado, onde a capacidade de

atendimento no centro obstétrico supera a

capacidade de acomodação dos pacientes

nos leitos de internação disponíveis.

Outra questão evidenciada na base de

dados foi em relação ao elevado tempo de

internação hospitalar para um percentual

de pacientes, conforme mostra a Figura 3.

De acordo com a cobertura de custos dos

planos de saúde, esse período deve ser de

até 48 horas para pacientes que tiveram

parto normal e de até 72 horas para

pacientes que tiveram parto cesariano.

Figura 3. Tempo de Internação Hospitalar

Nota-se que para 30% das pacientes do

período analisado, o tempo de

permanência foi superior a 72 horas, ou

seja, provavelmente essas pacientes

tiveram uma intercorrência ou um evento

adverso durante uma das etapas de

24%

46%

22%

8% 24,117%

70,497%

92,425%

100,000%

0%

20%

40%

60%

80%

100%

< 48 h 48 - 72 h 72 - 96 h > 96 h

Fre

qu

ên

cia

Duração

Tempo de internação hospitalar (Length of Stay - LOS)

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atravessamento do fluxo e o seu tempo de

recuperação foi superior ao tempo

normalmente necessário nessa situação.

Esse percentual de pacientes que

continuam ocupando o leito depois do

tempo normalmente esperado de

internação, contribui para haver

indisponibilidade de recurso para as

pacientes da fila de espera.

Também foi verificado durante as

observações de campo que a passagem de

turno entre os funcionários pode gerar

atrasos nas transferências dos pacientes

para o leito de internação. Na maternidade

estudada, os profissionais são escalados

dentro de três turnos de trabalhos que

podem ser: manhã (das 6:50h ás 13:10h),

tarde (das 13:10h ás 19:40h) ou noite (das

19:40h ás 6:50h), portanto diariamente

ocorrem duas passagens de turno e nesse

período também ocorre a transferência do

cuidado das pacientes, mas todas as

atividades são encerradas pela equipe

anterior para que a próxima equipe possa

reiniciar a rotina de trabalho.

Proposição de contramedidas

Após análise da situação atual e análise da

base histórica de dados, foi realizado um

levantamento referente aos problemas

encontrados. Esses problemas foram

classificados de acordo com: o tipo de

perda conforme as Sete Perdas do Sistema

Toyota de Produção (Shingo, 1996; Ohno,

1997); o valor afetado em relação aos seis

requisitos de valor para a paciente; a fonte

de evidência ou verificação; e o impacto

que esse problema causa na performance

do fluxo de valor, principalmente em

relação ao tempo de espera. A partir dos

problemas levantados foram elaboradas

ações recomendadas como contramedidas

desses fatores, segundo mostra o Quadro

1.

Um ponto de destaque no Quadro 1 é que

a dimensão “conforto” é o valor mais

afetado pelos problemas encontrados. Isso

acontece porque as deficiências dos

processos acabam gerando superlotação

da maternidade, filas, tempos de espera e

permanência elevados.

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Problema Tipo de perda

(7 perdas)

Valor

afetado

(paciente)

Fonte de

evidência

Impacto na

performance

do fluxo de

valor

Contramedidas

propostas

Indisponibilidade

de leito de

internação

Superprocessa-

mento,

estoques,

espera,

transporte,

movimentação

Conforto

Observações

em campo e

relatos de

funcionários

Pacientes em

processo de

recuperação

ocupando

salas de pré-

parto ou até

mesmo a

própria sala

cirúrgica

Estudar detalhadamente

o fluxo do proceso de

alta de modo que as

etapas seguintes a

formação da fila de

espera, possam absorver

a demanda em espera

ao aumentar o giro e a

disponibilidade de leitos

Elevada

permanência

hospitalar

Superprocessa-

mento,

estoques,

espera,

transporte,

movimentação,

defeitos

(intercorrências

médicas)

Segurança

do

tratamento,

conforto

Registros

históricos e

observações

em campo

29,5 % das

pacientes

permanecem

internadas por

mais de 72 h

Investigar as causas da

elevada permanência

hospitalar. Estratificar

os casos para analisar as

esperas e as possíveis

intercorrências e

eventos adversos

ocorridos com os

pacientes durante as

etapas de

atravessamento do

fluxo.

Transferência de

pacientes da sala

de recuperação

para os leitos é

afetada pela

passagem de

turno.

Superprocessa-

mento, espera.

Conforto,

disponibili-

dade da

equipe

assistencial

Observações

em campo

De 40 min até

1h25min

Priorizar a transferência

do paciente planejando

uma pequena equipe

para realizar esse

processo durante a troca

de plantão.

Quadro 1. Classificação dos Problemas e Propostas de Contramedidas

CONCLUSÕES

As análises dos resultados desse estudo

demonstram que o Lean Thinking e a

ferramenta de mapeamento de fluxo de

valor trazem resultados promissores ao

identificar melhorias em processos

hospitalares, como na maternidade

pesquisada. O direcionamento do

pensamento Lean coloca o paciente no

centro dos processos, buscando identificar

como ocorre a agregação de valor na

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Ingeniería Industrial.

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ISSN: 1856-8327

Basso et al., Identificando Oportunidades de Melhoria por meio do Lean Thinking, p. 71-82

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perspectiva deste. Para tanto, seis

requisitos de valor foram identificados

nesta pesquisa, os quais atuaram como

balizadores para a identificação dos

problemas.

Como consequência da produção

empurrada, o cliente tem seu valor

afetado, pois não dispõem dos recursos no

momento em que ele precisa ou deseja,

mas sim precisa aguardar quando a

organização poderá fornecê-los. Os

processos não estão centrados na

perspectiva das necessidades dos

pacientes, como fica claro em situações

onde a transferência do paciente é

impactada pela troca de turnos.

As contramedidas propostas evidenciam a

necessidade de se analisar etapas

específicas do fluxo do processo, como por

exemplo, o processo de alta, que pode

estar afetando negativamente o valor

conforto da paciente que está em espera, se

o tempo entre liberar um leito de

internação e admitir uma nova paciente

não for otimizado, considerando que esse

período contempla três altas diferentes:

alta médica, alta administrativa e alta

hospitalar e ainda o tempo de higienização

desse leito. Portanto, essa é uma questão

que ainda precisa ser estudada para haver

melhorias sistemáticas no atravessamento

da paciente pelo setor de maternidade. Os

motivos que levam os pacientes e ficar

mais tempo internado do que o necessário,

também precisam ser levantados e

estratificados em maior detalhe para

identificar as causas raiz que estão fazendo

com que essas pacientes não recebam alta

no momento devido, pois isso também

afeta negativamente o valor segurança do

tratamento para eles.

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Autores

Natália Basso Werle. Mestre em Engenharia de Produção, Universidade Federal do Rio Grande

do Sul; Engenheira de Produção, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil.

E-mail: [email protected]

Tarcisio Abreu Saurin. Doutor em Engenharia de Produção, Universidade Federal do Rio

Grande do Sul; Mestre em Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio Grande do Sul;

Engenheiro Civil, Universidade Federal de Santa Maria, Brasil.

E-mail: [email protected]

Marlon Soliman. Mestre em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Maria;

Engenheiro Químico, Universidade Federal de Santa Maria; Doutorando em Engenharia de

Produção, Universidade Federal de Rio Grande do Sul, Brasil.

E-mail: [email protected]

Recibido: 15-11-2016 Aceptado: 28-05-2017