As Perguntas Mais Comuns Sobre Um Curso Em Milagres - Ken Wapnick

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As Perguntas mais Comuns sobre Um Curso em Milagres Gloria Wapnick Kenneth Wapnick, Ph.D. Foundation for A Course in Miracles 1

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um curso em milagres

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As Perguntas mais Comuns

sobre

Um Curso em Milagres

Gloria Wapnick

Kenneth Wapnick, Ph.D.

Foundation for A Course in Miracles

1

ÍNDICE

Prefácio à Segunda Edição………………………………………………………………………......5Prefácio.........................................................................................................................................5

Capítulo 1

A NATUREZA DO CÉU

1. Qual é a natureza de Deus?..........................................................................................62. Qual é a natureza da realidade?....................................................................................63. Qual é a natureza da vida?............................................................................................74. O Deus em Um Curso em Milagres é o mesmo Deus da Bíblia?................................75. Se Deus não é uma pessoa, por que Jesus O retrata dessa forma?

Isso é confuso................................................................................................................86. O que Um Curso em Milagres quer dizer com criação?.............................................107. O que Um Curso em Milagres quer dizer com criação como um processo?...........108. Quais são as criações citadas no Um Curso em Milagres?.......................................119. Se Deus só tem um Filho, por que Um Curso em Milagres

usa o termo Filhos de Deus?.......................................................................................1210.Por que Um Curso em Milagres usa linguagem masculina para denotar

A Trindade? Jesus é sexista?......................................................................................13

Capítulo 2

A NATUREZA DA SEPARAÇÃO

11.Como o ego se originou, e o que pode impedir a separação de acontecer outra vez?..............................................................................................15

12.Se Deus não criou o mundo ou o corpo, quem o fez? Além disso,quem somos nós, e como chegamos aqui?................................................................16

13.Um Curso em Milagres realmente quer dizer que Deus não criou o universo físico inteiro?..............................................................................................17

14.E sobre a beleza e bondade no mundo?.....................................................................1915.Uma vez que nos tornamos separados, como podemos todos perceber os

mesmos Atributos da matéria, e concordarmos com suas características básicas, experimentando suas leis?.............................................................................19

16.Qual é a visão do Um Curso em Milagres sobre o tempo?.........................................1917.A mente egóica pode ser igualada ao cérebro humano?............................................2218.Onde fica a mente?.......................................................................................................2219.Como alguém pode acessar a mente para que ela possa ser modificada?.............2320.O que significa Filiação, e quem ou o que está incluído?...........................................2421.Um Curso em Milagres ensina que não existe morte. Isso pode ser entendido

como significando que a imortalidade física é possível?............................................2422.O que acontece quando morremos, e para onde vamos? As experiências

de quase-morte que muitas pessoas relatam são relevantes para osestudantes do Um Curso em Milagres?........................................................................26

23. Iluminação ou ressurreição significam liberdade do corpo?.......................................29

Capítulo 3

APLICAÇÃO E PRÁTICA DO UM CURSO EM MILAGRES

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24.Se tudo é um sonho ou uma ilusão, ou um roteiro que já está escrito,que diferença faz o que faço com a minha vida?........................................................31

25.Se tudo isso é um sonho ou uma ilusão, isso significa que o abuso que eu sofri enquanto era criança é irreal e deveria ser negado ou ignorado?....................32

26.E os defeitos congênitos ou mortes de crianças? Também foram escolhidos?......3327.Os bebês nascem inocentes?......................................................................................3328.Um Curso em Milagres tem uma moralidade, ou um código de ética?.....................3429.Uma vez que toda doença é uma projeção da culpa da mente, isso não

significa que é errado tomar remédios para a dor física?...........................................3530.Se sem defesas significa que eu deveria deixar alguém me matar ou estuprar,

ou ficar de lado enquanto a violência é cometida contra meus seres amadosou as outras pessoas?.................................................................................................37

31.Alguém pode ser um estudante do Um Curso em Milagres e participar de umJúri (sendo um médico, advogado, etc), ou permanecer com um parceiro quenão é um estudante do Curso? Ou deve-se ter um parceiro de qualquer forma?Isso não é simplesmente uma forma de especialismo?............................................38

32.Um Curso em Milagres ensina que a raiva nunca é justificada. Isso significa que eu nunca deveria ficar zangado e, se o fizer, não estarei sendo um bomestudante do Curso, ou não estou sendo espiritual o suficiente?............................40

33.O aprendizado é cumulativo? Isto é, eu levo o que aprendi comigo quando morro, para que quando “voltar”, não tenha que começar tudo de novo?...............40

34.Se a vida aqui é uma ilusão, por que o Curso se refere às “coisas vivas”?............4135.Um Curso em Milagres ensina que tudo já aconteceu. Não é a mesma coisa

que predestinação?.....................................................................................................4236.Existe algo como livre-arbítrio, e o que isso é de qualquer forma?..........................4237.O quanto somos livres em nossas vidas diárias para agirmos em nossos

melhores interesses, especialmente se, como o Um Curso em Milagres diz, estamos todos alucinando?.........................................................................................44

38.Um Curso em Milagres diz que não existe amor sem ambivalência. Isso significa que eu nunca ajo a partir de um espaço amoroso, e que todos osmeus pensamentos e ações vêm do meu ego?.........................................................44

39.Qual é o papel da meditação na prática do Um Curso em Milagres?.......................4540.O que é o instante santo, e qual é o seu papel na Expiação?...................................4641.O que Um Curso em Milagres quer dizer com “liberar o seu irmão”? Como

podemos salvá-lo se o mundo é uma alucinação na mente?....................................4742.O que Um Curso em Milagres quer dizer com “perdoar seu irmão”? E se ele

não aceitar o perdão, ou não estiver mais fisicamente presente? Isso significaque não posso mais perdoá-lo?...................................................................................48

43.Como podemos saber a diferença entre o Espírito Santo e o ego?..........................4944.É um mau sinal se eu não “ouvir” a Voz interior? Isso significa que não estou

sendo um bom estudante do Um Curso em Milagres?...............................................5145.Jesus e o Espírito Santo me enviam minhas lições?..................................................5146.Se Deus nem mesmo sabe sobre nós ou o mundo, qual é o significado ou

propósito da oração?....................................................................................................5447.Parece que as coisas estão piorando desde que comecei a trabalhar com o

Um Curso em Milagres. Isso é comum? Estou fazendo algo errado?.......................5548.Se eu praticar fielmente o Um Curso em Milagres, vou desaparecer?......................56

Capítulo 4

JESUS

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49.Onde está escrito no Um Curso em Milagres que Jesus é o autor, e por que não é dado o nome do autor no livro? Além disso, por que existem seções sobre Jesus no manual para professores, escritas na terceira pessoa? Existe outraVoz ditando aqui?.........................................................................................................58

50.Se Jesus foi o primeiro a aceitar a Expiação para si mesmo, como Um Curso em Milagres afirma, e as pessoas como Buda?..........................................................58

51.Se, como Um Curso em Milagres sugere, o mundo entendeu totalmente errado amensagem de Jesus há dois mil anos, por que ele esperou tanto para corrigi-la?.59

52.O Jesus do Um Curso em Milagres é o mesmo sobre quem se fala na Bíblia, ea mesma pessoa que caminhou sobre a terra na Palestina, há dois mil anos?......60

53.Existe uma diferença entre Jesus e o Espírito Santo, e importa para quempeço ajuda?..................................................................................................................61

54.Por que Jesus repetidamente diz em Um Curso em Milagres que preciso perdoá-lo? Perdoá-lo pelo que?...................................................................................62

Capítulo 5

O CURRÍCULO DO UM CURSO EM MILAGRES

55.Quem deu o título Um Curso em Milagres, e por quê?................................................6556.Qual é a relação entre o Um Curso em Milagres e outros caminhos

espirituais, e especificamente com a Bíblia?................................................................6557.O conceito de círculo da Expiação está relacionado à idéia do “centésimo

macaco”? E os “professores de Deus” deveriam sair para ensinar Um Curso em Milagres ou para converter outros?........................................................................67

58.Um Curso em Milagres pode ser concluído em um ano, como o livro de exercícios parece sugerir?............................................................................................68

59.Existe uma forma certa ou errada de praticar o livro de exercícios?..........................6860.É necessário fazer o livro de exercícios mais de uma vez?........................................6961.Por que o texto e o livro de exercícios têm focos diferentes, e de vez em

quando parecem dizer coisas diferentes?.....................................................................7062.Um Curso em Milagres tem que ser estudado, ou é suficiente apenas fazer

o livro de exercícios e ler o texto a esmo, de qualquer forma em que me sentirguiado a fazer?..............................................................................................................72

63.Deve-se ensinar Um Curso em Milagres às crianças?.................................................7364.De acordo com Um Curso em Milagres, como as crianças deveriam ser criadas?..7365.E os grupos que se reúnem para estudarem o Um Curso em Milagres?..................7466.Eu preciso de um psicoterapeuta, mas só quero um terapeuta que seja estudante

do Um Curso em Milagres, ou pelo menos esteja familiarizado com ele esimpatize com seus ensinamentos. O que devo fazer?...............................................75

67.Se Um Curso em Milagres é um ensinamento universal, por que ele vem emtermos tão sectários (i.e., cristãos)? Isso não limita sua aplicabilidade mundial?.....75

68.Por que a linguagem do Um Curso em Milagres é tão difícil de ler e entender? Por que Jesus não poderia tê-lo escrito de forma mais simples?...............................76

69.Posso fazer o Um Curso em Milagres por mim mesmo, ou preciso de um parceiro?.7670.Um Curso em Milagres é melhor praticado em reclusão,

sem as distrações do mundo?.......................................................................................77 71.Existem algumas pessoas que completaram com sucesso o Um Curso em

Milagres, e quem são elas?...........................................................................................78 72.O que se deve dizer a um estranho, um membro da família, ou um amigo que

pergunta o que é Um Curso em Milagres?....................................................................78

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Prefácio à Segunda Edição

Para um estudo mais aprofundado sobre as perguntas e respostas que aparecem nesse livro, assim como muitos outros tópicos, os leitores podem consultar ou usar o serviço de perguntas-e-respostas no nosso Web site, www.facim.org. Iniciado em 2002, já publicamos respostas para várias centenas de questões até o momento dessa impressão.

Prefácio

Nosso propósito ao escrevermos esse livro é respondermos às perguntas mais comuns feitas pelos estudantes do Um Curso em Milagres, desde sua publicação, em 1976. Através de muitos anos em que estivemos ensinando o Curso, tornou-se aparente que sua mensagem radical tem sido freqüentemente uma fonte de muita confusão, compreensão equivocada e distorção. É nosso objetivo nesse livro ajudar a esclarecer, através desse formato de perguntas-e-respostas, muitos dos princípios do Curso, para facilitar uma compreensão maior e aplicação do seu sistema de pensamento.

As perguntas foram divididas em cinco categorias, que formam os capítulos do livro: A Natureza do Céu, A Natureza da Separação, Aplicação e Prática do Um Curso em Milagres, Jesus, e o Currículo do Um Curso em Milagres.

Gostaríamos de agradecer à equipe e amigos da Fundação para Um Curso em Milagres (FACIM) por sua ajuda para a formulação e compilação de muitas dessas perguntas, e aos estudantes que através dos anos as fizeram.

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Capítulo 1

A NATUREZA DO CÉU

1) Qual é a natureza de Deus?

Para iniciar, é imperativo reconhecer que o verdadeiro Deus vivo citado em Um Curso em Milagres é um Ser não-dualista, em Quem não residem opostos de forma alguma. O Santo Um é o Criador de toda vida, um Ser de puro Amor e a Fonte e Primeira Causa da realidade não-física e da totalidade, o perfeito Um Que é oniabarcante, fora de Quem não há literalmente nada, pois Ele é Tudo. A natureza da nossa Fonte não pode ser descrita ou realmente compreendida, como Jesus afirma no livro de exercícios:

A Unicidade é simplesmente a idéia de que Deus é. E no Que Ele É, Ele abrange todas as coisas. Não há mente que contenha algo que não seja Ele. Dizemos: “Deus é” e então deixamos de falar, pois nesse conhecimento as palavras são sem significado. Não há lábios para pronunciá-las e nenhuma parte da mente é distinta o suficiente para sentir que agora está ciente de algo que não seja ela mesma. Ela se uniu à sua Fonte. E, como a própria Fonte, meramente é.Não podemos falar, escrever ou mesmo pensar sobre isso de modo algum (LE-pI.169.5:1; 6:1-2).

Jesus afirma que a natureza de Deus e Sua Unicidade não podem ser descritas porque é uma pura realidade não-dualista, e a palavra escrita e falada que expressa o pensamento de uma mente dividida é dualista. Portanto, qualquer tentativa de descrever o não-dualismo precisa falhar, e inevitavelmente passa longe de expressar a realidade da unicidade que repousa além de qualquer expressão. Novamente, simplesmente é. Na melhor das hipóteses, portanto, tudo o que podemos fazer é descrever a natureza de Deus, sempre mantendo em mente que nossas palavras são apenas “símbolos de símbolos”, e “são, portanto, duas vezes afastadas da realidade” (MP-21.1:9-10).

2) Qual é a natureza da realidade?

Realidade como é definida por Um Curso em Milagres não é um reino, dimensão ou experiência física, uma vez que a realidade, como foi criada por Deus e como Deus, é sem forma, imutável, eterna, amor infinito, e perfeição ilimitada e unificada - uma unicidade não-dualista. Realidade no Curso é sinônimo de Céu e obviamente não pode ser relacionada de qualquer maneira ao universo da forma que o mundo chama de realidade. Sendo imutável, a verdadeira realidade é permanente e estável, e, portanto, qualquer pensamento de separação – que é mudança – é impossível e, portanto, nunca foi. Como um estado não-dualista, a realidade está além da percepção, uma vez que a percepção pressupõe uma dicotomia sujeito-objeto que é inerentemente dualista, e então, não pode ser real. Em Um Curso em Milagres, realidade também é sinônimo de conhecimento, o estado de ser que é o Céu.

Uma passagem representativa de “Realidade imutável”, perto do final do texto, provê um lindo resumo da natureza da realidade:

A realidade é imutável. É isso o que faz com que ela seja real e a mantém separada de todas as aparências. Ela tem que transcender todas as formas para ser ela própria. Ela não pode mudar.

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O milagre é o meio de demonstrar que todas as aparências podem mudar porque elas são aparências e não podem ter a imutabilidade a que a realidade está vinculada...A realidade é imutável. Os milagres apenas mostram que o que interpuseste entre a realidade e a tua consciência é irreal e não interfere absolutamente (T-30.VIII.1:6-9; 2:1-3; 4:1-3).

3) Qual é a natureza da vida?

Em Um Curso em Milagres, a vida como foi criada por Deus não tem nada a ver com o que chamamos ou conhecemos como vida no corpo. A vida é espírito: imaterial, não-dualista, e eterno. Talvez a afirmação mais clara no Curso sobre a essência da vida – o que ela é e o que ela não é – venha nessa passagem muito poderosa de “As Leis do Caos”, no Capítulo 23 do texto. Ela começa com um conto e uma zombaria gentil da nossa adoração ao corpo:

Podes pintar lábios cor-de-rosa em um esqueleto, vesti-lo com o que é belo, agradá-lo e mimá-lo e fazê-lo viver? E podes ficar contente com uma ilusão de que estejas vivendo?Não há vida fora do Céu. Onde Deus criou a vida [Céu], lá ela tem que estar. Em qualquer estado à parte do Céu, a vida é ilusão. Na melhor das hipóteses, parece vida [quando o corpo está “vivo”]; na pior, parece morte [quando o corpo “morre”]. No entanto, os dois são julgamentos sobre o que não é vida, são iguais na sua falta de acuidade e de significado. A vida fora do Céu é impossível e o que não está no Céu não está em lugar nenhum. Fora do Céu, existe apenas o conflito de ilusões: sem sentido, impossível e além de toda a razão, mas apesar disso percebido como uma eterna barreira para o Céu. Ilusões não são senão formas. Seu conteúdo nunca é verdadeiro (T-23.II.18:8-10; 19).

Muito cuidadosamente, portanto, Jesus está explicando que a vida é Unicidade com nossa Fonte no Céu, onde a Mente de Cristo e a Mente de Deus são Uma. Vida, espírito e Mente são termos basicamente sinônimos entre si, compartilhando as características da ausência de forma, imutabilidade e vida eterna. O que nós, no mundo, identificamos como vida no corpo, tal como as ondas cerebrais e pulsações cardíacas, claramente não é o que o Curso chama de vida. Na verdade, uma lição do livro de exercícios (167) é intitulada: “Só existe uma vida e eu a compartilho com Deus”. Portanto, o que experimentamos como vida, como um organismo físico e psicológico, é um travesti ou paródia do nosso verdadeiro Ser, o Cristo que Deus criou como vida verdadeira. É importante entender como a vida é vista em Um Curso em Milagres, de outra forma, os estudantes iriam terminar confundindo-se, tanto em entenderem os ensinamentos não-dualistas do Curso, quanto em aplicá-los às suas vidas pessoais.

4) O Deus do Um Curso em Milagres é o mesmo Deus da Bíblia?

Jesus inequivocamente afirma no Curso que Deus não criou esse mundo e, portanto, só por isso Ele já é distintamente diferente da deidade judaico-cristã. O Deus bíblico é um criador dualista do universo material que ele cria pela palavra falada, como está escrito no primeiro registro da criação, em Gênesis: “E Deus disse, que assim seja...”. Portanto, esse mundo e todas as criaturas vieram à existência como entidades separadas, existindo fora dele. Com efeito, portanto, o Deus bíblico cria, projetando um pensamento ou conceito fora de si mesmo, onde ele se torna uma “realidade” física, como testemunhado, novamente, na história da criação, no Livro do Genesis.

Mas as distinções entre os dois são ainda mais profundas. O Deus bíblico é uma pessoa que vê o pecado como real, e precisa, dessa forma, responder a ele, primeiro com a punição, e depois com o plano de expiação, onde a salvação e o perdão são recebidos através do

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sofrimento e do sacrifício do seu Servo santo (o Servo Sofredor em Isaías – Velho Testamento), e seu único Filho bem amado Jesus (Novo Testamento). O Deus do Um Curso em Milagres, por outro lado, não é uma pessoa e, portanto, não tem nenhuma das qualidades antropomórficas do homo sapiens. Esse Deus nem mesmo sabe nada sobre a separação (o equivalente do Curso à noção bíblica de pecado original), e, portanto, não pode responder a ela.

Portanto, o Deus do Curso não é o Deus da religião formal, e certamente não é o Deus da Bíblia. Na verdade, nossa Fonte está além de todos os conceitos e antropomorfismos, e não tem nada em comum com o Deus bíblico, que tem todos os atributos do amor especial (um Deus que tem um povo escolhido), e do ódio especial (um Deus de punição) que estão associados ao sistema de pensamento do ego. A já mencionada seção “As Leis do Caos” contém um retrato gráfico desse Deus bíblico que tornou o pecado real e, portanto, revelou suas origens egóicas, ou melhor, os egos dos escritores dos livros da Bíblia:

A arrogância em que se baseiam as leis do caos não pode ser mais evidente do que aqui. Aqui está um principio que pretende definir o que o Criador da realidade tem que ser, o que Ele tem que pensar e o que Ele tem que acreditar, e como Ele tem que responder acreditando nisso. Nem mesmo se considera necessário perguntar-Lhe acerca da verdade do que foi estabelecido para que Ele creia. Seu Filho pode dizer-Lhe isso e Ele não tem senão a escolha de aceitar a sua palavra ou estar equivocado... [Mas] se Deus não pode estar equivocado, Ele tem que aceitar a crença do Seu Filho acerca do que ele é [um pecador] e odiá-lo por isso.Vê como o medo de Deus é reforçado por esse terceiro princípio. Agora vem a ser impossível voltar-se para Ele pedindo ajuda na miséria. Pois agora Ele veio a ser o “inimigo” Que a causou, a Quem é inútil apelar... E agora o conflito se faz inevitável, além da ajuda de Deus. Pois agora a salvação não pode deixar de ser impossível porque o salvador veio a ser o inimigo.Não pode haver nenhuma liberação, nem é possível escapar. Assim a Expiação vem a ser um mito e a vingança, não o perdão, é a Vontade de Deus. A partir de onde tudo isso começa, não há nenhuma ajuda à vista que possa ser bem sucedida. Só a destruição pode ser o resultado. E o próprio Deus parece estar ao lado da destruição para dominar o Seu Filho (T-23.II.6:1-8,10-12; 7:1-1-4,6-8; 8:1-5).

Esse retrato, como está claro, não é apenas do deus arquetípico do ego que repousa no centro das mentes de todos que acreditam na separação, mas é também o que tem sido tão poderosamente expresso na Bíblia, tanto no Velho quanto no Novo Testamento. Esse deus é uma figura, para reforçar, que acredita na realidade do pecado e na sua expiação através da punição, cujos componentes principais – sofrimento e sacrifício – se tornam o grande plano de salvação ou redenção. E, como Um Curso em Milagres ensina, uma vez que a crença na separação recebe qualquer realidade, é inevitável, no sistema de pensamento da mente errada do ego, que o deus do ego seja percebido como vingativo. Isso reflete a “trindade profana” de pecado, culpa e medo do ego: O sistema de pensamento do ego postula a separação como realizada, e a chama de pecado. Então, a experiência psicológica do pecado segue-se a isso, e a culpa surge. E agora, o deus do ego exige punição, a origem do medo, como já vimos na citação acima. E, por trás de toda insanidade, permanece o verdadeiro Deus do Amor, Que simplesmente “espera” que as mentes das Suas crianças adormecidas despertem do seu pesadelo, e retornem a Ele, a Quem nunca deixaram.

5) Se Deus não é uma pessoa, por que Jesus O retrata dessa forma? Isso é confuso.

Essa questão vai ao cerne de uma questão muito importante para estudantes do Um Curso em Milagres: o uso da linguagem metafórica de Jesus. É uma fonte de muita compreensão errônea para os estudantes, tanto em termos de entenderem o que Jesus está ensinando no

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Curso, quanto ao aplicarem seus princípios em suas vidas diárias. A linguagem do Curso é claramente dualista, simbólica e metafórica – como, na verdade, toda linguagem precisa ser – e existem vários trechos no Curso onde Jesus explica que precisa usar a linguagem da ilusão – i.e., dualidade – para que os seus estudantes entendam as verdades que ele está ensinando. Ele diz, por exemplo, no contexto do relacionamento santo recém-nascido:

De todas as mensagens que recebeste e falhaste em compreender, só esse curso está aberto à tua compreensão e pode ser compreendido. Essa é a tua linguagem. Ainda não a compreendes apenas porque toda a tua comunicação é como a de um bebê. Os sons que um bebê faz e o que ele ouve são altamente inconfiáveis, significando coisas diferentes para ele em momentos diferentes. Nem os sons que ele ouve e nem o que ele vê são ainda estáveis... Entretanto, um relacionamento santo, renascido há tão pouco tempo de um relacionamento não-santo e, apesar disso mais antigo do que a velha ilusão que substituiu, é agora como um bebê em seu renascimento. Ainda assim nesse infante a tua visão é devolvida a ti e ele falará a linguagem que podes compreender (T-22.I.6:1-7; 7:2-6).

Todos temos experimentado essa mesma necessidade que Jesus está descrevendo aqui. Quando falamos com crianças, usamos palavras e conceitos apropriados ao nível de compreensão das crianças. Mesmo que a forma do que dizemos nem sempre seja literalmente verdadeira, o conteúdo do nosso amor e desejo de sermos úteis é realmente genuíno.

E, depois, no texto, falando sobre a Unicidade de Cristo que nos ensina de dentro de nossas mentes separadas, Jesus faz a mesma afirmação:

Já que tu acreditas que estás separado, o Céu se apresenta a ti como se fosse separado também. Não que ele o seja na verdade, mas para que o elo que te foi dado para unir-te à verdade possa chegar a ti através de algo que compreendes... No entanto Ele [a Unicidade] tem que usar uma linguagem que essa mente possa compreender, na condição na qual ela pensa que está [o estado dualista da separação]. E Ele tem que usar todo o aprendizado para transferir ilusões à verdade, tomando todas as idéias falsas quanto ao que tu és e conduzindo-te para além delas, para a verdade que está além das ilusões (T-25.I.5:1-4; 7:7-12).

Uma vez que, como já vimos, não existe forma de Jesus conseguir nos dizer o que Deus,

nosso Criador e Fonte, realmente é, ele precisa recorrer à linguagem do mito e da metáfora. Esses são os símbolos que nós – identificados como corpos – conseguimos entender. E então, através de todo o Um Curso em Milagres, Deus é citado como um corpo, uma vez que nem mesmo podemos pensar Nele sem um (T-18.VIII.1:7). Ele é chamado de “Pai”, e retratado com Braços, Mãos e uma Voz, e tendo sentimentos de solidão e incompletude. Fica até mesmo implícito que Deus tem dutos lacrimais, uma vez que Ele chora por Seus Filhos que estão separados Dele. Claramente, o Deus não-dualista que temos descrito não pode possuir essas características e partes corporais. Além disso, o verdadeiro Deus não pensa, como nós experienciamos o pensamento. Nem Ele pode realmente ter um plano de Expiação como uma resposta à ilusão da separação quando, como está descrito no Curso, Ele cria o Espírito Santo. As contradições aparentes aqui são resolvidas quando entendemos, novamente, que Jesus está falando conosco no nível antropomórfico que podemos entender, um exemplo maravilhoso do princípio que ele enuncia logo no início do texto:

... o milagre, para atingir a sua plena eficácia, tem que ser expressado em uma linguagem que aquele que recebe possa compreender sem medo (T-2.IV.5:4-6).

Estudantes do Um Curso em Milagres precisam estar cautelosos para não caírem na armadilha de entenderem literalmente o que está destinado a ser figurativo. Uma boa regra

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iniciativa é nos recordarmos que apenas a não-dualidade é real. Em contraste, a dualidade é a ilusão da separação, como pode ser visto nessa paráfrase de uma sentença do manual, na qual substituímos a palavra dualidade por morte, uma passagem da qual devemos fazer citações mais profundas na última questão:

Professor de Deus, tua única atribuição poderia ser colocada assim: não aceites nenhuma transigência na qual a dualidade desempenhe um papel (MP-27.7:13).

Qualquer passagem em Um Curso em Milagres na qual Jesus fale sobre Deus fazendo qualquer coisa, ou tendo quaisquer características do homo sapiens – antropomorfismos – é inerentemente dualista e, portanto, é uma metáfora para expressar o Amor abstrato e não-específico de Deus, que está além de todo dualismo. De forma similar, qualquer referência ao Espírito Santo ou Jesus fazendo qualquer coisa cai na mesma categoria.

Para nos certificarmos, essas são passagens extremamente significativas para nós que ainda acreditamos estar em um mundo dualista de tempo e espaço, mas encarar essas afirmações como verdade literal vai assegurar que nunca aprendamos as lições que vão nos ajudar a despertar do sonho de que realmente existe um mundo de individualidade e corpos separados. Com freqüência demais, estudantes acabam reforçando seu próprio especialismo e identificação com seus corpos, por nunca irem além da linguagem do Curso – emprestada da Bíblia – que consiste amplamente de descrições metafóricas de Deus e do Espírito Santo como corpos e pessoas que interagem com eles. Focalizar-nos no verdadeiro papel do Espírito Santo como um Pensamento em nossas mentes, pedindo-nos para escolher a Ele ao invés do ego como nosso professor, vai manter os estudantes nos trilhos certos do perdão.

6) O que Um Curso em Milagres quer dizer com criação?

Em Um Curso em Milagres, criação não se refere a qualquer coisa física e, portanto, não tem nada a ver com a criação material ou artística. Ao invés disso, criação envolve apenas espírito, e pode ser definida como o sumo de todos os Pensamentos de Deus: infinito, ilimitado, sem início ou fim (LE-pII.11.1:1). Cristo, o Filho único de Deus, é o termo que o Curso usa para denotar a criação de Deus. Cristo está em unidade com Seu Criador, e não existe lugar algum onde Deus termina e o Filho começa (LE-pI.132.12:4). Portanto enquanto Deus é a Causa Primeira e Cristo é o Seu Efeito, em um Céu não-dualista – o estado da perfeita Unicidade -, não pode haver separação ou distinção entre o Criador e o criado. Causa e Efeito são, portanto indivisíveis e inseparáveis. Além disso, a criação de Deus precisa compartilhar dos atributos não-dualistas, não físicos da sua Fonte. Como o Criador é perfeito, imutável, espírito sem forma, vida eterna, e infinito amor – completo e unificado em Si Mesmo -, assim também tem que ser Sua criação, Cristo. Portanto, Deus e Cristo não são corpos, nem são entidades físicas e psicológicas, com personalidade. Em “O que é a Criação?”, da Parte II do livro de exercícios, encontramos esse adorável parágrafo que resume tudo:

A criação é o oposto de todas as ilusões, pois a criação é a verdade. A criação é o Filho santo de Deus, pois na criação a Sua Vontade se completa em todos os aspectos, fazendo com que cada uma das partes esteja contida no Todo. A inviolabilidade da unicidade da criação está garantida para sempre; para sempre mantida em Sua Vontade santa, além de toda possibilidade de dano, de separação de imperfeição e sem qualquer mancha em sua impecabilidade (LE-pII.11.3).

7) O que Um Curso em Milagres quer dizer com criação como um processo?

Uma vez que a criação está fora dos reinos temporal e espacial, não é um processo que possa ser compreendido pelo cérebro humano, condicionado pelos pensamentos de tempo e espaço. Criação, como compreendida pelo Um Curso em Milagres, é um sinônimo com

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extensão não-espacial, o “processo” através do qual Deus estende Seu Ser e Seu Amor em um jorro contínuo de Si Mesmo. Esse é um jorro, no entanto, que nunca deixa Sua Mente e, portanto, nunca está fora Dele. Uma vez que a criação de Deus – Cristo – compartilha dos atributos do seu Criador, Cristo, da mesma forma, cria no mesmo processo de extensão. Como o Curso explica:

Estender-se é um aspecto fundamental de Deus, que Ele deu ao Seu Filho. Na criação, Deus estendeu-Se às Suas criações e as imbuiu da mesma Vontade amorosa de criar. (T-2.I.1:1-3).... se Deus te criou estendendo-Se a ti, só podes estender-te como Ele fez. Só a alegria aumenta para sempre, já que a alegria e a eternidade são inseparáveis. Deus Se estende além dos limites e além do tempo e tu que és co-criador com Ele estendes o Seu Reino para sempre e além de todos os limites (T-7.I.5:2-7).

A criação do Filho (a ser definida abaixo, na próxima questão) permanece dentro da Mente Única de Cristo, assim como Cristo permanece dentro da Mente Única de Deus. Unicidade naturalmente só pode permanecer Uma, como essa passagem do livro de exercícios expressa:

Aos Pensamentos de Deus [Cristo] é dado todo o poder do seu próprio Criador. Pois Ele quer acrescentar ao Amor pela sua extensão. Assim, o Seu Filho compartilha da criação e tem que compartilhar, portanto, do poder de criar. O que a Vontade de Deus determina que seja para sempre uno ainda será uno quando o tempo tiver chegado ao fim, e não terá mudado ao longo do tempo, permanecendo como era antes que tivesse início a idéia do tempo (LE-pII.11.2).

Novamente, o que é citado abaixo como o “círculo da criação” não pode ser compreendido em termos físicos, ou no que é rotulado como criatividade no mundo. Aqui nesse mundo, criador e criação são separados; no Céu, são um – um estado que está além da nossa compreensão. As seguintes passagens do texto tornam isso claro:

O círculo da criação não tem fim. Seu inicio e seu fim são o mesmo. Mas, em si, ele contém todo o universo da criação sem começo e sem fim (T-28.II.1:7-9).

A tua função é adicionar ao tesouro de Deus por criar o teu. A Sua Vontade para ti é a Sua Vontade por ti. Ele não iria manter a criação afastada de ti porque é nisso que está a Sua alegria. Não podes achar alegria exceto como Deus o faz. A Sua alegria está em criar-te e Ele te estende a Sua própria Paternidade de modo que possas te estender como Ele fez. Não compreendes isso porque não O compreendes. Ninguém que não aceite a própria função pode compreender qual ela é e ninguém pode aceitar a própria função a não ser que conheça o que ele próprio é (T-8.VI.6:1-9).

O perdão, que nós podemos entender, é nossa função enquanto acreditarmos estar aqui no mundo, e é o processo através do qual aprendemos a aceitar nossa Identidade como Cristo. É essa aceitação, novamente, que nos permite finalmente compreender a realidade e o que significa ser como Deus nos criou.

8) Quais são as criações de Deus, citadas em Um Curso em Milagres?

Criações são extensões não-espaciais, atemporais e não-físicas de Cristo, Que cria como Sua Fonte. Como acabamos de ver, é da natureza do Amor do Céu estender-se, o que o Curso chama como o processo da criação. Uma vez que Cristo é Um com Seu Criador e é como Ele em todas as coisas, Ele também estende Seu Amor em criação, como já explicamos na

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pergunta anterior. São essas extensões do Amor de Cristo que Um Curso em Milagres chama de “criações”. Para reafirmar esse ponto importante, nossas criações não têm paralelo com nada no mundo físico, assim como a criação de Deus, Cristo, não tem paralelo com nada no mundo físico, incluindo o homo sapiens. De forma similar, nossa função de criar no Céu não tem nada em comum com a atividade que o mundo considera como “criativa”, tal como a criatividade artística, criar um bebê, ter uma idéia criativa, etc.

Como extensões de Cristo, as criações podem ser entendidas como sendo parte da Segunda Pessoa da Trindade do Curso, nossos “filhos”, como é visto nessas duas passagens do texto:

Deus só quer Seu Filho, porque Seu Filho é Seu único tesouro. Tu queres as tuas criações assim com Ele quer as Dele. As tuas criações são a tua dádiva à Santíssima Trindade, criadas em gratidão pela tua criação. Elas não te deixam, do mesmo modo como não deixaste o teu Criador, mas estendem a tua criação assim como o próprio Deus Se estendeu a ti (T-8.VI.5:1-6).

O lugar das tuas criações é em ti, assim como o teu lugar é em Deus. Tu és parte de Deus, como os teus filhos são parte dos Seus Filhos. Criar é amar. O amor se estende para fora simplesmente porque não pode ser contido. Sendo sem limites, não pára. Ele cria para sempre, mas não no tempo. As criações de Deus sempre existiram, porque Ele sempre existiu. As tuas criações sempre existiram, porque só podes criar como Deus cria. A eternidade é tua, porque Ele te criou eterno. (T-7.I.3).

Mantendo seu uso da metáfora, Jesus algumas vezes fala das criações de Cristo na linguagem reminiscente das chefes de torcida, encorajando os Filhos separados a voltarem para casa, como nessa passagem:

O Céu espera silenciosamente e as tuas criações estendem as mãos para ajudar-te a atravessar e dar boas-vindas a elas. Pois é a elas que buscas. Não buscas senão a tua própria completeza e são elas que te tornam completo (T-16.IV.8:1-4).

9) Se Deus só tem um Filho, por que Um Curso em Milagres usa o termo Filhos de Deus?

Muitas vezes, Jesus usa o plural para se dirigir às crianças de Deus que acreditam que são separadas e em grande quantidade. Esse é outro exemplo do uso flexível da linguagem de Jesus para que ele possa encontrar seus estudantes em um nível de separação ou dualidade que eles possam aceitar e compreender. Mas isso não deve ser visto como significando que existe individualidade e separação no Céu. Na realidade, como Um Curso em Milagres afirma repetidamente, só pode haver um Filho, uma vez que a Unidade só pode criar unidade, e multiplicidade não pode se originar da Unicidade. Isso é salientado nessas importantes passagens do texto e do livro de exercícios:

Deve-se notar especialmente que Deus só tem um Filho. Se todas as Suas criações são Seus Filhos, cada um tem que ser uma parte integral de toda a Filiação. A Filiação, em sua unicidade, transcende a soma de suas partes (T-2.VII.6:1-4).

Nós somos a criação, nós, os Filhos de Deus. Parecemos ser separados e inconscientes da nossa eterna unidade com Ele. Entretanto, por trás de todas as nossas duvidas, depois de todos os nossos medos, ainda há certeza. Pois o Amor permanece com todos os Seus Pensamentos e a Sua segurança pertence a eles. A memória de Deus está em nossas mentes santas, que conhecem a sua unicidade e a sua unidade com o seu Criador (LE-pII.11.4:1-6).

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Portanto, o termo Filhos de Deus é usado por conveniência, quando Jesus está se dirigindo aos seus estudantes como eles acreditam ser. Por outro lado, Filho de Deus é o termo usado para denotar quem nós realmente somos como Cristo, a Identidade de Unicidade para a qual todos devemos despertar depois que o nosso sonho de multiplicidade for desfeito.

10) Por que Um Curso em Milagres usa uma linguagem masculina para denotar a Trindade? Jesus é sexista?

Não, Jesus não é sexista, nem a escriba do Curso, Helen Schucman, uma sexista invertida. Na verdade, Um Curso em Milagres está escrito linguisticamente dentro da tradição judaico-cristã, dominada pelo masculino, e usa a linguagem bíblica patriarcal na qual essa tradição é baseada. Conseqüentemente, o Curso se adéqua a essa cultura religiosa usando termos trinitários que são exclusivamente masculinos. Precisa ser compreendido, no entanto, que a Trindade não é nem masculina nem feminina, e o Santo Um não conhece nada sobre sexo, uma vez que Ele não criou corpos. Esse ponto é um testemunho mais profundo da diferença dentre o deus-criador bíblico e o Deus do Um Curso em Milagres. De fato, o próprio Jesus fala sobre seu uso da linguagem orientada pelo ego:

Esse curso permanece dentro da estrutura do ego, onde ele é necessário... Usa palavras que são simbólicas e não podem expressar o que está além dos símbolos (ET-in.3:1-2,4-5).

E então, está claro que o significado do Curso ao usar essa linguagem masculina repousa em algum outro lugar. Enquanto a forma das palavras do Curso é a mesma da tradição ocidental de 2.500 anos, seu conteúdo é exatamente o oposto. Isso provê um bom exemplo de um princípio enunciado duas vezes no texto, de que o Espírito Santo não tira nossos relacionamentos especiais (a forma) de nós, mas, ao invés disso, os transforma (mudando seu propósito – o conteúdo) (T-17.IV.2:3-6; T-18.II.6). Portanto, o leitor recebe uma oportunidade maravilhosa de praticar o perdão, fazendo com que quaisquer pensamentos julgadores enterrados e inconscientemente presentes sejam elevados à consciência pela linguagem “sexista” do Curso, para que possam ser vistos de forma diferente, com a ajuda do Espírito Santo. Dessa forma, um relacionamento de ódio especial (ou de amor) com autoridades patriarcais – religiosa ou secular – pode ser transformado em um relacionamento santo, o relacionamento agora tendo o perdão e a paz como seu propósito, ao invés do julgamento e ataque.

Da mesma forma, podemos entender o uso do Curso do termo Filho de Deus. Por dois mil anos, ele tem sido usado exclusivamente na teologia cristã para denotar apenas Jesus, o único Filho primogênito de Deus, e a Segunda Pessoa da Trindade. Além disso, o especialismo de Jesus foi acentuado por São Paulo, relegando o resto da humanidade ao status de “filhos adotados” de Deus (Galatinas 4:4). Para acentuar o ponto de que é nosso igual, Jesus em Um Curso em Milagres usa o mesmo termo que até então tinha excluído a todos, exceto a ele mesmo. Agora, no entanto, ele denota todas as pessoas: as crianças de Deus que ainda acreditam que são corpos e separadas da sua Fonte e, portanto, diferentes Dele. E ainda mais especificamente, o termo Filho de Deus denota os estudantes que estão lendo e estudando Um Curso em Milagres, uma prática claramente feita, não importando seu sexo.

Esse termo é, portanto, deliberadamente usado para ajudar a corrigir dois mil anos do que Um Curso em Milagres vê como a distorção da mensagem básica de Jesus feita pelo cristianismo, nesse caso, a perfeita igualdade e unidade da Filiação de Deus. E então, no Curso, Jesus apresenta a si mesmo como não diferente de qualquer outra pessoa na realidade (embora certamente ele seja diferente de nós no tempo). Portanto, para afirmar mais uma vez, o mesmo termo – Filho de Deus – que foi usado apenas para Jesus agora é usado para todos nós. Além disso, o termo também é usado para denotar Cristo, a criação pré-separação de Deus. Seu único Filho. Novamente, vemos o uso da mesma forma como é feito no cristianismo,

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mas com um conteúdo completamente diferente. A frase Filho de Deus também pode ser facilmente compreendida como sinônimo de criança, um termo que também é usado com freqüência no Curso.

A reinterpretação de Filho de Deus de algo exclusivo para algo totalmente inclusivo, é crucial para o sistema de pensamento do Curso. E, por causa da razão de Jesus para usar esse termo, estudantes – tanto homens quanto mulheres – deveriam estar vigilantes contra a tentação de mudarem a linguagem “ofensiva” do Curso. Embora tal prática seja compreensível, realmente serve para minar um dos propósitos pedagógicos de Jesus. Seria muito melhor, para se manter alinhado com os ensinamentos do Um Curso em Milagres, deixar a forma como está, e mudar a própria mente ao invés disso. Nessas circunstâncias, seria bom parafrasear uma famosa linha do texto: Portanto, não busque mudar o curso, mas escolha mudar a sua mente sobre o curso (T-21.in.1:7). Portanto, uma vez que a forma do Curso não será modificada, os estudantes seriam sábios em usar suas reações como salas de aula nas quais podem aprender a perdoar, não apenas Jesus, Helen, ou o próprio Um Curso em Milagres, mas também todos aqueles no passado (ou presente) que têm sido percebidos como tratando a eles ou aos outros injustamente.

Uma nota final sobre o assunto da linguagem masculina do Curso: tem sido uma convenção gramatical que pronomes referindo-se a um substantivo neutro, tal como “um” ou “pessoa” assumem a forma masculina de “ele”. Claramente, uma vez que um ensinamento central do Um Curso em Milagres é o de que não existem corpos – e então, membros da Trindade não são corpos também -, a questão, mais uma vez, é meramente de forma ou estilo.

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Capítulo 2

A NATUREZA DA SEPARAÇÃO

11) Como o ego se originou, e o que pode impedir a separação de acontecer outra vez?

Essa é inquestionavelmente a pergunta mais freqüente de todas, e parece que cada estudante do Um Curso em Milagres tem pensado sobre isso uma vez ou outra. Temos ficado impressionados, através dos anos, pela ingenuidade com a qual estudantes do Curso emolduraram essa questão de muitas formas diferentes; no entanto, a questão básica em si mesma pode ser reafirmada dessa forma: “Se Deus é perfeito e unificado, e tem um Filho perfeito e unificado, como poderia um pensamento imperfeito de separação e divisão ter tido a possibilidade de surgir dentro de uma Mente assim?”.

A resposta de Jesus a essa pergunta no Curso vem dentro de uma moldura não-dualista, e dificilmente vai satisfazer uma mente intelectualmente inquisitiva que requeira uma resposta em seus próprios termos. No entanto, dentro da moldura dualista que experienciamos como nossa realidade, a questão é realmente uma afirmação mascarada em forma de questão, “perguntada” por uma mente egóica para estabelecer sua própria realidade e identidade única. Portanto, o questionador está realmente dizendo: “Eu acredito que estou aqui, e agora quero que você me explique como cheguei aqui”.

A consciência, sendo a primeira divisão introduzida na mente do Filho adormecido, é um estado egóico onde um perceptor e um percebido são vistos como existindo como “realidades” separadas. A consciência resulta em um conceito de um falso ser limitado, que é separado e incerto, parecendo experienciar um oposto ao verdadeiro Ser como Deus O criou. E é esse falso ser que acredita estar “aqui” e “pergunta” a questão sobre sua própria origem aparente, dessa forma buscando verificá-la. Na verdade, no entanto, a imperfeição não pode emanar da perfeição, e um pensamento imperfeito de separação e divisão não pode surgir da Mente perfeita do Filho perfeito de Deus, na qual opostos não podem existir. Apenas em um mundo de sonhos, esses absurdos, e as crenças que sustentam essa incerteza, levam a reflexões como essas.

A questão, portanto, só pode ser perguntada por aqueles que acreditam e experienciam que realmente são separados e distintos, e só pode ser respondida por alguém que concorde com essa premissa de que o impossível realmente aconteceu, e, portanto, requer e até exige uma explicação. Portanto, apenas um ego adormecido faria tal pergunta, uma vez que o Filho de Deus, certo da sua Identidade no Céu e desperto em Deus, nem mesmo poderia conceber a separação que é a base para essa pergunta para início de conversa. E, obviamente, se na realidade a separação não aconteceu nem uma vez, como poderia acontecer uma segunda vez? Portanto, mais uma vez, é uma pergunta de truque, como as perguntas dos comediantes, “Quando você pára de bater na sua esposa?”, que, se respondida, só pode incriminar a pessoa que a responde.

Jesus se dirige a essa questão duas vezes: A primeira é encontrada no texto, onde ele dá uma resposta muito prática para o que originalmente foi uma questão proposta por William Thetford, colega e amigo de Helen, conforme ela estava transcrevendo o ditado:

É razoável perguntar como a mente pôde jamais ter feito o ego. De fato, é a melhor pergunta que tu poderias fazer. Não faz sentido, porém, dar uma resposta em termos de passado, porque o passado não importa e a história não existiria se os mesmos erros não estivessem sendo repetidos no presente (T-4.II.1:1-5).

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Em outras palavras, por que se preocupar sobre como e por que a separação aconteceu no passado distante, quando você ainda está fazendo a mesma escolha de se separar no presente?

A próxima resposta vem em duas partes, e é encontrada no esclarecimento de termos, o apêndice do manual para professores. Aqui, a resposta de Jesus é muito mais direta ao ponto, e está dirigida à pseudo-natureza da questão em si mesma, e sua resposta está refletida em nossa discussão acima:

O ego vai pedir muitas respostas que esse curso não dá. Ele não reconhece como perguntas a mera forma de uma pergunta à qual é impossível dar uma resposta. O ego pode perguntar “Como ocorreu o impossível?”, “Para que aconteceu o impossível?” e pode perguntar isso de muitas formas. Entretanto, não há nenhuma resposta, apenas uma experiência. Busca somente isso, e não deixes que a teologia te atrase (ET-in.4).

Quem te pede para definir o ego e explicar como ele surgiu só pode ser alguém que pense que ele é real e busque, através da definição, assegurar-se de que a natureza ilusória do ego esteja oculta por trás das palavras que parecem fazer com que seja assim.Não há definição para uma mentira que sirva para torná-la verdadeira (ET-2.2:5-9; 3:1-2).

12) Se Deus não criou o mundo ou o corpo, quem o fez? Além disso, quem somos nós e como chegamos aqui?

Essa está entre as perguntas mais comuns, e certamente é uma compreensível. Quase todas as pessoas acreditam que são seres físicos e psicológicos, vivendo em um universo material que existia antes da sua vinda, e que vai sobreviver à sua partida. A dificuldade em compreender que esse não é o caso repousa no fato de que estamos tão identificados com nossos seres corpóreos individuais, que é quase impossível concebermos nossa existência no nível da mente, que está fora do mundo do tempo e do espaço.

Quando o pensamento de separação pareceu acontecer, Um Curso em Milagres explica que o Filho de Deus pareceu adormecer e sonhar um sonho, cujos conteúdos são de que a unicidade se tornou multiplicidade, e que a Mente não-dualista de Cristo se tornou fragmentada e separada da Sua Fonte, dividida em fragmentos insanos em guerra entre si mesmos. Como o Curso explica, esses fragmentos projetam para fora da mente uma série de sonhos ou roteiros que coletivamente constituem a história do universo físico. Em um nível individual, os dramas seriais que as personalidades do nosso ego identificam como nossas vidas pessoais, também são projeções das nossas mentes divididas e fragmentadas.

Portanto, somos todos atores e atrizes no palco da vida, como Shakespeare escreveu, encenando um sonho que experienciamos como nossa realidade individual, separada e à parte de Quem realmente somos como Cristo. Além disso, nossas mentes têm projetado muitas personalidades diferentes no sonho coletivo do Filho fragmentado, complicando todo o processo. Portanto, a questão “Como chegamos aqui?” precisa ser compreendida dessa perspectiva do sonho coletivo e individual. Em outras palavras, nós não estamos realmente aqui, mas estamos sonhando que estamos. Como Um Curso em Milagres afirma: “[Nós] estamos em casa em Deus, sonhando com o exílio” (T-10.I.2:1). E foi assim que o sonho pareceu acontecer:

Na eternidade, onde tudo é um, introduziu-se uma idéia diminuta e louca, da qual o Filho de Deus não se lembrou de rir. Em seu esquecimento, esse pensamento passou a ser uma idéia séria, capaz de ser realizada e ter efeitos reais (T-27.ViII.6:3-6).

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Esses “efeitos reais” constituem o mundo físico que pensamos ser o nosso lar. A seguinte passagem é talvez a melhor descrição no Curso sobre o processo através do qual esse efeito veio à existência, uma vez que o Filho levou a sério a diminuta e louca idéia de que poderia haver um substituto para o Amor de Deus. Como vamos ver agora, isso resultou na criação do universo físico, que acreditamos ser oposto ao Céu:

Tu, que acreditas que Deus é medo, fizeste apenas uma substituição. Ela tomou muitas formas, porque foi a substituição da verdade pela ilusão, da totalidade pela fragmentação. Ela veio a ser tão partida, subdividida e de novo dividida, vezes e mais vezes, que agora é quase impossível perceber que alguma vez foi uma só e que ainda é o que era. Esse único erro, que trouxe a verdade à ilusão, a infinidade ao tempo e a vida à morte, foi tudo o que jamais fizeste. Todo o teu mundo se baseia nele. Tudo o que vês reflete isso e cada relacionamento especial que jamais tiveste é parte disso.Podes te surpreender quando ouvires o quanto a realidade é diferente daquilo que vês. Não reconheces a magnitude desse único erro. Ele foi tão vasto e tão completamente inacreditável que um mundo de total irrealidade tinha que emergir. Que outra coisa poderia resultar disso? Seus aspectos fragmentados são bastante amedrontadores quando começas a olhar para eles. Mas nada do que tens visto nem de leve te mostra a enormidade do erro original, que aparentemente te expulsou do Céu para estilhaçar o conhecimento em pequenas partes sem significado de percepções desunidas e para forçar-te a fazer mais substituições.

Essa foi a primeira projeção do erro para fora. O mundo surgiu para escondê-lo e veio a ser a tela na qual ele foi projetado e colocado entre tu e a verdade. Pois a verdade se estende para dentro, onde a idéia de perda não tem significado e só o aumento é concebível. Tu realmente pensas que é estranho que um mundo no qual tudo está de trás para frente e de cabeça para baixo tenha surgido dessa projeção do erro? Era inevitável (T-18.I.4; 5; 6:1-7).

Mas, Um Curso em Milagres também afirma que o mundo foi feito como um ataque a Deus (LE-pII.3.2:1), e isso foi alcançado, novamente, pela mente coletiva dividida do Filho, que acreditou em seu sonho alucinatório de que tinha usurpado a Primeira Causa. Esse é o início da trindade profana do ego que é mencionada acima, na questão 4, na página 7. A culpa em relação ao seu pecado aparente da separação e usurpação exigiu que o Filho fosse punido. Conseqüentemente o Filho amedrontado procurou fugir da sua própria projeção insana de um deus irado, vingativo, que queria destruí-lo. Portanto, o Filho projetou sua culpa ilusória e seu ser fragmentado para fora da mente, dessa forma criando erroneamente um mundo físico de tempo e espaço no qual ele poderia se esconder do deus não-físico que acreditava ter destronado e destruído. Dentro desses sonhos múltiplos, o Filho único pareceu se dividir em bilhões de fragmentos, cada um dos quais se tornou encarcerado em um corpo de sonhos individuais insanos, acreditando que isso iria lhe dar “proteção” pessoal contra a imagem do ego da punição final de um deus irado.

É importante notar, mais uma vez, que estamos falando sobre a mente coletiva do Filho separado como o criador do mundo. Cada fragmento aparentemente separado é apenas uma parte dividida da mente única original que busca substituir a Mente Única de Cristo, portanto, o fragmento individual não é responsável pelo mundo, mas ele é responsável por sua crença na realidade do mundo.

13) O Um Curso em Milagres realmente quer dizer que Deus não criou o universo físico inteiro?

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Nós respondemos essa pergunta com uma afirmativa ressonante! Uma vez que nada da forma, matéria ou substância pode ser de Deus, então, nada no universo físico pode ser real, e não existe exceção a isso. A Lição 43 do livro de exercícios, no contexto da percepção, que é o reino da dualidade e separação:

A percepção não é um atributo de Deus. Seu é o reino do conhecimento... Tu não podes ver em Deus. A percepção não tem nenhuma função em Deus e não existe (LE-pI.43.1:1-2; 2:1-2).

No esclarecimento de termos, encontramos a seguinte afirmação clara e cristalina sobre a natureza ilusória do mundo da percepção, que Deus não criou:

O mundo que vês é uma ilusão de um mundo. Deus não o criou, pois o que Ele cria tem que ser eterno como Ele próprio. No entanto, não há nada no mundo que vês que vá durar para sempre. Algumas coisas durarão no tempo um pouco mais do que outras. Mas virá o tempo no qual todas as coisas visíveis terão um fim (ET-4.1).

E, finalmente, uma afirmação similar no texto:

As leis de Deus não prevalecem diretamente em um mundo no qual a percepção domina, pois tal mundo não poderia ter sido criado pela Mente para a qual a percepção não tem significado. Entretanto, as Suas leis refletem-se em toda parte [através do Espírito Santo]. Não que o mundo onde esse reflexo está seja, de fato, real. Mas apenas porque o Seu Filho acredita que ele seja real e Ele não poderia separar-Se inteiramente da crença de Seu Filho. Ele não poderia entrar na insanidade de Seu Filho com ele... (T-25.III.2:1-8).

Essas passagens são importantes, porque esclarecem uma fonte de compreensões errôneas para muitos estudantes do Um Curso em Milagres que mantém que Jesus está ensinando que Deus de fato criou o mundo. Eles afirmam que tudo o que o Curso está ensinando é que Ele não criou nossas percepções errôneas sobre ele. Afirmações que contêm a frase “o mundo que vês”, como na passagem acima do manual para professores, não se aplicam simplesmente ao mundo que percebemos através das nossas lentes da mente errada, mas ao invés disso, ao fato de vermos qualquer coisa que seja. Novamente todo o universo físico, o mundo da percepção e da forma, é ilusório e está fora da Mente de Deus.

Portanto, nada que possa ser observado – nada que tenha forma, seja físico, se mova, mude, se deteriore, e finalmente morra – é de Deus. Um Curso em Milagres é inequívoco a esse respeito, que é o motivo pelo qual nós falamos disso como sendo um sistema de pensamento perfeitamente não-dualista: não existem exceções. E então, a aparente majestade do cosmo e a glória percebida da natureza são todas expressões do sistema de pensamento de separação do ego, como vemos nessa maravilhosa passagem do texto:

O que parece ser eterno, tudo isso terá um fim. As estrelas desaparecerão e a noite e o dia não mais existirão. Todas as coisas que vêm e vão, as marés, as estações e as vidas dos homens; todas as coisas que mudam com o tempo, que florescem e murcham, não retornarão. Onde o tempo estabeleceu um fim, não é onde o eterno pode ser encontrado (T-29.VI.2:5-10).

Tentar fazer uma exceção a esse fato é tentar uma transigência com a verdade, exatamente o que o ego quer para estabelecer sua própria existência. Como Jesus afirma no livro de exercícios: “O que é falso é falso, e o que é verdadeiro nunca mudou” (LE-pIi.10.1:1). E, novamente, no texto:

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Como é simples a salvação! Tudo o que ela diz é que o que nunca foi verdadeiro não é verdadeiro agora e nunca o será. O impossível não ocorreu e não pode ter efeitos. E isso é tudo (T-31.I.1:1-3).

Em conclusão, portanto, nenhum aspecto da ilusão pode ser considerado verdade, o que significa que absolutamente nada no universo material veio de Deus, ou até mesmo é reconhecido por Ele. Sua realidade está totalmente fora do mundo dos sonhos.

14) E sobre a beleza e a bondade no mundo?

Seguindo a resposta acima, podemos ver que os chamados aspectos positivos do nosso mundo são igualmente tão ilusórios quanto os negativos. Ambos são aspectos de um universo perceptual dualístico, que só reflete a divisão dualística na mente da Filiação. A famosa afirmação “A Beleza está nos olhos de quem vê” também é aplicável aqui, uma vez que o que alguém considera como beleza, outra pessoa pode achar esteticamente desagradável, e vice e versa. De forma similar, o que uma sociedade julga como boa, outra pode julgar como má, e contra o bem comum. Isso pode ser evidenciado por um estudo cuidadoso da história, sociologia e antropologia cultural. Portanto, usando o critério de eterna imutabilidade para realidade que Jesus usa no Curso, podemos concluir que nada que o mundo considera bonito ou bom é real, e então, não pode ter sido criado por Deus.

Portanto, uma vez que tanto a beleza quanto a bondade são conceitos relativos e, portanto, são ilusórios, devemos seguir a injunção de Jesus de sempre perguntarmos a nós mesmos: “Qual é o significado do que observo?” (T-31.VII.13:5). Em outras palavras, ainda que algo lindo seja ilusório, ele permanece neutro, como tudo o mais no mundo. Dado ao ego, ele serve ao seu propósito profano de reforçar a separação, o especialismo e a culpa. Dado ao Espírito Santo, por outro lado, serve ao propósito santo de nos levar a uma experiência da verdade que jaz além da percepção. Por exemplo, um pôr-do-sol pode reforçar a crença de que posso encontrar a paz e o bem-estar apenas em sua presença, ou ele pode ajudar a me lembrar de que a verdadeira beleza de Cristo é a minha Identidade, e que essa beleza é interna, dentro da minha mente e independente de qualquer coisa fora dele.

15) Uma vez que nós nos tornamos separados, como podemos todos perceber os mesmos atributos da matéria, e concordarmos com suas características básicas e experimentarmos suas leis?

Quando o pensamento de separação pareceu acontecer, foi um único pensamento e uma única mente separada. Conforme o processo do pensamento de separação continuou, culminando com a criação do universo físico, esse único pensamento pareceu se dividir em bilhões e bilhões de fragmentos. Cada um desses fragmentos contém todos os aspectos do pensamento original de separação. Portanto, cada fragmento aparente iria experienciar todos os efeitos desse pensamento ilusório de separação, i.e., todas as chamadas leis da astronomia, física, química, biologia, etc., que são parte inerente da criação do universo. Portanto, o pensamento único do ego aparenta ser muitos. Isso responde pelo paradoxo de, por um lado, as pessoas compartilharem uma percepção comum do mundo, enquanto pelo outro, têm gostos, percepções e experiências muito pessoais e individualizadas. No final, todas as mentes aparentemente separadas são uma – um pensamento de separação, embora cada fragmento pareça ser separado, e acredite que é único e independente dos outros.

16) Qual é a visão de Um Curso em Milagres sobre o tempo?

Da perspectiva do Um Curso em Milagres, o tempo todo já aconteceu, ainda que “pareça ter um futuro ainda desconhecido para nós” (LE-pI.158.3:7). Para entender o Curso, é vital ter um vislumbre da visão do tempo que Jesus está apresentando. De outra forma, será muito difícil

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entender a metafísica e sua aplicação. Como ele afirma claramente nessa passagem do manual para professores:

Para compreender o plano de ensino-aprendizado da salvação, é necessário apreender o conceito de tempo que o curso estabelece (MP-2.2:1-3).

Quando nós aceitamos a crença em nossas mentes (antes que houvesse corpos) que poderíamos ser nosso próprio criador – i.e., auto-criado -, colocamos em movimento uma série de relacionamentos de causa e efeito. A forma mais fácil de entender isso é considerar como se tivéssemos brincado com o pensamento de que poderíamos fazer um oposto ao Céu, um dos efeitos desse pensamento seria o início de um mundo de sonho de tempo e espaço, e todas as formas com que manifestaríamos os efeitos desse pensamento: por exemplo, todos os muitos roteiros de várias assim chamadas existências.

Outra analogia é que um efeito daquele pensamento insano produziu um holograma de sonho de ódio, que tem o tempo e ao espaço como seu modelo. Portanto, é importante reconhecer que uma vez que a mente da Filiação pareceu adormecer, ela brincou com os pensamentos que eram opostos ao que realmente é. Por exemplo:

Realidade ilusão

eternidade tempovida morteimutabilidade mudançaperfeição imperfeição amor ódioausência de limites limitaçãoespírito corpoausência de forma forma

Portanto, todos os efeitos que o pensamento da separação engendrou já aconteceram, assim como a correção do Espírito Santo para cada pensamento errôneo. Como o Curso afirma: “Esse mundo terminou há muito tempo” (T-28.I.1:6). E estamos simplesmente “revendo mentalmente o que já se foi”, pois “o roteiro está escrito” (LE-pI.158.4:5,3). Esses dois “roteiros” podem ser comparados a dois hologramas – os hologramas do ódio e correção – que são mostrados no diagrama abaixo. A parte da mente que escolhe entre esses dois é o tomador de decisões.

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TOMADOR DE DECISÕES

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HOLOGRAMA DO ÓDIO HOLOGRAMA DA CORREÇÃO

MUNDO DO TEMPO, ESPAÇO e ESPECIFICIDADE

Pensamento da mente errada / pensamento da mente certapesadelos de ódio sonhos felizes do perdãoroteiros de separação roteiros de correção do do ego Espírito Santo

A próxima passagem importante do texto explica esses dois hologramas:

Deus deu o Seu Professor para substituir o professor que fizeste, não para entrar em conflito com ele. E o que Ele quer substituir, foi substituído. O tempo não durou senão um instante em tua mente, sem nenhum efeito sobre a eternidade. E assim o todo o tempo é o passado e todas as coisas são exatamente como eram antes que fosse feito o caminho para o nada. O diminuto tic-tac do tempo no qual foi feito o primeiro equívoco e todos eles dentro desse único, também continha a Correção daquele equivoco e de todos os que vieram dentro do primeiro. E naquele instante diminuto, o tempo desapareceu, pois isso foi tudo o que ele jamais foi. Aquilo a que Deus deu uma resposta foi respondido e desapareceu (T-26.V.3; grifos nossos).

A compreensão do Curso sobre o tempo e o espaço está resumida na seguinte passagem do texto:

Pois o tempo e o espaço são uma ilusão única, que toma formas diferentes. Se foi projetada além da tua mente, pensas nela como tempo. Quanto mais é trazida para perto de onde está a tua mente, tanto mais pensas nela em termos de espaço (T-26.VIII.1:5-9).

Essa “ilusão única” é a crença na separação de Deus, e é esse pensamento que está sob todo o universo físico, que parece durar bilhões de anos, e ter um número infinito de quilômetros. No entanto, uma vez que idéias não deixam sua fonte (LE-pI.167.3:6-7), o aparentemente vasto universo ainda é a manifestação desse único e simples pensamento, sempre permanecendo dentro da mente dividida que o concebeu em sua loucura.

Ele é uma parte integral da estratégia do ego para manter esse pensamento de separação protegido – “a diminuta e louca idéia” que nunca realmente aconteceu -, projetando-o da mente para que o Filho nunca pudesse desfazê-lo, por voltar-se para a presença do Espírito Santo Que também está na sua mente. Se o Filho se esquece de que tem uma mente, e, portanto, não está mais em contato com a decisão da sua mente de ser separado, então, não existe maneira de jamais poder mudar sua mente. Esse é o objetivo último da trama do ego para sustentar sua própria existência.

Portanto, quando o pensamento de separação é projetado “para longe” da mente do Filho, ele é expresso na dimensão do tempo: O passado, o aparente presente, e o futuro realmente parecem refletir a imensa brecha de bilhões de anos que o ego quer introduzir entre a decisão da mente de se separar de Deus e do Espírito Santo, e a experiência do Filho como estando em um corpo. Quando o pensamento de separação é experienciado entre um indivíduo e outra pessoa – i.e., próximo da sua experiência de si mesmo – então, é conhecido como espaço, a brecha física que experienciamos entre nós mesmos e os outros em nossos relacionamentos especiais. Para dizer de outra forma, o tempo (e, portanto, o espaço também) foi feito especificamente pelo ego para manter a causa (a mente e seus pensamentos) e o efeito (nossa dor e sofrimento) separados. Portanto, agora existe uma brecha imensa em nossa experiência entre a decisão da mente de se separar, e os roteiros múltiplos de sonhos diferentes, nos quais experienciamos dor e sofrimento como figuras nesses sonhos. Somente quando a causa e o efeito são reunidos e, portanto, desfeitos, pode haver cura verdadeira; i.e., quando a figura que chamo de mim mesmo desperta do sonho da separação e aceita a Expiação.

Em conclusão, portanto, podemos entender que o mundo do tempo (e também do espaço) não é nada mais do que a projeção e expressão na forma – fora da mente do Filho – do pensamento de separação que permanece oculto dentro da mente do Filho, inteligentemente oculto por trás da defesa do tempo e do espaço.

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17) A mente egóica pode ser igualada ao cérebro humano?

Não. A mente é não-física e intangível; i.e., ela não pode ser dissecada em um laboratório, fotografada com uma câmera, ou analisada por qualquer método empírico. O cérebro, por outro lado, é um órgão físico que é muito tangível, e pode ser dissecado e estudado facilmente em um laboratório. Ele é o “computador” que parece dirigir o corpo, organizando os dados sensórios que entram, em padrões aparentemente significativos, e dirigindo todos os sistemas e funções corporais para se ajustarem ao lugar do corpo no universo físico. Na verdade, no entanto, é a mente que é o programador e dirige o cérebro a funcionar como ela vê que é mais adequado, assim como um computador faz o que o operador lhe diz para fazer. A mente é o comando central do qual todas as diretivas emanam, conforme elas instruem o cérebro a estabelecer como uma realidade experimental, o mundo do tempo e do espaço que já terminou, e que na verdade jamais existiu!

Em e por si mesmo, portanto, o cérebro não pode fazer nada, porque ele não é nada além do órgão receptor da mente. Essa crença insana de que o cérebro pode funcionar independentemente da mente – que é crucial para a estratégia do ego de proteger a mente dividida e, portanto a si mesma – está refletida nessa passagem do livro de exercícios:

... acreditas que o cérebro do corpo pode pensar. Se apenas compreendesses a natureza do pensamento, poderias apenas rir dessa idéia insana. É como se pensasses que tens nas mãos o fósforo que ilumina o sol e lhe dá todo o calor; ou que manténs o mundo dentro da tua mão, bem preso, até que o deixes ir. No entanto, isso não é mais tolo do que acreditar que os olhos do corpo podem ver e o cérebro pensar (LE-pI.92.2).

O relacionamento do cérebro com a mente, do efeito com a causa, é afirmado aqui, no texto:

O cérebro não pode interpretar o que a tua visão vê [baseado na razão, ou na Presença do Espírito Santo na mente]... O cérebro interpreta em função do corpo, do qual ele faz parte (T-22.I.2:8-9,10).

Claramente, então, é a mente que faz a verdadeira interpretação, não o cérebro. Isso é confirmado nessa passagem do manual para professores, onde a causa da percepção é vista como sendo a mente, não os olhos nem, por implicação, o cérebro. Essa passagem, incidentalmente, não é encontrada na primeira edição do Curso:

No entanto, com toda a certeza é a mente que julga o que os olhos contemplam. É a mente que interpreta as mensagens dos olhos e lhes dá “significado”... A sua hierarquia de valores é projetada para o que está fora, e ela envia os olhos do corpo para achá-la... Contudo, a percepção não se baseia nas mensagens que eles trazem. Só a mente avalia as suas mensagens e, assim sendo, só a mente é responsável pelo que é visto. Só ela decide se o que é visto é real ou ilusório, desejável ou indesejável, prazeroso ou doloroso (MP-8.3:2-4,6-8,9-13).

18) Onde fica a mente?

A mente, como ensina o Um Curso em Milagres e como acabamos de ver, é incorpórea e imaterial, ao contrário do cérebro. Portanto, ela é invisível e intangível. Uma vez que ela é também não-espacial e atemporal, é impossível responder a essa pergunta, que repousa na presunção de que o tempo e o espaço são reais. A própria palavra onde tem a conotação de uma dimensão espacial, que é desconhecida para a mente. Portanto, responder a essa questão seria negar a própria natureza da mente, e reforçar a crença de que o corpo é real e independente da mente que o projetou e que é a sua causa.

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19) Como alguém pode acessar a mente para que ela possa ser modificada?

Em certo sentido, o propósito do Um Curso em Milagres é nos ajudar a fazer apenas isso. A pedra fundamental na qual se assenta o sistema de pensamento do ego é nossa culpa não perdoada. Ela nos enraíza em nossa experiência física e psicológica como um corpo e uma personalidade individual. Portanto, o objetivo do ego é “proteger” a culpa em nossas mentes para que não seja desfeita. Assim como é essa culpa em nossas mentes que é o programador das nossas vidas individuais, também é essa culpa que precisa ser desfeita através do perdão, o ensinamento central do Curso.

Conforme o perdão remove essa culpa inconsciente e nós passamos da mente errada para a mente certa, permitimos que o Espírito Santo seja nosso programador. Portanto, Seu Amor e paz servem de mediadores para nossas mentes e se tornam nossos guias, ao invés do sistema de pensamento de medo e ódio do ego. O ego sempre luta para nos fazer adotar algum novo sistema que ele inventou, tais como técnicas contemporâneas de auto-ajuda, para reprogramarmos nossas “mentes”, para que nossos cérebros então funcionem para “consertarem” e reprogramarem nossas vidas. Dessa forma, nós nos tornamos ainda mais emaranhados no aperto do sistema de pensamento do ego, ainda que não estejamos conscientes de que é isso o que estamos fazendo. No entanto, deveríamos notar que foi apenas essa crença em que somos auto-criados e estamos por conta própria, e poderíamos conseguir coisas por nós mesmos, que levou à separação para início de conversa. Além disso, todo pensamento teria isso como seu padrão básico e objetivo.

O importante princípio do Curso de “uma pequena disponibilidade” para pedirmos ajuda ao Espírito Santo para que nossas percepções sobre nós mesmos e os outros sejam corrigidas, nos imbui com um senso de humildade. Isso culmina na compreensão de que não conhecemos nossos melhores interesses, não importando o que o sistema de pensamento do ego proponha ou nos ensine. Portanto, é a responsabilidade de cada um reconhecer que para nos tornarmos direcionados pela mente certa e permanecermos dessa forma, é preciso sempre acessar o Espírito Santo.

Ainda mais específica é a determinação do Um Curso em Milagres para que seus estudantes olhem para seus egos sem julgamento. Essa é a forma de acessar a mente. Se os estudantes, com o amor de Jesus ao seu lado, puderem olhar sem julgamento e culpa para seus egos em ação, então, quem estará olhando? Não pode ser o próprio ego, mas a mente – ou melhor, o tomador de decisões em nossas mentes – que não está no corpo e, portanto, novamente, não é o ego. A seguinte passagem do texto provê uma descrição muito clara desse processo e o quanto Jesus acredita que é fundamental praticar seu Curso:

Ninguém pode escapar de ilusões a não ser que olhe para elas, pois não encará-las é a forma de protegê-las. Não há necessidade de se acuar diante de ilusões, pois elas não podem ser perigosas. Nós estamos prontos para olhar mais detalhadamente o sistema de pensamento do ego, porque juntos temos a lâmpada que o dissipará e já que reconheces que não o queres, tens que estar pronto. Vamos ser muito calmos ao fazer isso, pois estamos apenas procurando honestamente a verdade. A “dinâmica” do ego será a nossa lição por algum tempo, pois precisamos em primeiro lugar olhar para isso, para depois ver além, já que fizeste com que fosse real. Nós vamos desfazer esse erro juntos em quietude e então olhar além dele para a verdade.O que é a cura senão a remoção de tudo aqui que se interpõe no caminho do conhecimento? E de que outra forma pode alguém desfazer ilusões, a não ser olhando diretamente para elas, sem protegê-las?(T-11.V.1:1; 2:1-4).

E nessa sentença sucinta, também do texto, encontramos o objetivo desse processo claramente enunciado:

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Essa é uma época crucial nesse curso, pois aqui a separação entre tu e o ego tem que se fazer completa (T-22.II.6:1-2).

O “tu” é o tomador de decisões, a parte das nossas mentes divididas que escolhe, que agora tirou sua identificação do ego (a mente errada) e a passou para o Espírito Santo (a mente certa).

20) O que significa Filiação, e quem ou o que está incluído?

O termo Filiação, ou Filho de Deus no Curso, é usado de duas formas: para denotar os estados de realidade e ilusão. No Céu, Filiação se refere à criação única de Deus, o Cristo Que é o Filho único de Deus. Esse Filho, como já vimos, é totalmente unificado e em unidade Consigo Mesmo e com Seu Criador. No nível do sonho, Filiação se refere a todas as partes da mente única dividida que acreditou que poderia conquistar a separação, na qual cada fragmento parece ter uma forma e “vida” por sua própria conta. Portanto, os chamados reinos animal, vegetal e mineral são tão parte da Filiação quanto o homo sapiens. Distinções do que é animado e inanimado foram arbitrariamente introduzidas pelo homo sapiens seguindo os ensinamentos do ego, para serem capazes de categorizar e controlar um mundo ilusório e terem “domínio sobre cada coisa viva” (Genesis 1:26,8). Tal crença é o que Um Curso em Milagres chama de primeira lei do caos, de que existe uma “hierarquia de ilusões” (T-23.II.2:3), na qual alguns aspectos da ilusão são considerados como mais elevados , evoluídos, ou mais inclinados espiritualmente do que outros, como quando os cientistas falam sobre “a corrente da existência”, por exemplo, na qual, por implicação, existe uma classe de coisas vivas e inanimadas. De fato, no entanto, todas as formas de “vida” são a mesma, porque todas são iguais no fato de serem projeções do pensamento do ego de uma vida separada de Deus. Essa é a defesa contra o pensamento (ou memória) da Vida que é mantida pelo Espírito Santo em nossas mentes para todos os fragmentos aparentes. É isso o que está dito na seguinte passagem, dada na forma de uma oração de Jesus a Deus, nosso Pai:

Graças Te dou, Pai, sabendo que virás para fechar cada pequena brecha que existe entre os pedaços quebrados do Teu Filho santo. A Tua santidade, completa e perfeita, está em cada um deles. E eles estão unidos porque o que está em um está em todos [através do Espírito Santo]. Como é santo o menor dos grãos de areia quando ele é reconhecido com parte do retrato completo do Filho de Deus! As formas que os pedaços quebrados parecem tomar nada significam. O todo está em cada um. E cada aspecto do Filho de Deus é exatamente o mesmo que qualquer outra parte (T-28.IV.9; grifos nossos).

O pensamento do Filho separado na mente, portanto, não é uma forma, mas conteúdo. E esse é o pensamento de que o único poderia se separar do Criador, e ser independente Dele. A forma que esse pensamento assume – animada ou inanimada, um organismos de uma única célula ou um mamífero – é irrelevante, porque o pensamento permanece o mesmo. E além da cada pensamento está o Pensamento de Deus, mantido em segurança pelo Espírito Santo até o instante em que retornarmos a ele.

21) Um Curso em Milagres ensina que não existe morte. Isso pode ser entendido como significando que a imortalidade física é possível?

Absolutamente não! O Curso ensina que não existe morte porque o espírito é imortal. A lição do livro de exercícios “Eu sou como Deus me criou” aparece três vezes, e também é o tema central de uma revisão. Isso esclarece a importância do conceito de que apenas o que Deus criou (Cristo) é eterno, e de que esse mundo de corpos – tendo sido feito como um oposto ao

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Céu – teria como compromisso tornar a imortalidade impossível. Como está afirmado no início do texto sobre a inabilidade do ego de atingir a “eternidade”:

O ego pensa que é uma vantagem não se comprometer com coisa alguma que seja eterna, porque o eterno não pode deixar de vir de Deus. A qualidade do que é eterno é a única função que o ego tem tentado desenvolver, mas sistematicamente tem falhado em conseguir. O ego transige com o tema do eterno exatamente como faz com todos os temas que, de alguma maneira, digam respeito à questão real (T-4.V.6:1-7).

Em acréscimo, corpos existem apenas nos sonhos – as alucinações que chamamos de vida -, e, portanto, a duração dessa “vida” não tem absolutamente nada a ver com a realidade, sem falar na vida eterna do espírito.

Podemos ver que o próprio termo imortalidade física é um oximoro, uma contradição que reflete uma compreensão errônea da teologia do Um Curso em Milagres, e obscurece a diferença crucial entre realidade e ilusão. O conceito é, portanto, mais uma das tramóias do ego com a qual muitas mentes separadas são indulgentes, dessa forma tentando perverter o verdadeiro significado do Curso, tornando real o sistema de pensamento do ego e seu mundo.

O diabo pode citar a escritura para seus próprios propósitos, como Shakespeare comentou em “O Mercador de Veneza”, e infelizmente, os egos dos estudantes do Um Curso em Milagres podem fazer o mesmo truque. Se os estudantes desejarem apoiar sua própria crença de que eles (e seus corpos) podem ser imortais, podem facilmente desvirtuar afirmações do Curso, tirando-as do contexto, para apoiar esse desejo. Por exemplo, em “A atração pela morte”, o terceiro obstáculo à paz, no Capítulo 19 do texto, existe a seguinte afirmação, sob a subseção intitulada “O corpo incorruptível”:

Podes te dedicar a outra coisa que manteria o corpo incorruptível e perfeito na medida em que é usado para o teu propósito santo. O corpo não morre, assim como não pode sentir... A morte, se fosse verdadeira, seria o rompimento final e completo da comunicação que é a meta do ego (T-19.IV-C.5:1-3; 6:7-8).

E outra sentença que tem sido usada fora de contexto para provar que o corpo pode ser imortal é do manual para professores, a seção intitulada “O que é a morte?”. Falamos apenas sobre uma linha aqui, e a passagem inteira será citada abaixo, na próxima pergunta:

Mas o que nasce de Deus e ainda pode morrer? (MP-27.6:8).

E então, os estudantes vão falsamente concluir que uma vez que eles – como indivíduos físicos e psicológicos – foram criados pelo Deus eterno como Ele Mesmo, jamais podem morrer. Essa então se torna a base lógica para afirmar a validade da imortalidade física. O equívoco, obviamente, repousa em acreditar que Deus realmente, de fato, os criou como indivíduos, e como corpos além disso. O que realmente “nasce de Deus” é Cristo, nosso Ser que é apenas espírito, e é o Ser que é eterno e nunca pode morrer. O falso ser que tem uma identidade física e psicológica permanece dentro do sonho, onde existe apenas a ilusão do nascimento, vida e morte.

Alguns estudantes, além disso, usam as linhas acima para provarem que Jesus está defendendo a imortalidade física, afirmando que o corpo é incorruptível. No entanto, eles deixaram de entender o contexto da passagem acima (e título da subseção), eliminando a citação completa. A razão pela qual “o corpo não morre, assim como ele não pode sentir” e que a morte não é verdadeira, é que o corpo não existe verdadeiramente. O corpo, na realidade, não morre – uma seqüência sobre a qual o Deus da vida em si mesmo nada sabe. Além disso, a morte do corpo pressupõe que primeiro existiu vida; de outra forma, o conceito não tem significado. Como Jesus também afirma nessa passagem:

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Ele [o corpo] nada faz. Por si mesmo, não é corruptível nem incorruptível. Não é nada. É o resultado de uma diminuta idéia louca de corrupção que pode ser corrigida (T-19.IV-C.5:3-6).

O que é nada, portanto, não vive (e não pode viver), e, conseqüentemente, não morre (e não pode morrer) também.

No texto, encontramos uma passagem ainda mais estimulante que descreve a absoluta falta de vida do corpo, similar a uma marionete sem vida que meramente encena os desejos do seu mestre, o titereiro, o mestre do corpo, é claro, sendo a mente:

Quem pune o corpo é insano. Pois aqui a pequena brecha é vista e apesar disso, não está aqui. O corpo não julgou a si mesmo, e também não fez com que ele próprio fosse o que não é. Ele não busca fazer da dor uma alegria, nem procura prazer duradouro no pó. Ele não te diz qual é o seu propósito e não é capaz de compreender para que serve. Ele não faz vítimas porque não tem vontade, não tem preferências e não tem dúvidas. Ele não tenta imaginar o que é. E, portanto, não tem necessidade de ser competitivo. Ele pode ser vitimizado, mas não pode, ele próprio, sentir-se vítima. Ele não aceita nenhum papel, mas faz apenas o que lhe é dito [pela mente], sem ataque.... é incapaz de ver... não pode ouvir... ele não tem nenhum sentimento. Ele se comporta como tu [o tomador de decisões na mente] queres, mas nunca faz a escolha. Ele não nasce e não morre. Ele não pode fazer outra coisa senão seguir sem objetivo, o caminho no qual foi colocado (T-28.VI.1; 2:1-7).

Mais uma vez, dentro do sonho e separação do Filho, o corpo realmente parece nascer, viver e morrer, mas isso é apenas no mundo da ilusão. Pois apenas na realidade do espírito existe vida verdadeira ou existência, e isso não tem nada a ver com a existência física, que é do ego. É por isso que no início do texto, Jesus contrasta a especificidade da existência ilusória com o abstrato da realidade de ser (T-4.VII.4,5).

Portanto, concluímos que Um Curso em Milagres é inequívoco em seu ensinamento de que apenas o espírito é imortal. Acreditar que podemos existir em qualquer outro estado – significando o físico – é seguir as tentativas do ego de transformar o sonho da separação em realidade, na qual nossa identidade individual está assegurada, fazendo-nos acreditar na ilusão que ele chama de vida. E essa tentativa, naturalmente, é diametralmente oposta ao propósito último do Curso, que é nos ajudar a despertar do sonho de individualidade para nossa verdadeira Identidade como Cristo, o Filho único e imortal de Deus.

22) O que acontece quando morremos, e para onde vamos? As experiências de quase-morte que muitas pessoas relatam são relevantes para os estudantes do Um Curso em Milagres?

A “transição” para a morte pode ser comparada ao seguinte: 1) passar de um sonho adormecido para outro; 2) completar a visão de um vídeo tape e começar outro; 3) mudar os canais do aparelho de televisão para outro, no final do programa, ou até mesmo antes de ele terminar se assim o escolhermos; 4) deixar um quarto e ir para outro, como era ensinando pelo grande sábio indiano do século XIX, Ramakrishna. Uma vez que a consciência é inerente à mente dividida, e não se encontra no cérebro ou no corpo (embora seja experienciada aqui), a morte física é apenas uma ilusão do fim do estado mental de alguém, que é retido na morte. Apesar desse pensamento de separação estar sendo projetado no corpo, ele ainda permanece dentro da sua fonte: a mente errada. Portanto, não se vai a lugar algum na morte. Retornando à analogia da mudança de canais de televisão, a pessoa permanece fisicamente na poltrona da sala de estar, ainda que sua atenção tenha mudado do local visto no canal de televisão para o outro.

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Além disso, é importante perceber que o que chamamos de morte não traz um estado de iluminação ou paz. Se a pessoa não completar a liberação do sistema de pensamento do ego inteiramente, liberando a mente errada, a iluminação ou a ressurreição não pode ser atingida. De fato, Jesus nos avisa especificamente contra uma visão escapista da morte:

Entre o que poderias escolher senão entre a vida ou a morte, o despertar ou o dormir, a paz ou a guerra, os teus sonhos ou a tua realidade? Existe um risco de pensares que a morte é paz, porque o mundo equipara o corpo ao Ser Que Deus criou. No entanto, uma coisa nunca pode ser o seu oposto. E a morte é o oposto da paz, porque é o oposto da vida. E a vida é paz. Desperta [o significado da ressurreição] e esquece todos os pensamentos de morte, e descobrirás que tens a paz de Deus (T-27.VII.10:1-8; grifos nossos).

Uma variação recente dessa crença de que a morte física traz liberdade ou liberação do corpo é encontrada nas experiências de “quase-morte” de muitas pessoas, e questões sobre essas experiências freqüentemente são levantadas durante nossas aulas ou workshops. Os relatos geralmente incluem a experiência da pessoa de deixar o corpo e prosseguir através de um túnel escuro até um círculo ou um ser de luz, muitas vezes identificado como Jesus. Essa presença toda amorosa e gentil, algumas vezes revê a vida com a pessoa, e então a “envia” de volta para completar lições, aceitar certas responsabilidades ou assumir uma importante função (sempre uma das favoritas entre as necessidades de especialismo do ego).

Não cabe a ninguém julgar essas experiências de quase-morte, e seria tolo negar os efeitos muito positivos que essas experiências têm para as pessoas. No entanto, podemos comentar sobre a “teologia” dessas experiências e as conclusões tiradas a partir delas, sobre o significado da vida, morte e a assim chamada pós-vida, ou “vida depois da vida”.

O leitor precisa manter em mente que Um Curso em Milagres afirma muito claramente que a mente não está no corpo, embora certamente pareça estar. Por exemplo, no livro de exercícios:

A mente pode pensar que dorme, mas isso é tudo. Não pode mudar o que é o seu estado desperto. Não pode fazer um corpo, nem habitar no interior de um corpo. Aquilo que é alheio à mente não existe, porque não tem fonte...O que parece ser o oposto da vida está apenas dormindo. Quando a mente opta por ser o que não é [o corpo], e por assumir um poder alheio que não tem, um estado estranho [o corpo] no qual não pode entrar, ou uma condição falsa que não esteja dentro da Sua Fonte, ela apenas parece ir dormir um pouco. Sonha com o tempo, um intervalo em que o que parece acontecer nunca ocorreu, em que as mudanças forjadas são sem substancia e em que todos os eventos não estão em parte alguma. Quando a mente desperta, apenas continua tal como sempre foi (LE-pI.167.6:1-4; 9; grifos nossos).

E, de “Além do Corpo”, no texto:

O lar da vingança [o corpo] não é o teu, o lugar que separaste para abrigar o teu ódio não é uma prisão, mas uma ilusão de ti mesmo. O corpo é um limite imposto à comunicação universal que é uma propriedade eterna da mente. Mas a comunicação é interna. A mente alcança a si mesma. Ela não é feita de partes diferentes que alcançam umas às outras. Ela não sai para o lado de fora. Dentro de si mesma não tem limites e nada há fora dela. Ela abrange todas as coisas. Abrange inteiramente a ti, tu dentro dela e ela dentro de ti. Não há nenhuma outra coisa, em lugar nenhum ou tempo algum (T-18.VI.8).

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Portanto, quando consideramos tais experiências de quase-morte a partir da perspectiva do Um Curso em Milagres, podemos ver que elas não fazem sentido no nível da forma. Como alguém pode deixar o próprio corpo, viajar através de um túnel, e saudar uma grande luz, se a pessoa nunca esteve dentro do corpo para início de conversa? Lembrem-se de que o ser permanece na mente e não no corpo, assim como um ser sonhador não está no sonho, embora partes desse ser estejam refletidas lá. Novamente, isso não é para negar ou invalidar a experiência pessoal, mas é para dizer que, apesar do quanto uma experiência possa ser válida para a pessoa, a interpretação é puramente subjetiva e não deveria ser tomada pela verdade “objetiva”. Por exemplo, todos experienciam o sol nascendo e se pondo todos os dias, e muitas pessoas relatam muitos sentimentos significativos estéticos e espirituais associados ao nascer e pôr-do-sol. E, no entanto, sabemos cientificamente que o sol não nasce ou se põe, mas que, ao invés disso, é a terra que faz o movimento: girando ao redor do seu eixo, e ao redor do sol. A experiência é contrária à verdadeira explicação. De forma similar, todos nós experienciamos a terra como plana ao vivermos nossas vidas diárias, ainda que compreendamos intelectualmente que ela é redonda. E então, a experiência de uma pessoa sobre a ocorrência da quase-morte, ou de um lugar para o qual se vai após a morte (ou próximo da morte) não quer dizer necessariamente que o que é compreendido como a experiência é o que realmente é. E, novamente, quando olhamos para essas experiências através das lentes do Um Curso em Milagres, as entendemos de forma bem diferente: expressões de perdão que são projetadas da mente sobre o corpo e seu mundo de vida, morte e quase-morte.

Como já vimos, portanto, não pode haver, na verdade, uma experiência fora do corpo, uma vez que a mente nunca está no corpo para início de conversa. E então, a mente não pode deixar o corpo, viajar através de um túnel e encontrar-se com Jesus depois de ter deixado o corpo. Além disso, existe um perigo em acreditar nisso, porque sugere fortemente – assim como fazem muitas pessoas que tiveram esse tipo de experiência – que essa paz, alegria e felicidade só podem vir a uma pessoa depois de ter “morrido” e deixado o corpo. Todo o foco do Um Curso em Milagres está em que as pessoas escolham e tenham um instante santo nesse exato instante, escolhendo Jesus ou o Espírito Santo ao invés do ego. Uma pessoa não tem que morrer para ir para o Céu, uma vez que o Céu é uma consciência da perfeita Unicidade, dentro da mente, e nada mais além disso. A experiência maravilhosa do perdão que é freqüentemente relatada pode ser alcançada em um instante santo, novamente, sem ter deixado o corpo, atravessado um túnel, etc. Manter experiências de quase-morte como algo a ser idealizado e buscado (como vemos retratado no popular filme Flatliners) realmente serve bem à estratégia fundamental do ego de primeiro tornar o corpo real, e então transformá-lo em algo repulsivo. Isso estabelece uma situação na qual as pessoas iriam desejar se libertarem da sua prisão de escuridão, ansiando escapar para a luz incorpórea. E o tempo todo, o sistema de pensamento de separação, culpa e especialismo do ego se aninha confortavelmente na mente, protegido pela crença de que realmente existe um corpo que é real, e que verdadeiramente existe no mundo físico.

Portanto, acreditar na realidade dessas experiências é a própria transigência com a verdade – dando à luz e à escuridão poder igual e realidade – contra a qual Jesus nos previne em Um Curso em Milagres. Nós vemos uma clara afirmação dessa prevenção na seção sobre a morte, no manual para professores, e citamos essa passagem extremamente importante agora. Ela começa com uma referência à crença religiosa padrão de que depois da morte, a alma está livre para voltar para Deus, ou para continuar sua jornada, como na doutrina católica do purgatório. No entanto, o interesse contemporâneo nas experiências de quase-morte, como acabamos de ver, cai na mesma categoria de não reconhecer a natureza ilusória de todo o universo físico e da existência individual – corpo, mente e o que é erroneamente chamado de “espírito”:

A curiosa crença segundo a qual parte das coisas que morrem pode continuar vivendo à parte daquilo que vai morrer, não proclama um Deus amoroso nem restabelece qualquer terreno para a confiança. Se a morte é real para o que quer

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que seja, não há vida. A morte nega a vida. Mas se há realidade na vida, a morte é negada. Aqui não é possível nenhuma transigência. Ou existe um deus do medo, ou um Deus do Amor. O mundo tenta fazer mil transigências e tentará fazer outras mil. Nenhuma pode ser aceitável para os professores de Deus, pois nenhuma seria aceitável para Deus. Ele não fez a morte porque Ele não fez o medo. Ambos são igualmente sem significado para Ele.A “realidade” da morte está firmemente enraizada na crença segundo a qual o Filho de Deus é um corpo. E se Deus tivesse criado corpos, a morte certamente seria real. Mas Deus não seria amoroso. Não há nenhum ponto no qual o contraste entre a percepção do mundo real e a do mundo das ilusões se torne mais evidente...“E a última a ser vencida será a morte”. [a famosa afirmação de São Paulo da sua primeira carta aos Coríntios, 15:26]. É claro! Sem a idéia da morte não há mundo. Todos os sonhos terminarão com esse. Essa é a meta final da salvação, o fim de todas as ilusões. E na morte nascem todas as ilusões. O que pode nascer da morte e ainda ter vida? Mas o que pode nascer de Deus e ainda morrer? As inconsistências, as transigências e os rituais que o mundo fomenta nas suas tentativas vãs de se agarrar à morte e ainda pensar que o amor é real, tudo isso é mágica irracional, ineficaz e sem significado. Deus é, e Nele todas as coisas criadas têm que ser eternas. Não vês que de outro modo há um oposto para Ele e o medo seria tão real quanto o amor?Professor de Deus, tua única atribuição poderia ser colocada assim: não aceites nenhuma transigência na qual a morte desempenhe um papel. Não acredites na crueldade, nem permitas que o ataque esconda de ti a verdade. O que parece morrer foi apenas percebido equivocadamente e levado à ilusão. Agora vem a ser tarefa tua fazer com que a ilusão seja levada à verdade. Sê firme apenas nisso: não te enganes com a “realidade” de nenhuma forma em mutação. A verdade nem se move, nem vacila, nem naufraga na morte e na dissolução. E qual é o fim da morte? Nenhum senão esse: o reconhecimento de que o Filho de Deus é sem culpa agora e para sempre. Nada além disso. Mas não te permitas esquecer que não é menos do que isso (MP-27.4; 5:1-6; 6; 7; grifos nossos).

Em conclusão, portanto, podemos entender que nada que pareça viver e depois morrer, que mude, cresça e subseqüentemente se deteriore, ou que pareça ser separado de outros, pode ser de Deus e, portanto não pode ser real. E então, todas as categorias relacionadas a corpos de qualquer forma – incluindo a morte e a quase-morte – não têm significado verdadeiro porque realmente não existem. Seu único significado dentro da ilusão vem de servir como uma sala de aula na qual aprendemos a lição de discernir entre o significado e a falta de significado.

23) Iluminação ou ressurreição significam liberdade do corpo?

Não, porque a mente não está aprisionada no corpo, mas apenas em sua própria decisão de se identificar com o sistema de pensamento do ego; portanto, iluminação pode ser compreendida como despertar do sonho, um processo que acontece apenas no nível da mente. Como o Curso diz: “A iluminação é apenas um reconhecimento, não é uma mudança em absoluto” (LE-pI.188.1:4). Portanto, ela pode ser compreendida como a aceitação de nós mesmos como Deus nos criou, e o reconhecimento de que nenhuma mudança é necessária porque na verdade, a separação de Deus nunca aconteceu. Esse reconhecimento é o que Um Curso em Milagres quer dizer com aceitar a Expiação para si mesmo. Além disso, a definição do Curso de ressurreição é o despertar do sonho de morte do ego, como é visto na resposta do manual à questão, “O que é ressurreição?”, onde o processo de “vencer” a morte é claramente alocado na mente, uma vez que a morte não tem nada a ver com o corpo:

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Muito simplesmente, a ressurreição é a superação ou domínio da morte. É um novo despertar ou um renascimento, uma mudança da mente a respeito do significado do mundo. É a aceitação da interpretação do Espírito Santo sobre o propósito do mundo, a aceitação da Expiação para si mesmo. É o fim dos sonhos de miséria e a feliz consciência do sonho final do Espírito Santo...A ressurreição é a negação da morte, sendo a afirmação da vida. Assim, todo o pensamento do mundo é inteiramente revertido (MP-28.1:1-6; 2:1-3; grifos nossos).

E, de “A mensagem da crucificação”, no Capítulo 6 do texto, onde Jesus fala de si mesmo e da sua importância para nós como um modelo, lemos:

A tua ressurreição é o teu re-despertar. Eu sou o modelo para o renascimento, mas o renascimento em si é apenas o alvorecer na tua mente do que já está presente nela. O próprio Deus o colocou aí e, portanto, ele é verdadeiro para sempre (T-6.I.7:1-4; grifos nossos).

A ênfase que essas duas passagens colocam na mente claramente aponta para ela, e não para o corpo como o lugar da ressurreição (ou o processo do perdão). É a mente dividida que é a fonte de todos os sonhos, e, portanto, é apenas ali que a correção é necessária e pode ser realmente eficaz.

Portanto, alguém pode ser iluminado e ainda ter a aparência de permanecer no corpo, como Jesus fez, por exemplo, estando plenamente consciente de que sua realidade estava fora do sonho de corpos. Ressurreição, portanto, apenas significa liberdade da crença de que realmente existimos dentro de um corpo e que somos um corpo. Isso é a culminação do processo, mais uma vez, que acontece apenas no nível da mente, porque o sonho de separação do ego só existe ali, e em nenhum outro lugar. Idéias sempre permanecem dentro da sua fonte, como Jesus freqüentemente ensina no Curso, e então, a idéia de um mundo separado e um corpo nunca deixou sua fonte na mente dividida.

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Capítulo 3

APLICAÇÃO E PRÁTICA DOUM CURSO EM MILAGRES

24) Se tudo isso é um sonho ou uma ilusão, ou um roteiro que já está escrito, que diferença faz o que faço com minha vida?

Enquanto em um nível Um Curso em Milagres ensina que esse mundo é uma ilusão, e que na verdade nossas experiências aqui são alucinações, em outro nível, Jesus nos assegura que “é quase impossível negar sua existência nesse mundo. Aqueles que o fazem estão engajados em uma forma particularmente indigna de negação” (T-2.IV.3:10-11). Uma vez que foram nossas mentes erradas que escreveram o roteiro das nossas muitas “existências” nesse holograma ilusório de ódio, segue-se a isso que o propósito do ego seria reforçar a crença na aparente realidade da nossa experiência aqui, o que reflete nossa crença na realidade da nossa separação de Deus. E nada serve a esse propósito melhor do que a defesa da negação, que torna os pensamentos de culpa e medo tão inaceitavelmente reais que eles precisam ser reprimidos e nunca mais examinados. Isso assegura que o pensamento de separação permaneça real dentro da mente dividida, “a salvo e protegido” do Espírito Santo.

Um Curso em Milagres nos apresenta uma escolha entre duas formas de viver nesse mundo de sonho, que é a única escolha verdadeira que nos resta dentro do sonho. Como já deixamos implícito, o Curso ensina que nós temos uma mente dividida que é realmente tri-partida em sua estrutura: 1) uma mente errada que mantém o sistema de pensamento do ego no lugar, e ainda que pareça que temos escolhas dentro da mente errada, Jesus inequivocamente afirma que acreditar que existe uma escolha no sistema de pensamento do ego é ilusório e auto-enganoso; 2) uma mente certa que é o lar do Espírito Santo, e mantém uma correção para cada pensamento ou criação errônea do sistema de pensamento do ego; e 3) a parte da mente que escolhe entre o ego e o Espírito Santo, a qual nos referimos como o tomador de decisões. Portanto, nossa única escolha verdadeira e liberdade dentro do sonho ilusório de separação é escolhermos nossas mentes certas, permitindo que nossas mentes erradas sejam desfeitas. Devemos voltar a esse ponto importante em outra pergunta.

Conseqüentemente, Um Curso em Milagres nos instrui de que o único propósito que o mundo mantém é o de que escolhamos o roteiro do perdão. O Espírito Santo nos oferece uma correção do pesadelo de culpa e ataque do ego, no qual o mundo se torna uma sala de aula na qual podemos aprender as lições do perdão. Dessa forma, a culpa que fizemos, que no final das contas trouxe a criação do corpo e do mundo, é desfeita. Simplesmente cedendo às fantasias do ego sob a justificativa de que “Não importa de qualquer forma” tornaria esses desejos reais (caso contrário, por que ceder a elas?), e enraíza a pessoa ainda mais profundamente no sonho de culpa do ego. Tal auto-indulgência poderia incluir encenar os desejos reprimidos como assassinato, roubo, fraude, decepção, raiva, exploração sexual, depressão e até mesmo suicídio. E, portanto, a questão acima – “Que diferença faz o que faço com a minha vida?” – pode ser compreendida de uma perspectiva totalmente diferente. Essa é uma perspectiva que dá grande significado às nossas vidas, pois afirma: “Tenho que fazer uma escolha: que sonho escolho seguir; a qual sonho serei leal?”.

Em resumo, então, vemos que no nível metafísico, tudo o que fazemos – sem mencionar nossa identidade pessoal – é uma ilusão. No entanto, no nível do sonho, onde nós certamente acreditamos estar, nossas vidas fazem uma tremenda diferença; não tanto em termos do que fazemos, mas com quem fazemos. Apenas por escolhermos Jesus ou o Espírito Santo como nosso professor, guia e amigo, podemos desfazer a causa de permanecer adormecidos e tendo sonhos que estão enraizados na crença na realidade da separação da nossa Fonte, e uns dos outros. Não podemos mudar o roteiro, que já está escrito e realmente já foi desfeito.

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Mas podemos mudar do roteiro do ego para o do Espírito Santo. Ajudar-nos a alcançar isso é o propósito do Um Curso em Milagres.

25) Se tudo isso é um sonho ou uma ilusão, isso significa que o abuso que eu sofri enquanto criança é irreal e deveria ser negado ou ignorado?

Partindo da resposta à pergunta anterior, podemos entender que o abuso infantil, ou qualquer vitimação, é parte de um roteiro maior que veio à existência com o pensamento original de separação, que então se partiu em bilhões de fragmentos. O “eu” que experiencio como mim mesmo, assim como todas as experiências da vida que chamo de minha, são apenas aspectos do roteiro mais amplo do tomador de decisões. Na verdade, todos os roteiros do ego são só sonhos projetados de um mundo de opostos que resulta da crença de que nós (os vitimadores) poderíamos banir Deus e Sua unidade (a vítima) das nossas mentes. Portanto, qualquer parte das nossas vidas individuais é um congelamento na forma, do roteiro de vítima-vitimação do ego. Além disso, preciso aceitar a responsabilidade de que meu tomador de decisões escreveu um roteiro no qual eu iria vivenciar a dor do abuso para que eu pudesse provar que Deus estava errado e eu certo. Em outras palavras, não existe unidade da Filiação porque os pensamentos de separação e vitimação realmente aconteceram. Até que eu possa aceitar esse fato do meu sonho, não serei capaz de aceitar a correção e cura do Espírito Santo. E o mais importante, as pessoas nunca deveriam negar o que parece estar acontecendo a elas em seus sonhos, pois esses eventos se tornam os meios de ajudá-las a despertarem do sonho. Ao invés disso, elas deveriam prestar muita atenção a essas experiências, e depois pedir ajuda ao Espírito Santo para se tornarem aprendizes felizes, e aceitarem Seus sonhos de correção para substituir os pesadelos que seus egos fizeram.

Por exemplo, se alguém sobre um abuso tão doloroso como criança, a ponto de todas as memórias terem sido reprimidas e, portanto, tornadas inacessíveis à correção, alguma forma de intervenção terapêutica que permite que a pessoa se recorde do abuso inicial pode ser extremamente útil. Se isso não for feito, o pensamento de medo que “protege” o pensamento de vitimação recebe poder, e realmente continua a exercer seu poder a serviço de manter o sistema de pensamento do ego de separação e dor. Portanto, como Um Curso em Milagres repetidamente enfatiza, um sonho feliz de perdão precisa preceder o despertar último, no qual – ainda dentro do contexto do sonho de separação – uma pessoa é capaz de olhar com Jesus para os símbolos amargos dos sonhos do passado, abrindo-os para um re-exame e, portanto, para a correção. Esse é o significado da próxima passagem muito importante do texto que transmite a gentileza do amor corretivo e curativo de Jesus:

Nada mais amedrontador do que um sonho vão aterrorizou o Filho de Deus e o fez pensar que ele perdeu a sua inocência, negou o seu Pai e fez uma guerra contra si mesmo. Tão amedrontador é o sonho, tão aparentemente real que ele não poderia despertar para a realidade sem o suor do terror e um grito de medo mortal, a não ser que um sonho mais gentil precedesse o seu despertar e permitisse que a sua mente mais calma desse boas-vindas à Voz Que chama com amor para que ele desperte ao invés de temê-la; um sonho mais gentil, no qual o seu sofrimento foi curado e seu irmão veio a ser seu amigo. A Vontade de Deus é que ele desperte gentilmente e com alegria e deu-lhe o meio para despertar sem medo (T-27.VII.13:2-12).

E então, qualquer intervenção que permita que os indivíduos tenham acesso aos seus pensamentos de medo para que possam ser vistos através dos olhos do perdão de Jesus – uma visão não-julgadora – é útil. É por isso que Jesus ditou a Helen o panfleto Psicoterapia: Propósito, Processo e Prática. Embora isso claramente aconteça dentro do sonho de separação do ego, a psicoterapia pode, apesar disso, ser redirecionada pelo Espírito Santo para servir ao Seu propósito santo de desfazer o sonho – revertendo as dinâmicas de negação

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e projeção -, refletindo no terapeuta e no paciente a união de Deus e de Cristo que é a única verdade.

Como já afirmamos, é realmente verdade que falando metafisicamente, o abuso na primeira infância (ou qualquer coisa dentro do sonho) é uma ilusão, mas, enquanto a pessoa acreditar que ele realmente aconteceu – de outra forma, não haveria medo, negação, raiva ou dor – então, a ajuda precisa ser refletida na forma do que a pessoa precisa. Descartar um problema como mera ilusão quando a pessoa ainda acredita ser um corpo e uma personalidade é simplesmente tolo, e não uma prática espiritual legítima. Tal prática em negação claramente não serve bem a ninguém, e Jesus não nos dá um Curso em negação, mas em desfazer.

26) E os defeitos congênitos ou mortes de crianças? Também foram escolhidos?

Um defeito congênito, assim como a morte de uma criança, não foi escolhido pelo cérebro do bebê, mas pela mente que projetou uma figura em um sonho, que nasceu deformada ou morreu logo no início da vida. Por favor, vejam o diagrama na página 20, e recordem-se de que a mente dividida projeta muitos pensamentos que tomam forma através do holograma do tempo e do espaço. Portanto, se um pensamento de imperfeição ou morte é mantido pela mente separada, pode ser experienciado como defeito congênito ou morte de um bebê, no que é percebido como a vida de um indivíduo. Se alguém voltar á nossa analogia anterior sobre o corpo (e o cérebro) como um marionete, carregando os desejos da mente não-humana, respostas a questões como a acima farão sentido perfeito.

27) Os bebês nascem inocentes?

O único verdadeiro estado de inocência é o Céu, o lar real do Filho de Deus. Com muito, muito poucas exceções – os Professores dos professores citados no manual para professores (MP-26.2) -, só aqueles que retêm a culpa em suas mentes “vêm até aqui” e nascem. A Lição 182 do livro de exercícios provê um retrato pungente de todos os habitantes desse mundo:

Falamos por cada um que caminha por esse mundo, pois não está em casa. Vai incerto numa busca sem fim, buscando na escuridão o que não pode achar, sem reconhecer o que é que está buscando. Constrói mil casas, mas nenhuma satisfaz a sua mente inquieta. Não compreende que está construindo em vão. A casa que busca não pode ser feita por ele. Não há nenhum substituto para o Céu. O inferno foi tudo o que ele jamais fez (LE-pI.182.3).

E, no entanto, é essa própria crença de que existe um substituto para o Céu que constitui o pecado, e a culpa resultante e inevitável impulsiona continuamente o Filho separado a rever mentalmente o pensamento de separação e seus efeitos que já se foram. Portanto, todos os que vêm aqui compartilham essa culpa em relação à sua inocência perdida. Além disso, o propósito dos seus egos para sua manifestação no mundo é o reforço dessa culpa. Por outro lado, o propósito do Espírito Santo, uma vez que as pessoas acreditam estar aqui, é desaprender essa culpa através da prática do perdão que desfaz a crença na vitimação. Isso eventualmente restaura a todos os separados, sua consciência da inocência que é por direito e eternamente deles como o Filho único de Deus, o Cristo que Ele criou e Um com Ele.

Nesse contexto, podemos entender a visão popular de que bebês nascem inocentes e depois são corrompidos pela sociedade – a tese do “nobre selvagem” de Rosseau –, que se encaixa muito bem dentro do plano estratégico do ego para nos convencer de que o mundo é real e tem efeitos vitimadores sobre nós. O sistema de pensamento do ego mantém a idéia de que não somos o sonhador do sonho que é o mundo, mas que, ao invés disso, o sonho está nos sonhando. Portanto, é o mundo que é responsável pela perda da minha inocência. Não foi que eu a mandei embora através dos meus pensamentos, mas, ao invés disso, ela foi tirada de

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mim, a vítima inocente de um mundo que eu não escolhi. Esse princípio egóico fundamental é o tema da próxima passagem do “O herói do sonho”:

A série de aventuras do corpo, da hora do nascimento até à morte, é o tema de todo os sonhos que o mundo jamais teve. O “herói” desse sonho nunca vai mudar e nem o seu propósito. Embora o sonho propriamente dito tome muitas formas e pareça mostrar uma grande variedade de locais e de eventos em que seu “herói” se encontra, o sonho tem apenas um propósito, ensinado de muitas formas. Essa única lição é o que ele tenta ensinar uma e outra vez e ainda mais uma vez: que ele é causa e não efeito. E tu és o seu efeito e não podes ser a causa. Assim tu não és o sonhador, mas o sonho. E assim vagas em vão, entras e sais de lugares e acontecimentos que ele inventa. Que isso é tudo o que o corpo faz é verdade, pois ele não é senão uma figura em um sonho (T-27.VIII.3; 41-4).

28) Um Curso em Milagres tem uma moralidade, ou um código de ética?

A resposta a essa questão depende de como moralidade é definida. O dicionário define o termo como um conjunto de regras ou princípios de conduta: um sistema de moral e ética que define o que está certo e o que está errado. Olhando para a primeira parte da definição, o Um Curso em Milagres não apresenta um conjunto de regras sobre como alguém deveria agir no mundo, mas definitivamente apresenta um esquema da mente dividida pós-separação, que se separou na mente errada e na mente certa, os domínios respectivos do ego e do Espírito Santo.

De um ponto de vista histórico, a curta permanência do homo sapiens nesse planeta não tem sido nada além de moral, embora civilização após civilização tenha encenado códigos morais que governam as questões da vida diária dos seus cidadãos. Se os habitantes de qualquer sociedade, nação-estado ou civilização estão operando a partir da crença na escassez, o princípio de falta que governa todo o sistema de pensamento do ego, de códigos e leis morais inevitavelmente vai se refletir nessa escolha. E os eventos manchados de sangue da história são testemunha para o sistema de pensamento do ego de “matar ou ser morto”, que é o inconsciente que apóia todas as moralidades do mundo.

Portanto, ainda que um sistema de moralidade possa defender ideais nobres, se sua origem estiver na mente errada, nunca vai trazer uma correção para o que é chamado de imoral ou amoral. Além disso, como a sociedade vai determinar o que é certo ou errado, ou quem deveriam ser aqueles que vão tomar essas decisões? Se estudarmos as culturas do passado e do presente, ficaremos espantados quando olharmos objetivamente para o que é considerado certo ou errado por quaisquer grupos de pessoas através dos tempos. Por exemplo, durante a Inquisição, era considerado da máxima moralidade buscar, encontrar e punir aqueles que não concordavam com a Igreja Católica Romana, cujos ensinamentos acreditava-se terem vindo de Deus e de Jesus. Então, em Seus Nomes, hereges eram torturados e mortos. Basicamente então, o grupo que mantém o poder religioso, econômico ou político em qualquer sociedade, dependendo de esse ser um estado teocrático ou profano, determina o que está certo e o que está errado.

Um Curso em Milagres nos apresenta um novo modo de ser nesse sonho, que estaria muito além de qualquer moralidade ou regras de conduta às quais o mundo preste homenagem. Esse novo modo de ser nos pede para ficarmos conscientes dos pensamentos das nossas mentes erradas, e depois, para pedirmos ajuda para mudarmos para uma correção que já existe em nossas mentes certas. Para alcançarmos isso, precisamos tirar nossos seres egóicos do caminho, e liberar quaisquer valores morais, desejos ou investimentos em quaisquer resultados, quer envolvam conduta, regras ou expectativas. A seguinte exortação do livro de exercícios resume claramente essa abordagem de desfazer tudo o que acreditamos antes, para que a Sabedoria de Deus possa falar conosco e guiar nossos pensamentos, palavras e comportamento:

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Faze simplesmente isso: aquieta-te e deixa de lado todos os pensamentos sobre o que és e o que Deus é; todos os conceitos que aprendeste sobre o mundo; todas as imagens que tens de ti mesmo. Esvazia a tua mente de tudo o que ela pensa ser verdadeiro ou falso, bom ou mau, de todo pensamento que julga digno e de todas as idéias das quais se envergonha. Não retenhas nada. Não tragas contigo nenhum pensamento que o passado tenha te ensinado e nenhuma crença que tenhas aprendido com qualquer coisa anteriormente. Esquece-te desse mundo, esquece-te deste curso e vem com as mãos totalmente vazias ao teu Deus.Não é Ele Aquele Que conhece o caminho que leva a ti? Não precisas conhecer o caminho para Ele. A tua parte consiste apenas em permitires que todos os obstáculos que interpuseste entre o Filho e Deus Pai sejam quietamente removidos para sempre. Deus fará a Sua parte te respondendo imediatamente com alegria (LE-pI.189.7; 8:1-6).

Portanto, da perspectiva do Um Curso em Milagres, o que é “certo” é acessar a mente certa e seguir a orientação do Espírito Santo ou de Jesus; enquanto o que é “errado” é escolher a mente errada e ouvir a voz insana do sistema de pensamento de especialismo do ego. Nós então poderíamos cunhar um novo termo – ética não-normativa – para denotar o código único do Curso para vivermos nesse mundo. O que forja essa moralidade é a prática diária do perdão, que desfaz os bloqueios à presença do Amor do Espírito Santo e da sabedoria para que possam fluir através de nossas mentes para guiar nosso comportamento. Como Jesus escreve de forma tão comovente no livro de exercícios:

Pois é só disso que preciso, que ouças as palavras que digo e as dês ao mundo. Tu és a minha voz, os meus olhos, os meus pés, as minhas mãos, através das quais eu salvo o mundo (LE-pI.rV.in.9:1-3).

29) Uma vez que toda doença é uma projeção da culpa da mente, isso não significa que é errado tomar remédios para a dor física?

Absolutamente não. Como já explicamos, a “moralidade” do Curso – quer qualquer comportamento em particular seja “certo” ou “errado” – depende apenas de qual voz escolhemos escutar. E certamente pode haver ocasiões nas quais a orientação de Jesus seria tomar um remédio ou analgésicos. Acima de tudo, como é visto através de todo Um Curso em Milagres, seu ensinamento e orientação são gentis e amorosos, o que é exemplificado em uma passagem extremamente importante, perto do final do texto. Ela está direcionada especificamente a essa questão de tomar remédios, uma forma a que o Curso se refere como mágica. A passagem é particularmente importante, por causa da tendência dos estudantes do Um Curso em Milagres de usarem de forma julgadora seus ensinamentos contra si mesmos e os outros. Também é um excelente exemplo de integração do que temos citado freqüentemente como os dois níveis do Curso: Nível I – a fundação metafísica dos ensinamentos do Curso que contrastam a realidade de Deus e de Cristo com o mundo ilusório do ego; e o Nível II – a parte dos ensinamentos do Curso que se focalizam apenas no mundo da ilusão, o sonho. Nesse nível, a verdade é a interpretação do Espírito Santo sobre o mundo como uma sala de aula na qual aprendemos o perdão, em contraste com a ilusão que é o uso maligno do mundo feito pelo ego para promover seu próprio especialismo. A passagem começa como uma afirmação metafísica sobre a natureza ilusória do corpo, e então, Jesus gentilmente muda o foco para a experiência dos seus estudantes quando estão dominados pelo medo:

Todos os meios materiais que aceitas como remédios para enfermidades corporais são reafirmações de princípios mágicos. Esse é o primeiro passo para se acreditar que o corpo faz as suas próprias enfermidades. O segundo passo equivocado é

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tentar curá-lo através de agentes não-criativos. Contudo, não decorre daí que o uso de tais agentes com propósitos corretivos seja mau. Às vezes, a enfermidade tem um controle que é suficientemente forte sobre a mente para tornar a pessoa temporariamente inacessível à Expiação. Nesse caso, pode ser sábio usar uma abordagem de transigência para com a mente e o corpo, na qual por algum tempo se acredita que a cura venha de alguma coisa de fora. Isso é assim porque a ultima coisa que pode ajudar aquele que tem a mente disposta ao que não é certo, ou o doente, é fazer algo que aumente o seu medo. Esses já estão em um estado debilitado pelo medo. Se são prematuramente expostos a um milagre podem ser precipitados ao pânico. É provável que isso ocorra quando a percepção invertida induziu à crença em que milagres são assustadores (T-2.IV.4; grifos nossos).

Lendo outras passagens no Curso, fica aparente que uma vez que a origem e o conteúdo de todos os sonhos é o medo, todos nesse mundo estão em um estado de medo. Além disso, existe um medo inerente do poder do milagre de nos liberar de todas as defesas que nos “protegem” da “ameaça” do Amor de Deus. A doença e a dor constituem aspectos essenciais do plano de proteção do ego, uma vez que elas distraem nossa atenção para nossos corpos, tirando-a da nossa Identidade como espírito, a memória que é mantida para nós pelo Espírito Santo em nossas mentes certas (vejam a Lição 136 do livro de exercícios, “A doença é uma defesa contra a verdade”). Portanto, nós geralmente precisamos da “abordagem de transigência” que Jesus cita acima. E com muita freqüência, uma decisão de pedir ajuda ao Espírito Santo ao invés de ao ego – por causa do nosso medo – precisa ser expressa em uma forma material, como Jesus explica nessa passagem do manual:

A aceitação da doença como uma decisão da mente, com um propósito para o qual ela quer usar o corpo, é a base da cura. E isso é assim para a cura em todas as formas. Um paciente decide que isso é assim e se recupera. Caso se decida contra a recuperação, não será curado. Quem é o médico? Apenas a mente do próprio doente. O resultado é aquele que ele decidir. Aparentemente, agentes especiais trabalham nele, mas não fazem senão dar forma à sua própria escolha. Ele os escolhe de modo a dar forma tangível a seus desejos. Isso é o que fazem e nada mais. De fato, não são absolutamente necessários. O paciente, sem o seu auxílio, poderia simplesmente levantar-se e dizer: “Eu não tenho nenhuma utilidade para isso”. Não há forma de doença que não seja curada imediatamente (MP-5.II.2; grifos nossos).

Portanto, tomar remédios pode realmente ser uma expressão do pedido de ajuda que os estudantes fazem a Jesus, e aceitar essa ajuda na forma que não reforça seu medo do poder de cura de suas mentes. E então, retornando à mente seu poder de decidir por Deus, também traz à memória seu mau uso desse poder de escolher contra Ele. A culpa age quase como uma resistência elétrica que emite um choque sempre que alguém se aproxima dela, afastando-nos do nosso objetivo. E então, com freqüência, nosso pedido de ajuda a Jesus em nossas mentes precisa ser “ajustado” mediando a ajuda através do corpo. Essa dinâmica está refletida no seguinte parágrafo, parte do qual já citamos antes:

O valor da Expiação não está na maneira na qual ela é expressa. De fato, se é usada de forma verdadeira, inevitavelmente vai ser expressada do modo que for mais útil para quem recebe, seja ele qual for. Isso significa que um milagre, para atingir a sua plena eficácia, tem que ser expressado em uma linguagem que aquele que recebe possa compreender sem medo. Isso não significa necessariamente que esse é o mais elevado nível de comunicação do qual ele é capaz. Significa, contudo, que é o nível mais alto de comunicação do qual ele é capaz agora. Todo o objetivo

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do milagre é elevar o nível da comunicação e não descê-lo por aumentar o medo (T-2.IV.5).

Ainda que tomar remédios seja, em um nível, expressar a “tentativa mal conduzida de curar... através de agentes não criativos”, em outro nível – como já discutimos – isso reflete o ato de nos voltarmos para Jesus em busca de ajuda, aceitando-a no único nível que não reforça o medo. Excluir tal comportamento em nome dos ensinamentos do Um Curso em Milagres é sutilmente tornar o corpo real, afirmando que certos comportamentos são “maus” ou “errados”. Nas palavras de Hamlet: “Não há nada certo ou errado, mas o pensamento o torna assim”. E nosso pensamento pode expressar tanto o sistema de pensamento “errado” do ego quanto o “certo”, do Espírito Santo. Nossas ações simplesmente espelham a decisão que nossas mentes tomaram. No entanto, como vamos discutir na próxima pergunta, é um equívoco tentar entender qual professor foi escolhido baseado em ações observáveis.

30) Ser sem defesas significa que eu deveria deixar alguém me matar ou estuprar, ou ficar de lado enquanto a violência é cometida contra meus seres amados ou as outras pessoas?

Começamos afirmando que a ausência de defesas é um pensamento da mente certa, uma atitude baseada no sistema de pensamento do Espírito Santo de que o Filho de Deus é inocente e sem pecado e, portanto, invulnerável. Se não existe pecado, não pode haver culpa. E sem culpa, não pode haver projeção, o que significa que não pode haver medo de ser atacado. A culpa, como o Curso ensina, exige punição: se não existir culpa, o medo da punição também não existe. Finalmente, sem medo da punição de fora, não existe necessidades de defesas dentro, e então, o verdadeiro estado de ausência de defesas é o pensamento da inocência e invulnerabilidade.

Isso então não significa que o comportamento orientado pela mente certa de uma pessoa seja necessariamente aquilo que o mundo considera como sem defesas. O significado da falta de defesas espiritual é freqüentemente distorcido, então as pessoas pensam que precisam ser totalmente passivas, como capachos, para serem sem defesas. Deixar os outros cometerem violência contra si mesmo, um ser amado, ou qualquer outra pessoa é permitir que essas pessoas ajam de uma maneira que não apenas seria danosa para suas “vítimas”, mas para si mesmas também, reforçando sua própria culpa em relação à sua separação de Deus e do resto da Filiação. Agir de forma comportamental para proteger a si mesmo realmente pode ser seguir a orientação do Espírito Santo na mente, para ser amoroso. Não é a forma do comportamento que reflete a ausência de defesas, mas o conteúdo do pensamento na mente.

As experiências profissionais de nós dois oferecem exemplos desse princípio. Meu (Kenneth) primeiro emprego como psicólogo foi trabalhar com crianças perturbadas, em uma escola especial. Eram crianças com idades que variavam de cinco a treze anos, muitas das quais com severos problemas comportamentais, que com freqüência se manifestavam em atitude violentas contra si mesmas e os outros. Planejei uma maneira de poder controlar seu comportamento deitando-nos no chão, envolvendo-os com minhas pernas e braços de tal maneira que eles não se machucassem, mas não conseguissem chutar, dar socos, morder, arranhar, ou ferir outra criança. Portanto, impedindo suas tentativas de violência comportamental, eu era capaz de acabar acalmando-os. Meu comportamento poderia ter parecido defensivo para um observador, embora obviamente seu propósito fosse apenas o de ajudar.

Durante minha meu período como professora e reitora em uma escola secundária de Nova Iorque, eu (Gloria) muitas vezes tive que suspender adolescentes da escola ou detê-los por tipos variados de comportamentos violentos ou pelo uso de armas. Minhas intervenções, também, poderiam ser interpretadas por um observador como defensivas. No entanto, checar minhas respostas com Jesus o melhor que podia sobre como proceder, resultou em – parafraseando o texto – estabelecer um limite para a habilidade do adolescente de criar

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erroneamente (T-2.III.3:3). Portanto, eles eram impedidos de atuar mais pensamentos assassinos, que teriam resultado em um reforço maior da sua culpa. Eu sempre senti que era minha responsabilidade como reitora, que era um papel do sonho que eu estabeleci no meu roteiro, tirar a mim mesma do caminho, com máximo da minha habilidade, para permitir o acesso ao roteiro de correção do Espírito Santo para essas circunstâncias difíceis. Eu tinha a pequena disponibilidade de que Um Curso em Milagres fala, mas, algumas vezes, me questionei, em meus primeiros dias com o Curso, por que tinha escrito um roteiro com situações tão aparentemente difíceis!

Ter agido de outra forma – i.e., ter um comportamento passivo ou “sem defesas” diante de tais ações agressivas – teria sido muito não amoroso, pois seria deixar um estuprador assaltar sua esposa ou filha enquanto você fica murmurando “chavões” do Curso sobre não ser um corpo, como o amor não se defende, etc. Como com tudo relacionado aos ensinamentos do Um Curso em Milagres, é o conteúdo ou propósito que dá significado às nossas ações, e o único significado verdadeiro vem de Jesus ou do Espírito Santo em nossas mentes. Seu amor é abstrato e não-específico, e sempre o mesmo. No entanto, esse amor é expresso através de expressões específicas de nossas individualidade, e, portanto, diferente de uma pessoa para outra. Então, apenas alguém com a sabedoria de Jesus estaria em posição de avaliar de forma justa e imparcial as ações de outra pessoa. Para qualquer outra pessoa, seria temerário e arrogante fazer tais julgamentos. Como ele nos instrui no manual para professores:

De modo a julgar qualquer coisa acertadamente, a pessoa teria que estar inteiramente ciente de uma escala inconcebível de coisas passadas, presentes e por vir... E a pessoa teria que estar certa de que não há nenhuma distorção na sua percepção, de modo que o seu julgamento seja totalmente justo em relação a todos aqueles sobre os quais recai agora e no futuro. Quem está em posição de fazer isso? Quem, a não ser em grandiosas fantasias, poderia reivindicar isso para si mesmo?... Faze, então, apenas um julgamento a mais. É o seguinte: há Alguém contigo Cujo julgamento é perfeito (MP-10.3:3-6,8-13; 4:7-9).

E então, o ponto de partida é sempre pedir ajuda a Jesus ou ao Espírito Santo antes de responder a uma situação difícil, assim como pedir Sua ajuda antes de tentar julgar a resposta de outra pessoa em uma situação difícil.

31) Alguém pode ser um estudante do Um Curso em Milagres e participar de um júri (ser médico, advogado, etc), ou permanecer com um parceiro que não é estudante do Curso? Ou deve-se ter um parceiro de qualquer forma? Isso não é simplesmente uma forma de especialismo?

Essas perguntas refletem o nível de confusão que já consideramos, pois sugerem que existem certas atividades, ocupações ou relacionamentos que são mais ou menos espiritualizados do que outros. Por exemplo, as presunções subjacentes são as de que é mais santo se tornar um professor do Um Curso em Milagres, do que servir no governo ou nas forças armadas. Em outras palavras, essa presunção torna o erro real, algo que Jesus distintamente avisa seus estudantes para não fazerem. Na verdade, a primeira lei do caos descrita no Capítulo 23, e já citada, fala explicitamente sobre o princípio do ego de que existe “uma hierarquia de ilusões” (T-23.II.2:3).

Como temos dito freqüentemente nesse livro, o foco do estudante do Curso nunca deveria estar sobre um comportamento específico, mas apenas em qual voz é escolhida para guiar esse comportamento. Tudo o mais é sem significado. Com muita freqüência, ocupações difíceis provêem as melhores salas de aula nas quais aprendemos e praticamos o princípio do perdão, que é baseado na premissa de que nada fora de nós pode nos afetar de qualquer forma. São apenas as escolhas das nossas mentes pelo ego que nos trazem dor. Muitos anos atrás, estávamos dando um workshop em Albuquerque, Novo México. Um homem ficou de pé

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e falou sobre seu trabalho em Los Alamos, lugar onde são pesquisadas e produzidas umas das armas nucleares mais significativas desse país. Vários dos participantes começaram a atacá-lo por ser um estudante do Um Curso em Milagres ao mesmo tempo em que estava envolvido no que eles sentiam como uma atividade belicosa e obviamente baseada no ego. Eles claramente perderam todo o ponto principal de vista. Que melhor sala de aula poderia haver para alguém que trabalhasse em meio a um exemplo tão flagrante do sistema de pensamento do ego, aprendendo a vê-lo de forma diferente, através dos olhos do perdão, e especialmente vendo a si mesmo de forma diferente? E trabalhar em uma bomba nuclear realmente é de qualquer forma diferente de participar em qualquer instituição no mundo, todas as quais lidam com a separação, especialismo e perpetuação do sistema de pensamento do ego?

Sobre parceiros em relacionamentos, os mesmos princípios e cuidados se aplicam. Através dos anos, temos ouvidos muitas histórias de casais que romperam porque um dos parceiros não era estudante do Curso, como se uma condição externa fosse um pré-requisito para uma vida feliz juntos. A questão, naturalmente, não é que todos os casais deveriam continuar juntos, ou que deveriam se separar. No entanto, usar o Um Curso em Milagres como uma desculpa para romper, ou uma razão para permanecer juntos perde todo o ponto principal de vista novamente. Com muita freqüência, de fato, permanecer com alguém que não é um estudante do Curso pode ser a sala de aula perfeita na qual aprendemos que o cerne do Um Curso em Milagres é seu conteúdo de perdão, não a forma na qual o ensinamento vem. Vamos voltar a essa questão no último capítulo.

Os mesmos erros ocorrem do “outro lado” dos relacionamentos; i.e., a crença de que os estudantes do Curso não deveriam se envolver em quaisquer relacionamentos românticos ou sexuais de forma alguma, sem mencionar casar e ter filhos, uma vez que isso iria refletir claramente relacionamentos especiais. No entanto, as pessoas têm esquecido de que o especialismo existe não em um relacionamento entre duas pessoas, mas nos pensamentos de uma pessoa que prefere a individualidade ou especialismo do ego ao Amor do Espírito Santo. A falta que inevitavelmente se segue a tal decisão precisa levar a buscar do lado de fora para ajudar a suprir essa falta, o que o Curso descreve como o princípio da escassez. Esse preenchimento da falta interna percebida é o que o Um Curso em Milagres chama de relacionamentos especiais.

É impossível nascer nesse mundo sem especialismo, e é simplesmente a negação que levaria os estudantes a acreditarem que estão sem esse sistema de crenças. Uma das definições principais que o Curso usa para especialismo é substituição, e simplesmente deixar o Céu – como todas as pessoas no mundo acreditam que fizeram -, e expressa a crença de que o especialismo do ego é um substituto valioso e vantajoso para o Amor de Deus. Portanto, o relacionamento especial é a regra do mundo separado, e, ao invés de negá-los, os estudantes do Um Curso em Milagres deveriam aceitar esse fato perceptual, e voltar-se para Jesus ou o Espírito Santo para ajudá-los a aprenderem as lições de perdão que essa sala de aulas valiosa oferece, sob Sua orientação.

Em outras palavras, como nós freqüentemente lembramos aos estudantes durante nossas aulas e workshops, quando estiverem estudando o Um Curso em Milagres, acima de tudo, não devem se esquecer de serem normais. As pessoas normais participam de júris, se envolvem em licitações, fazem seguro, ficam doentes, ficam zangadas, riem, choram, lamentam a morte das pessoas amadas, têm relacionamentos, famílias, círculos de amizades, etc., etc., etc. O desafio é estar envolvido em todas essas atividades humanas normais, mas fazendo isso de forma diferente – com Jesus, ao invés de sem ele. Portanto, Jesus encoraja seus estudantes a serem como todos os outros, mas a serem pacíficos e felizes:

Há uma maneira de viver no mundo que não está aqui, embora pareça estar. Tu não mudas de aparência, embora sorrias mais freqüentemente. A tua fronte é serena, os teus olhos tranqüilos (LE-pI.155.1:1-3; grifos nossos).

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Portanto, como avisamos em nossa discussão sobre a pergunta anterior, estudantes do Um Curso em Milagres deveriam observar a vigilância de seu ego em julgar as respostas e comportamentos de outras pessoas, ou o seu próprio dessa forma. O julgamento amoroso de Jesus é sempre e apenas em termos de conteúdo – i.e., o professor interno que é escolhido – e nunca de forma. E, a menos que alguém tenha a sabedoria isenta de ego do Espírito Santo, como um observador teria a possibilidade de saber qual professor foi escolhido?

32) Um Curso em Milagres ensina que a raiva nunca é justificada. Isso significa que eu nunca deveria ficar zangado, e que, se o fizer, não estou sendo um bom estudante do Curso, ou não estou sendo espiritual o suficiente?

Jesus de fato, afirma explicitamente em dois lugares que a raiva (ou ataque) nunca é justificada. Na introdução à sua discussão sobre a crucificação, ele afirma:

A raiva sempre envolve a projeção da separação, que deve ser em última instância, aceita como responsabilidade da própria pessoa em vez de ser imputada a outros... Tu não podes ser atacado, o ataque não tem justificativa e tu és responsável por aquilo em que acreditas (T-6.in.1:2-5,13-14).

E mais a frente no texto, falando sobre por que o perdão é sempre justificado, ele ensina:

A raiva nunca é justificada. O ataque não tem fundamento. É aqui que o escape do medo começa e ele será completado. Aqui o mundo real é dado em troca dos sonhos de terror. É nisso que o perdão se baseia e é apenas natural (T-30.VI.1:1-4).

Nossa resposta aqui segue diretamente a discussão da questão anterior, e vai ao cerne da prática do Um Curso em Milagres. Jesus não está pedindo aos seus estudantes para serem perfeitos; se eles fossem, ou até quisessem ser, então, teriam permanecido no Céu – o único lar da perfeição -, ou já teriam retornado. O fato de os estudantes terem necessidade do Um Curso em Milagres está testemunhando sua crença na realidade da imperfeição. E pessoas imperfeitas se tornam zangadas e buscam evitar responsabilidade por suas próprias escolhas. Pode-se até dizer que o pensamento central do ego de todos é manter a individualidade e o especialismo que ele acredita ter roubado de Deus, mas evitando a responsabilidade por isso. Portanto, essa evitação só pode acontecer com as pessoas culpando outras pelo que secretamente acreditam ter feito e, portanto, atacando outra pessoa por seu pecado.

O propósito de Jesus no Curso é ajudar seus estudantes a aceitarem a responsabilidade por suas projeções sobre os outros. Seria muito irrealista da parte dele esperar que seus estudantes não tivessem pensamentos de ataque, mas é uma meta muito razoável pedir que os estudantes pelo menos estejam conscientes das tentativas do seu ego de negar a responsabilidade por estar transtornado. Portanto, ficar zangado não significa que alguém não é um bom estudante do Curso, mas se tornar um dos “bons” significa aprender – ou até ter a disponibilidade de aprender – a ser responsável pelas próprias percepções zangadas em relação aos outros, e estar ciente da própria culpa em relação à separação do Amor de Deus e da orientação amorosa de Jesus ou do Espírito Santo. “Bons” estudantes, portanto, nunca buscariam justificar seus pensamentos ou sentimentos zangados; ao mesmo tempo, eles não negariam que os têm. Essa honestidade permite que Jesus ou o Espírito Santo os ajude a mudarem suas mentes, se assim o escolherem. Essa é a forma gentil e amorosa de entender as afirmações de Jesus no texto que citamos acima.

33) O aprendizado é cumulativo? Isso é, eu levo o que aprendi comigo quando morro, para que, quando “voltar”, não tenha que começar tudo de novo?

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A premissa dessa questão é a de que o tempo é linear, e, portanto, o aprendizado de uma pessoa pode ser mensurado dentro de uma dimensão evolutiva linear. No entanto, como aprendemos em Um Curso em Milagres, também discutido no capítulo anterior, o tempo não é linear, uma vez que tudo dentro do sonho do tempo e do espaço aconteceu dentro do instante original. E então, o aprendizado realmente não acontece dentro da figura de sonho aparentemente baseada na linearidade que chamamos de nós mesmos. Ao invés disso, nosso aprendizado é apenas a aceitação da correção do perdão dentro de nossas mentes. Essa correção, efetuada para nós pelo Espírito Santo, desfaz – ou desaprende – o sistema de pensamento de separação do ego. Ela existia antes do mundo do tempo e do espaço ser feito, e ainda permanece em nossas mentes. Nossa habilidade de escolher essa correção também está em nossas mentes. E então, é isso a que nos referimos como o tomador de decisões – a parte das nossas mentes tripartites que escolhe – que aprende a diferença entre as mentiras do ego e a verdade do Espírito Santo. O ser físico e psicológico com o qual nos identificamos, e que acreditamos precisar de aprendizado, é simplesmente o reflexo, em um mundo de tempo e espaço, do tomador de decisões, cujas escolhas acontecem fora da dimensão temporal e espacial.

Isso, é claro, não é compreensível para um cérebro que foi programado para pensar apenas dentro da dimensão do tempo e do espaço, vida e morte. Mas, Jesus nos assegura que nossa compreensão não é necessária:

Achas difícil aceitar a idéia de que precisas dar tão pouco para receber tanto. E é muito difícil para ti reconhecer que não é um insulto pessoal que a tua contribuição e a do Espírito Santo sejam tão extremamente desproporcionais. Ainda estás convencido de que a tua compreensão é uma contribuição poderosa para a verdade e faz dela o que ela é. Entretanto, nós já enfatizamos que nada precisas compreender (T-18.7:3-9).

E então, mesmo que não consigamos entender verdadeiramente como aprendemos as lições do Espírito Santo, pelo menos podemos entender como não as aprendemos.

34) Se a vida aqui é uma ilusão, por que Um Curso em Milagres se refere a “coisas vivas”?

Aqui, novamente, precisamos entender o uso da linguagem feito por Jesus. Passagens nas quais essa frase aparece, como na Lição 195, por exemplo, são escritas no nível da nossa experiência e não a realidade de Jesus. Pois é dentro do sonho da nossa existência individual nesse mundo que realmente formamos relacionamentos com as “coisas vivas”. E, portanto, como é a mensagem dessa lição, deveríamos nos sentir gratos a esses seres pelas oportunidades de aprendizado que nossos relacionamentos com eles nos oferecem; isto é, que o que nós projetamos neles é simplesmente uma crença equivocada em nossa própria culpa.

Não faria sentido que Jesus insistisse em que nos relacionássemos com ele em seu nível,

pois a nossa experiência permanece enraizada no sonho. E então, seu propósito de expressar sua verdade no nível da nossa capacidade de compreensão precisa ser reconhecido pelos estudantes do Curso, a menos que eles interpretem muito mal sua mensagem. Jesus especificamente nos diz que não há vida fora do Céu, como vimos na questão anterior, e então, não pode haver “coisas vivas” no mundo. Mas, uma vez que acreditamos viver aqui, nos relacionando com outros seres que acreditamos viverem aqui também, seria inútil Jesus exigir que aceitássemos a verdade que nosso medo nos impede de aceitar nesse momento. Portanto, refletindo seu gentil amor por nós, ele fala sobre “coisas vivas”, ainda que em outro nível não exista nada vivo aqui de forma alguma.

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35) Um Curso em Milagres ensina que tudo já aconteceu. Não é a mesma coisa que predestinação?

A compreensão tradicional de predestinação, derivando de John Calvin, reformador protestante de século XVI, é a de que desde o início dos tempos, Deus escolheu (predestinados) aqueles que serão salvos (os “eleitos”) e aqueles que serão punidos (os “pecadores”) no futuro. E essa decisão é irrevocável e imutável.

A visão do Um Curso em Milagres é a de que sim, tudo já aconteceu – e nesse sentido, o drama do mundo é irrevocável (“o roteiro está escrito”) -, mas isso inclui tanto o roteiro do ego quando a correção do Espírito Santo para ele. Para citar novamente uma passagem importante:

Deus deu o Seu Professor para substituir o professor que fizeste... E o que Ele quer substituir, foi substituído. O tempo não durou senão um instante em tua mente, sem nenhum efeito sobre a eternidade. E assim todo o tempo é o passado e todas as coisas são exatamente como eram antes que fosse feito o caminho para o nada. O diminuto tic-tac do tempo no qual foi feito o primeiro equivoco e todos eles dentro desse único, também continha a Correção daquele equivoco e de todos os que vieram dentro do primeiro (T-26.V.3:1-9).

Portanto, em Um Curso em Milagres, o agente da predestinação é o tomador de decisões, não Deus, pois é esse aspecto da mente dividida ou tripartite que é o autor dos roteiros das nossas vidas no universo físico. No entanto, essa mesma mente dividida tem a capacidade, através do tomador de decisões, de escolher a qualquer instante determinado qual professor – o ego ou Jesus – vai nos guiar conforme “revemos mentalmente” os roteiros que “já se foram”. O “nós”, para afirmar novamente, não é o ser que chamamos de nós mesmos pelo nome, mas, ao invés disso, é o tomador de decisões em nossas mentes – fora do tempo e do espaço, e fora do ancestral roteiro do ego. E aqui a escolha certamente não é predestinada. Está, portanto, claro que a afirmação do Curso de que “o roteiro já foi escrito” não deve ser compreendida temporalmente de forma alguma, enquanto a visão tradicional da predestinação é, pois está baseada em uma decisão tomada por Deus no passado, que inevitavelmente será levada para o futuro.

36) Existe algo como livre arbítrio, e o que é isso de qualquer forma?

Essa pergunta precisa ser respondida em duas partes: 1) No Céu, não pode haver livre-arbítrio, pois, como o Filho de Deus poderia ser livre para escolher onde literalmente não há opções entre as quais fazer uma escolha? Em uma realidade não-dualista, que é o estado do Céu, existe apenas a perfeita Unicidade. É por isso que o Um Curso em Milagres afirma que a Vontade de Deus e a vontade do Seu Filho são uma e a mesma. E então, não pode haver nada mais, e, portanto, nada entre o que escolher. Além disso, o processo de escolha tem significado apenas dentro do mundo sujeito-objeto: um sujeito que escolhe entre diferentes objetos, todos percebidos e experienciados como fora da mente que escolhe. Portanto, o termo livre-arbítrio não tem significado aqui, a menos que seja usado como Um Curso em Milagres faz em uma parte, para se referir à liberdade de escolha, o título da seção no Capítulo 30. No entanto, nesse instante, o termo significa algo bem diferente da concepção usual de livre-arbítrio. No Céu, nossa vontade é livre porque não pode ser aprisionada, o que é uma afirmação que reflete o princípio da Expiação, de que a separação de Deus nunca aconteceu. Portanto, o Filho de Deus não pode ser verdadeiramente aprisionado por sua própria crença equivocada de que pecou contra seu Criador, e, portanto, foi feito prisioneiro da sua própria culpa. Lemos em diversas passagens:

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Como é maravilhoso fazer a tua vontade! Pois isso é liberdade. Não há nenhuma outra coisa que jamais deva ser chamada por esse nome. A não ser que faças a tua vontade, não és livre. E Deus iria deixar o Seu Filho sem aquilo que ele escolheu para si mesmo? Deus apenas garantiu que jamais perderias a tua vontade quando Ele te deu a Sua Resposta perfeita. Ouve-A agora, para que possas lembrar-te do Seu Amor e aprender a tua vontade. Deus não quer que o Seu Filho seja feito prisioneiro daquilo que ele não quer. Ele une-Se a ti na tua disponibilidade para ser livre. E opor-te a Ele é fazer uma escolha contra ti mesmo e escolher ser limitado (T-30.II.2).

No estado de santidade a vontade é livre, de forma que seu poder criativo é ilimitado e a escolha é sem significado (T-5.II.6:4-5).

Não é a tua vontade ser aprisionado porque a tua vontade é livre. É por isso que o ego é a negação da vontade livre. Nunca é Deus Quem te coage, porque Ele compartilha a Sua Vontade contigo. A Sua Voz só ensina de acordo com a Sua Vontade, mas não é essa a lição do Espírito Santo, porque isso é o que tu és. A lição é que a tua vontade e a de Deus não podem discordar, porque são uma só (T-8.II.3:2-8).

Quando finalmente aceitamos a Expiação para nós mesmos, despertando do sonho e, portanto, nos tornando manifestações do Espírito Santo, o reconhecimento de que nossas vontades são uma com a de Deus precisa inevitavelmente se seguir a isso.

2) Dentro do sonho, no entanto, que é o reino da percepção e da ilusão, o conceito de livre-arbítrio vem a ser extremamente importante e significativo, pois é o mecanismo da salvação. Em seu sonho, o Filho acreditou que tinha escolhido contra Deus, e colocou em movimento todo o drama da trindade profana – pecado, culpa e medo -, culminando na criação do universo físico como uma defesa contra a vingança irada percebida do Deus feito pelo ego. Portanto, dentro do sonho, o mesmo poder da mente do Filho de escolher contra Deus, agora precisa ser libertado para escolher por Ele. E então, Jesus afirma em várias passagens importantes:

Nesse mundo, a única liberdade restante é a liberdade de escolha, sempre entre duas opções ou duas vozes. A Vontade não está envolvida na percepção em nível algum e não tem nada a ver com a escolha (ET-1.7:1-4).

O poder da sua decisão lhe oferece isso conforme ele solicita. O Céu e o inferno estão nessa decisão. Ao Filho de Deus adormecido só resta esse poder (MP-21.3:6-8).

Tu escolheste estar em estado de oposição no qual opostos são possíveis. Como resultado, há escolhas que tens que fazer... A escolha depende de uma mente dividida (T-5.II.6:2-3,7-8).

Preferes ser um refém do ego ou o anfitrião de Deus? Só aceitarás a quem convidaste. Estás livre para determinar quem é o teu hóspede e por quanto tempo ele permanecerá contigo. No entanto, isso não é liberdade real, pois ainda depende do modo como o vês (T-11.II.7:1-5; grifos nossos).

Na verdade, poderíamos dizer que o propósito do Um Curso em Milagres é que Jesus nos ensine que realmente temos uma escolha dentro dos sonhos de separação e especialismo, e que essa escolha repousa dentro de nossas mentes. Aprendendo o significado do perdão, que é o de que nossa experiência do mundo é uma projeção da decisão em nossas mentes, que agora pode ser modificada, aprendemos a exercitar esse livre-arbítrio. Portanto, nós acabamos

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aprendendo e nos lembrando de que nossa verdadeira vontade esteve livre o tempo todo. Nós simplesmente nos esquecemos. E então, Jesus afirma: “O Espírito Santo te chama tanto para se lembrar [de Deus] quanto para se esquecer [do ego]” (T-5.II.6:1).

37) O quanto somos livres em nossas vidas diárias para agirmos em nossos melhores interesses, especialmente se, como Um Curso em Milagres diz, estamos todos alucinando?

Essa resposta começa onde a anterior termina. Dentro do sonho da nossa existência individual – a alucinação -, somos livres para escolher. No entanto, tal escolha não tem nada a ver com o que o mundo entende por escolha, especialmente quando pensamos que estamos tentando agir para nossos melhores interesses. Nós não podemos agir em nossos melhores interesses, porque, como o livro de exercícios nos lembra, “Eu não sei quais são meus melhores interesses” (LE-pI.24; grifos nossos). Esse é um aspecto crucial na compreensão do Curso, e a lição acima afirma o ponto claramente:

Em nenhuma situação que surja, reconheces qual é o resultado que te faria feliz. Portanto, não tens nenhum guia para a ação apropriada, e nenhum modo de julgar o resultado. O que fazes é determinado pela tua percepção da situação e essa percepção está errada. Assim, é inevitável que não sirvas aos teus maiores interesses. No entanto eles são a tua única meta em qualquer situação que seja corretamente percebida. De outra forma, não reconhecerás quais são eles.Se reconhecesses que não percebes os teus maiores interesses, seria possível ensinar-te o que eles são. Mas, na presença da tua convicção de que sabes, não podes aprender (LE-pI.24.1; 2:1-3).

Portanto, através de todo Um Curso em Milagres, Jesus nos incita a consultar tanto a ele quanto o Espírito Santo, pois Eles são os únicos Que realmente sabem quais são nossos maiores interesses. E esses, naturalmente, sempre envolvem a mudança da mente ou percepção, que refletem nossas decisões de perdoar, ao invés de atacar. Por conta própria, não podemos perdoar, sem falar em saber quais escolhas deveríamos fazer. No entanto, sempre somos livres para escolhermos nosso professor, e, nessa escolha, já agimos em nossos melhores interesses. E esse, e apenas esse, é o significado de livre-arbítrio dentro desse mundo de ilusão, pois é só a partir da mente certa que a escolha certa – nosso melhor interesse – pode resultar. Portanto, é assim que Jesus se dirige aos seus estudantes: “Renuncia agora do cargo de teu próprio professor... pois tens sido mal ensinado” (T-12.V.8:3; T-28.I.7:1), e ele pede que eles, ao invés disso, escolham o Professor Cuja sabedoria sempre vai ensiná-los corretamente.

38) Um Curso em Milagres diz que não existe amor sem ambivalência. Isso significa que nunca ajo a partir de um espaço amoroso, e que todos os meus pensamentos e ações vêm do meu ego?

Não, certamente que não. A afirmação específica no Curso é a seguinte:

Tu projetas no ego a decisão de te separares e isso conflita com o amor que sentes pelo ego pelo fato de o teres feito. Nenhum amor nesse mundo existe sem essa ambivalência, e como nenhum ego experimentou amor sem ambivalência, o conceito está além da sua compreensão. O amor penetrará de imediato em qualquer mente que o queira na verdade, mas é precisa que ela o queria verdadeiramente. Isso significa que ela o queira sem ambivalência e esse tipo de querer está totalmente isento da “compulsão para receber” que o ego tem (T-4.III.4:5-13).

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Essa passagem deixa muito claramente implícito que quando escolhemos a correção do Espírito Santo em nossas mentes certas – o instante santo -, e realmente liberamos nossos egos, podemos nos tornar um reflexo do amor, uma manifestação do Espírito Santo. Nesse caso, é realmente possível agir a partir de um espaço amoroso. De fato, o principal objetivo do Curso é fazer seus estudantes aprenderem a acessar suas mentes certas, o lar amoroso do Espírito Santo. No entanto, é preciso ter discernimento, pois com freqüência o amor especial do ego pode parecer idêntico ao Amor real do Espírito Santo. O “impulso para obter” inconsciente do ego – o cerne do especialismo – ainda é muito presente, e serve para mascarar a verdade com as mentiras inteligentes da ilusão.

Qualquer pensamento, palavra ou ato que proceda da mente errada, ainda que pareça amoroso, não pode ser assim. Portanto, avaliar qualquer interação pelas aparências só pode ser uma falta de discernimento que vêm da nossa necessidade de parecermos amorosos e compreensivos; em outras palavras, o que nossos egos iriam abençoar como comportamento “espiritualmente iluminado”. Nós não deveríamos subestimar a necessidade que cada um de nós tem de ser aceito pelos outros, porque queremos ser julgados por eles como amorosos. Essa necessidade se torna uma interferência poderosa na escolha de nossas mentes certas, onde repousa o único amor real.

Algumas vezes, a ação mais amorosa, emanando das nossas mentes certas, seria dizer “Não” para o pedido de alguém, incorrendo em seu desapontamento e raiva. É por isso que Jesus afirma:

Aprender esse curso requer disponibilidade para questionar todos os valores que manténs. Nenhum pode ser mantido oculto e obscuro sem pôr em risco o teu aprendizado. Nenhuma crença é neutra. Todas têm o poder de ditar cada decisão que tomas (T-24.in.2:1-4).

Vamos supor que um valor inconsciente que nossos egos mantenham é sermos populares e admirados por muitas pessoas, por sermos uma pessoa amorosa e atenciosa. Todo nosso roteiro de vida, então, emanando das nossas mentes erradas, se agita ao redor de sermos esse tipo de figura de sonho. Podemos alcançar nosso objetivo, mas a que custo? Estudantes do Um Curso em Milagres algumas vezes cometem o erro de julgarem pelas aparências e pela forma. Algumas vezes, a correção mais difícil para nós aceitarmos é irmos contra algum “valor acalentado” por nossos egos – acima de tudo, os modelos de relacionamentos de amor e ódio especiais. Se os estudantes puderem ser razoavelmente claros sobre o fato de terem exposto seus valores egóicos inconscientes, e terem a pequena disponibilidade de acessarem a correção em suas mentes certas – tirando a si mesmos do caminho -, então, serão manifestações do sistema de pensamento do Espírito Santo e não do ego.

Na verdade, nossa prática diária de perdão é o que nos permite estarmos cada vez mais em contato com essa amorosa Presença da verdade em nossas mentes divididas, para que nossos pensamentos, palavras e atos possam expressar essa verdade. Portanto, é certamente possível que nossas vidas venham de nossas mentes certas e não das erradas, do Espírito Santo e não do ego. É esse processo de refletir cada vez mais o amor ao invés do ego que nos traz ao portão do Céu, além do qual está o Amor de Deus.

39) Qual é o papel da meditação na prática do Um Curso em Milagres?

A meditação como tal não é parte integral do currículo do Curso, certamente, podemos ver as lições do livro de exercícios e o programa de treinamento de um ano como exercícios de meditação. Mas, novamente, eles são destinados apenas a um período de um ano. No entanto, Jesus nunca iria objetar a que seus estudantes passassem bastante tempo com ele, pedindo sua ajuda para remover os bloqueios da culpa e do ódio que interferem com sua consciência da sua presença amorosa. Apesar disso, ele especificamente previne os estudantes a não

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transformarem seus períodos regulares de prática espiritual em ídolos, ainda que eles ainda precisem de estrutura, parte da qual, naturalmente, poderiam ser momentos de meditação ou quietude:

Mas e aqueles que não alcançaram a sua certeza? Eles não estão ainda prontos para essa falta de estrutura da própria parte. O que precisam fazer para aprender a dar o dia a Deus? Existem algumas regras gerais que se aplicam, muito embora cada um deva usá-las da melhor forma possível à sua própria maneira. As rotinas como tais são perigosas, porque facilmente vêm a ser deuses em seu próprio direito, ameaçando aquelas mesmas metas em nome das quais foram estabelecidas (MP-16.2:1-8; grifos nossos).

Em “Eu não preciso fazer nada”, originalmente uma mensagem especial a Helen, Jesus especificamente discute como seu Curso não é um curso em meditação, mas, ao invés disso, tem um foco bem diferente. Isso não o torna necessariamente melhor do que outros caminhos, mas realmente estabelece o quanto é diferente deles:

Muitos passaram toda a vida em preparação e, de fato, atingiram os seus instantes de sucesso. Esse curso não pretende ensinar mais do que o que eles aprenderam no tempo, mas tem como objetivo economizar tempo... É extremamente difícil atingir a Expiação lutando contra o pecado. Um esforço enorme é gasto na tentativa de tornar santo o que é odiado e desprezado. Nem há necessidade de toda uma vida de contemplação e de longos períodos de meditação com o objetivo de desapegar-te do corpo. Todas essas tentativas, em ultima instância, terão sucesso devido a uma grande quantidade de tempo, pois todos procuram a liberação no futuro e partir de um estado de presente indignidade e inadequação.O teu caminho será diferente, não em relação ao propósito, mas ao meio... Não estás fazendo uso do curso se insistes em usar meios que serviram bem a outros, negligenciando aquilo que foi feito para ti (T-18.VII.4:4-8,9-13; 5:1; 6:5-7; grifos nossos em 4:9).

E então, os estudantes do Um Curso em Milagres seriam tolos em não meditarem, se essa prática for benéfica para seu caminho espiritual. E Jesus, novamente, dificilmente iria tentar dissuadi-los. No entanto, ele iria avisá-los, como já vimos, para não transformarem a prática meditativa em uma fonte de dependência. Ela deveria ser os meios, não o fim. Além disso, certamente seria um equívoco se esses estudantes sentissem que todos os estudantes do Um Curso em Milagres precisam meditar, simplesmente porque eles o fazem. Estudantes nunca deveriam se esquecer de que o currículo é altamente individualizado, e que seu currículo pessoal é combinado entre cada estudante individual e o Espírito Santo.

Existe outro aviso que devemos notar aqui, com relação à dependência e à meditação. O claro propósito do Um Curso em Milagres, e especificamente do livro de exercícios, é que os estudantes generalizem as lições e princípios a todos os aspectos de suas vidas diárias, o tempo todo. Estaria diretamente contra esse propósito que os estudantes precisassem se afastar por algum tempo de uma situação difícil para ficarem à parte e exteriormente quietos. Isso claramente nunca iria funcionar em meio a um congestionamento, uma reunião difícil, uma sessão psicoterapêutica, uma sala de aula, um carro cheio de crianças barulhentas, etc. Se a quietude não puder ser internalizada para que a pessoa saiba que Jesus ou o Espírito Santo estão sempre presentes na mente, então, a meditação real seria de pouco uso. Ao invés disso, os estudantes deveriam almejar generalizarem aqueles momentos quietos para todos os momentos, aprendendo o quanto seu verdadeiro Professor é acessível.

40) O que é o instante santo, e qual é seu papel na Expiação?

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Em certo sentido, entender o instante santo é um paralelo para entender a questão da meditação que discutimos acima. O instante santo não é um período de meditação no qual os estudantes têm uma “boa experiência”, e sentem a presença de Jesus ou do Espírito Santo. Pelo contrário, o instante santo é o termo do Curso para o instante – fora do tempo e do espaço – no qual escolhemos o Espírito Santo como nosso professor, ao invés do ego. É a correção do perdão para o “instante não santo” do ego, de julgamento e ataque, a experiência de desfazer nossa culpa através da ajuda de Jesus. É o propósito que faz o instante santo, e estabelece-o como uma parte integral do plano geral de Expiação para corrigir nossas percepções e pensamentos errôneos.

Além disso, o instante santo só pode ser compreendido como passos que damos através de toda a nossa vida, e que gradualmente nos levam para mais perto do mundo real, em um sentido, o instante santo último. Cada vez em que somos tentados a ouvir o conto de especialismo e necessidade de ataque do ego, somos lembrados por Jesus de que podemos escolher um milagre ao invés disso – “Que os milagres substituam todas as mágoas” (LE-pI.7:8) – e fazer com que ele nos ajude a fazer a mudança na percepção que constitui a essência do perdão, o cerne do instante santo. Em outras palavras, os instantes santos são os “pequenos passos” de perdão aos quais o Curso se refere como os meios para nos ajudar a desfazermos nossas ilusões, para que possamos alcançar nosso objetivo da verdade. Como lemos no Curso:

Face à noção insana de salvação do ego, o Espírito Santo gentilmente coloca o instante santo... O instante santo é o oposto da crença fixa do ego na salvação através da vingança do passado... No instante santo, o poder do Espírito Santo prevalecerá, porque te uniste a Ele... Libera os teus irmãos da escravidão das tuas ilusões, perdoando-os pelas ilusões que percebes neles. Assim, irás aprender que foste perdoado, pois foste tu que lhes ofereceste ilusões. No instante santo isso é feito para ti no tempo, para te trazer a verdadeira condição do Céu (T-16.VII.6:1-2,4-6; 7:3-5; 9:5-9).

41) O que Um Curso em Milagres quer dizer com “liberar seu irmão”? Como podemos salvá-lo se o mundo é uma alucinação na mente?

O leitor deveria se recordar da nossa discussão anterior, na questão 5, sobre o uso de metáforas feito por Jesus no Curso. Em outras palavras, os estudantes do Um Curso em Milagres precisam se permitir ser levados além da forma das suas palavras, para o conteúdo subjacente. Esse é um processo que acontece lentamente através do tempo, começando com uma compreensão mais literal dos ensinamentos do Curso. De início, portanto, frases como “liberar seu irmão”, ou algumas parecidas sobre sermos o salvador dos nossos irmão, ou a ênfase do livro de exercícios em sermos a luz do mundo, ajudam os estudantes a desfazerem sua auto-imagem negativa, tal como está resumido na Lição 93, do livro de exercícios:

Tu pensas que és o lar do mal, da escuridão e do pecado. Pensas que se alguém pudesse ver a verdade sobre ti ficaria repugnado e recuaria como se estivesse diante de uma cobra venenosa. Pensas que se o que é verdadeiro sobre ti mesmo te fosse revelado, serias abatido por um horror tão intenso que te precipitarias para a morte pela tua própria mão, pois continuar vivendo depois de ver isso seria impossível (LE-pI.93.1).

Essa é uma correção curativa para nos dizer que nossos pensamentos sobre nós mesmos não são verdadeiros, e que não apenas somos amados por Deus como uma extensão da Sua Vontade (como o resto da lição deixa claro), mas que temos o poder de curar e abençoar os outros também. É só quando progredimos em nosso trabalho com Um Curso em Milagres que se torna claro que o processo de “liberar” nosso irmão não tem nada a ver com nosso irmão,

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mas tem tudo a ver conosco mesmos. Na verdade, esse processo de perdão pode não ter nada a ver com nosso irmão, porque, na verdade, é o nosso sonho, e ele é apenas uma figura nesse sonho. Em uma passagem muito contundente, Jesus pergunta a seus estudantes:

O que aconteceria se reconhecesses que esse mundo é uma alucinação? O que aconteceria se compreendesses realmente que o inventaste? O que aconteceria se te desses conta de que aqueles que parecem perambular sobre ele, para pecar e morrer, atacar e assassinar e destruir a si mesmos, são totalmente irreais? (T-20.VIII.7:4-8).

Em outras palavras, nosso mundo e vidas são nossos sonhos, assim como nossos sonhos adormecidos – com todas as figuras e eventos – estão presentes apenas em nossas mentes adormecidas que, em certo sentido, só estão alucinando também. Além disso, uma vez que o conteúdo do sonho do ego é o medo, ódio, vitimação e falta de perdão, todas as figuras do sonho terão os temas acima delineados no roteiro através do sonho que chamamos de “vida”. Portanto, não existe ninguém para perdoar porque, novamente, todas as pessoas em nossas vidas são simplesmente figuras inventadas em nossos sonhos. Quem precisa ser perdoado somos nós mesmos – por sonharmos para início de conversa, ao invés de nos lembrarmos da nossa identidade como Cristo, despertos em Deus.

Nossa função de “liberar nossos irmãos” através do perdão está relacionada à função e processo que realmente acontece dentro de nossas mentes – o lar dos sonhos -, embora seja experienciado por nós como acontecendo entre dois indivíduos separados. Escolhendo Jesus como nosso professor ao invés do ego, ouvindo sua voz de perdão ao invés da voz de ataque do ego, nos unimos a ele como expressões da Alternativa que está na mente de todos. E, portanto, nos tornamos os lembretes para nossos irmãos de que eles podem fazer a mesma escolha que fizemos e, dessa forma, serem liberados da sua culpa, uma vez que ambos estabelecemos um ao outro no roteiro dos nossos sonhos respectivos. Portanto, podemos escolher tanto os símbolos da culpa quanto os do perdão para um ou outro. Esse processo de cura através do perdão é resumido nessa passagem maravilhosamente clara do manual para professores, que discute o papel do professor de Deus, quando confrontado pela doença:

O professor de Deus vem a eles [os doentes] para representar uma outra escolha que haviam esquecido. A simples presença de um professor de Deus é um lembrete... Eles representam a Alternativa. Como o Verbo de Deus em suas mentes, eles vêm para abençoar, não para curar os doentes, mas para lembrar-lhes do remédio que Deus já lhes deu... Com muita gentileza apelam para os seus irmãos para que se afastem da morte: “Contempla tu, Filho de Deus, o que a Vida pode te oferecer. Escolherias a doença em lugar disso?” (MP-5.III.2:1-3,7-10,12-14).

Portanto, nós salvamos o mundo e todos nele salvando ou mudando nossos pensamentos em relação ao mundo. Liberando a nós mesmos da nossa própria culpa, liberamos o mundo porque somos um com ele, uma vez que ele é nossa projeção. É isso o que o Curso quer dizer quando fala: “te ergueste com ele [Jesus], quando ele começou a salvar o mundo” (ET-6.5:6-7). Nossas mentes são uma, e o fato de Jesus permanecer um com o Espírito Santo se torna o lembrete brilhante na mente da Filiação para fazermos o mesmo. Fazermos essa escolha nos permite sermos a manifestação de Jesus para nossos irmãos, assim como ele é a manifestação do Espírito Santo para todos nós (ET-6.5:1-2). É esse chamado para se lembrar e escolher que realmente libera e cura.

42) O que Um Curso em Milagres quer dizer com “perdoar seu irmão”? E se ele não aceitar o perdão, ou não estiver mais fisicamente presente? Isso significa que não posso mais perdoá-lo?

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Nossa resposta é uma continuação da resposta da questão anterior. Somos solicitados no Curso a perdoarmos os outros pelo que eles não fizeram a nós. Isso é compreendido apenas lembrando-se de que na verdade, não existe ninguém lá fora para perdoar. O que nós realmente perdoamos (ou liberamos) são as projeções de culpa que colocamos sobre as figuras em nossos sonhos, que delineamos para serem nossos parceiros de amor ou ódio especial. Portanto, não importa se essas pessoas estão fisicamente presentes, nos conheçam pessoalmente, ou até mesmo se já morreram. Elas continuam presentes em nossas mentes através de nossos pensamentos que não perdoam, e a oportunidade de pedirmos ajuda para perdoar esses pensamentos e imagens projetadas sempre permanece.

Os efeitos do nosso perdão também estão sempre totalmente presentes em nossas mentes, unidos às mentes dos outros. Se as outras pessoas escolherem não aceitarem nosso perdão em nossos sonhos, o pensamento curado em nossas mentes não será menos eficiente. Como o Curso ensina, o Espírito Santo guarda esse perdão nas mentes dos outros até que estejam prontos para aceitá-lo. Esse é o processo a que Jesus está se referindo também quando nos diz, no Curso:

Eu guardei toda a tua benignidade e todos os pensamentos de amor que jamais tiveste. Eu os tenho purificado dos erros que escondiam a luz que estava neles e os tenho conservado para ti na radiância perfeita que lhes é própria. Eles estão além da destruição e da culpa (T-5.IV.8:2-6).

Da mesma forma, ele guarda nossos pensamentos amorosos em relação aos outros, e o guarda até que eles estejam prontos para aceitá-los por si mesmos.

43) Como podemos saber a diferença entre o Espírito Santo e o ego?

Começamos com uma afirmação do Curso. Ela está em “O teste da verdade”, no Capítulo 14 do texto, e é a resposta a essa pergunta, dada no contexto do discernimento entre as “lições escuras” do ego e as “lições brilhantes” do Espírito Santo:

Tens um teste, tão certo quanto Deus, para reconheceres se o que aprendeste é verdadeiro. [1] Se estás totalmente livre de qualquer tipo de medo e [2] se todos aqueles que se encontram contigo ou até mesmo pensam em ti compartilham a tua paz perfeita, então podes estar seguro de que aprendeste a lição de Deus e não a tua própria (T-14.XI.5:1-6)

Em outras palavras, Jesus está provendo seus estudantes com dois critérios com os quais podem avaliar se escolheram o ego ou a ele como seu professor. O primeiro lida apenas com estudantes individuais, quer estejam ou não em paz. O segundo envolve outras pessoas, que vivem e trabalham conosco, sem mencionar todas as outras pessoas. Todos nós teríamos que admitir que é relativamente simples nos iludirmos para pensarmos que escolhemos o Espírito Santo quando na verdade escolhemos nosso próprio especialismo. Mas é muito difícil enganar outras pessoas, especialmente aquelas que nos conhecem bem e nos vêem regularmente durante um grande período de tempo. Incidentalmente, estudantes do Um Curso em Milagres algumas vezes imaginam se o segundo critério deveria excluir Jesus, uma vez que obviamente a figura Bíblica (que, a propósito, nunca deveria ser confundida com o Jesus histórico – veja questão 52, na página 60, abaixo) foi crucificada por pessoas zangadas, que bem claramente não “compartilhavam da sua perfeita paz”. No entanto, deveríamos entender que essa situação significa que as pessoas podem experienciar sua paz perfeita, mas se sentirem tão ameaçadas por ela que tentem atacar a ela e a você. Mas elas não fariam isso se primeiro tivessem experienciado essa paz como autêntica, e depois se sentissem ameaçados por ela.

Esse teste da verdade é aplicável aos estudantes ao longo da vida porque, novamente, é difícil enganar os outros ou até a si mesmo durante um período de tempo. No entanto, em

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qualquer instante determinado no qual alguém deseje saber qual professor foi consultado, é quase impossível saber com certeza. Como todos os estudantes do Um Curso em Milagres já sabem, e como já comentamos, o ego pode de maneira bem enganadora posar como o Espírito Santo. Dado o tremendo investimento que todas as pessoas desse mundo têm em manter seu especialismo, não deveria ser surpresa que isso aconteça assim. Nessa passagem muito importante, Jesus previne seus estudantes sobre subestimarem o poder do seu especialismo de mascarar a Voz do Espírito Santo. Ela é de uma das principais seções no texto que lidam especificamente com a natureza ameaçadora do especialismo:

Tu não és especial. Se pensas que és e queres defender o teu especialismo contra a verdade do que realmente és, como podes conhecer a verdade? Que resposta que o Espírito Santo te dê pode alcançar-te, quando é ao teu especialismo que escutas e é ele que pergunta e responde? Tudo o que tu escutas é a sua resposta diminuta, que não tem nenhum som na melodia que transborda de Deus para ti eternamente louvando com amor o que és. E essa imensa canção de honra e amor pelo que tu és parece silenciosa e inaudível diante da sua “magnificência”. Tu te esforças para que teus ouvidos ouçam a sua voz sem som e, no entanto, o Chamado do próprio Deus é insonoro para ti.Podes defender o teu especialismo, mas nunca ouvirás a Voz que fala por Deus ao seu lado (T-24.II.4; 5:1-2; grifos nossos).

Portanto, nossa resposta a essa pergunta é afirmar que por causa da super-identificação dos estudantes com seus egos, é realmente a pergunta errada a se fazer. Ao invés disso, o foco deveria estar em eliminar a interferência a ouvirmos a Voz do Espírito Santo, o que então iria permitir que a Voz por Deus fosse Ela Mesma. Portanto, a pergunta deveria ser: “Por que eu não pratico as lições de perdão que o Espírito Santo me pede para praticar, para que eu possa ouvir melhor Sua Voz?”. Com essa nova questão, o foco agora é mudado para eliminar o problema para que a Resposta possa ser dada a nós. Como Jesus exorta seus estudantes:

A tua tarefa não é buscar o amor, mas simplesmente buscar e achar todas as barreiras que construíste dentro de ti contra ele. Não é necessário buscar o que é verdadeiro, mas é necessário buscar o que é falso (T-16.IV.6:1-4).

E, voltando ao “O teste da verdade”, vemos Jesus fazendo a mesma afirmação aos seus estudantes que se desesperam sobre serem capazes de realmente ouvirem o Espírito Santo, dada a força do seu investimento nas “lições escuras” do seu ego:

Não te preocupes acerca de como poderás aprender uma lição tão completamente diferente de tudo o que ensinaste a ti mesmo. Como poderias saber? A tua parte é muito simples. Só precisas reconhecer que tudo o que aprendeste, tu não queres. Pede para ser ensinado e não uses as tuas experiências para confirmar o que aprendeste. Quanto a tua paz é ameaçada ou perturbada, de qualquer forma, dize a ti mesmo:

Eu não conheço o significado de coisa alguma, inclusive disso. E, portanto, eu não sei como responder a isso. E não vou usar o meu próprio aprendizado passado como a luz que há de me guiar agora.

Com essa recusa de tentares ensinar a ti mesmo o que não conheces, o Guia que Deus te deu vai falar contigo. Ele tomará o Seu lugar de direito na tua consciência no instante em que tu o abandonares e ofereceres a Ele (T-16.XI.6).

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O foco primário do Curso de Jesus está sempre em remover as interferências à consciência da presença do amor (texto, introdução; T-in.1:7), e não no amor em si mesmo. E então, mais uma vez, o foco dos estudantes deveria permanecer em pedir ajuda a Jesus para deixar de lado o sistema de pensamento do seu ego, ao invés de pedir ajuda ou orientação diretamente a ele com as coisas no mundo. Finalmente, citamos uma importante passagem no texto que ressalta essa ênfase principal:

A tarefa do trabalhador de milagres... se torna negar a negação da verdade (T-12.II.1:5).

A “negação da verdade”, é claro, é o sistema de pensamento do ego, que nega a verdade de Deus. Nossa responsabilidade é pedirmos ajuda ao Espírito Santo para “negarmos” a validade do que o ego ensina, dessa forma afirmando Sua verdade da Expiação.

44) É um mau sinal se eu não “ouvir” a Voz Interior? Isso significa que não estou sendo um bom estudante do Um Curso em Milagres?

Na verdade, dentro do sonho, existem literalmente duas “vozes interiores” – uma da mente errada (o ego) e outra da mente certa (o Espírito Santo), e as diferenças entre elas, como já vimos, não podem ser facilmente discernidas como os estudantes poderiam esperar e acreditar. Para manter sua individualidade e singularidade, cada membro da Filiação ouviu a voz do ego e seguiu seu plano. Uma visão superficial da história desse planeta, juntamente com suas questões atuais, vai testificar e testemunhar muito um fato como esse.

Na verdade, não é a coisa mais fácil no mundo ser capaz de “ouvir” a Voz por Deus, o termo do Curso para o Espírito Santo. De fato, o próprio Um Curso em Milagres diz que “muito poucos podem ouvir a Voz de Deus de qualquer maneira que seja, e mesmo estes não podem comunicar as Suas mensagens através do Espírito Que as deu” (MP-12.3:2-5). Nosso investimento no especialismo e a necessidade de mantermos nossa individualidade, quase sempre inconsciente, tornam muito difícil ouvir a Voz que fala pelo desfazer do especialismo. Na questão anterior, citamos uma passagem que se direciona explicitamente para esse problema. Com freqüência demais, estudantes sinceros do Um Curso em Milagres são convencidos de que estão ouvindo a Voz do Espírito Santo, quando tudo o que estão realmente ouvindo é seus próprios egos exaltando seu especialismo e singularidade,dentro da moldura do que eles querem acreditar que é uma missão especial.

Outra fonte de compreensão errônea para muitos estudantes do Um Curso em Milagres é a Identidade específica da Voz do Espírito Santo. Uma pessoa não falha com o Curso se uma “Voz” não é ouvida internamente, como Helen ouvia. Além do mais, não deveríamos tentar limitar como e de que maneira o Espírito Santo pode nos atingir. Por exemplo, um sonho à noite, uma conversa com um amigo, um pensamento intuitivo, um livro que lemos, uma aula que assistimos – tudo pode ser usado pelo Espírito Santo para nos apresentar uma correção para nosso pensamento da mente errada.

Em conclusão, para reafirmar esse ponto importante, podemos dizer que o único critério para ser um “bom” estudante do Curso é ter a pequena disponibilidade de aprender as lições do Espírito Santo para desfazermos nossos egos através do perdão. Ouvir especificamente uma voz interior – novamente, como fez Helen – pode, portanto, ser entendido como irrelevante nesse contexto.

45) Jesus e o Espírito Santo me enviam minhas lições?

Não, não enviam. Aqui novamente, vemos um exemplo de estudantes tomando as palavras do Um Curso em Milagres literalmente. O resultado disso é que as conclusões tiradas são o oposto exato do que Jesus está realmente ensinando em seu Curso. Para nos certificarmos, existem passagens com palavras afirmando que o Espírito Santo (ou Jesus) provê lições para

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nós, envia pessoas até nós, ou que somos enviados aos outros. No entanto, é essencial que os estudantes do Um Curso em Milagres, se quiserem crescer em seu aprendizado e prática dos seus princípios, compreendam que afirmações como essas – claramente a minoria quando comparadas com o ensinamento total do Curso – são destinadas a atingirem aqueles que basicamente estão apenas iniciando sua jornada espiritual com o Curso. E então, Jesus exprime seus ensinamentos em palavras que seus estudantes – sempre citados como crianças (ou algumas vezes como ainda mais jovens) – possam entender sem medo.

Nossa experiência é a de que somos parte desse mundo físico, assim como acreditamos que Deus é. Existe, por exemplo, essa própria linha importante no texto, que já citamos: “Tu não podes nem mesmo pensar sobre Deus sem um corpo, ou em alguma forma que penses reconhecer” (T-18.VIII.1:7). Portanto, como já discutimos na questão 5, não seria útil nem prático para Jesus impor um nível de explicação além da capacidade de compreensão dos seus estudantes. Como ele afirma muito claramente no livro de exercícios: “Pois quem pode compreender uma linguagem muito além da sua simples apreensão?” (LE-pI.192.2:2). Portanto, podemos reconhecer novamente que Jesus usa a linguagem para servir como uma ponte do nível das experiências dos seus estudantes para a sua verdade.

De fato, o Espírito Santo ou Jesus não fazem nada no mundo, porque toda a correção e cura ocorrem no nível da mente. “Não há mundo!”, como Jesus afirma enfaticamente no livro de exercícios: “Esse é o pensamento central que o curso tenta ensinar” (LE-pI.132.6:2-3). A presença de Jesus existe apenas dentro de nossas mentes, uma vez que isso é tudo o que existe. Idéias não deixam sua fonte, e então, o sonho nunca deixou a mente do sonhador, não importando o quão forçosamente real o mundo pareça para nós. Isso é similar à experiência que todos têm quando estão dormindo, à noite, sonhando. Enquanto está adormecido, o sonhador realmente acredita que as atividades que acontecem no sonho são bem reais, e reage de acordo com os sentimentos de felicidade, medo, alegria ou ansiedade, sem mencionar concomitantes físicos também, tais como taquicardia, respiração excessiva, etc. No entanto, depois de acordar, o sonhador percebe que “era só um sonho”. Similar ao que discutimos acima, na questão 22, na página 26, compreendemos que nada aconteceu fora da mente do sonhador, que conteve as diversas imagens e símbolos que pareciam ser tão reais. Como Jesus repetidamente aponta no Curso, não existe diferença alguma entre nossas experiências enquanto estamos adormecidos ou acordados. Ambos são simplesmente sonhos acontecendo dentro de um sonho mais amplo de separação. Como ele diz, no texto:

Todo o teu tempo é gasto em sonhar. Os teus sonhos, quando estás dormindo, e os teus sonhos, quando estás acordado, têm formas diferentes e isso é tudo. Seu conteúdo é o mesmo. Eles são o teu protesto contra a realidade e atua idéia fixa e insana de que podes mudá-la. Nos teus sonhos quando estás acordado, o relacionamento especial tem um lugar especial. Ele é o meio pelo qual tentas fazer com que os teus sonhos, enquanto estás dormindo, venham a ser verdadeiros (T-18.II.5:16-23; grifos nossos).

E então, não faria sentido para nosso sábio professor interno, Jesus, cair na mesma armadilha que o mundo, de tornar o erro real, vendo problemas existentes lá, e, portanto, suas soluções também. No entanto, enquanto acreditarmos que estamos aqui, com problemas e respostas aqui, nossa experiência será a de que nossa ajuda estará aqui também. A presença amorosa de Jesus em nossas mentes certas – uma mente que temos negado – vai inevitavelmente ser experienciada no corpo e no mundo, ainda que ele não esteja lá. Participando do processo de perdão, estudantes do Um Curso em Milagres gradualmente percebem que eles são os sonhadores e não o sonho, e que sua existência está na mente e não no corpo. Eventualmente, a percepção também acontece de que Jesus ou o Espírito Santo estão apenas dentro de suas mentes.

E qual é Sua função dentro da mente? Para reafirmar o que discutimos antes, Sua função é simplesmente lembrar o Filho de Deus de que ele fez uma escolha errônea (escolhendo o ego

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como seu professor), e agora pode fazer a correta. Sua atenção, via milagres, foi restaurada à sua mente, onde a decisão errada foi tomada, e a presença do Espírito Santo o lembra de que ele pode escolher outra vez. No início do texto, Jesus descreve o funcionamento do Espírito Santo dessa forma:

A Voz do Espírito Santo não comanda, pois é incapaz de arrogância. Não exige, porque não busca o controle. Não vence, porque não ataca. Simplesmente lembra. É capaz de compelir devido apenas ao que ela te relembra. Traz à tua mente o outro caminho, permanecendo quieta mesmo em meio ao tumulto que possas fazer (T-5.II.7:1-6).

E então, nós – o tomador de decisões em nossas mentes - somos aqueles que escrevem e escolhem nossos roteiros, e o papel de Jesus é nos lembrar de que podemos fazer outra escolha na forma de olharmos para o que temos escolhido. Esse olhar com seu amor ao nosso lado é o cerne do significado de perdão do Curso. Somos nós que escolhemos errado e, portanto, somos nós que precisamos escolher de outra forma, como Jesus nos exorta no fim do texto:

As provações são apenas lições que falhaste em aprender, apresentadas mais uma vez de forma que onde antes fizeste uma escolha faltosa agora possas fazer outra melhor e assim escapar de toda a dor que o que escolheste antes trouxe a ti. Em toda dificuldade, toda aflição e a cada perplexidade, Cristo te chama e gentilmente diz: “Meu irmão, escolhe outra vez” (T-31.VIII.3:1-6).

Novamente, não é o Espírito Santo que nos traz vagas para estacionar, envia certas pessoas para serem ajudadas por nós ou para que sejamos ajudados, ou faz com que sejamos estuprados como uma lição de perdão, como uma pobre estudante do Um Curso em Milagres acreditou sobre uma experiência muito dolorosa em sua própria vida. Tais pensamentos equivocados sobre o Espírito Santo, além de terem implicações potencialmente trágicas, ajudam os estudantes a evitarem a responsabilidade por suas próprias escolhas, transferindo-os para o Espírito Santo ou Jesus. E então, eles justificam tais percepções equivocadas citando – fora de contexto! – passagens do Curso para apoiar suas posições de especialismo.

E então, é extremamente importante afirmar esse ponto mais uma vez, para que estudantes do Um Curso em Milagres não confundam a forma do ensinamento do Curso com seu conteúdo subjacente. De outro modo, o crescimento não vai ocorrer, e eles iriam permanecer para sempre nos níveis mais baixos da sua jornada subindo a escada espiritual que o Curso provê. Portanto, o propósito para que seja dito aos estudantes que o Espírito Santo faz coisas por eles no mundo, é ser curado do sistema de pensamento básico do ego que ensina que não existe Espírito Santo, e mesmo se houvesse, Ele certamente não seria uma Presença amigável, que iria confortá-los e guiá-los. Portanto, não são as palavras (a forma) que são o verdadeiro ensinamento do Curso, mas seu significado subjacente (o conteúdo). O propósito de Jesus ao usar essa linguagem metafórica é ajudar seus estudantes a desfazerem os pensamentos do ego de que um Deus irado e vingativo vai puni-los por seu pecado.

Uma vez que a crença em que Deus (ou o Espírito Santo, ou Jesus) é nosso inimigo é corrigida, somos capazes de avançar ao longo dos próximos passos de nossa jornada. Isso inclui o reconhecimento crescente, conforme abordamos o fim da jornada, da realidade essencialmente abstrata da presença do Espírito Santo e de Jesus em nossas mentes divididas. O que está em questão aqui é o ponto crucial de continuar lenta e pacientemente ao longo do caminho espiritual, minimizando o medo inevitável de eventualmente liberar a própria identidade individual. Como Jesus tão gentilmente nos conforta, usando a metáfora dos sonhos:

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O Espírito Santo, sempre prático em Seu juízo, aceita os teus sonhos e os usa como um meio de fazer com que despertes. Tu os terias usado para permaneceres adormecido. Eu disse anteriormente que a primeira mudança, antes dos sonhos desaparecerem, é que os teus sonhos de medo são transformados em sonhos felizes. É isso o que o Espírito Santo faz no relacionamento especial. Ele não o destrói, nem o arranca de ti. Mas Ele o usa de um modo diferente, como uma ajuda para fazer com que o Seu propósito seja real para ti. O relacionamento especial permanecerá, não como uma fonte de dor e culpa, mas como uma fonte de alegria e liberdade... No teu relacionamento, o Espírito Santo gentilmente colocou o mundo real, o mundo dos sonhos felizes, dos quais o despertar é tão fácil e tão natural (T-18.II.6:1-11; 9:4-6).

Portanto, estudantes não são solicitados a progredirem diretamente dos pesadelos ilusórios dos relacionamentos especiais para a realidade do relacionamento único com Deus, mas com Jesus como seu guia, eles primeiro passam através dos sonhos ilusórios de perdão. Esses sonhos felizes desfazem a interferência do ego, o que então permite que o Amor de Deus retorne à sua consciência. Portanto, como estudantes do Um Curso em Milagres, eles primeiro aprendem que Deus é um Pai amoroso ao invés de um cheio de ódio, e que o Espírito Santo é uma companhia confortadora para eles no mundo, ao invés de seu inimigo. Apenas então eles podem aprender que não existe, de fato, nenhum mundo no qual Eles nos confortem. Metáforas serviram ao seu propósito, e agora podem dar lugar à simples verdade da Unicidade em Deus, que repousa além de todas as palavras, e que é o objetivo último do Um Curso em Milagres.

46) Se Deus nem mesmo sabe nada sobre nós ou o mundo, qual é o significado ou propósito da oração?

Oração no sentido tradicional não tem lugar na teoria ou prática do Um Curso em Milagres. Para a maioria das religiões formais, a pessoa que ora implora a um Deus percebido do lado de fora de si mesmo, para que interceda, intervenha ou de outra forma, esteja envolvido em um problema percebido como afetando a si mesmo e aos outros.

O problema é, portanto, sempre visto como estando do lado de fora da mente, e fora da habilidade da pessoa de resolvê-lo. E Deus, no sentido visto nas peças gregas clássicas, é percebido como deus ex machina (literalmente significando “Deus fora da máquina”), que súbita e bem magicamente entra em nossos mundos para consertar o que está errado, assim como era feito nas performances das antigas peças, quando uma máquina real aparecia no palco, carregando o deus que fazia todas as coisas certas no final. Se Deus agisse dessa forma (incluindo, é claro, Jesus ou o Espírito Santo, Seus representantes no sonho), então, Ele estaria violando a “diretiva principal” do Curso (para emprestar um termo de Star Trek) que é não tornar o erro real (T-9.IV.4:1-6; C-2.I.3:3-4), o que tentar consertar um problema ilusório em um mundo ilusório certamente faria.

É por isso que Jesus afirma logo no início do texto que “a única oração significativa é pelo perdão, porque aqueles que foram perdoados têm tudo” (T-3.V.6:3). E, é claro, pedir ajuda ao Espírito Santo para acessarmos nossas mentes certas é uma forma dessa oração. O perdão desfaz o pensamento equivocado na mente de que realmente existe um problema que tem que ser resolvido. O problema real, naturalmente, é a crença de que existe um problema para início de conversa. E então, precisamos não rezar para uma figura externa remover problemas externos. Ao invés disso, rezamos por ajuda para nos lembrarmos de que realmente existe apenas um único problema (a crença na separação) e uma única solução (Expiação) e, além disso, esse problema já foi resolvido (LE-pI.79,80). A resposta só espera por nossa aceitação.

Para uma análise mais completa do assunto da oração, o leitor pode ler o panfleto, A Canção da Oração, especificamente a primeira seção, chamada “Oração”.

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47) Parece que as coisas estão piorando desde que comecei a trabalhar com Um Curso em Milagres. Isso é comum? Estou fazendo alguma coisa errada?

Embora sempre seja difícil responder às experiências individuais dos estudantes sem saber muito mais sobre eles, ainda existem algumas observações gerais que podemos fazer. É realmente o caso que com muitos estudantes do Um Curso em Milagres, seu trabalho com ele parece intensificar os conflitos do ego ao invés de aliviá-los. De fato, o que freqüentemente está acontecendo é que os pensamentos do ego que foram negados durante tanto tempo, agora estão sendo levados à consciência – um exemplo do princípio importante do Curso de trazer a ilusão à verdade, ou a escuridão à luz – para que possam ser vistos com Jesus ou o Espírito Santo, e depois liberados. Uma vez que é o medo que mantém nossa culpa negada, elevar essa culpa à consciência – sempre expressada em algum aspecto de especialismo -, vai inevitavelmente levar a uma experiência de medo. É isso o que está tencionado por essas duas poderosas afirmações no texto que especificamente estão dirigidas a essa experiência. A primeira está relacionada à nossa escolha de Jesus como nosso guia, ao invés do ego, e a resposta zangada do ego a tal ameaça percebida:

Queres conhecer a Vontade de Deus para ti? Pergunta a mim, que a conheço por ti e a acharás. Nada te negarei, assim como Deus não me nega nada. A nossa jornada é simplesmente a jornada de volta a Deus, que é a nossa casa. Sempre que o medo se introduzir em qualquer lugar ao longo da estrada para a paz, isso se deve ao ego ter tentado unir-se a nós nessa jornada, e não poder fazê-lo. Sentindo a derrota e enraivecido por isso, o ego se considera rejeitado e vem a ser vingativo (T-8.V.5:1-8; grifos nossos).

A segunda passagem, da seção “As duas avaliações”, explica a reação do ego quando escolhemos a avaliação amorosa do Espírito Santo sobre nós mesmos, ao invés da sua, não amorosa:

Tu tens, então, duas avaliações conflitantes de ti mesmo na tua mente e elas não podem ser ambas verdadeiras. Tu ainda não te dás conta do quanto essas avaliações são completamente diferentes, porque ainda não compreendes quão elevada a percepção que o Espírito Santo tem de ti realmente é. Ele não é enganado por nada do que fazes, porque Ele nunca esquece o que és. O ego é enganado por tudo o que fazes, especialmente quando respondes ao Espírito Santo, porque nestas ocasiões a sua confusão aumenta. O ego, portanto, é particularmente capaz de atacar-te quando reages amorosamente, porque te avaliou como não sendo amoroso e tu estás indo contra o seu julgamento. O ego atacará os teus motivos logo que eles passem a estar claramente em desacordo com a sua percepção de ti. É aí que ele vai se deslocar abruptamente da suspeita para a perversidade, uma vez que a sua incerteza terá aumentado (T-9.VII.4:1-14; grifos nossos).

As duas passagens não devem ser entendidas literalmente, no sentido de que o ego realmente acredita e sente essas coisas que são atribuídas a ele. Jesus atribui forma humana ao ego no Curso para que seja mais fácil para seus estudantes entenderem sua dinâmica. Como ele explica logo no início do texto:

Eu tenho falado do ego como se fosse uma coisa separada, agindo por conta própria. Isso foi necessário para persuadir-te de que tu não podes despedi-lo facilmente e não podes deixar de reconhecer quanto do teu pensamento é dirigido pelo ego (T-4.VI.1:3-7).

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A “retaliação” e “crueldade” do ego são simplesmente metáforas que descrevem o medo dos estudantes quando confrontados pela ameaça ao seu próprio especialismo e identidades individuais. A presença amorosa de Jesus dentro do nosso sonho, refletindo a avaliação que o Espírito Santo faz de nós, representa o cerne dessa ameaça ao sistema de pensamento do ego. Esse medo é o que leva à defesa da projeção, que precisa assumir a forma tanto de se comportar ou pensar de forma cruel em relação a outro (raiva), quanto em relação a si mesmo (doença). São esses “ataques egóicos” de raiva ou dor que levam à percepção e experiência de que as “coisas estão piorando”.

Em resumo, então, podemos freqüentemente ver que esses períodos difíceis – citados no manual para professores como “períodos de deslocamento” – podem ser “bons sinais”; i.e., que os estudantes estão realmente progredindo em sua jornada de perdão com o Curso. No entanto, isso de forma alguma deveria ser visto como significando que esse é sempre o caso. Estudantes precisam aprender a discernir esses sinais “positivos” dos “negativos”, onde eles podem estar ainda mais mergulhados no inferno do ego, e então, iriam precisar de alguma ajuda externa. Esses estudantes, em particular, que se colocam no papel de professor ou terapeuta do Um Curso em Milagres, e não têm treinamento ou experiência supervisionada nessas áreas, têm que ser vigilantes contra suas próprias necessidades especiais de interferirem com a aplicação do julgamento sonoro em circunstâncias onde outra pessoa está com problemas sérios, e precisando muito de ajuda. Infelizmente, durante um período de muitos anos, temos observado muitas conseqüências trágicas e dolorosas de pessoas não treinadas servindo como conselheiras e terapeutas de outras que estavam com sérias dificuldades emocionais. Suas intervenções algumas vezes exacerbaram o problema ao invés de aliviá-lo, até mesmo ao ponto de precipitarem colapsos nervosos que exigiram hospitalização.

48) Se eu praticar fielmente o Um Curso em Milagres vou desaparecer?

Essa é uma preocupação muito comumente expressa por estudantes do Curso, e reflete a mesma confusão de níveis sobre a qual já comentamos mais cedo. O Nível Um, que é nosso termo para a fundação metafísica do Curso, é inflexível em não ver reconciliação entre a verdade e a ilusão, a eternidade e o tempo. Nesse nível, não se leva tempo para retornar à ausência de forma do Céu, porque nunca o deixamos. Para recordar essa linha importante e anteriormente citada: “Tu estás em casa em Deus, sonhando com o exílio”. Nossa “jornada sem distância” (T-8.VI.9:7) não requer tempo para ser completada. No Nível Dois, no entanto, que reflete nossa experiência temporal dentro do sonho, nossa jornada para casa leva tanto tempo quanto precisarmos. De fato, cedo no texto, Jesus observa que o fim coletivo do sonho vai acontecer dentro de “milhões” de anos (T-2.VIII.2:5), certamente sugerindo que ele está consciente da necessidade de desfazermos o medo do Filho de forma lenta e gentil. Na verdade, como já vimos, muitas, muitas passagens no Um Curso em Milagres refletem essa consciência. Portanto, estudantes deveriam se sentir confortados por uma linha como a seguinte, que indica que seus medos de desaparecerem “no Coração de Deus” são sem fundamento:

Não tenhas medo de ser abruptamente erguido e jogado na realidade (T-16.VI.8:1).

O processo de crescimento que é sustentado pelo Um Curso em Milagres é sempre gradual, sob a orientação gentil e paciente de Jesus ou do Espírito Santo. Usando suas próprias palavras, podemos falar de um “programa lento de treinamento evolutivo” que é um “processo muito lento” (MP-9.1:7; 2:4). Estudantes do Um Curso em Milagres deveriam ter cuidado com aqueles que os aconselham a “acelerar” esse processo de perdão. Enquanto no nível mais amplo, a espiritualidade do Um Curso em Milagres realmente economize tempo, Jesus repetidamente enfatiza que existe uma ênfase muito diferente no nível da experiência individual. Lá, os estudantes precisam prosseguir lenta e gentilmente, de outra forma, como

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indicado acima, vão precipitar um ataque de pânico. Essa mesma preocupação da parte de Jesus é expressa no final do Capítulo 1 no texto, onde ele incita seus estudantes a se preparem para as últimas partes de sua jornada, para que não fiquem “com medo demais” e suas experiências sejam “traumáticas”.

E então, os estudantes do Um Curso em Milagres não precisam ter medo de perderem sua identidade ou individualidade. Conforme eles progridem em seu estudo e prática do Curso, o que vão perder será sua culpa, ansiedade, depressão, medo, etc., e o que vão descobrir é que estarão aprendendo a “sorrir mais freqüentemente” (LE-pI.155.1:2). O “passo final”, que pertence a Deus, através do qual Ele desce e “nos eleva até Ele”, não acontece até que tenhamos completado todos os “pequenos passos que Ele pede [a nós] para darmos com Ele” (LE-pI.193.13:7).

Em conclusão, portanto, “iluminação instantânea” não é algo que Um Curso em Milagres ensina, assim como o “relacionamento santo” e o “mundo real” não são alcançados em um ano. A espiritualidade do Curso está além dos chavões e posturas que a mente do ego conjura. Não há nada em Um Curso em Milagres que iria reforçar tais esforços mal orientados como iluminação instantânea de relacionamentos santos, ou até mesmo entrar no mundo real. Seguidores de tais esperanças mágicas no final vão descobrir que seus esforços não levaram a nada, pois apenas reforçaram mais experiências alucinatórias de salvação. Na verdade, isso requer um estudo sério ao longo de muitos anos prática e trabalho duro para alcançar o instante santo final, que é a aquisição do mundo real.

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Capítulo 4

JESUS

49) Onde está escrito no Um Curso em Milagres que Jesus é o autor, e por que não é dado o nome do autor no livro? Além disso, por que existem seções sobre Jesus no manual para professores, escritas na terceira pessoa? Existe outra voz ditando aqui?

Quase o texto inteiro do Um Curso em Milagres é escrito na primeira pessoa, onde o “Eu” é claramente identificado o tempo todo como Jesus. Além disso, existem muitos trechos onde ele especificamente discute a crucificação e a ressurreição. Existem relativamente poucas referências óbvias em primeira pessoa no livro de exercícios para estudantes e no manual para professores, mas, quando elas ocorrem, seu impacto é bem dramático, como é visto, por exemplo, na Lição 70 do livro de exercícios, a Introdução à quinta revisão, e o poema que encerra o manual.

De forma interessante, existe uma seção no próprio manual – “Jesus tem um papel especial na cura?” – e duas no apêndice do manual, o esclarecimento de termos – “Jesus Cristo” e “O Espírito Santo” – onde Jesus é citado na terceira pessoa. Alguns estudantes entenderam que essa mudança é significativa, e indica que Helen estava ouvindo outra voz aqui. Esse definitivamente não era o caso, como ela sempre foi clara sobre haver apenas uma única voz – Jesus – que estava ditando para ela. Essas três seções lidam especificamente com Jesus, e a mudança na pessoa da “voz” foi feita com propósitos estilísticos, e não têm outro significado. Se os estudantes desejarem, no entanto, podem entender essas seções na terceira pessoa como o Espírito Santo falando sobre Jesus.

É na seção acima mencionada, no manual para professores, que encontramos essa afirmação muito específica de que a fonte do Um Curso em Milagres é Jesus, dito, novamente se o estudante desejar, pelo Espírito Santo:

Esse curso veio dele porque suas palavras te atingiram em uma linguagem que podes amar e compreender. É possível que existam outros professores, para mostrar o caminho àqueles que falam diferentes línguas e apelam para símbolos diferentes? Certamente existem. Deus deixaria alguém sem uma ajuda presente nos momentos de dificuldade, sem um salvador que O pudesse simbolizar? Mesmo assim, precisamos de um currículo multifacetado, não em função de diferenças no conteúdo, mas porque os símbolos têm que se deslocar e mudar para se adequar à necessidade. Jesus veio para dar uma resposta à tua. Nele achas a Resposta de Deus (MP-23.7:1-11; grifos nossos).

A razão pela qual não é dado o nome do autor no Um Curso em Milagres é muito simples: Jesus foi bem explícito em suas instruções a Helen de que deveria ser assim. Helen também era pessoalmente muito clara sobre não permitir que seu próprio nome aparecesse, uma vez que ela sempre era enfaticamente não ambígua com as pessoas sobre não ser a autora do Curso.

50) Se Jesus foi o primeiro a aceitar a Expiação para si mesmo, como Um Curso em Milagres afirma, e as pessoas como Buda?

Essa referência vem na seção sobre esclarecimento de termos chamada “O Espírito Santo”, e afirma:

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Ele [o Espírito Santo] estabeleceu Jesus como o líder na realização do Seu plano [Expiação], já que foi o primeiro a cumprir a própria parte com perfeição (ET-6.2:4-6).

Seria tentador para os estudantes do Um Curso em Milagres usarem essa passagem como uma forma de estabelecer o direito de se gabarem que “nosso cara” (Jesus) é melhor do que o “seu cara” (Buda, ou qualquer outro professor iluminado). Mas alguém pode realmente acreditar que Jesus iria ceder a tal especialismo espiritual? Uma forma melhor de entender essa passagem é se recordar do fato de que o tempo não é linear e então, não existe nada em Um Curso em Milagres que sugira quando foi que Jesus aceitou a Expiação para si mesmo. E uma vez que, novamente, o tempo não é linear, toda a questão se torna sem significado, exceto por ser uma oportunidade valiosa de aprendizado, na qual os estudantes podem liberar seus próprios pensamentos de especialismo. Também é útil que o estudante se recorde de que Jesus afirma o seguinte, na seção de fato imediatamente anterior àquela onde a afirmação acima aparece:

Ajudantes te são enviados de várias formas, embora sobre o altar todos sejam um. Além de cada um há um Pensamento de Deus e isso nunca vai mudar. Mas eles têm nomes que diferem temporariamente, pois o tempo necessita de símbolos sendo irreal em si mesmo. Seus nomes são legião, mas nós não iremos além dos nomes que o próprio curso emprega (ET-5.1:4-10).

Em outras palavras, ele está falando apenas dentro da moldura cristã, e então, seria impróprio discutir Professores de outros caminhos espirituais, cujos “nomes são legião”.

51) Se, como Um Curso em Milagres sugere, o mundo entendeu totalmente errado a mensagem de Jesus há dois mil anos, por que ele esperou tanto tempo para corrigi-la?

Novamente, essa questão cuidadosa está baseada em uma visão linear do tempo, na qual dois mil anos parecem ser um período excessivamente longo para que o erro seja corrigido. Claramente, aqueles que fazem essa pergunta estão projetando em Jesus sua própria impaciência e, mais provavelmente, sua falta de perdão às diversas igrejas cristãs que sobrepuseram o sistema de pensamento do ego aos ensinamentos livres de ego do verdadeiro Jesus.

Uma forma mais profunda de se voltar para essa questão é considerar que estando livre do ego, qualquer um no mundo real – como está Jesus – não escolhe realmente fazer nada. Tendo escolhido o Espírito Santo de uma vez por todas, não existe nada mais a escolher. Portanto, não existe mais um tomador de decisões na mente que ativa o corpo e interage com o mundo, como na necessidade muito importante do ego. Professores de Deus verdadeiramente avançados – Professores dos professores – não fazem; eles são. Eles não planejam, escolhem, deliberam ou se comportam como faz uma pessoa que acredita na realidade do sistema de pensamento do ego. Sua simples presença de amor envolve as necessidades daqueles que ainda se identificam com um mundo de forma, assim como a água assume uma forma de acordo com o recipiente onde foi colocada, ou o leito do rio dá formato ao fluxo da água que passa através dele.

Nesse contexto, portanto, podemos entender que a aparição de Jesus dentro do sonho do mundo há dois mil anos foi o resultado da prontidão do Filho de experienciar o Amor de Deus dentro do seu sonho. É como se a mente do Filho – a única verdadeira esfera de experiência que existe – abrisse parcialmente a porta da sua mente que projetou a presença do Espírito Santo. A mente previamente escurecida pela culpa, portanto, permitiu que alguma luz entrasse, e essa luz assumiu a forma de Jesus, o Filho da Luz, cuja presença dentro da escuridão do mundo do ego nos lembra de que todos nós somos crianças da Luz.

O medo que essa luz engendrou – pois ela constitui uma grave ameaça ao sistema de pensamento de escuridão do ego – levou o Filho a fechar a porta para proteger seu ser

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individual, e isso assumiu a forma de tentar destruir Jesus e depois a sua mensagem, como a história do cristianismo atesta. É por isso que os escritores dos evangelhos mudaram toda a mensagem de Jesus e a enraizaram na crucificação, que reflete o plano subjacente do ego para perpetuar seu próprio sistema de pensamento de traição, sofrimento e morte. Jesus comenta sobre essa dinâmica no Curso em diversas partes. Nós olhamos para duas passagens assim; uma geral para as dinâmicas da mente do Filho, e outra específica, em relação ao próprio Jesus:

À medida em que a luz vem para mais perto, correrás para a escuridão, encolhendo-te com medo da verdade, às vezes recuando para as formas menos intensas do medo e às vezes para o terror mais absoluto (T-18.III.2:1-4).

Todas as pessoas que acreditam na separação têm um medo básico de retaliação e abandono. Acreditam em ataque e rejeição de modo que é isso que percebem, ensinam e aprendem. Essas idéias insanas são claramente o resultado da dissociação e da projeção. O que ensinas, tu és, mas é bastante evidente que podes ensinar errado e podes, portanto, ensinar errado a ti mesmo. Muitos pensaram que eu os estava atacando, embora fosse evidente que não estava. Um aprendiz insano aprende lições estranhas. O que tens que reconhecer é que quando não compartilhas um sistema de pensamento, tu o estás enfraquecendo. Aqueles que acreditam nele, portanto, percebem isso como um ataque a si próprios. Isso porque todos se identificam com seu sistema de pensamento e todo sistema de pensamento está centrado no que tu acreditas que és (T-6.V-B.1:1-14).

O leitor também deveria consultar “Expiação sem sacrifício” e “A mensagem da crucificação”, as seções iniciais dos Capítulo 3 e 6, no texto, para lerem comentários ainda mais específicos de Jesus sobre a compreensão errônea de sua mensagem, e de como e por que isso aconteceu.

E agora, dois mil anos depois, vemos que a porta para a mente fechada do Filho se abriu novamente para permitir a entrada da luz da verdade, e o resultado é a mensagem original de Jesus, apresentada em uma forma contemporânea, do século vinte (logo século vinte e um). Desnecessário dizer, tem havido outras expressões dessa luz no mundo cristão (e não-cristão), mas, novamente, devemos permanecer apenas dentro do contexto do Um Curso em Milagres.

A vantagem de responder a questão dessa forma é que a pessoa é capaz de evitar antropomorfizar Jesus – fazendo com que ele pense, planeje e se comporte da forma que faríamos -, o que, mais uma vez, só iria forjar a crença de que o capturamos dentro do sonho do ego, tornando-o um conosco, ao invés de nos tornarmos como ele. Acima de tudo, é sempre essencial manter em mente que Deus não tem resposta verdadeira ao pensamento de separação, ainda que, como já vimos, a linguagem metafórica do Um Curso em Milagres o retrate dessa forma. Primeiro e acima de tudo, se Deus soubesse sobre a “diminuta e louca idéia”, ela teria que ser real. Portanto, o Espírito Santo e Jesus – os mensageiros de Deus dentro do sonho, e as vozes do plano de Expiação que afirmam que o sonho da separação nunca aconteceu – também teriam que compartilhar dessa falta de resposta ao erro. É Sua simples presença cheia de luz em nossas mentes – escurecidas pelos pensamentos de pecado, culpa e medo – que nos ajuda. Eles não fazem nada; são apenas nossos egos que agem e reagem. Enquanto experienciarmos esse pensamento de separação nas formas específicas do especialismo que contêm nossas vidas individuais, precisamos experienciar essa Ajuda em formas específicas também. Mas essas formas são determinadas pelos roteiros do nosso ego, não por qualquer intervenção específica do divino.

52) O Jesus do Um Curso em Milagres é o mesmo Jesus sobre quem se fala na Bíblia, e a mesma pessoa que caminhou sobre a terra na Palestina, há dois mil anos?

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Sim, é definitivamente o mesmo Jesus que apareceu no mundo há dois mil anos, com a mesma mensagem de verdade – em conteúdo, obviamente, não em forma. No entanto, é extremamente difícil acreditar que o Jesus do Um Curso em Milagres é a mesma pessoa sobre quem se escreveu na Bíblia, assim como seria difícil aceitar que o Jesus bíblico assemelhe-se ao verdadeiro Jesus histórico. Esse não é o momento para investigarmos questões de erudição das escrituras, e como os evangelhos foram escritos, mas é suficiente afirmar para nossos propósitos aqui que a figura encontrada nos quatro evangelhos, assim como os ensinamentos registrados nos outros livros do Novo Testamento, são com freqüência diametralmente opostos ao que encontramos no Curso. Ao invés de tentar se ajustar a uma situação imposta, tentando encaixar um cubo em um buraco quadrado, parece muito mais seguro e intelectualmente honesto para os estudantes do Um Curso em Milagres aceitarem que o Jesus bíblico representa as projeções coletivas de vários autores dos evangelhos e epístolas, enquanto a voz e a pessoa de Jesus em Um Curso em Milagres representa o ser livre de ego que viveu e ensinou há dois mil anos. Em conclusão, o Jesus da Bíblia e do Curso são figuras mutuamente excludentes, com apenas o nome comum unindo-as.

Para uma discussão mais completa dessas diferenças, leiam Um Curso em Milagres e Cristianismo: Um Diálogo.

53) Existe uma diferença entre Jesus e o Espírito Santo, e importa para quem peço ajuda?

A diferença entre Jesus e o Espírito Santo é teológica, não prática. De acordo com a teoria do Curso, o Espírito Santo foi criado por Deus em resposta ao pensamento de separação na mente do Seu Filho. Na realidade, é claro, como já mencionamos várias vezes antes, tal descrição em Um Curso em Milagres é metafórica, porque como Deus poderia dar uma resposta a algo que nunca aconteceu? Em qualquer medida, o Espírito Santo pode ser mais bem compreendido como a memória do Amor de Deus e da verdadeira Identidade do Filho como Cristo, que ele carrega consigo para o sonho. O Espírito Santo, portanto, é um princípio ou um pensamento na mente do Filho, que lembra a ele que o que ele acredita sobre si mesmo e seu Criador é falso. Essa correção é o que é conhecido no Um Curso em Milagres como o princípio da Expiação.

Jesus, por outro lado, é uma parte da Filiação, e é tão tangível e específico como a crença do Filho sobre si mesmo. Ele é a parte da mente única do Filho que “se lembrou de rir” da diminuta e louca idéia. E, portanto, Jesus se torna uma manifestação do princípio de Expiação, ou da presença mais abstrata do Espírito Santo. É isso o que está tencionado no esclarecimento de termos, na afirmação já citada de que o Espírito Santo “estabeleceu Jesus como o líder para executar Seu plano” (ET-6.2:2), e, pela passagem no texto que é uma referência direta a Jesus:

O princípio da Expiação estava em efeito muito antes de começar a Expiação. O princípio era amor [o Espírito Santo] e a Expiação um ato de amor [Jesus] (T-2.II.4:2-4).

No nível da prática, no entanto, não existe diferença. Tanto Jesus quanto o Espírito Santo servem como nossos Professores internos, para quem nos voltamos pedindo ajuda para aprendermos como perdoar. O Espírito Santo oferece ao estudante um Professor mais abstrato, se Jesus for um problema; enquanto Jesus é uma forma mais específica e pessoal com a qual o estudante pode se relacionar. Qualquer um vai funcionar, no entanto, pois Sua função permanece a mesma. Apesar disso, se Jesus é realmente uma figura problemática para os estudantes do seu Curso, então, definitivamente seria um problema para esses estudantes cumprirem os próprios princípios do Curso, por causa da sua falta de perdão em relação a ele. Portanto, eles podem explorar suas raízes mais profundas para que possam ser desfeitas, assim como com qualquer falta de perdão que esteja presente dentro de suas mentes.

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54) Por que Jesus repetidamente diz em Um Curso em Milagres que eu preciso perdoá-lo? Perdoá-lo pelo que?

Para muitos estudantes do Um Curso em Milagres, essa é uma questão problemática. Por que, eles perguntam, tenho que perdoar Jesus; não estou zangado com ele. Eu (Gloria) me lembro de muitos anos atrás, quando tinha meu próprio grupo que se reunia para discutir o Curso. Essa questão era quase responsável pela irrupção da Terceira Guerra Mundial na minha sala de jantar, onde o grupo se reunia todas as semanas. Certamente não era um tópico neutro, e perdoar Jesus realmente é uma questão central que vai ao cerne dos ensinamentos do Curso sobre desfazer o sistema de pensamento do ego. Vamos iniciar nossa resposta examinando algumas passagens representativas do Curso, onde Jesus discute isso. As primeiras duas vêm na seção, “Os obstáculos à Paz”, no Capítulo 19 do texto, onde ele afirma:

Eu sou bem-vindo no estado de graça, o que significa que afinal me perdoaste. Pois tornei-me o símbolo do teu pecado e assim eu tive que morrer em teu lugar... Permite que eu seja para ti o símbolo do fim da culpa e olha para o teu irmão como olharias para mim. Perdoa-me todos os pecados que pensas que o Filho de Deus cometeu. E à luz do teu perdão, ele lembrar-se-á quem ele é e esquecerá o que nunca foi. Eu peço o teu perdão, pois se tu és culpado, eu também tenho que ser. Mas se eu superei a culpa e venci o mundo, tu estavas comigo. Queres ver em mim o símbolo da culpa ou o fim da culpa, lembrando-te de que o que eu significo para ti é o que vês dentro de ti mesmo? (T-19.IV-A.17:1-3; T-19.IV-B6).

E então, no início do próximo capítulo, na seção “Semana santa”, que foi escrita durante a semana anterior à Páscoa, Jesus volta a esse ponto importante:

Estás ao lado do teu irmão, os espinhos em uma das mãos e os lírios na outra, incerto quanto ao que vais dar. Une-te agora a mim e joga fora os espinhos oferecendo lírios para substituí-los. Nesta Páscoa, eu quero ter a dádiva do teu perdão, oferecida a mim por ti e devolvida a ti por mim. Não podemos estar unidos na crucificação e na morte. E nem pode a ressurreição estar completa enquanto o teu perdão não descansar em Cristo, junto com o meu... Eu era um forasteiro e me recolheste sem saber que era eu. Entretanto, pela tua dádiva de lírios, tu saberás. No teu perdão a esse forasteiro, estranho para ti e no entanto teu Amigo antigo, está a sua liberação e a tua redenção junto com ele (T-20.I.2:8-15; 4:5-8).

Jesus tem que ser perdoado em dois níveis. O primeiro está relacionado aos “ídolos amargos” nos quais o mundo o transformou, que claramente refletem suas projeções e não tem nada a ver com ele de forma alguma. Esses ídolos vêm tanto em formas de ódio quanto de amor especial, onde ele foi transformado tanto em uma figura de julgamento e punição, que exige sofrimento e sacrifício de seus seguidores, quanto um salvador mágico que, a pedido, vai resolver problemas e recompensar os bons atos de um discipulado fiel com seu amor e beneficência. Mais uma vez, tais imagens refletem as necessidades de especialismo dos criadores de imagens, sem referência ao Jesus real de forma alguma, que claramente está além de tais preocupações do ego. E então, podemos ver aqui que Jesus deve ser perdoado pelo que ele nunca fez, e ainda mais ao ponto, ser perdoado pelo que ele nunca foi.

Para o ego, Jesus é a figura mais ameaçadora imaginável, como já indicamos em nossas respostas a perguntas anteriores, pois ele é real, então, o sistema de pensamento do ego não pode ser. E então, a parte da mente de qualquer um que ainda se agarra ao especialismo e individualidade – as marcas distintivas do sistema de pensamento do ego – inevitavelmente iria temer, e, portanto, atacar Jesus para se proteger. Esse ataque reflete o pensamento original do ego de que o Filho de Deus separou-se pecaminosamente do Amor de Deus. A culpa em relação a esses ataques a Jesus – a maior incorporação ocidental desse Amor – só pode levar

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à negação. A culpa (ou auto-ódio) é uma experiência tão esmagadora que é quase inevitavelmente enterrada em nossas mentes. Isso reflete a crença mágica de que, como o proverbial avestruz, se não virmos o problema, não está lá. Essa dinâmica do ego de evitar a dor da nossa culpa culmina em projetar nossa crença no pecado e na culpa em Jesus.

Esse é o significado das passagens do texto citadas acima. Ao invés de aceitarmos a responsabilidade por nossa culpa – o que o ego nos ensina que vai nos levar à morte como punição justificada por nosso pecado -, esperamos, mais uma vez magicamente, que, projetando a culpa em Jesus, levando-o à sua morte, estaremos fora da mira. Pois o ego mataria ao invés de ter sua existência desfeita. E, portanto, dois mil anos de crença em salvação feita no lugar de outro, que a teologia cristã defende, proclamam que “Jesus fez isso por nós”. Essa dinâmica insana reflete a dinâmica “pão-com-manteiga” do ego do ciclo de culpa/ataque, na qual quanto mais culpados nos sentimos, maior é nossa necessidade de atacar os outros em “auto-defesa”, o que por seu lado reforça a culpa que sempre permanece reprimida em nossas mentes. E então, o ciclo começa novamente. É por isso que os cristãos sempre adoraram um salvador fraco, e por que os católicos especificamente comemoram a morte de Jesus, reencenando-a a cada missa. Nossa culpa nos impele continuamente a matá-lo. E então, o que perdoamos em Jesus é simplesmente a projeção do que permanece não perdoado em nós mesmos.

O que descobrimos aqui é que o primeiro nível do perdão a Jesus por nossas projeções sobre ele, é realmente a defesa contra o nível subjacente que reflete nossa necessidade real de perdão: Jesus tem que ser perdoado por quem ele verdadeiramente é. Novamente, se o Jesus da realidade está mesmo presente dentro de nossas mentes como a perfeita incorporação do Amor de Deus – a pura expressão do princípio de Expiação do Espírito Santo – então, toda a nossa identidade como seres físicos e psicológicos separados é desfeita. É realmente isso o que temos contra Jesus. Ele é a prova viva dentro do sonho da nossa própria existência, de que estamos errados e ele está certo. Ele é a presença clara e inequívoca de fora do sonho, que atesta para nossas mentes adormecidas que o sonho em si mesmo é irreal. Aceitar isso é aceitar que nós realmente não estamos aqui, mas sonhando um sonho no qual inventamos um ser individual para substituir o Ser que Deus criou. E então, para preservarmos esse ser inventado, precisamos atacar e destruir a verdade. Nós já examinamos essa idéia com alguma profundidade, mas vamos voltar a ela mais uma vez, citando algumas linhas expressivas dos últimos poemas de Helen, “Estranho na Estrada”, que retrata tão graficamente esse medo de confrontar a verdade da existência de Jesus. Com efeito, a presença de Jesus em nossas mentes nega a “verdade” do nosso próprio sistema de pensamento de medo e morte, o qual, em nossa estranha insanidade, acreditamos ser reconfortante para nós e, portanto, precisa ser protegido dele:

A estrada é longa. Não vou erguer meus olhosPois o medo apertou meu coração, e o medo eu conheço –

A concha que me mantém a salvo de ter esperanças;O amigo que mantém Você ainda estranho para mim.

Por que Você deveria caminhar comigo ao longo da estrada,Um desconhecido que eu quase penso temer

Porque Você parece alguém em um sonhoDe ausência de morte, quando só a morte é real?

Não me perturbe agora, estou contenteCom a morte, pois o pesar é mais gentil agora do que a esperança.

Enquanto existia esperança, eu sofri. Agora, caminhoEm certeza, para a morte que certamente virá.

Não perturbe o final. O que está feitoEstá feito para sempre. Nem esperança nem lágrimas

Podem tocar a finalidade. Não erga Os mortos. Venha, Estranho, vamos dizer “Amém”.

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(As dádivas de Deus, p. 103)

E então, com toda a honestidade, precisamos olhar para como tememos e odiamos Jesus, sentimentos quase sempre enterrados em nossas mentes inconscientes, sob camadas e camadas de defesa. Perdoando-o por quem ele realmente é, aprendemos ao mesmo tempo a perdoar a nós mesmos por tentarmos fingir que não somos quem realmente somos, e então, buscando culpá-lo por isso. Se a presença de Jesus não estivesse tão explicitamente clara em Um Curso em Milagres, muitos estudantes não teriam a oportunidade de lidar com essa camada profundamente oculta de falta de perdão e culpa em si mesmos.

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Capítulo 5

O CURRÍCULO DOUM CURSO EM MILAGRES

55) Quem deu o título Um Curso em Milagres, e por quê?

O título foi dado por Jesus. A transcrição de Helen começou com as palavras: “Esse é um curso em milagres”, e, através de todo o ditado, foi assim que Jesus se referiu ao material. Embora o valor do choque inicial do título possa nos atrair, e, portanto, talvez possa ser visto como uma justificativa para o seu uso, a razão real para o título repousa no fato de que todo o Curso está focalizado em ajudar o estudante a aprender e entender o que é o milagre e como aplicá-lo à sua vida pessoal. O foco de Jesus em seu currículo está na correção, especificamente em como o Espírito Santo nos lembra de que temos uma mente, e que essa mente é extremamente poderosa. Foi a mente que fez o problema da separação, e apenas ela, unida ao Espírito Santo, pode aceitar a correção.

Perto do início do texto, de fato, Jesus enfatizou esse ponto a Helen (e a todos os futuros estudantes), afirmando que o propósito do seu curso era fazê-la reconhecer o “poder do seu próprio pensamento” (T-2.VII.1:5). É o milagre que especificamente alcança isso, lembrando aos estudantes do Um Curso em Milagres que foram suas mentes que fizeram os problemas (sem mencionar todo o universo físico) e, portanto, novamente, são só suas mentes que podem mudar isso. O milagre, portanto, nos lembra de que somos os sonhadores dos nossos sonhos, e que, unindo-os a Jesus ou ao Espírito Santo, podemos aceitar uma mudança da dor dos sonhos que produzimos. Como Jesus afirma depois, no texto:

O milagre não te desperta, mas te mostra quem é o sonhador. Ele te ensina que existe uma escolha de sonhos enquanto ainda estás adormecido...O milagre estabelece que tu estás sonhando um sonho, e que seu conteúdo não é verdadeiro...O milagre devolve a causa do medo a ti que a fizeste (T-28.II.4:4-6; 7:1-2; 11:1).

56) Qual é a relação entre o Um Curso em Milagres e outros caminhos espirituais, e especificamente com a Bíblia?

Essa é uma pergunta extremamente importante, porque a compreensão incorreta da resposta leva inevitavelmente a sérias distorções do que Um Curso em Milagres realmente ensina e como deve ser praticado. Nós vivemos em uma época em que muitos seguidores dos caminhos espirituais – usualmente agrupados no que é chamada de “nova era” – enfatizam a unidade ao invés da diversidade. Embora esse seja um objetivo espiritual admirável, certamente, não serve para negar o “fato” do nosso mundo separado; isto é, que somos todos diferentes, e que os diferentes caminhos espirituais são, portanto, necessários. Uma vez que isso seja aceito, então, fica claro que diferentes caminhos serão diferentes. Isso é claramente óbvio em um nível, mas é freqüentemente obscurecido pela necessidade de toldar as diferenças para o bem de uma unidade espúria. Isso presta a cada caminho espiritual um desserviço, e Jesus sempre deixou claro a Helen pessoalmente, assim como no próprio Um Curso em Milagres, o quanto seu curso é diferente de outros caminhos. Isso não significa necessariamente que ele seja melhor, mas realmente significa que é único.

Perto do início do manual para professores, Jesus diz sobre Um Curso em Milagres:

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Esse é um manual para um currículo especial, voltado para os professores de uma forma especial do curso universal. Existem milhares de outras formas, todas com o mesmo resultado (MP-1.4:1-3).

E nós já examinamos a mensagem especial de Jesus a Helen – “Eu não preciso fazer nada” – onde ele contrasta seu Curso com outras espiritualidades que enfatizam a meditação e a contemplação.

Portanto, por um lado, o relacionamento do Curso com outros caminhos espirituais é o de que ele compartilha o mesmo objetivo de voltar para casa em Deus. Ele é diferente, no entanto, porque sua teologia e prática são diferentes. Jesus resume esse relacionamento em seu incisivo comentário:

Uma teologia universal é impossível, mas uma experiência universal é não apenas possível, mas necessária (ET-in.2:5).

Como já vimos, Um Curso em Milagres é uma espiritualidade não-dualista, enquanto quase todas as outras são dualistas. Confundir o Curso com outros sistemas de pensamento espiritual, dizendo “o Curso é como... (preencha com sua espiritualidade favorita)” é simplesmente o fim de uma sutil trama do ego para mudar o Um Curso em Milagres, para que seus ensinamentos sejam menos ameaçadores. Nós, é claro, temos visto em nossa história ocidental um exemplo notável desse artifício do ego quando o mundo cristão transformou Jesus e seus ensinamentos em uma extensão do judaísmo e do Velho Testamento, ao invés de aceitar a ele e à sua mensagem como a dádiva radical que eram, independente de todas as que o precederam. Estudantes do Um Curso em Milagres deveriam tirar proveito desse equívoco do passado, e crescerem em direção ao Curso, ao invés de tentarem rebaixá-lo ao seu próprio nível de compreensão.

Outra forma desse equívoco é a prática comum de incluir no Um Curso em Milagres o que Aldous Huxley chamou de “filosofia perene”, uma frase que reúne muitas coisas, usada para abarcar as principais tradições do mundo. Novamente, isso presta ao Curso um profundo desserviço, porque obscurece o que é sua contribuição distintiva para as espiritualidades do mundo: a idéia de que não apenas o universo físico é uma ilusão que Deus não criou, mas que também foi “feito como um ataque” a Ele (LE-pII.3.2:1). Esse princípio psicológico profundo e sofisticado, interado à pura metafísica não-dualista, é o que torna o Um Curso em Milagres único entre os sistemas de pensamento religiosos e espirituais do mundo.

Comparando Um Curso em Milagres especificamente com a Bíblia, podemos ver quatro áreas principais de diferenças, tornando esses dois caminhos espirituais totalmente incompatíveis. Vamos citar da introdução ao Um Curso em Milagres e Cristianismo: Um Diálogo, de Kenneth, e do padre jesuíta filósofo Norris Clarke, que explora essas diferenças com maior profundidade:

1) Um Curso em Milagres ensina que Deus não criou o universo físico, o que inclui toda a matéria, forma e o corpo; a Bíblia afirma que Ele o fez.

2) O Deus do Um Curso em Milagres nem mesmo sabe nada sobre o pecado da separação (uma vez que saber sobre isso a tornaria real), sem falar em reagir a ela; o Deus da Bíblia percebe o pecado diretamente, como está retratado na história do Jardim do Éden... e Sua resposta a isso é severa, dramática e algumas vezes punitiva, para dizer o mínimo.

3) O Jesus do Um Curso em Milagres é igual a todos os outros, uma parte do Filho único de Deus, ou Cristo; o Jesus da Bíblia é visto como um aparte especial e, portanto, ontologicamente diferente de todos os outros, sendo o único filho primogênito de Deus, a segunda pessoa da Trindade.

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4) O Jesus do Um Curso em Milagres não foi enviado por Deus para sofrer e morrer na cruz, em um ato sacrificial de expiação pelo pecado, mas, ao invés disso, ensina que não existe pecado, demonstrando que nada aconteceu a ele na realidade, pois o pecado não tem efeito sobre o Amor de Deus; o Jesus da Bíblia agoniza, e morre pelos pecados do mundo, em um ato que traz salvação indireta a toda a humanidade, dessa forma estabelecendo o pecado e a morte como reais, e além disso, claramente refletindo que Deus foi afetado pelo pecado de Adão, e precisa responder à sua presença real no mundo, sacrificando Seu Filho amado. (p.2-3).

Embora nossas respostas tenham se focalizado na Bíblia, a mesma mensagem básica pode ser dada em relação a qualquer outro caminho espiritual. Embora certamente não exista nada errado em ler outras espiritualidades ou estar interessado em aprender mais sobre elas, nem em participar de serviços religiosos, encontros espirituais, etc., um estudante do Um Curso em Milagres deveria ser pelo menos cauteloso – para afirmar novamente – sobre tentar fundir as teologias ou abordagens espirituais que em última instância não se misturam. Algumas espiritualidades realmente se prestam a essa “fusão”; Um Curso em Milagres não.

57) O conceito de círculo da Expiação está relacionado à idéia do “centésimo macaco”? e os “professores de Deus” deveriam sair para ensinar Um Curso em Milagres ou para converter outros?

A resposta à primeira pergunta é “não”; eles representam dois sistemas de pensamentos totalmente diferentes. O conceito do “centésimo maçado” é baseado sobre uma pesquisa questionável que concluiu que existe um ponto quantitativo que é atingido em uma espécie – como um certo peso que, uma vez atingido em uma escala balanceada, inclina aquela porção da escala e então, permite que os membros restantes da espécie adquiram o que o resto já aprendeu. A idéia do Um Curso em Milagres sobre o “círculo da Expiação” não é um conceito quantitativo, e não tem nada a ver com acumular números de estudantes do Curso, para que, uma vez que essa “massa crítica” seja atingida, salve o mundo. Nós lemos no manual para professores, por exemplo, que apenas um professor de Deus é necessário para salvar o mundo. Isso é assim porque só existe um professor – nosso Ser. Quando a Expiação for aceita por um indivíduo, essa pessoa vai se lembrar de que existe apenas um Filho e, portanto, o sonho da separação, diferenças e multiplicidade era simplesmente irreal. Acreditar que certo número requerido é necessário para salvar o mundo todo claramente transforma o conceito de números em algo real, sem mencionar estabelecer a realidade de uma espécie ou mundo que têm que ser salvos também.

Esse aspecto não-quantitativo do Um Curso em Milagres não é compreendido, então, estudantes do Curso de Jesus podem se sentir tentados a acreditarem que precisam converter outros, ou, de alguma forma, pregar o “novo evangelho de acordo com o Jesus real” para alcançar tantos estudantes do Curso quanto possíveis para que o mundo seja salvo. Como já aconteceu, estudantes vão se unir e pensar sobre si mesmos como um movimento, uma rede, uma religião, igreja, ou alguma dessas categorias especiais. Eles vão se deleitar com o pensamento de que uma cópia do Um Curso em Milagres foi enviada para o Vaticano, ou para a Casa Branca, ou, colocada em qualquer outro símbolo mundial de poder. Eles vão se sentir impelidos a criticar, julgar ou atacar outros caminhos espirituais, pois então precisam inevitavelmente ser vistos como competidores para alcançar essa massa crítica de pessoas necessária para mudar a balança em direção à salvação do mundo.

Tudo isso será facilmente evitado focalizando apenas no que Um Curso em Milagres realmente ensina, e dirigindo a própria atenção apenas para as próprias lições de perdão, e a eventual aceitação da Expiação para si mesmo. Não existe mais ninguém a ser “salvo”, e aceitar isso é, portanto, nossa única responsabilidade.

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58) Um Curso em Milagres pode ser concluído em um ano, como o livro de exercícios parece sugerir?

Essa pergunta repousa na premissa de que apenas o programa de treinamento de um ano do livro de exercícios para estudantes compreende o total treinamento mental (ou re-treinamento mental) que é o objetivo principal do Um Curso em Milagres. Não é assim. O livro de exercícios é o único aspecto de um currículo que consiste de três partes: o texto, que contém a teoria e teologia do Curso; o livro de exercícios para estudantes, a série de lições de um ano que ajudam o estudante a iniciar o programa de treinamento mental do Curso; e o manual para professores, que serve como um resumo de muitos dos ensinamentos do Curso, assim como ajuda a definir o que Jesus quer dizer por um professor de Deus.

Qualquer estudante sério do Um Curso em Milagres reconhece que o currículo total de forma alguma pode ser completado em um ano. Ao invés disso, é um trabalho para a vida toda, e o livro de exercícios, que, novamente, é um programa de treinamento específico de um ano, é o meio que iria garantir que os estudantes procedam da maneira correta. Uma vez que eles estiverem em contato com suas mentes certas e entenderem o processo de perdão que o Curso estabelece, os estudantes então serão capazes de passar o resto de suas vidas em uma prática diária com Jesus ou o Espírito Santo como seus Professores. Como o livro de exercícios afirma no final:

Esse curso é um início, não um fim. Seus Amigos vão contigo (LE-ep.1:1-2).

59) Existe uma forma certa ou errada de praticar o livro de exercícios?

Existe apenas uma regra que Jesus nos oferece sobre fazermos o livro de exercícios: “Não tentes fazer mais de um exercício por dia” (LE-in.2:6). Além disso, somos incitados por ele a continuarmos com nossa prática mesmo se tivermos problemas em entender uma lição, ou experienciar dificuldade em efetuar o exercício específico, porque não acreditamos no que ele diz. Como ele diz de forma confortadora a seus estudantes:

Acharás difícil acreditar em algumas das idéias que esse livro de exercícios te apresenta e outras podem te parecer bastante surpreendentes. Isso não importa. Meramente te é pedido que apliques as idéias como és dirigido a fazer. Não te é pedido para julgá-las em absoluto. Só te é pedido que use-as. É o uso destas idéias que lhes dará significado para ti e te mostrará que são verdadeiras.Lembra-te apenas disso: não precisas acreditar nas idéias, não precisas aceitá-las e não precisas nem mesmo acolhê-las bem. A algumas delas podes resistir ativamente. Nada disso importará ou diminuirá a sua eficácia. Mas não te permitas fazer exceções ao aplicar as idéias contidas no livro de exercícios, e quaisquer que sejam as tuas reações às idéias, usa-as. Nada mais do que isso é requerido (LE-in.8; 9).

Claramente, estudantes são encorajados na passagem acima, a fazerem o livro de exercícios que Jesus lhes dá, uma lição por dia, na seqüência na qual elas vêm. No entanto, não existe regra contra passar mais de um dia em uma lição. Muitas vezes, lições trazem uma multidão de perspectivas e problemas relacionados à vida da pessoa, e, portanto, os estudantes se vêem ruminando e ponderando sobre implicações pessoais dessas lições. Uma vez que o livro de exercícios é uma experiência altamente pessoal para os estudantes, não pode haver verdadeiramente uma forma “certa” ou “errada” de praticá-lo. A resposta correta, como sempre, é que a maneira “certa” é praticar o livro de exercícios com o Espírito Santo; a maneira “errada” é praticar com o ego. Isso coloca no estudante a responsabilidade de continuar a jornada com o Um Curso em Milagres de uma maneira tão livre do ego quanto possível, sempre mantendo uma vigilância contra as intrusões sutis do especialismo do ego.

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60) É necessário fazer o livro de exercícios mais de uma vez?

Não. O livro de exercícios para estudantes é estabelecido como um programa de treinamento de um ano, e não existe razão para o estudante se desviar disso. Fica claro, no próprio livro de exercícios, como já foi afirmado, que Jesus não espera que seus estudantes completem o processo de aprendizado em um ano. Um Curso em Milagres é um trabalho para a vida toda, e o programa de um ano de treinamento do livro de exercícios – que provavelmente deveria ser feito relativamente cedo no trabalho do estudante do Curso, embora a prática de todos com ele seja diferente – é simplesmente para orientar o estudante no caminho certo, com o professor certo. Então, colocados nas mãos do Espírito Santo, passamos o resto de nossas vidas tendo a Ele como nosso Professor de perdão:

E agora eu te coloco nas mãos Dele para seres o Seu fiel seguidor- tendo-O como Guia através de cada dificuldade e toda dor que possas pensar ser real... Deixa-O continuar te preparando. Ele ganhou a tua confiança falando-te diariamente do teu Pai, do teu irmão e do teu Ser. Ele continuará. Agora caminhas com Ele, tão certo quanto Ele do lugar para onde vais, tão certo quanto Ele de como deves proceder, tão confiante quanto Ele acerca da meta e de que chegarás ao fim em segurança (LE-ep.4:1-3,4-9).

Com muita freqüência, o desejo dos estudantes de repetirem o livro de exercícios (ou lições específicas, em uma necessidade quase compulsiva de fazê-las certo) vem do desejo de fazê-lo perfeitamente, reconhecendo o quão sua disponibilidade e prática foram imperfeitas. Isso derrota todo o propósito do livro de exercícios, que é treinar os estudantes para ouvirem a Voz de perdão do Espírito Santo, ao invés da culpa do ego. Na verdade, pode-se até mesmo afirmar que o propósito do livro de exercícios é fazê-lo de forma imperfeita, para que o equívoco – rotulado pelo ego como pecado – de nos afastarmos de Deus e não colocá-Lo em primeiro lugar em nossas vidas, possa ser perdoado e não levado a sério. As instruções de Jesus aos seus estudantes na Lição 95 reafirmam esse importante objetivo de perdão. Eles são dados no contexto dos estudantes não fazendo as lições perfeitamente, e escolhendo perdoar a lição diária durante o dia:

Mas não uses os teus lapsos nesse horário como um pretexto para não voltares a ele assim que puderes. É bem possível que haja uma tentação de considerares o dia perdido, uma vez que falhaste em fazer o que te é requerido. Contudo, isso deverá ser meramente reconhecido pelo que é: uma recusa em permitir que o teu equívoco seja corrigido e uma falta de disponibilidade para tentar de novo.O Espírito Santo não é detido em Seu ensinamento pelos erros que cometes. Ele só pode ser retido pela tua vontade que não está disposta a soltá-los. Que estejamos determinados, portanto, principalmente na próxima semana ou mais um pouco, a estarmos dispostos a perdoar os lapsos na nossa diligência e nossas falhas em seguir as instruções para a prática da idéia do dia. Essa tolerância para com a fraqueza fará com que sejamos capazes de não vê-la ao invés de dar-lhe o poder de atrasar o nosso aprendizado. Se lhe dermos o poder de fazer isso, estamos considerando-a como uma força e confundindo força com fraqueza.Quando falhas em cumprir os requisitos deste curso estás meramente cometendo um erro. Isso pede correção e nada mais. Permitir que um equívoco perdure é cometer equívocos adicionais, que se baseiam no primeiro e o reforçam. É esse processo que tem que ser posto de lado, pois não passa de outra maneira através da qual queres defender as ilusões contra a verdade (LE-pI.95.7:4-11; 8; 9; grifos nossos).

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Isso não significa, certamente, que os estudantes não deveriam fazer o livro de exercícios uma segunda ou terceira vez, mas, como afirmado na resposta anterior, eles deveriam ficar vigilantes contra a necessidade dos seus egos de reforçarem o pecado e a culpa, e expiarem por tal pecado se tornando “perfeitos”. Em outras palavras, os estudantes deveriam tratar seu relacionamento com o livro de exercícios como uma sala de aula também; uma sala de aula na qual eles trazem suas percepções equivocadas a Jesus para que ele ajude a corrigi-las. Nesse sentido, podemos acrescentar um pós-escrito à nossa resposta à questão anterior sobre existir uma “forma certa” de fazer o livro de exercícios. Existe: a “forma certa” é fazer o livro de exercícios da “forma errada”, e então ter a ajuda de Jesus para você perdoar a si mesmo por isso. Dessa forma, estará iniciando – no contexto de “se esquecer” sobre Deus, “se esquecendo” da lição diária – o processo de aceitar o perdão por ter se afastado de Deus no instante original da separação.

61) Por que o texto e o livro de exercícios têm focos diferentes, e de vez em quando parecem dizer coisas diferentes?

Jesus se refere ao Um Curso em Milagres como um “currículo multifacetado” e, portanto, ele requer que seu ensinamento seja apresentado de formas diferentes. O texto, que foi ditado a Helen primeiro, contém a teologia, fundação metafísica, e ensinamentos sobre aceitar o perdão para nossos relacionamentos especiais, nos quais o currículo repousa. Por exemplo, apenas no texto – destacado em sua maior parte do Capítulo 15 ao Capítulo 24 – a pessoa encontra uma exposição do ensinamento sobre relacionamentos santos e especiais. Em nenhum lugar no livro de exercícios ou no manual, esse assunto muito importante é discutido de forma específica. No livro de exercícios, como Jesus explica na introdução à primeira parte (Lições 1-220) lida “com o desfazer do modo como vês agora”, enquanto a segunda parte (Lições 221-365) lida “com a aquisição da verdadeira percepção” (LE-in.3:1). Nada é mencionado sobre a teoria do Um Curso em Milagres. Na verdade, o relacionamento específico entre o texto e o livro de exercícios é claramente estabelecido na Introdução:

Um fundamento teórico tal como o que o texto provê é necessário como uma estrutura para fazer com que as lições nesse livro de exercícios sejam significativas. Contudo, é a prática dos exercícios que fará com que a meta do curso seja possível. Uma mente sem treino nada pode realizar. O propósito deste livro de exercícios é o de treinar a tua mente para pensar segundo as linhas propostas pelo texto (LE-in.1).

É por causa desses propósitos e focos diferentes que os dois livros, de vez em quando, parecem estar dizendo coisas diferentes, que até mesmo, algumas vezes, parecem contraditórias. Talvez o melhor exemplo desse fenômeno interessante esteja relacionado ao papel do Espírito Santo. Muitas passagens no livro de exercícios incitam os estudantes a pedirem a Ele ajuda específica, como podemos ver nesse exemplo das lições finais (361-365):

Quero dar-Te [ao Espírito Santo] esse instante santo.Tu estás no controle. Pois eu quero seguir-Te,

certo de que a Tua direção me dá paz.

E se eu precisar de uma palavra que me ajude, Ele a dará a mim. Se precisar de um pensamento, Ele também o dará. E se eu precisar apenas de serenidade e de uma mente tranqüila e aberta, estas são as dádivas que receberei Dele. Ele está no controle porque eu pedi. E Ele me ouvirá e me responderá porque fala por Deus meu Pai e pelo Seu Filho santo (LE-pII.361-365).

E, no entanto, somos ensinados no texto de que não é o papel do Espírito Santo nos guiar no mundo dos efeitos – o mundo material de especificidades -, mas, ao invés disso, nos ajudar

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a mudar nossas mentes em relação à causa dos nossos problemas: nossa crença na realidade do pecado e da culpa. Por exemplo:

O Espírito Santo percebe a causa rindo gentilmente e não olha os efeitos. De que outra maneira poderia ele corrigir o teu erro, já que absolutamente não olhaste para a causa? Ele pede que tu Lhe tragas cada efeito terrível para que possam olhar juntos para a sua causa tola e possas rir um pouco com Ele. Tu julgas os efeitos, mas Ele julgou a causa. E através do julgamento do Espírito Santo os efeitos são removidos (T-27.VIII.9:1-7).

Apesar disso, se os estudantes não entenderem os dois níveis já mencionados nos quais o Um Curso em Milagres é escrito, e que, a propósito, nunca são especificamente identificados como tais, então, a pessoa pode concluir que essas afirmações são contraditórias. Para reafirmar esses níveis brevemente:

Nível Um: A fundação metafísica do Curso, que enfatiza a diferença entre Deus e o Céu, a única realidade, e o mundo coletivo ilusório do ego.

Nível Dois: o nível prático do Curso, que lida apenas com o sonho ilusório. Aqui, o contraste é entre a mente errada, que é o sistema de pensamento de pecado e culpa e medo do ego, e a correção de perdão do Espírito Santo dentro da mente certa.

Em relação ao assunto de Deus, encontramos a mesma contradição aparente. Na Lição 71 do livro de exercícios, nos é dito para pedirmos ao Próprio Deus ajuda específica:

O que queres que eu faça?Aonde queres que eu vá?

O queres que eu diga, e a quem? (LE-pI.71.9:4-6)

Além disso, toda a Parte II do livro de exercícios consiste de orações do estudante para Deus, o Pai. Isso é assim, apesar da afirmação seguinte muito clara – de forma interessante, também do livro de exercícios – de que Deus não ouve nossas orações:

Não penses que Ele ouvirá as pequenas preces daqueles que O invocam com os nomes dos ídolos que o mundo tem em grande estima. Eles não podem alcançá-Lo desse modo (LE-pI.183.7:2-5).

E, no manual para professores, lemos essas linhas sobre a verdadeira natureza de nossas palavras:

Deus não compreende palavras, pois foram feitas por mentes separadas para mantê-las na ilusão da separação. Palavras podem ser úteis, especialmente para o iniciante, no sentido de ajudar na concentração e facilitar a exclusão ou pelo menos o controle de pensamentos que não são pertinentes. Não nos esqueçamos, entretanto, de que as palavras não são senão símbolos de símbolos. Estão, assim, duplamente afastadas da realidade (MP-21.1:5-12).

Claramente, a primeira passagem nos mostra fazendo a Deus, o Pai, uma série de perguntas específicas para as quais esperaríamos totalmente receber respostas. Parte da razão para isso ser emoldurado dessa forma é que inerente ao pensamento de separação está a afirmação de que eu fui auto-criado, e, portanto, sou minha própria fonte. Então, pedindo

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ajuda a Deus no que me referi como Nível Dois, o nível do sonho ilusório, estou reconhecendo que não sou um ser autônomo, auto-criado, mas, ao invés disso, alguém que precisa de ajuda para desfazer esse falso ser que eu inventei. É dessa forma que o pensamento de que estou por conta própria vai ser desfeito, e vou perceber que as respostas a todas as minhas perguntas já foi dada, e que elas são uma. Como Um Curso em Milagres enfatiza, a correção do Espírito Santo para o sonho de separação do meu ego já aconteceu, porque o tempo já acabou, como notamos em um capítulo anterior (pergunta 16, na página 19). Mas, uma vez que eu continuo andando por aí, acreditando e experimentando de outra forma, a correção vai me atingir em uma forma com a qual eu possa me relacionar.

Em conclusão, simplesmente a partir desses dois exemplos, deveria ficar claro que Jesus realmente sabia o que estava fazendo quando ditou esses três livros do Um Curso em Milagres, e que somos nós que temos uma compreensão falha sobre como ele integra esse currículo e alcança o objetivo de mudar nosso sistema de pensamento.

62) Um Curso em Milagres tem que ser estudado, ou é suficiente apenas fazer o livro de exercícios e ler o texto a esmo, de qualquer forma em que me sentir guiado a fazer?

Novamente, não existe forma certa ou errada de seguir Um Curso em Milagres como caminho espiritual. No entanto, existem certas diretrizes que podemos apresentar que podem ajudar a assegurar que o trabalho da pessoa com o Curso não está sendo guiado pelo ego. Uma diretriz dessas é sempre retornar às próprias instruções de Jesus para o seu currículo. Os três livros foram estabelecidos como um curso de estabelecimento e ensino, no qual, para resumir novamente, existe o livro texto básico, que contém o material teórico que o instrutor (aqui, é claro, é Jesus) deseja que a classe estude, aprenda e compreenda; o livro de exercícios, que, como em um curso em laboratório, por exemplo, é a aplicação prática do que é aprendido no texto; e o manual, que oferece diretrizes para todos os alunos, que, nesse currículo, são também professores.

O que isso significa para os estudantes do Curso? Simplesmente que eles são solicitados por Jesus a estudarem, aprenderem e entenderem seu material de ensino, assim como a prática dos princípios de perdão do Curso. É por isso, por exemplo, que ele não requer que os estudantes entendam o que é dito no livro de exercícios, como já vimos na citação acima. Mas ele não deixa seus estudantes fora da mira quando chega ao texto. Perto do final do Capítulo 1, ele afirma muito claramente:

Esse é um curso de treinamento da mente. Todo aprendizado envolve atenção e estudo em algum nível. Algumas partes posteriores do curso se baseiam tanto nestas seções iniciais, que elas requerem um estudo feito com cuidado. Tu também necessitarás delas para a preparação. Sem isso podes ficar temeroso demais com o que virá para usar o curso construtivamente. Contudo, à medida em que fores estudando estas parte iniciais, começarás a ver algumas das implicações que serão ampliadas posteriormente (T-1.VII.4; grifos nossos).

De fato, durante o ditado do Curso, Jesus foi bem insistente com Helen e Bill para que eles estudassem essas notas, como ele se referia ao material. Ele estava falando à maneira de um professor da escola secundária, insistindo que seus estudantes prestassem atenção cuidadosa ao que estava sendo ensinado, e para estudarem as notas de leitura que ele estava dando. Seria uma contradição direta aos desejos de Jesus não estudar o texto, como ele especificamente pede. Ignorar essas instruções muito específicas no final do Capítulo 1 provê ainda outro exemplo do problema de autoridade dos estudantes, no qual eles acreditam que sabem melhor do que Jesus o que é dos seus melhores interesses, sem mencionar como deveriam proceder com o seu Curso.

Em relação ao livro de exercícios, uma vez que não é destinado a ser o aspecto de ensino do currículo, não precisa ser lido nem estudado da mesma forma que o texto. Certamente, no

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entanto, precisa ser praticado conforme as instruções orientam. Tendo disso isso, apesar disso acreditamos que os estudantes fariam bem em seu trabalho com Um Curso em Milagres – para ampliarem sua compreensão dele – em lerem cuidadosamente o próprio livro de exercícios em algum ponto, depois de terem terminado as lições, como deveriam fazer com o texto. Muitos ficariam atônitos com o que encontrariam aqui: uma profundidade de ensinamento que pode facilmente ser ignorada conforme a pessoa faz as lições no programa de treinamento de um ano.

63) Deve-se ensinar Um Curso em Milagres às crianças?

A própria Helen gostava de dizer sobre Um Curso em Milagres: “Finalmente, um sistema espiritual para os intelectuais”. Pareceria para nós que a única maneira de ensinar o Curso às crianças é através da vivência dos seus pais, professores, etc. Como sabemos, as crianças têm em seus jovens ombros a carga de aprendizado de uma vasta quantidade de informações relacionadas à adaptação às exigências físicas, psicológicas e sociais dentro de um mundo de multiplicidade. Tentar ensiná-las que esse é um mundo de ilusões e sonhos – todo feito como um ataque a Deus – não apenas confundiria seu aprendizado, mas iria deixá-las confusas sobre como se relacionarem com esse mundo. Portanto, o desejo de termos uma versão infantil do Um Curso em Milagres perde totalmente o ponto certo de vista. O que torna Um Curso em Milagres o que ele é, é a integração dos seus ensinamentos sobre o perdão com sua metafísica não-dualista. Sem essa fundação, você não tem mais Um Curso em Milagres.

Para nos certificarmos, é sempre útil ensinarmos as crianças em palavras e atos que Deus é um Criador amoroso, Que não pune Suas crianças. E existem muitas espiritualidades que ensinam isso e que são perfeitamente adaptáveis para crianças. Um Curso em Milagres, por outro lado, não pode ser adaptado sem perder sua essência, no entanto, aquelas figuras de adultos que se relacionam com as crianças e são estudantes do Curso podem ajudá-las a desfazerem o sistema de pensamento do ego que termina com a premissa de que Deus vai puni-las por seus pecados. Uma vez que os pais e outra figuras de autoridade são as figuras de sonho inevitáveis simbolizando Deus, eles têm a capacidade de reforçar tanto o sistema de pensamento de culpa e punição, quanto o sistema de pensamento do Espírito Santo que corrige equívocos através do perdão.

64) De acordo com Um Curso em Milagres, como as crianças deveriam ser criadas?

Como o Curso afirma: “O currículo é altamente individualizado, e todos os aspectos estão sob o cuidado e orientação particulares do Espírito Santo” (MP-29.2:6). Portanto, Um Curso em Milagres não ensina qualquer comportamento especifico de forma alguma, incluindo como criar crianças. Mas o que o Curso realmente ensina é que se você é um pai ou mãe, ou alguém que trabalha com crianças, é sua incumbência pedir continuamente ajuda ao Espírito Santo. Dessa forma, tudo o que pensar, fizer e disser virá da sua mente certa, e não do seu ego.

Muitos estudantes do Um Curso em Milagres nos relataram que uma vez que começaram a estudar o Curso, se sentiram relutantes em fazerem julgamentos sobre o comportamento dos seus filhos, ou até mesmos discipliná-los, por medo de fazerem julgamentos sobre eles e dizer a eles que estavam errados. Isso é uma distorção do que Jesus está ensinando. Primeiramente, uma pessoa pode entender que ser pai ou mãe, ou trabalhar intimamente com crianças, é uma sala de aulas muito intensa que escolhemos, precisamente por causa dos julgamentos constantes que precisam ser feitos sobre qual é o maior interesse da criança – decisões que uma criança não é capaz de tomar -, quando a criança iria claramente escolher algo que iria feri-la. Como Jesus afirma no texto:

Os bebês gritam com fúria quando tu lhes tiras uma faca ou uma tesoura, embora eles possam muito bem causar dano a si mesmos caso tu não o faças (T-4.II.5:3-5).

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Em segundo lugar, aprender como sair do caminho para acessar a mente certa, e talvez disciplinar uma criança dizendo – sem culpa ou raiva – “Não, esse comportamento não será tolerado”, podem ser pontos de referência muito importantes no processo do próprio crescimento.

Portanto, assim como com tudo o mais, não existe forma certa ou errada de criar crianças, nenhuma forma específica de acordo com Um Curso em Milagres. Existe apenas o caminho individual de pedir ajuda ao Espírito Santo para praticar o perdão. Seu Amor é sempre o mesmo, e encontra sua forma particular de expressão através de cada indivíduo particular, em cada circunstância particular. Nossa responsabilidade é remover, com Sua ajuda, as interferências do nosso ego para que possamos ser guiados de forma mais direta por esse Amor – em todos os relacionamentos, com crianças ou adultos.

65) E os grupos que se reúnem para estudarem o Um Curso em Milagres?

Vamos começar com a afirmação de que não existe absolutamente nada em Um Curso em Milagres sobre grupos, encontrar outras pessoas, ou unir-se no nível da forma, etc. A significância disso é que ilustra como o processo de estudar o Curso acontece no nível da mente, e é, na verdade, um curso em auto-estudo. Sua ênfase está sempre em unir-se a Jesus ou ao Espírito Santo na mente, e pedir Sua ajuda para perceber de forma diferente um relacionamento aparentemente externo, ou qualquer situação a esse respeito. Esse é o significado do perdão. Nossa experiência de sermos um corpo, interagindo com outros corpos, se torna a sala de aula na qual pedimos ajuda ao nosso Professor para nos ajudar a mudarmos nossas mentes. A única união, então, que é verdadeiramente significativa é com Jesus ou com o Espírito Santo, e essa deveria ser sempre e apenas o foco do estudante do Curso, o que o texto cita como “A união maior” (T-28.IV). Uma vez que, como está afirmado na seção com esse título, o Espírito Santo está em todas as mentes dos Filhos separados, unindo-os a Ele – o que, novamente, é o verdadeiro significado do perdão – a pessoa já se uniu a todos os outros. As palavras reais do texto são:

O Espírito Santo está nas mentes de ambos e Ele é Um porque não existe nenhuma brecha que separe a Sua Unicidade de Si própria. A brecha entre os vossos corpos não importa, pois o que é unido Nele é sempre uno (T-28.IV.7:1-4).

Portanto, é irrelevante para os propósitos do perdão se existe ou não “uma brecha entre os corpos”. Nós já estamos unidos. O perdão desfaz a brecha aparente que existe entre nossas mentes, e retorna à nossa consciência o fato da nossa unicidade uns com os outros e com nossa Fonte.

Com muita freqüência, os estudantes do Um Curso em Milagres esquecem essa união maior, e, por causa dos bons sentimentos que com freqüência vêm, de estarem externamente com outras pessoas, eles sentem que é sobre isso que Jesus está falando quando discute a união. Na verdade, no entanto, seu foco está sempre na remoção das barreiras do especialismo que colocamos entre nós mesmos e os outros. E essas barreiras são sempre pensamentos dentro das nossas mentes, como o Espírito Santo é um Pensamento dentro de nossas mentes certas. E então, nossa atenção sempre deveria ser colocada em trazer os pensamentos de especialismo do ego aos pensamentos de perdão do Espírito Santo – mais uma vez, dentro da mente. Apenas aí, poderemos estar certos de que nossa união externa com os outros é realmente Dele e não do ego.

Certamente, não pode haver nada errado com qualquer estudante do Um Curso em Milagres se unir externamente a outros estudantes. No entanto, o foco dos estudantes do Curso não pode ser o comportamento, mas sempre o professor interno que escolhemos para guiar nosso comportamento. Portanto, o ponto de partida é tentar o melhor possível fazer com que nossas ações – quer envolvam estudar o Curso ou qualquer outra coisa – se originem da

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sincera tentativa de trazer o envolvimento do nosso ego a Jesus antes de iniciarmos alguma atividade.

Se os estudantes se sentirem levados a participarem de algum tipo de grupo ou organização sobre o Curso, sempre deveriam ficar vigilantes para que esse envolvimento não se torne um substituto para seu próprio trabalho individual – estudar e praticar – com o material em si. De outra forma, eles facilmente cairão nas dobras do especialismo, que pode se definido, como já vimos, como usando qualquer coisa como um substituto para o Amor de Deus. Para enfatizarmos novamente nosso ponto inicial, existe uma razão para Jesus não dizer coisa alguma no Curso sobre unir-se em grupos. E os estudantes sempre deveriam estar cientes de que sua única ênfase em Um Curso em Milagres é sobre o relacionamento individual do estudante com o Espírito Santo, baseado na disponibilidade de praticar o perdão.

66) Eu preciso de um psicoterapeuta, mas só quero um terapeuta que seja estudante do Um Curso em Milagres, ou pelo menos esteja familiarizado com ele e simpatize com seus ensinamentos. O que devo fazer?

Como terapeuta, eu (Kenneth) freqüentemente sou solicitado pelos estudantes do Curso ao redor do país para recomendar um terapeuta que seja estudante do Um Curso em Milagres. Minha resposta usualmente é algo relacionado a: “Se você precisasse de uma cirurgia, iria querer alguém que seja um cirurgião do Curso, ou alguém que seja um ótimo cirurgião?”. De forma similar, o que qualquer pessoa que precise de terapia quer é alguém que seja bem treinado e supervisionado, como é uma pessoa com quem se possa relacionar e confiar. Existem relativamente poucos estudantes do Um Curso em Milagres que tenham essas qualificações como psicoterapeuta, quando comparados com a maioria dos terapeutas profissionais disponíveis. Simplesmente ser um estudante do Curso e “pedir” orientação do Espírito Santo para ajudar outros dificilmente é suficiente, especialmente dada a quantidade de especialismo que usualmente está presente em tais “terapeutas”, uma situação sobre a qual já falamos.

Portanto, se um estudante do Curso encontra um terapeuta profissional que também é um estudante do Um Curso em Milagres, ótimo. Mas, se esse estudante realmente precisa de um psicoterapeuta sensível e competente, uma falta de antecedentes do terapeuta em relação ao Curso dificilmente deveria ser uma consideração contra escolher um terapeuta assim. Estudantes buscando terapia deveriam ser cautelosos em relação a “programas de treinamento” em psicoterapia que são dirigidos por estudantes não-profissionais do Curso, que então recomendam esses “trainees” a outros; ou aqueles que têm listas de referências de “terapeutas do Curso”. Mais uma vez, você não quer uma pessoa que vá cortar seu estômago e tenha sido treinada por outros estudantes do Curso, mas, ao invés disso, um cirurgião treinado e competente, que foi treinado por outros médicos treinados e competentes. Não deveria ser nada diferente ao escolher um terapeuta para ajudar com problemas pessoais. Programas legítimos de treinamento em psicoterapia podem não ser livres do sistema de pensamento do ego, como Jesus aponta no panfleto Psicoterapia: Propósito, Processo e Prática (P-3.II.2:2-4), mas pelo menos garantem uma certa quantidade de treinamento e experiência supervisionada que forma uma sólida fundação de perícia que assegura que o paciente está em competentes mãos profissionais. Uma pessoa pode ser ajudada de forma muito efetiva a vencer os bloqueios do ego por um terapeuta que não seja estudante do Um Curso em Milagres, ou de qualquer outro caminho espiritual da mesma forma.

67) Se Um Curso em Milagres é um ensinamento universal, por que ele vem em termos tão sectários (i.e., cristãos)? Isso não limita sua aplicabilidade mundial?

Enquanto a mensagem básica do Um Curso em Milagres é universal – “O Filho de Deus é inocente, e sua inocência é sua salvação” (MP-1:3-5) -, sua forma certamente não é, nem está destinada a ser. Nós já citamos as palavras de Jesus com o fato de que esse é um “currículo

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especial”, que claramente reflete que tem uma audiência especial: o mundo ocidental que cresceu sob a forte influência do cristianismo, e a psicologia do século XX, uma influência que não tem sido muito cristã nem espiritual. É por isso que a linguagem do Curso é tão ocidental e, mais especificamente, cristã e psicodinâmica em sua afirmação. Como o caminho espiritual específico que chamamos de Um Curso em Milagres, o Curso simplesmente não está destinado a ter uma aplicabilidade mundial. Outras culturas e tradições religiosas têm, e vão continuar a ter, seus próprios caminhos espirituais, assim como nós no mundo ocidental agora temos o Curso, entre muitos outros. Como já mostramos repetidamente nesse livro, a união universal com todas as pessoas é o conteúdo do curso universal, mas as formas específicas nas quais as pessoas aprendem essa lição constituem as formas do “currículo especial”, do qual Um Curso em Milagres é simplesmente um exemplo. Formas, quase por definição, não são a mesma e não podem se misturar. Portanto, elas não podem ser universais, ou para todas as pessoas. É por isso que Jesus ensina na introdução ao esclarecimento de termos, para repetir e ampliar essa importante afirmação:

Uma teologia universal é impossível, mas uma experiência universal não só é possível como necessária. É para essa experiência que o curso está dirigido (C-in.2:8-10).

Essa “experiência” universal, ele não diz, é o amor, e Um Curso em Milagres é apenas uma forma de recuperá-la.

68) Por que a linguagem do Um Curso em Milagres é tão difícil de ler e entender? Por que Jesus não poderia tê-lo escrito de forma mais simples?

É sempre uma tentação para os seguidores de caminhos espirituais mudarem a inspiração original e transformá-la no que eles pensam que deveria ser, ao invés de na forma em que foi dado. E esse mesmo fenômeno acontece com Um Curso em Milagres também. Ao invés de adotar uma atitude de aceitação do que é, e depois adaptá-la a ele, estudantes se sentem tentados a adaptarem o Curso a eles. Esse é o caso com o estilo da escrita que a pessoa lê no Um Curso em Milagres, que, de vez em quando, parece a muitos estudantes densa, elíptica, obscura e simplesmente difícil demais de entender.No entanto, existe uma razão para o estilo do Curso, e seria um grande desserviço à pedagogia de Jesus querer mudá-lo. Um Curso em Milagres foi escrito de uma forma que exige que os estudantes prestem atenção cuidadosa ao que está escrito. Esse não é um livro – e estamos falando primariamente aqui sobre o texto – que possa ser lido rapidamente. Quase todos os estudantes experimentam a necessidade de ler a mesma sentença várias vezes antes de começarem a entendê-la; ou se torturaram em relação aos sujeitos apropriados para os pronomes. Mas o que eles geralmente encontram, se forem fiéis ao propósito de Jesus, é que, através do próprio processo de entender o significado de uma sentença ou passagem, tornaram claro um nível de significado que de outra forma não teriam entendido. O “estudo cuidadoso’ que Jesus incita seus estudantes a praticarem, discutido acima, é destinado muito literalmente. E o estilo literário assegura que os estudantes sérios vão dar a Jesus a atenção e dedicação que ele está pedindo. Uma vez que os estudantes do Curso compreendam seus ensinamentos, ficarão atônitos com o quanto ele é “simples, claro e direto” – palavras que o próprio Jesus usa para descrever seu Curso – um verdadeiro Curso em Milagres.

69) Posso fazer o Um Curso em Milagres por mim mesmo, ou preciso de um parceiro?

Como já mencionamos, Um Curso em Milagres é inerentemente um currículo de auto-estudo. A vida da pessoa – passada, presente e antecipada do futuro – é a sala de aula. Todos os relacionamentos da pessoa – caindo em qualquer uma das três categorias dadas no manual, indo do superficial até um intenso relacionamento circunscrito à vida toda de uma

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pessoa (MP-3) – provê o que os “parceiros” precisavam para a prática do perdão. Uma pessoa não precisa de um parceiro “designado” para essas práticas, nem o parceiro tem que ser um estudante do Curso, como já discutimos brevemente na pergunta 31. Qualquer um e todos servirão. Insistir em que um parceiro tenha a mesma opinião espiritual, e ainda mais especificamente, um estudante do Um Curso em Milagres, é confundir a forma com o conteúdo, e cair na armadilha do especialismo que é a própria coisa que o Curso almeja desfazer. Como já discutimos antes, a definição do Curso para união não tem nada a ver com os corpos ou coisas externas de qualquer tipo – “Mentes são unidas; corpos não” (T-18.VI.3:1). União, ao invés disso, tem a ver com unir-se a Jesus ou ao Espírito Santo, em Quem todos os membros da Filiação são encontrados como um, não importando seu caminho espiritual, ou ausência dele.

Portanto, realmente não importa com quem uma pessoa pratica as lições de perdão. A projeção da culpa permanece sendo o que é, não importando a forma do relacionamento ou a natureza da pessoa ou situação na qual é projetada. Tudo e todos no sonho que chamamos de nossas vidas oferecem as oportunidades de reconhecermos que o que percebemos e tornamos real fora de nossas mentes, tem existência apenas dentro de nossas mentes. Portanto, nada mais é necessário para uma pessoa trabalhar com Um Curso em Milagres, exceto ver a própria vida como a sala de aula, e a disponibilidade de deixar que Jesus nos ensine como percebê-la de forma diferente.

70) Um Curso em Milagres é melhor praticado em reclusão, sem as distrações do mundo?

Fazendo sérias considerações sobre essa pergunta, a pessoa reconheceria que ela não faz sentido. Dentro dos nossos sonhos individuais, estamos sempre sozinhos, porque não existe mundo fora de nossas mentes. Tentarmos nos separar do mundo, nos afastarmos dele, é simplesmente cair na armadilha do ego de “tornar o erro real”, que já discutimos. Novamente, iríamos ver o problema como estando do lado de fora da mente – nesse caso, o atarefado e distrativo mundo da separação e multiplicidade – e, dessa forma, o teríamos tornado real, assegurando-nos que ele nunca será desfeito. Na verdade, no entanto, o problema é os pensamentos atarefados e distrativos de separação e multiplicidade que estão em nossas mentes. Mudar o mundo externo para tentar resolver o problema do nosso mundo interno é uma boa definição funcional para o que o Curso quer dizer com mágica. E então, pelo fato de os estudantes acreditarem que só podem estudar e aprender o Um Curso em Milagres deixando a sala de aula das suas vidas, quase certamente estão seguindo a orientação dos seus egos, que iriam se certificar de que eles nunca aprendessem suas lições de perdão; eles inconscientemente separaram a si mesmos deles.

Embora sempre existam exceções, pensamos que seja uma afirmação justa a se fazer a de que quase todos os estudantes do Um Curso em Milagres deveriam praticar seus princípios exatamente como são. É por isso que Jesus incluiu a seguinte pergunta no manual para professores: “São necessárias mudanças na situação de vida dos Professores de Deus?”. Sua resposta explica que para a maioria dos estudantes, “é bastante improvável que mudanças de atitude não sejam o primeiro passo em um professor recém-formado no treinamento de Deus” (MP-9.1:4). E aqueles que se sentem guiados a mudarem sua situação “quase imediatamente” são “geralmente casos especiais” (MP-9.1:6). Naturalmente, muitos estudantes do Um Curso em Milagres pensam que caem nessa categoria especial. A vida da maioria das pessoas é dolorosa, cheia de circunstâncias, relacionamentos e condições corporais que são muito traumáticas. É difícil, portanto, para elas, evitarem a tentação de reinterpretarem o Curso, ou de “ouvirem” o Espírito Santo lhes “dizer” para deixarem seus empregos e/ou famílias, e simplesmente estarem com Ele para aprenderem a ensinar o Curso aos outros. É sempre útil se lembrar de que não pode haver “distrações no mundo”, a menos que você primeiro queira ser distraído e, portanto, tenha uma necessidade de que isso seja assim. Como Jesus afirma no texto, no contexto do mal:

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Não te esqueças de que as testemunhas do mundo do mal não podem falar, exceto por aquilo que tenha visto uma necessidade de mal no mundo (T-27.VII.6:2-4).

O mundo, como o corpo, em e por si mesmo é neutro. Ele simplesmente faz por nós o que pedimos que faça.

Nós freqüentemente gostamos de lembrar aos estudantes sobre as origens do Um Curso em Milagres. Ele não teve seu início em um deserto, ou no topo de uma montanha santa, nem Helen era uma freira enclausurada, “enterrada viva para Deus”. Jesus ditou seu Curso a Helen em meio a um relacionamento profissional muito tumultuado com Bill, onde ambos estavam muito ocupados com seus empregos éticos, em um dos maiores, mais prestigiados e mais baseados-no-ego centros médicos, no coração da cidade que está entre as mais importantes e ocupadas do mundo. O “treinamento é sempre altamente individualizado” (MP-9.1:5), no entanto, acreditamos que a própria história do Um Curso em Milagres provê uma sólida testemunha e exemplo de como seus estudantes deveriam aplicar sua pequena disponibilidade para aprenderem em meio às suas vidas normais, diárias.

71) Existem algumas pessoas que completaram com sucesso o Um Curso em Milagres, e quem são elas?

Quando isso é perguntado durante os workshops, nós algumas vezes dizemos às pessoas (com uma face impassível) que existe uma lista, mas a mantemos trancada, em um escritório seguro. Na verdade, no entanto, essa é uma pergunta que ninguém poderia responder verdadeiramente, pois como alguém poderia saber? Para começar, é provável que alguém que esteja realmente no mundo real, não saia por aí, alardeando o fato. Em segundo lugar, as pessoas geralmente pensam sobre o “sucesso” no Curso em termos de certos critérios externos que podem ser vistos, e esses critérios claramente não seriam compartilhados por todos. Uma das nossas histórias favoritas para ilustrar esse último ponto é a do jovem fervoroso que veio até Kenneth depois de um workshop no final de semana, em uma cidade do meio-oeste, dizendo: “Sei que você deve ser alguém muito avançado, por que não fuma cigarros, não bebe café, e não fica indo ao banheiro”. Outros critérios de “espiritualidade” incluem não trancar a porta do carro ou a casa porque a pessoa “confia em seus irmãos que são um com ela” (LE-pI.181), ou recusa garantias policiais porque “coloca seu futuro nas Mãos de Deus” (LE-pI.194). O ponto, naturalmente, é que tais julgamentos sobre adiantamento espiritual são sempre baseados em fatos externos, sem que a pessoa que julga saiba qual é o conteúdo por trás da forma, apesar da aparência “espiritual” da forma.

Além disso, implícito em questões como essa, está um medo latente de ser incapaz de alcançar o objetivo do Curso. Ouvir sobre outros que o fizeram, com freqüência provê testemunhas externas, quando a confiança expressa de Jesus em seus estudantes não é suficiente.

O ponto de partida, sempre que a pessoa se sentir tentada a ser indulgente com tais pensamentos de especialismo espiritual, é sempre se focalizar nas próprias lições de Expiação, dessa forma evitando a distração de pensar sobre os outros que conseguiram ou “não conseguiram”. Conforme a paz retorna à mente do estudante, a pergunta já terá sido deixada de lado.

72) O que se deve dizer a um estranho, um membro da família, ou um amigo que pergunta o que é Um Curso em Milagres?

Basicamente, não existe forma certa ou errada de responder a essa pergunta, quer seja um estranho, membro da família ou amigo que esteja fazendo perguntas sobre o Curso. No final das contas, todos precisam ir para dentro e tentar tirar o próprio ser egóico do caminho, e depois pedir ajuda para como responder. Especificamente, deve-se prestar atenção cuidadosa

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a qualquer das diversas formas de especialismo do ego que poderiam interferir ao falar com os outros sobre Um Curso em Milagres. Elas incluem: 1) sentir-se importante porque está associado a um ensinamento tão espiritualmente avançado, que vem do próprio Jesus e, portanto, a pessoa quer que os ouvintes fiquem impressionados, se não deprimidos, por não serem estudantes do Curso; 2) desconforto relacionado à figura de Jesus, tanto como o autor do Um Curso em Milagres quanto como sua figura central; e 3) desconforto relacionado ao próprio Curso – sua linguagem religiosa e distintivamente cristã e patriarcal, sem mencionar seus ensinamentos radicais que incluem a chave do princípio metafísico de que Deus não criou o universo físico ou material.

Portanto, embora não haja palavras corretas ou incorretas para usar ao falar sobre Um Curso em Milagres, existe uma maneira correta de proceder. E isso encerra pedir ajuda a Jesus ou a o Espírito Santo para tirar o próprio ego do caminho, para que as palavras mais amorosas fluam através de nós. Quando verdadeiramente Os deixamos serem os Guias para falarmos, a pessoa pode estar certa de que a integridade do Curso será mantida, e, ao mesmo tempo, estará livre para ser sensível às necessidades e nível de compreensão da pessoa com quem se está falando. Aqui, assim como em tudo o mais, podemos ver que o processo é sempre o mesmo, não importando a situação específica. É por isso que Jesus repetidamente fala sobre seu Curso como sendo simples.

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