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    FICHACATALOGRFICA ELABORADA PELABmUOTECACENfRAL- UNICAMPAubert, Francis HenrikAu14i As (in)fidelidades da traduo: servides eautonomia do tradutor I Francis Henrik Aubert.-Campinas, SP: Editara da UNICAMP, 1993.'Coleo Viagens da Voz)20. CDD - 418.02- 418 -; ":'lS.O:_, __ ;_::..:. "':'lSColao Viagens da VozCopyright by Francis Hen,\ik AubertCoordenao EditorialCannen Silvia P TeixeiraEditoraoNfvia Maria FernarulesPreparao de originaisVera Luciana MorandinRevisoKatia de Almeida RossiniVania Aparecida da SilvaComposio

    Gilmar Nascimento SaraivaSilvia Helena P. C. GonalvesLufs Cludio GomesMontagemEdnilson TristoCapaVlad Camargo"( .\'1'].2r1993Ejlwra da"ClO. Cxflio Feltrin, 253Cii3.:e Lc..:yer.sitria .. Baro GeraldoCEP 13084-1l CJ Campinas .. SP .. Brasil

    (0192) 39.3720Fax: (0192) 39.3157SUMRiOIntroduoA dimenso temporalOs participantes do ato tradutrioOs cdigosOs referentes e suas expresses no cdigoInterao entre os participantes do atotradutrio e o complexo cdigo/referente:a questo das competnciasOs canaisAs mensagens e os limites da "fidelidade"

    A autonomia do tradutor e da traduoBibliografia715232943536373

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    7987---------------" ,,'INTRODUOEm uma viso bastante difundida da traduoe do traduzir, o seu agente, o tradutor, tende a servisto como submetido a diversas "servides". Es-cravo do texto e/ou do autor do original e atrelados restries impostas pelas diversidades lingsti-cas e culturais, o tradutor deveria, na medida dopossvel e do abstrair o seu prprio ser,tomar-se um mero livre de "rudos" ou ou-tras obstrues passagem "plena" do texto origi-nal sua nova configurao lingstica. Quandoestas se manifestam, ou so tidas por se manifesta-rem, constituiriam "interferncia" indevida porparte do tradutor, 'riginrios de sua incompetnciapara a funo que se props, e resultante em des-vios inadmissveis. Quando, porventura, essas obs-trues passam desapercebidas, a percepo daexistncia do tradutor fica ofuscada. Lembrado emsuas falhas, relegado ao esquecimento em seus xi-tos, o tradutor, nessa viso, aparece como figura

    menor, secundria, um mal por vezes necessrio,7mas sem mrito pessoal outro que no seja o seuprprio apagamento. foroso admitir que os casos de incompetn-cia, em seus diversos matizes de escopo e de inten-sidade, cfu'11peiam na rea da traduo tanto quantoem quaisquer outras esferas de atividade, profissio-nal ou no. As verdadeiras questes, porm, sooutras. cabvel exigir do tradutor o seu pr6prioapagamento? Em que medida aceitvel o desviodo texto traduzido em relao ao original? Admitidaa diversidade lingfstica e cultural, sem as quais

    estaria prejudicada ii pr6pria razo de ser da tradu-o, at que ponto a diversidade constitui, efetiva-mente, um conjunto de "servides" impositivas?A busca de respostas a tais indagaes' exige,.. evidente, uma anlise mais detida e detalhada dosdiversos fatores intra e intersubjetivos, temporais,lingsticos e culturais, que se fazem presentes e'exercem variadas influncias sobre o desenrolar doprocesso tradut6rio e, por conseguinte, sobre o seuproduto, o texto traduzido.Aqui coloca-se uma primeira dificuldade. Asquestes propostas dizem respeito, primordialmente,ao fazer tradut6rio, mais que ao texto traduzido. No

    entanto, os estudos tradutol6gicos que tmpor nfa-se primeira a anlise do produto do ato tradut6rio eo confronto deste com o texto de partida, "origi-nal",1 compem a parte mais volumosa da biblio-grafia sobre o tema. Menos freqentes e, talvez nosurpreendentemente, mais hesitantes ou mais pol-1 Para um questionamento do conceito de "texto original", videArrojo, 1986.8micas, so as tentativas de flagrar a traduo no seu

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    gens geradas no primeiro e no segundo atos comu-nicativos mantm entre si um certo grau de corres-pondncia, correspondncia essa cuja natureza pre-cisa constitui um dos principais desafios para a re-flexo sobre o fenmeno tradutrio, especificamen-te, e sobre o fenmeno lingstico, em geral. So,10por necessidade, diferentes em um ou mais aspectos(caso contrrio no se efetiva uma substituio esim mera reiterao, geralmente incua) e, no en-tanto, entretm entre si uma relao tal que se-gundo ato comunicativo (o ato tradut6rio) produz(ou perceptivelmente procura produzir) efeitos desentido similares aos pretendidos no primeiro.Dessa substituio, e tendo em vista o inter-valo de tempo, maior ou menor confonne o caso,entre os dois atas comunicativos, decorre uma certaalterao de papis na relao Emissor/Receptor,alm da substituio ou variao de um ou maiscomponentes do complexo comunicativo, incluindoos participantes propriamente ditos, o cdigo e/ou oreferente, a mensagem e/ou o canal.A natureza.do bloqueio comunicativo que ger\uma situao tradut6ria prende-se, como ficou dito,

    variao lingstica. Entenda-se tal variao no;seu mais amplo sentido: abarca desde as variaesque se apresentam em uma (cor)relao geogrfica,(lnguas, dialetos, falares regionais), passando pelasvariaes temporais (dialetos diacrnicos), sociais(socioletos), individuais (idioletos), de canal (es-crita/fala) e at as circunstanciais (condies deproduo da mensagem numa detenninada situa-o). Assim: um sotaque, um arcasmo, um jargo,um cacoete de expresso; o analfabetismo absolutoou funcional de um dos participantes da reladEmissorlReeptor; um pronunciado diferencial dd:motivao entre tais participantes; uma efetiva dife-)

    rena de conhecimento ou de ponto de vista sobre oreferente; uma marcada discrepncia de domnio do'cdigo empregado; qualquer um desses fatore,S,isoladamente ou em cumulaes e intensidades va-11FREFERENTE I REt;ERENTE 2EMISSOR I MENSAGEM 1 RECEPTOR 1::::;' EMiSSOR 2 MENSAGEM2 RECEPTOR 2IRECEPTQR 3CANAL 1 CANAL 2CDIGO I CDIGO 2Transposto para as situaes em que ocorre oato tradutrio, tal esquema, numa primeira aborda-

    gem, apresenta-se da seguinte forma:Cada um dos diversos componentes da se-qncia comunicativa compreende um conjunto devariveis de natureza psicosocial (motivacional, dehierarquia, e outros), factual, lingfstica, econmi-ca, jurdica etc. Igualmente, ocorrem interaes en-tre cada um desses conjuntos de variveis. Constituiuma das hip6teses de trabalho dessas reflexes aafinnao de que a configurao especfica de cadaum desses conjuntos de variveis e o modo de inte-

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    modo de traduo - a traduo no seu sentido '-13.15corriqueiro - deve ser entendido como comparti-lhando da natureza de um fenmeno complexo (lin-gstico, comunicativo, cultural) de maior abran-gncia e no como uma peculiaridade, um rito mis-terioso e de poucos iniciados, ou, inversamente,uma atividade marginal, secundria, estigmatizadapelo nefando Tradutori, tradittori (vide tambmAubert, 1991a).O esquema clssico da comunicao organiza-se, de acordo com Jakobson (1969), como segue:)REFERENTEMENSAGEM RECEPTORCANALCDIGOEMISSORriadas, pode levar a uma ruptura do elo comunicati-vo, em que a decodificao da mensagem deixa dese produzir de maneira adequada s respectivas in-tenes dos referidos participantes.Em face de tal ruptura, pode ocorrer (a) oabandono da relao comunicativa (o silncio) ou(b) a busca de caminhos alternativos que permitam a

    superao do bloqueio (do "rudo na comunica-o"). Feita a opo por empreender tal busca,ocorre uma retomada da relao Emissor/Receptorem um novo ato comunicativo, o ato tradutrio.Assim conceituado, o ato tradut6rio entendi-do num sentido amplo, posto que no limitado a si-tuaes de discrepncias de cdigo lingfstico. Fi-lia-se, portanto, aos conceitos de Jakobson (1969) eMel'chuck (1978), embora sem se confundir comeles. Em Jakobson e Mel'chuck, por caminhos di-versos, a traduo vista primordialmente comouma operao lingstica strict sensu: como parfra-se ("dizer. a 'mesma' coisa com outras palavras, sig-

    nos, smbolos, cones"); ou como constituindo aprpria relao significado ( - ) significante, postu-ra pela qual Cincia da Linguagem e Teoria da Tra-duo se confundiriam. Aqui, correndo algo para-lelamente a Jakobson, a nfase primeira posta noaspeCto comunicativo do ato tradutrio, trazendopara uma reflexo global acerca do fenmeno noapenas os elementos lingsticos e antropolgicoscomo tambm os seus aspectos sociais e situacio-nais, individuais e at mesmo comerciais.No presente trabalho, embora a referncia b-sica seja feita traduo interlingual, a remisso aosentido amplo do ato tradutrio estar, explicita ou

    implicitamente, sempre presente. Com efeito, tal12 13rao entre os mesmos produzem, em princpio, umnmero de interdependncias, determinaes econstelaes (no sentido dado por Hjelmslev, 1943,a esses termos) teorica.rnente infinito, embora pass-veis de categorizao. E um dos propsitos funda-mentais aqui perseguidos ser o de propor tal cate-gorizao das variveis pertinentes consecuo do

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    ato tradutrio.Neste intuito, e na conscincia de que o pre-sente estudo no pode pretender a propositura derespostas definitivas mas ter flego pata, ao me-nos, encetar uma explorao desses fatores e de seuentrecruzamento no ato tradut6rio, sero abordadas,seqencialmente, as dimenses temporais do atotradut6rio e os participantes desse ato; sero reto-madas e reelaboradas, de forma sinttica, algumasdas consideraes j amplamente difundidas da bi-bliografia especializada relativas aos cdigos e aosreferentes em confronto; tratar-se- dos diversosproblemas atinentes aos canais (oralidade e escrita)da comunicao, raramente enfatizados na discussodo fenmeno tradut6rio exceto para sinalizar a es-pecificidade da interpretao em relao traduoescrita. Inevitavelmente, sero ainda abordadas asmensagens em si, no quadro de uma discusso acer-ca dos limites da sempre esperada "fidelidade" natraduo, para, por fim, verificarmos em que medidaas reflexes encaminhadas permitem propor res-postas s questes levantadas de incio.14A DIMENSO TEMPORAL

    Como aludiu-se na Introduo, entre a produ-o do ato comunicativo inicial e a do ato comuni-cativo tradut6rio que se prope como seu equiva-lente ocorre necessariamente um certo intervalo. Talintervalo pode ser extremamente breve, como no jcitado caso da interpretao simultnea, ou, paramencionar mais um exemplo, na fala do no-nativoque formula mentalmente uma frase em sua lnguamaterna para, na seqncia, express-la, com ousem hesitaes marcantes, na lngua estrangeira.Pode, inversamente, estender-se sobre dias, sema-nas, anos ou, at, sculos e milnios. .. lOfm, aque.sJ? temporal na

    mais complexa. So, efetivamente, asdimens&s temporais que se sobrepem Ie interagem no processo tradut6rio: (a) a distnciaque se estende entre a concluso do processo deproduo do primeiro ato de comunicao e o pri-meiro contacto do tradutor com esse primeiro ato decomunicao; (h) a distncia que se estende entre aconcluso do processo de produo do primeiro ato15)___.. n .......~ ---- -- ---------------.---------------------_.............

    de comunicao e o incio do ato tradut6rio; (c) adistncia que se estende entre o primeiro contactodo tradutor com o primeiro ato de comunicao eo incio efetivo do ato tradut6rio, que diz respeito memria; e (d) a distncia que se estende entreo incio e o fim do ato tradut6rio e que se prende questo do prazo.Os diferenciais de tempo de tipos (a) e (b) fre-qentemente se confundem em uma mesma dimen-so (salvo na medida em que o diferencial de tipo

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    (b) se entrelaa com o diferencial de tipo (c) - videadiante). Exercem, em seus p6los extremos, in-fluncias diversas sobre a realizao do ato tradut-rio. Na i-lterpretao simultnea, a comunicaoprimeira e sua respectiva traduo so quase co-ocorrentes (na mdia, o intrprete encontra-se trspalavras atrs da fala original). Assim, o processotradut6rio tem de ser efetuado no apenas sem umaviso completa do texto mas, at, da estrutura sint-tico-semntica de cada enunciado da emisso origi-nal, ocasionando, como de se esperar, alguma he-sitao, improvisao e recriao. Na traduo detextos cujos originais remontam a um ou mais s-culos, manifestam-se diferenas diacrnicas mar-cantes, no apenas de natureza lingstica comotambm de natureza referencial, de viso de mundo,e outros, que colocam diversos problemas de inter-pretao e de decises estratgicas sobre o encami-nhamento a dar ao ato tradut6rio propriamente dito:(i) optar entre uma atualizao da linguagem vs.manuteno mais ou menos coerente do "arcasmo"do original: (ii) assistir leitura do texto traduzidocom notas, glossrios, comentrios em prefcio etc.para facilitar o acesso realidade extralingstica

    (inclusive ideolgica) expressa ou implcita no ori-16ginal vs. proceder sua maior ou menor "moderni-zao" etc.Nos casos em que ocorre um diferencial detempo ligeiramente mais afastado do imediatismomas ainda dentro de uma faixa cronol6gica que po-deria ser tido por "presente" (diferencial mensur-vel em termos de horas, dias, semanas) e mantidasas demais variveis idnticas, instituem-se condi-es favorveis! para a manuteno de pontos devista, interpretaes, vises de mundo no-discre-pantes entre o primeiro e o segundo atos comunica-

    tivos (original/traduo). A partir de um detenpJna-do grau de diferenciao, porm, quanto maior ointervalo de tempo entre esses dois atas, maior aprobabilidade de tais discrepncias se manifestaremou, visto sob outro prisma, maior o esforo a serdispendido na execuo do ato tradut6rio caso sepretenda evitar ou mitigar essas discrepncias. Nolimite, a abordagem p ~ e i r a (leitura) do texto ori-ginal j constituir um ato tradut6rio, quer porque diferencial diacrnico - lingstico e cultural - aca-bou alocando-o a um dialeto temporal diverso da-quele vigente no momento do ato tradutrio (porexemplo, portugus vicentino/portugus brasileiro

    contemporneo), quer porque o pr6prio complexolngua/cultura de partida deixou h mui.to de existir(por exemplo, o tico e a civilizao ateniense dosculo V a.C).A distncia que intermedeia o primeiro con-tacto do tradutor com o primeiro ato de comunica-1 Entenda-se por "condies favorveis" aquelas que, de princ-pio, favorecem detenninada soluo, mas que no a garantem, casooutros fatores presentes no ato tradut6rio ajam em sentido contrrio.17

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    l z s11o (texto original) e o incio efetivo do ato tradut-rio - diferencial de tipo (c) - corresponde ao espaoda mem6ria. Com o progressivo distanciamentotemporal, o texto original, neste espao, deixa pau-latinamente para trs a sua estrutura discursiva "o-riginal" para cristalizar-se como uma imagem, sim-ples ou complexa, objeto de uma relao no apenasintelectiva mas igualou, qui, principalmente, afe-tiva, objeto de desejo ou de repulsa, de idealizaopositiva ou negativa. Assim, em princpio, um maiordistanciamento temporal entre o primeiro contactocom o texto e o incio do ato tradutrio propria-mente dito pode ensejar um maior vis, uma maiorapropriao do texto original por parte do tradutor,em sua 6tica particular, um maior engajamento, umamaior participao do prprio tradutor na co-criaotradut6ria.2No que tange ao diferencial de tempo de tipod. - tempo de durao do ato tradut6rio - possvelperceber a tendncia a uma certa flutuao entre ocomeo e o fIm do ato tradutxio em termos-.das op-es lexicais, sintticas e estilsticas para o estabe-

    lecimento das equivalncias tradutrias, tendnciaessa que se toma marcante em textos mais longos,que, ipso facto, demandlL'11 um tempo maior de fei-tura. Quanto maior esse tempo de feitura, mais per-ceptfvel ser a aludida flutuao e, caso a intenocomunicativa do ato tradut6rio implique a manjJtefi:'2 !\o vai nessas consideraes qualquer crtica ou jufzo de valor, afavor ou contra tal apropriao, ta! vis. A avaliao de sua maior oumenor aequao em detenninada situao de traduo depender da~ l i s e e ta! situao como um todo e, em particular, da sua maiorou menor coerncia com a inteno tradut6ria do tradutor dou coma inteno comunicativa receptiva dos destinatrios da traduo.18

    4 2;o de urna certa uniformidade, acabar por exigiruma retomada, uma etapa de reviso (vide Aubert,1981) objetivando, especificamente, a obteno daunicidadelcoerncia estilstica e terminol6gica.o tempo (d), porm, raramente pode ser esta-belecido apenas em funo das efetivas necessida-des de elaborao e reelaborao do texto traduzi-do, a critrio do Emissor-Tradutor. Na prtica, oprazo constitui uma injuno da situao discursiva,imposta pelos Receptores (Intermedirio ou final)da Traduo ou com estes negociada. Corno resul-tado dessas injunes, difIcilmente ser possvel as-

    segurar ao ato tradut6rio um quadro temporal "i-del", isto , que permitisse atingir um ndice qua-litativo prximo a 100%. ao interior do prazopossvel que o ato tradut6rio ser desenvolvido,exigindo de seu Emissor-Tradutor urna adequaode meios e o estabelecimento de prioridades paraque o produto final corresponda quilo que os Re-ceptores da Traduo possam perceber como sendode qualidade aceitvel. De fato, no mercado de tra-balho, uma das habilidades apreciadas no profIssio-

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    nal da traduo a capacidade de efetuar exata-mente esta conciliao, "em que a curva de pro-gresso (Q) atinge, em perodo de tempo(f) relativamente curto, um nvel satisfat6rio, e emque qualquer melhora qualitativa ulterior demandaum prazo adicional que tende a aumentar em pro-gresso geomtrica" (Aubert, 1988), conformeilustrado a seguir:19.,b ztII--t'-------------TEntenda-se por satisfat6ria, neste contexto, a produ-o de um texto que responda s expectativas dosusurios da traduo em termos e correo grama-ticaI e semntica e de adequao 3o estabelecimento de prioridades na traduode um texto significa determinar, em funo doscondicionantes temporais e dos(vide a seguir), os elementos informtivos e lin-gfsticos essenciais inteno tradut6ria, cujo nvelde elaborao qualitativa deve merecer a atenomaior (e, portanto, o maior dispndio de tempo),deixando para o segundo plano os elementos infor-

    mati vos e Iingfsticos secundrios para os fms doato tradut6rio em questo,Com efeito, s6 excepcionalmente (por exem-plo, na traduo de poesia), todos os segmen-tos tero, a priori, a mesma relevncia infor-mativa e/ou estilstica. Assim, na verso deum hist6rico escolar de segundo grau para finscurriculares, caber priorizar a identificaodo aluno, as disciplinas que cursou, a avalia-o que obteve e a qualifiao que o certifi-cado de concluso lhe confere, enquanto queinformaes tais como as referncias estrutu-ra administrativa do sistema escolar (por

    exemplo: delegacia de ensino a que o estabe-lecimento escolar est subordinado) sero ti-dos por secundrios e uma verso menos felizpara o conceito de "Coordenadoria do EnsinoBsico e Normal" dificilmente aCaITetar pro-blemas para o uso que se far da verso de taldocumento. (Aubert, 1988)Q3 Ou, como certa vez foi explicitado por um cliente: "Sei que oprazo muito limitado; mas, se voc puder me assegurar um nvel dequalidade de 85%, podemos fechar o negcio". Esse ndice, evi-dentemente, no se refere a uma mediao precisa, quantificada, daqualidade em si e sim a uma distino entre o "bastante satisfatrio"

    e o "ideal"e20 21QQOS PARTICIPANTES DO ATO TRADUTRlOParalela.-nente - mas no necessariamente vin-culada - ao diferencial temporal, observa-se umaconfigurao situacional mais ou menos distinta en-tre o primeiro ato comunicativo e o ato tradut6rio.Tal configurao situacional envolve, de um lado,os instrumentos pr6prios da comunicao lingstica

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    - cdigos, canais - e o referente, que sero objetode considerao nos captulos seguintes; de outro,abarca os prprios participantes do ato tradutrio,os seus sujeitos, ou actantes.O esquema comunicativo/tradut6rio indicadono captulo anterior distingue Emissor1 (EmissorOriginal) e Emissor2 (Emissor Tradutor). Emborade uma aparente obviedade, cabe fazer uma preci-so. Tratam-se, aqui, de papis distintos e no ne-cessariamente de pessoas distintas: ou seja, autore tradutor podem, eventualmente, constituir umamesma entidade psicofsica. No entanto, por seremos papis distintos, nesse caso particular tantoquanto na situao mais usual, o momento outro,23,!1os destinatrios so, presumivelmente, outros, e amotivao dificilmente ser idntica.:::.z em da situao especfica da interao (vide?:neux, 1969).Essa rede, obviamente, constitui-se de maneira e, desde que se integre s imagens (iii),

    (viii), (xi) e (xvi) uma intencionalidade de aproxi-mao e estabelecimento (negociado e conciliado,que seja) de uma base comum, pode-se observar, nodesdobramento da relao dial6gica, constantesajustes em direo a uma sintonia cada vez mais fi-na entre os interlocutores.O princpio geral exposto no que precede apli-ca-se, igualmente, ao ato tradut6rio (mesmo entreautor/tradutor que sejam, entre si, Ego e Alter Ego,quando esse, excepcionalmente, for o caso). Ape-nas, nessa situao, a rede de relaes imagticasintersubjetivas desdobra-se em dois momentos, emdois atos comunicativos distintos; I e, mais comu-

    mente, o primeiro Emissor no participa diretamenteda relao, mas apenas atravs de um produto seuque o texto original.2Da mesma forma, em um nmero certamentemajoritrio dos casos, o receptor final da traduo(seu usurio ou consumidor) encontra-se inacess-I Tal configurao pode, efetivamente, manifestar-se em outrassituaes - na realidade igualmente tradut6rias mas raramente tidaspor tal - como, por exemplo, no curso de um debate em que deter-minado interlocutor se prope interpretar a inteno comunicativade outro em "benefcio" de um terceiro. Apenas, no ato tradut6riointerlingual, esse desdobramento no apenas constitui parte essen-

    cial, obrigat6ria, inevitvel do processo, mas, sobretudo, explfcito,enquanto que em outros atos comunicativos ser, por via de regra,algo camuflado, aparentemente incidental, espordico.2 Em certas modalidades de ato tradut6rio, particularmente na in-terpretao simultnea ou consecutiva, todos os interlocutores po_tenciais encontram-se em interao ativa e concomitante.Em qualquer situao em que ocorre uma inte-rao intersubjetiva - inclusive, mas no apenas,com o suporte do cdigoentre os participantes (interlocutores), uma rede de

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    relaes imagticas (hipteses) que, em sntese, po-de ser descrita como segue: (a) o Emissor compare-ce relao com: (i) uma determinada imagem de simesmo, (ii) uma detenmnada imagem do mundo (vi-so de mundo), (iii) uma determinada imagem desituao especfica da interao, (iv) uma detenni-nada imagem does) sen(s) interlocutor(es), (v) umadeterminada imagem da auto-imagem de seu(s) in-terlocutor(es), (vi) uma determinada imagem daimagem que taleis) interloculor(es) se faz(em) doEmissor, (vii) uma determinada imagem da imagemque taleis) interlocutor(es) se faz(em) do mundo e(viii) uma determinada imagem da imagem quetaleis) interlocutor(es) se faz(em) da situao espec-fica da interao; (b) os Recptores tm, cada um porsi, (ix) uma determinada imagem de si mesmo, (x)uma determinada imagem do mundo (viso de mun-do), (xi) uma determinada imagem da situao espe-cfica da interao, (xii) uma determinada imagemdo Emissor e, quando for o caso, dos demais inter-locutores, (xiii) uma determinada imagem da au-to-imagem do Emissor e, sempre quando for o caso,dos demais participantes da interao, (xiv) umadeterminada imagem da imagem que taleis) interlo-

    cutor(es) se faz(em) dele, Receptor, (xv) uma de-terminada imagem da imagem que tal(is) interlocl-torCes) se faz(em) do mundo e (xvi) uma detennina-da imagem da imagem que taleis) interlocutor(es) seIl 2.425......",Aqui, e conforme ficou caracterizado ante-riormente, o interlocutor privilegiado o Receptor-Intermedirio. Este tem (ou teria), entre suas diver-27competente para realizar a tarefa de traduo.

    A percepo da natureza do texto (literrio,jornalstico, tcnico, cientfico, jurdico etc.)implica, ainda, em permitir que o tradutor to-me decises a respeito da necessidade demaior ou menor fidelidade forma ou estilodo original e se essa fidelidade ser [caracteri-zada] em relao ao estilo pessoal do autor ouapenas ao tipo de registro caracterstico dognero de texto em questo. (Aubert, 1981)Ao assumir, porm, o papel de Emissor2, otradutor v-se diante de outras contingncias. Esta-belece, direta ou indiretamente, uma relao comu-nicativa com os receptores. Consciente ou subcons-

    cientemente, tender a levar em conta que as condi-es de recepo dos destinatrios da traduo soao menos parcialmente distintas das condies derecepo vivenciadas por ele, tradutor. Negociasignificados e sentidos no mais apenas com o textooriginal e com o constructo mental que corresponde sua viso do autor original do texto, mas com ou-tro constructo mental, o de sua viso, unitria oumultifacetada, do conjunto de receptores da tradu-o que empreender do texto, ou, mais precisa-

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    mente, do novo texto que substituir o primeiro, narecepo does) seu(s) pblico(s)-alvo. outra, por-tanto, a situao comunicativa, so outras as rela-es intersubjetivas e, assim, necessariamente seroutra a abordagem do texto no decorrer da execuodo ato tradut6rio.De fato, a determinao do tema, do assuntotratado, dir-lhe-, por exemplo, de que recur-sos dever se valer para completar ou preen-cher suas lacunas de informao (enciclop-dias, glossrios de termos tcnicos, consulta aespecialistas etc.) e, em ltima anlise, se temou no. o direito de se considerar perfeitamentevel. Ou seja, embora o Receptor-Emissor-Tradutordetenha a possibilidade de afinar sua aproximaocom o destinatrio intennedirio (cliente), o emissordo original e o qestinatrio ltimo da traduo ten-dero a permanecer como hip6teses, como cons-tructos mentais, sem maiores possibilidades de con-trole exceto, eventualmente, a posteriori.~ Assim, os participantes mais diretos da relao":::'tradut6ria so o Receptor-Tradutor, o E m i s s ~ r - Tra-dutor e o Receptor-Intermedirio. Aqui, novamente,ocorre um desdobramento de papis, apesar de o

    tradutor constituir, em ambos os papis, a mesmaentidade psicofsica. Como Receptor, o tradutor po-de ser entendido, num primeiro momento, comomais um dos destinatrios da mensagem original. E,efetivamente, o tradutor pode ter sido, em algummomento anterior do passado imediato, pr6ximo ouremoto, exatamente isso. No mbito do ato tradut6-rio, porm, esse Receptor-Tradutor ter uma atitudediversa da do "leitor comum". Nesse papel, a sualeitura se far no apenas visando uma reconstitui-o da mensagem, qualquer que seja sua natureza,simples ou composta (referencial e/ou potica e/ouconativa etc.), mas tender a constituir uma primeira

    explorao dos problemas de ordem lingstica (es-tilo, terminologia etc.) e factual que a tarefa de tra-duzir o texto em questo lhe ir impor.,iIl 26~ - ~ ----r ....)OS CDIGOS

    A relao entre o Cdigol (C6digo de Partida)e Cdig02 (Cdigo de Chegada) constitui objeto delargos estudos em nvel da Lingstica Comparada,da Anlise Contrastiva (para fins de ensino de ln-gua estrangeira) e das reflexes especficas sobrea traduo e suas "servides". o campo prediletodas avaliaes srias e dos relatos anedticos datraduo, pelo fato evidente de constituir, nas. res-pectivas atualizaes, o que h de mais tangvel noprocesso tradut6rio, para no dizer nos atos comu-

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    nicativos efetivados lingisticamente, como um to-do. Revela-se, igualmente, como a rea que tende aservir como pedra de toque na maioria das cogita-es sobre a factibilidade ou no do ato tradut6rio.Em sntese, a questo da relao entre os c-digos pode ser proposta como centrada em algunseixos bsicos de indagao: (l) se, a despeito daspeculiaridades estruturais de cada lngua, que ex-cluem, a priori, a existncia de correspondnciasbiunvocas entre quaisquer dois cdigos, existe al-gum plano (substncia do contedo, significaosas funes: (i) a de estabelecer/negociar o valor datraduo, o resultado dt., tal negociao tendo con-seqncias diretas para o grau de motivao queimpulsionar o tradutor na execuo do ato tradut-rio; e (ii) a de proporcionar ao tradutor um indicati-vo das intenes e motivaes do usurio final datraduo. Nada garante, porm, que as indicaesfornecidas tero uma afinidade suficiente/com arealidade. Com efeito, seus interesses n(l so ne-cessariamente coincidentes com a do receptor finalda traduo (podem, por exemplo, resumir-se aosinteresses estritamente comerciais, enquanto que oreceptor final pode comparecer ao texto com uma

    motivao essencialmente esttica), conflito essenem sempre administrvel pelo tradutor, quer pelarelao de foras, ou devido inacessibilidade dasinformaes pertinentes. Nessas relaes intersub-jetivas, portanto, possvel o que talve.zseja uma das principais faixas de nsco para a efetI-vao de um ato tradutrio que seja satisfatrio aosseus diversos participantes.I __....... 2_8 2_9 ""-__contextual, ou qualquer outro designativo que sequeira atribuir-lhe) em que se possa vislumbrar umauniversalidade ou, pelo menos, um paralelismo sufi-

    ciente para assegurar uma relao de equivaln-cia, isto , de uma similitude suficientepot"_t:neiodaqual a traduo possa se realizar; (2fse a viso demundo imbricada a cada idioma to inerente e es-pecfica do mesmo que qualquer tentativa de tradu-o necessariamente redunda em fracasso, ao menosno que tange a este aspecto cosmognico, essenciala qualquer texto que no constitua o discurso da l-gebra pura. Nenhuma dessas colocaes nova,nem pretenso deste trabalho inovar em larga es-cala nesta reflexo, de qualquer fonna considerada

    por alguns autores (vide, a prop6sito, Milton,1990), uma questo superada, ou irrelevante, parauma tradutologia que se quer modema. No entanto,para assegurar uma coerncia discursiva s presen-tes consideraes, faz-se inevitvel empreender umcerto mis au point.Em primeiro lugar, convm insistir que, aocogitarmos de atas comunicativos e de atos tradut6-rios, estamos francamente no domnio da fala, daparole, e no no domnio da langue saussuriana. De

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    gens, como so duas as "roupagens" lingIsticas,mas visando [ms comunicativos similares, que seaproximam o suficiente (sem se confundirem) paraque uma seja percebida como sendo a traduo - aequivalncia - da outra.Uma segunda conseqncia do fato de a tra-duo situar-se a nvel da parole a incluso, noconceito de cdigo, no apenas dos componentesfonolgico/grafolgico, morfossinttico, lexical esemntico mas, igualmente, dos aspectos atinentes norma e ao uso, das diversas estilsticas de cadaidioma. E, assim como entre um cdigo e outro ha-ver discrepncias e "lacunas" fonolgicas, mor-fossintticas, lexicais e semnticas, o mesmo certa-mente ocorrer com os usos, registros, estilos. Ape-nas para citar um exemplo entre tantos disponveis,uma das grandes dificuldades enfrentadas pelospesquisadores brasileiros que pretendem participarde congressos e simpsios internacionais reside no32fato de a estrutura textual dos abstracts norte-ame-ricanos ser relativamente diversa da estrutura equi-valente para os nossos "resumos"; e certamente atraduo apenas frasaI dos resumos para abstracts

    constitui um dos motivos de sua freqente rejeiopelas respectivas comisses organizadoras e de se-leo de trabalhos (vide, a propsito, James, 1989).Desta maneira, qualquer an1ise comparativaou contrastista visando determinar os graus de pro-ximidade e distncia tipolgicas entre cdigos emconfronto em determinado ato tradutrio ter neces-sariamente de levar em devida conta tambm oselementos estilsticos, as mltiplas normas situacio-nais e discursivas, faixa de enrecruzamento do lin-g{stico e antropolgico para, novamente, procurardeterminar as possibilidades de equivalncia ex-pressiva.

    Outro elemento essencial para a avaliao decada situao especfica de traduo, no que tange relao Cdigo de Partida/Cdigo de Chegada, dizrespeito direo da operao tradutria. Comefeito, no evidente a priori que, dados doisidiomas quaisquer, a passagem de A -4 B e deB -4 A processar-se- de tal modo a obtermos, nosdois casos, imagens mutuamente espelhadas; ou,dito de outra forma, que, se traduzirmos um dadotexto de A -4 B e, subseqentemente, o retradu-zirmos de B -4 A, obteremos, literalmente, omesmo Texto Original, desde que mantidas neutrasas demais variveis.

    Assim, em sua dissertao de mestrado, Pinto(1985) props-se verificar a hiptese da bidirecio-nalidade espelhada na traduo. Em um primeirocorpus, levantou, de maneira aleatria, ocorrncias33do QUE relativo em textos originais em portugus,para, a seguir, verificar de que modo esse relativoreaparece em tradues publicadas em lngua ingle-sa. Em um segundo corpus, partiu de tradues pu-blicadas em portugus, levantand()>-ilovamente de

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    maneira aleat6ria, ocorrncias do QUE relativo, pa-ra, na seqncia, verificar que elementos textuaisnos respecti vos originais em lngua inglesa deramorigem a esses pronomes relativos. Classificando asdiversas ocorrncias do QUE em termos sintticos(funo) e semnticos (natureza semntica do ele-mento a que o pronome relativo se refere), verificoualguns casos de diferena significativa entre os doiscarpam no nvel sinttico e em todas as categoriassemnticas.Embora se trate de um nico estudo, e extre-mamente pontual, as suas constataes, efetuadascom base na observao de um aspecto atinente aum elemento quase "automtico" da produo dalinguagem (vocbulo funcional), parecem indicarque, mesmo neutralizadas as variveis relativas aotradutor e sua competncia e s situaes discur-sivas divergentes entre a produo do original e suatraduo, e sem levar, ainda, em conta, as diversi-dades culturais que, por si s6, justificariam incont-veis disparidades na direo tradut6ria, a pr6prianatureza de cada cdigo resulta em solues dife-rentes, no-paralelas, no-espelhadas, conforme adireo adotada no ato tradutrio em questo.

    A questo relativa viso de mundo imbricadaem cada cdigo algo mais complexa. difcil fa-zer justia s mltiplas facetas deste problema nombito de um nico captulo. No entanto, cabe teceraqui algumas consideraes, essenciais para o ade-34quado encaminhamento das linhas de reflexo pro-postas neste trabalho.De incio, competiria, talvez, admitir que oconceito de viso de mundo, na sua acepo corri-queira, algo vago, requerendo, se no uma defini-o precisa, ao menos um delinear nocional sufi-ciente para fundamentar uma argumentao. Tal

    como entendida aqui, uma determinada viso demundo corresponde a um conjunto de representa-es da realidade que, privilegiada mas no exclu-sivamente, encontram-se entremeadas na estrutura eno uso de detenninada lngua. No se confunde com"ideologia" ou "esquemas conceptuais", emboraesteja em clara interseco com essas noes. Emtermos de estrutura lingstica, observamos m a n i ~festaes de viso de mundo por exemplo na adoode um dos gneros gramaticais como no-marcado,genrico, em detrimento does) demais, marcado(s);na opo, varivel de lngua a lngua, por instituir arelao do verbo preferencialmente com o modifi-

    cador temporal ou com o aspectual; no uso variadodos conceitos de dezena, dzia e vintena em varia-das situaes de contagem; na existncia ou inexis-tncia morfol6gica do subjuntivo, do ergativo, doartigo, do dativo de interesse etc.; nas metforascristalizadas nos diferentes idiomas (por exemplo,ing. training =? porto formao) e nas segmenta-es divergentes de campos semnticos equivalen-tes, como em:35

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    -ing. porto nor.morning manh morgenformiddagnoon meio-diaafternoon tardeettermiddagevening kveldnoitenight nattmadrugadaapenas para renovar uma exemplificao j abun-dante na literatura especfica.Em termos de uso, entrev-se uma questo deviso de mundo nas flutuaes socioletais, dialetaise, at mesmo, diacrnicas, nas formas de tratamen-to, na imagtica das grias das diversas geraesadolescentes que se sucedem, noS registras formmse informais das diferentes culturas, nas diversasmaneiras de compor a estrutura textual (por exem-plo: os modelos anglo-saxnico, escandinavo eso-brasileiro para o instrumento de mandato, curn-culum vitae, certido de nascimento etc.).Mas todos esses elementos - lexicais, morfo-

    lgicos, sintticos e textuais - por si s ?ocionam uma imagem completa do conceIto de VIsaode mundo, tal como se manifesta ou se institui nalnaua. Vivenciar o mundo algo que se faz, atra-v; da linguagem, instituindo relaes de intimidadecom esse mundo.Essa intimidade se estabelece pelo menos deduas maneiras, formalmente distintas, mas compon-do um todo de difcil dissociao. De um lado, efe-tiva-se com o mundo fechado da pr6pria linguagemque, na sua funo potica,vas lexiais., .1l10rfolgicas e fl6gicas, que do significativo, uma espcie de "entoao"

    semntico-imagtica subjacente no apenas ao dis-curso mais elaborado, literrio (ou com laivos de),mas, em proporo comparvel, no dia-a-dia da in-terao de cada sujeito falante. De outro, obser-vvel no uso metaf6rico de imagens cristalizadas darealidade extralingstica tpica de cada cultura, eem que cada usurio se reconhece como participan-te, como componente do grupo social, reafirmandosua identidade e segurana culturais:porto neste angu tem caroo =?nor. det er ugler i mosen ["h corujas no musgo"].Em ambos os casos, a viso de mundo se esta-belece de marleira em cada cdigo lin-

    g{stico e se generaliza no interior da sociooade,que dele se vale como meio de expresso e comuni-cao. Conduzida a reflexo at este ponto, com-preensvel que se tenda a associar os constituintesde cada complexo cdigo/viso de mundo de umaforma to estreita que, com mais um passo, se estejadiante da dvida sobre a viabilidade de uma opera-o tradutria que se processe sem virar pelo avessoessa mesma viso de mundo.As evidncias empricas da prtica tradutria

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    permitem, contudo, entrever que da aceitao da hi-ptese de vinculao entre cdigo lingstico e vi-so de mundo no decorre, necessariamente, a as-suno de uma postura radical quanto a uma "impe-37l 36ka sInetrabilidade" de mundos dspares. Os po9tos devista so efetivamente distintos na origem, comotestemunha o clebre exemplo citado por Mounin(1963):he swam across the riverele atravessou o rio a nadoem que, para reter apenas o aspecto mais marcante,o foco da descrio em ingls reala o ato de nadar,enquanto que o foco correspondente em portugusdestaca a chegada outra margem.No entanto, perfeitamente possvel obter fo-cos mais prximos entre ambas as. lnguas, desdeque se adote uma postura menos literalizante, comose pode verificar nas seguintes solues alternati-vas:he crossed the river after some hefty arm-work,para reproduzir em ingls o foco sugerido na verso

    em lngua portuguesa, ou emmergulhou nas dguas do rio e acabou atingindo aoutra margem,para obter o efeito inverso, na passagem da formu-lao primeira em ingls ao portugus.33 Evidentemente, estas so apenas algumas de vrias soluespossfveis, e sequer tm a pretenso de serem as mais adequadas. To-madas fora de contexto, porm, so suficientes para ilustrar o pontode vista ora defendido.38H_, ainda. um terceiro aspecto a considerar:detenninadas facetas daquilo que convenconamos

    rotular como viso de mundo e que encontram suaexteriorizao na linguagem so privativas no deuma lngua, genericamente fal

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    constitui um conjunto unifonne e inflexivelmenteunifonnizante de valores, nem o cdigo lingsti-co um monolito imagtico-ideolgico, uma camisade fora do pensamento e da sensibilidade. per-feitamente possvel ser ou ter sido romntico, cls-sico, simbolista ou ps-moderno; ateu, catlico,muulmano ou ren-budista; monarquista ou republi-cano, capitalista ou socialista; machista ou feminis-ta; colrico ou melanclico; dionsico ou apolneo;conformista ou rebelde; potico ou prosaico; soci-39- ---------------....,.~ . ' .lIci",,!:,,III,,: ... 11velou ermito; tudo e mais todas e quaisquer outrasantonmias e em qualquer combinat6ria, em qual-quer idioma, sob a gide de qualqyer "cultura".Tendncias histricas, artsticas, econmicas eideol6gicas diferentes, individualidades racional eemocionalmente dspares encontram abrigo e dizi-bilidade sob a gide de um mesmo c6digo formal,que assegura sua funo social precisamente porproporcionar tal dizibilidade intersubjetiva e inter-grupal.Inversamente, tal contra-constatao se faz

    sem invalidar as anteriores. No se trata, efetiva-mente, de uma opo crua entre afirmar um vnculolngua/viso de mundo inamovvel, esttico e uni-formizante, infenso a qualquer dinmica sincrnicaou diacrnica; ou, tropeando em outro extremo,negar qualquer relao de maior pertinncia entre osmesmos, relegando o papel da lngua ao de meroinstrumento, arbitrrio e convencional no sentidobanalizante desses termos, sem hist6ria e sem vicis-situdes, ferramenta de barro plasmvel vontade dousurio, desprovida de relevante consistncia pr-pria.Como s6i acontecer nas coisas do Homem -

    para incmodo e desafio s cincias humanas - Ja-nus aqui tambm preside realidade, instituindouma relao tanto/quanto. Sob um dos prismas, alngua incorpora em sua estrutura formal e em seuuso social e hist6rico todo um reposit6rio cultural,antropol6gico, imagtico, que delineia um primeiroquadro de apreenso e expresso do mundo, comum determinado conjunto de matizes, difceis, parano dizer impossveis, de serem reencontrados, namesmssima configurao de valores, em outro40idioma. Conduz o esprito humano, mesmo que porinrcia, a pensar, sentir e dizer o mundo (ou os

    mundos) de determinada maneira ou de um conjuntolimitado de maneiras percebidas como tpicas docomplexo lngua/cultura em questo.Mas essas configuraes so mais ou menosinstveis, quer estrllturalmente quer em termos deuso. Dependem, basicamente, do grau de estabilida-de interna dos subsistemas fonol6gico, morfossint-tico e semntico do cdigo em questo, do grau deestabilidade interna da comunidade sociolingsticapertinente e de sua maior ou menor exposio aos

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    contactos externos. A tese Whorf-Sapir (vide, porexemplo, Whorf, 1958), que tende a sustentar a alu":dida hip6tese de "impenetrabilidade" dos mundosretratados pelas diversas lnguaslculturas, deriva deobservaes conduzidas, quase que exclusivamente,sobre as lnguas amerndias, lnguas essas durantemilnios isoladas da interao com culturas marca-damente distintas, situao essa de qualquer formaj, embora algo cruelmente, superada. Assim, na"brecha" das instabilidades inerentes e transcen-dentes, institui-se um primeiro espao de reelabora-o, coletiva e individual, para a percepo e para oreconhecimento, ainda que, na origem, viesada, daalteridade cultural, lingstica, de viso de mundo,enfim.o segundo prisma particularmente relevantepara as consideraes acerca do ato tradut6rio: afuno cognitiva, metalingstica, apontada por Ja-kobson (1969). Pela metalinguagem, em suas maisvariadas manifestaes, inclusive o discurso cient-fico, abre-se, novamente, um caminho - no isentode escolhos e pedras, verdade - que reala a ca-41-

    ,pacidade de dizer asalteridades cultural, lingfsticae cosmognica. No sem razo que, no referidotrabalho, Jakobson afirma: "As lnguas diferem na-quilo que devem expressar, no naquilo que podemexpressar". (Grifo do autor.) Manifestada na tradu-o, velada ou explicita..'Ilente, nas variadas fonuasdos apostos e comentrios parentticos, nas parfra-ses, nas apresentaes e notas de tradutor, nos glos-srios em pr ou posfcio, a metalinguagem irrompeat mesmo por sobre algumas das barreiras postaspela funo potica - bem verdade, no sem sacri-ficar a apreenso direta da poeticidade, como quer

    que se entenda tal termo. Esbarra, apenas, nas res-tries, no da lngua em si, mas de admissibilidadeno mbito de determinados tipos de discurso. As-sim, por exemplo, em textos para um pblico leitorinfantil, o recurso nota de tradutor raramente seradmitido, e o texto de apresentao, se houver, diri-gir-se- mais ao adulto que pretende ler o texto emvoz alta para as crianas do que propriamente parao recm-alfabetizado.Em sntese, no nos parece que a viso demundo imbricada a cada idioma seja to inerente eespecfica a ponto de condenar ao fracasso qualquertentativa de traduo que inclua, entre seus prop-

    sitos, o resgate dessa mesma viso de mundo. Nem,inversamente, podemos aceitar a tese de uma neu-tralidade na relao lngua/viso de mundo. Mas es-sa relao, motivada e essencial em vrios planos,no nem inflexvel nem esttica: impe dificulda-des evidentes, no muralhas intransponveis. Varia,em intensidade, de texto a texto e, talvez mais ain-da, de uma situao tradutria para outra, exigindouma avaliao caso a caso. No constitui mais umaservido e sim mais um desafio.

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    42OS REFERENTES E SUAS EXPRESSESNO CDIGOTal como no captulo precedente, aqui nova-mente pisamos em territrio fartamente explorado:os problemas e as aparentes armadilhas que cercama traduo diante das realidades distintas, de culturaa cultura, que se sobrepem ao distanciamento ine-rente s vises de mundo conflitantes e as amplifi-cam (vide, em especial, Mounin, 1963, Nida, 1964,Nida & Taber, 1969). E, mais uma vez, no preten-demos, neste trabalho, inovar nem reinventar a ro-da, mas, to-somente, delinear alguns traos carac-tersticos da questo para assegurar uma adequadacobertura de anlise.A obviedade da constatao de que, na passa-gem de uma lngua para outra, se tende a mudar,igualmente, de um universo referencial para outro,no apenas em termos de viso de mundo - mesmarealidade referida, isto , descrita de maneira dis-tinta por cada cdigo lingstico - mas, tambm, emtermos de realidades extra-lingsticas (ecolgicas,materiais, sociais e religiosas/ideolgicas) efetiva-mente distintas, tem conseqncias talvez menos

    43h.,. IIIIIIl ...evidentes no que tange traduo de textos que, di-reta ou indiretamente, retratem tais realidades dis-crepantes.Na viso mais corriqueira da traduo inter-lingllal, mudam os cdigos lingiifsticos mas, pressu-pe-se, a realidade retratada no texto, o referente -freqente e simplesmente identificado com o con-tedo do texto - deve permanecer o mesmo; e urnadas dificuldades da traduo ser, ento, encontrarna lngua de chegada meios de expresso para umreferente diverso daquele que o complexo ln-

    gua/cultura de chegada usualmente exprime.Essa concepo no deixa de conter a sua par-cela de verdade, a despeito da confuso entre con-tedo e referente, mas nilo representa toda a verda-de. Com efeito, a insero do Referentel (Referentede Partida) no texto traduzido constitui uma opo,que tipifica uma abordagem matricial (ou, na ter-minologia talvez pouco feliz de Newmark, 1981,uma abordagem semntica) do ato tradut6rio; ouseja, em termos simplificados, aquela em que oscondicionantes lingstico-estilstico-culturais dotexto original tm precedncia, na estruturao dasprioridades do processo tradut6rio em pauta, sobre

    os condicionantes equivalentes da lngua/cultura dechegada. Essa, no entanto, no se configura como anica postura possvel: dadas certas circunstnciasfavorveis, pode-se conceber uma substituio purae simples do Referente de Partida pelo Referente deChegada (Referente2) ou alguma soluo hJbrida,miscigenando elementos de ambos os referentes.A distino entre Referente de Partida e Refe-rente de Chegada nem sempre muito evidente. T-pica, mas no exclusivamente, em textos relativos a

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    44questes de tecnologia de ponta, por exemplo, a di-ferena mais imediata percebida em termos de es-tgios discrepantes de desenvolvimento tecnolgico.Nestas configuraes, a cultura receptora tende, sefor perifrica, a absorver as informaes, os dados,os conceitos gerados na cultura transmissora, cen-tral. Recorrendo-se a emprstimos, decalques e al-guns instrumentos parafrsticos, a barreira acabavencida.1Se a diferena em termos de estgio tec-nol6gico for muito grande (para raciocinar sobre umcaso tangenciando os lirI'jtes da verossimilhana:a traduo de um texto sobre fsica nuclear para oguarani), o tradutor assumir s claras um papelnonnalmente exercido de forma mais velada, o decriador e inovador de linguagem, gerando toda umaterminologia - e, qui, at mesmo uma epistemolo-gia - nova, transmutando o referente de partida eincluindo-o no acervo da UnguaJcultura de chegada.Algo semelhante, mais evidente em teImOS dediferenciao de referentes, embora menos radicalna sua manifestao, se observa na traduo jura-

    mentada de textos jurdicos: um instrumento pblicode procurao lavrado em cartrio brasileiro mante-r li mesma feio, no apenas lingfstico-estilfstica,mas referencial brasileira (por exemplo, identifica-o do cartrio, referncia nacionalidade, profis-so, estado civil, domfcilio, RG e CPF do outor-ga.,te e do outorgado) em qualquer outra lngua pa-ra a qual venha a ser traduzido, mesmo que para talem outra lngua conceitos tais como de Cart6rio de1 Evidentemente, se as relaes de "fora cultural" forem inver-sas, o recurso ao em:prstimo e, em grau menor, ao decalque (no sen-tido de Vinay, 1968 e Aubert, 1984) torna-se, pelo menos, proble-mtico.

    45------., rNotas, CPF e de RG no faam sentido, ou no fa-am o mesmo sentido, isto , no se refiram a umamesma realidade jurdica, notarial, tributria e poli-cial. No entanto, numa traduo no-juramentada domesmo texto, pode-se empreender uma reescritamais avanada, mais livre, mais "comunicativa" nosentido de Newmark (1981), adequando no apenasa linguagem (inclusive estilo) mas alterando, porsupresso, mudana ou acrscimo, as indicaes re-ferenciais, para assim tornar o texto traduzido com-patvel com a realidade lingstica e cultural de

    chegada. Nessa segunda opo, a pr6pria "origemtradut6ria" ~ o texto acaba ficando parcial ou total-mente oculta.Talvez mais c;omum seja a s')luo intermedi-ria, isto , aquela em que certos elementos referen-ciais do texto de partida so mantidos relativamenteintactos enquanto que outros so substitudos, emfavor de componentes do referencial de chegada,gerando uma aproximao e uma facilitao da lei-tura do texto traduzido. Essa soluo freqente-

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    mente induzida pelo fato de culturas diversas, utili-zarem designativos similares para realidades efeti-vamente distintas (como ilustrao, basta considerara traduo do ing. M. A. in Linguistics pelo portoMestrado em Ling{stica) ou reforada por uma es-pcie de "tradio" tradut6ria, que iguala, porexemplo, ing. bill e porto nota fiscal.22 Ao contrrio do que poderia parecer, no se trata propriamentede falsos cognatos ou falsos amigos. H, em ambos os casos, umaclara interseco conceptual e referencial, interseco essa insufi-ciente, porm, para autorizar a suposio de tratar-se do "mesmo"referente. Nos termos de Vinay (1968) e Aubert (1984), constituemcasos de "adaptao" , geralmente no percebidos como tal.46Qualquer que seja a opo feita, porm, e par-ticularmente nas tentativas de transmutao ou in-sero, total ou parcial, do referente de partida nouniverso do referente de chegada, no caso de textostcnicos, cientficos, comerciais e jurdicos somentea utilizao, em escala relativamente extensa, da pa-rfrase (recurso esse nem sempre efetivamente dis-ponvel para a modalidade de texto em questo ouaceitvel em funo do perfil do destinatrio presu-

    mido), ou a pressuposio de uma biculturalidadepor parte do destinatrio do ato tradut6rio ou, ainda,a sinalizao sistemtica do diferencial (por meio deemprstimos, por exemplo) poderia 61 itar, ou neu-tralizar, de modo eficaz, uma "leitura" referencialdo texto traduzido que tender, de outro modo, aefetuar uma insero no UoNerso cultural de chega-da da realidade extralingstica nela retratada, colo-rindo-a, transfonnando-a, alterando toda uma escalade valores, gerando uma iluso de proximidade oude universalidade. Ou seja, a apreenso do textotraduzido tende a ser efetuada tendo por pano defundo o quadro referencial da lngua/cultura de

    chegada, gerando como que um "sotaque" de leitu-ra. No processo tradut6rio, caber, portanto, avaliaro grau de admissibilidade de tal sotaque que, dequalquer forma, passCvel de um certo controle, pormeio dos recursos h pouco aludidos; a sua neutra-lizao plena, porem, parece constituir meta dificil-mente realizvel na prtica.Voltando, no entanto, a ateno para os textosmais marcadamente culturais, que mais explicita-mente retratam ou se referem ao meio-ambiente na-tural, material, social e ideo16gico da cultura departida, observa-se uma situao algo diversa. En-quanto os textos tcnicos e jurdicos tendem, por

    476 .....via de regra,3 a buscar a universalidade e, na tradu-o, as peculiaridades de referente so claramentepercebidas como bices comunicao e tratadascomo tais, nos textos de natureza mais literria, oumais culturalmente marcados, a especificidade refe-rencial mostra-se, no raro, com um dos seus ele-mentos constitutivos, um dos "atrativos" que justi-ficam e valorizam uma iniciativa tradutria. As so-

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    lues encontradas no so necessariamente distin-tas, do ponto de vista da tcnica tradutria; masocorrer, quase inevitvel, uma postura diferente,quer por parte do receptor-tradutor, na apreensoprimeira, quer por parte do receptor final da tradu-o, do consumidorlleitor do texto traduzido.Na traduo de textos tcnicos, jurdicos e si-milares (genericamente, textos pragmticos), o dife-rencial de referente , ao mesmo tempo, explcito e,at certo ponto, isolvel. Assim, por exemplo, umasimples nota de rodap ou um aposto parentticopode bastar para fazer entender ao receptor final datraduo o sentido da sigla CPF/MF em um textojurdico ou institucional originalmente expresso navariante brasileira da lngua portuguesa.Nos textos culturais, ou literrios latu sensu,esse diferencial tende a apresentar-se de fonna maissutil. Em muitos desses textos, a especificidade re-ferencial tomada como dada de antemo, no exi-gindo verbalizao, e corre, por isso mesmo, riscomaior de escapar percepo do receptor-tradutor.Uma padaria , aparentemente, equivalente ao nor.brpdforretning (literalmente, "loja de po") - tanto3 Trata-se, neste pargrafo, de uma generalizao, estatistica-

    mente suposta como vlida, sem pretenso a descrever uma "verda-de inerente".48quanto a drogaria ao drugstore americano - mas aseleo de produtos disponveis nos respectivos es-tabelecimentos apresenta apenas uma certa intersec-o, ainda assim em tennos genricos ("produtos dapanificao", "medicamentos"), dificilmente noque tange a produtos especficos (pozinho francs,po de queijo, rosca de ricota, vs. rundstykk[lit. "pedao redondo", equivalente funcional masno no fonnato, ao "pozinho francs"], f r ~ b r f / J d[po de trigo coberto com sementes de papoula, in-

    dependentemente do fonnato], kringle [espcie derosca tranada, sem recheio]).4 A faxina domsticano apenas diferente conceptualmente (cf. ing.spring-cleaning, na sua aluso a uma atividade pri-maveril, findo o perodo frio e com largo uso doaquecimento a carvo, que clama por uma limpezaem regra que elimine o negrume resultante) mas nasua concretude, com a presena ou ausncia do ralo. 'pISO azulejado, de lajotas ou de lin6leo etc. O nor.lunsj-pause dificilmente se compara nossa hora dealmoo, diferindo na durao (30 minutosll hora emeia) e no contedo (lanche/refeio [idealmente]

    quente). E assim por indefmidamente diante, mati-zando, a cada momento, cada gesto, cada rotina im-pensada, do despertar ao dormir e alm dele, comuma qualidade cultural pr6pria, que dispensa o re-curso aos extremos exotismos - como a problemti-ca traduo do conceito de "Cordeiro de Deus" pa-4 .Ass!:u, ~ frase "Ele foi padaria tomar uma cervejinha com osamIgos eXIgIr, normalmente, em sua traduo para outras Irn-guaslculturas, uma reelaborao em que a aluso panificao desa-parecer por completo. Da mesma forma, a degustao de um sun-

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    dae no drugstore estadunidense dificilmente concilivel com a no-o de venda de produtos farmacuticos.49LlIIIIz- .ra a lngua esquim6 - para a adequada caracteriza-o do problema a enfrentar.Nesta matizao cultural generalizada, a espe-cificidade referencial tende a ser menos facilmenteisolvel, inserindo-se em toda uma rede de alusesdiretas e indiretas que, em seu conjunto, institui opano de fundo cultural ao interior do qual o recep-tor do original efetua a sua leitura do texto. Aqui,embora o recurso adotado possa ainda ser a obser-vao parenttica ou nota de tradutor, uma soluodo tipocachaa, a sugar-cane brandy5no pode pretender resgatar toda a rede associativade imagens referenciais que o termo automatica-mente ativa em qualquer falante brasileiro do portu-gus: o alambique, a figura do pinguo (e no do

    "bebedor inveterado de usque ou gin etc. "), o gole"p'ro santo", a meia-de-seda, e, por extenso, todaa civilizao da cana-de-acar, desde as sesmariasdas capitanias hereditrias at o Pr6-lcool e o usodo lcool como desinfetante no apenas mdico mascomo instrumento cotidiano de limpeza domstica.65 Essa soluo foi adotada pela tradutora de J. Amado, Tereza Ba-tista Cansada de Guerra (traduo norte-americaml de B. Shelby,Tereza Batista Home fram de Wars. New York, Alfred A. Knopf,1975).6 O conjunto de associaes articula-se de outro modo, por exem-plo, na Noruega, em cuja cultura os ecos da Lei Seca ainda se fazem

    sentir, e onde a polftica de controle do alcoolismo tornou a venda debebidas alcolicas - excetuada a comercializao da cerveja, dequalquer forma no-disponfvel em todos os municfpios do pafs - ummnoplio estatal, e engendrou uma forte restrio ao acesso ao l-cool "puro"; frascos de lcool hidratado somente podem ser adqui-ridos em farmcias e contra apresentao de receita mdica.50Sem dvida, as mesmas redes associativas po-dem manifestar-se - certamente se manifestam - naleitura dos textos pragmticos. No entanto, para osfins previsveis de um texto pragmtico, a explicita-o do significado referencial de um termo - comono caso do aludido CPFIMF - no seu sentido mais

    imediato, conceptual, limitado aos prop6sitos dotexto especfico em que se encontra inserido, ser obastante. Suas demais relaes referenciais - o deidentificao do cidado como contribuinte e con-sumidor, a exigncia de sua apresentao para umgrande nmero de atas cotidianos por vezes distan-tes da esfera tributria, sua correlao com a cdulade identidade, com o talo de cheque etc. - podem,quase sempre, ser omitidas da traduo sem danopara o ato comunicativo especfico. A mesma omis-

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    so, quando ocorre em texto cultural, retira-lhe algoda substncia, da consistncia, ou, como se dizcostumeiramente, "empobrece" o texto traduzido., talvez, nesse ponto, mais do que em qualqueroutro, que se adentra a faixa de risco da intraduzi-bilidade prtica.Diante do exposto, inevitvel, a cada atotradut6rio, efetuar uma anlise global da situaotradut6ria especfica e das suas necessidades detec-tveis, investigar a densidade e o grau de "amarra-o" referencial de cada texto, e adotar uma deter-minada e consciente postura7para, ento, efetivar oato tradut6rio resgatando o referente de partida,buscando seus equivalentes aproximados no com-7 Mesmo que tais opes, anlises e posturas sejam efetuadas eadotadas por assim dizer "subconscientemente", elas se fazem pre-sentes e se revelam na maneira pela qual o texto traduzido foi traba-lhado.51L e-----------------------r

    plexo lngua/cultura de chegada, ou efetuando con-ciliaes entre essas duas vertentes, recorrendo,eventualmente, a mecanismos de compensao, denatureza lingfstica, visual ou outra.52INI'ERAO ENI'RE os PARTICIPANTES DOATO TRADUTRIO E O COMPlEXOCDIGO/REFERENTE:A QUESTODAS COMPETNciASNeste estgio destas reflexes, coloca-se, pri-mordialmente, a questo da competncia e do de-sempenho dos participantes do ato tradut6rio (Emis-sor Original, Receptor-Tradutor, Receptor Final) em

    funo dos cdigos manipulados e dos conheci-mentos referenciais mobilizados na produo dosdois textos. preconceito bastante difundido alar o textooriginal (e, por extenso, o seu autor) ao topo dealgum pedestal, consider-lo como algo sacrossanto,inviolvel, e condenar com veemncia o ato cons-purcat6rio da traduo que o reduz a algo mortal,evanescente.1Com exceo da grande obra literria,1 A morlalidade dos textos traduzidos , com efeito, um fenmenobastante generalizado, mas no pelo motivo ora sugerido. No que

    tange h grande obra literria, cada traduo da mesma a exteriori-zaio ("atualizao", no sentido dado pela LingOfstica) de uma lei-tura, condicionada individualmente e por correlaes mutveis detempo e espao; e, portanto, cada individualidade, cada lugar e cadatempo, requer uma nova leitura. Quanto traduo dita "pragmti-ca" (alternativa menos negativista para "no-literria"), acresce que53'iIJ

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    porm, que atualmente representa uma nfima per-centagem do volume de tradues processadas, acada dia, em escala planetria, os demais textos ori-ginais pouco ou nada apresentam de transcendente,de "perfeito", antes pelo contrrio.Na realidade da produo textual em nossa ci-vilizao, quer de textos originais ou de textos tra-duzidos, o grau de competncia e o nvel de desem-penh02de seus produtores e de seus consumidoresapresentam-se bastante variveis, tanto no que serefere ao conhecimento do referente quanto ao do-mnio dos meios de expresso disponveis no cdigo(inclusive dos meios de expresso especficos parao referente em questo). Idealmente, o emissor dooriginal utilizar, na produo do texto original, sualngua de domnio mais ativo,3e discorrer sobreboa parte da mesma constitui aquilo que, no jargo profissional, rotulado como "traduo descartvel", ou seja, aquela que, uma vezcumprida sua funo de transmisso de mensagem, por sobre asbarreiras lingfsticas e culturais, pode ser posta de lado, ou refor-

    mulada ("copidescada"), sofrendo novas mutaes que a distanciamde uma relao tradutria, para constituir novo texto originai. Nisso,alis, a sorte do texto traduzido no difere daquilo que o destino damaioria dos textos produzidos no contexto cultural contemporneo,de vida til curta. Duradoura, por injuno legal, apenas a traduojuramentada: mas, qual o seu alcance numrico e temporal? Quantoslem e relem tais textos?2 Para os fins destas consideraes, os conceitos de competncia ede desempenho vm utilizados em seu sentido mais genrico, semreferncia expressa terminologia da teoria gerativista.3 Evitamos, deliberadamente, o emprego da expresso llngua mL/-terna. Com efeito, com a progressiva globalizao cultural e os cres-centes movimentos migratrios, que mudam de direo mas no

    parecem decrescer em intensidade, so cada vez mais encontradiasas "biografias lingfsticas" em que, em algum momento do per-curso vital do indivduo, ocorre uma mutao mais ou menos radicalnas suas diversas competncias linglfsticas. Ainda, no caso de filhosde imigrantes - mas no apenas nesses - relativamente comumobservar-se uma certa "especializao" lingfstico-referencial, ou54assunto que conhea em profundidade. Da mesmaforma idealizada, o Receptor-Tradutor ter conhe-cimento pelo menos equivalente do universo refe-renciaI em questo e produzir o texto traduzidonaquela que a sua lngua de domnio mais ativopara leitores/ouvintes tambm dotados de suficiente

    competncia lingstica e referencial.Ora, a realidade , percebe-se logo, freqen-temente bastante diversa. A utilizao por um emis-sor de sua lngua de domnio mais ativo significa,to somente, expressar uma mensagem utilizando ocdigo em que o emissor em questo apresenta seumelhor desempenho lingstico; a comparao,portanto, feita internamente, com referncia aoconjunto de competncias lingsticas daquele emis-sor em particular, e no externamente, em funo de

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    mais um "ideal" - o de competncia. E, se o Emis-sor-Tradutor utilizar sua lngua de domnio maisativo para produzir o texto de chegada, fatalmenteestar, no papel de Receptor, empregando um cdi-go lingfstico no qual no dispe da mesma com-petncia.4Outrossim, particularmente no caso dosidiomas largamente empregados para a comunicaointernacional, em ambientes empresarial, comercial,seja, a maior facilidade para exprimir-se sobre determinados assun-tos em uma Ifngua e sobre determinados outros assuntos em outra(por exemplo, no idioma dos pais sobre o referencial domstico e noidioma de escolaridade sobre o referencial externo vida familiar).4 Teoricamente, possfvel conceber um indivduo com uma com-petncia Iingfstica e10u referencial rigorosamente equivalente emdois idiomas e10u dois referentes e que atue, sistemtica ou intermi-tentemente que seja, na funo de receptor e emissor-tradutor. Naprtica, porm, tal configurao parece ser das mais excepcionais, deincidncia estatstica to illSignificante que sua excluso de uma teo-rizao sobre o ato tradutrio no representa a menor violncia realidade.55______________1

    turstico, acadmico, e tantos outroS" (incluem-senessa categoria, sem limitao, o ingls, o francs,o alemo, o russo e o castelhano), muito comum aproduo de" textos de partida naquilo que, para oemissor, constitui uma segunda ou, mesmo, umaterceira lngua.Algo semelhante pode ocorrer com o tradutor.Apesar da recomendao da FIT (Fdration Inter-nationale des Traducteurs), insistindo em que ostradutores devem, preferencialmente, sempre tradu-zir para suas respectivas lnguas "maternas" ou"nativas" (sc), na realidade do mercado da tradu-o, esse desiderato nem sempre pode ser cumprido

    risca. E todo tradutor com alguns anos de vivnciaprofissional poder relatar situaes em que se viudiante da tarefa irrecusvel de traduzir de um idio-ma em que sua competncia, ao menos em termosestritamente lingsticos, era algo precrio ou, atmesmo, de traduzir de um idioma para outro em queambos lhe eram, por assim dizer, "estrangeiros",ou, pelo menos, em uma situao em que nenhumdos c6digos, de partida e de chegada, correspondia sua lngua de domnio mais ativo.5Para melhor retratar - de forma confessada-mente simplificada - as diversas configuraes de

    competncia que podem ocorrer no ato tradut6rio,podemos conceber uma escala de A a F, definidacomo segue:5 O autor j se viu diante da necessidade de traduzir uma fatura emgrego modenro para o portugus, curriculwn vitae do francs parao ingls, e roteiro de filme publicitrio do castelhano para o ingls,embora a sua competncia lingfstica para os idiomas em questo,com base no quadro adiante, fosse: portugus - A; ingls - B; fran-cs - D; castelhano - E; grego moderno - F.56

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    A - pleno domnio dos recursos expressivosdo cdigo;B - domnio profissionalmente competentedos recursos expressivos do c6digo, masinsuficiente para evitar, vez por outra,uma certa interferncia estrutura! ouidiomtica do idioma de domnio "A";C - domnio dos recursos expressivos bsicosdo cdigo, mas com competncia passivaclaramente superior ativa;D - domnio ativo do cdigo suficiente paraassegurar a compreenso pelos interlo-cutores em situaes de interao socio-lingstica menos complexa;E - competncia quase que apenas passiva docdigo;F - competncias ativa e passiva rudimenta-res.Na situao de interao tradutria, teramos,ento, a seguinte configurao de competncias:Emissor do Receptor- Emissor- RceptordaOriginal Tradutor Tradutor TraduoA A A AB B B B

    C C C CD D D DE E E EF F F FConsiderando a virtual impossibilidade de otradutor deter, nos seus dois momentos de receptor57r e de emissor e no mbito de um mesmo ato tradut6-rio, o mesmo nvel de competncia lingfstica, po-de-se prever, com base no que constitui, conformej foi ressalvado, uma simplificao que no levaem conta uma multiplicidade de nuances de diferen-

    cial de competncia, um total de 1.080 situaestradutrias, apenas no que tange ao domnio dos re-cursos expressivos dos cdigos pertinentes.6O retrato aqui proposto implica, inclusive, apossibilidade de uma inverso da situao precon-ceituosa tpica a que se fez aluso no incio desteitem: pode ocorrer - e freqentemente ocorre - de-ter o tradutor uma maior competncia lingstica ab-soluta (isto , relativa ao "ideal" de competncia),quer como receptor ou como emissor da traduo,do que o emissor do .original. Neste momento, pode-r o tradutor empreender, como parte integrante do

    processo tradutrio, uma "correo", uma "melho-ria" do texto, tornado-o mais adequado em tenuosde nonua, uso e expressividade.76 Evidentemente, uma configurao em que o emissor do originalproduza seu texto - oral ou escrito - em nvel de competncia "F",em que tal texto seja decodificado por um receptor-tradutor igual-mente com competncia "F" e utilize, no seu papel de emissor-tra-dutor, um cdigo em que detenha um domnio de nvel "E", dirigi-do a receptores finais com um desempenho de nvel "F" em tal c-

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    digo de traduo, constitui, provavelmente, mais uma hiptese delaboratrio do que urna situao verossmil para a realizao de umato tradutrio que no seja abortado em algum momento antes de suafinalizao. No entanto, o anedotrio da traduo profissional re-pleto de situaes a priori inimaginveis, o que no autoriza seu ba-nimento liminar do reino das potencialidades. Ademais, uma parcacompetncia lingstica pode ser parcialmente compensada por ou-tros recursos, desde a expresso corporal at o conhecimento refe-renciaI (de assunto).7 Excetuada a traduo juramentada, que se prope como uma es-pcie de "transparncia" sobre o texto orignal, reproduzindo, in-clusive, as suas deficincias lingsticas e10u factuais.58Situao algo parelha observa-se no que dizrespeito competncia refencia!. Aqui tambm arealidade nos mostra os produtores de texto, emisso-res originais e tradutores, bem como os destinat-rios, tradutores ou usurios [mais da traduo, comum variado domnio de assunto, estendendo-se des-de um conhecimento rudimentar, de almanaque, ata verdadeira erudio. Aplica-se, portanto, para oreferente, boa parte das consideraes j tecidasacima acerca da competncia lingstica, inclusive amultiplicidade de configuraes reais de competn-

    cia.8Note-se, no entanto, que, enquanto uma sens-vel discrepncia de competncia lingstica do tra-dutor nos papis de receptor do texto original e deprodutor do texto traduzido pode levar este a incor-porar em si estruturas e idiomatismos do cdigo departida, resultando, no geral, em um produto tidopor qualitativamente insatisfatrio deste ponto dev ista ("com cara de texto traduzido"), uma situaosimilar ao nvel de domnio de assunto pode, igual-mente, resultar numa .introduo do referente departida no espao do referente de chegada sem, no

    8 Considere-se, apenas, o efeito multiplicador de situaes con-cretas: o produto do nmero te6rico de configuraes de competn-cias Iingsticas dos participantes do ato tradutrio e do nmero te-rico de configuraes de competncias referenciais dos mesmos re-sulta em um total de 1.I 66.4oo! Tal constatao, por si s - isto ,sem levar em conta todas as demais variveis descritas neste texto- j seria suficiente para gerar a impresso de que, em traduo cadacaso um caso; ou dito de outra forma, que a traduo constitui umaevidncia emprica contundente comprobat6ria da Teoria do Caos.Tal observao no seria, na realidade, totalmente descabida. Ape-nas, acreditamos que cada caso no um caso isolado, mas passvelde anlise, avaliao e enquadramento em tendncias e categorias deaplicao mais geral.

    59r entanto, que tal fato seja necessariamnte tido porrevelador de um desempenho inadequado, e simcomo opo tradut6ria deliberada.9Observa-se, ainda, no tradutor, uma certa rela-o compensat6ria entre a competncia lingstica ea competncia referenciaL Ou seja, uma competn-cia lingstica sofrvel pode vir compensada, ao

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    menos parcialmente, por uma competncia referen-cial de nvel mais elevado; e, inversamente, umacompetncia lingstica de nvel mais elevado podecompensar uma competncia referencial mais prec-ria, em ambos os casos permitindo a gerao deprodutos - textos traduzidos - com alguma chancede aceitabilidade por parte dos receptores dos mes-mos. Essa segunda configurao - competncia lin-gstica mais elevada e referencial mais precria -constitui, provavelmente, a mais encontradia entreos .tradutores profissionais e justificaria, de princ-pio, a interveno de mais um participante no atotradut6rio - o revisor, ou consultor especialista. Aprtica profissional demonstra, porm, sociedade,o quanto problemtica a coordenao harmoniosade tal interveno. Salvo se sua participao for ri-gorosamente limitada funo de informante termi-nol6gico ou de revisor ortotipogrfico, haver o ris-co de introduzir-se uma nova leitura, uma posturaparcialmente' distinta nas diversas representaesimagticas que vinculam os interlocutores, alm dediscrepncias de competncia lingstica, de inten-9 Embora possa, na realidade, originar-se da insegurana do tra-dutor. Observa-se, aqui, um caBO evidente - e que, de fato, de apli-

    cao mais geral - de como pode ser problemtico inferir algo sobreo processo a partir do produto (provavelmente, no apenas no camporestrito da traduo).60o comunicativa e outras. Mesmo no papel restritode consultor de terminologia, as disparidades deuso, os diversos "dialetos terminol6gicos" queopem integrantes de subgrupos sociais distintos(por entidade, escola de pensamento etc.) represen-tam, novamente, um certo grau de risco para a "feitu-ra de um ato tradut6rio que transponha os bloqueioscomunicativos originais sem engendrar, por umapolifonia inadequada,lO novos impedimentos inte-

    rao intersubjetiva.10 Evidentemente, a poli fonia como tal no se caracteriza necessa-riamente como algo inapropriado interao discursiva e culturalque se estabeIce na traduo interlingual, Pode, ao contrrio, cons-tituir um dos objetivos do ato tradut6rio, particularmente quando osvalores culturais e estticos esto em jogo. A crtica aqui formuladadiz respeito exclusivamente aos hibridismos terminol6gicos, no quetm de negativo para a intencmunicao dentro de cada rea de es-pecialidade.61rOS CANAISNas situaes mais tpicas - mais freqentes -

    textos originais escritos so submetidos a atos tra-dut6rios que resultam em textos traduzidos escritose textos originais orais so submetidos a atos traut6-rios que resultam em textos traduzidos orais (inter-pretao simultnea ou consecutiva). Nesses casos,eventuais manifestaes do canal alternativo - orale escrito, respectivamente - podem ocorrer inci-dentalmente durante a execuo do ato tradut6rio:na traduo escrita, por exemplo, pelo teste de eu-fonia de uma frase e eliminao de cac6fatos; na

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    interpretao, o canal escrito pode servir de apoio simultnea, atravs da leitura prvia de resumos dasconferncias ou palestras a serem proferidas e/ouconfeco de glossrios, ou, no caso da traduoconsecutiva, mais sistematicamente, pela tomada denotas, taquigrficas ou no.Mesmo descontadas essas "interferncias" re-sultantes de "canais trocados", de qualquer formamarginais ou secundria ao processo bsico, a rela-63th do escrita ( - ) escrita e oralidade ( - ) oralidadeno ato tradutrio no est isenta de problemas.Para a interpretao, os problemas especficosdo canal remetem ao fato de que a fala sempreacompanhada de (1) inflexes entoacionais de todaordem, algumas facilmente identificveis, como sig-nos gramatiais que so - melodia interrogativa vs.melodia declarativa -, outras mais sutis, manifes-tando, conscientemente ou no, pressupostos, su-bentendidos, elementos atitudinais, freqentementesujeitas a fortes variaes dialetais, e, mais fre-qentemente ainda, desestruturadas e invertidas por

    falantes de nveis B e C (vide captulo anterior),impondo, como previsvel, fortes exigncias competncia lingstica do Receptor-Intrprete; (2)de uma expresso corporal (gestualidade) que se ar-ticula com a linguagem e, por vezes, a substitui ou,at, inverte seu "valor de face". Todos esses ele-mentos, ausentes da interao escrita, so cultural-mente marcados, ou seja, so portadores de sentidosespecficos de cada lngua e/ou cultura, e melodiase gestos similares podem ter significados diversos(at contrrios ou contraditrios) em lnguas e cul-turas distintas. Pressupondo-se o intrprete comodispondo da devida competncia entoacional e ges-

    tual bilnge e bi-cultural, diversos filtros - interfe-rncias de esttica no dilogo por meio telefnico,pouca ou nenhuma percepo visual do falante (r-dio, telefone, cabine de interpretao simultneamal posicionada) - podem bloquear, parcial ou to-talmente, o acesso a essas informaes, no obs-tante serem vitais para uma apreenso menos viesa-da da mensagem.Para a relao tradutria que se desenvolvepelo canal da escrita, uma questo a que se tem da-64rido relativamente pouca ateno, mas que exige, em

    algum momento, uma tomada de posio por partedo tradutor e/ou do receptor (cliente) da traduodiz, respeito s convenes dspares dos sistemasgrafmicos discrepantes. Com efeito, mesmo entreidiomas que empregam o alfabeto romnico, apenasdois - o ingls e o holands - no utilizam letrasespeciais e/ou diacrticos de diversos tipos. Depen-dendo do ferramental de escrita disponvel, I podemocorrer restries de toda ordem que mesmo as im-pressoras mais modernas, a laser ou a jato de tinta,

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    com seus diversos cartuchos de fontes, nem sempresolucionam de maneira satisfat6ria quando de suainterao com os softwares mais em voga.2Diantede tais restries, far-se- normalmente necessriooptar entre a transliterao e a traduo grafolgi-ca.Nos termos definidos por Catford (1980), atransliterao constitui um processo complexo peloqual se procura inicialmente, na lngua de partida, oequivalente fonol6gico ao grafema (ou dgrafo etc.)em questo. Num segundo momento, efetua-se umatraduo fonolgica, isto , procura-se, na lngliade chegada, o fonema com caractersticas mais pr-ximas ao fonema da lngua de partida que corres-1 O caso mais exemplar o do telex, que no comporta minsculasnem diacrlticos.2 Este problema tende a se tomar particularmente agudo sempreque, pelos mais diversos motivos - emprstimos, nomes pr6priosno-traduzveis etc. - o produtor do texto de chegada queira ou ne-cessite manipular, no mbito da mesma escrita, duas convenesortogrficas, a da lngua de partida e a da Ungua de chegada, casoambas utilizem diacrlticos, ou letras especiais, em combinat6rias de

    sinais no inteiramente confluentes.65II!IIponde ao grafema que se pretende transliterar. Fi-nalmente, determina-se o(s) grafema(s) na lngua dechegada que corresponda(m) ao fonema identificadocomo aquele sendo mais similar ao fonema da ln-gua de partida. Assim, por exemplo, a aspiraoglotal, tpica dos idiomas anglo-germnicos, a fri-

    ativa surda mais posterior dessas lnguas. No por-tugus do Brasil, a fricativa surda posterior umavelar [R], variante livre da vibrante mltipla. Poresse motivo, falantes nativos de portugus do Brasiltendem a substituir a aspirao glotal, em sua pro-nncia das lnguas anglo-germnicas, por um tipode "r", como em ing. house [haus] ..., [Raus).Da as grafias jocosas como "Rolide" por Holly-wood e quejandos.Aplicada traduo entre lnguas de escritaromnica, porm,3a transliterao tende a criar

    desvios mais ou menos significativos na percepovisual. Assim, se uma longa tradio j consagrou aaceitabilidade da transliterao do grafema alemo"" como "ue" (o "e" conferindo ao "u" um ele-mento de anterioridade), a reescrita de "Conceio"como Konseisaung (transliterao para o noruegus)ou de "aougue" como assouguee (transliteraopara o ingls) tende a causar tal espcie, gerar taisdvidas sobre a real identidade do vocbulo, que aopo natural parece ser o apelo traduo grafol-

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    gica.3 Exceto a "transliterao metalingrstica" freqentemente utili-zada nos guias fraseol6gicos de bolso, para consumo dos turistas, emque se efetua um arremedo de transcrio fontica utilizando a con-veno ortogrfica nativa do turista para indicar a pronncia apro-ximada dos sons da lfngua estrangeira; por exemplo, "bong gia" por"bom dia", em que o desvio visual no percebido como tal portratar-se, explicitamente, de orientao para a fonao.66Nesta, a converso se faz procurando direta-mente na conveno ortogrfica da lngua de che-gada o grafema visualmente mais similar ao grafemaproblemtico em lngua de partida. Assim, para ografema "" do portugus e do francs, o corres-pondente mais similar nas demais lnguas europiasde escrita romnica , simplesmente, o "c", sem ocedilha; da mesma forma, nas lnguas anglo-germ-nicas, o "" apresenta como nico equivalente pos-svel o "a", sem diacrtico ou, alternativamente,tremado. Dessa forma a reproduo do nome pr-prio "Conceio" ser usualmente feita como"Conceicao" ou "Conceico".Esta, ao menos, a descrio teoricamentemais confortvel. Na realidade, porm, as formas

    correntes de lidar com o problema das convenesortogrficas discrepantes se apresentam algo maiscomplexas. Por exemplo, diante de eventuais restri-es instrumentais, para as lnguas escandinavastende-se a adotar como conveno ortogrfica alter-nativa para o ~ ' a " a forma mais arcaica "aa".4No caso da traduo escrita entre lnguas comsistemas de escrita divergentes - alfabticos, silbi-cos ou ideogrficos - a nica soluo vivel paraassegurar a legibilidade nos casos de emprstimos esimilares a transliterao. Observa-se, a este res-peito, a ausncia de uma conveno de translitera-

    o suficientemente bem difundida que leve emconta a estruturao grafgica especfica do portu-4 Em termos. O sueco foi o primeiro idioma a substituir o "aa"por " ~ " , em princfpios do sculo XIX. O noruegus efetuou a trocana passagem do sculo XIX para o sculo XX. J o dinamarqu&so-mente abandonou o drgrafo "a" aps a Segunda Guerra Mundial (a-pud Walshe, 1965).67r gus, sendo comum, entre ns, a imitao de con-venes mais bem articuladas para a transliteraoao francs ou ao ingls. bem verdade que umatraduo grafolgica parcial pode tambm ser ope-

    rada entre tais convenes dspares, mas, usual-mente, apenas como efeito esttico e/ou publicit-rio, por exemplo, sugerindo uma "autenticidaderussa" em conhecida marca de vodca, ou conferindoum "ar" nipnico, rabe, hebraico etc. a determina-da palavra ou frase (apud Catford, 1980).Outro aspecto que tem merecido pouco desta-que prende-se especificidade do canal escrito emrelao ao oral. Ao contrrio da crena mais difun-dida, a escrita no constitui um mero derivativo da

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    oralidade. Independentemente da precedncia hist-rica de uma ou outra modalidade de verbalizao,na prpria evoluo da escrita o sistema alfabtico,mais prximo de uma "imitao" do componentefonolgico das lnguas, foi o ltimo, no o primeiro,a ser elaborado, sendo precedido pelo pictogrfico,logogrfico ou ideogrfico e, numa soluo inter-mediria, pela analogia logogrfica/silbica e/oufonolgica (Gelb, 1952). Desde sua incepo, por-tanto, a escrita foi concebida como distinta e nocorrelata fala. E, mesmo em convenes alfabti-cas, abundam os grafemas no-fonolgicos (videCrispim, 1988).Esse dado diacrnico indica a de di-ferenas de ordem estrutural, manifestas sincroni-camente. E, de fato, alm da presena/ausncia (oumanifestao diversa) da entoao e da expressocorporal, a oralidade e a escrita se diferenciam empelo menos um ponto central prpria definio dosigno. A noo de linearidade do significante68- - .(Saussure, 1964) aplica-se, em seu sentido integral,to somente ao signo fonologicamente produzido.

    Na escrita, a bidimensionalidade do meio matiza es-sa linearidade,5 abrindo perspectivas inimaginadasna fonao, e que provavelmente compensam a pre-cria reproduo da pauta meldica e a quase au-sncia da gestualidade (salvo na poesia concreta esimilares) na escrita. Essa bidimensionalidade, ma-nifesta de modos variados na produo, no produtoe na decodificao do texto escrito, faculta a distin-o maiscula/minscula, a incluso na escrita, aolado de fono-grafemas (letras), de logo-grafemas (,$, %, ro, *, + e outros), logotipos, sobreposiesdo tipo prezado(a) senhor(a), alm de toda umasignificao textual manifesta na disposio grfica:

    paragrafao, subttulos, sublinhados, itlicos, ne-gritos, nmero de colunas, margens, organizao detabelas, uso de grficos e tabelas dos mais variadostipo, todos portadores de significado lingistica-mente definvel.Em funo do que precede, coloca-se para atraduo escrita de textos escritos a questo da "i-mitao" (ou busca de equivalncia) da disposiovisual do texto. Tal preocupao parece, com efeito,ser bastante recente. Na viso - e na praxe - tradi-cional, o tradutor produz seu texto em "laudas", deacordo com um certo padro,6 eventualmente com5 E, por vezes, a cancela quase que totalmente, como no caso das

    palavras cruzadas.6 A lauda padro um dos muitos mitos renitentes da profisso.Na realidade, observa-se pelo menos 5 ou 6 padres distintos nomercado brasileiro, variando entre um mnimo de 20 linhas x 50caracteres por linha at um mximo de 32 linhas x 72 caracteres porlinha, ou seja, um diferencial da ordem de l30%!69r-It

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    Ifuma entrada de alguns poucos toques para a marca-o dos pargrafos. Embora constitua uma forma deproceder que simplifica o processo de contagem delaudasllinhas e, portanto, de estabelecimento dopreo final devido pelo texto traduzido, omite-se,dessa fonna, toda a informao visual presente nooriginal. Na atualidade, em que os sistemas infor-matizados de processamento de texto e as leitorasticas (scanners) proporcionam um ferramental ex-tremamente flexvel para a organizao visual dostextos, possvel reproduzir, com relativa "fideli-dade", colunas, bordas, centralizao e diviso si-lbica automticas, tabulaes complexas, corpos deletras variados, negritos, sublinhados, duplo subli-nhados, itlicos, entre outros (vide, a propsito,Simpk:in, 1983). Evidentemente, aqui como alhures,caber verificar at que ponto as convenes e ossentidos comunicativos manifestos na disposio vi-sual do texto so similares ou distintos e decidir,para o ato tradutrio em questo, da conveninciade manter a esttica visual do original (opo essaprovavelmente mais pertinente em situaes que

    impliquem um cotejamento constante do originalcom a traduo, tal como em edies bilnges, mi-nutas de contrato em vias de negociao entre par-tes empregando cdigos lingsticos distintos), oude proceder s reformulaes que as convenes di-ferentes da lngua/cultura de chegada imporiam(quando a traduo dever atuar na comunidade so-ciolingstica de chegada como texto autnomo).Tendo em vista a natureza estruturalmente di-vergente entre a oralidade e a escrita