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O Capital no Século 21 Thomas Piketty Resumo

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O Capital no Século 21 Thomas Piketty

Resumo

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Trabalho iniciado em Abril e terminado em 11 de outubro de 2016.

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Dedico este resumo ao nosso amigo de infância Garrolê, uma antítese da meritocracia.

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Considerações Muitos líderes mundiais – tendo em Lula um de seus expoentes – e diversos intelectuais colocam

a questão da distribuição mundial de renda no centro da solução da crise que vive toda população

mundial atualmente. A concentração de riquezas no século XXI – que já atingiu níveis

semelhantes aos do início do século XX - com tendência a se concentrar ainda mais, poderá levar

a humanidade a uma crise generalizada a ponto de comprometer todo o avanço da humanidade

nos últimos 300 anos. Piketty sinaliza um caminho e dá sugestões de como poderíamos

redistribuir a renda de forma que o retorno do capital não ultrapassasse a taxa de crescimento

da produção – ponto central da discussão presente neste trabalho – e assim, mais que estancar

a concentração de renda, voltássemos a redistribui-la sem a necessidade de passarmos por um

período de sofrimentos ou guerras como foi o caso do século passado onde a renda foi

redistribuída de forma mais humanitária.

Para tornar a leitura mais fácil, omiti todas as referências e pesquisas que corroboram as

afirmações de Piketty. As referências podem ser acessadas em português aqui:

http://delubio.com.br/biblioteca/wp-content/uploads/2015/02/O-Capital-no-Seculo-XXI-Thomas-Piketty-2.pdf

O resumo foi feito de forma livre, mas sempre tentando ser fiel às ideias de cada tópico. O livro é

dividido em Partes, Capítulos e Sessões. São 208 sessões. Cada uma ganha seu resumo. Caso o

texto que você esteja lendo se encontre em formato itálico significa que você estará lendo uma

opinião minha ou um cenário criado por mim para esclarecer melhor alguns conceitos

importantes apresentados por Piketty.

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Sumário

Introdução ...................................................................................................................................... 1

1 Um Debate Sem Dados? ......................................................................................................... 1

2 Malthus, Young e a Revolução Francesa ................................................................................. 2

3 Ricardo – Princípio da Escassez ............................................................................................... 3

4 Karl Marx – Princípio da Acumulação Infinita ......................................................................... 3

5 De Marx para Kuznets ou o Apocalipse dos Contos de Fada .................................................. 3

6 A Curva de Kuznets: Boas Notícias em Tempos de Guerra Fria .............................................. 4

7 Colocando a Questão da Distribuição de Volta no Coração da Análise Econômica ............... 4

8 As Fontes de Dados Usadas Neste Livro ................................................................................. 5

9 Os Principais Resultados Deste Estudo ................................................................................... 5

10 Forças Divergentes e Convergentes ...................................................................................... 6

11 O fator Fundamental da Divergência: r > g ........................................................................... 6

12 Os Limites Históricos e Geográficos Deste Estudo ................................................................ 7

13 A Estrutura Teórica e Conceitual........................................................................................... 9

14 Esboço do Livro ..................................................................................................................... 9

Capítulo 1 - Renda e Produção ..................................................................................................... 13

15 A Divisão Capital-Trabalho no Longo Prazo: Não Tão estável ............................................ 13

16 A Ideia de Renda Nacional .................................................................................................. 14

17 O Que é Capital? ................................................................................................................. 14

18 Capital e Riqueza ................................................................................................................. 15

19 Razão Capital / Renda ......................................................................................................... 15

20 A Primeira Lei Fundamental do Capitalismo: α = r * β ....................................................... 16

21 Contas Nacionais: Uma Construção Social em Evolução .................................................... 17

22 A Distribuição Global da Produção ..................................................................................... 17

23 De Blocos Continentais Para Blocos Regionais ................................................................... 18

24 Desigualdade Global: de 150 a 3.000 Euros por Mês ......................................................... 18

25 A Distribuição Global da Renda é Mais Desigual do Que o PIB Entre os Países ................. 19

26 Quais Forças Favorecem a Convergência? .......................................................................... 19

Capítulo 2 – Crescimento: Ilusões e Realidades .......................................................................... 20

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27 O Crescimento mundial ao longo dos tempos .................................................................... 20

28 A Lei do Crescimento Cumulativo ....................................................................................... 21

29 Os Estágios do Crescimento Demográfico .......................................................................... 22

30 Crescimento Demográfico Negativo? ................................................................................. 22

31 Crescimento como um fator de Equalização ...................................................................... 23

32 Os Estágios do Crescimento Econômico ............................................................................. 23

33 O que Significa um Aumento de 10 vezes no Poder de Compra?....................................... 24

34 Crescimento: Uma Diversificação do Estilo de Vida ........................................................... 24

35 O Fim do Crescimento? ....................................................................................................... 25

36 Um Crescimento de 1% Implica em Mudanças Sociais Importantes .................................. 26

37 A Posteridade do Período Pós-Guerra: Entrelaçando Destinos Além-Mar ......................... 26

38 As Duas Curvas de Gauss do Crescimento Global ............................................................... 27

39 A Questão da Inflação ......................................................................................................... 28

40 A Enorme Estabilidade Monetária dos Séculos XVIII e XIX ................................................. 28

41 O Significado do Dinheiro na Literatura Clássica ................................................................ 28

42 A Perda das Relações Monetárias no Século XX ................................................................. 29

Capítulo 3 – A Metamorfose do Capital ....................................................................................... 31

43 A Natureza da Riqueza: da Literatura para a Realidade ..................................................... 31

44 A Metamorfose do Capital na Grã-Bretanha e França ........................................................ 31

45 A Ascensão e Queda do Capital Estrangeiro ....................................................................... 32

46 Renda e Riqueza: Algumas Ordens de Grandeza ................................................................ 32

47 Riqueza Pública, Riqueza Privada ........................................................................................ 33

48 Riqueza Pública em uma Perspectiva Histórica .................................................................. 33

49 Grã-Bretanha: Dívida Pública e a Revitalização do Capital Privado .................................... 34

50 Quem Lucra com a Dívida Pública? ..................................................................................... 34

51 Os Altos e Baixos da Equivalência de David Ricardo ........................................................... 35

52 França: Um Capitalismo Sem Capitalistas no Período Pós-Guerra ..................................... 36

Capítulo 4 – Da Velha Europa Para o Novo Mundo ..................................................................... 36

53 Alemanha: O Capitalismo “Reno” e Propriedade Social ..................................................... 36

54 Choques do Capital no Século Vinte ................................................................................... 37

55 O Capital na América: Mais estável do que na Europa ....................................................... 38

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56 O Novo Mundo e o Capital Estrangeiro .............................................................................. 38

57 Canadá: Propriedade da Coroa por Longo Tempo .............................................................. 39

58 O Novo e o Velho Mundo: A Importância da Escravidão .................................................... 39

59 Capital Escravo e Capital Humano ...................................................................................... 39

Capítulo 5 – A História da Relação Capital / Renda ..................................................................... 39

60 A Segunda Lei Fundamental do Capitalismo β = s / g ......................................................... 40

61 Uma Lei de Longo Prazo ...................................................................................................... 40

62 O Capital Está de Volta aos Países Ricos a Partir dos Anos 70 ............................................ 40

63 Além das Bolhas: Baixo Crescimento, Altas Taxas de Poupança ........................................ 41

64 Os Dois Componentes da Poupança Privada ...................................................................... 41

65 Bens Duráveis e Bens de Consumo ..................................................................................... 42

66 O Capital Expresso em Anos de Rendimento Disponível .................................................... 42

67 A Questão das Fundações e Outras Organização de Capital .............................................. 43

68 A Privatização das Riquezas nos Países Ricos ..................................................................... 43

69 A Histórica Recuperação dos Preços dos Ativos ................................................................. 43

70 Capital Nacional e Ativo Líquido Estrangeiro nos Países Ricos ........................................... 43

71 Como Ficará a Razão Capital / Renda no Século XXI? ......................................................... 44

72 O Mistério do Valor da Terra .............................................................................................. 44

Capítulo 6 – A Divisão Capital-Trabalho no Século XXI ................................................................ 44

73 Da Razão Capital / Renda Para a Divisão Capital-Trabalho ................................................. 45

74 Fluxos de Renda: Mais Difícil de Estimar do que o Capital ................................................. 45

75 A Noção do Retorno Puro do Capital .................................................................................. 45

76 A Participação do Capital na Renda numa Perspectiva Histórica ....................................... 45

77 O Retorno do Capital no Início do Século XXI ..................................................................... 46

78 Ativos Reais e Nominais ...................................................................................................... 46

79 O Capital é Usado Para Quê? .............................................................................................. 46

80 A Noção de Produtividade Marginal do Capital .................................................................. 47

81 Capital em Excesso Mata o Retorno do Capital .................................................................. 48

82 Além de Cobb-Douglas: a Questão da Estabilidade da Divisão Capital-Trabalho ............... 48

83 Substituição do Capital-Trabalho no Século XXI: Elasticidade Maior do que 1 .................. 49

84 Sociedades Agrícolas Tradicionais: Uma Elasticidade Menor que 1 ................................... 50

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85 O Capital Humano é Ilusório? ............................................................................................. 50

86 Mudanças de Médio Prazo na Divisão Capital-Trabalho .................................................... 50

87 De Volta para Marx e a Queda do Lucro ............................................................................. 51

88 Além do Debate “Two Cambridges” ................................................................................... 51

89 A Volta do Capital a um Regime de Baixo Crescimento ...................................................... 52

90 Os Caprichos da Tecnologia ................................................................................................ 52

Capítulo 7 – Desigualdade e Concentração: Considerações Preliminares ................................... 55

91 A Lição de Vautrin – Personagem de Balzac ....................................................................... 55

92 A Pergunta Chave: Trabalho ou Herança? .......................................................................... 55

93 Desigualdades em Relação ao Capital e Trabalho .............................................................. 56

94 Capital: Sempre Mais Desigualmente Distribuído do que o Trabalho ................................ 56

95 Desigualdades e Concentração: Algumas Ordens de Grandeza ......................................... 56

96 Classes Baixa, Média e Alta ................................................................................................. 57

97 Luta de Classes ou Luta do 1%? .......................................................................................... 57

98 Desigualdades Relacionadas ao Trabalho: Desigualdade Moderada? ............................... 57

99 Desigualdades Relacionadas ao Capital: Desigualdade Extrema ........................................ 58

100 A Grande Inovação: A Classe Média Patrimonial .............................................................. 58

101 Desigualdade da Renda total: Dois Mundos ..................................................................... 59

102 O Problema dos Índices Sintéticos .................................................................................... 59

103 O Véu Casto das Publicações Oficiais ................................................................................ 60

104 De Volta às “Tabelas Sociais” e à Aritmética Política ........................................................ 60

Capítulo 8 – Dois Mundos ............................................................................................................ 61

105 Um Caso Simples: A Redução da Desigualdade na França no Século XX .......................... 61

106 A História da Desigualdade: Uma História Política Caótica .............................................. 61

107 De Uma “Sociedade de Rentistas” Para Uma “Sociedade de Gerentes” .......................... 61

108 O Mundo Diferente dos 10% Mais Ricos .......................................................................... 62

109 Os Limites do Imposto de Renda ...................................................................................... 62

110 O Caos dos Anos de Entre Guerras ................................................................................... 63

111 O Choque das Temporalidades ......................................................................................... 63

112 O Aumento da Desigualdade na França a Partir de 1980 ................................................. 64

113 Um Caso Mais Complexo: a Transformação da Desigualdade nos EUA ........................... 64

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114 A Explosão da Desigualdade nos EUA após 1980 ............................................................. 65

115 O Aumento da Desigualdade Causou a Crise Financeira? ................................................ 66

116 A Ascensão dos Super Salários .......................................................................................... 66

117 Coabitação nos 1% Mais Ricos .......................................................................................... 67

Capítulo 9 – Desigualdade na Renda do Trabalho ....................................................................... 69

118 Desigualdade Salarial: Uma Corrida Entre Educação e Tecnologia? ................................. 69

119 Os Limites do Modelo Teórico: O Papel das Instituições .................................................. 70

120 Escalas Salariais e o Salário Mínimo .................................................................................. 70

121 Como Explicar a Explosão da Desigualdade nos EUA? ...................................................... 71

122 A Ascensão do Supergestor: Um fenômeno Anglo-Saxão ................................................ 71

123 Europa: Mais Desigual do que o “Novo Mundo” em 1900-1910 ...................................... 73

124 Desigualdades nas Economias Emergentes: Menor do que nos EUA? ............................. 73

125 A Ilusão da Produtividade Marginal .................................................................................. 74

126 A Decolagem dos Supergestores: Uma Força Poderosa de Divergência .......................... 75

Capítulo 10 – Desigualdade da Propriedade do Capital .............................................................. 75

127 Riqueza Hiperconcentrada: Europa e América ................................................................. 75

128 França: Um Observatório da Riqueza Privada .................................................................. 75

129 As Metamorfoses de Uma Sociedade Patrimonial ........................................................... 76

130 Desigualdade do Capital na Europa da “Belle Époque” .................................................... 77

131 A Emergência da Classe Média Patrimonial ...................................................................... 78

132 Desigualdade de Riqueza na América ............................................................................... 79

133 Os Mecanismos da Força Divergente: r Versus g na História ........................................... 80

134 Porque o Retorno do Capital é Maior Que a Taxa de Crescimento? ................................ 81

135 A Questão da Preferência Temporal ................................................................................. 83

136 Existe Um Equilíbrio de Distribuição? ............................................................................... 84

137 O Código Civil e a Ilusão da Revolução Francesa .............................................................. 84

138 Pareto e as Ilusões da Desigualdade Estável .................................................................... 85

139 Porque a Desigualdade de Riqueza não Retornou aos Níveis do Passado ....................... 86

140 Algumas Explicações Parciais: Tempo, Impostos e Crescimento ...................................... 86

141 Século XXI: Ainda Mais Desigual Que o Século XIX? ......................................................... 87

Capítulo 11 – Mérito e Herança a Longo Prazo ........................................................................... 87

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142 A Herança Flui a Longo Prazo ............................................................................................ 88

143 Fluxo Fiscal e Fluxo Econômico ......................................................................................... 89

144 As Três Forças: a Ilusão do Fim da Herança ...................................................................... 89

145 A Mortalidade no Longo Prazo ......................................................................................... 90

146 A Riqueza Envelhece Com a População: o Efeito μ X m .................................................... 91

147 Riqueza dos Mortos e Riqueza dos Vivos .......................................................................... 91

148 Os Cinquentões e os Velhos de Oitenta anos: Idade e Fortuna na Belle Époque............. 92

149 O Rejuvenescimento da Riqueza em Virtude da Guerra .................................................. 92

150 Como o Fluxo de Herança Irá Evoluir no Século XXI? ....................................................... 92

151 Do Fluxo Anual de Herança Para Estoque de Riqueza Herdada ....................................... 93

152 De Volta ao Vautrin de Balzac ........................................................................................... 93

153 O Dilema de Rastignac ...................................................................................................... 94

154 A Aritmética Básica dos Rentistas e Gestores ................................................................... 94

155 A Sociedade Patrimonial Clássica: O Mundo de Balzac e Austen ..................................... 95

156 Extrema desigualdade da riqueza: Uma Condição da Civilização Em Uma Sociedade

Pobre? ...................................................................................................................................... 95

157 Extremismo Meritocrático Nas Sociedades de Ricos ........................................................ 95

158 A Sociedade dos Pequenos Rentistas ............................................................................... 96

159 O Rentista, Inimigo da Democracia ................................................................................... 97

160 O Retorno da Riqueza Herdada: Um Fenômeno Europeu ou Global? .............................. 98

Capítulo 12 – Desigualdade Global da Riqueza no Século XXI ..................................................... 99

161 A Desigualdade do Retorno do Capital ............................................................................. 99

162 A Evolução do Ranking da Riqueza Global ........................................................................ 99

163 Do Ranking dos Milionários Para os “Relatórios da Riqueza Global” ............................. 100

164 – Herdeiros e Empreendedores nos Rankings da Riqueza.............................................. 101

165 – A Hierarquia Moral da Riqueza .................................................................................... 101

166 – O Retorno do Capital nas Dotações Universitárias ...................................................... 102

167 – Qual é o Efeito da Inflação na Desigualdade do Retorno do Capital? ......................... 103

168 O Retorno Sobre os Fundos Soberanos: Capital e Política.............................................. 104

169 Os Fundos Soberanos Dominarão o Mundo? ................................................................. 104

170 A China Irá Dominar o Mundo? ...................................................................................... 104

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

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171 Divergência Internacional, Divergência Oligárquica ....................................................... 105

172 Os Países Ricos na Verdade São Pobres? ........................................................................ 105

Capítulo 13 – Um Estado Social Para o Século XXI ..................................................................... 108

173 A Crise de 2008 e o Retorno do Estado .......................................................................... 108

174 O Crescimento do Estado Social no Século XX ................................................................ 109

175 Redistribuição Moderna: Uma Lógica de Direitos .......................................................... 109

176 Modernizar o Estado Social e não o Desmantelar .......................................................... 110

177 As Instituições Educativas Possibilitam a Mobilidade Social? ........................................ 111

178 O Futuro das Aposentadorias: as Contribuições Previdenciárias em Época de Fraco

Crescimento ........................................................................................................................... 111

179 O Estado Social nos Países Pobres e Emergentes ........................................................... 112

Capítulo 14 – Repensando o Imposto de Renda Progressivo .................................................... 113

180 A Questão da Tributação Progressiva ............................................................................. 113

181 O Imposto Progressivo no Século XX: Um Efêmero Produto do Caos ............................ 114

182 Tributação Progressiva na Terceira República ................................................................ 114

183 Tributação Confiscatória da Alta Renda: Uma Invenção Americana .............................. 115

184 A Explosão dos Salários dos SuperGerentes: O Papel da Tributação ............................. 115

185 Repensando a Questão da Taxa Marginal Superior ........................................................ 116

Capítulo 15 – Um Imposto Global Sobre o Capital .................................................................... 117

186 Um Imposto Global Sobre o Capital: Uma Utopia Útil .................................................... 117

187 Transparência Democrática e Financeira ........................................................................ 117

188 Uma Solução Simples: Transmissão Automática de Informações Bancárias .................. 118

189 Qual o Propósito de um Imposto Sobre o Capital? ......................................................... 118

190 Um Projeto para Tributação da Riqueza na Europa ........................................................ 119

191 Tributação de Capital Em Uma Perspectiva Histórica ..................................................... 119

192 Formas Alternativas de Regulação: Protecionismo e Controles de Capital .................... 120

193 O Mistério da Regulação do Capital Chinês .................................................................... 121

194 A Redistribuição das Receitas do Petróleo ..................................................................... 121

195 Redistribuição Pela Imigração ......................................................................................... 121

Capítulo 16 – A Questão do Dívida Pública ................................................................................ 122

196 Reduzindo a Dívida Pública: Impostos Sobre o Capital, Inflação e Austeridade ............. 122

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Jandui Tupinambás xiv

197 A Inflação Redistribui Riquezas? ..................................................................................... 123

198 Qual o Papel dos Bancos Centrais? ................................................................................. 124

199 A Crise cipriota: Quando a Tributação do Capital se Junta à Regulação Bancária .......... 125

200 Euro: Uma Moeda Sem Estado Para o Século XXI? ......................................................... 126

201 A Questão da Unificação da Europa................................................................................ 127

202 Poder Público e Acumulação de Capital no Século XXI ................................................... 128

203 Direito e Política .............................................................................................................. 128

204 Mudança Climática e Capital Público .............................................................................. 129

205 Transparência Econômica e Controle Democrático do Capital ...................................... 129

206 A Contradição Central do Capitalismo: r > g ................................................................... 132

207 Por Uma Economia Política e Histórica ........................................................................... 132

208 O Interesse dos Mais Pobres ........................................................................................... 133

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Jandui Tupinambás 1

Introdução “As distinções sociais só podem se fundamentar na utilidade comum”

Artigo I, Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, França 1789

A dinâmica do capitalismo nos levará para o caminho anunciado por Karl Marx –

concentração infinita do capital – ou para o caminho de Simon Kuznets – a harmonia do

mercado? Esta são algumas das perguntas que este trabalho tentará responder.

Mas um aviso: as respostas aqui presentes são imperfeitas e incompletas. No entanto,

se baseiam em dados históricos e comparativos muito mais extensos que os dados de

qualquer outra pesquisa já realizada e numa estrutura teórica inovadora que permite

compreender melhor as tendências e os mecanismos em operação.

O crescimento econômico atual e a força do conhecimento tornaram possível evitar o

apocalipse marxista, mas não modificaram as estruturas profundas do capital e da

desigualdade. Quando a taxa de remuneração do capital ultrapassa a taxa de

crescimento da produção e da renda, como ocorreu no século XIX e parece provável que

volte a ocorrer no século XXI, o capitalismo produz automaticamente desigualdades

insustentáveis, arbitrárias, que ameaçam de maneira radical os valores de meritocracia

sobre os quais se fundam nossas sociedades democráticas.

Existe, contudo, caminhos para reverter a tendência da concentração da riqueza e

assegurar que o interesse geral da população da terra tenha prioridade sobre os

interesses do capital privado sem, todavia, perder o grau de abertura econômica e

repelindo retrocessos protecionistas e nacionalistas. Muitas proposições serão feitas

neste sentido ao longo do livro que se apoiam em lições tiradas de experiências

históricas cuja narrativa forma a trama principal deste texto.

1 Um Debate Sem Dados? Durante muitos anos os debates políticos e intelectuais sobre a distribuição da riqueza

se alicerçavam no preconceito, nos interesses de classe e na pobreza de fatos.

Mesmo sem uma estrutura teórica ou análises estatística, os escritores de suas épocas

conseguiam detalhar a estrutura da riqueza, padrões de vida e níveis de fortuna dos

diferentes grupos sociais revelando a estrutura profunda da desigualdade da época. Dois

exemplos excelentes são Austen e Honoré de Balzac. Os dois escritores possuíam

conhecimento íntimo da hierarquia da riqueza em suas sociedades – Londres e Paris,

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respectivamente. Os romancistas da época da Belle Époque desnudaram os meandros

da desigualdade como nenhuma análise ou estatística seria capaz de alcançar.

A questão é importante demais para ficar na mão somente de cientistas ou filósofos.

Banqueiro, operário, camponês, cada um tem uma visão distinta sobre a questão e

elabora sua própria concepção do que é justo e do que não é justo. Logo, sempre haverá

uma questão subjetiva sobre o tema e por isso, ele é tão delicado e sempre levará a

conflitos políticos que nenhuma análise política saberia atenuar. A democracia jamais

será suplantada pela república dos especialistas (ou pelos cabeças de planilha, como diria

o economista e jornalista Luiz Nassif)

Mas, de qualquer forma a questão merece ser estudada de forma sistemática e

metódica. Sem dados e métodos podemos dizer qualquer coisa e o seu oposto. E tudo

será verdade. Ou mentira. Para alguns a desigualdade será sempre crescente e o mundo

sempre injusto. Para outros, a desigualdade será sempre decrescente e a harmonia se

dará de forma natural. Em meio a este diálogo de surdos, entre conservadores

dogmáticos ou marxistas dogmáticos onde cada lado justifica sua preguiça de buscar

dados e métodos para sustentar suas afirmações, existe um papel a ser urgentemente

desempenhado por outros intelectuais com pesquisas honestas, sistemáticas e

metódicas, mas nunca totalmente científica pois o tema não o é. A pesquisa metódica

pode destruir os debates retóricos, conduzir melhor as políticas públicas, tornar os

debates mais produtivos e racionais.

Ora, não se pode negar que os estudos sobre a desigualdade da riqueza sempre foram

carentes de dados e se fundamentavam em poucos fatos sólidos, mas, sim, em muitas

especulações inspiradas na ideologia. Antes de mostrar as fontes deste trabalho vamos

traçar um panorama histórico das reflexões sobre esta questão tão bem contada por

Austen e Balzac.

2 Malthus, Young e a Revolução Francesa O crescimento demográfico da França, saltando de 20millhões de habitantes em 1700

para 30 milhões em 1790 motivaram análises conservadoras expressas em Malthus e

Arthur Young, um agronomista inglês. Dado suas origens, as análises de ambos, além de

carente de dados robustos, eram preconceituosas em muitos aspectos. Tanto para

Malthus quanto para Arthur Young, dois nobres intelectuais assustados com os rumos

da revolução francesa, achavam que o problema da distribuição da riqueza eram os

pobres e à medida que a população crescia, mais catastrófico seria o cenário. A solução

que eles propunham era afastar os plebeus das decisões políticas e conter radicalmente

a expansão demográfica.

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3 Ricardo – Princípio da Escassez Com o aumento da população, a lei da oferta e procura elevarão o preço das terras e dos

aluguéis das terras. Esta era a base do pensamento de David Ricardo. Para equilibrar a

desigualdade (a riqueza tende a ir para os donos da terra) ele propôs aumentar o

imposto do aluguel das terras. Suas ideias teriam grande fundamento se a tecnologia e

a revolução industrial não entrassem em cena algumas décadas depois. A terra seria um

bem raro e por isso o nome “princípio da escassez” em que se baseia todo seu trabalho.

4 Karl Marx – Princípio da Acumulação Infinita Piketty questiona os trabalhos de Marx.

1) Usou pouco os dados disponíveis na época para apoiar seu trabalho

2) O princípio da “acumulação infinita” não faria sentido, segundo Piketty.

Mas Marx dizia que antes do “infinito” haveria a revolução proletária. Difícil de saber quem teria

razão. O passado como laboratório pouco ajuda nesta questão devido aos tropeços da

humanidade com a primeira e segunda guerras mundiais.

5 De Marx para Kuznets ou o Apocalipse dos Contos de Fada Passando dos escritores apocalípticos vamos para os escritores que tinham uma atração

pelos contos de fadas. Kuznets é um representante clássico destes economistas.

Segundo a sua teoria, a desigualdade deveria diminuir automaticamente nos estágios

mais avançados do desenvolvimento capitalista de um país, a despeito das políticas

adotadas ou das diferenças entre países, até que se estabilizasse num nível aceitável. A

teoria de Kuznets foi elaborada após a segunda guerra influenciada pelos anos dourados

chamados de “trinta gloriosos” na França. Da mesma forma seguiu Robert Solov que em

1956 analisou as condições que levariam uma economia a alcançar a “trajetória do

crescimento equilibrado”. Tais visões eram uma antítese do que previam as teorias de

David Ricardo e Karl Marx. Estas teorias dos “contos de fada” influenciaram fortemente

todas as linhas conservadoras do século XX pós-guerra e ainda continuam, de certa

forma, influenciando.

Apesar de Kuznets ter se precipitado em conclusões muito genéricas influenciado pelo

ambiente de crescimento da época, ele fez o que Malthus, Ricardo e Marx não fizeram:

se baseou em muitas fontes de dados confiáveis para fazer suas análises. Kuznets, de

certa forma tinha razão: baseando em dados e estatísticas evidenciou os anos dourados

do pós-guerra apesar do equívoco de afirmar que a curva descendente da desigualdade

na época seria uma prova de que o sistema capitalista naturalmente levaria a uma

sociedade harmoniosa.

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6 A Curva de Kuznets: Boas Notícias em Tempos de Guerra Fria Segundo a teoria de Kuznets, a desigualdade de renda em qualquer lugar poderia ser

descrita como uma curva em forma de sino. Cresce de início, tem um pico e logo em

seguida entra em declínio quando os processos de industrialização e desenvolvimento

começam a fluir. A ideia é simples e quase ingênua. Kuznets se precipita - apesar de ele

próprio chamar a atenção para que não haja precipitação na interpretação dos dados

que ele coletou durante quase todo o século XX até 1953 – ao concluir que todo

capitalismo no início tende a concentrar renda pois poucos indivíduos estariam

preparados para se beneficiar efetivamente dos ganhos iniciais dos processos dos novos

meios de produção e mais à frente cai a concentração da riqueza pois muitos passam a

ter possibilidade de beneficiar do processo.

A teoria da “curva de Kuznets” foi formulada pelos motivos errados e o fundamento que

a sustenta é frágil. A queda da desigualdade de renda que se deu entre 1914 e 1945 é,

na verdade, consequência das guerras mundiais e dos violentos choques econômicos e

políticos que delas sobrevieram. Tem muito pouco a ver com os fatores de produção dos

setores econômicos descritos por ele.

7 Colocando a Questão da Distribuição de Volta no Coração da Análise Econômica Pensadores como Kuznets no meado do século XX atrasou o debate sobre a questão da

distribuição das riquezas. Só agora estamos nos conscientizando que o crescimento

mundial da economia não é harmônico e sem conflitos. O capitalismo, por mais que

tenha avançado alavancando tecnologias e conhecimentos, não nos levou a um período

de distribuição de riquezas e igualdades. Pelo contrário. Os economistas do século XIX

se encontravam em um ambiente bem semelhante de desigualdades de riquezas como

o que encontramos agora. A resposta que eles deram para a questão talvez não tenha

sido tão satisfatória, mas, pelo menos, fizeram as perguntas certas. Hoje, ainda, nem as

perguntas certas os economistas não se propuseram a fazer.

Não há motivo para acreditar que o crescimento tende a se equilibrar naturalmente.

Temos que urgentemente resgatar as questões do século XIX. Ao longo de várias décadas

o tema da distribuição foi negligenciado em parte, devido às conclusões otimistas de

Kuznets e dos novos pensadores atuais atraídos pelos modelos matemáticos

reducionistas conhecidos como “modelos de agente representativo”. Como a maioria das

áreas do conhecimento – climatologia, medicina, nutrição... – a economia também sofre viés

ideológico ao ser invadida pela plutocracia.

Para trazer a questão de volta é preciso reunir a base de dados histórica mais completa

possível a fim de compreender o passado e refletir sobre as tendências futuras. Somente

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assim poderemos ter a esperança de revelar os mecanismos em operação e

proporcionar um maior esclarecimento sobre o futuro.

Coincidência ou não, quando o mundo se encontrava em níveis tão desiguais quanto hoje, o

homem ao fugir deste indispensável debate, acabou mergulhando em duas guerras mundiais.

8 As Fontes de Dados Usadas Neste Livro O livro se baseia na técnica de Kuznets de análise evolutiva e histórica da renda, riqueza

e desigualdade. O autor destaca que os dados eram detalhados demais para os

historiadores e histórico demais para os economistas. Provavelmente Piketty e sua

equipe foram os primeiros a encarar e estudar com detalhes a evolução da riqueza,

renda e desigualdade desde os princípios da revolução francesa.

A fonte primária do livro é o WTID – World Top Incomes Database – o maior banco de

dados histórico sobre o assunto.

WITD se concentra na renda gerada pelo capital. Diversos esforços para obter

informações históricas sobre a renda vinda do trabalho foram feitos com incursões a

diversos autores.

Piketty destaca a importância de se estudar a relação entre capital/renda e estimar a

renda nacional anual com o total de riqueza de uma nação. Geralmente esta proporção

pode variar entre 3 e 8 vezes (mais ou menos).

O atual estudo leva vantagem sobre todos os anteriores sobre desigualdade pela

amplitude histórica dos dados analisados. Algo inédito nesta área.

9 Os Principais Resultados Deste Estudo Quais conclusões que Piketty tira deste seu estudo?

Primeira conclusão: não se pode em hipótese alguma confiar em argumentos

provenientes do determinismo econômico quando o assunto é distribuição da renda e

riqueza. Este assunto sempre foi e será político o que o impede de ser analisado com os

modelos dos plutocráticos e suas planilhas.

Segunda conclusão: toda distribuição de riqueza que ocorreu nos países desenvolvidos

durante o século passado não foi por fenômenos naturais de mercado ou do capitalismo,

mas antes de tudo, de políticas públicas adotadas devido às grandes guerras e os

choques econômicos advindos delas.

Terceira conclusão: a dinâmica da distribuição da riqueza sempre leva a duas forças

distintas. A primeira de convergência que faz com que a riqueza seja distribuída e a

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segunda força que faz com que a riqueza fique cada vez mais concentrada. E não existe

nenhum fator natural para impedir os fatores divergentes de atuarem. Ou o ser humano

se prepara para conter o horror do ciclo vicioso da concentração de renda ou partimos

para cenários cada vez mais obscuros.

Quarta conclusão: o crescimento do capital humano e o fim da luta de classes e o início

da luta de gerações.

O crescimento do capital humano seria a capacidade do trabalhador de influenciar mais

e mais no meio de produção fazendo com que isto force a distribuição de riquezas. Não

há evidência de que a participação do trabalho na renda nacional tenha aumentado de

modo substancial ao longo dos anos. Tanto esta hipótese como a ideia do fim da luta de

classes são duas grandes ilusões. O que se pode afirmar é que o capital é quase tão

indispensável hoje quanto foi nos séculos XVIII e XIX e talvez se torne mais indispensável

ainda no futuro.

10 Forças Divergentes e Convergentes Existem forças de divergência e convergências relacionadas à desigualdade. À medida

que o capitalismo avança, a tecnologia e o conhecimento passam a ter um papel

importante na diminuição das desigualdades. Mas Piketty afirma que este movimento

não é natural. Depende de fatores diversos como políticas públicas educacionais,

cultura, etc. Piketty irá analisar as forças de divergência mesmo em sociedades ditas

regulamentadas e mercadologicamente eficientes.

Duas curvas de desigualdades são apresentadas – são as curvas em U (figuras 1.1 e 1.2).

Na primeira, mostra a evolução dos 10% dos salários mais altos em relação à renda

nacional. Nota-se, como já dito, a participação menor dos “top decile” no período da 2ª.

guerra mundial com uma recuperação impressionante a partir da década de 80. A

segunda curva, semelhante à primeira refere-se à razão entre capital/renda na

Alemanha, França e Grã-Bretanha. Também, nota-se que entre 1940 e 1980, a razão

capital/renda foi menor que nas décadas subsequentes.

Destaca-se que a diferença descomunal entre os salários dos top decile sobre os

trabalhadores americanos é o principal fator de divergência da desigualdade.

11 O fator Fundamental da Divergência: r > g r = retorno do capital

g = taxa crescimento do país

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Esta relação carregará a lógica de todo o livro. Quanto maior o retorno do capital em

relação à taxa de crescimento maior será a desigualdade.

Se o retorno do capital excede muito a taxa de crescimento então, segue-se que a

riqueza herdada crescerá mais rapidamente que a produção e a renda.

12 Os Limites Históricos e Geográficos Deste Estudo O livro analisará a distribuição da riqueza desde o século XVII até os dias atuais. Se

concentrará, principalmente por limitações de fontes de dados, aos países França,

Inglaterra e Estados Unidos. Mas também, apresentará dados importantes da Alemanha,

Japão e alguns países emergentes.

A França será o país com análises mais detalhadas por dois motivos:

a) Riqueza de dados históricos graças, principalmente, à revolução francesa.

b) A população da França mudou muito pouco desde o século XVIII. Na revolução

francesa a população já alcançava 30 milhões de almas. Nos EUA, durante a

independência, a população era ainda de 3 milhões.

A dinâmica de distribuição da riqueza se comporta de forma distinta num país que

apenas dobrou sua população para um país em que a população cresceu 100 vezes!

Devido a este vertiginoso crescimento populacional dos EUA, a distribuição de riqueza

era mais justa até os idos de 1970 bem diferente da França onde a população apenas

duplicou em 200 anos. Por isto, o estudo da França nos trará conclusões mais acertadas

sobre o estudo do comportamento da distribuição da riqueza no mundo atual já que não

existem países com crescimento impressionante como ocorreu com os EUA – salvo

exceções em países da África.

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13 A Estrutura Teórica e Conceitual Piketty diz que pertence à geração que assistiu à queda do muro de Berlim. Não se

considera um esquerdista que nega o desastre da URSS nem um capitalista que acha que

as leis de mercado tudo resolve.

Quer dar uma modesta contribuição para encontrar a melhor maneira da sociedade se

organizar de forma a minimizar as desigualdades sociais. Faz uma diferenciação entre a

escola econômica americana – onde terminou seu doutorado aos 25 anos – e a escola

francesa. Na França, a escola econômica não goza do mesmo status que a escola dos

EUA. Mas na França, não existe tentativa arrogante de tentar fazer das ciências

econômicas uma verdadeira ciência. E mais que isto: uma ciência independente das

outras como é comum nas universidades dos EUA.

A escola francesa sabe os limites das ciências econômicas e entende que a relação com

as demais áreas – história, sociologia e política, é fundamental para a compreensão da

questão das riquezas e suas desigualdades.

Ele pede a paciência dos leitores que não têm muita intimidade com matemática, mas

muita preocupação e interesse pela questão da desigualdade mundial pois irá usar

algumas relações matemática não muito complexas para analisar a história de uma

forma diferente.

14 Esboço do Livro O Livro é dividido em 4 partes.

Parte I

Traz uma visão geral e conceitos de renda e capital

Parte II

Apresenta historicamente a relação entre Capital e renda.

Parte III

Disseca a estrutura da desigualdade principalmente nos EUA e Europa.

Parte IV

Apresenta sugestões para efetiva regulação do Capital no Século XXI

Parte I

Capítulo I

Apresenta os seguintes conceitos:

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a) Renda Nacional

b) Capital

c) Razão Capital / Renda

E fala de forma geral sobre a evolução da distribuição de renda e da produção.

Capítulo II

Fala de como o crescimento populacional evoluiu juntamente com a produção industrial

desde o início da revolução industrial.

Parte II

Capítulo III

Descreve sobre a metamorfose do capital a partir do século XVIII

Capítulo IV

Mostra casos dos EUA e da Alemanha – evolução da desigualdade, renda e crescimento

Capítulo V e VI

Estende as análises da desigualdade, renda e crescimento para todo o planeta.

Parte III

Capítulo VII

Atenta para a estrutura da desigualdade do ponto de vista do trabalho e do ponto de

vista da renda via capital.

Capítulo VIII

Analisa a dinâmica histórica da desigualdade descrita no capítulo anterior tomando por

base França e EUA.

Capítulo IX e X

Estende a análise para todos demais países com dados presentes no banco de dados

WTID.

Capítulo XI

Estuda a influência da riqueza via herança na estrutura da desigualdade.

Capítulo XII

Comenta sobre as perspectivas da distribuição global da riqueza no século XXI

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Parte IV

Capítulo XIII

Oferece caminhos para um “estado social” se enquadrar nas condições atuais e como

este estado seria.

Capítulo XIV

Propõe novas formas de taxação progressiva do capital.

Capítulo XV

Descreve mais detalhadamente como seria uma taxação progressiva do capital e outras

formas de impostos.

Capítulo XVI

Destaca as questões prementes relativa aos débitos públicos atuais.

O estudo do comportamento da renda, capital e trabalho desde a revolução francesa

apenas mostrou que o futuro do capital é totalmente imprevisível. O estudo do passado

ajuda a clarear e entender melhor o presente para que possamos construir o futuro.

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Parte 1 - Renda e Capital

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Capítulo 1 - Renda e Produção Acionistas de uma mina na África do Sul manda invadir uma mina. Trinta e um

trabalhadores morrem.

Motivo da greve: aumento salarial.

No coração do conflito capital/trabalho está a questão: qual o percentual da produção

deve ser direcionado ao trabalho e qual percentual para o Capital e lucro?

A história é repleta de rebeliões causadas pela desigualdade social: o latifundiário e o

lavrador, o dono da terra e o produtor que paga o aluguel, os donos dos meios de

produção e o trabalhador. Durante a revolução industrial os conflitos aumentaram talvez

pela maior riqueza gerada pois a produção à medida que se tornava mais dinâmica com

a participação maior do capital (máquinas e maior uso de recursos naturais) menos era

usufruída pelos trabalhadores.

Será que esses tipos de conflitos serão suavizados ou serão parte importante da

evolução histórica deste século?

Nas duas primeiras partes deste livro trataremos da desigualdade entre capital e

trabalho e não entraremos na questão das desigualdades no campo do trabalho (um

trabalhador comum e um executivo, por exemplo). Também é de fundamental

importância as diferenças salariais atuais mas deixaremos isto para mais adiante.

15 A Divisão Capital-Trabalho no Longo Prazo: Não Tão estável Tinha-se como verdade que a participação do trabalho na renda nacional sempre girou

em torno de 2/3 e a participação do Capital os outros 1/3. Mas, após a possibilidade de

acesso a um rico banco de dados sobre a riqueza desde o final do século XVIII, viu-se que

a coisa não é bem assim.

Esta divisão sofreu mudanças principalmente com a primeira e a segunda guerra

mundiais que acabou fazendo com que o capital tivesse uma menor participação no

crescimento econômico do que o trabalho. Mas, a partir da década de 80 com Margareth

Thatcher e Ronald Reagan, o capital começou a se recuperar e a desigualdade inicia sua

curva ascendente com perspectiva de chegar em 2020 em situação pior que a “Belle

Époque”.

Existe hoje uma ideia espalhada e tida como consenso de que o crescimento econômico

depende quase que exclusivamente do “capital humano”. À primeira vista, isto

significaria que o trabalho está, então, reivindicando uma maior participação na

produção e riqueza. Mas isto não é bem assim uma vez que a participação do capital

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(excluindo o “capital humano”) no século XXI é muito pouco maior do que a participação

do capital no início do século XX.

Mais uma vez é importante destacar que, diferentemente do que se pensa no mundo econômico,

o capital humano não teve um peso considerável no total da renda uma vez que a participação

do capital no início do século XXI é praticamente igual (um pouco superior) à sua participação no

início do século XIX.

A predominância do capital sobre o trabalho na atualidade nos países ricos se deve pelo baixo

crescimento populacional e de produtividade aliado a políticas que objetivamente favorecem o

capital privado.

As partes I e II irão tratar da divisão capital / trabalho e da razão capital / renda. Relação

esta que será o centro para entender toda a estrutura da desigualdade social.

16 A Ideia de Renda Nacional Renda Nacional: é a soma da renda de toda população residente de um país.

Está intimamente relacionado com o conceito de PIB que mede a quantidade de bens e

serviços produzidos em um dado ano no território de um país. A renda nacional é o PIB

subtraindo a depreciação dos ativos que tornam esta produção possível. O valor desta

depreciação é substancial e gira em torno de 10% do PIB.

A renda Nacional é, portanto, o produto interno bruto líquido somado a diferença entre

a renda que um país ganha vinda do exterior e a renda que o país transfere para outros

países no exterior:

Renda Nacional = PIB – 10%(depreciação) + (Renda entra do exterior – Renda sai para

exterior).

Importante perceber que a diferença do segundo termo desta equação leva a

desigualdades entre as nações que podem causar tensões políticas sérias. Geralmente,

este segundo termo é sempre positivo nos países ricos.

Mas a questão é que a desigualdade de renda interna nos países é bem mais séria que a

desigualdade entre os fluxos de renda líquida entre os países (apesar de existir também).

Mas é lenda dizer que os EUA pertencem aos bancos japoneses ou que a França pertence

aos fundos de pensão da Califórnia – são lendas urbanas.

17 O Que é Capital? Produção e renda = Renda de capital + Renda do trabalho.

Um parêntese. Reflexão sobre o que é o capital:

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Numa reflexão preliminar concluiria que capital poderia ser considerado como sendo trabalho

estocado ao longo do tempo e apropriado por quem já possuía o domínio sobre as pessoas que

forneciam sua força de trabalho. E como é estocado, pode ser transferido e perpetuado via

herança, mas sempre manchado pelo pecado original da usurpação.

Primeiramente, quando Piketty se refere a capital ao longo do livro, ele não considera

(apesar da maioria dos economistas infelizmente considerarem) o capital humano como

componente do próprio capital.

Capital seria então: somatório total de ativos não humanos que podem ser apropriados

e negociado no mercado.

Exemplos: residências, prédios, máquinas, infraestrutura, patentes, etc.).

Porque “capital humano” não pode ser tratado como Capital? Pelo fato de não poder ser

apropriado por alguém – a não ser nos regimes escravocratas do passado – ou mesmo

negociado no mercado (não permanentemente, pelo menos).

O conceito de capital, portanto, é variável na história da sociedade. Não é imutável pois

reflete o estado de desenvolvimento das relações sociais de cada época.

18 Capital e Riqueza Capital representa as riquezas acumuladas por seres humanos ao longo do tempo.

Dependendo do contexto podemos excluir bens naturais do conceito de capital. A terra,

os minerais e outros bens naturais são riquezas que, em determinado momento

podemos considerar parte de um dado capital e em outros momentos, apenas como

riqueza.

Riqueza Nacional = riqueza privada + riqueza pública.

Considerando que riqueza pública é praticamente zero na maioria dos países – ou

mesmo negativa (o débito público geralmente é maior que o crédito), conclui-se que a

riqueza privada é responsável por quase a totalidade da riqueza Nacional.

Capital Nacional = Riqueza Nacional = Capital doméstico + Capital exterior líquido

O capital estrangeiro no total é igual a zero globalmente. Este fator da fórmula pode ser

razoavelmente positivo ou negativo se considerarmos análises individuais de cada

nação.

19 Razão Capital / Renda Renda: é um fluxo. Corresponde à quantidade de bens produzidos e distribuídos em um

dado período.

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Capital: é estoque. Quantidade de riqueza possuída em um dado ponto no tempo.

A forma mais útil de medir o capital em um país é dividindo o estoque de riquezas pelo

fluxo anual da renda. À esta razão chamaremos de β.

A grandeza β não diz nada quando se fala em desigualdade exatamente pelo fato de

que as riquezas são mal distribuídas nacionalmente. Mas β irá nos dizer a importância

geral do capital para a realidade de um dado país sendo esta grandeza fundamental para

o estudo das desigualdades.

O objetivo principal da parte II do livro é entender porque e como β varia de país para

país e como tem evoluído no tempo.

O capital pode ser, a grosso modo, dividido em duas partes: Capital doméstico e Capital

profissional (empresas particulares e governo).

20 A Primeira Lei Fundamental do Capitalismo: α = r * β

r representa o retorno do capital e α corresponderia a participação do capital no total

da renda nacional.

Um cenário hipotético para exemplificar melhor:

Imaginemos um país-ilha fictício cuja população produz sandálias de fibra de folhas de palmeiras.

Para a fabricação das sandálias são necessários alguns ativos a saber: cadeira, suporte metálico

para trançar as fibras, tela para bater as folhas, cestos e caixas.

O valor desses ativos equivale a 6 vezes a quantidade de sandálias que a população consegue

produzir no ano. Isto significa que a quantidade de trabalho necessária para se produzir estes

ativos corresponde à quantidade de trabalho necessária para se produzir 6 anos de sandálias. Se

algum habitante empresta um cesto estocado que ele possuía para algum grupo de

trabalhadores, no final do ano este capitalista (afinal, podemos chamá-lo assim, pois possui um

cesto estocado fruto de trabalho no passado) continuará de posse do seu cesto – apesar de

emprestado e receberá uma quantidade de sandálias equivalente a 5% do valor do seu cesto. E

qual seria, então a participação de todo o capital na renda da ilha? Ora, é uma simples expressão

tautológica:

α = r * β

α = 5% * 600% = 30%.

Isto é, todo ativo da ilha: cestos, cadeiras, etc, contribuem com 30% para formação de toda a

renda produzida em 1 ano.

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Os 30% do exemplo acima coincidem com a média da participação do capital em países ricos no

ano de 2010.

Apesar da fórmula ser tautológica, podemos considerá-la a primeira regra fundamental

do capitalismo por envolver as três grandezas mais importantes do sistema capitalista a

saber:

A razão capital / renda, a participação do capital na produção e a taxa de retorno do

capital.

A fórmula fundamental nos leva à segunda lei fundamental do capitalismo: quanto maior

a taxa de poupança e menor a taxa de retorno, maior será a razão capital / renda.

Isto fica lógico quando nos lembramos do exemplo das sandálias da ilha. Quanto mais cadeiras,

telas, etc, um morador da ilha conseguir guardar, e quanto menor for o crescimento do total de

produção de sandálias na ilha, maior será o capital em relação à produção de sandálias.

21 Contas Nacionais: Uma Construção Social em Evolução Desde meados do século XVII já se nota tentativas tímidas de países europeus em medir

suas riquezas nacionais. A partir do final da segunda guerra mundial os países passaram

a medir anualmente a renda nacional – PIB ou GDP. Uma das motivações para este

esforço e preocupação foram as consequências devastadoras da depressão de 1931.

Conclui-se que as contas dos estados sofrem evoluções constantes. Os números nunca

foram e nunca serão perfeitos. São sempre estimativas que vão melhorando com o

tempo, principalmente com o advento da informática. Os dados que são oferecidos

pelos governos sempre apresentam falhas que devem ser percebidas e complementadas

com outras fontes e análises.

É importante destacar que os indicadores governamentais estão relacionados com

médias e totais absolutos e nunca com índices que medem desigualdades sociais ou

distribuição de renda entre os grupos da sociedade.

22 A Distribuição Global da Produção No início do século XIX os índices de distribuição da produção já eram bem conhecidos.

De 1900 a 1980, 70-80% da produção de bens e serviços estavam concentrados na

Europa e América.

A partir de 2010, a participação do PIB dessas duas regiões declinou para 50%. E, em

algum ponto deste século, talvez, a participação deva cair para 20-30%.

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Jandui Tupinambás 18

Observa-se que as curvas do PIB per capita entre as regiões América/Europa e o resto

do mundo estão em caminho de colisão (cacth-up da curva oriental) e é difícil de se fazer

uma previsão de quando elas se colidirão, se é que isto realmente irá ocorrer no futuro

dado as incertezas da economia principalmente as dificuldades de se analisar a

economia da China.

23 De Blocos Continentais Para Blocos Regionais No tópico anterior fizemos uma divisão continental. Mas, para expressar melhor a

realidade dos desníveis das riquezas e PIB é melhor que separemos o mundo em regiões

e não continentes. Todos os continentes possuem diferenças internas significantes. Na

América são dois mundos distintos. O Norte representado por Canadá e EUA e um

mundo pobre representado pelos demais que estão abaixo dos EUA até o Chile. O Norte

com uma renda per capita de 40.000 Euros e o Sul com uma renda de 10.000 euros bem

semelhante à média mundial.

Em 2012 a renda per capita mundial girava em torno de 760 euros / mês o que nos dá

9.120 euros / ano.

A própria Europa mostra suas desigualdades. Os países do oeste europeu, entre eles

Espanha, França, Itália, Alemanha e Inglaterra, possuem renda per capita de 31.000

Euros e 410 milhões de habitantes. Os restantes do Leste (não considerando Rússia e

Ucrânia) somam 130 milhões de habitantes com uma renda per capita de 16.000 Euros.

África é a região mais pobre do mundo com uma renda per capta de apenas 2.000 Euros.

Na Ásia, apesar do Japão sustentar uma renda per capita semelhante à dos países ricos,

pouco influencia no geral da Ásia pois sua população é pequena em relação ao total da

Ásia.

24 Desigualdade Global: de 150 a 3.000 Euros por Mês A renda per capita varia de 150 a 3.000 euros por mês ao redor do mundo. A renda média

mundial está entre 600-800 euros por mês – coincidindo com a renda média per capita

chinesa.

Mas todo cuidado é pouco para analisar dados sobre desigualdades. A dificuldade de

obtenção de dados confiáveis sobre desigualdades internas em cada país é sempre maior

do que da obtenção de dados entre países.

Para se fazer análises de desigualdades entre países Piketty usa o indicador “poder de

compra por paridade”. Indicador administrado pela instituição ICP – International

Comparison Program que compara o poder de compra entre moedas. Tal indicador é

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Jandui Tupinambás 19

mais constante e confiável do que o fator universal de conversão das moedas dado a

dependência deste último indicador às políticas econômicas de cada país.

Apesar de garantir um indicador mais estável, o ICP afirma, mesmo assim, que existe um

grau de incerteza sobre o índice “poder de compra por paridade” de até 10%.

25 A Distribuição Global da Renda é Mais Desigual do Que o PIB Entre os Países Isto fica claro quando se percebe que os fluxos de renda entre os países são discrepantes.

Geralmente os países com PIB maior geram renda fora de suas fronteiras. Parte do PIB

dos países mais pobres são direcionados para os países mais ricos.

De qualquer forma, a diferença desses fluxos de riquezas entre países impacta pouco.

EUA e Grã-Bretanha o impacto é de 1 a 2%. No Japão e Alemanha varia de 2 a 3%.

O continente que mais sofre com este desequilíbrio é a África onde o total produzido

(PIB – 10% de depreciação) é 5% maior do que a renda do continente.

Antes da primeira guerra mundial, a situação era pior: os grandes da Europa detinham

de 1 terço a 1 quarto da produção da África e Ásia e três quartos de todo capital

industrial.

26 Quais Forças Favorecem a Convergência? Convergência: ricos se tornando menos ricos e pobres se tornando menos pobres.

Existe a teoria que diz que o investimento de países ricos nos territórios dos países

pobres, apesar do lucro ser enviado de volta, pode diminuir o gap das desigualdades pois

afinal, o capital investido melhora a produtividade dos países que recebem o

investimento.

No entanto, esta teoria tem dois grandes problemas.

Primeiro:

A convergência de produção per capita (crescimento do PIB nos países pobres graças ao

investimento feito pelos países ricos) não significa convergência de renda per capita.

Comparemos a taxa de retorno do capital que os países pobres devem pagar aos países

ricos com a taxa de crescimento do PIB dos países ricos e pobres.

Segundo:

A ascensão dos países asiáticos nos últimos 20 anos não se deveu aos investimentos dos

países ricos e sim, aos investimentos feitos por eles próprios tanto em capital físico

quanto em capital humano. Da mesma forma, países pobres dominados pelos ricos,

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 20

tanto na época da colonização quanto os países da África hoje, não tiveram e não têm

atualmente perspectiva de convergências.

Resumindo, o que contribui para a convergência é a difusão do conhecimento suportado

por governos legítimos e eficientes.

Capítulo 2 – Crescimento: Ilusões e Realidades O ponto central desta sessão é a tendência de baixo crescimento do PIB de todos os

países do mundo e a perspectiva seria do crescimento continuar em baixos níveis

durante todo o século XXI.

Importante destacar que crescimento do PIB envolve dois componentes:

a) Crescimento populacional

b) Crescimento puramente econômico

Somente o último componente envolve elevação no nível do padrão de vida da

população. Os debates públicos muitas vezes desconsideram o primeiro componente

pois assumem que o crescimento populacional não mais existe o que é uma falsidade,

pelo contrário. Mundialmente, a população mundial cresce em torno de 1% enquanto o

crescimento mundial do PIB está em 3% ou um pouco superior a isto. Logo, o

crescimento per capita estaria um pouco acima de 2%.

27 O Crescimento mundial ao longo dos tempos Antes de analisar as tendências de crescimento atuais, vamos nos debruçar no

crescimento da produção mundial a partir da revolução industrial.

Observa-se que o mundo antes da revolução industrial praticamente não crescia se

considerarmos que o aumento da população crescia a taxas iguais ao aumento da

produção. A partir da revolução industrial inicia-se um crescimento tímido de 0.1%. É

importante destacar que, diferente do que os debates costumam propagar em que

afirmam que 1% de crescimento seria desprezível, na verdade, ao longo de grandes

períodos no tempo, 1% é na verdade um crescimento considerável.

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28 A Lei do Crescimento Cumulativo O crescimento populacional mundial cresceu numa média anual de 0.8% ao ano entre

1700 e 2012. Isto, portanto, dá um crescimento vertiginoso em 3 séculos de 10 vezes.

De 600 milhões de habitantes em 1700 pulou para 7 bilhões em 2012. Neste ritmo, em

2300 teremos uma população girando em torno de 70 bilhões.

Portanto, é importante destacar que crescimento de produção ou de população de 1%

é algo imperceptível em 1 ano, mas é o suficiente para mudar completamente a

estrutura e o perfil de uma nação ou sociedade se este crescimento de 1% for constante

durante 30 anos, por exemplo.

Da mesma forma podemos dizer do retorno do capital. 1% ou o mais comum, 5% ao ano

pode não parecer um retorno significativo, mas ao longo de um período de 20 ou 30

anos significa um aumento assustador no capital do investidor.

A tese centra do livro é precisamente que o aparentemente gap entre o retorno do

capital e a taxa de crescimento pode a longo prazo desestabilizar e causar efeitos

devastadores na estrutura e dinâmica da desigualdade social.

Os valores acumulados do retorno do capital não deveriam ser usados para acumular mais

capital e sim, serem usados para aumentar a produção mundial de forma que a taxa de

crescimento não fique abaixo do retorno do capital. Isto deveria ser uma regra humanitária

patrocinada e difundida mundialmente pela ONU.

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29 Os Estágios do Crescimento Demográfico As taxas de crescimento populacional do planeta a partir do ano 0 até 1700 eram bem

tímidas comparadas com as taxas após a revolução industrial. Estima-se que a população

mundial cresceu 25% entre os anos 0 e 1000 e 50% entre os anos 1000 e 1500. De 1500

a 1700 o crescimento foi de 50% novamente. A partir de 1700 tivemos uma taxa de

crescimento de 0.4% ao ano no século 18 e 0.6% no século 19. A Europa experimentou

seu maior crescimento populacional no período de 1820 a 1913 que girou em torno de

0,8% ao ano. De 1913 a 2012 a taxa caiu pela metade chegando a 0.4%

Previsões da ONU indicam crescimento mundial de 0.4% de 2012 a 2030 caindo para

0.1% de 2030 a 2070. Lembrando que a América tem taxa prevista de 0% de crescimento,

Ásia e Europa com índices provavelmente negativos de 0.2% e 0.1% respectivamente. A

taxa geral de 0.1% de crescimento deve-se a previsão populacional da África com taxa

anual de 1%.

Evidente que são apenas previsões imprecisas pois elas dependem da taxa de fertilidade,

expectativa de vida e evolução das políticas socioeconômicas.

30 Crescimento Demográfico Negativo? A tendência de reversão do crescimento populacional é bem clara quando se compara a

Europa Ocidental com a América do Norte. Em 1780 a Europa Ocidental já ultrapassava

100 milhões de habitantes enquanto a América do Norte tinha quase 3 milhões. Em 2010

Europa Ocidental chegou a 410 milhões e a América já alcançou 350 milhões. A ONU

prevê a América com uma população ultrapassando a Europa Ocidental já em 2050.

A explicação para esta reversão não é simples. Por que a taxa de fertilidade da Europa é

menor? As políticas de proteção social não podem ser a explicação uma vez que, por lá

na América, elas praticamente não existem.

Talvez a explicação seja uma mistura de história e cultura. Talvez resta ainda na mente

dos americanos a imagem da terra prometida onde eles ainda vislumbram um futuro

sempre melhor para seus filhos. De qualquer forma, mesmo na América do Norte, a taxa

de crescimento demográfico também está caindo. Muitos fenômenos podem ocorrer

num futuro próximo como o aumento de imigração entre os dois continentes, a taxa de

fertilidade aumentar na Europa ou mesmo a expectativa de vida na América não evoluir

na mesma proporção que na Europa. Portanto, estas previsões da ONU são somente

previsões.

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Outro país que reverteu a taxa de crescimento populacional foi a China que a partir de

1970 com a política de filho único conseguiu estabilizar sua taxa de fertilidade. A previsão

da ONU é de que a Índia a ultrapasse já no ano de 2020.

Assim, mesmo com as previsões de reversão de crescimento populacional, não é exagero

os números da ONU, pelo contrário. Mesmo com possíveis pequenas variações, a

tendência de o mundo chegar a uma população de 70 bilhões em 2300 se a taxa de

crescimento continuasse em 0.8% ao ano, não é uma previsão plausível. A ONU

considera que a média de crescimento de 2012 até 2300 não ultrapasse 0.1% ou 0.2%

ao ano. Isto nos daria uma população variando entre 9 a 13 bilhões de habitantes.

31 Crescimento como um fator de Equalização Prever taxas de crescimento demográfico não é a tarefa central do livro, mas é um fator

importante para avaliar a distribuição de riquezas.

Uma taxa de crescimento alta tende a diminuir as desigualdades uma vez que diminui o

peso da herança sobre o total das riquezas e capital acumulado.

Da mesma forma, se a taxa de crescimento populacional é negativa ou mesmo se a taxa

de crescimento econômico também for negativa, a influência do capital é maior. Neste

cenário, caímos no problema já destacado mais no início onde a taxa de retorno do

capital se torna maior que a taxa de crescimento econômico contribuindo para aumento

das desigualdades.

O crescimento populacional também pode contribuir para uma maior mobilidade social

resultando em diminuição das desigualdades uma vez que a transferência de pai para

filho das funções exige a inclusão de novos agentes estranhos à família.

32 Os Estágios do Crescimento Econômico A média do crescimento econômico entre 1700 e 2012 foi igual à média do crescimento

populacional: 0.8%. Em três séculos, a produção mundial cresceu 10 vezes. A renda per

capita em 1700 girava em torno de 70 euros e em 2012, 760 euros.

Grande parte do crescimento econômico deve-se ao século XX onde a média foi de 1.6%

por ano com o século XIX ficando com 0.9% e o século XVIII com apenas 0.1%.

Medir crescimento per capita é uma tarefa bem mais complexa do que medir

crescimento populacional. O poder de compra passa a ser um indicador relativo

dependente dos costumes e cultura da época. A cesta básica do século XVIII por exemplo

não pode ser comparada com a cesta básica atual que engloba serviços nem existentes

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à época e diversos outros produtos manufaturados que não eram essenciais ou nem

mesmo existiam.

Piketty neste tópico apenas chama a atenção para se ter cuidado ao tentar comparar

poder de compra de antigamente com o poder de compra das sociedades atuais.

Se a população cresceu com taxas iguais ao crescimento da produção nos 3 últimos séculos,

significa que o homem não conseguiu aumentar sua produtividade neste período. Mas,

importante dizer que nos dois primeiros séculos houve um retrocesso na produtividade e o século

XX, graças, talvez às novas tecnologias, conseguiu reverter e recuperar este atraso.

33 O que Significa um Aumento de 10 vezes no Poder de Compra? 1. Produtos industriais manufaturados – setor secundário

2. Produtos agrícolas – setor primário

3. Serviços – setor terciário

Os preços do primeiro grupo caíram bem acima da média devido aos avanços acentuados da tecnologia na área trazendo mais produtividade ao setor.

O segundo grupo – agrícola – caiu no mesmo nível da média geral dos preços.

Apenas no grupo de serviços podemos detectar baixa produtividade em relação aos tempos mais remotos ou mesmo taxa de crescimento de produtividade próxima de zero.

As mudanças de hábitos de consumo a partir da revolução industrial foram tão grandes que tentar medir e comparar o poder de compra entre gerações desde os meados do século XIX são tentativas fúteis e reducionistas.

De qualquer maneira, os avanços tecnológicos possibilitaram à boa parte da população mundial acesso a mais alimentos, serviços e produtos industriais diversos.

34 Crescimento: Uma Diversificação do Estilo de Vida Em relação ao custo de vida relacionado com serviços, o livro lança mão de um exemplo interessante: o valor de 1 hora de trabalho de um típico trabalhador atual consegue comprar a mesma quantidade de cortes de cabelo que 1 hora de trabalho de um típico trabalhador de 100 anos atrás. O poder de compra desse tipo de serviço permaneceu inalterado.

De qualquer forma, a classificação do mercado de trabalho em primário, secundário e terciário fazia mais sentido no meio do século passado quando a divisão entre os três setores era similar (32%, 33% e 35% - primário, secundário e terciário respectivamente na França). Hoje, a divisão na França é a seguinte:

3% primário, 21% secundário e 76% terciário.

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Portanto, é imprescindível para não comprometer análises, subdividir o setor de serviços em subsetores:

Saúde e Educação – 20% ou mais

Hotéis, cafés, restaurantes, bares, Cultura e Lazer – 20%

Consultoria, projetos, TI, Financeiras, Bancos e Transportes – 20%

Órgãos públicos - 10%

No caso de serviços relacionados com saúde e educação, parte são custeados via

impostos e de livre utilização variando de país para país. Nos EUA e Japão, por exemplo,

o custo com educação e saúde é bem menos subsidiado pelo estado em relação aos

países europeus, por exemplo. Estas variações dificultam ainda mais quando se tenta

fazer comparações entre padrão de vida entre os países.

O livro chama a atenção para o fato de que não existe uma concordância com relação em sumarizar os serviços públicos de saúde e educação no cômpito geral do PIB. Na visão de Piketty é claro que este valor deve ser somado. Caso não fosse, se um país opte em diminuir seus serviços de saúde e educação privatizando parte desses setores (o Brasil

corre este risco com o programa “Ponte para o Futuro” do governo Michel Temer), ele automaticamente estaria aumentando artificialmente o PIB do país.

Sem sombras de dúvidas, o crescimento econômico entre 1700 e 2012 trouxe um grande avanço no padrão de vida das pessoas na ordem de 10 vezes – de 76 euros por mês para 760 euros/mês. Se considerarmos somente os países ricos, este salto foi mais que 20 vezes.

35 O Fim do Crescimento? Será que o espetacular aumento da renda per capita entre 1700 e 2012 enfim chegou ao

fim neste século XXI? Será que estamos vivenciando o início de períodos de crescimento

zero por problemas tecnológicos ou ecológicos ou por ambos os motivos?

Antes de continuar, é muito importante destacar que nunca existiu na história da

humanidade crescimento acima de 1.5% por períodos longos. Os analistas que

reivindicam que crescimento abaixo de 3% não seria um crescimento que mereça

destaque, estão enganados e esqueceram de estudar a história econômica mundial.

Com estas considerações, o que poderemos dizer das futuras taxas de crescimento? De

acordo com alguns economistas como Robert Gordon, a tendência das taxas de

crescimento não devem ultrapassar 0.5% até 2100. Suas análises se baseiam nas ondas

de inovações que ocorreram durante a história da humanidade a partir da revolução

industrial. A máquina a vapor e a introdução da eletricidade nos meios de produção

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Jandui Tupinambás 26

trouxeram uma ruptura revolucionário na sociedade impactando enormemente a

produtividade. Já as novas ondas de avanços e inovações tecnológicas – como a

introdução da informática – não tiveram o mesmo potencial de ruptura não trazendo

tantas melhorias na produtividade.

Prever taxas de crescimento é tão difícil quanto prever taxa de crescimento

populacional. O que será tentado neste trabalho é desenhar alguns cenários

relacionados com a dinâmica da distribuição de riquezas. Para tanto, não iremos

considerar previsões otimistas de crescimento de renda nem nos basear nas previsões

de Robert Gordon (0.5% até 2100). Mas para termos um cenário palpável

consideraremos uma taxa de crescimento do PIB na ordem de 1.2% até 2100. E mesmo

assim, para isto se concretizar, teremos que ter avanços tecnológicos que permitam que

fontes de energias alternativas já estejam preparadas para substituição da energia

convencional dos hidrocarbonetos. E este, é apenas um cenário dentre vários possíveis.

Há controvérsias em relação aos hidrocarbonetos. Além da teoria ser fraca de que sejam uma

ameaça ao meio ambiente, não se sabe exatamente qual seria o estoque de petróleo ainda não

descoberto.

36 Um Crescimento de 1% Implica em Mudanças Sociais Importantes É sempre bom destacar que prever taxas de crescimentos a longo prazo não é mais

importante do que perceber que 1% de crescimento per capita anual é, na verdade, um

crescimento extremamente rápido, mais rápido do que muitos economistas e

debatedores espalhados pelo mundo imaginam.

Piketty descreve as mudanças profundas nos países como EUA, Japão e Europa nos

últimos 30 anos onde o crescimento médio foi de 1 a 1.5% ao ano.

Uma sociedade com crescimento de 0.1 a 0.2% ao ano se reproduz e se repete sem

modificações significativas em suas estruturas socioeconômicas. Já sociedades com

crescimento a longo prazo de 1 a 1.5% sofrem profundas e constantes alterações.

Mas estas alterações não dizem respeito a uma melhor distribuição das riquezas. Pelo

contrário caso não sejam criadas instituições e políticas para conter a concentração. As

forças invisíveis do mercado ou mesmo as novas tecnologias não irão de forma alguma

fazer este papel distributivo.

37 A Posteridade do Período Pós-Guerra: Entrelaçando Destinos Além-Mar Os EUA sentiram menos os impactos da primeira e segunda guerras mundiais. Diferente

da Europa, principalmente a Europa Ocidental que experimentou os “30 Gloriosos –

Trente Glourieses” – período de 1940 a 1970 onde viveram com um crescimento per

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capita de 4%. No caso dos EUA o crescimento até 1950 foi constante e um pouco acima

do crescimento europeu e no intervalo dos Trente Glourieses, o crescimento não foi tão

espetacular quanto o crescimento da Europa. Após estes anos dourados, tanto Europa

quanto EUA experimentaram uma curva descendente no crescimento onde Europa

partiu de 4% chegando a 1.5% em 2012 e EUA de 2.5% para um pouco menos que 1.5%.

O crescimento percebido na Europa Ocidental seria ainda mais acentuado se

retirássemos os dados de crescimento da Inglaterra que se comportou de forma mais

semelhante aos EUA do que a própria Europa.

Importante dizer que os 30 gloriosos foram marcados por uma presença forte do estado

sobre a economia dos países europeus. Muitos analistas consideram que o inicio do

liberalismo nos anos 80 foi o causador do fim destes anos gloriosos.

Os países de língua inglesa (EUA e Inglaterra), no período de 1950 e 1980 viram seus

rivais – Alemanha, França, Japão e até Itália (Piketty não cita URSS, mas creio que também

pode entrar na lista) experimentaram crescimento maiores que os deles. Ao invés de

perceberem que o crescimento a menor poderia ter sido pelo motivo da pouca

interferência do estado na economia, a reação foi inversa. Margareth Thatcher e Ronald

Reagan radicalizaram e promoveram ainda mais o liberalismo na economia. Até hoje,

muitos ainda acham que esta atitude teria sido a correta uma vez que hoje as taxas de

crescimento de todos estes países se igualaram.

Na verdade, nem a intervenção do estado na economia seria a razão da glória e nem o

liberalismo seria a razão do desastre. Piketty desconfia que talvez, os países de língua

não inglesa ao chegarem no limite da fronteira tecnológica dos EUA e Inglaterra,

igualaram suas taxas de crescimento.

38 As Duas Curvas de Gauss do Crescimento Global Tanto o crescimento global da população quanto o crescimento per capita da riqueza

nos últimos 3 séculos desenham uma curva em forma de sino (curva de Gauss).

Mas as duas curvas se distinguem. O crescimento populacional iniciou sua ascendência

antes da curva da riqueza e o mesmo se pode dizer em relação ao momento em que as

duas começaram a sua descendência: o crescimento populacional desacelerou-se bem

primeiro.

O pico do crescimento populacional se deu entre 1950-1970 aproximadamente 2% ao

ano.

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Enquanto o crescimento populacional iniciava sua ascendência, o crescimento per capita

da renda ficou adormecido por 100 anos. Iniciou timidamente sua decolagem no século

XIX e só atingiu picos semelhantes e até maiores que 2% somente no século XX. Os

percentuais entre 1950 e 2012 atingiram níveis acima do crescimento populacional

graças à recuperação econômica da Europa e posteriormente da Ásia principalmente da

China que chegou a crescer 9% ao ano – algo nunca alcançado antes na história da

humanidade. Num cenário um pouco mais otimista que o cenário descrito por Robert

Gordon, Piketty prevê crescimento de até 3.5% até 2030, 3% até 2050 e depois,

estabilização em torno de 1.5% até o final do século XXI. Logicamente que são somente

previsões ligeiramente otimistas, mas factíveis. Previsões mais pessimistas são, é claro,

possíveis.

39 A Questão da Inflação A análise do crescimento excepcional a partir da revolução industrial ficaria

comprometido se não falássemos sobre a inflação. Todos os indicadores econômicos

usados para análise de renda per capita ou qualquer outra analise relacionada à renda

sofrem influência da inflação. A inflação a cada época é expurgada dos índices antes de

serem apresentados. Entretanto, ela gera um certo ruído, uma vez que não é tão simples

dimensionarmos valores reais com moedas pois a todo momento os mesmos estão

contaminados pela inflação que nem sempre pode ser detectada com precisão

milimétrica.

A inflação também é um fator que influencia na distribuição de riquezas tanto

concentrando quanto fazendo o papel de convergência (ver Sessão 10 – Fatores

Divergentes e Convergentes). No caso do pós-guerra, por exemplo, a inflação foi um

fator importantíssimo para diminuir os vultosos débitos das contas públicas

principalmente na Europa.

40 A Enorme Estabilidade Monetária dos Séculos XVIII e XIX Nesta sessão Piketty descreve sobre as moedas da França, Inglaterra e EUA desde a

revolução Francesa mostrando a incrível estabilidade interna e também, a estabilidade

das paridades entre elas até o alvorecer da primeira guerra mundial concluindo que o

fenômeno da inflação é típico do século XX e XXI.

41 O Significado do Dinheiro na Literatura Clássica Piketty usa exemplos de clássicos da Literatura como Jane Austen (1775-1817) ou Honre

de Balzac (1799 – 1850) para mostrar a estabilidade das moedas. Nesta época os autores

usavam a renda dos personagens representada em moedas correntes para situá-los

socialmente. Observa-se que os valores são praticamente os mesmos durante todo o

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século XIX e início da primeira guerra mundial. Tais exemplos podem também ser

encontrados nos EUA, Itália e em várias outras nacionalidades de autores além dos

autores da Inglaterra e França já citados.

42 A Perda das Relações Monetárias no Século XX Devido à primeira e segunda guerra mundiais, a estabilidade das moedas de todos países

ocidentais foi destruída. Os romances simplesmente pararam de tomar como referência

os valores monetários dado sua variabilidade com o advento da inflação. A paridade com

o ouro sucumbiu em 1914, voltou em 1920, com a crise de 1930 desapareceu

novamente. Viram que tal paridade trazia maior confiabilidade e retornaram com a

paridade em 1946 permanecendo até 1970. Após isto, a ruptura final aconteceu e a

paridade com o ouro desapareceu completamente nascendo a era do dólar. Tal ruptura

não se deu somente no mundo da economia, mas ocorreu também no mundo cultural,

social e na literatura.

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Parte 2 – A Dinâmica da Razão

Capital/Renda

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Capítulo 3 – A Metamorfose do Capital A parte II do livro tratará do Capital e a razão entre Capital / Renda além das diferentes

formas que o Capital pode se apresentar.

Relembrando minha reflexão sobre o Capital: trabalho estocado ao longo do tempo em forma de

riquezas e apropriado por quem já possuía o domínio sobre as pessoas que forneciam sua força

de trabalho. E, se estocado, pode ser perpetuado e transferido via herança. O capital, portanto,

sempre trará a mancha do pecado original da usurpação.

Observação: da mesma forma que as relações sociais mudam, que as pessoas passam a ver a

vida de formas diferentes, que os hominídeos um dia se libertaram dos altos galhos das árvores

e buscou o chão ou que a larva se transforma em uma borboleta, meu conceito sobre o Capital

provavelmente também irá evoluir principalmente após ler o livro presenteado pelo meu irmão:

O Capital de Karl Marx.

O Capital apresentou formas diferentes de se manifestar desde o século XVIII. Ele pode

ser observado de várias formas: terras, máquinas, firmas, estoque, patentes, pecuária,

ouro, recursos naturais, etc.

As análises se concentrarão na Grã-Bretanha e França por possuírem informações

históricas abundantes. Piketty inicialmente usará a literatura para ilustrar e introduzir a

questão da riqueza.

43 A Natureza da Riqueza: da Literatura para a Realidade O estudo usa os romances do século XIX de Balzac e Jane Austen para mostrar as formas

que o capital tomava antigamente e como o mesmo gerava riqueza e renda. Com a

leitura dos romances da época pode-se perceber que o capital, apesar de sua estrutura

ter mudado, sua função permanece a mesma: gerador de renda e, por tabela, caso o

retorno do rendimento se encontre acima da taxa de crescimento no período, gerador

também, de desigualdades. E, comparando as formas de desigualdades sociais nos

romances com os dias de hoje, é feito um questionamento: a forma que tomou o capital

atual é mais dinâmico e menos danoso ou menos “avarento” que o capital de

antigamente?

44 A Metamorfose do Capital na Grã-Bretanha e França O valor total do capital tanto na França quanto na Inglaterra nos séculos XVIII e XIX e até

o início da primeira guerra mundial era 6 ou 7 vezes maior que o total da renda anual

desses dois países. Com o início da primeira grande guerra, a depressão de 1930 e ainda,

a segunda guerra mundial, esta relação caiu fazendo o valor total do capital ser no

máximo 3 vezes a renda anual. Após a segunda guerra mundial o capital inicia

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Jandui Tupinambás 32

novamente sua recuperação chegando em 2010 com vigor semelhante aos séculos XVIII

e XIX.

Reflexão: o que significaria capital de uma nação cair de 6 ou 7 vezes a sua renda anual para

somente 3 vezes? Voltemos ao nosso exemplo do país-ilha (Sessão 19 – Razão Capital / Renda).

Para que a quantidade de capital da ilha (cadeira, suporte metálico para trançar as fibras, tela

para bater as folhas, cestos e caixas) caia para 3 vezes o valor da produção de sandálias de 1

ano, significa que em um dado período, estes ativos foram usados para produção de sandálias e

a quantidade acrescentada de renda, dado a inclusão desses ativos no processo de produção,

não retornou para o capitalista para acumular mais ativos e sim, usado e sumarizado na própria

renda da ilha trazendo, como consequência, maior distribuição de riquezas diminuindo as

desigualdades entre os nativos.

Apesar da relação capital/renda ter voltado aos tempos antigos, não podemos deixar de

destacar que sua estrutura mudou completamente. Se antes, a terra tinha uma

participação majoritária no total do capital, após a revolução industrial e os avanços

tecnológicos, a terra passou a ter uma participação irrisória chegando a valores incríveis

abaixo de 5% do valor total do capital.

45 A Ascensão e Queda do Capital Estrangeiro Chama-se de capital estrangeiro a soma de todas as riquezas do país em domínios

estrangeiros subtraído das riquezas de outros países no seu próprio solo.

A partir de 1800 a Inglaterra aumentou significativamente suas posses com sua política

de colonização. Até o início da primeira guerra a Inglaterra possuía capital estrangeiro

equivalente a 3 vezes sua renda nacional anual. O mesmo pode ser dito para a França

apesar da França possuir na época bem menos riquezas internacionais que a Inglaterra.

Nesta posição confortável, tanto a Inglaterra quanto a França podiam manter uma

balança comercial negativa. Consumiam mais do que exportavam. Os demais países do

mundo trabalhavam para eles consumirem sem haver problemas de déficit uma vez que

as riquezas internacionais compensavam a balança comercial. Com o fim da segunda

guerra mundial estas riquezas originadas do colonialismo praticamente desapareceram.

Hoje, podemos dizer que a riqueza internacional líquida exerce influência quase zero na

estrutura do capital das nações.

46 Renda e Riqueza: Algumas Ordens de Grandeza Piketty faz comparações da estrutura de riquezas entre os séculos XVIII/XIX com a

atualidade mostrando o deslocamento natural das riquezas que migraram da terra para

outros tipos de capitais (imobiliário, máquinas, etc.). Piketty mostra que apesar da

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estrutura do capital ter se transformado totalmente, a renda nacional se preservou na

mesma proporção que o capital nacional.

47 Riqueza Pública, Riqueza Privada Antes de analisar as razões do ressurgimento do Capital no século XXI, é importante

distinguir entre Capital Privado e Capital Público. Lembrando que tanto capital privado

ou público é a resultante entre os ativos e passivos de cada um. Isto é, ao se falar de

Capital Público ou Privado, falamos de Capital Líquido.

Para Capital Público separamos em Capital de ativos e Capital financeiro. Estima-se que

atualmente o capital público de ativos da Inglaterra gira em torno de 1 ano da renda

nacional. Na França seria 1 ano e 6 meses.

Considerando que os dois países possuem débitos na ordem de 1 ano de renda nacional,

Inglaterra possui praticamente zero de Capital Público líquido e a França em torno de

30% de sua renda nacional.

Estes valores, importante dizer, são estimativas pois avaliar ativos públicos como

rodovias, escolas, hospitais não é algo tão simples e corriqueiro. De qualquer forma, é

claro que o Capital Líquido Público é insignificante se comparado com o Capital Líquido

Privado.

De forma geral temos que hoje no mundo toda a riqueza se encontra no mundo privado

uma vez que as dívidas públicas dos países estão na mesma ordem de grandeza de seus

ativos.

48 Riqueza Pública em uma Perspectiva Histórica Observando a evolução da riqueza líquida tanto da França quanto da Inglaterra podemos

concluir que a relação entre renda nacional e capital nacional fica restrito somente ao

capital privado uma vez que a riqueza líquida pública sempre é irrisória. Os totais de

ativos públicos sempre estão bem próximos dos débitos: um anulando o outro.

Isto mostra como os dois países sempre se basearam na propriedade privada para dirigir

suas economias. Atualmente, não só os dois países, mas todos os países mais ricos estão

em fase de executar grandes dívidas públicas (ver tabela da sessão anterior). Mas este

contexto de dívida pública pode mudar rapidamente como iremos mostrar mais adiante

pois tanto Inglaterra quanto França oferecem experiências ricas nesta questão.

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País Dívida %PIB Reservas em milhões US$

Japão 229 1.026 Itália 133 128 Portugal 129 19 Bélgica 106 22 EUA 104 119 Espanha 99 49 França 96 0,1 Irlanda 96 - Reino Unido 89 144 Canadá 86 0,9 Alemanha 71 175 Índia 66 361

BRICS Brasil 66 362

China 43 3.000

Rússia 17 391 Fonte: http://pt.tradingeconomics.com/portugal/indicators - em 2015. Tabela não presente no livro de Piketty

49 Grã-Bretanha: Dívida Pública e a Revitalização do Capital Privado Nos séculos XVIII e XIX os governos da França e Inglaterra sempre andaram endividados.

As despesas, principalmente devido às guerras napoleônicas e a revolução americana,

eram grandes.

A forma como as duas nações conviveram e trataram suas dívidas foram completamente

distintas. Enquanto a França, no alvorecer da revolução francesa usou a moratória e a

inflação – a chamada “Banqueroute des deux tiers” ou Bancarrota dos dois terços para

liquidar suas dívidas no início do século XIX, a Inglaterra usou seu orçamento positivo

durante todo o século XVIII e XIX para financiar o capital privado que emprestava sem

limites com retorno garantido de 4 a 5%. Com isto, o capital privado na Inglaterra se

tornou mais forte que o capital privado na França.

50 Quem Lucra com a Dívida Pública? A retrospectiva anterior mostrando como o estado de certa forma transferia riquezas

para o capital privado foi importante para entendermos o porquê da preocupação dos

socialistas com a dívida púbica – a começar por Karl Marx.

Os rentistas eram pagos generosamente e sem atrasos os seus bônus de governo. Os

personagens dos romances de Balzac e Jane Austen são prova do “bon vivant” das

classes mais abastadas não só na Inglaterra como na França e outros países da Europa.

Na França do século XIX, Bonaparte taxou os produtores de bebidas para honrar dívidas

com rentistas. No final da guerra com a Prússia, novamente se valeu de taxar a

população para pagar a dívida equivalente a 30% da renda nacional ao país vencedor. Os

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exemplos, tanto em registros da história quanto nos romances de Balzac e Jane Austen

são ricos e definitivos: os estados eram usados como ferramenta para aumentar a

riqueza privada.

No século XX um novo ponto de vista sobre a dívida pública surgiu. A dívida pública

passou a ser um instrumento de política de inclusão social e ajuda aos mais necessitados.

Os débitos com os rentistas eram quitados usando-se a inflação para financiar as

políticas públicas. As taxas pagas não eram corrigidas proporcionalmente com as

emissões de moedas. Os rentistas tinham a garantia do pagamento, mas a diferença

entre o montante real a pagar e montante nominal eram usados pelos governos para

implementação de seus projetos sociais.

Com esta nova forma de tratar a dívida pública, a França saiu de uma dívida de 80% de

sua renda nacional em 1914 para apenas 30% em 1950. Observem que, além de

melhorar a vida das pessoas, o estado também diminuía seus débitos.

Por outro lado, na Inglaterra a história da dívida pública da Inglaterra seguia caminhos

mais tortuosos. Se em 1815 sua dívida era preocupante, em 1950 era maior ainda: 200%

de sua renda nacional. Foi após a guerra que a Inglaterra usou da mesma artimanha da

França e conseguiu amenizar sua dívida a partir da inflação chegando a 50% do PIB.

A técnica da inflação para conter a dívida pública não é um mar de rosas. Não são

somente os rentistas milionários que pagam o pato. Longe disto. Muitos setores sofrem.

Com a inflação, setores da sociedade perdem e outros ficam ricos. Além disto, o processo

se torna um ciclo vicioso e depois se torna um problema difícil de dominar. A inflação

juntamente com a recessão – estagflação – passou a ser um fenômeno comum na

década de 70 com significativos índices de desemprego. Assim, o controle da inflação

passou a ser um consenso entre os economistas já no final da década de 70.

51 Os Altos e Baixos da Equivalência de David Ricardo A hipótese do Princípio da Equivalência de Ricardo diz: Débito público não teria nenhum

efeito na acumulação do capital nacional.

Ricardo formulou esta hipótese pelo que testemunhou. O débito de 200% do PIB na

época ainda não tinha sido perceptível na poupança do capital privado e provavelmente

por isso, David Ricardo teria “comido mosca”.

John Maynard Keynes reconhece que não existia outra forma na época de os estados

resolverem o problema da dívida a não ser via a técnica da inflação.

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52 França: Um Capitalismo Sem Capitalistas no Período Pós-Guerra Os ativos da França e Inglaterra nos séculos XVIII e XIX giravam em torno de 50% de suas

rendas nacionais. Com a forte expansão da economia no século XX os ativos mais que

dobraram. A França em 2010 contabiliza 150% da renda nacional em ativos e a Inglaterra

chega a 100%.

Estes dados omitem uma realidade: apesar dos ativos estatais crescerem

significativamente, a partir de 1980 seguiu-se uma onda de privatizações nos setores

industriais e de serviços. Este fenômeno pode ser observado não somente nos países

europeus como também em diversos países emergentes.

Antes desta onda de privatização, no intervalo de 1930 a 1980 o descrédito ao

liberalismo foi intenso. A depressão de 1930, a segunda guerra mundial que exigiu uma

atitude mais igualitária de todos setores nacionais, e a própria postura de certos

capitalistas principalmente na França que, durante a ocupação nazista se beneficiaram

financeiramente, a grande reação econômica da URSS após a revolução de 1917 bem

como sua importância fundamental para derrota da Alemanha, foram fatores

importantes que trouxeram os estados para o centro das questões e soluções sociais.

Capítulo 4 – Da Velha Europa Para o Novo Mundo Após analisar as metamorfoses do capital na França e Inglaterra, Piketty irá estender sua

análise para a Alemanha e posteriormente EUA e Canadá. Os EUA possuem algumas

características que os distinguem dos países europeus:

a) A terra é abundante e barata não impactando no valor total do capital

b) A herança não teve impacto importante na concentração e perpetuação das riquezas

c) Existência da escravidão

d) Tendência da cultura dos povos colonizadores da América em acumular menos

capital que a Europa

53 Alemanha: O Capitalismo “Reno” e Propriedade Social Devido às constantes mudanças territoriais da Alemanha não se pode ir muito além na

história para analisar as transformações do capital neste país.

Pode-se notar semelhanças entre Grã-Bretanha tomando por base as transformações

ocorridas e que puderam ser observadas a partir de 1870.

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Alemanha não possuía riquezas internacionais como a França e muito menos ainda como

a Inglaterra. Talvez seja esta a principal razão das tensões militares que causaram a

primeira guerra mundial: Alemanha desafia França em sua supremacia no Marrocos.

Imperialismo, o ápice do capitalismo de Lenin (1916) traz esta tese do imperialismo e os

conflitos derivados que influenciaram o ambiente para a primeira grande guerra.

A história dos ativos internacionais entre Alemanha e as duas antigas potências coloniais

– França e Inglaterra – são inversas. Enquanto a Alemanha não possuía muitas riquezas

internacionais nos séculos XVIII e XIX e França e Inglaterra acumulavam riquezas

extraordinárias graças às suas colônias, a Alemanha foi acumulando aos poucos seus

ativos internacionais com seus superávits comerciais. Atualmente, os ativos

internacionais da França e Inglaterra estão próximos de zero e a diferença com os ativos

da Alemanha tendem a aumentar mais ainda.

Em relação à dívida pública, Alemanha se comportou de forma semelhante à França e

Inglaterra: usou e abusou da inflação para diminuir suas dívidas no século XX. Hoje,

paradoxalmente, a Alemanha é um dos países que mais evitam a inflação em sua

economia. Talvez, pelo trauma causado na década de 20 quando, ao utilizar deste meio

para aliviar as dívidas, viu a hiperinflação sair dos domínios do estado.

Existe, entretanto, diferenças substanciais entre o capital privado da Alemanha e todos

os demais países da Europa. Seu capital privado é bem inferior que os demais tomando

por base o PIB. Mas esta situação pode ser temporária e mesmo ilusória pois pode ser

explicado pelo controle rígido dos juros, unificação com Alemanha oriental que derrubou

os preços dos ativos e a forma como a Alemanha avalia suas empresas. Na verdade, esta

diferença de capital privado da Alemanha e demais países não é nada mais do que uma

questão política do que uma questão propriamente de métodos de avaliação de ativos.

A saúde econômica da Alemanha comparada com os demais países nesta crise pode ser

explicada pela forma como suas empresas privadas são administradas. Os acionistas

compartilham o poder com outras partes interessadas como a sociedade em volta da

empresa e os próprios funcionários que possuem poder de decisão nivelado com o poder

de decisão dos próprios acionistas.

54 Choques do Capital no Século Vinte Entendendo como se deu o colapso da relação Capital / Renda no século XX e sua

surpreendente recuperação a partir da década de 80.

A queda do capital pode ser explicada somente em partes pela destruição de ativos

causadas pela primeira e segunda guerras mundiais. Com um capital nacional em média

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6 a 7 vezes a renda nacional (Alemanha, França, Inglaterra, etc.) em 1913 para um capital

nacional de 2,5 vezes a renda nacional. Se as guerras por si justificassem a queda do

capital, Inglaterra teria uma queda do capital em relação à renda bem menor que França

e Alemanha onde as duas guerras foram mais destruidoras. De acordo com dados de

Piketty, a queda do capital em relação aos ativos destruídos na Grã-Bretanha pelas

bombas nazistas foi 40 vezes maior.

Isto prova que o choque político orçamentário causado pelas guerras se mostraram bem

mais destrutivos ao capital do que os combates propriamente ditos.

55 O Capital na América: Mais estável do que na Europa Por motivos óbvios, o Capital na América teve um papel menos importante na economia.

A nação estava só começando. Os colonos que saiam da Europa para o Novo Mundo não

levavam ativos, riquezas ou máquinas. As terras eram baratas. Assim, a relação capital /

renda era bem menor que a relação na Europa. Como consequência, as riquezas eram

distribuídas de forma menos desigual. O fenômeno de pouco capital acumulado talvez

seja a razão do espírito de liberdade e igualdade que dominou os americanos até o final

do século XIX. Mas no início do século XX o capital já tinha se recuperado e a fama

americana de uma sociedade mais igual e justa foi desaparecendo. De qualquer forma,

a curva em U da queda do capital no século XX nos EUA foi mais suave que na Europa.

Talvez por isso, os americanos sempre olharam o capitalismo com olhos mais otimistas

que a Europa durante o século XX – pelo menos, até a década de 80.

56 O Novo Mundo e o Capital Estrangeiro Os EUA não eram uma colônia típica da época onde os impérios a tudo possuía e toda

riqueza era transferia e sugada. De toda riqueza dos EUA, 98% era de propriedade dos

próprios americanos e apenas 2% pertenciam a estrangeiros.

Esta tradição se manteve. A posição líquida do capital estrangeiro dos EUA sempre se

manteve estável: um pouco negativa e às vezes ligeiramente positiva. As riquezas

presentes no país sempre estiveram nas mãos dos próprios americanos. Os estrangeiros

nunca se apropriaram de mais que 5% das riquezas em nenhum momento da história

econômica dos EUA.

Já o Canadá tem uma história distinta dos EUA. Grande parte de sua riqueza pertenceu

aos estrangeiros, principalmente os Ingleses. Talvez pelo fato da relação com a Grã-

Bretanha ter sido mais subserviente. Apenas nos dias atuais que a riqueza líquida

internacional se estabilizou na mesma ordem de grandeza dos EUA.

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57 Canadá: Propriedade da Coroa por Longo Tempo Curiosamente, o Canadá sempre foi mais submisso aos colonizadores. O total das

riquezas nacionais pertencentes aos estrangeiros chegou a 25% do total. Algo

inimaginável para os cidadãos estadunidenses dos séculos passados. Provavelmente isto

tem uma explicação política uma vez que a ruptura do Canadá com a Inglaterra não foi

feita de forma traumática como a independência dos EUA. No entanto, atualmente o

percentual de participação de estrangeiros nas riquezas nacionais do Canadá caíram

para 10%. Um patamar mais comparável com os números apresentados pelos EUA.

58 O Novo e o Velho Mundo: A Importância da Escravidão Em 1800 os escravos representavam 20% da população dos EUA – 1 milhão num total de

5.

No Sul, região de Thomas Jefferson – presidente dos EUA em 1801 – 40% da população

era escrava. O próprio Thomas Jefferson possuía 600 escravos. Como o sul dos EUA

possuía muito mais escravos que o Norte, a desigualdade econômica e social era bem

mais acentuada trazendo reflexos até os dias atuais.

59 Capital Escravo e Capital Humano O preço de um escravo nos EUA girava em torno de 12 anos de salários de um

trabalhador rural livre. Piketty, em desacordo com muitos economistas atuais

(principalmente americanos), não considera o trabalho humano como capital. Assim, ele

evita o termo “capital humano”. No caso do trabalho escravo é diferente pois se trata

de se transformar pessoas em mercadorias. E o capital “escravo” tinha uma

particularidade interessante que atraía os capitalistas: a taxa de retorno r era até 12

vezes maior que a taxa de retorno do capital convencional.

Capítulo 5 – A História da Relação Capital / Renda Mesmo com todas as transformações do capital nestes últimos 3 séculos analisados,

observa-se que a relação Capital / Renda não mudou substancialmente. Após o final da

segunda grande guerra o Capital voltou a se recuperar e alcançar os mesmos patamares

do início do século. Resta saber se esta pressão do Capital sobre a Renda continuará a

crescer ou se estabilizará no decorrer deste século.

Interessante ressaltar que a relação Capital / Renda na Europa, como sempre foi

historicamente, continua maior que nos EUA. Europa: C / R = 6 – EUA: C/R = 4.

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60 A Segunda Lei Fundamental do Capitalismo β = s / g s = taxa de poupança em relação ao PIB

g= taxa de crescimento do PIB

Esta relação tende a ser verdadeira a longo prazo.

Voltando no nosso exemplo da ilha. Se a ilha poupa 12% de sua produção de sandálias e 2% delas

se transformam em mercadorias e o restante vira capital (estoque de sandálias), seu capital

evidentemente irá aumentar. Em um longo prazo a relação Capital /renda tenderá a 6. Isto é: o

capital teria no futuro um valor 600% maior que o valor total das sandálias produzidas em 1 ano.

A taxa de crescimento populacional não pode deixar de ser considerada. Logo, a renda

per-capita é fundamental para se analisar esta relação. A explicação para a relação C/R

ser maior na Europa do que nos EUA se deve exatamente a isto: a taxa de crescimento

populacional nos EUA ainda é ligeiramente positiva o que ocasionou um poder do capital

um pouco menor do que no velho continente.

61 Uma Lei de Longo Prazo A segunda lei do capitalismo é assintótica. Tende a ser verdadeira somente à longo

prazo. Ela é importante para ajudar a entender o comportamento desta relação durante

todo o século XX, por exemplo. Se considerarmos períodos curtos dos choques da

primeira ou segunda guerra mundiais, esta equivalência não fará muito sentido.

Exemplificando a lei com três exemplos:

12% de poupança em um país com capital 6 vezes sua renda anual.

12% de poupança em um país com capital menos que 6 vezes sua renda anual.

12% de poupança em um país com capital maior que 6 vezes sua renda anual

No primeiro caso o capital crescerá 2% e assim, a taxa de crescimento da renda será

também de 2% (β =s/g 6 =12 / s) fazendo com que a relação β (C/ R) permaneça estável.

Por outro lado, no segundo caso, uma taxa de poupança de 12% implica num

crescimento do capital maior que 2% - mais rápido que a renda - e assim, β crescerá até

atingir seu equilíbrio.

Já no terceiro caso, o capital crescerá numa taxa menor que 2% e assim, β não poderá

se manter no nível inicial e decrescerá até alcançar um equilíbrio.

62 O Capital Está de Volta aos Países Ricos a Partir dos Anos 70 Piketty destaca que, apesar dos fenômenos de bolhas que ocorreram com frequência

desde a década de 90 até os dias atuais onde os ativos eram supervalorizados, a evolução

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da relação Capital / Renda é real. A partir da segunda lei fundamenta do capitalismo β =

s / g, podemos concluir que algumas das causas desta evolução foram:

a) Menor crescimento da renda

b) Menor crescimento populacional

c) Altas taxas de poupança

Além destas forças dominantes de longo prazo também não se pode menosprezar outros

fatores como a transferência dos ativos públicos para as mãos privadas e a recuperação

natural dos ativos de todo o mundo após sua desvalorização no período subsequente a

segunda guerra mundial (1945 – 1980).

63 Além das Bolhas: Baixo Crescimento, Altas Taxas de Poupança O fenômeno da recuperação do capital após a década de 70 pode ser demonstrada a

partir das taxas de crescimento populacionais e da renda juntamente com o percentual

de poupança de cada país. Ver tabela 5.1 a seguir.

A maior concentração do capital na Europa e Japão do que nos países ricos periféricos e

EUA pode ser explicada devido a um maior crescimento da renda nestes últimos países.

As diferenças não são grandes, mas à longo praza traz um grande impacto na estrutura

da razão Capital / Renda.

64 Os Dois Componentes da Poupança Privada Poupança advinda do ganhos individuais privados e poupança dos lucros que são

reinvestidos pelas empresas. Este segundo componente geralmente é usado para

manter o capital: compensar sua própria depreciação. Assim, somente a poupança

líquida pode incrementar o capital social.

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65 Bens Duráveis e Bens de Consumo Estes itens que não são considerados riquezas ou poupanças privadas. A título de

curiosidade os bens duráveis (móveis, automóveis, geladeiras, etc.) correspondem a 3

anos e meio de rendimento de um indivíduo. Esta proporção sempre manteve esta

ordem de grandeza desde o início do século XVIII. Por outro lado, os bens de valor –

pedras preciosas, joias, ouro, etc – são contabilizados de acordo com as normas

internacionais como riquezas privadas mas tem um valor montante bem menor que os

bens duráveis e seu valor decresceu consideravelmente comparando com os séculos

passados.

66 O Capital Expresso em Anos de Rendimento Disponível A diferença entre Renda Disponível e Renda Nacional está no somatório de obrigações

(taxas, impostos, etc.) pagas pelo cidadão. Seria a grosso modo a Renda Nacional líquida.

Antigamente quando o estado tinha participação menor na sociedade, o somatório da

Renda Disponível dos indivíduos correspondia a 90% da renda nacional. Sempre que no

livro se faz referência à renda, considera-se que seria a Renda Nacional. Para

comparações com outras nações, o indicador de Renda Disponível pode desvirtuar as

análises pois um país onde o estado é mais participativo implica em Renda Disponível

menor que em um país com pouca participação do estado. O último, usando-se estes

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índices poderia mostrar indicadores de qualidade de vida melhores que o anterior

mesmo sendo um país mais carente.

67 A Questão das Fundações e Outras Organização de Capital As fundações perfazem um total de 5 a 10% do total das riquezas privadas atualmente.

A rigor, não poderiam ser tratados como riqueza privada e nem como riqueza pública.

Não é uma nem outra. Piketty escolheu considerar os valores das fundações como sendo

riqueza privada. A decisão, na verdade, não afeta muito as análises, uma vez que os

valores não são tão relevantes como na época da revolução francesa por exemplo onde

os bens da Igreja tinham um impacto significativo na renda nacional.

68 A Privatização das Riquezas nos Países Ricos O período de recuperação do capital coincide com a onda de privatizações entre 1970-

2010. Proporcionalmente à renda nacional, Itália e Japão são os países onde o capital

atingiu o maior nível em relação à renda nacional.

Esta onda não se restringiu somente entre os países mais ricos. Todo o sudeste europeu

e a Rússia seguiram este caminho após a derrocada do comunismo e a queda do muro

de Berlin.

69 A Histórica Recuperação dos Preços dos Ativos Outro fenômeno que contribuiu para a grande recuperação do capital se refere à

valorização dos ativos a partir do fim da segunda guerra mundial. De 1910 a 1950 os

ativos, por diversos motivos, ficaram desvalorizados em todo o mundo. Com o fim da

guerra os ativos foram recuperando seu valor real chegando num provável pico máximo

em 2010. As bolhas, de certa forma, podem ser interpretadas como fenômenos

complementares desta reação.

Este fenômeno incentivou o uso do indicador Tobin’s Q (homenagem ao economista

James Tobin). O indicador atribui 1 para uma firma onde o valor de mercado da empresa

corresponde exatamente ao valor real. Áreas de negócios que sofrem com as bolhas

possuem o indicador Tobin’s Q sempre maior do que 1.

Tobins’s Q = valor mercado / valor contábil

Finalizando, a recuperação dos valores dos ativos no período de 1970 a 2010 foi

responsável por 1 quarto a 1 terço no aumento da razão Capital / Renda.

70 Capital Nacional e Ativo Líquido Estrangeiro nos Países Ricos As riquezas internacionais que as grandes nações ricas possuíam no alvorecer da

primeira grande guerra mundial praticamente desapareceram já no início da década de

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70. Assim, a grande recuperação do capital após a segunda grande guerra não contou

com estes ativos e sim, com as próprias riquezas domésticas destas nações.

A questão que fica é: será que alguns países ficarão dominados por outros

financeiramente ou no decorrer deste século os ativos internacionais tenderão a se

equilibrar? Para analisar melhor esta questão temos que estudar a questão do petróleo

e dos países emergentes – China principalmente. Mas isto será assunto em capítulos

posteriores.

A estrutura do capital atual tornou mais complexa a questão dos ativos e passivos dos

países pois as transações financeiras perderam as fronteiras principalmente na Europa.

Esta questão será discutida com mais detalhes na parte III do livro.

71 Como Ficará a Razão Capital / Renda no Século XXI? Já sabemos como foi o comportamento do capital durante todo o século passado. Seguiu

uma curva em U nos períodos das grandes guerras se recuperando a partir de 1970. Este

cenário também foi observado no Japão e toda América Latina.

Numa tentativa de prever como seria esta curva nas próximas décadas usamos a

segunda lei β = s /g considerando as previsões de crescimento demográfico e

crescimento econômico já apresentados no capítulo 2. Relembrando as previsões:

crescimento econômico caindo de 3.5% para 1.5% na segunda metade deste século com

a taxa de poupança estabilizando em 10% a longo prazo. Aplicando estes indicadores à

lógica da segunda lei capitalista poderemos ter um planeta com a cara da Europa do

século XVIII na época da Belle Époque. Apesar de plausível este cenário não passa de

uma possibilidade dentre várias outras, mas do ponto de vista do autor, talvez seja o

cenário mais provável.

72 O Mistério do Valor da Terra A segunda lei do capitalismo não se aplica à terra que é um capital que não se pode

acumular. Mas, qual seria o valor da terra? Estima-se que o valor não é significativo em

relação ao montante do capital de um país. Portanto, o valor da terra não é uma variável

determinante na fórmula β = s /g.

Capítulo 6 – A Divisão Capital-Trabalho no Século XXI Vimos como a relação capital / renda é dependente da taxa de poupança de crescimento

das nações. E estes índices são totalmente imprevisíveis e influenciáveis por milhares de

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variáveis dependentes de fatores culturais, econômicos, psicológicos, sociais e

demográficos. Estes fatos no ajudam a entender as grandes variações históricas e

geográficas desta relação.

73 Da Razão Capital / Renda Para a Divisão Capital-Trabalho Da primeira lei do capitalismo α = r * β podemos deduzir qual é a participação do capital

e do trabalho na renda nacional. Afinal, se temos β e r, obtemos α que é a participação

do capital. Com a participação do capital em mãos, basta subtrair do total da renda

nacional e obtemos a participação do trabalho. Mas como deduzir r? r = % retorno do

capital investido no ano.

Não é uma tarefa trivial. Afinal, o indicador r por si só é uma construção abstrata.

Dependendo da quantidade e do tipo de capital que se está investindo pode-se ter

rendimentos que variam de 8 a 0% ou mesmo a percentuais negativos no caso de

ambientes com inflação. O fator r que usaremos sempre representará uma média anual.

74 Fluxos de Renda: Mais Difícil de Estimar do que o Capital Nos séculos passados a renda advinha de forma mista isto é: rendimentos de pessoas

físicas fruto tanto do trabalho quanto do capital tinha um peso bem maior sobre a renda

doméstica nacional. Exemplos destes trabalhadores “sem salário”: donos de pequenos

estabelecimentos como bares, salões ou profissionais liberais, fazendeiros, etc. Piketty

justifica em não detalhar esta faixa pois na atualidade esta renda representa menos que

2% da renda doméstica nacional.

Mas, considerando que estes trabalhadores “sem salário” nos séculos passados geravam

renda superior a 30% da renda do país, é importante analisar de forma crítica os gráficos

relativos ao retorno do capital quando olhamos para o passado.

75 A Noção do Retorno Puro do Capital Os gráficos da página 202 mostram a evolução histórica do retorno do capital na França

e Inglaterra. Piketty traça curvas paralelas para mostrar o retorno REAL do capital

subtraindo (estimativa) o trabalho gasto pelo capitalista para fazer com que seu capital

tenha o devido retorno. Com isto, as curvas do retorno puro, como ele se refere, ficam

em torno de 2 pontos percentuais abaixo da curva nominal (ou oficial) do retorno do

capital.

76 A Participação do Capital na Renda numa Perspectiva Histórica O retorno do capital nos séculos XVIII e XIX giravam em torno de 4 a 5% e no século XX

ficou em torno de 3 a 4%. Estes números seriam relativos ao retorno líquido (ou retorno

puro) do capital. Nos romances de Balzac tem-se a impressão que o retorno é bem maior,

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mas analisando mais detalhadamente percebe-se que existe um grande esforço dos

investidores para se chegar nos percentuais observados entre os personagens. Na

verdade, este esforço deve ser debitado no trabalho para alcançar tal percentual.

Na atualidade existe uma tendência desses 3 a 4% de retorno atingirem valores maiores

dada às novas habilidades tecnológicas dos capitalistas com a especulação.

77 O Retorno do Capital no Início do Século XXI Mostra que o retorno do capital gira em torno de 3-4% lembrando que este indicador se

refere ao retorno líquido ou retorno puro. O motivo deste indicador ser menor hoje do

que nos séculos passados se deve aos impostos e ao trabalho atual que hoje é bem mais

significativo para se obter os rendimentos (custos gerenciais e custos para se chegar às

melhores opções de investimento).

78 Ativos Reais e Nominais Ao considerar o indicar de retorno do capital devemos ficar atentos aos ativos nominais

e ativos reais. Afinal, ativos nominais estão sujeitos aos ataques inflacionários enquanto

os ativos reais oscilam seus valores originais com o mercado. Assim, o retorno do capital

relativo ao ativo nominal deve ser descontado os índices inflacionários no período do

rendimento.

Sua conclusão final acerca da inflação e dos ganhos de capitais é que a inflação tem uma

influência maior na redistribuição de riqueza nas diversas categorias que ela representa

do que efeito real sobre a riqueza de forma geral. Exemplo: a inflação teve papel

fundamental para liquidar os débitos públicos na sequência das duas grandes guerras

mundiais. Mas as grandes fortunas souberam se livrar dos ativos nominais migrando

para os ativos reais quando perceberam que o fenômeno da inflação seria de longa

duração.

Enfim, Piketty quer deixar claro que o papel da inflação na distribuição ou concentração

da riqueza é bem limitado. No geral, ela apenas faz com que o capital transite de uma

representação monetária para uma outra.

79 O Capital é Usado Para Quê? Quais as forças sociais que determinam o retorno do capital em um dado período da

história? Porque e como estas forças mudam no decorrer do tempo? Saberemos prever

como as taxas de retorno iram evoluir no século XXI?

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O que seria afinal o retorno do capital? De acordo com os conceitos estabelecidos seria

o percentual acrescido na produção de acordo com uma dada unidade de capital

investido. A isto, damos o nome de produtividade marginal. Mas em um modelo mais

complexo e mais exato, a participação do capital oscila para mais ou para menos em

relação à produtividade marginal de acordo com as várias forças e partes envolvidas no

processo. De qualquer forma, as forças básicas envolvidas para determinação do retorno

do capital se referem à tecnologia e à abundância de capital disponível para

investimento (capital em excesso mata o retorno do capital).

Se o estoque de capital de uma sociedade qualquer não possui participação alguma nos

meios de produção logo, o retorno do capital nesta sociedade fictícia seria zero. Nesta

sociedade hipotética, toda produção e renda são consequência única e direta do

trabalho. Não significa que não exista motivações ou interesses para que se acumule

capital por outros motivos (estoque para prever tempos difíceis, ostentação, status,

etc.).

Historicamente sabemos que esta sociedade hipotética nunca existiu. O Capital, além de

prover moradia – melhor ainda, prover trabalho para que a moradia possa existir – ele

também contribuiu no processo de produção ao possibilitar o uso de terra, maquinário,

infraestrutura, etc.

Observem que no processo de produção existe implicitamente dois tipos de trabalhos: o trabalho

no tempo presente que executa as funções para gerar a produção e o trabalho armazenado no

tempo pretérito que permite que as funções sejam executadas. Para se fazer as sandálias em

nosso exemplo do país-ilha fictício, não bastava trançar as fibras das folhas de palmeira para se

fazer as sandálias. Era fundamental o suporte metálico para que elas fossem trançadas. E o

suporte metálico não existe sem um trabalho anterior. E no futuro, para se produzir mais

sandálias, trabalhos presentes para fabricação de mais suportes também são necessários. Por

isto, o capital, com exceção dos bens naturais, não passa de trabalho ocorrido no tempo passado

se manifestando no presente caso participe da produção ou simplesmente, capital estocado, caso

fique à margem da produção.

80 A Noção de Produtividade Marginal do Capital A produtividade marginal do capital pode ser definida como sendo o valor adicional da

produção devido ao acréscimo de uma unidade de capital no processo.

Voltando à ilha. Supondo que a produção de sandálias estava aquém da capacidade real que os

trabalhadores poderiam produzir. Existia a mão de obra, mas faltava suportes metálicos para

todos os trabalhadores. Supondo que um suporte metálico custasse $SD 120,00 (pode-se ler

120,00 Sanreal = unidade monetária da ilha) e que foram investidos $SD 1.200,00 de suportes.

Com este adicional de capital, a produção aumentou em 100 sandálias por ano dando um

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acréscimo final de $SD60,00 na renda anual da ilha – logo, uma sandália custa atualmente na

ilha $SD 0,60 (há tempos atrás custava exatos $SD 1,00). Assim, o retorno do capital na ilha

equivaleria a 5%.

Este exemplo ilustra o que vem a ser a produtividade marginal do capital.

Mas é importante considerar que no mundo real, nem sempre o retorno real

corresponde à produtividade marginal. Bolhas, especulações, excesso de capital ou a

falta dele podem fazer com que o retorno oscile muita a menor ou muito a maior. As

questões que ficam são muitas: o capitalista merece receber este adicional mesmo não

participando diretamente da produção? Quais as consequências para a sociedade se os

capitalistas recebem bem mais ou bem menos do que a produtividade marginal?

Precisamos refletir sobre estas questões de difícil respostas.

81 Capital em Excesso Mata o Retorno do Capital Que o retorno do capital cai com excesso de capital é algo óbvio. A questão é tentar

entender o quão rápido cai o fator r a medida que cresce a disponibilidade de capital.

Dois casos são possíveis:

a) r cai numa velocidade maior que β (β = capital / renda ). Por exemplo, r pode

cair de 5% para 1.5% enquanto β apenas dobra seu valor. Neste cenário, α = r *

β que é a participação do capital na renda, diminui enquanto β aumenta.

b) r cai numa velocidade menor que β aumenta então a participação do capital α na

renda aumenta enquanto β também aumenta. Neste caso, a queda de r serve

como um amortecedor para moderar o aumento do capital.

Os dois cenários são possíveis. O cenário b) se encaixa no comportamento do capital e

do retorno do capital desde os tempos da revolução industrial.

Importante destacar que ambos cenários são possíveis. Tudo depende das tecnologias

disponíveis à época e a combinação de tecnologia com trabalho. Deve-se medir o quanto

é fácil de substituir capital por trabalho ou trabalho por capital para se produzir as

demandas da sociedade.

82 Além de Cobb-Douglas: a Questão da Estabilidade da Divisão Capital-Trabalho Esta questão nunca foi consenso entre os economistas do século XX. Cobb e Douglas

propuseram em 1928 que a fórmula α = r * β é estável independentemente se β é 3 ou

6 (Capital 3 ou 6 vezes maior que a renda nacional anual). Esta estabilidade nos levaria

também a uma estabilidade entre a divisão Capital-Trabalho. Piketty questiona esta linha

teórica que inclusive, foi endossada por Keynes. A Hipótese de Cobb-Douglas pode

parecer verdadeira quando se compara com dados de somente um setor da economia

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ou mesmo um período da história. Ela não é satisfatória quando comparamos períodos

maiores, ou mesmo num mesmo período, comparamos um país com outro, ou quando

fazemos uma análise de dados em períodos de longo prazo.

Os economistas marxistas, por outro lado, tendem a afirmar que a divisão Capital-

Trabalho no sistema capitalista sempre será instável e o capital tenderá sempre ao

crescimento e os salários, no mínimo, ficam estagnados. Mas as análises a longo prazo

dos dados também não validam esta teoria pois tivemos períodos (pós-guerra) onde os

salários aumentaram e o capital diminuiu.

Muitas pesquisas a partir de 1990 mostram um fluxo de riquezas migrando do trabalho

para o Capital colocando em cheque a lei universal da estabilidade da divisão Capital-

Trabalho.

Até mesmo o FMI reconheceu esta instabilidade sinalizando que a questão da

concentração do capital está sendo levada mais a sério neste século.

83 Substituição do Capital-Trabalho no Século XXI: Elasticidade Maior do que 1 Clareando o termo elasticidade. É um conceito usado pelos economistas que reflete as

possibilidades tecnológicas de uma sociedade. Se a elasticidade = 0 significa que

incrementar mais capital ou trabalho humano ao processo de produção não aumentará

a produção.

Por outro lado, se a elasticidade é infinita, sempre que se acrescentar capital ao processo

de produção, haverá incremento na quantidade total produzida.

Os dois extremos não seriam relevantes. Mas os dois intervalos: de 0 a 1 e >1 são

distintos e merecem consideração.

Elasticidade de 0 a 1: significa que um aumento de β (capital / renda) acarreta uma

queda em r a tal ponto que nos leva a uma menor participação do capital. Lembrando

que α = r * β.

Elasticidade >1: significa que um aumento de β (capital / renda) acarreta uma queda em

r não o suficiente fazendo a participação do capital aumentar.

Assim, o primeiro intervalo representa uma sociedade de menores habilidades

tecnológicas para trocar trabalho por capital com ganho de produtividade marginal do

que a segunda.

Provavelmente, por um longo período a elasticidade da substituição Capital-Trabalho

ficou acima de 1(um). Isto significa como vimos anteriormente que, apesar do retorno

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do capital ter decaído, o aumento de β também fez aumentar a participação do capital

na renda nacional. Provavelmente isto se deve à capacidade do capital se envolver nos

meios de produção via tecnologia. A tendência para este século seja, talvez, um

crescimento sempre maior de β com redução do retorno do capital e aumento da

participação do capital na renda (α). E é importante destacar que não existe um

mecanismo de autocorreção para prevenir esta forte tendência de aumento de β com

uma também forte tendência de aumento de α.

84 Sociedades Agrícolas Tradicionais: Uma Elasticidade Menor que 1 Nas sociedades agrícolas tradicionais o capital era representado quase que

exclusivamente pela terra. Desta forma, a habilidade de substituição de trabalho por

capital era deficiente. Assim, mesmo com o capital aumentando, o retorno do capital cai

a tal ponto que a participação do capital na renda final também decresce.

85 O Capital Humano é Ilusório? Atualmente muitos acreditam que o que caracteriza o processo de crescimento e

desenvolvimento econômico é a crescente importância do trabalho humano, suas

habilidades e conhecimento. Mas Piketty, se baseando em seus modelos teóricos e

dados de longo prazo, considera que a tecnologia se baseia principalmente em capital e

mais importante do que isto, na nossa atualidade, o capital assume diversas formas e

maneiras de se inserir nos meios de produção. Segundo ele, dado uma elasticidade > 1,

a participação do capital na renda mundial irá aumentar e sua importância continuará

avançando sobre o trabalho. Muitos da comunidade econômica consideram que

entramos na era do capital humano o qual está fazendo com que o papel do capital

desapareça lentamente. Não é bem assim. Pelo contrário. A importância do capital está,

na verdade aumentando, e esta é a tendência deste século.

86 Mudanças de Médio Prazo na Divisão Capital-Trabalho Um dos exemplos claros de que a hipótese de Coob-Douglas que diz que a divisão

Capital-Trabalho seria historicamente estável pode ser retirado da época da revolução

industrial onde a participação do capital pulou de 10% para 35-40% no final do século

XVIII início do século XIX e para 45-50% já nos meados do século XIX quando Karl Marx

escreveu “Manifesto do Partido Comunista” e começou a trabalhar “O Capital”.

E da mesma forma, a participação do capital decaiu no período subsequente de 1870-

1900 e novamente veio a aumentar entre 1900 e 1910.

De acordo com os dados de Robert Allen, economista que detectou a estagnação do

trabalho, pode-se concluir que esta sobreposição do capital sobre o trabalho nestes

períodos tem causas no êxodo rural com grande oferta de mão-de-obra nos centros

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urbanos e avanços tecnológicos que permitiram ao Capital se moldar e se fundir de

forma mais eficiente aos processos de produção.

87 De Volta para Marx e a Queda do Lucro Para Karl Marx, o capitalismo cava sua própria cova no princípio da acumulação infinita.

Evidentemente, este princípio leva a uma queda constante do lucro (o retorno do

capital). Marx não utiliza de modelos matemáticos e seus textos muitas vezes não

ajudam a clarear esta questão. Uma forma consistente para interpretar e entender seu

pensamento seria considerar o crescimento da renda representado em g na dinâmica β

= s / g igual a zero ou perto de zero. Naquela época, crescimento da produção era

consequência direta do incremento do capital industrial. Não se cogitava a ideia de

aumento de produtividade.

Numa realidade como a imaginada por Karl Marx onde a taxa de produtividade e de

crescimento populacional se aproximava de zero, a acumulação infinita talvez fosse

realmente a única conclusão ao alcance.

A maior falha da teoria de Karl Marx foi se basear em dados de apenas alguns setores da

economia Britânica não considerando os indicadores nacionais do país. Ele usou dados

que mostravam o enorme retorno r do capital (próximo de 10!) a partir de balanços de

poucas empresas de tecelagem para embasar toda sua teoria que levou à conclusão

paradoxal da acumulação infinita.

88 Além do Debate “Two Cambridges” A batalha “Two Cambridges” trata dos debates que ocorreram nos meados do século XX

entre as universidades Cambridge da Inglaterra e Cambridge de Massachusetts.

Em resumo o debate se deu em torno da afirmação dos economistas Ingleses onde a

fórmula β = s / g trazia termos constantes e eram naturalmente balanceadas. Já os

economistas americanos afirmavam que este balanceamento não era natural e que

sempre levaria a crises importantes e destacavam que a intervenção na economia a

curto prazo – teoria defendida por Maynard Keynes – era algo que deveria ser

considerado para tentar equilibrar a equação.

O cerne da questão é a distribuição de renda. A linha Cambridge inglesa, defendendo a

estabilidade e natural equilíbrio das forças da relação β = s / g, afirmava que o capital e

o trabalho sempre estariam em perfeito equilíbrio. Já a linha americana tinha a

convicção de que a não intervenção na economia faria com que as grandezas envolvidas

se desequilibrariam levando a um aumento das desigualdades.

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89 A Volta do Capital a um Regime de Baixo Crescimento Considerando a quantidade de dados que Piketty consegue juntar, ele afirma que a taxa

Capital / renda tenderá a ficar acima de 5 podendo chegar a 7. A principal razão para isto

é o baixo nível de crescimento atual não ultrapassando 1.5%. Por outro lado, o retorno

do Capital não deve decrescer mais que o aumento da taxa capital/renda uma vez que a

elasticidade deve ficar acima de 1 dado a facilidade atual do capital ser aplicado nos

meios de produção. Com este cenário, as chances da participação do capital na renda

nacional podem chegar a 30-40%, um nível perto dos níveis alcançados nos séculos XVIII

e XIX podendo chegar a níveis ainda mais elevados.

90 Os Caprichos da Tecnologia A principal lição que tiramos desta segunda parte do livro: não existe força natural que

reduz a importância e a opressão do capital sobre a renda. Após a segunda guerra

mundial as pessoas pensaram que o capital humano teria triunfado sobre o próprio

capital devido às novas tecnologias acompanhadas das habilidades humanas para utilizá-

las. As evoluções tecnológicas deram mais poder à força de trabalho vinda do homem,

mas, ao mesmo tempo, aumentou a importância da infraestrutura, das máquinas,

prédios, escritórios e do próprio capital financeiro. O aumento do capital devido às novas

tecnologias foi proporcional ao aumento do valor do trabalho na renda. Resumindo, o

crescimento moderno, o qual é baseado no crescimento da produtividade juntamente

com a tecnologia vez com que se evitasse o apocalipse previsto por Karl Marx da

acumulação infinita e balanceou o processo de acumulação. Todavia, todo este processo

moderno não mudou a estrutura do capital e sua importância frente ao trabalho. A

desigualdade gerada pela falta de controle do capital sobre o trabalho se mostrou

evidente e será o tema central da próxima parte a seguir.

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Parte 3 – A Estrutura da

Desigualdade

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Capítulo 7 – Desigualdade e Concentração: Considerações Preliminares Se na parte anterior discutimos sobre a evolução e a divisão capital/trabalho, agora

iremos tratar das desigualdades entre renda e capital em um nível mais individual.

Descobrimos que a recuperação do capital após a segunda grande guerra foi, em grande

parte, devido a um fenômeno que se repete: o baixo crescimento econômico

semelhante ao do século XIX.

Agora iremos analisar as desigualdades do século XX e mostrar como as políticas sociais

pós-guerra contribuíram para diminuir as desigualdades sociais na segunda metade do

século XX. E este processo, evidentemente, diferente da teoria de Kuznets, não foi nada

natural ou espontâneo (ver sessão de número 3 sobre a teoria de Kuznets).

Antes de iniciar é bom destacar que a desigualdade pode ser decomposta em três

termos:

1. A desigualdade de renda vinda exclusivamente do próprio trabalho

2. A desigualdade de renda vinda dos rendimentos daqueles que se apropriam do

capital

3. E a interação entre os dois termos anteriores.

91 A Lição de Vautrin – Personagem de Balzac Piketty usa os personagens Vautrin e Restignac de Honoré de Balzac para ilustrar a

questão da herança e do trabalho nos meados do século XIX – a chamada “Belle Époque”.

Vautrin mostra para Restignac que não adiantaria ele estudar direito ou medicina para

tentar chegar ao topo das classes sociais que frequentavam as noites de Paris. Ele iria se

matar de estudar e trabalhar para receber valores bem aquém dos rentistas da época.

Ele, de forma bem nua e crua, mostra o atalho infalível: casar com filha de um homem

rico. Assim, Piketty inicia sua discussão sobre renda vinda do trabalho e vinda da

herança.

92 A Pergunta Chave: Trabalho ou Herança? Nas últimas décadas do século XX o trabalho se valorizou mais e tentar galgar as classes

sociais mais abastadas via herança passou a ser considerado uma atitude imoral e com

menos chances de sucesso do que tentar pela via dos estudos e do trabalho. Mas até

que ponto se deu esta transformação e o que exatamente ocorreu e ainda, existe a

chance desta maior valorização no trabalho se inverter novamente?

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93 Desigualdades em Relação ao Capital e Trabalho Para se analisar a desigualdade em uma dada sociedade é preciso distinguir

desigualdade originada do trabalho e a desigualdade originada do capital. Podemos ter

uma sociedade onde a desigualdade presente na renda via capital é maior que a

desigualdade vinda da renda no trabalho e vice-versa. Muitos economistas esquecem de

fazer este tipo de análise que é fundamental. Até mesmo alguns indicadores como o GINI

mistura os dois conceitos tornando quase impossível distinguir claramente as múltiplas

dimensões das desigualdades em cada país. Nas próximas sessões Piketty tentará

distinguir os dois tipos de desigualdade com mais precisão.

94 Capital: Sempre Mais Desigualmente Distribuído do que o Trabalho Este fenômeno ocorre em todos os países e em todos os períodos da história onde temos

dados disponíveis. Logo, podemos dizer com certeza que a desigualdade relativa ao

capital e ganhos de renda vindos do capital são bem maiores que a desigualdade que

encontramos nos rendimentos do trabalho desde o século XVIII.

Em geral, 10% dos cidadãos com os maiores salários recebem de 25 a 30% do total da

renda vinda do trabalho enquanto os top 10% da distribuição da renda vinda do capital

se apropriam de 50% do total (e em algumas sociedades pode chegar até a 90%). Além

disto, os 50% na parte de baixo dos rendimentos do trabalho recebem no total o

equivalente aos 10% do topo. Já os 50% na parte de baixo do capital recebem geralmente

menos de 5% do montante dos top 10% mais ricos.

Esta característica de concentração maior no âmbito do capital do que no âmbito do

trabalho não se deve à tendência de as pessoas acumularem capital durante a vida para

garantir uma aposentadoria mesmo porque, os mais velhos em geral são mais ricos que

os mais novos. A explicação desta desigualdade mais acentuada pode ser encontrada na

dinâmica das heranças. Por exemplo, um cidadão que tenha recebido de herança um

apartamento terá mais condições de acumular riquezas do que o cidadão que tem que

pagar aluguel durante toda sua vida.

95 Desigualdades e Concentração: Algumas Ordens de Grandeza Piketty mostra alguns dados da Europa, Escandinávia e EUA relativos aos top centiles,

deciles e os 50% mais pobres relativos ao total que cada faixa se apropria dos totais de

rendas ou capital. Mostra que os países da Escandinávia são mais igualitários, mas estão

também muito longe do ideal. Em relação ao capital somente, até a Escandinávia se

encontra em posição de muita desigualdade. Esta sessão serve para o leitor se acostumar

com o conceito de top centile e top decile.

Topo centile: são os 1% mais ricos - Top decile: são os 10% mais ricos

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96 Classes Baixa, Média e Alta Piketty, para tornar suas ideias mais claras define a classe A como sendo o top decile, a

classe B os 40% abaixo dos 10% e a Classe C os 50% restantes mais pobres. Isto irá facilitar

no decorrer do livro.

É muito comum se deparar com conceitos onde quase 99% dos top decile (os 10% mais

ricos) são jogados na classe média. Muitas vezes esta manipulação está relacionada com

a tentativa de mostrar que este grupo não é privilegiado e que a pouca participação nas

taxas de impostos se justifica (e viva Bezerra da Silva: “malandro é malandro mané é

mané...”).

Os conceitos de classe alta, média e baixa variam de sociedade para sociedade e de

tempos em tempos. Piketty não entra neste mérito e faz uma divisão bem estatística

(10%, 40% e 50%) sem desmerecer os conceitos de níveis de classes em cada cultura.

97 Luta de Classes ou Luta do 1%? As desigualdades de renda entre as classes sociais são consideráveis e se aproximam dos

índices do final do século XIX. No entanto, percebe-se que a desigualdade no top da

cadeia – os deciles – é ainda maior. As diferenças de renda entre os centiles (1% mais

ricos) em comparação aos demais 9% trazem números impressionantes.

Piketty quer deixar bem claro sua opção impessoal de dividir a sociedade nos 10%, 40%

e 50%. Seria a forma mais imparcial de tratar a desigualdade. Se não fosse assim, uma

divisão quase que matemática, o autor teria que se subordinar a visões preconceituosas

ou culturais de cada país e assim, suas análises se perderiam. Destaca que dentro dos

10% mais ricos sempre existiram a classe dominante representada pelos 1% dos 10%

mais ricos. Desde os tempos de 1789 que os top centiles já dominavam a sociedade e

tinham um controle efetivo de todo o destino de um povo.

Não basta apenas fazer a divisão de escala de salários de 1 a 100, por exemplo. É preciso

quantificar o número de pessoas em cada escala salarial. Só assim poderemos fazer um

estudo que demonstre o grau de desigualdade de uma dada sociedade.

Finalmente, é importante destacar que a distribuição de renda e riquezas nas três classes

será feita nesta parte do livro sem considerar a intervenção dos impostos. Para cada país,

podemos ter uma política de distribuição mais igualitária ou mais concentradora. Por

enquanto nos preocuparemos somente com o estágio antes das ações dos impostos.

98 Desigualdades Relacionadas ao Trabalho: Desigualdade Moderada? É certo que a desigualdade vinda do capital é bem maior que a desigualdade da renda

do trabalho. Mas não se pode negligenciar esta questão: além de ser também acentuada

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a desigualdade no trabalho, a renda do trabalho corresponde a mais de dois terços ou

três quartos da renda nacional. Observa-se diferenças de desigualdades de renda no

trabalho entre os países bem mais discrepantes do que a diferença de renda do capital.

As políticas públicas têm uma influência bem maior para mitigar estas desigualdades

quando se trata da renda no trabalho do que da renda do capital.

Os países menos desiguais ainda são os escandinavos seguido dos europeus. Os EUA é

um exemplo de país onde a desigualdade salarial é considerada uma das mais severas.

Nos 50% com salários mais baixos em todo o mundo, as mulheres têm uma

representação acima do normal. Somente nos países do norte da Europa que elas

conseguem diminuir esta discrepância.

Estas desigualdades sociais trazem a consequência de domínios de uma classe sobre a

outra e sempre são causas de conflitos sociais importantes. Portanto, é importante

entender as forças políticas, econômicas e sociais que determinam estas diferenças

econômicas entre classes em diferentes sociedades.

99 Desigualdades Relacionadas ao Capital: Desigualdade Extrema Em relação ao capital, as desigualdades são mais impressionantes. Em quase todas as

sociedades a metade mais pobre praticamente não possui nada. Invariavelmente os 50%

mais pobres possuem menos que 10% de toda a riqueza em qualquer sociedade. Nos

EUA estes números chegam a 2%!

Curioso observar que a desigualdade de capital na Escandinávia é mais desigual que a

desigualdade salarial nos EUA.

Os imóveis correspondem a 50% do total da riqueza do grupo dos 10% mais ricos. Mas

quando subimos na hierarquia, descobrimos que os imóveis correspondem, no máximo,

a 10% de suas riquezas. Os ativos financeiros para os milionários correspondem

praticamente com 90% de suas riquezas.

100 A Grande Inovação: A Classe Média Patrimonial A grande mudança na estrutura da distribuição da riqueza no século XX entre os países

ricos foi sem sombra de dúvida, o aumento considerável dos bens patrimoniais da classe

média.

É verdade que a desigualdade de 1900-1910 persiste. Da mesma forma que os 50% mais

pobres daquela época possuíam em torno de 5% das riquezas, hoje nos EUA estes índices

são parecidos. Mas se antigamente não existia uma classe entre os ricos e os pobres,

hoje esta camada é significante e possui cerca de um quarto a um terço de toda riqueza

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Jandui Tupinambás 59

dos países ricos. Esta é a classe dos 40% ou classe média. Como nada vem do nada, esta

riqueza migrou de parte da classe dos 10% sem tirar nenhum tostão dos 1% mais ricos,

mas sim, dos restantes 9% mais ricos. E a curva para sair dos 9% para os 1% é a curva

mais acentuada que existe nas curvas das desigualdades. E um dos objetivos principais

deste trabalho é tentar não só entender essas desigualdades como também tentar

entender como elas emergem, subsistem, desaparecem ou mesmo, reaparecem.

101 Desigualdade da Renda total: Dois Mundos Renda Total: soma das rendas vinda do trabalho + renda do capital. Como a renda do

trabalho corresponde a 70% da renda total logo, a desigualdade considerando a renda

total tende a ser mais parecida com a desigualdade de renda do trabalho.

Analisando dados históricos é possível perceber um limiar de desigualdades em que se

consegue um equilíbrio (ou uma pax romana) entre as classes. Este limiar gira em torno

de 50% de posses de riquezas pelos 10% mais ricos. Acima disto, a sociedade passa a

viver riscos iminentes de revoltas e revoluções. Logicamente que a história não se pode

confundir com matemática. Muitas estratégias podem tornar mais flexíveis este limiar

como o monopólio da informação nas mais dos 10%, por exemplo.

Observa-se que nos EUA, se a curva de desigualdade continuar no ritmo desde o início

deste século, este limite já terá sido ultrapassado em 2030.

A presente desigualdade da renda total atual está sendo justificada com o argumento da

meritocracia: os super-salários sendo justificados pela competência de alguns e os

salários irrisório pela incompetência de outros por não aproveitar as oportunidades.

Piketty chama a atenção para a possibilidade de se combinar as desigualdades vindas da

renda do trabalho e do capital fazendo com que no futuro, as desigualdades venham a

se tornar ainda mais graves (ver pag. 265 versão em Inglês). A sombra do limiar dos 10%

mais ricos com 50% de toda a riqueza e suas consequências podem ser ameaças reais e

assustadoras a encobrir nosso mundo ainda antes de 2030.

102 O Problema dos Índices Sintéticos Antes de examinar a estrutura e evolução da desigualdade país por país, é importante

discutir a questão dos índices que medem esta grandeza. O índice mais comum que tenta

medir esta grandeza é o índice de GINI – homenagem ao estatístico Corrado Gini (1884-

1965). Por definição, o índice varia de 0 a 1. Zero significa um país totalmente igual e 1

significa uma sociedade totalmente desigual. Na prática, este índice varia de 0.2 a 0.4

quando se refere ao salário e de 0.6 a 0.9 quando se refere exclusivamente ao capital.

Com relação à renda total a variação de GINI fica em torno de 0.3.a 0.5.

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Jandui Tupinambás 60

Grandezas sociais entre elas e principalmente as grandezas relacionadas com a

desigualdade não são unidimensionais nem lineares com o índice de GINI. Este é o

principal problema destes índices. Um número isolado, independentemente de todo

trabalho estatístico por trás não consegue traduzir toda estrutura de desigualdade de

uma nação. Além disto, estes índices confundem desigualdade do trabalho com

desigualdade do capital mesmo sabendo que são dois tipos de desigualdades bem

distintas e que devem ser tratadas separadamente pois a mitigação de cada tipo exigem

políticas sociais também completamente diferentes.

Por estes motivos, Piketty opta em demonstrar as desigualdades distinguindo os tipos

de desigualdades (trabalho, capital e misto) e estratificando em centiles, deciles, 40% e

50%.

103 O Véu Casto das Publicações Oficiais A OCDE oferece indicadores que camuflam a verdadeira realidade da desigualdade das nações. Usam o índice P90/P10 que corresponde ao valor salarial para se entrar no top 10 centile dividido pelo valor para se entrar nos 90% mais pobres. Estes tipos de índice acabam encobrindo de forma deliberada como se dá a distribuição de renda dentro dos mais miseráveis e a impressionante diferença de renda entre os 10% em comparação com os 1% e os 90%. Fazer a divisão usando valores fixos como os dados oficiais de propósito tem como objetivo camuflar a desigualdade. Por isso, Piketty usa percentuais sobre a renda total, do trabalho ou do capital para fazer a divisão dos 10% (1% + 9%), 40% e dos 50%.

104 De Volta às “Tabelas Sociais” e à Aritmética Política Atualmente as contas nacionais permitem medir a renda nacional e a riqueza a todo ano. Considerando que se tem também dados de toda a população, fica fácil um cruzamento e analisá-los usando o método de decile e centile (1,10%, 40% e 50%) trazendo assim, mais luz para a estrutura da desigualdade atual. Com este método não ficamos restritos em saber se uma nação cresceu o PIB em 1% ou 5%. Temos a chance se saber qual o percentual deste crescimento foi transferido para uma destas 3 ou 4 faixas estipuladas por Piketty. Bom destacar que a tabela proposta por Piketty não é original. Este método era usado ainda no século XVII e XVIII no iluminismo. Eram chamadas de “Tabelas Sociais” e podem ser encontradas na Enciclopédia no artigo “Aritmética Política” de Diderot. Estes tipos de abordagem dissecam a realidade da desigualdade de uma sociedade. Formas bem menos parciais do que os índices unidimensionais e secos inspirados em GINI ou Pareto.

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Capítulo 8 – Dois Mundos Este capítulo tratará da evolução e história das desigualdades de renda e capital desde

o início do século XIX. O choque provocado com as grandes guerras, a compressão da

desigualdade nos períodos dourados de 1950-1980 e a concentração de riqueza que veio

a seguir. Estes fatores não foram em hipótese alguma causados por fenômenos naturais.

As políticas públicas e sociais tiveram um papel importante nas mudanças estruturais da

desigualdade.

105 Um Caso Simples: A Redução da Desigualdade na França no Século XX Desde os tempos da Belle Époque que a desigualdade na França vem caindo. No início

do século XX, antes da primeira guerra mundial, o top decile (10% mais ricos) detinham

de 45 a 50% de toda riqueza da França caindo para 35 a 40% atualmente. Esta queda

da distribuição se deve somente ao capital. No caso dos salários, apesar de novas

habilidades, sociedade do conhecimento, etc, os números permaneceram praticamente

constantes. O colapso do top centile foi devido à queda de renda vinda dos ganhos

financeiros. Nada a ver com compressão das desigualdades como um processo natural

previsto pela visão otimista de Kuznets.

106 A História da Desigualdade: Uma História Política Caótica Estudar a história da desigualdade de um país é na verdade uma maneira rica de estudar

toda a sua história. Os movimentos sociais, as guerras civis, conflitos, etc, são de certa

forma reflexos dos caminhos turbulentos das variações das desigualdades entre as

classes socioeconômicas: a luta entre os deciles, percentiles, 40 e 50% mais pobres

determinam a roda da história.

A história da desigualdade na França é quase um retrato de toda a Europa – com exceção

da Inglaterra cuja realidade é mais semelhante à dos EUA. O choque que o capital tomou,

ou o tombo, teve início com a primeira guerra mundial, agravou-se com a depressão de

1930 e atingiu seu nadir no final da segunda guerra mundial. Após isto, o capital não

conseguiu mais se recuperar ao ponto de chegar nos níveis da Belle Époque.

As duas principais razões da queda do capital no período das guerras: destruição de

ativos e política de taxação do capital.

107 De Uma “Sociedade de Rentistas” Para Uma “Sociedade de Gerentes” O grupo dos top 10% continuam com características semelhantes desde o início da

primeira guerra. Mas temos uma diferença importante hoje: antes, a renda do capital

somente sobrepõe a renda do trabalho quando entramos na faixa dos 0.1% mais ricos.

Em 1932 esta faixa era 5 vezes maior.

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Esta mudança é importante: antes tínhamos os rentistas que viviam no top 1% e tinham

suas rendas garantidas somente com rendimento do capital. Isto é: nem trabalhavam.

Hoje, boa parte dos top 1% são compostos de gestores de empresas onde a origem da

renda vem predominantemente do trabalho. Se o valor pago é proporcional ou não à

sua produtividade, é outra questão.

Mas o que fez com que os rentistas não voltassem com toda força como no alvorecer da

primeira guerra mundial? Os impostos sobre o capital e a herança com certeza, é uma

das razões. Mas não é somente isto. A questão é mais complexa. Outros fatores que

exercera papeis semelhantes aos impostos devem ser considerados.

108 O Mundo Diferente dos 10% Mais Ricos A sessão presente apenas reforça a anterior e mostra detalhes da diferença existente

entre os 10% mais ricos. Destaca que na atualidade, para se alcançar o top 1%, o restante

dos 9% precisam lançar mão de rendimentos fora do trabalho e buscar renda a partir do

capital. As mudanças estruturais básicas nesta faixa comparando com o alvorecer da

primeira guerra mundial:

- A faixa de rentistas era 5 vezes maior que hoje

- Os tipos de profissionais da faixa dos 9% mais ricos (que antes eram 5,6% mais ricos)

mudaram significativamente. Hoje as profissões são um pouco mais diversificadas e mais

especializadas que antes para se atingir o top 10%.

Afora as mudanças de perfil das profissões de forma geral, as faixas dos 40 e 50% pouco

se alteraram durante 100 anos.

109 Os Limites do Imposto de Renda A análise das desigualdades baseadas nas declarações de imposto de renda traz o

problema da evasão fiscal que é invisível aos dados da receita. Assim, sempre que nos

debruçamos em dados oficiais de IR temos que levar em conta que boa parte da renda

vinda do capital não foi declarada. O mesmo não se pode dizer em relação à renda vinda

do trabalho pois esta fonte é mais difícil de sonegação. Para tornar os indicadores destas

fontes mais reais é necessário acrescentar em torno de 2% a 3% (no caso da França. No

Brasil, acredito que estes percentuais sejam um pouco maiores) nas rendas de capital para não

camuflarmos a verdadeira estrutura da desigualdade.

Rendimentos, juros e dividendos são tratados de forma bem parecidas nos países ricos.

Mas o ganho de capital é uma exceção. Nos EUA, por exemplo, a taxação sobre ganho

de capital é feita de forma bem mais controlada do que na França.

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Outra limitação de dados de declaração de imposto de renda diz respeito à origem do

capital fruto da renda adquirida. Este capital é fruto de ganho próprio ou de herança?

Esta questão camufla a importância da herança na estrutura da desigualdade.

Por estes motivos, as fontes de dados vindas da receita federal são analisadas neste livro,

mas sempre acompanhadas de outras fontes para correção e complementação.

110 O Caos dos Anos de Entre Guerras A “dança” da participação dos top 10 na renda nacional das grandes nações mostra quão

turbulento foi o período entre guerras. A partir de 1914, tanto os top decile quanto os

top centiles começaram a sentir a queda. Mas no crash da bolsa de Nova York houve

uma inversão das curvas: os top decile se recuperaram até 1935 enquanto os top centiles

sentiram mais ainda a queda. A explicação pode ser encontrada quando se analisa os

dados mais detalhadamente. O top centile acumulava seus rendimentos em sua maioria

com ações e lucros de empresas as quais, neste período, se encontravam em situação

deplorável. Já os top deciles, em sua maioria, eram os funcionários do alto escalão que

não sentiram tanto a onda de desemprego na época que atingiu basicamente as faixas

abaixo.

111 O Choque das Temporalidades Piketty sempre prioriza as análises de longo prazo de 40, 50 ou mais anos. Mas não

despreza as mudanças estruturais da variação e distribuição da renda de médio e curto

prazo pois estas pequenas mudanças, às vezes, para o tempo de vida de um ser humano

é quase que toda a sua vida. A história da desigualdade da França e outros países é

repleta desses períodos curtos que se distinguem das tendências de longo prazo e devem

ser analisados com cuidado. Um exemplo clássico é o comportamento dos salários nos

períodos de guerra. Geralmente nestes períodos a inflação é alta e os salários mais

baixos são mais protegidos pela inflação do que os salários dos top 10. Além disto, a falta

de mão de obra desqualificada também acaba ajudando a valorizar os salários dos 40 e

50% mais pobres.

Outro exemplo foi o período curto entre 1945 e 1967. Tempos de crescimentos

vertiginosos dado às perdas da guerra e a necessidade das nações de se recuperarem.

Neste período ninguém deu prioridade à mitigação das desigualdades mesmo porque,

elas tinham se suavizado durante a guerra. A partir de 1967 até 1983 um período inverso

se sucedeu: os salários deram uma recuperada aumentando a compressão dos salários.

E novamente, a partir da década de 90, o capital e a renda do trabalho dos top 10 voltam

a se recuperar.

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Observa-se assim, 3 períodos curtos de 1945 até 2010 de descidas e subidas da

desigualdade. Numa análise de longo prazo – 1945 até 2010 – como um todo, podemos

afirmar que tivemos um período estável. Mas olhando com uma lupa, percebe-se a

turbulência do período.

112 O Aumento da Desigualdade na França a Partir de 1980 O que causou o aumento da desigualdade de renda na França a partir de 1980 foi um

fenômeno que já ocorria nos EUA: aumento significativo dos salários dos trabalhadores

da faixa top centile (os 1% mais ricos).

Mas, por ser um processo totalmente novo na França, precisamos de analisar este

fenômeno em uma perspectiva internacional.

113 Um Caso Mais Complexo: a Transformação da Desigualdade nos EUA Os EUA se destacam entre todos os países como sendo o primeiro país a criar a classe

dos “supergestores”. As figuras 8.5 e 8.6 mostram a evolução dos top decile nos EUA

(comprimido e estratificado). Mas esta evolução se deu graças ao incremento dos

salários dos 1% mais ricos e não dos 9% restantes como mostra a figura 8.6.

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A evolução das rendas entre os EUA e a França é bem parecida. Destaca-se, entretanto,

que os EUA na virada do século XX era um país mais igualitário e hoje as coisas se

inverteram: a desigualdade nos EUA é bem maior que em todos países da Europa

ocidental e não só na França.

O que torna o caso dos EUA mais complexo é que diferente da Europa que apenas

recuperou os índices de desigualdade do início do século XX, eles voltaram com uma

desigualdade bem maior que tinham nesta mesma época.

Com os efeitos da guerra, a sociedade dos rentistas na Europa sofreram um impacto

significativo. Já os EUA, por estar longe do palco da guerra, não teve este impacto

distributivo como tiveram os países europeus. Uma das razões da desigualdade nos EUA

ter partido de uma posição inferior no início do século XX para uma posição de destaque

atualmente.

114 A Explosão da Desigualdade nos EUA após 1980 Os tempos dourados dos EUA onde a desigualdade chegou no seu ponto mais baixo se

deu entre 1950 e 1980, pelo menos para os brancos. Paul Krugman nostalgicamente se

refere a este período como “A América que amamos”. Espantosamente a partir de 1980

a desigualdade explodiu e a curva ascendente até 2010 continua firme. A continuar no

mesmo ritmo, em 2020 os 10% mais ricos (top decile) estará abocanhando 60% de toda

renda nacional da América. E ainda temos que destacar que o gráfico da figura 8.5 se

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baseia em declarações de impostos de renda. Logo, valores não declarados e paraísos

fiscais, se possível fosse demonstrá-los no gráfico, teríamos um cenário ainda mais

desigual. Logo, a desigualdade que hoje está em níveis da Belle Époque pode estar a

níveis ainda mais assustadores.

As bolhas de 2000-2001 e 2007-2008 não foram suficientes para suavizar a onda de

desigualdades. Mesmo com os ganhos de capitais despencando, à médio prazo, a

desigualdade nos EUA continuou aumentando.

De acordo com a figura 8.6 nota-se que o grosso da desigualdade está representado no

grupo dos 1% mais ricos e não nos demais 9%.

E entre esses 10% dos mais ricos estão boa parte dos economistas que afirmam que a

economia dos Estados Unidos da América vai muito bem, obrigado. Sem comentários.

115 O Aumento da Desigualdade Causou a Crise Financeira? As crises de 2001 e 2008 não causaram fortes impactos na estrutura da desigualdade

nos EUA. Mas, e o contrário: será que o acentuado aumento das desigualdades pode ter

causado ou ajudado a explodir a crise de 2008, por exemplo? Afinal, os picos de

desigualdades dos EUA ocorreram exatamente nos anos de suas piores crises: crash de

1929 e a crise de 2008. Portanto, este questionamento não pode ser evitado. Do ponto

de vista de Piketty isto é bem claro. O aumento da desigualdade traz diminuição do

poder de compra. Com a diminuição do poder de compra dos 40 e dos 50% mais pobres,

a dívida bancária aumenta e a inadimplência força a crise financeira

Nota-se ainda que a transferência de renda dos 90% mais pobres para os 10% mais ricos

no período de 1980 até 2010 foi de aproximadamente 15% - 4 vezes maior que o próprio

déficit comercial dos EUA. Isto significa que o desequilíbrio entre EUA e os países com

superávit comercial é bem menos significativo do que o desequilíbrio que a própria

economia americana gerou internamente.

Os economistas que moram nos 10% tentam encontrar culpados fora usando o desequilíbrio das

balanças comerciais enquanto o problema está bem mais perto deles. Está entre os seus salários

e os salários dos porteiros de seus prédios ou do salário do garçom que os servem diariamente

ou do salário de sua própria secretária que agenda suas palestras sobre crise econômica.

116 A Ascensão dos Super Salários Durante a segunda guerra mundial os salários se comprimiram fazendo com que a média salarial se aproximasse mais dos 10% mais rico. Este cenário permaneceu inalterado até o final da década de 50. Foi nos meados da década de 70 que os salários dos 10% mais

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ricos começaram a ter uma participação bem maior no total da renda nacional vinda do trabalho.

Alguns alegam que a questão da desigualdade salarial não é tão relevante, pois durante

a carreira de um trabalhador a recuperação seria natural bastando se valer da regra da

meritocracia. Esta é uma falácia que ainda é usada por muitos economistas e

conservadores a qual não se sustenta com os dados vindos das declarações de impostos.

A figura 8.7 a seguir ilustra as fases de compressão e descompressão salarial nos EUA

desde 1910 usando a participação salarial dos 10% mais ricos sobre a renda.

117 Coabitação nos 1% Mais Ricos Apesar da evolução extraordinária dos salários dos “supergestores”, o ganho de renda

vindo do capital continua a prevalecer entre os 1% mais ricos. Em resumo, a população

de indivíduos desta faixa em que o rendimento via trabalho prevalece aumentou na faixa

de baixo crescendo até o patamar de 0.1%. Mas mesmo assim, os poucos que restaram

nos 0.1% detêm 70% de toda renda desta faixa.

Os dois quadros abaixo mostram uma evolução deste comportamento em dois pontos

de alta concentração de renda: no alvorecer do crash da bolsa de Nova York e no

alvorecer da crise de 2008.

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Capítulo 9 – Desigualdade na Renda do Trabalho Neste capítulo será estudado a dinâmica da desigualdade do trabalho em outros países

desenvolvidos além dos EUA e França. O que causou a explosão dos supergestores? Por

que da diversidade da evolução histórica da estrutura da desigualdade entre os países

desenvolvidos?

118 Desigualdade Salarial: Uma Corrida Entre Educação e Tecnologia? A teoria mais aceita para explicar o porquê de as desigualdades salariais serem tão

díspares entre os países é a corrida entre a educação e a tecnologia. Mas ela não explica

tudo. Muito menos, o nascimento dos supergestores ou a explosão das desigualdades

salariais nos EUA a partir da década de 80. De qualquer forma, deixa uma pista para

entendermos a evolução histórica da questão.

A teoria se baseia em duas hipóteses:

a) O salário do trabalhador está baseado na sua produtividade marginal, isto é, o

quanto sua força de trabalho contribui para a produção final da organização na

qual ele trabalha.

b) A produtividade marginal do trabalhador está diretamente relacionada com suas

habilidades e com a capacidade da sociedade em suprir e demandar estas

habilidades.

Por exemplo, se em uma sociedade temos poucos tradutores (fornecimento é baixo) mas

temos muitos livros para traduzir, o mais provável é que a combinação de baixo

fornecimento e alta demanda resultará um salário alto para os poucos tradutores.

A produtividade marginal é uma hipótese um pouco fraca. A força social e organizacional

de um grupo é mais determinante na sua valorização social do que sua produtividade

marginal mesmo porque, esta última grandeza além de ser difícil de ser determinada é

muitas vezes subjetiva. Já a segunda hipótese destaca duas grandezas econômicas e

sociais de papel fundamental na questão da desigualdade salarial: a oferta e demanda

das habilidades dos trabalhadores. No mínimo, estas duas últimas grandezas têm uma

influência crucial nos diferentes grupos sociais. Se a sociedade oferece muita tecnologia

no mercado, mas não consegue treinar no mesmo ritmo seus cidadãos para utilizar estas

tecnologias, esses trabalhadores permanecerão em estágios menos especializados e a

desigualdade salarial tende a aumentar. O contrário já traria uma maior compressão

salarial.

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Piketty cita dois estudos, um feito na França ou nos EUA que comprova a segunda

hipótese e conclui: para diminuir as diferenças salariais, o estado precisa de investir de

forma eficaz na educação.

119 Os Limites do Modelo Teórico: O Papel das Instituições O modelo teórico referido é o modelo da produtividade marginal que por sua vez leva a

especialização do trabalhador que levará à questão da tecnologia e educação. Piketty

mostra com exemplos de capítulos anteriores que a compressão e expansão salarial

frequentes ocorridas nos EUA e França não têm relação com a produtividade marginal e

mostra como a evolução do salário mínimo tanto na Europa quanto nos EUA têm uma

influência muito maior no poder de compra dos salários e na estrutura da desigualdade

salarial do que a teoria da produtividade marginal. O gráfico a seguir mostra a evolução

do salário mínimo na Europa e EUA.

120 Escalas Salariais e o Salário Mínimo Piketty faz uma análise sobre o salário mínimo e sua capacidade de diminuir as

diferenças salariais. EUA e França foram um dos primeiros países a implantar a política

de salário mínimo. A Inglaterra implantou somente em 1999 e a Alemanha usa os

acordos bilaterais para cada ramo industrial – o salário mínimo parece que foi

implantado entre 2013 e 2014. Apesar do salário mínimo ser um fator para evitar muitas

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desigualdades salariais, a melhor maneira para que o trabalhador melhore o poder de

compra do seu trabalho ainda é o investimento público em educação de forma que o

conhecimento não fique aquém do desenvolvimento tecnológico disponibilizado no

mercado.

121 Como Explicar a Explosão da Desigualdade nos EUA? O modelo teórico da produtividade marginal não explicaria o fenômeno dos altos

salários nos EUA a partir de 1980. Muitos economistas se curvam à esta teoria da

especialização e avanços tecnológicos que teria criado uma minoria de gênios gestores

que justificariam seus altos salários a partir da produtividade marginal que estas

habilidades teoricamente ofereceriam às empresas. Mas estes argumentos são fracos e

não convencem.

A variação dos salários na faixa dos 1% e até dos 0.1% dos mais ricos mostra uma curva

bem mais acentuada do que os salários dos demais 9% mais ricos. Ao mesmo tempo ao

se construir um perfil de habilidades desses dois grupos, percebe-se que eles são, senão

idênticos, muitos semelhantes. Logo, apesar das habilidades serem iguais e, portanto, a

produtividade marginal semelhante, os salários das duas faixas tiveram variações bem

diferentes com o grupo dos 1% mais ricos se tornando ainda mais ricos e distantes dos

9% - o que dirá dos 40 e 50% mais pobres.

Logo, a teoria da produtividade marginal a qual está diretamente relacionada com a

meritocracia não explica esta explosão dos super salários. Este fenômeno será melhor

discutido a seguir.

122 A Ascensão do Supergestor: Um fenômeno Anglo-Saxão A explosão de altos salários ter ocorrido em alguns países e não ter ocorrido em outros

é também um forte indicador de que a teoria da produtividade marginal não explica o

fenômeno do supergestor. Coincidência ou não, este fenômeno ocorreu nos países de

língua inglesa: EUA, Inglaterra, Austrália e Canadá. A curva de participação na renda dos

10% mais ricos desses países são bem semelhantes como mostra a figura 9.2 a seguir.

A explicação para a curva se tornar ascendente a partir de 1980 é clara: ascensão

meteórica dos salários dos supergestores.

Por outro lado, as curvas da Alemanha, Japão, Suécia e França não mostram esta

ascensão dos salários dos 10% mais ricos. A figura 9.3 sugere, pelo contrário, uma

estabilização desde a década de 50 com uma ligeira queda e recuperação a partir dos

anos 80.

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Os demais países da Europa possuem curvas semelhantes às curvas dos países não

saxões. Mas não podemos nos deixar enganar: apesar da curva dos demais países não

mostrar uma ascensão tão incrível como a dos países de língua inglesa, percebemos que

a participação dos 0.1% dos mais ricos avançou de forma extraordinária em todos os

países ricos praticamente dobrando em todos eles de 1980 a 2010. Exceção para os EUA

em que a participação aumentou de 5 a 7 vezes.

Por tudo isto dito, temos que a evolução da desigualdade salarial mostrou ser distinta

em diferentes partes do mundo mostrando que a teoria da produtividade marginal e a

evolução tecnológica juntamente com a educação que acompanha esta teoria por ser

homogênea em todos os países analisados, não são suficientes para explicar estas

desigualdades.

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123 Europa: Mais Desigual do que o “Novo Mundo” em 1900-1910 Diferente do que muitos pensam, a desigualdade na Europa no início do século passado

era bem mais acentuada do que nos EUA. A característica americana como o país das

oportunidades, prosperidade e igualdade se esvaía, mas ainda se refletia no alvorecer

da primeira guerra mundial.

Para explicar a concentração excessiva de renda na Europa, incluindo os países

escandinavos e o Japão, temos que analisar a questão da concentração do capital nestes

países na época. Porque o capital era tão concentrado na Europa e Japão?

A resposta para esta questão está relacionada diretamente com a baixa taxa de

crescimento populacional destas regiões o que resulta automaticamente em uma maior

concentração de riquezas refletindo diretamente na desigualdade salarial.

124 Desigualdades nas Economias Emergentes: Menor do que nos EUA? Piketty conseguiu analisar dados de alguns países pobres ou emergentes: África do Sul,

Índia, China, Argentina, Colômbia e Indonésia. Observou que as desigualdades salariais

são semelhantes aos países desenvolvidos com dois pontos fora da curva: China como o

país menos desigual e Colômbia como o mais desigual trazendo indicadores piores que

dos EUA. A figura 9.9 a seguir mostra a famosa curva em U demonstrando a ascensão,

queda e nova ascensão dos 10% mais ricos (semelhante à recuperação do capital).

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Curiosidade: conseguir recuperar dados tanto em países emergentes quanto em países

ricos não é tarefa fácil. Com o advento da informática na década de 90 paradoxalmente,

a tarefa se tornou ainda mais difícil pois a busca de dados em sistema legados na maioria

dos casos é praticamente impossível. Esta é uma das razões dos gaps de dados que

aparecem na figura 9.9.

125 A Ilusão da Produtividade Marginal Comparar os níveis de desigualdades salariais entre EUA e os países de economia

emergente coloca a teoria da produtividade marginal em cheque. Afinal, se a teoria

explica a diferença quase sobrenatural dos salários dos top 1%, poderíamos afirmar que

a educação nos EUA é mais precária do que a educação na Índia ou África do Sul pois por

lá, as desigualdades salariais são menores. Lembrando que a consequência de falta de

oferta de educação de qualidade é exatamente aumento da desigualdade salarial entre

os menos especializados e os mais abastados de conhecimento.

Para Piketty, a explicação para a desigualdade salarial dos EUA ser tão maior do que nos

demais países é a que segue. Determinar uma produtividade marginal para

trabalhadores de linha de produção ou de um garçom, por exemplo, não é tarefa difícil.

Mas tentar medir a produtividade marginal de um gestor sênior de uma grande empresa

é uma tarefa impossível. Esta determinação acaba se confundindo com uma construção

ideológica para justificar o status do gestor que oprime o trabalhador comum. A

determinação de salários dos altos executivos é responsabilidade de quem? Ora, dos

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próprios executivos. Quando acusamos que os políticos determinam seus próprios

salários, esquecemos estes pequenos detalhes. Apesar da tal da governança corporativa

que possui regras distintas de país para país e muitas vezes suas regras são dúbias e até

falhas – principalmente quando se refere à interesses dos espécimes que habitam o topo da

cadeia usurpadora.

126 A Decolagem dos Supergestores: Uma Força Poderosa de Divergência Forças divergentes: ver sessões 5 e 6.

A abordagem relativa aos salários astronômicos dos supergestores considerando normas

sociais internas das grandes empresas parece plausível, mas apenas desloca a

compreensão do fenômeno para um outro nível. Nos movemos de um contexto

econômico para uma problemática multidisciplinar envolvendo questões sociológica,

política, psicológica, histórica e social.

Independente da multidisciplinariedade da questão, a bondade do sistema com os

salários dos gestores das grandes empresas é um fator poderoso de força divergente

mesmo porque, esses gestores têm poder suficiente para fazer pressão política para que

a tabela de imposto de renda continue sendo sempre boazinha para eles.

Capítulo 10 – Desigualdade da Propriedade do Capital O capítulo tratará da desigualdade das riquezas em geral. A questão é mais importante

do que a desigualdade da renda do trabalho pois o fenômeno é mais concentrador e

mais global. A desigualdade do trabalho é um fenômeno com limitações geográficas. Já

a acumulação do capital no início deste século se mostra mais firme e geral.

127 Riqueza Hiperconcentrada: Europa e América A riqueza, isto é, a renda advinda somente do capital sempre foi mais concentrada do que a riqueza da labuta. Em qualquer sociedade que conhecemos os 50% mais pobres não possuem mais que 5% de toda riqueza enquanto os 10% mais ricos possuem de 60% a 90% dela. Estes números podem ser bem detalhados para os países que conservaram seus dados históricos: EUA, Inglaterra, França e Suécia.

128 França: Um Observatório da Riqueza Privada França é o país com o maior registro confiável relacionado com a distribuição de riqueza em todo o mundo desde o final do século XVIII até os dias de hoje.

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A revolução francesa impôs em 1791 impostos sobre propriedades e doações de herança para qualquer tipo de riqueza – imóveis, estoque, propriedade urbana, fazendas, bônus e qualquer outra forma financeira de capital independentemente se os proprietários eram cidadãos comuns ou nobres. Controle das riquezas neste nível da França só começou a ocorrer 100 anos depois na Grã-Bretanha e logo após em outros países como os EUA que implementou controles a partir de 1916.

Curiosamente, as taxas de impostos na França impostas pela revolução eram agradáveis para os mais ricos pois eram taxas irrisórias de 1% a 2%. Se tornaram progressivas somente a partir de 1901 após batalhas longas no parlamento.

129 As Metamorfoses de Uma Sociedade Patrimonial A estrutura do capital foi totalmente transformada entre os séculos 18 e o início do século 20 (capital de terra substituído por capital financeiro, industrial e imobiliário). Contudo, o total de riqueza medido em anos de renda nacional permaneceu relativamente estável.

Em relação à distribuição de renda houve uma melhora causada pelos períodos das duas grandes guerras mundiais. No entanto, a partir da década de 70 observa-se uma recuperação clara do capital até os dias de hoje como mostra a figura 10.1 a seguir.

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130 Desigualdade do Capital na Europa da “Belle Époque” Vimos que o nível de desigualdade na Europa no período da Belle Époque (1871 – 1914) foi um dos mais terríveis da história. A revolução francesa nos deu uma certa ilusão de que a iniquidade na Inglaterra seria bem maior que na França. Mas os dados mostram que a concentração de renda na França neste período era praticamente igual à da Inglaterra. Talvez, um pouco pior. A figura 10.3 mostra a evolução da riqueza dos 10% mais ricos da França. Observem como a desigualdade percorria uma curva ascendente mesmo após ter ultrapassado 60% em 1890 até se deparar com a primeira guerra mundial.

Mais impressionante são os dados históricos da Suécia onde se descobre que a desigualdade do capital não era tão diferente da França ou Inglaterra. Atualmente é um pouco menor que na França: os 10% mais ricos hoje na Suécia possuem 60% de toda riqueza do país enquanto na França os mesmos 10% possuem 70%. Em ambos os casos, a inclinação das curvas mostra forças divergentes atuando.

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131 A Emergência da Classe Média Patrimonial Antes de terminarmos este capítulo teremos que responder três questões fundamentais:

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1. Por que a desigualdade era tão extrema e ainda seguia em ascensão até a primeira guerra mundial?

2. Por que, apesar da recuperação do capital no início do século XXI, a desigualdade ficou bem abaixo do recorde histórico?

3. Finalmente, esta situação seria irreversível?

Uma das chaves para entender estas questões é a presença de uma nova classe detentora de até um terço de toda a riqueza nacional: a classe média (os 40% da hierarquia da riqueza).

Apenas lembrando a hierarquia traçada por Piketty para analisar a distribuição de riquezas:

Classe A: 1% dos mais ricos (elite) Classe B: 9% dos mais ricos (classe alta) Classe C: 40% abaixo (classe média) Classe D: 50% restantes (ralé)

Lembrando que os 50% mais pobres continuaram com o mesmo perfil em toda a Europa: possuem de 5% a, no máximo, 10% da riqueza nacional.

Esta foi a grande mudança estrutural que pode ser observada em toda a Europa: o nascimento de uma classe que passou a ser proprietária de um quarto a um terço das riquezas.

132 Desigualdade de Riqueza na América Muitas diferenças entre Europa e EUA de destacam no período analisado desde 1800. No início deste período, por exemplo, o nível de desigualdades nos EUA era semelhante ao nível de desigualdade da Suécia no período de 1970-1980. Isto não seria surpresa pois o país ainda era de imigrantes que chegaram sem nenhuma riqueza e pouco tempo ainda tinha se passado para que as riquezas pudessem ser acumuladas. Se considerássemos somente os estados do norte dos EUA, o nível de desigualdade seria ainda menor do que os níveis da Suécia. Por outro lado, o sul dos EUA mostrou desigualdade pior que os níveis da Europa da Belle Époque. Ainda no início do século XX os EUA ainda se mostravam um país mais igual do que a Europa, mas já se observava uma curva ascendente da desigualdade desde então que iria ultrapassar a curva da Europa no final da década de 50. Percebia-se desde o final do século XIX que os americanos aos poucos iam perdendo seu pioneiro espírito igualitário apesar das taxas progressivas de impostos que impuseram ainda em 1916.

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As diferenças entre EUA e Europa são interessantes. A Europa no período de 1950 a 1970 experimentou uma queda acentuada na desigualdade. O espírito capitalista sumiu dando lugar a uma atmosfera mais socialista com uma maior presença do estado fazendo o papel de proteção social. Mas, a partir de 1980 houve uma inversão. E até hoje, os europeus se perguntam porque a época dourada de 1950-70 se esvaiu e quando chegará o dia que o gênio do capitalismo voltará para sua garrafa.

Já nos EUA, foi o contrário. A partir de 1950 as desigualdades se acentuaram ultrapassando a Europa e ao invés de quererem que o gênio do capitalismo voltasse para a garrafa, a cada aumento da desigualdade, mais eles se apegavam às crenças do livre mercado na ilusão de que o capitalismo fosse a solução para a nação americana. O fenômeno Bernie Sanders – eleições presidenciais 2016 - talvez seja um sinal de que a descrença ao capitalismo tenha iniciado seu processo por lá.

133 Os Mecanismos da Força Divergente: r Versus g na História Vamos tentar explicar agora o fenômeno da hiperconcentração de renda na Europa no século XIX até o início da primeira guerra seguido de uma suavizada no período entre guerras até início da década de 70 e novamente uma retomada das desigualdades sem, contudo, alcançar os níveis mais alarmantes do início do século passado.

Para relembrar as grandezas r, s e g vá às sessões 6, 15 e 55.

A principal razão para a hiperconcentração da riqueza antes da primeira guerra mundial seria a baixa taxa de crescimento das nações associado à alta taxa de retorno do capital em comparação com o crescimento. Como já foi dito brevemente em sessões anteriores r > g é um fator que se destaca como força divergente. Funciona como se segue. Um mundo onde o crescimento econômico girava em torno de 0.5% a 1% e ao mesmo tempo r (retorno do capital) girava em torno de 4% a 5% significa que temos um retorno relativo muito grande em relação ao crescimento econômico.

Imagine nossa Ilha onde a produção de sandálias praticamente não cresce no ano e, ao mesmo tempo, o capitalista que emprestou alguns cestos para a produção das sandálias obtém todo ano algumas sandálias como pagamento.

Isto significa que a acumulação da riqueza ocorrerá de forma bem mais rápida do que o aumento da produção. Este cenário é um cenário de uma sociedade de heranças que nos leva a um ambiente severamente desigual onde as fortunas tendem sempre a aumentar enquanto a riqueza para quem não possui capital para usufruir do seu retorno fica estagnada ou decresce.

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A figura 10.7 mostra como o fator r era superior à taxa de crescimento g: idêntico ao cenário descrito acima. A renda vinda do capital chegava a 40% da renda nacional e isto era o suficiente para gerar uma poupança de 10% que era o suficiente para garantir um crescimento da riqueza bem maior do que a renda nacional e assim, fazia a concentração de riqueza aumentar (ver figura 10.8).

134 Porque o Retorno do Capital é Maior Que a Taxa de Crescimento? Muitos economistas acham estranho r > g em um período tão longo da história. Como seria isto possível? A história e os dados coletados mostram que foi assim.

Desde a antiguidade até o final do século XVII, o crescimento líquido (considerando a taxa de crescimento populacional) nunca excedeu 0.1% a 0.2% por muito tempo. Enquanto isto, a taxa de retorno do capital girava sempre em torno de 4-5%. Muitos dados mostram que este intervalo é coerente. Mas, mesmo supondo que o retorno girasse em torno de 2-3% ainda assim, temos um valor r 10 a 20 vezes maior que g. A figura 10.9 mostra a evolução dos dois indicadores numa escala de longuíssimo prazo.

A taxa de crescimento no século XX, por outro lado, se mostrou bem maior que a média de 0.1-0.2% girando em torno de 3.5-4% ao ano. Isto explica porque, apesar da recuperação do capital no século XX, hoje os índices de desigualdade aumentaram, mas não chegaram nos patamares da Belle Époque europeia.

A perspectiva para o século XXI como já mostrado é de índices tímidos de crescimento de, no máximo 1.5% ao ano. Isto nos leva obrigatoriamente a pensar em conter o capital através de taxas progressivas de impostos e outras ações contundentes. Caso contrário, a grande diferença de r e g pode fazer com que os níveis de desigualdade que vigoravam no alvorecer da primeira guerra mundial voltem mais fortes ainda.

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E nunca é demais lembrar que a sociedade nunca reage de forma pacífica quando as desigualdades atingem valores que precederam a grandes guerras mundiais.

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135 A Questão da Preferência Temporal r > g é uma realidade e evidência histórica mas não significa que uma sociedade possa conviver com o inverso mesmo sem a intervenção do estado. Tudo depende de como o capital é empregado – tecnologia – e por outro lado, as atitudes dos cidadãos relativos a poupança e propriedade. O capitalista pode, simplesmente, estocar seu capital sem aplicá-lo nos meios de produção. Neste caso teríamos r = 0. Mas na prática, isto é raro na história. A média histórica do retorno do capital r gira sempre em torno de 4-5% e no pior caso, 3-4%. O fenômeno econômico que explica esta constante de r se chama “preferência temporal” e é representada pela letra grega θ. Funciona assim: se o indivíduo está disposto a economizar 105 no futuro para gastar 100 a mais no presente, então θ é igual a 5%. Assumindo uma taxa de crescimento de 0% não fica difícil deduzir que o retorno do capital r tem que ser igual à preferência temporal θ.

Logo, de acordo com esta teoria, a explicação para que r fique sempre em torno de 4-5% é psicológica uma vez que r refletirá sempre uma média da impaciência do indivíduo perante o futuro.

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O problema desta teoria é seu simplismo. Tentar encapsular todo comportamento humano de poupança e sua postura diante o futuro em um simples parâmetro psicológico é um tanto quanto ingênuo.

Resumindo, podemos dizer que a taxa de crescimento g tende a ser estruturalmente baixa (geralmente, no máximo 1% ao ano no caso de transições demográficas já completas e o país atingindo a fronteira tecnológica onde o ritmo da inovação é mais lento). Por outro lado, a taxa de retorno do capital r depende de vários fatores tecnológicos, culturais, sociais e psicológicos que juntos, resultam mais ou menos nos 4-5%.

136 Existe Um Equilíbrio de Distribuição? Vamos retornar à questão central e das mais importantes deste estudo: a inequação r > g ser persistente a longo prazo é uma força divergente de desigualdade das mais potentes. Por exemplo, se a taxa de crescimento g = 1% e a taxa de retorno do capital r = 5%. Os indivíduos abastados precisam investir somente 1/5 do seu capital anual para garantir que seu capital cresça tão rápido quanto a renda média. Diante de um quadro desse, a única força que pode impedir uma espiral de desigualdade é a seguinte. Se a fortuna dos indivíduos ricos cresce mais rapidamente que a média da renda, a razão capital / renda irá crescer indefinidamente o que, a longo prazo nos conduz a um decréscimo do fator r de retorno do capital. Este processo pode, no entanto, levar décadas, especialmente em economias abertas onde indivíduos ricos podem acumular ativos fora de suas fronteiras. A princípio este processo chega a um fim, mas isto obviamente, pode levar tempo.

O controle da herança também é uma questão central que pode contribuir para diminuir as forças divergentes da desigualdade. A herança é o principal meio de se concentrar riquezas. A forma como era feita antes da revolução francesa era mais concentradora ainda pois considerava o filho mais velho como o único herdeiro. Esta prática aos poucos foi sendo abandonada em todas as nações, mas mesmo assim, a herança ainda é um fator que perpetua a desigualdade. A forma para amenizar mais ainda é implementar meios legais de taxá-la.

137 O Código Civil e a Ilusão da Revolução Francesa Mesmo após a implantação do código civil (1804) e após todas resoluções socialistas da revolução francesa, a desigualdade no século XIX continuou a crescer atingindo picos exorbitantes no período da Belle Époque e com índices parecidos aos da época da aristocracia e monarquia britânica. Qual seria a razão desta aparente contradição?

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O fato concreto é que a revolução francesa não atuou de forma firme para diminuir a taxa de retorno do capital r em relação à taxa de crescimento g. A taxação de renda implantada não era progressiva e os percentuais, além de pífios, eram fixos em 1-2% independentemente da faixa de renda de cada indivíduo. Isto conservou o gap r – g alto a longo prazo causando uma maior desigualdade de renda. O fim da herança baseada somente no filho mais velho ajudou um pouco, mas foi irrisório levando em consideração que a diferença r -g se mostrou constante por longos tempos. Por mais incrível que possa parecer, a desigualdade na França de 1913 era maior que a desigualdade da Inglaterra da família real e dos aristocratas.

Enfim, a desigualdade na França chegou a 70% de toda riqueza pertencente aos 10% mais ricos. Fica uma questão: se não tivesse ocorrido choque de capital no período entre guerras, qual seria o limite máximo que a sociedade europeia suportaria de desigualdades?

138 Pareto e as Ilusões da Desigualdade Estável Vilfredo Pareto desenvolveu sua teoria chamada “Lei de Pareto” entre 1890 e 1910 onde afirmava que as desigualdades sociais são fenômenos estáveis e, portanto, sem necessidade de interferências quaisquer. Tal lei foi abraçada pelos movimentos fascistas da Itália e Pareto, antes de morrer, saudou Mussolini no poder.

Fazendo uma análise retrospectiva da lei de Pareto fica fácil de concluir a superficialidade de sua teoria. Pareto se baseou em alguns dados de, no máximo, uma década da Prússia, Inglaterra e Suíça. Os dados, inclusive, mostram uma tendência à desigualdade se acentuando e, claramente, Pareto se esforça para esconder esta tendência.

A verdade é que a base de dados utilizada por Pareto não o credencia a afirmar nada sobre qualquer tendência acerca da desigualdade no mundo. O caso Pareto é interessante pois ilustra o ramo da economia que se apoia ilusoriamente na matemática para tentar justificar as desigualdades sociais. Pareto desenvolveu uma família de funções para demostrar a relação entre o decrescimento de contribuintes à medida que se sobe na hierarquia de rendimentos. Todas suas funções possuem parâmetros que fazem com que tal comportamento se adapte a elas não interessando se estamos falando de desigualdades na Suécia, EUA ou França. Basta ajustar os parâmetros e temos, então, a curva de Pareto. As questões sociais, políticas e econômicas são postas de lado e passam a valer somente suas funções e seus parâmetros. Após ajustar os parâmetros, suas funções irão demonstrar que a desigualdade representada gráfica e matematicamente, não passam de leis naturais da sociedade.

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Enfim, Pareto é uma farsa que o fascismo de Mussolini deu guarida. Nos faz lembrar das políticas neoliberais que o Brasil sofre desde Sarney até os dias de hoje (incluindo em certa medida o governo Lula-Dilma com seus juros elegantemente mantidos no topo do mundo) onde se tenta justificar com fórmulas de planilhas eletrônicas as políticas econômicas de inspiração rentista.

139 Porque a Desigualdade de Riqueza não Retornou aos Níveis do Passado Voltando à questão essencial: porque os níveis de desigualdade não voltaram aos níveis da “Belle Époque”? Podemos ter a certeza de que esta situação é estável e irreversível? A questão é complexa e não temos uma fórmula matemática para tentar responde-la com precisão.

Sobre o choque ocorrido no período entre guerras onde a desigualdade decaiu temos uma explicação mais simples e fácil. Os impactos do capital devido às duas grandes guerras somados às ações políticas da época provocaram um colapso no capital levando o fator r (Capital / Renda) a níveis mais suaves que hoje.

O período entre guerras deu a ilusão aos mais ricos de um sistema estável e balanceado. O que ocorria era uma corrida dos milionários aos capitais acumulados para manter seu estilo de vida. E assim, o capital foi se deteriorando impactando nas gerações vindouras. Tanto é que a média de rendimentos dos 1% mais ricos no período da Belle Époque girava em torno de 80-100% do salário médio da época enquanto o rendimento dos 1% mais ricos em 1930 girava em torno de 30-40% do salário médio.

Notem que a pergunta é mesmo complexa pois Piketty ainda não a respondeu.

140 Algumas Explicações Parciais: Tempo, Impostos e Crescimento Enfim, não é surpresa de forma alguma que a desigualdade diminuiu entre 1914-1950. O mais curioso e de explicações menos triviais diz respeito a não total recuperação do capital após 1950. É importante destacar que acumulação de capital não é um processo de curto prazo. O nível alto de acumulação de riquezas na Belle Époque, por exemplo, foi fruto de acumulações anteriores, não de décadas, mas de séculos. Portanto, o capital não se recuperou exatamente no período 2000-2010. Ele vem se recuperando desde então e continua a se recuperar. É um processo contínuo. Em outras palavras, uma das razões pela qual o capital não é tão desigualmente distribuído como no alvorecer da primeira guerra mundial diz respeito ao tempo. Pouco tempo se passou desde o final da segunda guerra para que a concentração ainda não atingisse os níveis horríveis de 1910. O tempo é, pois, parte da explicação. Mas não o suficiente.

Quando observamos que os 1% mais ricos em 1910 com 60-70% da renda nacional contra 20-30% atualmente, fica claro que o choque entre guerras causou uma mudança

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estrutural de tal forma que até agora tem evitado os níveis de desigualdade do início do século XX. Uma destas mudanças é a taxação do capital exercido pelos estados. Antes da primeira guerra o capital (lucros, dividendos, ações, etc.) não eram taxados e quando eram, as taxas eram irrisórias e não progressivas.

141 Século XXI: Ainda Mais Desigual Que o Século XIX? Além dos fatores tempo, impostos e crescimento ainda temos alguns fatores que exercem influência importante sobre a desigualdade: o decrescimento do capital sobrea a renda e da taxa de retorno do capita no longo prazo. A taxa de crescimento da produção no século XXI deve ser tímida não ultrapassando 1.5% mas mesmo assim será maior do que as taxas históricas dos séculos anteriores ao século XIX. Assim, os níveis de desigualdades tendem a não se igualarem aos níveis do final do século XIX mesmo se as políticas econômicas das nações não taxarem firmemente o capital.

Mas não temos motivo para regozijo. Provavelmente a desigualdade não atingirá os níveis do passado, mas a probabilidade de continuar a crescer substancialmente é grande. E, como já dito, a questão não se consegue ser resumida com fórmulas matemáticas. Existem forças divergentes atuando que podem levar a uma desigualdade ainda maior que as vividas antes da primeira guerra. Por exemplo, a taxa de crescimento, apesar da previsão de crescimento médio de 1.5% pode vir a se tornar negativa fazendo com que a questão da herança exerça um papel fundamental na concentração de riquezas. Além disto, o mercado de capital pode se tornar mais e mais sofisticado de forma a fazer com que o fator r siga em ascendência e sabemos que este fato é outro fator de força de divergência.

Resumindo, o fato é: o menor nível de desigualdade hoje na Europa em relação à Belle Époque se deve a questões do acaso como as duas grandes guerras e as questões pontuais de taxação de capital. Enfim, tudo é incerto. Podemos caminhar para um século novo mais desigual ou não. Mas uma coisa podemos afirmar: é uma ilusão pensar que existe algo de natural no crescimento moderno ou que as leis do mercado de capital irão contribuir para diminuir as desigualdades e que uma harmoniosa estabilidade se alcançará.

Capítulo 11 – Mérito e Herança a Longo Prazo Para entender melhor a evolução e a acumulação do capital no século XXI vamos usar o

presente capítulo para analisar a evolução a longo prazo das regras da herança e a

poupança na formação do capital. A acumulação do capital sempre se dá pela herança

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ou poupança. Um século atrás, a herança era a principal maneira de se acumular capital.

Atualmente os indivíduos estão poupando mais tornando este comportamento mais

significativo no acúmulo do capital. Uma das razões para esta mudança pode ser

explicada no aumento significativo da expectativa de vida. Não significa que a herança

fica em um segundo plano. Ela também irá exercer papel importante na acumulação do

capital no século atual.

Pode-se concluir, considerando que a diferença r – g ainda é discrepante, que a herança

superará a poupança pois o capital acumulado no passado renderá mais no presente do

que a riqueza guardada no presente através do trabalho.

142 A Herança Flui a Longo Prazo Uma coisa é certa: existe somente duas maneiras de se acumular capital: via herança ou

via trabalho. A questão central é em que proporção ocorre estes dois tipos de

acumulação do capital nos 10% e nos 1% mais ricos. Para analisar a sistemática de

acumulação de capital vamos acompanhar o fluxo das riquezas que passam de geração

em geração através da herança tomando a renda nacional como comparativo.

A figura 11.1 a seguir mostra o fluxo da herança no tempo na França desde 1820 até 2010. Nota-se que a herança participava com até 25% da renda nacional até o início da primeira guerra e continuou caindo e só recuperando após a segunda guerra mundial. Neste período de alta da herança, quase que a totalidade do estoque de capital vinha da herança. Vê-se assim, que as tragédias vividas pelos personagens de Balzac eram histórias reais onde o protagonista era encorajado a trocar os estudos pelo casamento com herança garantida para galgar os degraus da nobreza.

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A evolução da curva durante o final do século 19 até 2010 mostra uma mudança profunda na estrutura da desigualdade na Europa. Existe uma crença de que não mais vivemos a era da herança onde se podia garantir a posição social dos ascendentes através da riqueza acumulada e transmitida. Realmente, hoje a participação da herança é bem menor que no início do século passado mas vem se recuperando e já é 4 a 5 vezes maior do que era no final da segunda guerra mundial. Podemos viver novamente os tempos de Balzac se o crescimento demográfico e econômico se mostrar pífio e o retorno do capital r continuar acima de 2.5-3%.

143 Fluxo Fiscal e Fluxo Econômico Piketty, para garantir a confiabilidade dos dados levantados sobre herança na França, utilizou-se de duas fontes distintas para desenhar o gráfico do fluxo de herança: o fluxo fiscal e o fluxo econômico. Apesar de ser fontes totalmente distintas vê-se pelo gráfico que uma valida a outra. A curva do Fluxo Fiscal fica sempre um pouco abaixo da outra curva provavelmente devido aos ativos que são sonegados nas declarações de imposto de renda.

144 As Três Forças: a Ilusão do Fim da Herança A vantagem de se utilizar uma abordagem do fluxo de herança no tempo é que ela requer uma visão das três forças que a determinam. Para expressar o fluxo de herança tomando como base a renda nacional usamos a seguinte expressão:

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by = μ × m × β,

onde by representa o fluxo de herança

μ representa a razão entre a média da riqueza no fim da vida e a renda média dos indivíduos ao longo da vida.

m é a taxa de mortalidade.

Uma análise resumida das três forças:

β = razão do capital privado e a renda nacional. Note que aqui utiliza-se somente a renda privada uma vez que a renda pública não pode ser considerada na herança. Logicamente se, em um dado período uma sociedade possui um fluxo alto de herança então, a quantidade de capital que pode ser usada como herança também é grande.

m - taxa de mortalidade também é uma igualdade lógica. Quanto maior a taxa de mortalidade, maior o fluxo de herança.

μ Vamos supor que a média de riqueza na hora da morte é a mesma média da riqueza da população como um todo. Assim, μ = 1. Então, by – fluxo da herança é igual ao produto da taxa de mortalidade e a razão β.

Claramente, μ depende diretamente da quantidade de riqueza guardada no tempo. Quanto mais a riqueza aumenta com a idade mais alto será μ e assim, mais alto será o fluxo by.

145 A Mortalidade no Longo Prazo A segunda força que pode explicar o fim da herança é o aumento na expectativa de vida que diminui a taxa de mortalidade m. Mas todo cuidado é pouco antes de se chegar a qualquer conclusão. Esta diminuição no fluxo de herança pode ser temporária ou não. Imaginemos primeiramente um cenário onde a taxa de mortalidade está diminuindo e a taxa de natalidade também diminuindo. Chegará um momento que as pessoas vão ter que morrer mesmo com a taxa de mortalidade em descenso. Neste momento, considerando que a população irá diminuir devido à baixa taxa de natalidade, o fluxo de herança passará a ser mais significativo. Por outro lado, um cenário onde a taxa de mortalidade também caia, mas a taxa de natalidade aumentando, a herança não será um fator divergente na desigualdade.

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146 A Riqueza Envelhece Com a População: o Efeito μ X m Agora vamos imaginar o cenário onde, a longo prazo, as faixas etárias permanecerão constantes, mas a taxa de mortalidade é baixa. Se os indivíduos demoram mais a morrer logo, o fluxo de herança diminui, certo? Na verdade, não é bem assim. Se a expectativa de vida sobe de 60 para 80 anos, a média de idade com que um filho receberá sua herança subirá de 30 para 50 anos. Por outro lado, a própria riqueza em “disputa” também sofrerá o fenômeno do aumento de expectativa de vida. Isto é: o indivíduo ao demorar mais anos para morrer irá acumular mais capital. Assim, a expectativa de vida como coeficiente negativo no fluxo é confrontada com o aumento do valor da herança fazendo com que a equação do fluxo de herança permaneça, no mínimo, estável. Matematicamente podemos representar este raciocínio com a expressão no título: μ X m onde o primeiro coeficiente é influenciado para cima pelo aumento da riqueza da herança e o segundo coeficiente influenciado para baixo com a queda da mortalidade.

147 Riqueza dos Mortos e Riqueza dos Vivos Piketty apresenta dados para desmistificar a afirmação de que a era das heranças não existe mais. A herança ainda é um fator importante para conservar o status quo sendo um dos instrumentos mais importantes de força divergente. Desde 1820, como mostra a figura 11.5 a seguir, a riqueza dos mortos está sempre acima da média da riqueza dos cidadãos. Exceção apenas ao período da segunda guerra mundial.

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148 Os Cinquentões e os Velhos de Oitenta anos: Idade e Fortuna na Belle Époque Usando dados da França desde 1820, observa-se que a média da riqueza dos mais velhos chegou a níveis extremos em 1912 quando a média da riqueza dos indivíduos acima de 80 anos chegou a 253% maior do que a riqueza da faixa de 50-59 anos. Sabemos que este fenômeno não pode ser explicado pelo valor do trabalho mesmo porque, com 80 anos o indivíduo não consegue mais produzir com tanta eficiência quando era mais jovem. Na verdade, é consequência direta da desigualdade r > g e a lógica acumulativa e exponencial que esta diferença acarreta. Sabemos que o indivíduo na faixa dos 1% mais rico, à medida que envelhece vai virando sua fonte de riqueza do trabalho para o rendimento do seu próprio capital se tornando um rentista e, se o crescimento da renda nacional é baixo como era na Belle Époque e a diferença entre r e g acentuada, a desigualdade aumenta expressivamente e a lógica das heranças garante sua manutenção.

149 O Rejuvenescimento da Riqueza em Virtude da Guerra Este mecanismo que se auto sustentou por muito tempo foi abaixo com o choque do capital de 1914-1945. A consequência é um forçado rejuvenescimento da riqueza que pode ser visto de forma clara na figura 11.5 anterior. Este fenômeno também pode ser visto no fato de que em 1947, por exemplo, o grupo de indivíduos entre 50-59 anos acumulava mais riqueza que o grupo dos octogenários. Fato único nos registros da história da riqueza da França.

O rejuvenescimento da riqueza é de simples explicação: com a destruição de imobilizados e ativos com a guerra somado às empresas que iam à falência, levaram os ricos ao abismo. Os mais velhos não tinham a força que os mais novos tiveram para se recuperar. Por isto esta transferência da riqueza entre as faixas mais velhas para as faixas mais novas. Este cenário foi propício para alastrar a ideia de que o capitalismo seria um sistema econômico superado.

Mas este foi um cenário breve. A base da sociedade nada tinha mudado. O status-quo permanecia inalterado. E assim, a faixa de 50-59 que se tornaram os mais ricos foi

envelhecendo e o fator r > g incumbiu de torná-los os mais ricos quando chegaram na faixa de 60-69 e assim, chegamos em 2010 com uma realidade semelhante à de 1912. Portanto, o fluxo de herança volta a ter um papel preponderante como força de divergência.

150 Como o Fluxo de Herança Irá Evoluir no Século XXI? Considerando que questões culturais não irão mudar radicalmente o comportamento

dos indivíduos durante o século XXI em relação à poupança, os cenários mais prováveis

desenhados por Piketty baseados em baixo crescimento tanto populacional quanto de

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renda e retorno do capital insistindo em permanecer entre 2-5% nos leva a concluir que

o fluxo de herança será fator importante de força divergente durante todo o decorrer

deste século. Caso o crescimento do PIB mundial se mostrar baixo – que é o mais

provável – e o retorno do capital se situar em torno de 4-5%, o papel do fluxo da herança

passará a ter o mesmo peso do período da Belle Époque (1871-1910).

É ilusório imaginar que o aumento da expectativa de vida irá diminuir o papel de

transferência de riquezas. Pelo contrário. Com mais tempo para acumular riquezas a

partir de rendimentos financeiros, a tendência é o fluxo se tornar mais forte. Afinal, a

expectativa de vida pode aumentar, mas todos um dia irão morrer.

151 Do Fluxo Anual de Herança Para Estoque de Riqueza Herdada Piketty apenas reforça o importante papel da herança no século XXI contradizendo boa

parte dos economistas que acreditavam que a herança iria perder a importância como

fator de acúmulo da riqueza. De todo conjunto de dados analisados na França, somente

na década de 70 que a riqueza acumulada durante a vida pelos mais ricos ficou acima da

riqueza herdada. A partir da década de 80, a herança se recupera podendo voltar aos

tempos de 1910 como ele já disse nas sessões anteriores.

Desde 1820 que a herança transferida equivale à riqueza total adquirida mostrando o

baixo crescimento de renda em relação ao retorno do capital. O título da sessão quer

dizer isto: durante todo este período, a riqueza herdada foi a base da criação de novas

riquezas.

152 De Volta ao Vautrin de Balzac Vautrin, talvez o personagem mais vil de Balzac disse mais ou menos assim em Pere

Goriot:

“Que tipo de vida alguém pode esperar viver ganhando seu próprio dinheiro comparado

com a vida que podemos ter casando com alguém com uma grande herança? ”

Os romances de Balzac ilustram como a herança era realmente algo determinante na

hierarquia da riqueza na época da Belle Époque. Nesta sessão Piketty apenas reforça a

recuperação da força da herança a partir da década de 80. O poder da herança apenas

sofreu uma queda devido aos choques no capital graças às duas grandes guerras.

Considerando os prováveis valores dos indicadores g, r e a estabilidade da taxa de

crescimento populacional, Piketty reforça que a importância da herança como força

divergente pode voltar aos níveis do início do século XX.

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153 O Dilema de Rastignac O Dilema de Rastignac: aqueles que de alguma forma conseguem colocar as mãos em

uma boa herança estariam em chances de ter uma vida melhor do que aqueles que são

obrigados a galgar as hierarquias sociais através do seu próprio trabalho.

Piketty traça um gráfico mostrando o padrão de vida das pessoas mais ricas nascidas

desde 1790 comparando o padrão de vida dos 1% mais ricos por herança e os 1% mais

ricos por rendimento do trabalho. Observa-se que o padrão de vida do grupo dos 1%

mais ricos por herança só ficou abaixo do padrão dos 1% mais ricos via rendimento do

trabalho somente no período de 1900-1950. Este estudo apenas vem comprovar que a

herança perdeu força devido aos choques do entre guerras e que se recuperou a partir

da década de 70 como mostra a figura a seguir.

154 A Aritmética Básica dos Rentistas e Gestores Recapitulando: uma sociedade onde a renda vinda de herança se sobrepões à renda do

trabalho no topo da hierarquia social – sociedade bem descrita por Balzac e Austen –

duas condições precisam ser preenchidas:

a) β necessariamente deve ser grande o suficiente - acima de 6. E este estoque de

capital dever ser composto de, no mínimo, 1/4 de herança.

b) A riqueza via herança deve ser extremamente concentrada.

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A herança deve ser responsável por 50-70% de toda a riqueza dos 1% mais ricos.

Com esta proporção, os milionários rentistas alcançam um padrão de vida maior

do que os 1% mais ricos que vivem da renda do trabalho.

Assim, no atual ambiente mundial onde o crescimento é pífio com estagnação

populacional e o retorno do capital é grande em relação ao crescimento, os 1% mais

ricos com capital irão sempre se sobrepor sobre os 1% mais ricos via remuneração do

trabalho.

155 A Sociedade Patrimonial Clássica: O Mundo de Balzac e Austen Piketty apresenta cenas dos romances de Balzac – França, Austen – Inglaterra e Henry

James – EUA para mostrar de forma contundente as desigualdades extremas da Belle

Époque e a força que tinha o capital acumulado sobre as rendas advindas do trabalho.

156 Extrema desigualdade da riqueza: Uma Condição da Civilização Em Uma Sociedade Pobre? O luxo dos 1% mais ricos nos períodos da Belle Époque tão bem descritos por Balzac e

Austen não seriam possíveis se seus rendimentos fossem somente 20-30 vezes o

rendimento médio da época. Atualmente, sim, seria possível. Ocorre que naquela época

as coisas eram mais caras. Se vestir, viajar, frequentar clubes e bares eram atividades

que dispendiam muito mais esforço financeiro do que hoje. Por isso que esses

milionários tinham rendimentos que ultrapassavam 60 vezes a média de rendimento.

Por isto, para se viver naquela extravagância, a extrema desigualdade era necessária.

Naquela época não se precisava usar da falácia da meritocracia como é comum hoje.

Antigamente, para se viver uma vida luxuosa, a competência profissional ou intelectual

não era considerada: bastava ter fortuna herdada.

Bem, pelo menos, à época, praticava-se menos a hipocrisia.

157 Extremismo Meritocrático Nas Sociedades de Ricos Bem, talvez não era bem assim. Na época de Napoleão, inclusive com concordância dele

próprio, muitos movimentos políticos eram realizados para fazer com que os altos

funcionários públicos recebessem salários que garantissem um padrão de vida

semelhante aos dos rentistas (herdeiros) na época. O pior na defesa da tal da

meritocracia sem evidência alguma de produtividade marginal é o teor hipócrita dos

argumentos. Nos EUA atualmente é frequente ouvirmos os argumentos justificando os

salários astronômicos dos supergestores: ora, se eles não recebem esses salários

somente os grandes herdeiros teriam o direito de alcançar uma riqueza verdadeira e isto

seria algo injusto. Enfim, justificam uma prática de desigualdade no campo do trabalho

(salários) mirando-se nas desigualdades ainda mais extremas no campo do capital.

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Igualando as duas extremas desigualdades é a forma deles mostrarem que estão

combatendo a iniquidade.

E o pior de tudo é que esta crença da meritocracia vira ladainha não somente no topo

da hierarquia dos 1% ou 0.1% mais ricos. Se torna um discurso conservador e hipócrita

no âmbito da classe média – os 40% abaixo dos verdadeiramente ricos. Michèle Lamont

desenvolveu uma pesquisa entre diversos indivíduos na França e EUA confirmando este

comportamento da classe média. Além das qualidades de esforço e competência, os

indivíduos pesquisados ainda argumentavam que recebiam mais que a classe baixa por

possuir também qualidades morais superiores.

Pois é: pelo menos, os herdeiros-rentistas milionários dos personagens de Austen e

Balzac não comparavam seu caráter com o caráter de seus criados.

158 A Sociedade dos Pequenos Rentistas Piketty reforça a tendência de a herança predominar no decorrer do século XXI

considerando o cenário já descrito de baixo crescimento econômico e alto retorno do

capital. O gráfico 11.11 a seguir baseado neste cenário mostra que os indivíduos

nascendo a partir de 2010 já terão riquezas herdadas no futuro proporcionalmente

maiores do que os indivíduos nascidos na Belle Époque.

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Mas a estrutura da riqueza atual mudou bastante. Se os 1% mais ricos possuíam 2/3 de

toda riqueza, hoje estes mesmos 1% possuem por volta de 20% da riqueza. Nasce no

final do século passado e início deste os pequenos rentistas. Boa parte do patrimônio e

capital nas mãos dos 1% mais ricos se transferiram para as mãos desta nova classe: os

40% ou a chamada classe média. Este fenômeno acabou causando a onda de

meritocracia e a desigualdade passa a perpetuar nas habilidades adquiridas nas grandes

universidades. Dos romances de Balzac e Austen onde os grandes artistas e

protagonistas pertenciam à classe dos rentistas que não possuíam qualquer habilidade,

para os grandes heróis das séries americanas onde os protagonistas são muitas vezes

indivíduos doutores, inteligentes e com habilidades específicas. Hoje, o sistema

educacional não tem a habilidade de fazer o papel de distribuir renda a partir da

capacitação mais igual. Ela foi apropriada pela classe dominante garantindo uma

estrutura social rígida e desigual.

159 O Rentista, Inimigo da Democracia E nada indica que esta tendência ira se reverter. Pelo contrário. O baixo crescimento da

renda nacional de quase todas nações e o alto retorno do capital mostram que a

característica desigual de nossa sociedade do século XXI deva durar muito ainda. O pior

deste cenário é que a sociedade atual se preocupa em justificar seu perfil desigual

usando a crença hipócrita da meritocracia. Pelo menos, tal crença oferece mais conforto

às consciências dos mais “competentes” e abastados.

E esta crença meritocrática exerce um papel fundamental: em uma democracia a

igualdade de direito tão orgulhosamente afirmada se contrasta com a bruta

desigualdade social e para superar tal paradoxo, a meritocracia se encaixa como luva

pois a desigualdade não seria uma realidade imposta e sim uma situação conquistada

pelo próprio indivíduo. Caso ele não queira sofrer nas classes sociais mais baixas, basta

estudar e oferecer suas habilidades.

Hoje existe um preconceito com a palavra rentista ou rendimento como se o retorno do

capital acima da taxa de crescimento da renda fosse algo que deva ser corrigido

bastando para isto detectar os setores de mercado onde a concorrência não está

atuando ou não estão atuando de forma livre. A ideia de que o livre mercado e a

soberania do mercado competitivo irão dizimar a herança e levar a sociedade para o

mundo perfeito da meritocracia é uma ilusão. O advento do sufrágio universal acabou

com o domínio formal dos ricos sobre a política. Mas o mundo está mostrando que isto

não foi o suficiente para abolir as forças econômicas que geram a sociedade dos

rentistas.

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160 O Retorno da Riqueza Herdada: Um Fenômeno Europeu ou Global? É bom lembrar que todos os gráficos e dados apresentados até aqui sobre fluxo de

heranças são relativos à França. Para Alemanha, Inglaterra, EUA, infelizmente não temos

dados em que podemos confiar para fazer análises criteriosas como as feitas com o fluxo

de herança na França. No entanto, o que podemos deduzir sobre este assunto para estes

países é o seguinte:

Alemanha: a curva em U do fluxo de herança se desloca um pouco para a direita e não

se recuperou de forma tão acentuada como na França ainda. Isto é: a força da herança

se recuperou com um certo atraso. Provavelmente isto não se deve a problemas de

comportamento ou questões culturais. Provavelmente, a razão disto é que em certa

época no século passado após a segunda guerra mundial, o crescimento demográfico foi

maior do que na França inibindo a força da herança.

Inglaterra: aqui, o cenário é mais interessante. A predominância da herança é bem mais

fraca do que na França e também na Alemanha e não se encontra indicadores

geográficos, econômicos ou políticos que justifique. Talvez, os britânicos mais velhos

sejam mais dados a gastar mais. Sabemos também que investem mais em fundos de

pensão apesar de isto ser apenas parte da explicação dado o montante destes fundos.

EUA: O caso dos EUA é o pior entre eles pois é onde temos os dados mais incompletos.

Chega a ser tão incertos que na década de 80 surgiram duas teorias de dois economistas

respeitáveis: Modigliani e Summers.

Modigliani afirmava a partir de dados coletados à época que da riqueza atual dos EUA

somente 20-30% eram de herança. Já Summers dizia que a herança era responsável por

70 a 80% de toda a riqueza.

Examinando com mais detalhes os dados analisados por eles e com os disponíveis hoje,

os quais eles não tinham, concluiremos que a verdade estava entre as duas teorias

tendendo mais para Summers: provavelmente a herança é responsável por 50-60% das

riquezas dos EUA.

Podemos concluir finalmente que o retorno do fluxo de herança sobre o total da riqueza

dos países voltou a ser bastante determinante principalmente na França e

provavelmente, num futuro próximo, voltará com a mesma força na Alemanha. Na

Inglaterra a recuperação também pode ser esperada, mas em menor grau um pouco. E

ainda, apesar de significativa, um pouco menor nos EUA.

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Capítulo 12 – Desigualdade Global da Riqueza no Século XXI A dinâmica da desigualdade das riquezas foi tratada até aqui com uma certa restrição.

Foram analisados dados da França e Inglaterra. Se faz necessário avançar mais afinal, o

fenômeno financeiro global é uma força significativa e que poderá levar a mudanças

ainda mais estruturais na lógica da desigualdade. Afinal, o que interessa é tentarmos

entender a lógica desta estrutura de forma global: será que as novas habilidades do

capital de interferir na produtividade marginal irão contribuir para uma maior

concentração de renda? Será que este fenômeno já não estaria em pleno

funcionamento?

Para isto, Piketty irá analisar a evolução das riquezas dos milionários durante o século

XXI e analisar em seguida as desigualdades entre as nações. Mas antes irá analisar a força

divergente crucial que exerce papel de suma importância neste contexto: a desigualdade

do retorno do capital.

161 A Desigualdade do Retorno do Capital Muitos modelos econômicos consideram que o retorno do capital é igual

independentemente do tamanho deste capital que o capitalista detém. Vamos

combinar. O rio corre para o mar. Quanto maior o cacife do capitalista mais facilidade

ele terá para aumentar o retorno do seu capital contra os investidores menos abastados.

Isto se agrava à medida que o mundo financeiro se torna cada dia mais complexo e cheio

de possibilidades. Assim, os 1% mais ricos tendem a ficar cada dia mais ricos se

distanciando dos 10% mais ricos agravando ainda mais o problema da desigualdade.

Este fenômeno pode levar a uma diferença cada vez maior de r – g e o único fenômeno

natural que pode suavizar esta força divergente como já vimos no Capítulo I seria o fator

g de crescimento. Da mesma forma que analisamos individualmente as diferenças de

retorno do capital, também temos que analisar as desigualdades entre as nações.

Primeiramente será analisado o retorno do capital relacionado com dotações

universitárias e depois o retorno de fundos soberanos da China de países exportadores

de petróleo.

162 A Evolução do Ranking da Riqueza Global No geral, os economistas fazem vistas grossas para a relação Forbes de milionários

questionando seus métodos. Mas a pesquisa existe e é global. As pesquisas e estatísticas

governamentais pecam por fazer levantamentos apenas domésticos em um mundo

capitalista que se torna a cada dia mais e mais global. Estas pesquisas tendem a perder

totalmente o valor. Apesar da revista Forbes não utilizar dos melhores métodos, pelo

menos, ela é global e vale a pena fazer uma análise mais de perto.

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Todos os anos, desde 1987, a revista Forbes publica a lista dos bilionários. De 1987 a

1995 a lista foi liderada por um Japonês. De 1996 a 2009 passou a ser liderada por um

Americano e por último, por um mexicano. Eram 140 bilionários em 1987 e hoje temos

1.400 bilionários (2013). Para uma análise mais racional sem armadilhas da matemática,

vamos analisar uma parte fixa – vinte milionésimos – dos mais ricos: cerca de 150

pessoas de 3 bilhões no final da década de 80 para 225 pessoas de 4,5bilhões no final de

2010. Assim temos que a média da riqueza acumulada deste grupo cresceu de 1,5bilhões

em 1987 para quase 15bilhões em 2013.

Resumindo: a riqueza global tem crescido numa média um pouco mais acelerada do que

a renda. No entanto, as grandes fortunas cresceram bem mais rapidamente do que a

média das riquezas.

163 Do Ranking dos Milionários Para os “Relatórios da Riqueza Global” Piketty chama a atenção para a falta de estatísticas governamentais ou de agências

econômicas para coletar dados de forma global relacionados com a riqueza –

principalmente sobre os 0.1%, 1% e 10% mais ricos. Ele é obrigado a consultar fontes

pouco confiáveis como os dados da revista Forbes e outros. Alguns bancos na Europa já

estão fazendo estas coletas e análises e disponibilizando para a comunidade, mas os

dados são recentes e não se tem como fazer análises a médio e longo prazo.

Observando estas diversas fontes de dados podemos concluir que globalmente a

desigualdade de riquezas em 2010 chega ao nível da desigualdade no alvorecer do século

XX. Piketty coloca os percentuais de renda por faixa dos top decile, etc mas, como ele

mesmo diz, são dados bem imprecisos e de difícil certificação. No entanto, pode-se

afirmar que a concentração de riqueza no âmbito global é bem maior do que a

concentração observada internamente nos países.

Existem duas forças se debatendo neste cenário: uma divergente forçando ainda mais a

desigualdade nos 0.1% e 1% mais ricos e outra força convergente relacionada à taxa de

crescimento dos países mais pobres sempre um pouco maior do que dos países ricos. É

difícil de afirmar qual força irá superar a outra ou se as duas irão se compensar ou se

elas irão ou não afetar as classes sociais abaixo dos 1% mais ricos.

A bomba relógio da desigualdade está na diferença de retorno do capital entre os 1 e

0.1% mais ricos que pode gerar uma espiral de desigualdades que levará a classe média

para níveis de pobreza que podem causar instabilidades sociais. Como será visto

adiante, somente uma taxação progressiva do capital poderá impedir esta espiral da

fome.

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164 – Herdeiros e Empreendedores nos Rankings da Riqueza Piketty descreve as metodologias das revistas Forbes, Magazine e outras. Mostra que

são metodologias incompletas e pouco confiáveis mas têm o mérito de, pelo menos fazer

o levantamento global – o que os governos ou mesmos institutos econômicos nunca se

arriscaram a fazer. De qualquer maneira, as pesquisas traçam um cenário onde duas

forças se debatem: uma divergente forçando ainda mais a desigualdade nos 0.1% e 1%

mais ricos e outra força convergente relacionada à taxa de crescimento dos países mais

pobres sempre um pouco maior do que dos países ricos. É difícil de afirmar qual força

irá superar a outra ou se as duas irão se compensar ou se elas irão ou não afetar as

classes sociais abaixo dos 1% mais ricos.

165 – A Hierarquia Moral da Riqueza É estéril a discussão se as desigualdades são consequências diretas ou não de empreendedorismo ou por r ser maior que g. Estes dois argumentos não passam de falácias. A lista dos mais ricos do mundo mostra que não é bem a mente empreendedora que eleva os indivíduos ao topo e sim, na grande maioria, sua herança. E a expressão r > g apesar de força divergente não explica totalmente a desigualdade atual. Mas o fator r do retorno do capital ser bem maior para os mais ricos do que para os menos ricos é sim argumento poderoso que, juntando-se ao fato do mundo está iniciando um período de pouco crescimento, explicaria este triste cenário que se vai igualando aos tempos de Balzac.

Até mesmo os empreendedores como Bill Gates com o tempo vão se deslocando de empreendedores para rentistas de forma natural. Bill Gates viu bem confortavelmente em seu sofá de aposentado sua fortuna crescer mais rapidamente do que no tempo em que trabalhava 10 horas ou mais por dia.

Esta é a principal justificativa para se taxar progressivamente as grandes fortunas. Esta taxação seria a única saída para evitar este processo danoso exponencial e ao mesmo tempo preservar a dinâmica do empreendedorismo. Esta ideia será examinada com mais detalhe na parte IV bem como suas limitações.

A abordagem fiscal elimina elegantemente o blábláblá da justificativa moral da riqueza envolta no discurso da meritocracia. Se as grandes fortunas não são totalmente fruto de roubo ou totalmente fruto de méritos, não importa. A taxação progressiva oferece uma forma democrática de controle – o que já é um avanço.

Piketty desmonta a lógica de que grandes milionários se tornaram milionários por mérito próprio citando como exemplo Gates e o Mexicano Slim. Parece coincidência, mas não é: os admiradores de Gates que acreditam que o mesmo é um milionário dado a sua

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capacidade de trabalho e empreendedorismo são sempre pessoas conservadoras que buscam justificativas para o nível alarmante das desigualdades da atualidade.

Outra justificativa para a taxação progressiva do capital são a grande quantidade de bilionários espalhados pelo mundo onde as origens do capital vêm de roubo como foi o caso do multimilionário Teodorin Obiang que roubou milhões de hectares do povo de Guiné Bissau se tornando um bilionário explorando as florestas daquele país e comprando imóveis, quadros e carros milionários em Paris.

Enfim, as grandes fortunas podem ter origem do bom empreendimento, da herança, do roubo e independentemente da sua origem, ela cresce devido ao desproporcional retorno do capital quando ela chega no topo dos 0.1% mais ricos. Por isso, a solução para este ciclo não se tornar uma perigosa espiral da desigualdade seria a taxação progressiva.

166 – O Retorno do Capital nas Dotações Universitárias Vimos na sessão anterior que o retorno do capital aumenta proporcionalmente com o tamanho da riqueza de quem está investindo, mas os dados para se demonstrar este fenômeno não existem no âmbito governamental e Piketty foi forçado a analisar os dados das revistas Forbes e outras. No entanto, Piketty encontra uma fonte rica e confiável que pode mostrar que este fenômeno é real: os dotamentos universitários dos EUA. Desde 1979 uma instituição chamada National Association of College and University Business Officeres publica os montantes investidos pelas dotações das 850 universidades públicas americanas. Neste montante de dados bem detalhados, encabeça o ranking de maiores dotações para investimentos as seguintes universidades: 1 Havard - US$30milhões 2. Yale - US$ 20milhões 3. Princeton - US$ 15milhões 4. Stanford - US$ 15milhões 5. MIT - US$ 7milhões 6. Columbia - US$ 7milhões 7. Chicago - US$ 7milhões 8. Pennsylvania - US$ 7milhões

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As pesquisas publicadas anualmente pela instituição responsável mostram que a taxa de retorno dos investimentos de cada universidade é maior para aquelas onde se detém maiores montantes de dotações. A razão é de certa forma de simples explicação: as Universidades com maiores dotações possuem mais capacidade de contratar melhores gestores para indicar os melhores setores para investir. Este paralelo feito por Piketty tem a intenção de mostrar como a taxa r de retorno do capital tende a ser extremamente maior que a taxa g de crescimento nacional da renda à medida que o agente financiador vai acumulando mais e mais capital. Novamente, Piketty destaca que esta lógica leva a uma espiral de desigualdade que só poderá ser interrompida e até retraída se houver em âmbito internacional taxação progressiva do capital.

167 – Qual é o Efeito da Inflação na Desigualdade do Retorno do Capital? Existe ainda uma crença na comunidade econômica de que a inflação é um instrumento de força convergente. Isto é: os rentistas teriam dificuldades de manter um retorno do capital atraente após descontado a taxa da inflação. Não é bem assim. Os valores dos ativos e imóveis em uma sociedade com inflação acima de 4.5% são reajustados e os rendimentos que são gerados a partir deles também aumentam na mesma proporção.

A inflação, na verdade, irá dificultar os rentistas menos enriquecidos (classe média) de ter acesso a formas de investimentos mais lucrativos que compensem a inflação. Estes realmente perdem. Mas os grandes investidores possuem cacife para pagar agentes que irão buscar opções de investimento que preservem o retorno do capital descontado a inflação. No máximo, a inflação irá promover uma pequena distribuição de renda entre os muito ricos (agentes) e os milionários pois os últimos retiram parte do rendimento adquirido para pagar os anteriores.

A ilusão de que a inflação seria uma forma de distribuição de renda talvez esteja relacionada com os métodos do pós-guerra onde os governantes usaram a inflação para diminuir as dívidas públicas.

Piketty não defende uma sociedade com inflação zero (esta questão será discutida na parte IV). No entanto, oferecer a inflação como forma de distribuição de renda é uma falácia perigosa que irá, na verdade, fomentar ainda mais nossa espiral da desigualdade.

O autor bate novamente na tecla da taxação progressiva do capital como a única maneira de amenizar as desigualdades.

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168 O Retorno Sobre os Fundos Soberanos: Capital e Política Fundo Soberano: é um instrumento financeiro adotado por alguns países que utilizam parte de suas reservas internacionais

Piketty analisa os fundos soberanos da Noruega e dos países do Oriente Média que tiveram um crescimento substancial nos últimos anos.

Na Noruega, o fundo soberano corresponde a 3 vezes as dotações universitárias americanas. 60% dos rendimentos da indústria do petróleo norueguês é direcionado para os Fundos Soberanos e 40% para as despesas governamentais. O custo para manter o Fundo Soberano da Noruega é de 0.1% do seu ativo – 3 vezes menor que os custos das dotações americanas. No entanto, o retorno não parece ser alto. O Fundo Soberano de Abu Dhabi possui um retorno de cerca de 7 a 8%. Já o FS da Arábia Saudita é direcionado para o Bônus do Tesouro Americano – uma opção conservadora de investimento que não ultrapassa 3% ao ano. Talvez, esta opção seja o preço que ela paga para receber proteção política e militar do império. Isto nos lembra os pagamentos dos pequenos comerciantes ao serviço de segurança prestado por Al Capone na Grande Chicago nas décadas de 20 e 30.

169 Os Fundos Soberanos Dominarão o Mundo? A maior parte dos fundos soberanos pertencem aos países produtores de petróleo. O total destes fundos chegam a U$5.3 trilhões. Lembrando que, de acordo com a revista Forbes, o montante da riqueza dos grandes bilionários chega a U$5,4 trilhões. Somando as duas fontes de riqueza temos apenas 3% do total de riqueza no mundo. Tudo bem. Parece pouco e não precisamos de nos preocupar com isto.

Mas não é bem assim. Grande parte do capital mundial está em forma não líquida. O que não ocorre com o capital dos fundos soberanos de petróleo. Por isso, eles têm um poder bem maior. Além disto, os fundos soberanos acumulam mais riquezas não só a partir dos próprios rendimentos do retorno do capital como também do próprio lucro da indústria do petróleo.

A previsão do preço de barril pode chegar a U$200,00 entre 2020 e 2030. Neste cenário, os países produtores de petróleo podem chegar em 2040 com 20 a 30% de toda riqueza mundial. A reação política e militar dos países ricos do ocidente pode ser imprevisível. Nada garante que este processo de deslocamento da riqueza em direção ao oriente médio ocorreria de forma pacífica.

170 A China Irá Dominar o Mundo? Considerando a lógica onde r sobrepõe com folga g e que isto continue através deste século e somado a isto uma baixa taxa de crescimento da população dos países produtores de petróleo, poderemos ter um futuro meio sombrio onde os fundos soberanos de petróleo iriam comprar quase que o mundo inteiro e simplesmente viver

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dos rendimentos do seu capital. Diferente da China e Índia. Apesar dos fundos chineses serem consideráveis, a taxa de poupança não alcançaria índices que permitissem que os fundos desses dois países dominassem o mundo. Portanto, o temor da China ou Índia, de certa forma, dominar o mundo neste século, é pouco provável. O Oriente Médio, portanto, continuará sendo um caldeirão que não tem perspectiva de esfriar. Pelo contrário.

171 Divergência Internacional, Divergência Oligárquica De qualquer forma, é bem mais possível que, ao invés de fundos ou países passarem a dominar o capital mundial, as grandes oligarquias e os multimilionários o dominem. Assim, não seria a China, mas sim, seus indivíduos multimilionários, não seria os fundos de pensão do oriente médio, mas seus indivíduos multimilionários que teriam bem mais chances de dominar o mundo neste cenário de r > g sem controle público do capital.

Os países ricos são mais ricos do que eles próprios pensam que são. O medo do crescimento chinês é pura fantasia. O total de ativos dos países europeus totalizam 70 trilhões de euros. O total dos fundos soberanos somados às reservas do Banco Central da China somam irrisórios 3 trilhões de euros.

Mesmo assim, existe um sentimento de perda de posses, um medo real do ocidente de perder o controle do capital para os chineses. De onde vem este mito? Em parte, o mito vem da invasão de alguns estrangeiros do oriente e oriente médio no mercado imobiliário da Europa. Apesar de estatisticamente comprarem pouco, talvez o sentimento ufanista faz com que esta participação pareça bem maior. Com isto, gera este temor irracional.

172 Os Países Ricos na Verdade São Pobres? Outro ponto que deve ser destacado se refere aos ativos espalhados pelos paraísos fiscais ficando difícil de identificar a distribuição geográfica das riquezas. E isto parece claro quando se compara os ativos líquidos dos países ricos com o resto do mundo. Eles se tornam negativos. Não significa que os países ricos são pobres, é claro. Significa sim, que boa parte de suas riquezas não conseguimos contabilizar pois estão nos paraísos fiscais. Mesmo assim, Alemanha e Japão estão em posição confortável. Possuem bem mais ativos fora de seu território do que o restante do mundo. E o mais estranho que quando analisamos mais detalhadamente os ativos dos países pobres: também negativos. Caímos no paradoxo do planeta terra todo negativo. Estaríamos devendo para o planeta Marte? Claro que não. Os paraísos fiscais é explicação para este absurdo contábil. Os levantamentos sobre as riquezas nos paraísos fiscais são incertos, mas a estimativa é de que o grosso da riqueza pertença a indivíduos dos países ricos.

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Parte IV – Regulando o Capital no

Século XXI

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Capítulo 13 – Um Estado Social Para o Século XXI Analisamos a evolução da riqueza desde os tempos da revolução francesa e toda

estrutura da desigualdade no mundo em particular Europa e EUA. Vimos que a estrutura

da riqueza e dos patrimônios sofreram mudanças profundas com as duas grandes

guerras mundiais diminuindo temporariamente as desigualdades. Vimos também que os

índices de desigualdade voltaram a aumentar com indivíduos possuindo mais riquezas

que um país inteiro. Neste capítulo iremos analisar as possibilidades de implementação

de políticas públicas capazes de reverter este processo de forma que não seja necessário

esperarmos passivamente por uma terceira guerra mundial (esta sim, global) para

retomarmos vergonhosamente o caminho da justiça social.

173 A Crise de 2008 e o Retorno do Estado Fazendo uma análise dos dados da crise de 1930 e comparando com a crise de 2007-

2008 podemos afirmar que a crise de 30 foi bem mais devastadora. Enquanto a

capacidade produtiva dos países ricos caia 40% e o desemprego também atingia o

mesmo patamar na primeira crise, a atual crise teve queda de somente 5% da produção

nos países mais ricos. Mas isto foi o suficiente para que fosse considerada a segunda

maior crise do capitalismo de todos os tempos.

A principal razão para que o mundo não sofresse o mesmo colapso de 30 se deve aos

governos e bancos que não deixaram o sistema financeiro explodir evitando concordatas

em série como ocorreu entre 1920-1935. Os bancos centrais evitaram uma bancarrota,

porém, não foram capazes de evitar a crise e muito menos de impedir o aprofundamento

da desigualdade.

1930 teve pelo menos o mérito de trazer o estado para o centro do epicentro exercendo

um papel mais regulador. A taxação das grandes fortunas, por exemplo, chegou a 80%

no início do governo Roosevelt enquanto não passou de 35% no segundo mandando de

Barack Obama.

A participação tímida do governo na atual crise com certeza será o principal motivo pelos

prováveis intervalos que se seguirão de mais crises.

A partir desta última crise, o mundo se dividiu mais ainda entre aqueles que defendem

o fim do estado ou o “estado mínimo” e aqueles que consideram que o mercado precisa

de ser controlado com políticas públicas e maior participação na economia.

De qualquer forma, o mundo precisará dar uma resposta urgente e desafiadora a um

mundo atual bem mais complexo.

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Antes de apresentar qualquer possibilidade de saída vamos dar uma olhada breve na

evolução das taxas de impostos e nos gastos públicos desde o final do século 19.

174 O Crescimento do Estado Social no Século XX Olhando a figura 13.1 a seguir podemos perceber a evolução do estado e sua

participação no dia-a-dia dos indivíduos.

Os impactos da crise de 2008 terem sido menor que os da crise de 1930 também podem

ser associados à alta participação do estado na sociedade neste século em comparação

com as primeiras décadas do século passado como mostra claramente o gráfico:

Na presente sessão Piketty detalha os percentuais de gastos dos estados atuais em

educação, saúde, seguro desemprego e aposentadoria mostrando que o total de gastos

sociais chegam a 25-35% da renda nacional.

175 Redistribuição Moderna: Uma Lógica de Direitos Resumindo: a redistribuição moderna não consiste em transferência de renda do rico

para o pobre de forma explícita. O que ocorre atualmente é o financiamento de serviços

públicos que podem ser oferecidos de forma igual para toda a população e assim,

nivelando de certa forma, a qualidade de vida entre as diferentes camadas sociais. A

redistribuição moderna da renda está fundamentada no princípio dos direitos

fundamentais iguais para todos historicamente reafirmados tanto na revolução francesa

quanto na declaração dos direitos da constituição americana. Ambas afirmaram

igualdade de direitos como princípio absoluto. Mas na prática, o sistema político que se

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desenvolveu à revelia destas revoluções no século 19 se preocuparam mais em proteger

o direito de propriedade.

176 Modernizar o Estado Social e não o Desmantelar Esta nova forma de redistribuição criada pelos estados europeus no século passado

baseada na educação, saúde e aposentadoria elevando as taxas para patamares acima

de 40% do PIB tem seus problemas, desafios e limitações mas marcaram um avanço

histórico significativo da sociedade e apesar de todos conflitos partidários e ideológicos

que giram em torno desta questão, este novo paradigma se tornou um consenso. Não

existe qualquer movimento político sério que reivindique a volta de um estado com um

orçamento com menos de 30% da renda nacional.

Considerando que os impostos são arrecadados e gastos com transparência para o bem

de toda a população não existiria lógica em não se concordar em aumentar os gastos

para 2/3 ou ¾ de toda renda nacional de uma nação. Mas temos pelo menos duas boas

razões para afirmar que isto não ocorrerá no decorrer do século 21.

Primeiramente, durante o século XX, a taxa de crescimento mundial girava em torno de

5% bem acima das taxas atuais. O mundo se tornava mais rico enquanto a participação

do estado era mínima até o final da segunda guerra mundial. Este ambiente foi propício

para que o estado assumisse um papel protagonista do bem-estar social saltando dos

20% do PIB em arrecadação para 40-50% após a segunda guerra. Hoje o cenário é bem

diferente uma vez que nos encontramos numa fase de baixo crescimento do PIB com

perspectiva de longo prazo. Com baixo crescimento fica mais difícil do estado querer

reivindicar ainda mais elevação de impostos. Soma-se isto com as novas necessidades

do mundo consumista. As pessoas necessitam de mais dinheiro para viajar, comprar

novos produtos de tecnologia, adquirir roupas, etc. A sociedade precisa de escolher as

prioridades entre os diferentes tipos de necessidades.

Além disto, novas formas de organização nem totalmente públicas nem privadas irão

evoluir durante este século de forma a melhorar a gestão financeira dos recursos sociais

antes que 2/3 ou ¾ da renda nacional sejam direcionadas para o setor.

A questão sobre a eficiência do estado e como as organizações podem evoluir a longo

prazo foge ao escopo deste estudo. Contudo, iremos analisar mais de perto a questão

do acesso igual à educação, principalmente às universidades e logo após, analisar os

planos públicos de aposentadoria com contribuição antecipada (pay-as-you-go) em um

mundo de baixo crescimento.

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177 As Instituições Educativas Possibilitam a Mobilidade Social? Um dos objetivos dos gastos públicos com educação é promover a mobilidade social.

Mas será que as instituições públicas estão cumprindo este papel?

As escolas superiores se proliferaram. Os meios de produção passaram a exigir mais

conhecimento específico, mais tecnologia e a educação respondeu satisfatoriamente. O

nível escolar no ambiente de trabalho é mais sofisticado atualmente. Portanto, de

acordo com dados disponíveis isto não foi suficiente para possibilitar uma maior

mobilidade social. Pelo contrário: a mobilidade é hoje menor do que nos tempos

anteriores ao boom tecnológico. Os países com maior mobilidade social são os nórdicos

e o de menor mobilidade, os EUA – entre os mais ricos do mundo. Entre estes extremos

se encontram Alemanha, França e Inglaterra. Lembrando que este cenário mostra uma

inversão a qual já foi destacada em capítulos anteriores: na época das colônias, a terra

prometida que garantia ascensão social a partir do trabalho era os EUA e os países

Europeus primavam pela máxima do conservadorismo.

Os números da Universidade de Havard mostram que a meritocracia não é um critério

para admissão de seus alunos. A média salarial dos pais dos alunos é de U$ 450.000,00

o que corresponde à média salaria dos 2% mais ricos dos EUA.

Mas o problema da falta de igualdade de oportunidades e igualdade de acesso às

universidades é uma epidemia mundial onde nenhum país conseguiu dar uma resposta

satisfatória. Creio que o governo Lula / Dilma deram uma resposta satisfatória a este desafio ao

implementar projetos unificados na área; ENEN, Ciências Sem Fronteira, Fies, Lei de Cotas e

outros. Depois apresentaremos estes programas para o nobre economista que cita o Brasil

somente duas vezes em seu livro.

De qualquer forma, a questão é bem complexa: não existe uma fórmula mágica para se

atingir uma igualdade real de oportunidades para se alcançar o ensino superior.

178 O Futuro das Aposentadorias: as Contribuições Previdenciárias em Época de Fraco Crescimento Geralmente os planos públicos previdenciários são do tipo pay-as-you-go, isto é: a parte

descontada na folha do trabalhador já é direcionada para pagar os trabalhadores já

aposentados. Diferente dos planos de saúde particulares onde as contas são

personalizadas. Por definição, o tipo PAYGO oferece, por definição, um retorno igual à

taxa de crescimento da economia: a contribuição disponível para pagar a aposentadoria

de amanhã aumenta à medida que a média salarial aumenta. Este sistema é, na verdade,

virtuoso e promove a harmonia entre as gerações pois é interesse de quem está na ativa

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que as crianças tenham uma boa educação para obter um bom emprego para pagar sua

aposentadoria e que a taxa de crescimento esteja sempre a crescer.

Mas o cenário atual é bem diferente do cenário do pós-guerra quando o plano PAYGO

foi implantado. Na época, além da taxa de natalidade ser alta, a taxa média de

crescimento mundial girava em torno de 5%. Ambiente ideal para um plano onde o valor

contribuído vai diretamente para o trabalhador já aposentado. Hoje, o retorno do capital

girando em torno de 5% e a taxa de crescimento da economia em torno de 1,5% forçarão

os planos de aposentadoria migrar de PAYGO para planos de capitalização individuais.

O grande impasse é passar de um plano para o outro pois muitos trabalhadores que já

contribuíram ficariam prejudicados. Além do mais, os planos de capitalização ficam na

dependência da volatilidade do mercado financeiro.

De qualquer forma, os planos de aposentadorias que foram arquitetados quando a

expectativa de vida girava em torno de 60-70 anos agora encaram uma realidade bem

diferente onde a expectativa de vida sobe para 89-90 anos. Elevar a idade para se

aposentar não é uma saída simples nem mesmo igualitária. Os trabalhadores mais

especializados tendem a querer trabalhar bem além da idade de se aposentar. Os

trabalhadores menos especializados geralmente começam a trabalhar mais cedo e não

querem e nem conseguem estender sua idade de aposentadoria. Os países que estão

tentando mudar esta política sofrem resistências importantes por este motivo. (É o que

está ocorrendo na era Temer aqui no Brasil).

O desafio dos estados é construir um sistema de aposentadoria unificado com leis claras

e iguais para todos os trabalhadores com conta individual de forma que o trabalhador

saiba o quanto ele irá receber quando aposentar.

179 O Estado Social nos Países Pobres e Emergentes Os impostos arrecadados pelos países ricos montam valores sempre próximos de 45-

50% ou até mais da renda nacional. Estes montantes, na verdade, eram até menores e

evoluíram no decorrer do século 20. No entanto, os países emergentes e pobres a

situação se inverte: a maioria deles não arrecadam mais que 15% de sua renda nacional.

Uma análise histórica mostra que os países ricos têm um importante papel neste cenário

triste. A forma como se deram as independências de cada país onde fronteiras artificiais

foram impostas, onde muitos dos ativos dos países continuaram nas mãos dos países

imperialistas além de formas de governos impostas pela guerra fria contribuíram

sobremaneira para a criação de estados fracos e corruptos. De qualquer maneira, as

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formas como os estados sociais dos países pobres e emergentes irão evoluir é uma

questão fundamental para o futuro do planeta.

Capítulo 14 – Repensando o Imposto de Renda Progressivo O imposto progressivo e o imposto sobre herança foram as principais inovações do

século XX para diminuir a desigualdade social. No atual século, estas duas instituições

estão ameaçadas. Piketty irá analisar em mais detalhes estes dois tipos de impostos

numa perspectiva progressiva de cobrança e o papel fundamental desta forma de

tributação para se alcançar uma sociedade mais igual e redistribuída.

180 A Questão da Tributação Progressiva Tributação não é uma questão técnica. É sim, uma questão política, filosófica e cultural.

Talvez, a questão mais importante de qualquer questão política. Sem tributação, ações

coletivas seriam impossíveis e as sociedades não conseguiriam visualizar um destino

comum.

Em todas revoluções políticas da história encontramos uma revolução fiscal

correspondente. O antigo regime francês foi varrido do mapa após as assembleias

revolucionárias abolirem os privilégios fiscais da aristocracia. A expressão “No taxation

without representation” presente na independência dos EUA também ilustra esta

afirmação.

Distinguimos três tipos de tributação: tributação de renda, de capital e de consumo. A

tributação de consumo é chamada de tributação indireta pois não incide diretamente na

renda ou no capital. Ela é paga indiretamente no momento da venda/compra de um

bem.

Para além destas retóricas de definições, o importante é classificar os diversos tipos de

impostos em progressivo, proporcional ou regressivo. Se progressivo, quanto mais se

ganha ou quanto mais se tem ou quanto mais se consome, mais impostos se paga. Se

progressivo, as taxas são proporcionais ao ganho e se for regressivo, quanto mais rico

menos se paga. Aliás, foi o famoso “pool tax” onde Margareth Thatcher defendia o

imposto regressivo, que a tirou do cargo de primeira ministra em 1990.

A maioria das tributações governamentais podem ser classificadas como proporcionais

e, politicamente, não é fácil de se implantar sistemas tributários que fogem à esta regra.

Os tributos progressivos foram um dos principais responsáveis em evitar que o capital

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chegasse ao patamar da Belle Époque e, ao mesmo tempo, os tributos progressivos, são

os principais motivos que explicam as grandes fortunas atuais.

A guerra dos tributos entre países na era do capital sem fronteiras está fazendo com que

muitos países passem a isentar o grande capital como uma forma de fixar o capital no

país. Com isto, existe uma tendência forte da evolução da tributação regressiva tornando

a perspectiva futura ainda mais sombria em relação às desigualdades.

A existência de um estado social ainda significativo e protetor exigirá que as tributações

não evoluem para regressivas e voltem, no mínimo para um sistema progressivo. Fica

ainda mais incerto o futuro do estado social quando olhamos para o sistema de

tributação dos patrimônios. As heranças sofrem ainda mais com a síndrome da “curva

em forma de sino” onde a taxação cai à medida que os ativos herdados valem mais.

181 O Imposto Progressivo no Século XX: Um Efêmero Produto do Caos O imposto progressivo no século XX foi uma realidade devido ao choque das duas

grandes guerras mundiais como mostra a figura 14.1 a seguir. A alíquota de imposto para

os mais ricos na França, por exemplo, era de apenas 2% em 1914. Logo após o fim da

primeira guerra a alíquota já chegava aos patamares modernos de 50% chegando a 72%

em 1924. Vinte anos após o final da segunda guerra mundial as alíquotas da tributação

de grandes fortunas voltam a se estabilizarem em torno de 40-50%.

182 Tributação Progressiva na Terceira República Terceira República Francesa: iniciou-se em 1870 durante a guerra Franco-Prussiana e terminou

em 1940 com a invasão da Alemanha.

Durante a terceira república a França, apesar de afirmar os ideais da revolução, além de

retroceder com o sufrágio universal masculino em 1871 relutou em implantar tributação

progressiva sobre salários ou capital. Somente após o final da segunda guerra mundial

que as alíquotas reagiram progressivamente. O mais interessante era perceber que

durante a terceira república, a elite econômica usava o argumento de que a França era

um país igualitário e, portanto, não precisava de política de tributação progressiva.

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183 Tributação Confiscatória da Alta Renda: Uma Invenção Americana EUA e Inglaterra nos períodos entre guerras lançaram mão de tributações progressivas

mais que os demais países da Europa – principalmente os EUA. A alta taxação das

grandes fortunas não tinha nenhum objetivo de buscar novas receitas. O objetivo era

tentar desmotivar as grandes fortunas para não criar conflitos sociais e manter tentar

manter os princípios do ideal americano de igualdade.

Logo após a primeira guerra muitos americanos começaram a se preocupar com o

caminho de extrema desigualdade que os EUA estavam se dirigindo. Os americanos

reagiram à esta escolha pela desigualdade logo após a primeira guerra. Em 1919 os

americanos com alta renda já eram taxados em 70% de tributos federais. E, em 1933,

Roosevelt também taxa os imobilizados acima de 70%.

A onda da super tributação chega na Inglaterra. Em 1942 a alíquota sobre a renda subiu

para 80% e em 1944 alcançava o valor astronômico de 94% se estabilizando em 90% até

o início da década de 60. A média da tributação das grandes fortunas nos EUA entre

1932-1980 alcançou nada mais nada menos que 81% da renda.

184 A Explosão dos Salários dos SuperGerentes: O Papel da Tributação A partir da década de 70 os EUA e a Grã-Bretanha diminuíram suas alíquotas de impostos

sobre os mais ricos diferentemente da Alemanha e França. Este comportamento

conservador dos dois países está diretamente relacionado com o sentimento de ameaça

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devido à reação econômica de outros países. Esta recuperação econômica do Japão,

China e outros países criou um ambiente propício para a implantação de políticas

conservadores e concentradoras de renda nas gestões de Ronald Reagan e Margareth

Thatcher.

Com a queda das alíquotas sobre os mais ricos, os salários dos grandes gestores

começaram a subir. Até a década de 80 não era de interesse deles forçar um salário mais

alto, pois grande parte iria diretamente para o governo. Com o leão mais manso sobre

os salários astronômicos, estes gestores conseguiram convencer as partes interessadas

das grandes organizações (conselheiros, acionistas, etc.) de que a produtividade

marginal de seus trabalhos seria diretamente proporcional aos salários reivindicados.

Assim, nascia o fenômeno dos salários astronômicos dos executivos americanos.

Já foi mostrando em sessões anteriores que este alto salário não é algo meritocrático.

Sabemos que o PIB per capita dos países desenvolvidos não aumentou em nada com o

advento desses super-salários. Piketty, Emmanuel Saex e Stefanie Stantcheva fizeram

pesquisas que foram além de comparações internacionais para mostrar que a grande

ascensão dos salários dos supergestores é simplesmente uma questão de alíquotas

bondosas. A única forma de resolver esta questão seria o retorno das alíquotas mais

pesadas como ocorriam antes da década de 80.

185 Repensando a Questão da Taxa Marginal Superior Tais pesquisas mostraram que uma alíquota nas rendas dos 1% mais ricos não só é

possível como também seria a única saída para conter a ascensão dos altos salários. De

acordo com as estimativas desta pesquisa, 80% seria a alíquota ótima para resolver de

vez esta questão. Na verdade, a receita não iria melhorar uma vez que os salários desses

milionários iriam migrar para faixas menores. Por isto, faixas menores também deveriam

sofrer aumentos de taxas na ordem de 60% - estamos falando em salários de

U$200.000,00 trazendo impactos positivos para as receitas dos estados.

Mas Piketty não é nada otimista em relação à implementação desta visão da alíquota

progressiva. Pelo contrário: aqueles que deveriam mudar as leis que são representantes

legitimados pelo sufrágio universal estão no topo da cadeia dos rendimentos. Tal ideia

foi implantada no século passado graças aos choques tanto econômicos quanto

psicológicos das duas grandes guerras. A tendência, segundo Piketty, é de um século XXI

mais parecido com a Belle Époque do que com os tempos dourados dos anos 60 onde o

capital deu uma arrefecida mitigando um pouco as desigualdades.

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 117

Capítulo 15 – Um Imposto Global Sobre o Capital Para regular o capitalismo patrimonial no século XXI não bastará rever o modelo fiscal e

social do século XX e adaptá-lo aos dias atuais. Fundamental que duas ações sejam

tomadas: tributação progressiva e volta de um estado social forte. Mesmo que a

democracia se sobreponha ao poder do mercado financeiro, ela terá que se reinventar.

Uma questão central deverá ser atacada: o controle financeiro internacional com total

transparência. Piketty analisará mais detalhadamente a questão da tributação

progressiva e posteriormente fará algumas reflexões acerca do controle internacional

do capital.

186 Um Imposto Global Sobre o Capital: Uma Utopia Útil Uma tributação global sobre o capital é uma ideia utópica. A implantação desta ideia é

realmente de difícil execução. Uma forma de torná-la exequível seria implementar por

região começando na Europa, por exemplo. Não podemos esquecer que a tributação

progressiva que ocorreu entre as duas grandes guerras também era algo impensável e

totalmente utópica no final do século XIX e início do século XX.

A proposta de Piketty é tributar globalmente o alto capital de forma progressiva e todos

os tipos de capital incluindo os ativos. Para se ter uma estrutura fiscal de tributação

mundial com o mínimo de distorções possíveis será necessário tirar lições dos diversos

tipos de tributação que falharam ou que são casos de sucesso. Os países de língua inglesa

possuem sistemas distintos dos sistemas da França que por sua vez são diferentes dos

interessantes sistemas de tributação da China, etc.

187 Transparência Democrática e Financeira A proposta de criar uma tributação global não tem como objetivo aumentar as receitas

do estado nem substituir as demais formas de arrecadação já existentes. O propósito

principal seria a regulamentação do mercado financeiro. O objetivo primeiro seria

interromper o aumento incontido da desigualdade de riquezas e segundo, impor uma

regulação efetiva no sistema bancário para evitar as crises cíclicas. Para alcançar tais

objetivos o sistema global de tributação precisa promover transparência financeira

democrática.

A transparência é fundamental pois se a tributação é global como saberíamos que a

arrecadação sobre grandes riquezas está gerando os valores corretos caso os países não

ofereçam relatórios e dados confiáveis?

Com a transparência tal tributação forçaria os governos a ajustar os acordos

internacionais relacionados aos compartilhamentos de dados entre bancos. O princípio

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 118

é simples: as autoridades de cada país responsáveis em recolher esses impostos

receberiam toda informação necessária para efetuar os cálculos das bases do imposto

de cada cidadão. E considerando que a taxas seria relativamente pequena (0.1%), os

milionários optariam em pagar evitando problemas fiscais com as autoridades tanto

nacionais quanto internacionais.

188 Uma Solução Simples: Transmissão Automática de Informações Bancárias O primeiro passo para se implantar a tributação global será estender a nível

internacional todas as transações bancárias para que cada país tenha o controle dos

ativos dos contribuintes.

A missão não é simples, mas já foram dados os passos iniciais para alcançar este objetivo.

O Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA) dos EUA já prevê que todos os bancos

mundiais informem as transações e ativos dos contribuintes americanos. A União

Europeia também possui algum tipo de controle não tão rígido quanto o FATCA, mas já

é um início. De qualquer forma, os controles atuais são insuficientes. Seria necessário

implantar penalidades não só aos bancos como também aos países que se recusarem a

prestar contas.

189 Qual o Propósito de um Imposto Sobre o Capital? Com a tributação progressiva, o estado se contentaria com 0.1% sobre o capital ou uma

alíquota mais substancial seria necessária? A questão deve, na verdade, ser colocada de

outra forma: qual é, afinal, o objetivo da tributação progressiva do capital?

Primeiramente, é importante destacar que existem duas justificativas para se aplicar

tabela progressiva: contributiva e incentivada.

A ideia contributiva é simples: a taxação não pode ser feita somente sobre a renda, mas

necessariamente sobre os rendimentos originados desta renda. Por exemplo, um

bilionário que possui 10 bilhões de euros terá um rendimento de 500 milhões de

euros/ano. Tal indivíduo, por mais bom gosto possa ter, não conseguirá gastar estes 500

milhões de euros. Este retorno do capital, portanto, precisa ser tributado de forma

progressiva. Os sistemas atuais esquecem este tipo de tributação e assim, ao invés de

fazerem o importante papel de distribuição de renda, os sistemas estão fortalecendo a

lógica da desigualdade.

A outra justificativa para a implementação da tributação progressiva se baseia na ideia

do incentivo. A ideia básica é a seguinte: taxar capital incentiva buscar o melhor

investimento e, portanto, o melhor retorno do capital para compensar o imposto que

será cobrado posteriormente. Por exemplo, uma alíquota de 1-2% sobre um capital onde

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 119

o empreendedor consegue um retorno de 10% é um imposto pouco significativo. Assim,

o capital nas mãos de empreendedores acomodados tende a ser transferido para

empreendedores mais arrojados fazendo com que ele tenha uma participação mais ativa

nos processos de produção.

Por outro lado, sabemos que o retorno do capital é uma grandeza volátil e que o próprio

empreendedor, por mais competente que seja, não tem total domínio sobre ele. Por

isso, a tributação deve ser feita não somente sobre o capital. São três os pilares na

tributação progressiva que se complementam: tributação sobre herança, capital e renda.

190 Um Projeto para Tributação da Riqueza na Europa Qual seria o plano de implantação para um sistema de implantação global e o que este

sistema poderia nos trazer de ganhos? Primeiramente teríamos que tributar as grandes

heranças uma única vez a cada geração. A tributação das grandes propriedades poderia

gerar em torno de 0.5 a 1% de rendimento tributário considerando que o valor assumido

do retorno do capital dessas propriedades gira em torno de 3 a 5%.

O próximo ponto é importante. O alto nível de riqueza privada que impera hoje na

Europa trará uma receita considerável com a tributação progressiva. Aplicando a tabela

abaixo, por exemplo, teríamos uma receita líquida de 2% do PIB europeu.

Riqueza em Euros Alíquota Progressiva

Até 1 milhão 0%

Até 5 milhões 1%

Acima de 5 milhões 2%

Tanto a FATCA quanto a União Europeia não têm a intenção de trabalhar com tributação

progressiva. O objetivo deles não vai além de informar às autoridades sobre os ativos

dos contribuintes para diligências internas relativas à sonegação.

191 Tributação de Capital Em Uma Perspectiva Histórica Nos tempos da Grécia antiga Aristóteles destacava que juros significava tocos - criança em grego. Aristóteles afirmava que dinheiro não poderia fazer nascer mais dinheiro. Isto nos idos anteriores à Idade Média. A partir da Idade Média e até os dias atuais, obter mais riquezas a partir do capital sem exercer qualquer esforço nunca foi considerado

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 120

algo imoral, antiético ou ilegal. O princípio geral dos juros desde então se tornou inquestionável. A consequência em se aceitar os juros como algo normal e natural vez com que o capital se reproduzisse também naturalmente perpetuando as desigualdades e concentrando cada vez mais a riqueza. A solução apresentada por Karl Marx para este problema foi colocada em prática na antiga União Soviética. O Capital foi apropriado pelo estado e o retorno privado caiu a 0%. Mas a questão de uma classe burocrática responsável em administrar todo o capital que um dia estava nas mãos dos indivíduos trouxe um custo que, no final, todos nós sabemos qual foi o resultado. Tributar progressivamente o capital ao invés de torná-lo totalmente centralizado no estado é uma solução mais inteligente e eficaz. É a única resposta para a desigualdade r > g. Piketty faz um resumo dos sistemas de tributações atuais mostrando suas falhas e a eficácia zero para tentar resolver o problema do acúmulo do capital. Por fim, mostra que a tributação global progressiva do capital é uma ideia nova que precisa ser discutida democraticamente por todos os líderes e organizações mundiais para a sua implementação.

192 Formas Alternativas de Regulação: Protecionismo e Controles de Capital Não temos outra forma de controlar o capital a não ser com tributação progressiva.

Outras formas estão sendo utilizadas, mas sem sucesso. As formas são o protecionismo

e o controle de capital. O protecionismo como forma de proteger setores de econômicos

de um país de problemas de mão de obra escrava e processos comerciais ilegais de

outros países é perfeitamente justificável e uma ferramenta que deve ser usada. Mas o

procedimento não muda em nada o controle do capital, apenas fortalece determinados

setores sem ocorrer diminuição de desigualdades.

Outro procedimento é o controle do capital. Após a queda do muro de Berlim, os

economistas do capital entraram em êxtase e suas corporações foram juntas. O FMI e a

OCDE mandaram às favas os controles de capitais e propagaram a ideia de autocontrole

da economia. Com isto, o capital nadou de braçada nos países do terceiro mundo

aumentando ainda mais as desigualdades entre as nações.

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 121

193 O Mistério da Regulação do Capital Chinês Nem todos países caíram no canto da sereia do livre fluxo de capitais. A China é um bom

exemplo. O controle de ações é rígido e o estrangeiro não pode ter controle majoritário

sobre ações. Da mesma forma para a saída de capital que é totalmente controlada. Além

disto, as tributações do capital na China são mais progressivas que nos países

desenvolvidos e a receita originada são investidas em educação, saúde e infraestrutura.

Sem dúvida, apesar de ser um sistema pouco, a tributação na China tem mais chances

de se tornar um sistema progressivo como sugerimos do que os sistemas europeus.

194 A Redistribuição das Receitas do Petróleo A distribuição mundial dos recursos mundiais principalmente o petróleo é um fator

complicador da regulação internacional do capital. Se a terra fosse uma simples e única

comunidade democrática, os recursos poderiam ser distribuídos de forma mais igual.

Como o mundo não é este, a distribuição de recursos naturais é feita quase sempre na

imposição de fronteiras artificiais e muitas vezes na força explícita da guerra. As regiões

com poucos recursos sofrem com a pobreza e os países no oriente médio que possuem

muitos recursos - quase sempre construídos sob fronteiras impostas pelos impérios - não

utilizam a renda oriunda desses recursos para melhorar a educação, infraestrutura ou

saúde.

Uma nova sistemática do controle de capital deverá encontrar meios de alcançar uma

distribuição mais justa dos rendimentos do petróleo seja através de obrigações fiscais,

impostos ou ajuda internacional com o objetivo de dar oportunidade aos povos carentes

de todos países de usufruir da riqueza do planeta.

195 Redistribuição Pela Imigração A imigração é um caso oposto ao problema dos recursos naturais. Mover capital é bem

mais complexo e envolve mais conflitos de interesses do que a imigração. É bem mais

simples permitir deslocamentos de mão de obra de uma região ou país com salário

menor para uma região com salário mais alto. Aliás, esta foi a grande contribuição dos

EUA para a história da distribuição de renda mundial. No início da colonização o país

possuía 3 milhões de habitantes. Hoje são 300 milhões. A imigração força o capital a não

se acumular tanto e torna suportável o ambiente de desigualdades. Os imigrantes nos

EUA apesar de estarem em posição bem inferior do que a média da renda nacional, se

sentem, de certa forma, confortáveis, pois, nos seus países de origem estariam ainda

piores. Isto suaviza os conflitos de classe.

É claro que a imigração mitiga um pouco o problema da desigualdade, mas não resolve

a questão. Parte da desigualdade em um país pobre é deslocada para um país mais rico.

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 122

No entanto, a tendência de concentração de renda continuará caso não se contenha o

capital a partir de tributação progressiva.

Caso não se tenha estados sociais fortes e globalmente não se construa um sistema de

regulação do capital, a imigração continuará sendo um tema tratado com ódio e

nacionalismo. A África passaria a ter vantagens em relação à imigração, por exemplo.

Com tributações internacionais mais justa não teríamos o débito atual da África onde os

valores que saem do continente são maiores que os valores de ajuda que entram.

Capítulo 16 – A Questão do Dívida Pública Existem apenas duas formas de um governo financiar suas despesas: com impostos ou

com débitos. É claro que usando a segunda forma, tem-se a vantagem de não se ter

custo de arrecadação mas chega um momento em que o compromisso deve ser quitado.

Dependendo dos juros praticado, a segunda forma faz com que as riquezas migrem

sempre para o lado daqueles que possuem o capital para emprestar. Existe situações em

que seria interessante o uso do débito público. Atualmente estamos em um ciclo de

débitos. Todas as grandes nações estão com dívidas equivalentes ao valor de seu PIB.

Por outro lado, os países pobres estão com dívidas públicas que giram em torno de 30%

do PIB. Dívida pública não é indicador de riqueza de um país como mostra o exemplo

acima. Não passa de transferência de riqueza do setor público para o privado e vice-

versa. Europa vive hoje um paradoxo: continente com maior riqueza privada do planeta

e uma extrema dificuldade em resolver suas dívidas públicas.

196 Reduzindo a Dívida Pública: Impostos Sobre o Capital, Inflação e Austeridade O estado pode seguir três caminhos para diminuir sua dívida. A mais adequada sem

dúvida é a tributação progressiva e controle do capital principalmente na Europa onde

quase todo líquido positivo de capital se encontra no setor privado. Outra solução, como

no passado, é fazer uso da inflação para transferir riquezas do setor privado para o

público. A forma menos aconselhada é a que está sendo feita hoje na Europa:

austeridade prolongada. Considerando que a soma dos ativos dos estados europeus com

os débitos está próxima de zero, como eles conseguiriam zerar seus débitos? Vendendo

seus ativos?

A dívida pública do Brasil já está em 67% do PIB (setembro 2016). E este é o raciocínio da direita

brasileira ou como diria Marx, do lupem burguês: vender ao máximo os ativos do estado para

liquidar o débito público e levar um por fora, é claro.

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 123

E é evidente que esta não é a solução. Se os ativos são vendidos, toda nação irá pagar

aluguel para usar os ativos que foram vendidos aos compradores que são, é claro, os

10% dos capitalistas que possuem mais de 60% das riquezas domésticas dos países.

Assim, a dívida pública volta a crescer e a concentração de renda alcançaria níveis

alarmantes que faria inveja aos indicadores da Belle Époque.

Voltamos à tecla que temos que pressionar incansavelmente: a solução mais racional e

justa é cobrar taxas excepcionais do capital que no caso da maioria dos países no mundo

está sob a tutela do mundo privado.

197 A Inflação Redistribui Riquezas? Sem dúvida, a melhor forma de diminuir grandes montantes de dívidas públicas seria a

tributação progressiva ao capital. Mas uma outra maneira já foi utilizada com sucesso

principalmente no final da segunda guerra mundial. Os títulos das dívidas públicas geral

são ativos nominais – isto quer dizer que são valores pré-fixados livres do fator

inflacionário. Assim, o governo da Alemanha, por exemplo, logo após a segunda guerra

mundial financiou sua reconstrução com dinheiro usando a inflação para fazer acontecer

um alto fluxo de capital do setor privado para o público sem aumentar sua dívida pois os

títulos para captar dinheiro no mercado não eram indexados na alta inflação da época.

Curiosamente temos o Banco Central dos EUA, o Banco Central do Japão e o Banco

Central da Inglaterra tentando aumentar a inflação atualmente para tentar aliviar os

débitos públicos desses países que giram em torno de 229%, 104% e 89%

respectivamente – ver tabela de dívida pública mundial na sessão 47. Caso sejam bem-

sucedidos, estes 3 países se recuperarão bem mais rápido do que os países da zona do

Euro.

Dado o estratosférico débito público da maioria dos países desenvolvidos, além de uma

necessária e excepcional taxação do capital, será necessário usar também a inflação para

se livrarem mais rapidamente de suas dívidas.

Um exemplo de que a austeridade não seja o caminho correto para se sair de crises pode

ser visto na história da Inglaterra. Após as guerras napoleônicas a dívida deste país foi

equilibrada com superávits primários de 2-3% do PIB somente depois de 99 anos – 1814

a 1913! Lembrando que na época a inflação na Inglaterra era mínima contribuindo para

este período eterno de acertos fiscais. Não foi à toa que Inglaterra ficou estagnada

economicamente todo este período (ocupando-se somente em enriquecer ainda mais os

credores privados da época).

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 124

Usar a técnica da inflação para diminuir dívida pública pode ser uma faca de dois gumes.

Depois que a inflação é instalada ela fica difícil de se controlar. Na França a inflação

chegou a 50% entre 1945 e 1948 e na Alemanha em 1923 os preços das mercadorias

chegaram a se multiplicar por 100 milhões! Além disto, a inflação é um fardo para os

pequenos poupadores não empreendedores pois capital parado é o mais penalizado em

épocas de inflação.

Concluindo, a inflação poderia ser usada para reduzir a dívida pública, mas o desafio dos

governantes seria mantê-la sob controle e, para que os pequenos investidores não sejam

tão penalizados, mantê-la alta por pouco tempo e, após se resolver a dívida, promover

políticas distributivas para compensar possíveis perdas da população. De qualquer

forma, sem a taxação excepcional do capital, qualquer procedimento apenas jogará

lenha na fogueira dos fatores divergentes de desigualdade.

198 Qual o Papel dos Bancos Centrais? Para melhor entender o papel da inflação e principalmente dos bancos centrais na

regulação do capital temos que voltar um pouco na história antes da atual crise para

uma análise mais ampla. Antes, quando o ouro era o padrão de todas as moedas – antes

da primeira guerra mundial – os bancos centrais tinham uma importância bem menor

na economia. O poder de criar dinheiro estava sempre limitado na quantidade de ouro

ou prata que se tinha em estoque. Reside problemas sérios no padrão ouro. O sistema

se desestabiliza quando o PIB mundial aumenta e as descobertas não. Ou quando se

descobre muitas reservas de ouro ou prata enquanto o PIB se estabiliza causando

aumento de preços e ganhos para alguns e muitas perdas financeiras para outros. Com

certeza, o padrão ouro nunca mais volta para ser a base de controle monetário mundial.

Keynes se referia ao ouro como uma relíquia bárbara.

Se o ouro não é base para geração de moedas, o Banco Central passa a ter um poder

imenso sobre a economia e precisa, portanto, ser regulamentado. Esta é a questão

central da discussão sobre a independência ou não do Banco Central. Deixá-lo solto e

autônomo é transferir poder de instituições democráticas eleitas diretamente para

grupos tecnocratas que não passaram no crivo de nenhum escrutínio.

Apesar do debate acirrado, hoje é consenso que o Banco Central tem um papel de

garantir saúde financeira das economias. O papel dele é evitar bancarrotas e garantir

liquidez. Na crise de 1930 quando o Banco Central ainda digeria o poder que lhe foi dado

de geração de moeda, a bancarrota foi generalizada por falta de liquidez. O Banco

Central dado sua imaturidade – o padrão ouro tinha sido banido há pouco tempo – não

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 125

cumpriu seu papel regulador. Esta foi a principal causa da crise de 30 ter sido bem maior

que a crise de 2008.

Para Friedman, a solução para qualquer crise econômica se encontra única e

exclusivamente em controles monetários, isto é, controle de emissão de moedas. Para

Friedman e todos monetaristas que formaram a base do liberalismo que se alastrou no

final da década de 70, o New Deal que tirou os EUA da crise foi uma farsa custosa e inútil.

Mas sem entrar na discussão de política monetarista liberal X keynesiana, todos são

unânimes: o papel do Banco Central é garantir liquidez e segurança no mercado

impedindo bancarrotas e crises como a de 1930.

Mas hoje afinal, o que os Bancos Centrais fazem? É importante destacar que eles não

produzem riqueza, mas a distribuem. Ao efetuar um empréstimo de alto valor para uma

determinada organização, ocorre uma dança de ativos e passivos, mas o capital total do

país continuará inalterado.

Para resolver pânicos financeiros, crises de guerra ou desastres naturais a melhor

ferramenta é o Banco Central que pode imprimir milhões de cédulas para um

financiamento rápido e resolver a questão pontual. Outras soluções são morosas e não

apropriadas dado a urgência. Criar um novo imposto ad-hoc, aguardar sua tramitação

no congresso, etc não é uma solução inteligente para momentos de crise.

199 A Crise cipriota: Quando a Tributação do Capital se Junta à Regulação Bancária O caso da Grécia é extremo e exemplar. Exige-se da Grécia que ela faça os mais ricos

pagarem mais impostos. Trata-se sem dúvida de uma excelente ideia. O problema é que,

na ausência de uma cooperação internacional adequada, a Grécia, evidentemente, não

tem os meios para arrecadar, sozinha, um imposto justo e eficaz, pois é muito fácil para

os seus cidadãos mais ricos deslocar seus fundos para outros países, muitos deles

europeus. As autoridades europeias não tomaram medidas que permitissem uma

implementação de tributação internacional e regulamentação bancária. Em

consequência, na falta de recursos fiscais adequados, tanto a Grécia como os outros

países envolvidos na crise criam receitas por meio da venda dos ativos públicos que

ainda lhes restam, em geral a preços baixos, o que para os compradores — gregos ou

europeus de diversas nacionalidades — sem dúvida é mais interessante do que pagar

impostos.

Outro caso interessante é o Chipre de março de 2013. O Chipre é uma ilha com um

milhão de habitantes que se juntou à União Europeia em 2004, depois à zona do euro

em 2008. Seu setor bancário é hipertrofiado, aparentemente pelo fato de possuir

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grandes depósitos estrangeiros, sobretudo russos, atraídos pelo regime fiscal frouxo. O

problema, na verdade, é que os bancos cipriotas não têm o dinheiro que aparece em

seus balanços. As quantias parecem ter sido alocadas em títulos gregos hoje

desvalorizados e investimentos imobiliários em parte ilusórios. Naturalmente, as

autoridades europeias hesitam em usar o dinheiro do contribuinte europeu para cobrir

os bancos cipriotas sem uma contrapartida, sobretudo porque se trata, no final das

contas, de cobrir os milionários russos.

Depois de meses de reflexão os responsáveis pela crise europeia tiveram a triste ideia

de aplicar uma tributação progressiva equivocada sobre as contas nestes bancos. Ocorre

que um milionário russo pagava quase que a mesma taxa de um poupador comum pois

as taxas eram muito semelhantes. Além disto, a base da tributação ficou pouco clara e

os milionários eram taxados somente no ato do depósito. Os valores já em conta,

bastava fazer uma transferência para títulos, ações ou bônus. Esta proposta foi

violentamente rejeitada pela população de Chipre que percebeu que a proposta era, na

verdade, regressiva.

Esse episódio é interessante por ilustrar as limitações dos bancos centrais e das

autoridades financeiras. Sua força é a rapidez de ação; sua fraqueza, a capacidade

limitada de direcionar corretamente as redistribuições que eles realizam. A conclusão é

que o imposto progressivo sobre o capital é não só útil enquanto imposto permanente

como também pode desempenhar um papel central na forma de arrecadação

excepcional (com taxas às vezes bem mais elevadas) no contexto da regulação de

grandes crises bancárias.

200 Euro: Uma Moeda Sem Estado Para o Século XXI? A decisão de criar o Euro surgiu no tratado de Maastricht em 1992 e a ideia

implementada em 2002. Naquela época, quando o neoliberalismo se fantasiava de

salvador da economia mundial, o papel dos bancos centrais era visto apenas como um

regulador da inflação sem atuação de controle maior e com total independência dos

governos democráticos. Talvez por isso, que o Euro tenha surgido. Mas com a crise de

2008 perceberam que os bancos centrais e, por conseguinte o Banco Central Europeu

foram personagens importantes para evitar uma crise maior e perceberam que o

neoliberalismo não era solução para nenhuma crise.

Ainda hoje, o estatuto do BCE prioriza a inflação baixa sobre o pleno emprego e o

crescimento refletindo ainda a ideologia neoliberal de 2002.

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 127

E, ainda mais importante, esses estatutos impedem o BCE de comprar dívidas públicas

recém-emitidas do governo: ele deve antes deixar os bancos privados emprestarem seu

dinheiro aos Estados da zona do euro (às vezes a uma taxa mais alta do que aquela a que

o BCE emprestou aos bancos privados), depois recomprar os títulos no mercado

secundário, o que ele acabou fazendo para os países do sul da Europa.

Em meio à crise instalada em 2008 na Europa, é quase impossível organizar um debate

democrático tranquilo sobre os esforços necessários e sobre as reformas indispensáveis

do Estado social europeu. Para os países do sul da Europa, trata-se de uma péssima

combinação. Antes da criação do euro, podia-se reativar a competitividade

desvalorizando sua moeda interna e impulsionando a atividade econômica. Pela lógica,

a contrapartida da perda da soberania monetária deveria ser a garantia da possibilidade

de tomar emprestado, se necessário, a taxas baixas e previsíveis.

201 A Questão da Unificação da Europa Para resolver estas contradições, a Europa precisa urgente de reinventar seu

parlamento. O parlamento europeu atual possui 27 países e muito não estão na zona do

euro e não estão interessados em resolver questões de forma unificada. Um novo

parlamento formado somente por países do Euro com parlamentares eleitos pelos

próprios países com legitimação democrática seria um grande passo. As metas de

redenção (níveis de dívida pública) e orçamentárias poderiam ser programadas de forma

consensual e conjuntas.

Sem uma evolução desta magnitude fica bem difícil imaginar uma saída desta crise da

zona do Euro. As dívidas e déficits devem ser compartilhados.

Uma questão crítica é o imposto sobre os lucros das empresas. Na Irlanda e em alguns

países do leste europeu as taxas são irrisórias. Esta estratégia vai de encontro com as

ideias de unificação. A melhor solução seria haver uma declaração única de lucros de

toda a Europa na zona do Euro e buscar integrações entre os bancos e estados para

impedir que grandes multinacionais transfiram seus lucros (o caso da Google na Inglaterra

é um exemplo) para países fora da zona do euro com leis que não obrigam a arrecadação

de impostos com altas taxas.

O imposto sobre o capital individual também é um problema para a unificação europeia. Gerard Depardieu também é um bom exemplo quando ele transferiu seus rendimentos para a

Rússia para se livrar das altas tributações da França. O conceito de residência do detentor

do capital deveria ser trocado pelo conceito de residência do capital. Isto poderia

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O Capital no Século XXI – Thomas Piketty

Jandui Tupinambás 128

diminuir os fluxos de capitais entre os países da zona do euro como subterfúgio para

sonegação de impostos.

Tudo isto é utópico? Não, se considerarmos que antes da primeira guerra era utópico

taxar grandes fortunas em até 80% ou mais como foi feito durante o século passado.

Nem existiria uma moeda independente de estados como foi idealizado o Euro em 1992.

Assim, questões como taxa de juros da dívida pública, imposto progressivo sobre capitais

e tributação dos lucros das multinacionais deveriam sair da soberania única de uma

nação e se tornar uma questão fiscal unificada.

202 Poder Público e Acumulação de Capital no Século XXI Numa sociedade ideal qual seria o nível ideal de endividamento público? Ou melhorando

a questão: qual o nível ideal de capital público em relação ao capital total nacional?

Enfim, de acordo com que já foi estudado, qual seria o melhor valor para β (capital total

/ renda nacional)? É difícil uma resposta exata mas podemos fixar uma margem limite

dentro de determinadas hipóteses. Seria razoável que o retorno r do capital –

teoricamente dentro dos parâmetros de sua produtividade marginal – não ultrapasse a

taxa de crescimento do PIB g. No século XIX r girava em torno de 4 a 5% e o crescimento

não passava de 1%. Para diminuir o retorno do capital precisaríamos de acumular mais

e mais capital. Difícil dizer qual a quantidade deveria ser acumulada, mas com certeza,

valores bem acima de 5, 6 ou 7 vezes o valor do PIB.

Na verdade, a coisa vista desta forma se torna bem abstrata. A regra de outro r = g não

é algo prático. Difícil qualquer sociedade acumular tanta riqueza para depois, evitar o

acúmulo e concentração de renda. Mas existe uma regra interessante implícita nesta

lógica r = g. Podemos concluir após alguma reflexão (reflexão presente na sessão original de

Piketty) que a regra de outro se assemelha a uma estratégia de saturação do capital.

Acumula-se tanto capital que a sociedade chegará num ponto onde os rentistas não

terão mais o que consumir pois seria necessário usar todo capital para reinvestir para

que o capital cresça no mesmo ritmo da economia e preservar o mesmo status social da

média da sociedade. Isto, se r = g. Mas com r > g será o suficiente reinvestir a cada ano

uma parte do retorno do capital correspondente à taxa de crescimento e consumir o

resto. A desigualdade r > g é, portanto, o mundo ideal dos rentistas.

203 Direito e Política O tratado de Maastricht em 1992 que fundou o euro fixou a dívida pública em 3% do PIB

e que a dívida pública total não poderia ultrapassar 60% do PIB. Ninguém nunca

conseguiu explicar a lógica econômica por trás destes números dos “cabeças de

planilha. Como fixar dívida de um conjunto de países se os ativos e capital público de

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cada país são variáveis indispensáveis para se determinar a capacidade de

endividamento de cada um? Voltamos no problema de um conselho democrático e

unificador para tratar estas questões. Varais razões nos levam a afirmar que não é nada

sensato escrever em mármore jurídico ou constitucional estes critérios orçamentários.

Tal poder não pode ser deslocado para o judiciário. Em tempos de crises, limites

econômicos ou orçamentários não são os mesmos que em tempos de bonança. Por isso,

as decisões precisam ser políticas e democráticas e não judiciais como está ocorrendo

atualmente.

A história mostra o viés conservador e inflexível do judiciário quando se trata de

questões orçamentárias. Na Europa existe a tendência de se priorizar o direito absoluto

de livre circulação de bens e capitais sobre os direitos dos Estados de promover o

interesse geral – o que inclui o direito de arrecadação de impostos.

Não podemos esquecer que atualmente a Europa nunca esteve tão rica. O patrimônio

púbico líquido é quase zero em todas as nações do Euro, mas o capital privado nunca

esteve tão elevado. O fato é que os países europeus jamais estiveram tão prósperos.

Vergonhosamente, o capital nacional é extremamente mal repartido: a riqueza privada

vive da pobreza pública e, sobretudo, por consequência, há uma despesa muito maior

em juros da dívida do que o que investimos, por exemplo, no nosso ensino superior. (No

Brasil o contexto é o mesmo só que em um nível ainda mais alarmante – estou em outubro de

2016). Hoje, a dívida pública está custando muito caro às finanças púbicas. Esta é a

principal razão pela qual é necessário reduzir esta dívida por meio de tributação

progressiva. Mas estas decisões, de qualquer forma, devem vir de um parlamento

soberano e democrático.

204 Mudança Climática e Capital Público Piketty coloca a questão da degradação do capital natural do ser humano no decorrer

do século XXI e como o poder público iria poupar capital público para tentar mitigar ou

diminuir esta perda. Ele mergulha num tema que ele pouco conhece do aquecimento

global e fala algumas besteiras como a possibilidade de inibir o uso de hidrocarbonetos.

A verdade é que atualmente a área do meio ambiente está contaminada pela “bad Science” e

com isto, as conclusões e as políticas públicas mundiais sobre a questão estão totalmente

equivocadas. Melhor desconsiderar esta sessão do livro.

205 Transparência Econômica e Controle Democrático do Capital O verdadeiro desafio do futuro não seria exatamente a questão do meio ambiente. O

desafio do futuro é, sem sombra de dúvidas, o desenvolvimento de novas formas de

propriedade e de controle democrático do capital. Pode existir formas híbridas de

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organizações que não sejam nem totalmente públicas nem totalmente privadas com

controle público e democrático sobre as decisões. Para isto precisamos de evoluir em

relação à transparência fiscal e econômica. Este é um desafio de governança

democrática com participação popular nas decisões das organizações.

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Conclusão

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Durante todo o livro, foi apresentado todo o conhecimento humano relativo à

distribuição das riquezas desde o século 18 até os dias atuais. Temos daí algumas lições

que podemos tirar.

Os estudos apresentados sobre este tema neste livro foram os mais amplos e detalhados

do que qualquer outro em todos os tempos. Porém, a pesquisa científica nunca é nem

será definitiva. Nada substitui o amplo e aberto debate democrático.

206 A Contradição Central do Capitalismo: r > g A conclusão geral deste estudo é que a economia de mercado baseada na propriedade

privada contém forças convergentes baseadas no conhecimento e em novas habilidades

no âmbito do trabalho. No entanto, as forças divergentes existem e atuam de tal forma

que passam a ser uma ameaça às sociedades democráticas. Quando não se tem sistemas

eficientes e democráticos de controle do capital o fator r tende a perdurar por longo

tempo acima de g (taxa de crescimento da economia) trazendo mais concentração e

maior desigualdade. Isto se torna um ciclo vicioso levando os empreendedores a abdicar

mais e mais de ações diretas nos meios de produção valorizando a relação capital X

produtividade marginal e a se dedicar ao nada dos rendimentos financeiros graças ao

alto índices do indicador r.

A solução mais clara para esta sinuca de bico é a tributação progressiva sobre o capital

que irá evitar a tenebrosa espiral da desigualdade. A experiência histórica mostra que as

desigualdades de riquezas tão extremas não têm relação com o espírito empreendedor

e nenhuma utilidade para o crescimento. A desigualdade, enfim, é inimiga da “utilidade

comum”; retornando à expressão que foi utilizada pela declaração de 1789 com a qual

foi aberto este livro.

A dificuldade para encarar tal caminhada de controle do capital é a necessidade de

conquistarmos uma cooperação internacional adequada e uma integração política

regional suficiente. No entanto, somente assim poderemos almejar uma regulação eficaz

do capitalismo patrimonial do século XXI que está somente se iniciando.

207 Por Uma Economia Política e Histórica Algumas palavras sobre economia e ciências sociais são importantes para concluirmos.

A Economia não pode ser um ramo de estudos independente da ciências sociais, história,

sociologia e antropologia. Ela deve ser colocada no seu devido lugar: uma subdisciplina

destas. Ciências econômicas é um termo meio arrogante como se a economia tivesse

galgado um patamar mais elevado e deixado as outras ciências sociais para trás. Piketty

sugere mudar o nome de Ciências econômicas para Economia Política. Os economistas

precisam de se engajar nos debates públicos mais do que ficar a desenvolver fórmulas

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em planilhas e tentar explicar fenômenos como a fome ou o desemprego com índices

criados em laboratórios.

Os economistas desde tempos antigos gastaram energia demais com especulações

puramente teóricas sem que os fatos políticos ou os problemas econômicos que

propunham resolver fossem devidamente entendidos ou mesmo definidos com clareza.

Hoje existe uma tendência salutar de alguns economistas em utilizar experiências para

identificar casualidades para embasar teorias. Isto é bom, mas não podemos nos

distanciar do mais importante: a história como o maior laboratório de economia. As

lições que podemos tirar analisando a história são insubstituíveis. Para tentar ser mais

eficazes, os economistas precisam ser mais pragmáticos e passar a utilizar com mais

afinco os dados históricos disponíveis sobre as sociedades e a economia de cada país e,

é claro, se aproximarem mais das outras disciplinas das ciências sociais para melhor

compreensão do que estão analisando. Por outro lado, os cientistas das áreas sociais

precisam encarar com mais coragem os números quando eles se apresentam e não

lavarem as mãos como se análises de números fossem de responsabilidade exclusiva de

economistas.

208 O Interesse dos Mais Pobres Furet, um economista francês abre seu livro de 1965 – Movimentação do lucro na França

do século XIX: “Enquanto as rendas das classes da sociedade contemporânea estiverem

fora do alcance da pesquisa científica, será em vão querer empreender uma história

econômica e social válida.”.

O livro de Furet é rigoroso, sem preconceitos e busca antes de tudo reunir materiais e

estabelecer fatos. Ele se tornou célebre por seus trabalhos sobre a história política e

cultural da Revolução Francesa onde é difícil encontrar algum traço das “rendas das

classes da sociedade contemporânea” em que o grande historiador, preocupado com

embate com os marxistas (na época dogmáticos e dominantes na Sorbonne), parecia

mais preocupado em refutar toda forma de história econômica social. Isto foi uma pena,

na medida em que é possível conciliar as diferentes abordagens.

Os combates bipolares dos anos 1917-1989 estão nitidamente no passado. Longe de

estimular pesquisas sobre capital e as desigualdades, os confrontos entre capitalismo e

comunismo contribuíram mais para empobrecê-los, tanto entre historiadores e

economistas como entre os próprios filósofos. Já está em tempo de superar confrontos

desta natureza.

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A abdicação da história como ferramenta fundamental para a análise econômica se deve

muito à dificuldade de obtenção e tratamento de dados. Assim, a análise dos elos entre

as evoluções econômicas e a história política e social do período estudado é

frequentemente mínima tornando as obras pobres e áridas.

O fim do uso da história pelos cientistas parece também estar ligado ao fato de que este

programa de pesquisa (história serial) ter morrido antes de alcançar o século XX. Hoje

corremos o risco do simplismo onde os esquemas abstratos sobre a infraestrutura

econômica e a superestrutura política bastam para compreensão do todo. Mas, uma

breve olhada nas curvas de desigualdade da renda e do patrimônio ou a relação capital

/ renda bastam para ver que a política está em toda parte e que as evoluções econômicas

e políticas são indissociáveis, devendo ser estudadas lado a lado.

Piketty tem para ele que os pesquisadores em ciências sociais, os jornalistas,

comentaristas, os militantes sindicais e os políticos de todas as tendências e,

principalmente todos os cidadãos deveriam se interessar mais pelo dinheiro, por sua

medida, pelos fatos e pelas evoluções que o rodeiam. Aqueles que possuem muito nunca

se esquecem de defender seus interesses. Recusar-se a lidar com números raramente

trará benefícios aos mais pobres.