Francisco Luiz Corsi
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1
Crise do capitalismo e reestruturação da economia mundial. As estratégias de
desenvolvimento na America Latina
Francisco Luiz Corsi1
1- Introdução
Análises que têm por objeto a América Latina não deixam de ser arriscadas, pois
a região é marcada pela diversidade, com inúmeras peculiaridades nacionais. O risco de
generalização é, portanto, muito grande. Todavia, uma série de aspectos comuns pode
justificar a empreitada2, sobretudo as experiências históricas e culturais comuns, a
situação de dependência e subordinação ante as potências hegemônicas, e a similar
inserção na economia mundial, elementos que tanto influenciam os processos políticos e
ideológicos, e os projetos de desenvolvimento, que constituem objeto deste artigo.
(Arceo, 2006, p. 28). Mais especificamente, o presente texto tem por objeto a discussão
das conseqüências das crises de 1929, da década de 1970 e da atual para as estratégias
de desenvolvimento das economias latino americanas, em especial para os casos do
Brasil e Argentina. Sem menosprezar as determinações sociais, políticas e econômicas
internas, esses momentos históricos foram decisivos para a definição dos rumos das
economias da região. Pretendemos também fazer um breve contra ponto da trajetória de
desenvolvimento das economias latino-americanas com as do Leste asiático. O artigo
1 Mestre em Economia e Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP). Professor de Economia da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC) da Universidade
Estadual Paulista –UNESP. Pesquisas concentradas na área de História Econômica, em especial em
política econômica brasileira no período 1930-1955 e em trajetórias de desenvolvimento econômico. No
momento, está desenvolvendo um projeto de pesquisa que busca realizar uma análise comparativa das
políticas econômicas de Brasil e Argentina no período 1930-1955. 2 Entre esses aspectos comuns cabe destacar a origem das economias da região no processo de expansão
comercial capitalista a partir do século XV, a inserção da região como exportadora de produtos primários
na economia mundial, a acentuada concentração da propriedade e da renda, a formas que assumiu o
processo de industrialização após a crise dos anos de 1930 com base na substituição de importações e as
formas de adoção das políticas neoliberais, marcadas pela privatização das empresas públicas, abertura
das economias nacionais, processo de acentuada desnacionalização e elevada dívida externa (Acerceo,
2006, p. 28). Sobre as questões metodológicas pertinentes a um estudo comparativo ver a respeito Devoto
e Fausto (2004) e Cruz (2007)
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não pretende esgotar temas tão complexos, mas apenas realizar um balanço dessas
questões e tecer alguns comentários críticos acerca desses processos.
A crise de 1929 e a depressão que se seguiu acarretaram uma relativa
desarticulação da economia mundial, que abriu novas possibilidades de
desenvolvimento para os países da região que já tinham alcançado certo patamar de
desenvolvimento. Definiram-se projetos de desenvolvimento voltados para o mercado
interno e para a industrialização via substituição de importações. A Segunda Guerra e as
dificuldades de reorganização da economia no imediato pós-guerra projetariam esse
quadro para o período subseqüente. Não se colocava à época estratégias voltadas para as
exportações. A retomada do processo de internacionalização do capital, sobretudo, a
partir de meados da década de 1950 colocou novas questões para essas estratégias de
desenvolvimento, que enfrentavam diversos obstáculos, em particular no tocante ao
financiamento externo.
A crise de 1974 e a reestruturação do capitalismo que se seguiu fecharam os
espaços para as estratégias desenvolvimentistas. Com a globalização observa-se
crescente tendência de abertura comercial e financeira das economias nacionais, uma
onda de inovações tecnológicas, a reestruturação dos processos produtivos, a
intensificação dos fluxos de capitais e a realocação espacial de inúmeros setores
industriais para a periferia, sobretudo para o Leste Asiático. Os países latino-americanos
enfrentando severas crises de endividamento externo e inflacionária (processos
articulados à nova situação internacional) tiveram enormes dificuldades de se inserir de
forma dinâmica nessa nova ordem. Abandonaram as estratégias desenvolvimentistas e
assumiram as políticas recomendadas pelo chamado Consenso de Washington.
A região entrou em uma fase de estagnação e instabilidade econômica, marcada
por forte vulnerabilidade externa. As crises internacionais tendiam a se desdobrara em
crises financeiras internas. A situação começou a mudar com a fase de expansão da
economia mundial 2003-2007 e com a guinada para centro esquerdo observada em
importantes países da região, que significou rupturas, em graus variados, com o modelo
neoliberal. Verifica-se a retomada do crescimento e a adoção de políticas sociais mais
abrangentes. Todavia, as economias latino-americanas continuaram na trajetória,
seguida desde a adoção do modelo neoliberal, de involução do setor industrial e
3
retomada da importância dos setores primários, o que representa uma inserção na
economia mundial cada vez mais acentuada como exportadora de produtos agrícolas e
minerais. Tendência exacerbada com a crescente ascensão da China no cenário
internacional.
A crise atual ao acenar com o deslocamento do centro do capitalismo para a Ásia
e para um mundo multipolar parece acentuar a tendência de uma inserção pouco
dinâmica na economia mundial dos países da região. O artigo basear-se-á em ampla
bibliografia existente sobre esses temas e nas bases de dados existentes na CEPAL.
Palavras - chave: Crise, Desenvolvimento, América Latina
2- A crise de 1929, relativa desarticulação da economia mundial e a definição de
projetos nacionais de desenvolvimento
A década de 1930 foi marcada pela Grande Depressão. A atividade econômica
regrediu em quase todos os países do mundo capitalista e o desemprego atingiu taxas
elevadíssimas. Com a queda acentuada dos preços dos produtos primários, as regiões
menos desenvolvidas, que em muitos casos já enfrentavam problemas de superprodução
desde a década anterior, também imergiram na depressão. Como diz Hobsbawm (1995,
p. 96), esses eventos tornaram “...a depressão global no sentido literal”.
Uma das mais importantes conseqüências dessa globalidade da Grande
Depressão foi uma relativa desarticulação da economia mundial. A queda acentuada dos
fluxos de capital, mercadorias e força de trabalho rompeu com a tendência de contínua
integração da economia mundial. Consolidou-se a tendência de redução do livre
deslocamento internacional de mão de obra, já delineada desde a I Guerra Mundial.
Entre 1929 e 1932, o volume das trocas mundiais caiu em 25% e seu valor sofreu uma
diminuição de cerca de 60%. O sistema multilateral de trocas praticamente desmoronou,
prevalecendo em seu lugar acordos bilaterais de comércio e um ferrenho protecionismo.
Paralelamente, observou-se um declínio de cerca de 90% dos empréstimos
internacionais e, ao longo da década de 1930, uma drástica redução dos investimentos
diretos externos. A redução dos fluxos de capital atingiu negativamente os países
4
devedores, contribuindo para uma queda ainda maior das importações e para a
generalizada suspensão dos pagamentos das dívidas externas a partir de 1931. Na
América Latina observou-se uma onda de moratórias das dívidas externas. (Hobsbawm,
1995; Kennedy 1989).
Outro elemento importante de desagregação dos laços econômicos foi o
solapamento do já combalido padrão ouro-divisas (Gold Exchange Standard), a partir
da desvalorização da libra (1931) e do dólar (1933). O desmoronamento do padrão
monetário internacional foi fundamental para a constituição de áreas restritas de
comércio vinculadas às diferentes moedas.
Em virtude da relativa desarticulação da economia mundial e da queda
generalizada da atividade econômica, muitos, à época, acreditavam que um sistema
mundialmente integrado parecia estar com seus dias contados. A ascensão do nazismo,
que recolocava de forma mais aguda a luta pela hegemonia mundial, e a política
expansionista do Japão no Extremo Oriente aumentavam ainda mais as incertezas
quanto ao futuro. O contexto era de acirramento das disputas interimperialistas e das
lutas e classe. Embora os movimentos de esquerda tenham sofrido um refluxo no início
dos anos 1930, voltaram a crescer a partir de meados da década, acirrando os embates
com o nazifascismo e as disputas ideológico-políticas entre socialismo e capitalismo. A
vitória da Frente Popular na França e a Guerra Civil Espanhola são emblemáticas dos
confrontos vividos naquele momento. O fato da URSS, que levava a cabo uma política
de construção do socialismo em um só país, passar incólume pela crise, apresentando
vigoroso crescimento sob a égide dos planos qüinqüenais, consistia em outra fonte de
dúvidas quanto à sobrevivência do capitalismo (Hobsbawm, 1995).
A relativa desarticulação da economia mundial abriu espaços para a busca de
saídas nacionais para a crise. A alarmante situação econômica vivida por diversos países
empurrou a maioria dos governos a experimentar políticas alternativas à ortodoxia
econômica neoclássica, então perplexa diante dos acontecimentos. Ao longo da década
de 1930, os Estados passaram a intervir cada vez mais na economia, procurando regular
os mercados e estimular a atividade econômica. As desvalorizações competitivas de
moedas, os controles de câmbio e importações, as restrições à livre circulação de
capitais e de força de trabalho, o comércio bilateral e um forte protecionismo passaram
a ser adotadas por um número crescente de países. Cada país queria proteger-se da crise
5
mundial, direcionando sua economia para o mercado interno e, ao mesmo tempo,
exportando mais e importando menos.
A Grã-Bretanha, símbolo da economia liberal, a partir de 1932 com a
introdução da lei de Direitos de Importação, que estabelecia um aumento significativo
das tarifas, rompeu com três quartos de século de política liberal e procurou orientar sua
economia para o mercado interno e consolidar a área do esterlino com os acordos
comerciais de Ottawa, assinados com outros membros da comunidade britânica nesse
mesmo ano. Os EUA se fecharam ainda mais com a introdução da tarifa Smoot-Hawley
em 1930. Esses não eram casos isolados, mas representavam uma tendência geral
(Hobsbawm, 1986; Kennedy, 1989).
A América Latina foi duramente atingida pela crise e muitos países romperam
com a ortodoxia e também buscaram novos rumos. Grosso modo, podemos dividir os
países da região em dois blocos. Os países menos desenvolvidos tinham poucas
alternativas de mudanças de rumos, pois suas economias pouco diversificadas
pautavam-se na exportação de produtos primários e o grau de urbanização era bastante
reduzido. Estes países procuraram enfrentar a crise por meio de políticas ortodoxas, que
ao contribuírem para reduzir a demanda agregada agravavam a própria situação. Para
estes países, a crise foi mais dura e demorou mais tempo para ser superada. Neste caso,
encontravam-se Equador, Peru, Venezuela, Paraguai, Bolívia, Cuba, Haiti, República
Dominicana e mais seis países centro-americanos (Cano, 2000).
Embora suas economias fossem fundamentalmente agrárias, outro grupo
formado por países, que já tinham uma economia mais diversificada, com um incipiente
processo de industrialização e urbanização, seguiu trajetória distinta. Este grupo
englobava o Chile, a Colômbia e, sobretudo, México, Brasil e Argentina. Para esses
países o leque de opções era maior. Seguiram a tendência geral. Fecharam suas
economias e buscaram soluções próprias para a situação. A crise tinha tornado evidente
a vulnerabilidade de países dependentes de uns poucos produtos primários de
exportação. Pelo menos os principais países da região, a partir de 1931, adotaram
controles de câmbio e de importações, políticas creditícias e monetárias de caráter
expansivo, medidas que significavam uma maior presença do Estado na economia,
políticas de formação de estoques reguladores para os principais produtos de
exportação, medidas de proteção e incentivo à indústria e procuram rever o pagamento
de suas dívidas externas. De imediato, não se observa a adoção de políticas de cunho
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industrializante: a preocupação inicial parecia ser em neutralizar a crise através da
diversificação da economia (Donghi, 1975). Os governos, as classes sociais e os
partidos políticos demoraram algum tempo para tomar consciência das novas
possibilidades que se abriram naquele momento para os países que já tinham alcançado
certo patamar de desenvolvimento capitalista. Só um pouco mais tarde, com o avanço
das ideologias nacionalistas, os projetos nacionais de desenvolvimento vieram a ganhar
contornos mais nítidos como nos casos do cardenismo no México e do peronismo na
Argentina e o vargismo no Brasil. (Llach, 1992; Ianni, 1991).
Contudo, mesmo dentro desse grupo encontramos diferentes estratégias de
desenvolvimento, condicionadas pelos resultados das lutas e dos impasses políticos e
sociais de cada país. Os casos do Brasil e da Argentina são emblemáticos. No Brasil, a
Revolução de 1930 deslocou a burguesia cafeeira da posição hegemônica, o que
conferiu ao Estado, em um contexto de crise de hegemonia, maior autonomia para
responder rapidamente a crise e para conduzir um projeto calcado na industrialização e
no mercado interno, que amadureceu paulatinamente e ganhou contornos mais nítidos
no Estado Novo. A política de defesa do café, o monopólio do câmbio e a política
monetária e fiscal expansiva foram fundamentais para a relativamente rápida
recuperação da economia e contribuíram para o processo de industrialização deslanchar
a partir de 1933. Uma série de outras medidas também foi fundamental para a mudança
de rumos nos anos que se seguiram, a saber: a legislação trabalhista, visando a
regulação das relações entre capital e trabalho, a criação de inúmeros organismos de
fomento e regulação de setores específicos da economia, a implantação da grande
siderurgia, as incipientes tentativas de planejamento econômico em 1939 e 1943 por
meio do Plano de Obras Públicas e Raparelhamento da Defesa Nacional e do Plano de
Obras e Equipamentos, centrados na expansão da infra-estrutura e na indústria de base,
a busca racionalização do serviço público, as tentativas de criar mecanismo de
financiamento dos investimentos, como a CREAI do Banco do Brasil e a formação de
um fundo de investimentos a partir da cobrança de impostos sobre as operações
cambiais, a nacionalização dos recursos naturais presentes nos códigos de Águas e
Minas (1934) e na Constituição de 1937 e as medidas protecionistas. Medidas que
expressam o projeto de desenvolvimento e Vargas
Na argentina, o golpe de Estado desferido pelo general Uriburu
derrubou o governo constitucional de Yrigoyen e reafirmou a hegemonia dos setores
7
exportadores e da chamada oligarquia diversificada, que tinha origem agrícola, mas
tinha diversificado sua atuação para o comércio, os serviços, a indústria e finanças.
Dessa forma, a política de enfretamento da crise parece ter sido fortemente
condicionada pela reafirmação do predomínio dos grandes proprietários de terras,
expresso no golpe de Estado e depois nas eleições de Augustim Justo. O Brasil, ao
contrário, vivia uma crise de hegemonia, que abria uma maior possibilidade de adoção
de políticas alternativas. No país platino não se observa, pelo menos nos primeiros anos
da crise, medidas de caráter industrializante e nem um programa amplo de defesa da
renda e do emprego semelhante à política de defesa do café implementada por Vargas.
A suspensão da convertibilidade da moeda ainda em 1929, o que no Brasil só viria a
ocorrer em dezembro de 1930, quando as nossas reservas tinham se esgotado, não
impediu a forte desvalorização do peso. Como no Brasil, foram introduzidos, em 1931,
controles de câmbio, que seriam aperfeiçoados em 1933 com a introdução de licenças
de importações e taxas múltiplas de câmbio, pois a deterioração das contas externas não
deixava alternativa. Essas medidas adotadas a partir de 1933 estimulariam a indústria.
Os aumentos das tarifas aduaneiras em 1930 e 1932 não tinham por objetivo estimular a
produção industrial interna, mas sim incrementar a arrecadação do Estado. Em 1931, foi
introduzido o imposto sobre a renda com objetivo de ampliar a arrecadação e diminuir a
dependência da receita pública em relação ao imposto de importação. Essas medidas
somadas a diminuição de gastos acarretaram um equilíbrio das finanças públicas por
volta de 1933. A política monetária também foi ortodoxa. Entre 1929 e 1933, observa-
se uma redução da oferta monetária de 14%. As taxas de juros aumentaram em plena
depressão. Os rendimentos das Letras Hipotecarias aumentaram de uma média 6,1% em
dezembro de 1928/29 para 7% em dezembro de 1932. Os rendimentos dos títulos do
governo subiram de 6,2 para 7,5% no mesmo período. As taxas de juros só passaram a
declinar a partir dessa data. A elevação das taxas de juros reais foi muito maior que
esses números, pois se verificou deflação no período. Ou seja, o governo argentino
levou a cabo uma política de equilíbrio orçamentário e monetário justamente no período
mais agudo da crise como recomendava a boa ortodoxia neoclássica. Política bem
diversa da aplicada por Vargas, que ampliou consideravelmente o gasto público e
expandiu a base monetária nesse período, particularmente na fase mais aguda da crise
em 1931 e 1932A diferença entre a política econômica dos dois países pode também ser
observada no tratamento dispensado a dívida externa. A Argentina em nenhum
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momento suspendeu o pagamento de suas dívidas, caso raro na América Latina no
período. Manteve seus compromissos externos, apesar das crescentes dificuldades em
pagá-los. Enquanto o Brasil decretou moratória da dívida em 1931 e 1937. Também
manteve sua tradicional alianaça com a Inglaterra, assinando um acordo comercial com
os britânicos muito mais bastante desfavorável de que o Brasil firmou com os EUA no
mesmo período (Alejandro, 1973; Romero, 1994; Cano, 2000; Ferrer, 2006).
O primeiro esboço de uma política claramente industrializante na Argentina se
deu com o chamado Plano Pinedo de 1941, que propunha uma industrialização centrada
nos setores de processamento de produtos agrícolas e minerais, nos quais a Argentina
detinha vantagens comparativas, e na expansão da construção civil. Também estabelecia
um esquema interno de financiamento de investimentos de longo prazo, que seria
coordenado pelo Banco Central e sustentado pelo fortalecimento dos mercados de
capitais e do sistema financeiro. O plano propunha uma industrialização voltada para as
exportações e um redirecionamento econômico e político em direção a nova potência,
os EUA. A proposta do Plano transcendia o contexto imediato da guerra, no qual a
Argentina aumentou consideravelmente, como o Brasil, suas exportações para os países
vizinhos. Contudo, não chegou a ser aprovado não só em virtude do bloqueio que a
União Cívica radical fazia às matérias apresentadas pelo governo no Congresso, mas
também devido às dificuldades de sustentar o desenvolvimento a partir das exportações
em um contexto de relativa desarticulação da economia mundial e, sobretudo, por falta
de complementaridade com a economia norte-americana, o grande mercado que poderia
absorver as exportações argentinas, dada a decadência da Inglaterra, tradicional aliada
dos argentinos. A definição de uma ampla política industrializante na Argentina deu-se
com Perón, que estabeleceu amplas políticas voltadas para o fortalecimento do mercado
interno, em particular a indústria. A política peronista também estava centrada na
geração de empregos e na distribuição da renda. Tudo isso seria financiado pelas
exportações, que passaram a ser diretamente controladas pelo Estado, o que foi um dos
fatores de seu esmorecimento no final da década de 1940, com conseqüências bastante
negativas para o próprio programa de desenvolvimento argentino (Llach, 1992).
Este quadro que abria a possibilidades de projetos nacionalistas e
desenvolvimentistas projetou-se para o período subseqüente. A reorganização da
economia mundial no pós-guerra, sob a hegemonia dos EUA, não fechou essas
9
possibilidades. As dificuldades dos EUA em levar a cabo seu projeto de reorganizar a
economia mundial sob a égide do livre comércio e da livre circulação de capital
forçaram-no a aceitar a permanência, por longo tempo, dos controles de câmbio e dos
fluxos de capital, especialmente os de curto prazo. As dificuldades das economias
destroçadas pela guerra, as lições da Grande Depressão, a correlação de forças favorável
aos trabalhadores no centro e o avanço dos movimentos de descolonização, muitos deles
de inspiração marxista, em um contexto de Guerra Fria, abriram espaço para a economia
mundial organizar-se com base em fortes economias nacionais e nos países
desenvolvidos contribuíram para o florescimento do Estado de Bem-Estar Social. O
grande capital financeiro internacional, enfraquecido pela depressão, teve que se adaptar
a nova situação.
Para a América Latina não estava colocada, neste contexto, uma estratégia
dirigida para as exportações. Isto pelo menos até a segunda metade dos nos 1950.
Varguismo, Cardenismo e Peronismo são exemplos de projetos de desenvolvimento
voltados para a indústria e para o mercado interno. Embora buscassem fortalecer o
capital nacional, internalizar os centros de decisões e garantir uma margem maior de
autonomia na definição de suas políticas internas e externas, esses projetos não
excluíam a participação de capital estrangeiro no financiamento do desenvolvimento e
de empresas estrangeiras na economia nacional. Pelo contrário, buscavam com matizes
e intensidades diferentes articular o desenvolvimento ao financiamento e ao capital
externo. Não buscavam a autarquia econômica e nem romper com o bloco ocidental.
Mas ao lutarem por certa autonomia, principalmente no contexto de acirramento da
guerra fria, eram considerados nacionalistas.
Vargas, por exemplo, esperava ser possível industrializar o Brasil, garantir sua
soberania e conseguir um papel de destaque na América Latina, contando para isso com
apoio político, financeiro e tecnológico norte-americano. Com tais objetivos, esse era
um difícil projeto no contexto em que os EUA firmavam-se como grande potência e
exigiam estrita subordinação dos países que estavam em sua área de influência3 (Corsi,
3 Projeto Nacional de desenvolvimento não é entendido aqui como um projeto que integra os interesses
coletivos da nação. Entendemos que as classes e as facções de classe podem ter um projeto seu para a
nação. A sociedade é marcada pela luta de classes e, portanto, não podemos falar em interesses que
congreguem o conjunto das forças sociais. Ao falarmos em projeto não queremos dizer que as ações das
classes, das facções de classe e de grupos estejam previamente definidos por um projeto dado. Mesmo
porque esses projetos nunca aparecem acabados. Eles sofrem inflexões, são abandonados etc. a partir da
luta social e das mutantes circunstâncias políticas, sociais e econômicas (Corsi, 2000).
10
2000). Perón buscou, diante a forte crise econômica enfrentada pela Argentina no final
da década de 1940, aproximar-se dos EUA e atrair capital estrangeiro para financiar o
desenvolvimento argentino (Romero, 2006).
As estratégias de desenvolvimento têm que ser analisadas em seu contexto
histórico. No período em pauta, os projetos de desenvolvimento visando à
industrialização e autonomia nacional, embora contando para viabilizar esses objetivos
com apoio político e financeiro externo, pareciam uma alternativa plausível. Pelo menos
para os países mais importantes da região, como México Argentina e Brasil, que
dispunham de um mercado interno potencialmente amplo e abundantes recursos naturais
e certo patamar de desenvolvimento capitalista, a estratégia de garantir um crescimento
voltado para o mercado interno parecia à única saída em um contexto de relativa
desarticulação da economia mundial. A estratégia voltada para as exportações era
inviável.
No período 1930-1945, as economias nacionais estavam relativamente fechadas
e o comércio internacional em crise. Depois do final II Guerra até a segunda metade da
década de 1950, embora observemos uma retomada do comércio internacional, a
possibilidade de sustentar o crescimento nas exportações não parecia alentadora, mesmo
porque as economias centrais não estavam abertas para os produtos manufaturados da
periferia. Ou seja, não se colocava à época a possibilidade de um desenvolvimento
calcado nas exportações de produtos manufaturados e a crise dos anos 1930 tinha
demonstrado a inviabilidade de países cujas economias se sustentavam em um punhado
restrito de produtos primários. Além disso, nesse período, os fluxos de capitais para a
América Latina foram modestos. Esse contexto contribuiu para a formação de uma
visão negativa das exportações de produtos primários como saída para o
desenvolvimento, claramente expressa no pensamento cepalino. A divisão internacional
do trabalho naquele momento não abria a possibilidade de estratégias de
desenvolvimento voltadas para as exportações (Arceo e Basualdo, 2006; Corsi, 2000).
Os projetos desenvolvimentistas conseguiram garantir taxas respeitáveis de
crescimento. Desse ponto de vista, foram um sucesso. Os problemas desses projetos
residiam sobretudo nos resultados sociais do crescimento. Esses projetos apresentaram
grandes dificuldades de enfrentar os graves problemas de desigualdade e miséria que
historicamente assolavam a região e também se mostraram incapazes para completar os
processos de industrialização.
11
A incapacidade de completar os processos de industrialização residia, pelo
menos em parte, em problemas relativos à constituição de um esquema de
financiamento interno da acumulação de capital. Esse problema estava vinculado à
incapacidade do Estado articular esse esquema e garantir uma maior ação na economia.
As classes dominantes, mesmo aqueles setores beneficiados pelas políticas
industrializantes, sempre viram com preocupação o excesso de intervenção estatal na
economia, embora muitos setores, particularmente o setor industrial, necessitassem de
ampla proteção e auxílio creditício, sem falar na necessidade do Estado assumir os
setores da economia que a burguesia não tinha condições de levar avante, mas vitais
para a continuidade do crescimento. As classes dominantes também sempre viram com
desconfiança as mobilizações operárias e a intervenção dos trabalhadores na vida
política. Em momentos de agudização dessas mobilizações, unificavam-se contra
qualquer mobilização popular mais intensa, o que fragilizava os projetos nacionais de
desenvolvimento. Outro problema era o das políticas cambiais que não incentivam as
exportações agrícolas, o que contribuía para agravar os crônicos problemas das contas
externas, agravados ainda mais pela deterioração dos termos de intercâmbio. O Estado
na América Latina, que aparentemente era forte e isso era bem visível no tratamento
dispensado a classe subalterna, nessas questões mostrava seu lado frágil (Fiori, 1995,
Arceo, 2006; Corsi, 2000).
Contudo, observa-se a partir de meados da década de 1950 a retomada do
processo de internacionalização do capital. A retomada dessa tendência, nos anos 1950,
marca o fortalecimento dos grandes oligopólios e da grande finança, o que seria um dos
fatores da crise da ordem econômica internacional estabelecida em Bretton Woods na
década de 1970. Esse processo também teve conseqüências para os países da região. A
forte expansão das empresas multinacionais em direção às regiões periféricas redefiniu
a divisão internacional do trabalho e colocou novas questões para os projetos nacionais
de desenvolvimento, que, em muitos casos, estavam em um beco sem saída, em virtude
de sérios problemas de financiamento interno e externo. Essas empresas multinacionais
dirigiam-se para a periferia para ocupar os mercados internos, então fortemente
protegidos, que tinham potencial de crescimento, mão-de-obra barata, abundância de
recursos naturais e tinham alcançado um razoável desenvolvimento capitalista. O
12
objetivo não era conquistar uma base para exportar produtos manufaturados baratos
para o conjunto do sistema. Isto não se colocava à época (Oliveira, 2003)4.
Para alguns países, abriu-se a possibilidade de um desenvolvimento baseado em
uma larga associação com o capital estrangeiro. Nessa fase, começaram a ficar
evidentes as crescentes dificuldades de projetos de desenvolvimento com autonomia
nacional, embora alguns países continuassem a desenvolver-se nessa direção. A
diferença com o período anterior no tocante às estratégias de desenvolvimento é que
agora eram propostas estratégias de desenvolvimento associado com maior
subordinação ao capital estrangeiro, a busca de certa autonomia e projeção internacional
tinha ficado para trás.
Uma comparação com os países do Leste asiático, que tenderam a seguir outro
caminho, é ilustrativa. Vejamos o caso da Coréia. Antes de tudo, é preciso assinalar que
esse país seguiu nos anos 1950 e início da década seguinte uma estratégia de
desenvolvimento baseada na substituição de importações, que só conseguiu se sustentar
graças às significativas injeções de capital norte-americano. A industrialização via
substituição não representava uma saída consiste para esse país, que não tinha um
mercado interno potencialmente promissor e nem era dotado de abundantes em recursos
naturais, que pudessem sustentar uma estratégia calcada em exportações de produtos
primários ou contribuir para o financiamento de uma estratégia substitutiva de
importações (Amsden, 1992; Canuto, 1994; Goldenstein, 1992; Arceo, 2006; Arrighi,
1997; Velasco e Cruz, 2007. Os próximos parágrafos baseiam-se nessas obras).
Mas algumas características, que poderiam indicar obstáculos para o
desenvolvimento, transformaram-se com as mudanças na divisão internacional do
trabalho e no quadro geopolítico da região em vantagens. Inicialmente a ajuda
financeira e posteriormente o acesso privilegiado ao mercado norte-americano, que só
podem ser explicados pelo papel geopolítico da Coréia na guerra-fria, foram de grande
importância para o desenvolvimento da região. O estreito mercado interno, dado os
níveis baixos de renda, a população relativamente pequena e o arrocho dos salários, e a
carência de recursos naturais foram fatores que induziram o país a buscar uma estratégia
dirigida para as exportações, o que implicava construir uma indústria competitiva. Cabe
destacar também que a situação internacional tinha se alterado substantivamente. O
4 Sobre esse ponto, também baseamo-nos em Belluzzo e Coutinho (1984).
13
avanço da internacionalização do capital e o acentuado crescimento dos fluxos
comerciais abriam novas possibilidades.
No que diz respeito à questão do desenvolvimento da tecnologia, outro ponto
fraco da América Latina, a Coréia logrou um desenvolvimento em bases nacionais, que
só foi possível graças aos fortes investimentos em educação e ao fato das empresas
coreanas terem que desenvolver capacidade tecnológica para competir. As
multinacionais, que entraram em larga escala na América Latina a partir de meados dos
anos 1950, não se interessaram pela Coréia, com seu mercado exíguo, apesar de sua
relativa abundância de mão de obra barata. Isso foi um dos fatores que permitiu a
preponderância do capital nacional na economia coreana e induziu ao desenvolvimento
tecnológico, pois as multinacionais não têm interesse de desenvolver tecnologia nos
países periféricos, elas trazem de suas matrizes pacotes tecnológicos prontos. Além
disso, o Estado, que teve grande peso no desenvolvimento do país, estabelecia metas de
desempenho para as empresas, que incluíam o desenvolvimento de tecnologias.
A ação norte-americana na Coréia também contribuiu para o equacionamento de
outras duas questões chave do processo de desenvolvimento das regiões periféricas, a
saber: o problema agrário e o do papel do Estado na economia. Os EUA ao
patrocinarem uma reforma agrária na Coréia criaram um amplo campesinato, que foi
importante para a sustentação do Estado autoritário no país e, ao mesmo tempo,
neutralizaram os grandes proprietários. É verdade que a reforma agrária só foi possível
naquele país devido ao fato das terras distribuídas terem sido propriedades que estavam
nas mãos dos japoneses e dos colaboracionistas, nacionalizadas após o término da II
Guerra. Também não existia uma burguesia (industrial, comercial e financeira) de peso,
dado o próprio desenvolvimento acanhado da economia. Da mesma forma, o
proletariado era débil e desorganizado. O Estado também tratou a classe trabalhadora
com mão de ferro, o que garantiu elevada taxa de exploração. Esse contexto, conferiu
grande autonomia ao Estado coreano para implementar projetos de desenvolvimento,
ainda mais que ele contava com forte apoio externo. Além disso, as empresas japonesas
nacionalizadas foram utilizadas pelo Estado no processo de formação dos grandes
grupos nacionais (Velasco e Cruz, 2007).
Na América Latina, a burguesia agrária vinculada às exportações nunca foi
anulada. Na Argentina, o seu peso político e econômico foi um dos fatores que
bloquearam o avanço da industrialização. No Brasil, onde foi deslocada da posição
14
hegemônica em 1930, continuou a ter um papel relevante e serviu para impor limites à
ação industrializante do Estado. A presença dessas forças sempre foi um dos fatores de
instabilidade política na região. Na América Latina a presença das classes populares na
vida política foi, no período em pauta, aparentemente maior que na Coréia. Embora
esses setores tenham sido um ponto importante de apoio para as políticas
industrializantes, nunca foram totalmente subordinados ao Estado, o que exigia
reconhecimento de suas demandas e políticas voltadas para os trabalhadores. Isto muitas
vezes assustava as classes dominantes que se reaglutinavam para bloquear avanços reais
ou imaginários das classes subalternas. O Estado na região nunca teve a autonomia que
desfrutou o Estado coreano. Este no plano da política internacional manteve a mais
estrita subordinação a política norte-americana. Porém, em compensação, teve espaço
para desenvolver uma economia forte, centrada no capital nacional, sem que isso
significasse qualquer forma de isolamento, mas sim profunda articulação com a
economia mundial (Basualdo e Arceo, 2006).
Os projetos voltados para a industrialização visando diferentes graus e formas de
associação com o capital estrangeiro e ou visando autonomia, que proliferaram na
periferia do sistema entre as décadas de 1930 e 1970, vieram em sua maioria a ruir a
partir dos anos 1980. O fracasso dos projetos socialistas também pode ser visto sob
essa ótica, pois eles, entre outros aspectos, representavam alternativas de
desenvolvimento ao sistema capitalista. Embora tivessem obtido êxito parcial no tocante
à industrialização, ao desenvolvimento tecnológico e à melhoria do nível de vida de
suas populações, o fracasso desses projetos reforçaria, segundo vários autores, dentre
eles Ianni (1992), as enormes dificuldades de um desenvolvimento econômico, social,
político e cultural fora do âmbito da sociedade capitalista global. A partir de outro
referencial teórico, Arrighi (1997) vai nessa mesma direção, considera o
desenvolvimento da periferia uma ilusão.
A reestruturação do sistema capitalista, que marcou esse período, foi, em grande
medida, uma resposta à crise estrutural aberta em 1974 e à crescente contestação social.
A reestruturação buscou-se recompor a rentabilidade do capital em queda acentuada,
reorganizando o processo produtivo, por meio da introdução da chamada “acumulação
flexível”, e realocando espacialmente setores importantes da indústria, o que contribuiu
para o surgimento de novas fronteiras de acumulação de capital, em especial na Ásia.
Nesses complexos processos, foram introduzidas novas tecnologias que poupam
15
trabalho e diferentes formas de reorganização do processo de trabalho, acompanhadas
da desregulamentação do mercado e da precarização das condições de trabalho.
Mudanças que contribuíram para fragmentar a classe trabalhadora e enfraquecer os
sindicatos. Observa-se rápida e acentuada desregulamentação das economias nacionais,
caracterizada pela abertura comercial e, sobretudo, financeira. O incremento da
concorrência, a reestruturação produtiva e as novas tecnologias têm condicionado
profundas alterações nas classes sociais, na luta de classes e na posição dos países no
capitalismo globalizado (Belluzzo, 2005). Nesse processo, os EUA conseguiram
reafirmar sua hegemonia, embora tenha ela passado a enfrentar problemas crescentes
tanto em termos econômicos quanto políticos. Foi central também o deslocamento
espacial para a periferia, sob o comando dos grandes oligopólios, de importantes setores
industriais. Nesse processo, gestou-se, ao longo dessa fase, um novo pólo dinâmico de
acumulação de capital no Leste asiático, enquanto o resto da periferia, apesar de
inúmeras especificidades regionais, tendeu para uma fase de lento crescimento e crise
social.
Para a periferia do sistema capitalista, um dos marcos desse processo foi a
abertura das economias nacionais iniciada ainda na década de 1980. Esse processo foi
inspirado no chamado “Consenso de Washington”, que apesar de vago teve enorme
influência na região. Suas propostas não se esgotavam, como assinala Arceo (2006), nas
propostas de estabilização da economia, mas consistiam, sobretudo, em uma agenda de
reestruturação das economias periféricas com o objetivo de prepará-las e inserí-las na
nova ordem global de acordo com os interesses financeiros5 (Arceo, 2006). Esses
marcos gerais balizam a análise que se segue das estratégias de desenvolvimento
adotadas pelos países latino-americanos.
2- Crise de 1974, reestruturação do capitalismo e periferia
A crise do padrão de acumulação desenvolvimentista e as novas estratégias de
desenvolvimento e inserção na economia mundial só podem ser entendidas a partir da
compreensão da nova fase do capitalismo iniciada no final da década de 1970 e começo
da seguinte, denominada por Chesnais (1996) de mundialização do capital,
compreendida como um aprofundamento do processo de internacionalização do capital,
5 Sobre o Consenso de Washington ver Fiori, 1997.
16
cujo traço principal é a hegemonia do capital financeiro. A lógica dessa fração do
capital passou a condicionar as demais formas do capital, indicando um entrelaçamento
entre elas. Desde o início dos anos 1980, observa-se um crescimento vertiginoso dos
mercados de capitais, de câmbio e de títulos em escala global. As estrelas do mercado
financeiro global são os hedge funds e os fundos de pensão e de investimento. Também
continuam tendo papel importante as grandes corporações e os bancos centrais dos
países mais desenvolvidos. Esses organismos movimentam massas impressionantes de
riqueza na sua forma líquida com objetivo de valorização crescente e no curto prazo de
seus fundos6(Cintra, 2005, p. 17-19).
A constituição desse mercado financeiro global deu-se sob a liderança dos EUA.
O dólar é a moeda chave desse mercado e a transnacionalização do sistema financeiro
norte- americano é peça fundamental na sua sustentação (Belluzzo, 2005). Esse
mercado financeiro global caracteriza-se pela instabilidade e pela rapidez de seus
fluxos. A postura dos gestores dos fundos de buscar resultados de curtíssimo prazo a
qualquer preço é, sem dúvida, um dos elementos importantes que influenciam essa
instabilidade e exacerba a especulação7. Especulação que floresce ainda mais nos
momentos de grande liquidez na economia mundial, como, por exemplo, no início da
década de 19908. O capital financeiro global especula com o petróleo, as commodites, as
ações, os títulos, as moedas e a expansão imobiliária em diversos países. Dessa maneira
amplifica-se a instabilidadade da economia mundial (Chenais, 1996; Cintra, 2005).
Esse capital rentista é muito sensível a qualquer alteração nas variáveis reais da
economia. O incremento da inflação, os desequilíbrios mais acentuados das contas
6 “Apenas os fundos de pensão da OECD (Organização para a Cooperação Econômica e o
Desenvolvimento) administravam um estoque de ativos estimado em US$ 7,4 trilhões, representando
27% do PIB desses países e 39,1% do valor da capitalização das ações nos mercados de capitais desses
mesmos países” (Cintra, 2005, p. 17) 7 “Todos os agentes econômicos relevantes (investidores institucionais, bancos e corporações) passam a
utilizar os derivativos e outros instrumentos de transferência de risco, procurando dispersar ou assumir
riscos de preço (oscilações nas taxas de juros, câmbio, inflação, índice de bolsas etc.). Vale dizer,
procuram realizar proteção contra riscos ou tomar posição para realizar ganhos de capital. Procuram
ainda adotar técnicas de gestão de recursos, como a alavancagem, utilizando derivativos e empréstimos,
para aumentar a rentabilidade esperada dos investimentos. As agências de classificação de risco passam a
participar ativamente desse circuito. Sua função é montar parâmetros para a classificação de riscos dos
diferentes agentes emissores de securits e de alguns tipos de derivativos” (Cintra, 2005, p. 18). 8 A partir de 1992, a redução das taxas de juros e a expansão do crédito levada a cabo pelos bancos
centrais dos países desenvolvidos com o objetivo de tirar a economia da recessão geraram uma enorme
liquidez e diminuíram a rentabilidade do capital financeiro, que passou a buscar desenfreadamente
oportunidades mais rentáveis de aplicação, muitas vezes utilizando-se de alavancagem de recursos. Os
países em desenvolvimento foram inundados com capitais extremamente voláteis, que tanta instabilidade
acarretaram na década passada. (Chenais, 1996; Cintra, 2005).
17
externas ou das contas do governo e a queda da rentabilidade das empresas podem
acarretar intensos movimentos de fuga de capitais, o que pressiona os Estados a adotar
políticas ortodoxas, visando controlar a demanda agregada e assim evitar pressões
inflacionárias e desequilíbrios externos e fiscais que poderiam levar a repentinas
mudanças cambiais. Esse processo tende a pôr em questão a capacidade de os Estados
controlarem suas economias à medida que o capital financeiro busca impor políticas de
abertura das economias nacionais e políticas deflacionistas (Corsi, 2002, p. 16)9. A
existência dessa massa de capital flutuando na economia mundial vincula-se
diretamente a crise de superprodução vivida pelo capitalismo desde a década de 1970.
A crise de superprodução dos anos 1970 abriu uma fase de reestruturação do
capitalismo de largas conseqüências para o conjunto da economia mundial, sobretudo
para as classes sociais, para as lutas de classe, para a concorrência intercapitalista e para
a distribuição espacial da acumulação de capital10
. Contrastado com os chamados “30
anos glorioso”, marcados por altos índices de crescimento e, nos países centrais, pela
redução da desigualdade social sob a égide do Estado de bem estar (Hobsbawm, 1995),
segui-se um período relativamente longo de baixo crescimento, que se estendeu até
2003, e de grande instabilidade, em especial a partir do final dos anos 1980. Entre 1990
e 2007, foram seis crises baseadas no estouro de bolhas especulativas. O ritmo da
acumulação de capital foi bastante desigual nesta fase. As economias desenvolvidas
apresentaram um crescimento modesto, embora as taxas não tenham sido homogêneas.
Extensas áreas da periferia, sobretudo na América Latina e na África, tiveram um
desempenho medíocre, apresentando retrocessos sociais e econômicos significativos,
enquanto várias economias do leste asiático apresentaram um crescimento acelerado 11.
9 Isso não significa, porém, que os países devam adequar-se passivamente à chamada globalização nem
que esse processo atinja de forma homogênea e integradora o conjunto do planeta. A perda de graus de
liberdade na definição da política econômica por parte dos Estados depende da situação econômica,
social, política e geopolítica de cada país, como também da posição política e ideológicas dos governos
(Corsi, 2002, p. 16-17).
10 Fugiria dos limites do presente capítulo uma discussão detida sobre os determinantes e os
desdobramentos da crise dos nos 1970, embora tenhamos particular interesse sobre os seus
desdobramentos. Uma discussão sobre este ponto pode ser encontrada em Arrighi ( 1996 a,b e 2008),
Brenner (1999 e 2003), Belluzzo (2009), Fiori (1999), Harvey (1992), Hosbawm (1995) e Mandel
(1990). Baseamo-nos amplamente nestas obras nos próximos parágrafos. 11
Além do baixo e desigual crescimento, observa-se também o fim da tendência à convergência dos níveis
de desenvolvimento presente entre 1950 e 1975 no plano mundial (ARRIGHI, 1996; CHESNAIS, 2006).
O PIB real dos cinco países mais ricos do mundo (EUA, Japão, Alemanha, Grã-Bretanha e França)
cresceu em média, entre 1950 e 1973, 4,4%. Entre 1973 e 200, esse crescimento foi de 2,3% (Gonçalves,
202, p. 50) O Japão entrou em uma fase de estagnação nos anos 1990, cresceu em média por ano 1,3%
18
Entender esse padrão de acumulação de capital implica discutir alguns traços
fundamentais da crise e de seus desdobramentos. A crise estrutural dos anos 1970
resultou da articulação de uma crise de superprodução com a falência do padrão
monetário internacional estabelecido em Bretton Woods. Também resultou do
aprofundamento das lutas de classe entre meados dos 1960 e meados da década
seguinte. Outro elemento da crise estrutural foi a derrota dos EUA no Vietnã e o avanço
de movimentos nacionalistas, socialistas e fundamentalistas na periferia do sistema. A
crise energética foi outra relevante determinação da crise estrutural ao colocar fim a um
dos pilares do crescimento econômico do período anterior, a energia barata.
A partir do início dos anos 1960 observa-se um incremento da produção e da
capacidade produtiva em escala mundial, que decorria da entrada maciça de produtos
japoneses e alemães no mercado mundial e também devido ao avanço das
industrializações tardias na periferia. Esse processo gerou um forte incremento da
concorrência intercapitalista, o que acabou afetando negativamente as taxas de lucro e
gerou capacidade ociosa não planejada em diversos setores. A situação agravou-se em
virtude do ímpeto do movimento sindical, que não só impedia a recomposição dos
lucros por meio do arrocho dos salários como os pressionava para cima. Nesse contexto,
a economia norte-americana foi a mais afetada, pois apresentava modestos ganhos de
produtividade e, ao mesmo tempo, elevação dos salários, fruto das lutas sindicais. A
economia dos EUA também era pressionada pela elevação dos gastos decorrentes da
nesse período, depois de ter sido o campeão do crescimento econômico na fase anterior. A Europa
Ocidental cresceu, nos anos 1990, 2,0% aa, enquanto que entre 1958 e 1973 o crescimento médio do PIB
tinha sido de 4,9% a a. Na Europa Central e Oriental, a situação foi mais dramática depois da dissolução
da URSS. A região apresentou crescimento negativo de 3,2% entre 1991 e 2000, enquanto que no período
1958-1973 tinha crescido 4,5% a a. Na Oceania também observamos tendência ao baixo crescimento,
com uma média anual de 3,2% a a entre 1991-2000. A situação da África também não foge ao quadro
geral; o crescimento médio anual do PIB alcançou a cifra de 2,9% nos anos 1990, contra um crescimento
médio de 4,7% no período 1958-1973 (GONÇALVES, 2002, p. 111). O PIB latino-americano cresceu em
média 54% ao ano entre 1950 e 1973. Entre 1981 e 1990, esse incremento foi de 0,9%. Na década
seguinte, o crescimento médio anual do PIB foi de 3,3% (CANO, 1999, p. 294-311; Gonçalves, 2002, p.
111). Porém, a melhora observada na primeira metade da década de 1990 sofreu forte reversão. De 1997 a
2002, quando a economia globalizada entrou em declínio, depois da crise asiática seguida das crises
russa, brasileira e argentina e do lento estouro da bolha especulativa de Wall Street, segundo dados
apresentados pela CEPAL, a economia latino-americana encontra-se estagnada. No referido período, o
PIB da região cresceu em média 1%, enquanto o crescimento demográfico foi de 1,5% , o que acarretou
uma queda do PIB per capita de 1,45% no período. O caso mais grave foi o da Argentina, que, entre
1999 e 2002, teve uma retração de cerca de 20% do PIB, de 10,9% só em 2002. Níveis comparáveis aos
da Grande Depressão dos anos 1930 (CEPAL, 2003). Entre 1991 e 2003, o crescimento médio anual do
PIB da América Latina e do Caribe, segundo Singh (2005), foi de 2,8%. A Ásia foi uma exceção, cresceu
mais na década de 1990 (7,3% a a) do que entre 1958 e 1973 (5,8% a a), cabendo destacar a China e a
Índia, que cresceram em média por ano respectivamente, na década de 1990, 10,5% a a e 5,5%.a a
19
Guerra do Vietnã, da Guerra Fria e da majoração dos dispêndios sociais destinados a
responder a onda de contestação social que varreu o país na segunda metade dos anos
1960. A perda de competitividade e a saída volumosa de capitais vinculadas à crescente
internacionalização dos grandes empresas, associada à resistência destas em repatriarem
os lucros obtidos no exterior para fugirem de maior carga fiscal sobre esses recursos,
gerou déficits nas contas externas. Os crescentes déficits externos e internos passaram a
ser cobertos cada vez mais com emissão de moeda, o que tornou insustentável a
paridade estabelecida em 1944 e deixou o dólar a mercê de movimentos especulativos.
A desvalorização do dólar em 1971 e a introdução do regime de câmbio
flutuante dois anos mais tarde, que parecia num primeiro momento fruto das fraquezas
políticas e econômicas dos EUA, mostrou ser, pouco tempo depois, elemento
importante para a reafirmação, pelo menos temporariamente, da hegemonia dos EUA e
do predomínio do capital financeiro na economia mundial. A aparente decadência dos
EUA abria novas possibilidades em um contexto de crescente contestação social.
As décadas de 1960 e de 1970 foram caracterizadas pela ascensão das forças de
esquerda e dos movimentos sociais tanto no centro como na periferia do sistema, que
parecia estar sendo tomada pelo nacionalismo, pelo fundamentalismo e pela esquerda.
Floresceu uma cultura anticapitalista. Sugiram movimentos como o feminista e o
ecológico, alternativos aos burocratizados movimentos tradicionais de esquerda. A crise
de hegemonia dos EUA também se processava em um contexto de avanço da URSS, de
crise econômica e energética. A possibilidade de profundas transformações sociais
parecia eminente à época. Muitos contemporâneos sonhavam com o fim próximo do
capitalismo.
Entretanto, o capital financeiro e as grandes empresas, cada vez mais
internacionalizadas, se fortaleceram ao longo do extenso período de acelerada
acumulação de capital que marcou os “30 anos gloriosos”. O capital financeiro
finalmente se recuperou do baque sofrido na crise de 1929 e na depressão que se seguiu.
As grandes empresas retomaram o movimento de internacionalização a partir de meados
da década de 1950 e reorganizaram a seu favor a divisão internacional do trabalho,
fechando espaços para os projetos nacionais de desenvolvimento que propunham um
desenvolvimento centrado no mercado interno e tinham florescido na periferia desde a
20
década de 1930, em especial na América Latina. Essas forças estavam ávidas para
retomar o terreno que tinham perdido para os trabalhadores em decorrência de uma
correlação de forças favorável a estes ao final da II Guerra Mundial, expressa no avanço
da social democracia e na extensa regulação política do processo de acumulação de
capital.
As possibilidades de revolução, contudo, logo se dissolveram no ar. A própria
crise e o processo de reestruturação que se seguiu, ao elevar as taxas de desemprego, ao
impor novas formas de organização do processo de produção, que implicaram novas
experiências para a classe trabalhadora, com conseqüências profundas na cultura, na
consciência de classe e nas formas de organização, e ao enfraquecer os sindicatos
contribuíram para a mudança da correlação de forças a favor da grande burguesia
mundializada e para a hegemonia do capital financeiro. O neoliberalismo foi a
expressão ideológica maior desse processo. Suas propostas respondiam aos anseios e
interesses desses setores. Desregulamentação das economias nacionais, permitindo
plena liberdade de comércio e circulação de capitais, desregulamentação do mercado de
trabalho e diminuição da ação estatal da economia, seguida de equilíbrio monetário,
fiscal e no balanço de pagamentos. A social democracia foi desarmada, não tinha uma
resposta consistente para a queda na atividade econômica acompanhada de inflação
crescente e redução das receitas públicas, justamente no momento de exacerbação dos
gastos decorrente da ampliação do desemprego. Os grupos mais a esquerda, muitos
deles transformados em “seitas”, perderam a capacidade de análise concreta das
situações concretas. Não tinham também propostas consistentes e se afastaram dos
trabalhadores. Situação que se agravaria, posteriormente, com o colapso da URSS.
Os grandes bancos, os fundos de pensão e investimentos, as grandes corporações
e os governos do núcleo orgânico do capitalismo reagiram à crise estrutural
reorganizando o sistema. Nos países desenvolvidos, sob comando do neoliberalismo,
que rapidamente alcançou uma posição hegemônica, iniciou-se um processo de
desmonte do Estado de Bem-estar Social. Os gastos públicos, até então destinados
prioritariamente para área social, passaram a ser um elemento importante para sustentar
a valorização do capital financeiro, sobretudo por meio da ampliação da dívida pública.
As economias nacionais foram desregulamentas, em particular no que diz respeito aos
sistemas bancários e aos mercados de capitais. Os mecanismos que permitiam ao Estado
21
controlar os fluxos de capitais e de mercadorias pelas suas fronteiras e os graus de
endividamento e alavancagem das instituições bancárias e dos variados fundos de
investimentos, que vinham se tornado cada vez mais importantes, foram flexibilizados
ou extintos, o que reduziu drasticamente a sua capacidade de implementar políticas de
pleno emprego. Esses processos também estão intimamente vinculados com a crescente
internacionalização e reestruturação dos processos produtivos.
A reestruturação produtiva teve papel fundamental no enquadramento da classe
trabalhadora e, portanto, na recomposição da taxa de lucro. A introdução novas
tecnologias (informática, robótica, biotecnologia, etc.), que poupam trabalho e
aumentam a produtividade, e de novas formas de organizar a produção, que implicam
processos flexíveis de produção, elevação do desemprego e vínculos variados e
relativamente frouxos entre capital e trabalho (trabalho temporário, trabalho parcial,
tercerização etc.), foram centrais para fragmentar a classe trabalhadora, enfraquecer os
sindicatos, arrochar os salários e precarizar as condições de trabalho em geral. A
reestruturação produtiva só foi possível em virtude da elevação do desemprego, do
enfraquecimento dos burocratizados partidos de esquerda e dos sindicatos, do
enfraquecimento político e da fragmentação de experiências e interesses da classe
trabalhadora, do fracasso do reformismo, da desilusão com o socialismo e do posterior
desmoronamento da URSS12
.
A busca pela recomposição da lucratividade também levou o capital, em um
contexto de acirrada concorrência, a buscar novos espaços de acumulação, onde pudesse
contar com recursos naturais abundantes, legislação ambiental inexistente ou bastante
flexível e, sobretudo, mão-de-obra barata e altas taxas de lucro. Essa expansão só foi
possível graças à abertura das economias nacionais (financeira e comercial) e a um
conjunto de inovações (diminuição dos preços de transportes, desenvolvimento das
comunicações e do processamento de dados), que permitiram as matrizes das grandes
corporações coordenarem e controlar processos globais de produção e comercialização,
cujas fases encontram-se espalhadas geograficamente por diferentes regiões do planeta.
Por meio de contratos e subcontratos de empresas em rede essas empresas
disseminaram processos produtivos fragmentados espacialmente, o que foi fundamental
12
Desenvolver esse ponto de grande importância fugiria ao escopo do presente artigo.
22
para retomada da rentabilidade13
. Também cabe ressaltar o papel dos organismos
internacionais, como a Organização Mundial do Comércio, com o objetivo de regular o
funcionamento dos mercados, garantir os direitos relativos à propriedade intelectual e a
não interferência dos Estados. Esse processo trouxe mudanças significativas para a
posição dos países periféricos na economia mundial. Em 1960, os manufaturados
representavam 7% do total de suas exportações, em 1980, 20% e atualmente cerca de
70% (Basualdo e Arceo, 2006; Carneiro, 2007).
Uma característica importante desse processo foi a realocação regional de vários
segmentos produtivos, que incorporou milhões de trabalhadores da Ásia à economia
mundial, remunerados com salários diminutos, o que também contribuiu para colocar
em xeque as conquistas do movimento operário nos países desenvolvidos. A realocação
espacial de segmentos da indústria, em especial no Leste Asiático, induzida pela busca
incessante de valorização do capital, contribuiu para abrir uma nova fronteira de
acumulação, que ganharia peso crescente na economia mundial e redesenharia
espacialmente o capitalismo. Mas isso agravava o problema de excesso de capital. Esse
processo também estava determinado pelas transformações internas dos países da região
e pelas suas políticas de desenvolvimento. O peso do crescimento acelerado do Leste
Asiático, sobretudo o da China, ficaria evidente a partir de 2003, quando a economia
mundial retomaria um vigoroso crescimento.
Nesse contexto, alguns países asiáticos, sobretudo a Coréia do Sul, a Índia e a
China, conseguiram em virtude de um conjunto de peculiaridades históricas adotar
projetos de desenvolvimento que lhes possibilitou uma inserção ativa no processo de
mundialização do capital14
, aproveitando “brechas” na estrutura da economia mundial
para se desenvolverem, articulados dinamicamente as novas linhas de expansão da
economia mundial. Porém, esta trajetória se revelaria inalcançável para a maior parte
dos países periféricos, que passaram por momentos de grande instabilidade e crise
econômica e social, apresentando uma inserção passiva na economia mundial, como o
13
Os fluxos privados totais (líquido) para os chamados países emergentes foram, em 1990, de US$ 45, 8
bilhões de dólares. Tenderam a subir até 1996, quando atingiram US$ 224,2 bilhões e caíram após a crise
asiática, atingindo a cifra de US$ 32 bilhões em 2000. Esses fluxos para a América Latina subiram de
US$ 10,3 bilhões, em 1990, para US$ 68,1 bilhões em 1997, passando a declinar a partir daí. Boa parte
desse fluxo era composta por investimentos de porta-fólio, o que indica a vulnerabilidade das economias
da região. Em 1996, por exemplo, das entradas líquidas de US$ 62, 8 bilhões, US$ 38,0 corresponderam
a esse tipo de investimento. (Carneiro, 202, p. 247-252). 14
No escopo do presente artigo não é possível desenvolver esse ponto. A esse respeito ver, entre outros,
Fiori (1999) e Corsi ( 2007).
23
caso do Brasil (Gonçalves, 2002), o que reafirma o caráter desigual e combinado do
desenvolvimento capitalista.
No novo contexto de economias nacionais cada vez mais abertas, os países do
Leste asiático, que desde os anos 1960 seguiam, como já foi assinalado acima,
estratégias de desenvolvimento voltadas para as exportações, tiveram melhores
condições para se adaptarem às transformações em curso na economia mundial.
Situação diversa da enfrentada pelos países latino-americanos, que vinham se
desenvolvendo a partir do processo de industrialização via substituição de importações,
com economias mais fechadas e voltadas para o mercado interno. Alguns países
asiáticos vinham passando por um processo de acelerado crescimento desde os anos
1950. Até o final da década de 1970, as estratégias de desenvolvimento voltadas,
sobretudo, para as exportações, não parecia sobrepujar a industrialização via
substituição de importações.
Apesar das marcantes diferenças históricas, econômicas, políticas, sociais e
culturais, o elevado crescimento dos países em desenvolvimento da Ásia baseava-se, em
geral, em projetos de desenvolvimento inspirados no modelo japonês, marcado por
ampla ação estatal na economia e estratégias de crescimento voltadas para as
exportações. Outros elementos importantes eram a superexploração da força de trabalho
e o uso intenso de modernas tecnologias. Padrão de desenvolvimento que inicialmente
abarcou os chamados tigres de primeira geração (Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura e
Hong Kong) e depois alcançou outros países da região, como Malásia, Tailândia e
Indonésia, no que Palma (2004), entre outros, denominou do padrão de
desenvolvimento dos “gansos voadores”. O próprio papel do Japão precisa ser
ressaltado, pois a partir de meados da década de 1980 as grandes empresas japonesas
intensificaram seu processo de internacionalização na região por meio de elevação dos
investimentos externos diretos, variadas formas de terceirização de atividades
produtivas e constituição de empresas em rede, que implicavam, entre outros aspectos,
transferência de tecnologia. Também adotou uma postura distinta quando a crise da
dívida externa assolou os países em desenvolvimento. Não cortou os financiamentos
externos para os países endividados da região, o que foi de grande importância para
esses países enfrentarem aquela difícil conjuntura sem estancar o crescimento
24
econômico. Posição bem distinta da norte-americana em sua área de influência
(Medeiros, 2006).
A trajetória chinesa não seguiu esse caminho. Suas peculiaridades marcantes
merecem uma rápida discussão.15
O ponto de partida do processo de transição para o
capitalismo na China parece ser a constatação por parte da liderança do Partido
Comunista Chinês (PCC) dos enormes obstáculos para implantar o socialismo.
Percepção que deve ter sido reforçada após a queda do Muro de Berlim e o colapso da
URSS. A modernização passou a ser encarada como uma questão vital para
sobrevivência política do próprio PCC e do regime e isso implicava profundas reformas
econômicas e sociais e maior articulação com a economia mundial. Desencadeou-se a
partir do final dos anos 1970 uma via própria de desenvolvimento capitalista, que ainda
não está concluída e pode sofrer alterações decorrentes da atual crise. A revolução
Chinesa transitou para uma revolução nacional, pautada por um projeto nacional que
tem por objetivo, indícios sugerem, transformá-la em grande potência com pretensões
imperiais.
A China, que em pouco tempo alcançaria a posição de centro da economia
regional, deslocando o Japão dessa posição, vinha implementando, desde a década de
1980, um amplo programa de reformas capitalistas em sua economia, cujos principais
pontos são os seguintes: reintrodução da propriedade privada; mercantilização da força
de trabalho; recolocação do mercado como nexo da economia a partir do momento em
que os preços nele formados passaram a ser determinantes na alocação de recursos e de
mão-de-obra, em que pese as interferências estatais nesse processo; estímulos à
agricultura familiar, privatização de inúmeras empresas estatais, pesados investimento
em infra-estrutura, abertura controlada para o capital estrangeiro, formação de grandes
grupos nacionais com base em empresas estatais, o que consiste em um dos
instrumentos que confere ampla margem de ação do Estado na economia, agressiva
política exportadora e controle de variáveis chave da economia: juros, câmbio e crédito.
As reformas foram acompanhadas de profundas contradições, expressas na forte
15
Fugiria do escopo do presente capítulo uma discussão detida sobre esse ponto. Ver a respeito Arrighi
(2008), Belluzzo (2005), Gonçalves (2002), Leiva (2005), Medeiros (1999, 2004, 2006, 2010) e Walker e
Buch (2007). Utilizamos amplamente esses textos neste e nos parágrafos que se seguem.
25
concentração da renda, na super-exploração da força de trabalho, em acentuados
desequilíbrios regionais e na degradação ambiental.
Essas reformas na China, que levavam sua economia crescer cerca de 10% ao
ano desde o início dos anos 1980, a transformaram na economia mais dinâmica do
mundo. A China e os outros países do Leste asiático passaram a constituir-se em nova
fronteira de expansão capitalista, um espaço aberto para ampla valorização do capital,
cada vez mais centrado na economia chinesa, que tende a descolar o Japão desse papel.
Até meados da década de 1990, a China, todavia, ainda não tinha a densidade
econômica e política que viria a ter na virada o milênio, quando o processo cumulativo
de crescimento possibilitaria um salto qualitativo de seu peso na economia mundial.
Esse processo se deu a partir de certa simbiose com a economia norte-americana, que
continua determinando a dinâmica da economia mundial. O pólo dinâmico de
acumulação na Ásia continua subordinado à dinâmica do capital financeiro hegemônico
no centro do sistema, como ficou evidente na crise de 1997. Mas essa subordinação
parece perder força mais recentemente com o baixo dinamismo do centro desenvolvido
do sistema. Embora subordinado ao capital financeiro, esse pólo dinâmico sustenta-se
em capitalismos nacionais16
.
A trajetória da América Latina foi bastante distinta. A nova fase não se mostraria
propicia para as estratégias de desenvolvimento voltadas para o mercado interno,
calcadas na industrialização via substituição de importações. Não apenas pelas
dificuldades em competir em uma economia mundial cada vez mais aberta, pois o
diferencial tecnológico com os países do leste asiático não era significativo no final dos
anos 1970 e início da década seguinte, apesar dos países asiáticos investirem muito mais
em educação e pesquisa tecnológica. A América Latina foi impactada de maneira severa
pela crise da dívida externa, que estava intimamente articulada a crises fiscais e a crises
inflacionárias que atingiram vários países da região, que entraram em um período do
crise econômica e social. No bojo desse processo, abriram-se espaços para o avanço das
políticas econômicas liberais. No contexto de liberalização comercial e financeira e de
16
Entendemos por capitalismo nacional o desenvolvimento capitalista controlado por forças políticas
internas. Dessa forma, a política econômica é determinada pelos interesses das classes dominantes
nacionais. Isto, porém, não significa qualquer forma de isolamento ou hostilidade em relação ao capital
estrangeiro, que é bem vindo e considerado importante para financiar, pelo menos em parte, o
desenvolvimento, embora a penetração de empresas multinacionais sofra algumas restrições, preferindo-
se associações com empresas nacionais públicas ou privadas.
26
taxas de câmbio flexíveis o espaço dos países periféricos para adotarem uma política
fiscal e monetária autônoma, visando o crescimento e o emprego, diminuiu
consideravelmente (Coutinho, 1996; Basualdo e Arceo, 2006)17
.
Enfim, o processo de globalização longe de gerar certa convergência e
homogeneidade na economia mundial, como alguns de seus ideólogos defendiam, entre
eles Ohamae (1996), reafirma a tendência do desenvolvimento desigual e combinado.
3- A estratégia de desenvolvimento da América Latina no contexto de
mundialização do capital
As diferentes estratégias de desenvolvimento condicionam, em parte, o
desempenho econômico dos países ao longo do período em pauta. Mas não o
determinam de maneira isolada. O desenvolvimento também depende de outras
complexas determinações, que incluem a divisão internacional do trabalho, as
características do centro hegemônico, o ciclo da economia mundial, a inserção
internacional, a rigidez das estruturas da economia mundial, a estrutura interna de
classes, os recursos naturais disponíveis, a situação geopolítica, as condições históricas
herdadas e as lutas de classe de cada país (Arrighi, 1887; Arceo e Bausualdo, 2006, p.
41).
A nova fase do capitalismo foi um dos elementos que colocou em xeque o
desenvolvimentismo na América Latina, calcado na substituição de importações.
Contudo, o modelo desenvolvimentista começou a ruir mesmo antes das profundas
transformações vividas pelo capitalismo a partir dos de 1980. Não só em virtude do
baixo desempenho econômico em vários países, da incapacidade de completar o
processo de industrialização e do agravamento das condições sociais em muitos países,
mas também devido à ascensão das lutas sociais que marcaram os anos 1960 e 1970. As
classes dominantes, temerosas em relação a esses avanços e ao desfecho que a luta de
classes poderia ter, unificaram-se e buscaram implementar uma nova disciplina através
do mercado.
Esse foi o caso do Chile, que adotou a partir de 1973 uma política liberal que
levou a desindustrialização e ao enfraquecimento da classe trabalhadora. A Argentina
17
Os próximos parágrafos baseiam-se em especial nessa obra.
27
seguiria o mesmo caminho a partir da implantação da ditadura militar em 1976. Em
outros países da região a adoção da estratégia neoliberal foi mais paulatina e se deu sob
a pressão de processos hiperinflacionários, de profunda crise econômica, de grave crise
fiscal e da crise das dívidas externas. A estatização das dividas externas contribuiu
fortemente para a deterioração da situação fiscal e para o incremento da inflação,
enfraquecendo o Estado. A fuga de capitais e a deterioração dos termos de intercâmbio,
ausentes na Ásia, pelo menos com a mesma intensidade, foi outro elemento que
enfraqueceu a posição dos países latino-americanos. Também foi essencial a continua
pressão dos organismos multilaterais de crédito. Esses processos, em particular o
crescente desemprego decorrente da crise econômica, debilitaram a capacidade de
resistência da classe trabalhadora. Não por acaso o Brasil, que viveu forte acessão dos
movimentos sociais na década de 1980, abraçou a estratégia neoliberal mais
tardiamente. Sem dúvida que a adoção dessa estratégia implicou em uma
reacomodação dos setores das classes dominantes, com o fortalecimento dos setores
financeiros e rentistas e dos vinculados às exportações. Setores de classe fortemente
articulados com o capital estrangeiro, que nunca teve solidariedade com o
desenvolvimento nacional na periferia. Os setores do capital nacional mais vinculados à
produção e ao mercado interno perderam terreno nesse novo contexto, embora também
sejam grandes aplicadores do mercado financeiro. A ameaça de uma eventual vitória do
Partido dos Trabalhadores, em 1989, unificou os diferentes setores das classes
dominantes em torno da candidatura Collor e de seu projeto neoliberal. (Arceo, 2006,
Oliveira, 2006, Filgueiras, 2006).
A expectativa quando da adoção das políticas neoliberais de abertura e
desregulamentação das economias nacionais era de retomada do crescimento com
estabilidade e preços e modernização do parque produtivo e da infra-estrutura. Mas o
contexto internacional era bastante adverso, sobretudo em virtude da grande
instabilidade dos mercados financeiros, vinculada a frenética especulação com títulos,
moedas e ações decorrentes da desregulamentação generalizada das economias
nacionais e a formação de mercados globais de valores. Muitos Estados nacionais se
viram cada vez mais impotentes ante esses fluxos e “forçados” a submeterem-se aos
ditames do capital financeiro.
A mundialização do capital também não garantiu um desempenho elevado para
a economia mundial. Desde o início da década de 1980 até 2003, a economia mundial
28
apresentou um desempenho sofrível, apesar das profundas transformações que se
processaram no sistema capitalista nesse período. A reestruturação do capitalismo não
conseguiu reverter por um longo período o quadro de lento e crescimento, com algumas
regiões apresentando forte crescimento, enquanto outras apresentam um desempenho
medíocre18
.
Os países em desenvolvimento do Leste asiático, entre 1991 e 2003, cresceram
em média 6% ao ano (Arceo, 2006). A América Latina, no mesmo período, quando
vários países da região abraçaram o chamado “Consenso de Washington”, cresceu em
média 2,7% ao ano, sendo que o crescimento per capita foi de 1%. Entre 1980 e 2003, o
crescimento do produto anual por habitante foi de apenas 0,1%. As expectativas dos
neoliberais de que o equilíbrio fiscal, taxas de inflação sob controle, mercados abertos e
integrados com o resto do mundo, privatizações, papel reduzido do Estado na economia
e maior espaço para a iniciativa privada gerariam um crescimento acelerado e estável,
com baixo desemprego, salários reais crescentes e incremento da produtividade, nem de
longe se concretizaram (CEPAL, 2008a, p. 63-64).
O contraste com o período desenvolvimentistas (1930-1980), quando vicejaram
projetos com o objetivo de impulsionar o processo de industrialização, que pareciam
apontar para um desenvolvimento voltado para completar o processo de industrialização
18
Sobre o desempenho da economia mundial no período em pauta baseamo-nos sobretudo em Chesnais
(1996) e Brenner (2003). A economia mundial entre 1958 e 1973 cresceu em média 5,0% ao ano. Nas
décadas de 1970 e 1980, 2,8% e na seguinte 3,2%. O Japão entrou em uma fase de estagnação, cresceu
em média 1,3% nos anos 1990, enquanto crescia 9,8% entre 1958 e 1973. Nos anos 1990, a Europa
Ocidental cresceu 2,0%, enquanto que entre 1958 e 1973 o crescimento médio do PIB tinha sido de 4,9%.
Na Europa Central e Oriental, a situação foi mais dramática depois da dissolução da URSS. A região
apresentou crescimento negativo de 3,2% entre 1991 e 2000, enquanto que no período 1958-1973 tinha
crescido 4,5%. Na Oceania também observamos tendência ao baixo crescimento, com uma média anual
de 3,2% entre 1991-2000. A situação da África também não foge ao quadro geral; o crescimento médio
anual do PIB alcançou a cifra de 2,9% nos anos 1990, contra um crescimento médio de 4,7% no período
1958-1973. A Ásia foi uma exceção, cresceu mais na década de 1990 (7,3%) do que entre 1958 e 1973
(5,8%), cabendo destacar a China e a Índia, que cresceram em média por ano respectivamente, na década
de 1990, 10,5% e 5,5% (Gonçalves, 2002, p. 111). O PIB latino-americano cresceu em média 5,5% por
ano na década de 1960 e 5,6% na década seguinte. Entre 1981 e 1990, esse incremento foi de 0,9%. Entre
1990 e 1997, o crescimento médio anual do PIB foi de 3,3% (Cano, 1999, p. 294-311). Porém, a melhora
observada na primeira metade da década de 1990 sofreu forte reversão. De 1997 a 2002, quando a
economia globalizada entrou em declínio, depois da crise asiática seguida das crises russa, brasileira e
argentina e do lento estouro da bolha especulativa de Wall Street, segundo dados apresentados pela
CEPAL, a economia latino-americana encontra-se estagnada. No referido período, o PIB da região
cresceu em média 1%, enquanto o crescimento demográfico foi de 1,5%, o que acarretou uma queda do
PIB per capita de 1,45% no período. O caso mais grave foi o da Argentina, que, entre 1999 e 2002, teve
uma retração de cerca de 20% do PIB, de 10,9% só em 2002. Níveis comparáveis aos da Grande
Depressão dos anos 1930 (CEPAL, 2003). Entre 1991 e 2003, o crescimento médio anual do PIB da
América Latina e do Caribe foi de 2,8%. (Corsi, 2006, p. 24-25).
29
e mais autônomo, é grande . Este aspecto é importante porque o desenvolvimento
parece requer industrialização com “diversificação setorial [e] adensamento das
cadeias produtivas” (Carneiro, 2007), embora isso não signifique necessariamente
melhoras nas condições de vida, menor desigualdade social e equilíbrio com o meio
ambiente. Vejamos essas questões a partir de uma perspectiva de mais longo prazo.
Tabela 1
Evolução das disparidades entre regiões do mundo (1820-2006)
A. Produto por habitante,
por região(1)
1820 1870 1913 1950 1973 1980 1990 2006
Europa Ocidental 1204 1960 3457 4578 11417 13197 15965 21098
Austrália, Canadá, EUA e Nova
Zelândia
1202 2419 5233 9268 16179 17935 22345 30143
Japão 669 737 1387 1921 11434 13428 18789 22853
Ásia (exceto o Japão) 577 548 658 635 1225 1511 2109 4606
América Latina 692 676 1494 2503 4513 5183 5072 6495
Europa Oriental e ex União
Soviética
686 941 1558 2602 5731 6231 6460 7000
África 420 500 637 890 1410 1538 1449 1697
Mundo 667 873 1526 2111 4091 4521 5155 7282
B. Disparidades Inter-
regionais (%)
Região menos desenvolvida/
Região mais desenvolvida
34,9 20,7 12,2 6,9 7,6 8,4 6,5 5,6
América Latina/
Região mais desenvolvida
57,5 27,9 28,6 27,0 27,9 28,9 22,7 21,5
América Latina/ Mundo 103,8 77,4 97,9 118,6 110,3 114,6 98,4 89,2
América Latina
Região menos desenvolvida
164,9 135,2 234,4 394,0 368,5 343,0 350,0 382,7
Participação na produção mundial
(%)
Europa Ocidental 23,0 33,1 33,0 26,2 25,6 24,2 22,3 17,7
Austrália, Canadá, EUA e Nova
Zelândia
1,9 10,0 21,3 30,7 25,3 24,3 24,6 22,7
Japão 3,0 2,3 2,6 3,0 7,8 7,8 8,6 6,2
Ásia (exceto o Japão) 56,4 36,0 22,3 15,5 16,4 18,3 23,2 36,4
América Latina 2,2 2,5 4,4 7,8 8,7 9,8 8,3 7,7
Europa Oriental e ex União
Soviética
9,0 12,0 13,4 13,0 12,9 11,9 9,8 6,0
África 4,5 4,1 2,9 3,8 3,4 3,6 3,3 3,3
Mundo 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: CEPAL, 2008a, p. 20.
(1) Em dólares PPA (Paridade de poder de compra) de 1990
30
No que se referem à América Latina os dados acima indicam uma perda de peso
econômico da região na economia mundial ao longo do período neoliberal. Isto fica
claro na crescente divergência do produto per capita da América Latina e o da região
mais desenvolvida e na queda da participação na produção manufatureira mundial. O
retrocesso econômico relativo se manifestou mesmo depois que as economias da região
voltaram a crescer em 2004. Os dados indicam que o período 1950-1980, no qual
vigorou o padrão de acumulação desenvolvimentista, foi caracterizado por uma redução
do fosso das economias latino-americanas em relação às economias desenvolvidas e
pelo avanço da industrialização. Em termos de desenvolvimento econômico o padrão
desenvolvimentista obteve relativo sucesso, embora não se possa dizer o mesmo em
relação aos seus resultados sociais.
A partir de 1980, a evolução de vários países da Ásia, que adotaram, apesar das
peculiaridades nacionais, uma estratégia bem distinta dos países da América Latina que
seguiram a industrialização via substituição de importações, também denota a
articulação do desenvolvimento com a evolução da economia mundial. A região
apresentou de maneira sustentada elevadas taxas de crescimento na fase de
mundialização do capital, cujas complexas causas sociais, políticas, geopolíticas e
econômicas não é possível aqui discutir. A Ásia conseguiu uma inserção dinâmica na
economia mundial no período, enquanto a nova fase para a América Latina representou
relativo retrocesso. Como indica Arceo (2006), a nova fase do capitalismo ampliou os
espaços para absorção de produtos manufaturados produzidos pela periferia pelo centro
do sistema, o que favoreceu os países asiáticos, que tinham adotado estratégias de
desenvolvimento baseadas nas exportações.
A trajetória da América Latina deve-se a determinações estruturais, a certas
circunstâncias adversas e a adoção de políticas econômicas equivocadas. Como
assinalou Coutinho (1996), os países da região tiveram dificuldades em acompanhar as
mudanças em curso a partir da década de 1980. As razões disso são complexas e
residem nas condições econômicas, sociais e políticas herdada do período
desenvolvimentistas e no o fato de a região ter mergulhado, a partir de 1982, em uma
fase de estagnação, marcada por baixos índices de crescimento, graves crises
inflacionária, fruto sobretudo dos graves problemas de endividamento externo. A
predominância de governos conservadores impediu, naquele momento, um
31
enfretamento com o grande capital internacional em particular no que diz respeito a
questão da dívida externa. Nessas circunstâncias, os países latino-americanos não
tinham condições de implementar com um maior grau de autonomia programas de
desenvolvimento para incorporar as novas tecnologias, enfrentar os problemas
estruturais e enfrentar as mudanças em curso na economia mundial. As classes
dominantes paulatinamente se aglutinaram em torno do projeto neoliberal.
Um dos resultados da adoção das políticas neoliberais, inspiradas no chamado
Consenso de Washington, foi em vários países da América Latina uma involução
estrutural. Isto também está vinculado às dificuldades da região se inserir na nova
divisão internacional do trabalho a partir das estruturas pré-existentes. Essa involução
aparece claramente no Brasil e na Argentina, que tinham conseguido alcançar uma
estrutura industrial relativamente complexa. No caso do México, a expansão das
indústrias maquiladoras não representou um salto qualitativo em seu setor industrial. O
modelo seguido desde pelo menos o pós-guerra tinha assegurado altas taxas de
crescimento no contexto de uma acumulação de capital centrada no mercado interno,
mas não gestou as condições (indústrias competitivas, desenvolvimento tecnológico
autônomo, esquemas internos consistentes de financiamento da acumulação de capital,
Estado com capacidade de sustentar, planejar e direcionar o desenvolvimento e fortes
grupos nacionais) e os atores sociais necessários para enfrentar o novo contexto (Palma,
2004; Arceo e Basualado, 2006). A estratégia neoliberal também se mostrou incapaz de
resolver essas questões.
A América Latina no novo contexto internacional apresentava custos salariais
maiores que o Leste Asiático, o que dificultava a competição com os produtos dessa
região. Também não tinha condições de competir com os produtos do centro, que
incorporavam alta tecnologia e trabalho altamente qualificado. As plantas das empresas
nacionais e transnacionais foram construídas para atender o mercado interno e
geralmente utilizavam tecnologia obsoleta. Durante a fase anterior não tinham sido
feitos esforços relevantes para um desenvolvimento tecnológico autônomo, em parte
devido ao próprio peso das empresas estrangeiras na economia. A partir de 1980
nenhuma classe tinha condições de rearticular um novo projeto de desenvolvimento, o
que abriu espaço para as facções rentistas. Nas circunstâncias de crise de
endividamento externo e crise inflacionária as economias da região estavam
sobremaneira vulneráveis a uma abertura rápida da economia, justamente o que
32
propunha a estratégia neoliberal vencedora nos embates políticos do período (Basualdo
e Arceo, 2006).
A participação do setor industrial no PIB da América Latina caiu 30% entre
1975 e 2000, acompanhando a queda da participação da região na produção industrial
da periferia, que foi de 37% para 26% no mesmo período. As exportações em relação
ao PIB da região subiram de 11,6% para 23,7% entre 1975 e 2003. Se excluirmos o
México, dado o grande peso que as maquiladoras têm em sua indústria, 67,5% das
exportações da América Latina, em 2003, consistiam de produtos primários e
manufaturas básicas que utilizam recursos agropecuários, florestais e minerais.
(Basualdo e Arceo, 2006, p. 46-55). A tabela 2 e o gráfico 1 ilustram essa tendência.
Tabela 2
Estrutura por nível de tecnologia das exportações do mundo, da periferia, da América
Latina e América Latina sem México (2003). Taxa de crescimento anual dos distintos
grupos para 94 países (1994-2003).
Mundo Periferia A Latina A Latina
Sem Mex.
Cres. Exp.
Mundiais
(1994-2003
Alta Tecnologia
Eletrica e Eletrônica
17% 24,8% 11,2% 3,7% 8,5%
Alta Tecnologia
(outros)
6,5% 2,2% 2,2% 1,9% 9,8%
Baixa Tecnologia
Têxtil,Vestimenta
e calçados
6,4% 11,5% 6,7% 7,2% 3,9%
Baixa tecnologia
(outros)
9,6% 10,3% 5,8% 4,2% 6,1%
Tecnologia intermediaria
Automotor
9,8% 4,3% 9,4% 3,4% 7,1%
Tecnologia intermediária
Processos
7,3% 5,2% 4,7% 5,8% 5,3%
Produtos primários 10,7% 15,1% 29,4% 40,9% 5,4%
Manufaturas básicas de
Recursos agropecuários
E florestais
6,9% 5,1% 8,1% 11,8% 4,3%
33
Manufaturas básicas de
Ouras fontes primárias
9,3% 9,3% 9,8% 14,8% 6,5%
Produtos não Classificados
Tecnologicamente
2,4% 15% 2,6% 1,8% 5,8%
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 6,3%
Fonte: Arceo, 2006, p. 54
Os dados apresentados indicam que as exportações da América Latina, sem
contar o México, concentram-se nos setores menos dinâmicos, que têm auferido, com
uma exceção, um crescimento abaixo da média mundial. A participação nos setores de
alta tecnologia, que têm alcançado as mais altas taxas de crescimento no comércio
internacional, é modesta. O México tem um forte desempenho exportador em virtude
da chamada indústria maquiladora, mas que não se traduz em termos de crescimento do
PIB. O tratado de livre comércio com os EUA e o Canadá (o NAFTA), criou as
condições para as grandes corporações norte-americanas transferirem a parte final de
suas cadeias produtivas para os Estados fronteiriços com os EUA, buscando mão-de-
obra barata, controles frouxos sobre o meio ambiente e infra estrutura. O nível de valor
adicionado as cadeias produtivas no México é bastante reduzido19
(Palma, 2004). A
forte expansão das exportações da América Latina dos últimos anos se deve, em parte,
as exportações de commodities para Ásia, em especial para China20
. A região tende a se
inserir na economia mundial como produtora de produtos primários e manufaturados de
baixo valor agregado.
19
Em 2002, o México foi um dos nove maiores exportadores de produtos manufaturados entre os países
em desenvolvimento, com 12% do total, o que representou cerca de 150 bilhões de dólares. Mas o
crescimento do PIB foi de 0,8%. O exemplo da produção de aparelhos de TV é ilustrativo. O México
produziu, em 2001, 30 milhões de aparelhos, sendo que 90% foram exportados para os EUA. “98% dos
insumos da indústria de televisores eram importações diretas ou indiretas [...] Na verdade, as empresas
mexicanas só fornecem 2% restante dos insumos (essencialmente embalagens de papelão e de plástico,
e manuais de uso)” (Palma, 2004, p. 210-215) 20
As exportações da América Latina para a região Ásia-Pacifico para os 30 principais produtos da pauta
de exportações cresceram de 8,959 bilhões de dólares, em 1990, para 10,765 bilhões em 2000, atingindo
30,891 bilhões de dólares em 2006 (CEPAL, 2008b, p. 59).
34
Gráfico 1
América Latina e Caribe: participação do setor manufatureiro no valor agregado total.
(a)
(Em %)
Fonte: CEPAL, 2008a, p.79
O gráfico mostra que para os principais países da região, com exceção do
México, verificou-se uma queda do peso do setor manufatureiro na economia entre o
início da década de 1970 e o período 2002-2006. Note-se que economia estava
crescendo a taxas mais elevadas em parte desse segundo período, o que pode sugerir
que a fase de crescimento 2004-2008 não implicou mudanças na estrutura do modelo
de crescimento implantado a partir da década de 1990. Em 2006, 61,3% das
exportações da América Latina e Caribe consistiam de bens primários e bens
manufaturados baseados em produtos naturais e produtos de baixa tecnologia. Para
China, que cada vez mais aparece como um dos eixos mais dinâmicos da economia
mundial, esse número alcança 88,21% (CEPAL, 2008b, p. 57). Estes números sugerem
35
uma reprimarização das economias da região no contexto da nova divisão internacional
do trabalho no capitalismo globalizado.
No que se refere às questões sociais, o desempenho do modelo neoliberal
também foi sofrível, como indicam os dados a seguir. Em 1980, 40,5% da população
da América Latina era constituída de pobres, sendo que destes 18,6% viviam em
situação de pobreza extrema. Em 1990, esses números tinham saltado para 48,3% e 22,
5% respectivamente. Em 2002, a situação melhorou. Os pobres representavam 44,% e
os miseráveis 19,2% da população total. Melhora significativa observa-se entre essa
data e 2007, justamente quando da ascensão de governos críticos do neoliberalismo na
região, que adotaram medidas mais abrangentes contra a pobreza, e da retomada de
taxas mais elevadas de crescimento econômico. Nesse último ano, os pobres perfaziam
34,1% e os miseráveis 12,6% da população. O desemprego apresentou evolução
semelhante. Em 1990, representava 6,2% da PEA, passando para 10,5%, em 2002, e
caindo para 8,6%, em 2006 (CEPAL, 2008d, p. 16 e 24).
A América Latina concomitantemente aprofundou a inserção financeira no
processo de globalização. A reprimarização e o avanço da inserção financeira se
complementam. Depois de ficar alijada dos fluxos internacionais de capital por um
longo período em virtude da crise da divida externa, a região passou a receber a partir
de 1992 fluxos crescentes de capitais, principalmente de investimento de portfólio e
Investimentos Externos Diretos (IED) voltados à participação nos processos de
privatização das empresas estatais. Esses IED não acarretaram substantivos
incrementos na capacidade produtiva, na inovação tecnológica e no emprego, tinham
sobretudo um caráter de valorização patrimonial (Carneiro, 2007).
Os fluxos foram positivos até 1999, superiores as necessidades de financiar os
crescentes déficits nas contas de transação corrente, o que resultou na elevação das
reservas. A entrada vultosa de capitais era fundamental para fechar os graves
desequilíbrios das contas externas decorrentes das políticas de estabilização inspiradas
no Consenso de Washington, seguidas com entusiasmo pelo Brasil, pela Argentina e
pelo México, que conseguiram debelar, de um lado, os processos inflacionários, mas
engendram, de outro, severas crises nas contas públicas e externas. A necessidade de
atrair capitais obrigou a forte majoração da taxas de juros, levando ao baixo
crescimento, ao crescente desemprego e ao agravamento da situação das dívidas
públicas, que explodiram. O resultado foi o crônico problema de vulnerabilidade
36
externa e instabilidade vivido no período pelos países que adotaram os planos de
estabilização baseados no ideário neoliberal. A forte ampliação da dívida pública, a
abertura dos mercados de captais e a reforma dos sistemas de previdência social, que
ensejaram a formação de fundos privados de previdência, criaram um espaço
privilegiado de valorização do capital financeiro na região em um contexto de taxas de
juros relativamente elevadas (Carneiro, 2007).
A partir da crise asiática, observa-se acentuada reversão desses fluxos de
capitais. A partir de 2003, a região deixou de absorver recursos reais do exterior em
virtude da melhora do desempenho das exportações e dos preços das commodities, o
que acarretou superávits crescentes em transações correntes. Como conseqüência desse
resultado e da entrada de capitais especulativos, observa-se um crescimento acentuado
das reservas, o que levou a uma situação mais confortável em relação às flutuações da
economia mundial(Corsi, 2002; Carneiro, 2007). A melhora da situação não significa,
todavia, a superação da vulnerabilidade externa21
.
A fase expansiva da economia mundial iniciada em 2003, que interrompeu a
tendência de baixo crescimento que se estendia desde a década de 198022
, parece indicar
alterações na dinâmica do capitalismo. Cabe observar que o crescimento verificado a
partir desse período não se concentrou mais em duas regiões, Leste da Ásia e EUA,
como vinha ocorrendo até a recessão de 2001/2002, e seus índices são semelhantes ao
da chamada “idade de ouro do capitalismo23
”. O crescimento foi mais disseminado e o
Leste asiático, em particular a China, firmou-se como uma nova fronteira e um dos
eixos de acumulação de capital no capitalismo globalizado, influenciando o
21
O fluxo de capitais privados para as economias emergentes cresceu do início dos anos 1990 até 1996,
quando atingiu a cifra de US$ 324,5 bilhões. Passou a cair devido as intensa instabilidade das economias
periféricas na década de 1990. Esses fluxos atingiram US$ 125 bilhões em 2002, passando a crescer até
2008. Em 2005 foram de US$ 3999, 6 bilhões. Os países emergentes, que apresentaram crescentes
déficits em suas contas correntes até a crise asiática, passaram a apresentar superávits a partir de 1998.
Levaram a cabo a partir da crise de 1997 políticas de formação de reservas e hoje detém significativas
reservas, o que aparentemente os torna mais resistentes na atual crise (Biancareli, 2006). 22
Em relação à retomada do crescimento da economia mundial a partir de 2003 ver a respeito Brenner
2003 e 2006. 23
Entre 2003 e 2005, o incremento médio anual do PIB da África foi de 4,8%, da Europa Oriental de
5,1%, do Oriente Médio de 5,9% e da América Latina de 4,1%. Esta última região cresceu sobretudo
devido a forte elevação das exportações de bens primários, decorrentes sobretudo da expansão chinesa
(10,1% em média no referido período) e da onda de especulação com commodities, processos que
também impactaram as demais regiões. Em 2006, o produto mundial cresceu em média 5,5%, cabendo
destacar os países em desenvolvimento da Ásia (9,7%), a África (5,5%), a Comunidade de Estados
Independentes (7,7%), a Zona do Euro (2,8%) e a América Latina (5,6%) (FMI, 2006, 2008).
37
desempenho econômico da América Latina, em particular a partir, sobretudo, do
estimulo das exportações de commodities. Porém, este desempenho sugere uma
mudança do padrão de crescimento da economia mundial, o que não significa, contudo,
nem o fim da predominância do capital financeiro e nem a superação da instabilidade e
das bolhas especulativas que vêm sustentando a economia global, como a atual crise
deixou claro (Brenner, 2003, 2006).
Na fase de expansão a América Latina acompanhou a tendência geral de
crescimento24
. Esse desempenho também se vincula ao fracasso das políticas neoliberais
na região25
. A reversão do quadro econômico se deu em um contexto de expansão
acelerada da economia mundial, que teve forte influência benéfica para um grande
número de países latino-americanos, e de uma guinada política para centro esquerda,
representada pelos governos Lula, Correia, Chavez, Morales e Kirchiner. A vitória
dessas forças denota, entre outros aspectos, o rechaço popular às políticas neoliberais.
Lula e Kirciner parecem não ter um programa de ruptura com as políticas neoliberais,
embora o governo argentino tenha caminhado mais nesse sentido. Correia, Chavez e
Morales defendem um projeto nacional de ruptura com o neoliberalismo, mas o parco
desenvolvimento de suas economias, a pressão internacional e a falta de clareza do que
seja o “socialismo do século XXI” tolhem as possibilidades de desenvolvimento de seus
países.
Apesar da melhora da situação, não parece que os países da região estejam
avançando de maneira firme no sentido de superarem os graves problemas sociais e
econômicos que os enfrentam. Observa-se, como já assinalamos, um reforço da posição
24
O PIB da região cresceu 1,9% em 2003, depois de ter apresentado um declínio de 0,5 no ano anterior.
O crescimento em 2004 foi mais significativo, alcançou a cifra de 6,2%. Em 2005, foi um pouco menor,
4,6%, voltando a acelerar para 5,6% em 2006. Nos dois anos seguintes o PIB da região apresentou a
seguinte evolução: 2007, 5,7 %; 2008, 4,6%. No período 2004-2008, os países que mais destacaram
foram Panamá, Uruguai, Venezuela e Argentina. O exemplo deste último, que cresceu 8,7%, em 2003;
9,0%, em 2004; 9,2% no ano seguinte; 8,5%, em 2006; 8,7%, em 2007; 6,8%, em 2008; e , em 2009 é
ilustrativo. (CEPAL, 2008c, p. 158). Embora esses números estejam, em parte, distorcidos pela profunda
crise dos anos anteriores, é preciso observar que a Argentina rompeu com o ideário do FMI e declarou
moratória da dívida externa, indicando que é possível a implementação de políticas alternativas às
estabelecidas pelo Consenso de Washington.
25
O balanço das políticas econômicas neoliberais na América Latina, implementadas a partir de fins da
década de 1980, é negativo. De modo geral, muitos países latino-americanos entraram em uma fase de
crise social, baixo desempenho e instabilidade econômica e inserção passiva na economia mundial
(Gonçalves,2202), embora caiba ressaltar a superação da crise inflacionária que assolava a região. A crise
argentina (2000-2003) exemplifica o fracasso das políticas baseadas no Consenso de Washington. Essa
fase iniciada na segunda metade da década de 1980 se estendeu até 2003, quando a região passou a
apresentar taxas relativamente elevadas de crescimento.
38
da América Latina como exportadora de produtos primários e de produtos
manufaturados intensivos em recursos naturais e força de trabalho, com baixo valor
agregado. Verifica-se também a permanência da forte dependência financeira, apesar da
situação de vulnerabilidade externa ter se reduzido. Essa tendência parece reafirmar a
inserção passiva e subordinada na economia mundial fruto do modelo de crescimento
que ganhou força a partir da adoção das políticas neoliberais. Os governos de centro
esquerda, críticos do neoliberalismo, não conseguiram, ou não tinham alternativas ou
projetos para mudar os rumos da economia. A atual crise parece reforçar essa tendência.
4 - O estouro da bolha imobiliária nos EUA e o aprofundamento da tendência a
reprimarização das economias latino-americanas
Desde agosto de 2007, o capitalismo global vive mais uma vez vive uma crise
estrutural de grandes proporções, cuja causa imediata foi o estouro da bolha de títulos
imobiliários nos EUA. O estouro da bolha se alastrou rapidamente para o sistema
financeiro e para a economia em escala mundial. O epicentro irradiador da crise é o
próprio coração do sistema e não mais a periferia, como nos anos 1990. A forte queda
do movimento especulativo com ações na Nasdaq, em 2000, foi o primeiro prenúncio de
que a crise sistêmica tinha alcançado o núcleo do capitalismo. Embora o contexto
histórico seja bem diverso, o desenrolar da crise atual guarda certas semelhanças com a
de 1929, que foi, pouco a pouco, se agravando e atingiu o auge em 1932 e 1933.
Contudo, a atual crise de sobreacumulação de capital não repete as que a antecederam.
Cada uma tem suas próprias e múltiplas determinações. Porém, como no passado, o
capitalismo, tudo indica, reagirá à crise se reestruturando.
A bolha especulativa foi gerada a partir da emissão de enorme volume de títulos
imobiliários norte-americanos. O mercado imobiliário norte-americano sofreu forte
expansão desde meados da década de 1990. Essa expansão acelerou-se a partir de 2001
com base em taxas de juros relativamente baixas. Os preços dos imóveis aumentaram
persistentemente até meados de 2006, quando passaram a cair. Entre 2001 e 2006, o
montante médio anual de novas operações foi de cerca de US$ 3 trilhões. Em 2001,
39
foram aprovados US$ 2.405 trilhões de financiamentos imobiliários, sendo que desse
montante US$ 190 bilhões (8,6% do total) representavam títulos subprimes. Cinco anos
depois, o montante de financiamento atingiu US$ 3.580 trilhões, sendo US$ 600 bilhões
em títulos subprimes (20,1% do total). 80,5% destes títulos foram securitizados. Em
2006 já existiam evidências de graves problemas no setor de financiamento imobiliário,
dado os altos índices de inadimplência. O aumento da oferta de imóveis levou a queda
dos preços, que exacerbou a inadimplência e gerou a crise26
. A exacerbação da
inadimplência evidenciou que bancos, fundos de investimento e pensão e companhias
de seguros poderiam estar com suas carteiras carregadas de títulos “podres”. A crise
aberta em agosto de 2007 foi uma crise anunciada (Costa, 2007; Pinheiro, 2007a e b;
Belluzzo, 2007; Chesnais, 2008; Borça Jr. e Torres Filho, 2008).
No momento em que a crise estourou, existiam nos EUA cerca de 12 trilhões de
dólares em empréstimos imobiliários, sendo parte considerável desse montante
constituída de títulos de solvência duvidosa. Para fugir do risco, os bancos e as
instituições de crédito imobiliário norte-americanas securitizaram esses títulos. Os
títulos hipotecários foram agrupados com outros títulos de dívidas (cartão de crédito,
credito automotivo etc.), compondo novos títulos com variados graus de risco. Dessa
forma, buscava-se dissolver o risco. Esses títulos foram tomados como base para o
lançamento de derivativos, que foram vendidos para outros bancos e para os fundos de
investimentos pelo mundo todo. Muitas dessas instituições, que adquiriram esses
derivativos, utilizaram esses títulos como garantia de outros créditos e de empréstimos
que serviam para alavancar aplicações em mercados de ações, moedas e títulos.
Formou-se uma cadeia de especulação com base em papéis insolventes27
. É possível
26
Cada vez mais tomadores de hipotecas imobiliárias ficaram em situação difícil, pois os empréstimos
eram tomados a juros flutuantes, que variavam ao longo do contrato. Alguns contratos estabeleciam
períodos de carência e outros prestações inicialmente mais baixas, que aumentavam depois de
determinado período de tempo. Muitos devedores, quando se viam diante de prestações mais altas,
contornavam a situação tomando novas hipotecas com base na elevação dos preços dos imóveis, com as
quais saudavam as hipotecas anteriores e voltavam a pagar prestações mais baixas por um novo período.
Também incrementavam o consumo com a diferença entre os recursos obtidos com as novas hipotecas e
os pagamentos relativos às velhas. Com o aumento da inadimplência, os bancos retomavam cada vez mais
imóveis e os colocavam novamente a venda, o que resultou no incremento da oferta e na queda de preços.
A queda de preços inviabilizava a tomada de novas hipotecas e, portanto, levou milhares a situação de
inadimplência. Estava quebrado o circuito que sustentava o crescimento do mercado imobiliário e a
especulação que o acompanhava (Brenner, 2006; Borça Jr. e Torres Filho, 2008). 27
Detalhada descrição dos complexos mecanismos financeiros que criaram uma cadeia especulativa
apoiada em títulos de financiamento subprime pode ser encontrada em Borça Jr. e Torres Filho (2008) e
Freitas e Cintra (2008).
40
dizer, dado o processo acima descrito, que dezenas de trilhões de dólares em diferentes
tipos títulos e ações, que expressam o capital fictício e encontram-se espalhadas pelo
mundo, estão direta ou indiretamente contaminados pelos títulos hipotecários
insolventes, o que coloca a possibilidade colapso de todo o sistema financeiro.
A crise atingiu um estado agudo em setembro e outubro de 2008 a partir da
falência do banco de investimentos Lehman Brothers. Não tanto pelo peso que esse
banco tinha no sistema financeiro norte-americano ou mundial, mas muito mais pelo
efeito simbólico, pois trouxe à luz a situação generalizada de insolvência do sistema
financeiro no centro do capitalismo (EUA e Europa). Situação que ainda não foi
superada, consistindo em um dos nós górdios da crise. Esse episódio desencadeou uma
onda de pânico, que não se converteu em corrida geral contra os bancos em virtude da
rápida ação dos bancos centrais dos países desenvolvidos, garantindo os depósitos e
injetando centenas de bilhões de dólares para evitar o colapso da liquidez do sistema
financeiro28
.
28
Entre julho de 2007 e março de 2008, os bancos de investimentos dos EUA sofreram perdas de 175
bilhões de dólares em seus patrimônios. Na Inglaterra, a insolvência do Northerm Rock, importante banco
hipotecário, gerou uma corrida aos bancos, o que obrigou o governo a injetar 60 bilhões de libras no
sistema, a declarar que os depósitos estavam garantidos e a estatizar a instituição. Outros governos
europeus tiveram que seguir o exemplo britânico nas semanas e meses que se seguiram. No início da
crise, os governos dos países mais ricos lançaram pacotes de socorro que totalizaram 390 bilhões de
dólares. Em março, o Federal Reserve (FED) concedeu linha de crédito de US$ 29 bilhões para JP
Morgan Chese adquirir o Bear Stearns, que tinha quebrado. Nesse mesmo mês, os bancos centrais da
Europa, Japão e EUA injetaram mais 200 bilhões de dólares no sistema para impedir o colapso da
liquidez. Em julho de 2008, o governo norte-americano, salvou da falência as agências Fannie Mae e
Freddie Mac, que juntas possuíam carteiras imobiliárias da ordem de US$ 5trilhões (40% do mercado de
hipotecas), injetando US$ 200 bilhões. Essas agências acabaram sendo estatizadas em setembro, devido a
continua deterioração da situação financeira. Nesse mês, o Lehman Brothers pediu concordata. Em
seguida, foi a vez da American Interregional Group (AIG) receber US$ 85 bilhões para continuar
operando e passou a ser controlada pelo governo, que ficou com 80% de suas ações. Logo depois, o JP
Morgan e o Bank of America adquiriram, com ajuda do FED, o Washington Mutual e o Meril Lynch
respectivamente. Diante do quadro catastrófico, o governo Bush lançou um pacote de emergência de
USS$ 700 bilhões para salvar o sistema bancário e para compra de títulos imobiliários ilíquidos. O pacote
não foi suficiente para acalmar os mercados. Em janeiro de 2009, o Bank of America precisou de mais
117, 2 bilhões de dólares e Citigroup, após anunciar perdas de 8,29 bilhões, dividiu suas operações em
duas. A queda das ações dos bancos norte-americanos e europeus foi generalizada depois dessas notícias.
As ações do Barclays, um dos bancos mais afetados da Inglaterra, despencaram 25%. Hoje, o Citi vale
10% de seu valor de um ano atrás. Na Alemanha, vários bancos tiveram que ser socorridos. Estima-se que
os bancos alemães tenham cerca de 400 bilhões de dólares em títulos “podres”. Não por acaso acabou de
ser aprovada lei que confere poder ao governo alemão de estatizar os bancos. O recém-eleito Barak
Obama lançou pacote de estímulo à economia e ajuda aos bancos de 789,5 bilhões de dólares. Inúmeros
governos também laçaram amplos programas de obras em infra-estrutura, aumento do salário desemprego
e elevação dos gastos sociais na tentativa de deter o progresso da crise. Estima-se que os 21 países mais
desenvolvidos do mundo farão um estímulo fiscal da ordem de 2 trilhões de dólares, o que acarretará, sem
dúvida, deterioração das contas públicas. Essas iniciativas tornaram letra morta o cânone liberal de auto
regulação da economia pelo mercado. Apesar de todas essas iniciativas, a crise não parece amainar, o que
41
Trilhões dólares de capital fictício na forma de ações e títulos foram
queimados. Subitamente os seus valores despencaram. Estima-se essa soma em cerca de
30 trilhões de dólares desde o início da crise até janeiro de 2009 (Dowbor, 2009). Essa
desvalorização maciça de capital fictício não esvaziou a crise, pois a crise só terminará
quando o excesso de capital constante também for desvalorizado ou destruído. O pano
de fundo da crise é a sobreacumulação de capital em escala global.
Entretanto já no segundo semestre de 2009 a economia mundial começou a dar
sinais aparentes de recuperação29
. Foi o bastante para os arautos do capitalismo, em
especial os do capital financeiro, além de alardear que o pior já tinha passado e que a
economia mundial caminhava sóbria para uma recuperação consistente, retomar a velha
cantinela liberal (FMI, 2010).
A crise, porém, se mostrou mais profunda e complexa. As políticas monetárias e
creditícias frouxas e a ampliação do gasto público, embora tenham evitado um colapso,
não conseguiram garantir uma retomada robusta da economia, em particular em relação
aos países desenvolvidos. A situação voltou a se agravar logo no início de 2010, quando
a Grécia se viu diante de um ataque especulativo, que ameaçou sua solvência e acabou
também atingindo Irlanda, Espanha e Portugal30
. Até a economia italiana, mais solida
que a destes países, foi seriamente ameaçada de entrar no turbilhão. O risco do pânico
se alastrar pela Europa foi bem real naquele momento, em particular para alguns países
do Leste europeu, cujas economias também enfrentavam problemas de solvência. O
estopim do recrudescimento da crise foram os problemas relativos à rápida expansão
levanta dúvidas quanto a eficácia das estratégias keynesinas para “salvar” o capitalismo (Blackburn,
2008; Borça Jr.. e Torres Filho, 2008; Folha de São Paulo, B7, 18/01/2009 e B4 e B5, 08/02/2009) . 29
No segundo trimestre deste ano, o PIB norte-americano cresceu 1% ante uma queda de 6,4% no
trimestre anterior. No terceiro trimestre, cresceu acima do esperado pelos economistas, 3,5%. No quarto,
a taxa anualizada de crescimento do PIB atingiu 5,0%. Depois de amargarem retrações em suas
economias, a Alemanha e a França cresceram 0,3% e o Japão 0,6% no terceiro semestre de 2009.
Enquanto isso, o PIB chinês crescia, nesse mesmo período, a uma taxa anualizada de 7,9% e no trimestre
seguinte 8,9% em relação à igual período do ano anterior (BNDES, 2009, p. 2; Corsi, 2010, p. 57). 30
A Grécia, em 2009, tinha uma dívida pública de 273,4 bilhões de Euros (PIB de € 237,5 bilhões), com
um déficit de 13,6% em relação ao PIB. A dívida de Portugal alcançou 125,9 bilhões (PIB de € 163,9
bilhões) e o déficit foi de 9,4% do PIB. A Espanha tinha uma dívida de € 559,7 bilhões (PIB de € 1.051,2
trilhão) e um déficit de 11,2% do PIB. A Irlanda tinha uma dívida de € 104,7 bilhões (PIB de € 163,5
bilhões) e um déficit público de 14,3% do PIB. A dívida pública italiana, nesse ano, alcançou a cifra de €
1.760,8 trilhão (PIB de € 1.520,9 trilhão) e o déficit público foi de 5,3% do PIB. A elevação recente das
dividas e dos déficits decorreu, em grande parte, do socorro ao aos bancos, as cia. de seguros, as
empresas e aos pacotes de ampliação de gastos para enfrentar a crise aberta em 2007, agravada em fins de
2008. Essas medidas, de um lado, evitaram provavelmente que a crise imobiliária se desdobrasse em uma
grande depressão, mas um dos efeitos colaterais foi a deterioração das contas públicas (Folha de São
Paulo, 29/04/2010, p. B2)
42
das dívidas e dos déficits públicos, que alcançaram elevados patamares. As fragilidades
estruturais da zona do euro ficaram evidentes. No limite, a própria união econômica
estava em risco.
A situação só foi aparentemente contornada quando a União Européia aprovou,
em maio de 2010, um pacote de 750 bilhões de euros para socorrer os países com
elevadas dívidas públicas. Para evitar que a crise grega contagiasse os demais países
também fragilizados, o que teria graves conseqüências sociais e econômicas, mais uma
vez os Estados se “curvam” ao capital financeiro e buscam garantir a não
desvalorização do capital fictício, cujo excesso é uma das principais causas da própria
crise. No entanto, o auxílio prometido está condicionado a rígidas políticas de combate
ao déficit público, o que implica medidas contencionistas. Em um contexto de crise,
medidas de corte no gasto público podem agravar a situação, jogando esses países em
uma situação de longa estagnação, pois por adotarem o euro não dispõem da
possibilidade de forte desvalorização da moeda, que abriria espaço para melhorar as
exportações e assim começar uma recuperação. Embora o euro esteja se desvalorizando,
o que explica em parte a atual retomada da Alemanha via o incremento das exportações,
a alternativa para esses países será mais difícil e implicará obter ganhos significativos
de produtividade, que demoram tempo e exigem elevados investimentos, improváveis
de se concretizarem em uma economia em recessão ou estagnada.31
No segundo trimestre de 2010, os indícios de esmorecimento da retomada da
economia mundial parecem consistentes. A causa imediata da perda de ímpeto da
retomada da economia mundial parece residir, em boa medida, no próprio afrouxamento
das medidas tomadas para neutralizar o pânico instalado após a quebra do Lehman
Brothers, embora a manutenção por parte dos países desenvolvidos da política
31
O PIB norte-americana (anualizado), que ascendeu desde o 2º trimestre até o final de 2009, desacelerou
a partir daí, cresceu 3,7% no 1º trimestre de 2010 e 2,4% no 2º trimestre, e já se comenta que será
revisado para baixo pelas autoridades econômicas norte-americanas. Esse desempenho deveu-se ao
comportamento do consumo, enquanto o investimento em máquinas e equipamentos permaneceu
relativamente elevado na esteira do incremento dos lucros em diversos setores, causado pelo arrocho dos
salários31
. Embora a zona do euro tenha crescido 1% no 2º trimestre ante o trimestre anterior, a
recuperação européia continua precária. O mesmo pode-se afirmar para o Japão. O bom desempenho da
economia alemã, puxado pela elevação das exportações, sobretudo para a China, em um contexto de
desvalorização moderada do euro, evitou uma situação mais amarga para a região, pois muitos países
apresentaram retrocesso ou desempenho medíocre no início deste ano. O PIB alemão cresceu 2,2% no 1º
trimestre de 2010 em relação ao anterior. Não por acaso, as projeções para os próximos anos não são
nada alvissareiras, indicam um crescimento modesto, embora bastante desigual. Se não fosse o bom
desempenho de várias das economias em desenvolvimento da periferia, a economia mundial teria entrado,
provavelmente, em profunda depressão.
43
monetária frouxa e das baixas taxas de juros continue tendo papel relevante para a
sustentação da atividade econômica. Mas a redução do gasto público, decorrente dos
problemas de excesso de endividamento, o esgotamento dos pacotes e socorros estatais
a empresas, o elevado desemprego, o elevado endividamento das famílias derrubaram a
demanda agregada. O fim da recomposição dos estoques, que estavam muito baixos no
ano passado, também contribuiu para o arrefecimento da retomada. Indícios sugerem
que a economia mundial caminha para uma fase de baixo crescimento econômico,
embora muito desigual.
Parece delinear-se a retomada do padrão de acumulação que vigorou do final dos
anos 1970 e 2003. Neste caso, o período de ascensão 2003-2007 não passaria de um
interregno em uma tendência de mais logo prazo. Esse padrão de acumulação de capital
caracterizado, entre outros aspectos, pelo baixo e desigual crescimento, não é nenhuma
novidade. Pelo contrário, marcou o largo período que vai da crise dos anos 1970 até a
fase de acelerado crescimento iniciada em 2003. É preciso, contudo, assinalar que neste
largo período, ao lado do baixo dinamismo da Europa e do Japão, vastas áreas da
periferia enfrentaram recorrentes crises e retrocessos, não obstante o alto desempenho
dos países asiáticos em desenvolvimento, em especial da China e da Índia. Hoje, o
centro do problema parece residir no núcleo desenvolvido do capitalismo, enquanto a
periferia apresenta aparentemente uma situação mais favorável.
Este padrão não decorre de problemas conjunturais, mas sim de determinações e
contradições profundas da própria dinâmica de acumulação e valorização do capital e
mais uma vez parece estar em curso uma nova reestruturação do capitalismo, cuja
direção precisa é cedo para determinar, mas alguns elementos já estão presentes na atual
conjuntura.
A crise do sistema financeiro e a retração econômica generalizada colocam em
questão a solidez das moedas, em particular do dólar, que pode ser crescentemente
questionado como moeda chave da economia mundial, embora observemos uma fuga
em direção aos títulos do tesouro dos EUA. No curto prazo, a necessidade das empresas,
bancos, fundos e especuladores de cobrirem suas posições em dólares levou ao
incremento da demanda por essa moeda, o que resultou em sua valorização. Mas o
aprofundamento da deterioração da economia, das finanças públicas e das contas
44
externas dos EUA, pode, em médio prazo, exercer pressões sobre a moeda, em um
cenário onde os países asiáticos, em especial a China, poderiam preferir desviar seus
excedentes para financiar programas anticíclicos, do que deixá-los desvalorizar na
forma de dólares acumulados. O financiamento dos desequilíbrios da economia norte-
americana poderia, nesse quadro, ficar comprometido. Para defender o dólar, um dos
pilares de sua predominância, o governo teria que majorar os juros, bloqueando, ou na
melhor das hipóteses retardando, a recuperação da economia norte-americana e
dificultando a aplicação de políticas keynesianas. No limite a desvalorização do dólar
poderá estilhaçar o padrão monetário internacional e enfraquecer ainda mais a
hegemonia norte-americana. Muitos, entre eles Harvey (2009), discutem o fim da
hegemonia norte-americana e o surgimento de um novo centro hegemônico no Leste
Asiático, embora seja prematuro falar nesses termos. A manutenção da hegemonia das
EUA parece depender das respostas que este país dará a crise. Mas como assinala o
referido autor, poderemos estar caminhando para um mundo multipolar.
A crise também colocou em questão o neoliberalismo. Governos liberais
estatizaram parte do sistema financeiro de seus países. Medidas protecionistas são
defendidas e adotadas. Em pouco tempo surgiu um clamor generalizado por mais
regulamentação das finanças globalizadas, como se a regulação do capital financeiro
associada a políticas keynesianas fossem a solução para todos os males do capitalismo.
As instituições multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial, tão ativas quando se trata
de disciplinar as economias dos países pobres, impondo duras políticas recessivas, estão
paralisadas, sem condições e disposição de tentar reverter o quadro. Nesse contexto,
abre-se espaço para a regulação dos mercados e para posturas mais nacionalistas. Vários
analistas, entre eles Fiori (2008), assinalam que o “modelo chinês”, estatizador,
nacionalista, centralista e planejador tenderá a ganhar terreno.
Os países do Leste asiático, em especial a China, a Índia e a Coréia do Sul,
apresentaram acentuado crescimento nas últimas décadas, enquanto o conjunto da
economia mundial apresentou uma tendência de baixo crescimento até o início da fase
de acelerada expansão em 2003 (Corsi, 2008). O peso desses países na economia
mundial tem crescido sistematicamente, sugerindo um gradativo deslocamento do
centro do capitalismo para Ásia (ARRIGHI, 1997). Esse processo ficou evidente na
recente fase de expansão (2003-2007), quando, diferentemente da fase anterior,
45
observa-se um crescimento econômico concentrado sobretudo nos países em
desenvolvimento, em especial na China. Este país tornou-se um dos centros dinâmicos
do capitalismo global, embora fortemente articulado a economia norte-americana. A
crise ao atingir duramente o centro do sistema pode impulsionar esse deslocamento do
centro dinâmico do capitalismo e abrir novas possibilidades de desenvolvimento para a
periferia.
A crise econômica mundial iniciada em agosto de 2007 e que se aprofundou ao
longo de 2008 e 2009 pôs fim a fase de expansão e abriu um período de incertezas,
trazendo novamente à tona os problemas econômicos da região. A queda dos preços das
commodities, a queda nas exportações a redução da entrada de capital estrangeiro e a
saída de capitais abalaram as economias latino-americanas, apesar de muitos países
contarem com economias aparentemente mais sólidas do que nos anos 1990. Tanto é
que a crise mundial não se desdobrou em crise financeira interna, como neste período,
quando qualquer instabilidade mais forte da economia mundial transformava-se em
grave crise interna. O PIB teve um retrocesso de 1,9%, em 2009, depois de um
crescimento de 4,2% em 2008. Em 2010, a economia da região voltou a crescer
(CEPAL, 2010, p.55). O resultado não foi pior, em parte, graças ao incremento do
comércio com a Ásia, que foi um dos responsáveis pelo bom desempenho da fase
expansiva 2003-2008. Em parte, também em virtude do comportamento da demanda
interna.
Observa-se ao longo do período um crescimento das exportações de produtos
primários e um peso cada vez maior do comércio com a Ásia, em particular com a
China. Em 2000, 5% das exportações da América Latina e Caribe dirigiam-se para a
Ásia-Pacífico. Esse número saltou para 14,6%, em 2009. Enquanto isso as exportações
para os EUA caíram de 59,7% para 41,1% no mesmo período. Entre 2000 e 2007, o
comércio com a China cresceu de US$ 12,6 bilhões para US$ 93 bilhões. As
exportações da América Latina e Caribe de matérias-primas no período 1990-1999
cresceram em média 2,6% e, entre 2000-2009, 11,4%. As de manufaturados nos
mesmos dois intervalos de tempo cresceram respectivamente 14,7% e 5,3%, sendo que
os produtos manufaturados de alta tecnologia tiveram o pior desempenho. As
exportações desse segmento cresceram em média por ano 35% entre 1990-1999 e 3,8%
no período 2000-2009. Enquanto as dos demais segmentos apresentaram um
46
crescimento melhor, embora seu ritmo também tenha desacelerado, com exceção das
exportações de manufaturas baseadas em recursos naturais, cujo ritmo de crescimento
foi de 8,9% , entre 200 e 2009, contra 7,5% no período 1990-2000 . (CEPAL, 2010b, p.
95-96). Esses números parecem ser mais um indício de que na nova fase do capitalismo
as economias latino-americanas tenderão a ser inserir sobretudo como exportadoras de
bens primários e manufaturas de baixo valor agregado e baseadas em recursos naturais
na economia mundial.
4- Considerações finais
A Crise de 1929 e a Grande Depressão dos anos 1930 ao acarretarem uma
relativa desarticulação da economia mundial abriram espaços para projetos nacionais de
desenvolvimento baseados no mercado interno e na industrialização via substituição de
importações para os países da America Latina que já tinham alcançado certo patamar
prévio de desenvolvimento capitalista. Esses espaços permaneceram abertos até meados
da década de 1970, embora desde meados dos anos 1950 os enormes obstáculos de
desenvolvimento autônomo já eram claramente visíveis, o que ensejou projetos de
desenvolvimento associados ao capital estrangeiro, em um contexto de retomada da
internacionalização do capital e redefinição da divisão internacional do trabalho
comandada pelas grandes empresas multinacionais. Nesse período observa-se um
grande crescimento econômico e uma tendência para reduzir as distâncias em termos de
renda com o centro do sistema. Contudo o desenvolvimentismo começou a entrar em
crise no início da década de 1970 em virtude da incapacidade de completar os processos
de industrialização, de resolver os gravíssimos problemas sociais que assolavam e do
acirramento da luta de classes.
A crise estrutural dos anos 1970 e a mundialização do capitalismo que se seguiu
ao reorganizarem a divisão internacional do trabalho fecharam os espaços para o
desenvolvimentismo na América Latina. O processo de substituição de importações,
uma resposta adequada à situação de relativa desarticulação da economia mundial
decorrente da crise dos anos de 1930 e da II Guerra Mundial, na qual as economias
latino-americanas centraram o crescimento no mercado interno, mostrou-se inadequada
47
no novo contexto, que passou a exigir, entre outros aspectos, uma indústria competitiva,
desenvolvimento tecnológico autônomo e um Estado capaz de levar a cabo um projeto
de inserção dinâmica na economia global. As políticas neoliberais, que pretendiam dar
uma resposta a esses diversos problemas, também fracassaram e passaram a ser cada
vez mais questionadas. Não cumpriram suas promessas de garantir expressivo
crescimento econômico, inserção dinâmica na economia mundial e aumento do
emprego e da renda. O período entre 1990 e 2003 foi caracterizado pelo baixo
crescimento, pela ampliação do desemprego, pela ampliação da desigualdade social,
pela instabilidade, pela vulnerabilidade externa e pela tendência de especialização das
economias da região na produção de produtos primários e produtos manufaturados que
utilizam grandes quantidades matérias-primas e possuem baixo conteúdo tecnológico.
Ou seja, nos setores menos dinâmicos da economia mundial. A melhora da situação
econômica no período2003-2008 deveu-se ao quadro favorável da economia mundial e
a adoção de medidas alternativas as políticas neoliberais. Contudo, parece não ter
ocorrido alterações substantivas na inserção predominante financeira na globalização e
na tendência de retrocesso do setor industrial. Uma ordem internacional multipolar, que
poderá ser um dos resultados da crise atual, com grande peso dos países asiáticos, em
particular da China, que vem consolidando sua posição de novo pólo de acumulação de
capital mundial, reforçará, indícios sugerem, uma inserção passiva da região na
economia mundial, calcada, sobretudo, na exportação de produtos primários. Esta não
parece ser uma boa alternativa para as economias latino-americanas. Contudo, o
fracasso econômico e social das políticas neoliberais e a crise atual do capitalismo e as
suas conseqüências colocam para países latino-americanos a necessidade de repensar
suas estratégias de desenvolvimento.
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