Post on 07-Jan-2017
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS AMBIENTAIS E
TECNOLÓGICAS
CURSO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA
ADA CATARINA SOARES DE SENA COSTA
O USO DO CACTO NA CONSTRUÇÃO CIVIL: MUCILAGEM ADICIONADA A
COMPONENTES CONSTRUTIVOS
MOSSORÓ-RN
2012
ADA CATARINA SOARES DE SENA COSTA
O USO DO CACTO NA CONSTRUÇÃO CIVIL: MUCILAGEM ADICIONADA A
COMPONENTES CONSTRUTIVOS
Monografia apresentada à Universidade Federal
Rural do Semi-Árido – UFERSA, Departamento
de Ciências Ambientais e Tecnológicas – DCAT
para a obtenção do título de Bacharel em Ciência
e Tecnologia.
Orientador (a): Profª. D. Sc. Marília Pereira de
Oliveira – UFERSA.
MOSSORÓ-RN
2012
Ficha catalográfica preparada pelo setor de classificação e
catalogação da Biblioteca “Orlando Teixeira” da UFERSA
Bibliotecária: Vanessa de Oliveira Pessoa
CRB15/453
C837u Costa, Ada Catarina Soares de Sena.
O uso do cacto na construção civil: mucilagem adicionada a
componentes construtivos. / Ada Catarina Soares de Sena Costa.
-- Mossoró, 2012.
48 f.: il.
Monografia (Graduação em Ciência e tecnologia) –
Universidade Federal Rural do Semi-Árido.
Orientadora: Drª. Marília Pereira de Oliveira.
1. Argamassas. 2. Aditivos. 3. Mucilagem de cactos. I. Título.
CDD: 691.5
ADA CATARINA SOARES DE SENA COSTA
O USO DO CACTO NA CONSTRUÇÃO CIVIL: MUCILAGEM ADICIONADA A
COMPONENTES CONSTRUTIVOS
Monografia apresentada à Universidade Federal
Rural do Semi-Árido – UFERSA, Departamento
de Ciências Ambientais e Tecnológicas – DCAT
para a obtenção do título de Bacharel em Ciência
e Tecnologia.
Aos meus pais: Francisco de Assis de Sena Costa
e Izabel Maria Soares de Sena Costa.
Ao meu tio: Antão Sena Filho.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, acima de tudo, por se fazer constante em minha vida, guiando meus passos,
protegendo-me em todos os caminhos que percorro e fazendo-me forte e esperançosa quando
estou prestes a fraquejar.
Agradeço à minha mãe, Izabel Maria Soares de Sena Costa, por todo apoio e colaboração em
todos os sentidos, sempre.
Agradeço ao meu pai, Francisco de Assis de Sena Costa, por ter sacrificado anos de sua vida
para ter como investir na educação de base minha e de meus irmãos, fundamental para eu ter
chegado aonde cheguei.
Agradeço ao meu tio, Antão Sena Filho, pelo apoio de sempre, confiança, incentivo e pela sua
significância para mim, assim como para toda a minha família.
Agradeço à minha avó, Salma Semiranis de Sena, pelas contribuições financeiras tão
importantes para que eu pudesse continuar meus estudos.
Agradeço aos demais familiares que próximos ou à distância acreditaram na minha
capacidade e sempre tiveram alguma palavra de incentivo para me dar.
Agradeço aos professores que tiveram participação na minha formação ao longo de toda
minha vida. A todos eles, devo admiração, respeito e reconhecimento.
Agradeço aos muitos amigos com quem firmei amizade ao longo de toda minha vida, pois
foram essenciais para que eu continuasse a minha jornada, sabendo que não estaria sozinha,
como em muitos momentos difíceis estenderam as mãos para me auxiliar e/ou serviram de
exemplo para que eu me convencesse que todo sacrifício valeria a pena.
Agradeço, em especial, à Michelle, Pacelli, Felipe e Janielly, seja pelo fato de serem os
amigos mais próximos e/ou por terem me dado mais do que apoio, atenção e credibilidade,
uma palavra certa, na hora certa, que foi decisiva diante de algum problema que enfrentei.
Agradeço também à minha orientadora, Marília Pereira de Oliveira, que forneceu a ideia base
para este trabalho, bem como pela sua orientação e paciência ao longo desses últimos meses.
“Uma jornada de duzentos quilômetros
começa com um simples passo.”
(Provérbio chinês)
RESUMO
A indústria da construção civil é um dos setores em constante ascensão, principalmente
impulsionada pelo crescimento populacional e pelo bom momento da economia, o que a
motiva a estar interessada em encontrar soluções sobre novos materiais que ajudem a
aperfeiçoar os processos de construção e ainda possam reduzir seus custos. Um dos recursos
disponíveis é o resgate de técnicas antigas que possam ser utilizadas na construção alternativa.
O uso de aditivos tem a finalidade de ampliar as qualidades ou minimizar os pontos fracos de
argamassas e concretos. Há registros que comprovam que no passado foram utilizados
compostos orgânicos empregados como aditivos capazes de promover maior plasticidade e
resistência mecânica a argamassas. Dentre os compostos orgânicos disponíveis tem-se o
cacto, material disponível em abundância na região do semi-árido nordestino brasileiro. Este
trabalho reúne dados que comprovam as propriedades aditivas da mucilagem de cactos.
Palavras-chave: Argamassas. Aditivos. Mucilagem de cactos.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Espécies de cactos dominantes do nordeste brasileiro 24
Figura 2 - Raiz do cacto barril-dourado 24
Figura 3 - Espinhos de cacto 25
Figura 4 - Figo-da-índia 26
Figura 5 - Coleta de amostras de reboco à base de cal com mucilagem de cactos 28
Figura 6 - Igreja São Sebastião, SC 28
Figura 7 - Restauração das ruínas de Chan-Chan, Peru 29
Figura 8 - Igreja Matriz, Olhão, Portugal 30
Figura 9 - Pintura de casa com mucilagem de palma associada à cal, Valente, Bahia 30
Figura 10 - Nopalea cochenillifera 31
Figura 11 - Comparação entre os tempos de pega inicial e final das argamassas M1
(0% de cacto em pó) e M2 (5% de cacto em pó)
38
Figura 12 - Resistência à compressão das misturas M1 (0% de cacto em pó) e M2
(5% de cacto em pó)
39
Figura 13 - Gráfico comparativo entre as médias de resistência à compressão 41
Figura 14 - Gráfico comparativo entre as médias de resistência à tração 41
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Classificação das argamassas segundo as suas funções na construção 18
Tabela 2 - Classificação das argamassas 19
Tabela 3 - Média da absorção de água dos corpos de prova com 14 dias de moldagem e
média da resistência à flexão estática dos corpos de prova com 90 dias de moldagem
34
Tabela 4 - Resistência à flexão e à compressão das argamassas de cimento Portland e
areia, na proporção 1:3
36
Tabela 5 - Consistência da pasta M1 37
Tabela 6 - Consistência da pasta M2 37
Tabela 7 - Coeficiente de absorção (CA) e valor assintótico da quantidade de água
absorvida por unidade de superfície (M*) para cada tipo de argamassa
42
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10
2 OBJETIVOS ........................................................................................................................ 12
2.1 OBJETIVO GERAL ........................................................................................................... 12
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................................. 12
3 METODOLOGIA ................................................................................................................ 13
4 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................................... 14
4.1 AGLOMERANTES ........................................................................................................... 14
4.1.1 Gesso ............................................................................................................................... 14
4.1.2 Cal ................................................................................................................................... 15
4.1.3 Cimento .......................................................................................................................... 17
4.2 ARGAMASSAS ................................................................................................................. 18
4.2.1 Classificação ................................................................................................................... 18
4.2.2 Propriedades .................................................................................................................. 20
4.2.2.1 Estado fresco ................................................................................................................ 20
4.2.2.2 Estado endurecido......................................................................................................... 20
4.3 ADITIVOS ......................................................................................................................... 21
4.4 CACTÁCEAS .................................................................................................................... 23
4.4.1 Distribuição geográfica dos cactos ............................................................................... 23
4.4.2 Morfologia geral das cactáceas ..................................................................................... 24
4.5 UTILIZAÇÃO DOS CACTOS .......................................................................................... 26
4.6 USO DO CACTO NA CONSTRUÇÃO CIVIL ................................................................ 27
4.6.1 Introdução ...................................................................................................................... 27
4.6.2 Cactos como aditivo em pastas de gesso ...................................................................... 31
4.6.3 Cactos como aditivo em argamassas de cimento portland ........................................ 35
4.6.4 Cactos como aditivo em argamassas de cal ................................................................. 39
5 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 43
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 45
10
1 INTRODUÇÃO
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU, 2007), a partir de 2008, metade da
população mundial já seria urbana. O crescimento populacional em áreas urbanas é um dos
fatores que mantém aquecida a indústria da construção civil. No entanto, a indústria da
construção é uma das grandes responsáveis pelo consumo de matéria-prima e geradora de
resíduos, despertando discussões sobre questões ambientais diante da esgotabilidade de
recursos. Por este motivo, há a necessidade de buscar alternativas tecnológicas para a
construção.
Os materiais de construção em geral, no Brasil, possuem elevado custo, comumente
pelo gasto de energia destinado à sua produção bem como pelo gasto com o transporte dos
mesmos. No caso das argamassas e concretos, outro fator que eleva seus custos é a
incorporação de aditivos, geralmente sintéticos, que permitem modificar ou acrescentar
alguma propriedade ao material.
De acordo com Chandra et al. (1998), nos tempos antigos a durabilidade de estruturas
foi melhorada com o uso de materiais orgânicos, chamados polímeros naturais, que em sua
maioria eram disponibilizados localmente e que, por isso, não eram caros. Estes autores
investigaram o uso do extrato de cactos em argamassas de cimento Portland.
Os cactos são plantas abundantes no Brasil, principalmente na região nordeste e
predominantemente no semi-árido. Sobrevivem a longos períodos de seca, pois, além de seus
espinhos dificultarem a perda de água para o ambiente, possuem internamente uma substância
viscosa, rica em polissacarídeos, denominada mucilagem, que retém água.
Há vasta documentação acerca da utilização da mucilagem de cacto em toda a
América do Sul. Dentre suas utilidades em diversas áreas, destaca-se seu uso na construção
civil. Na América Latina, foi utilizada como estabilizante de terra crua em monumentos e
como consolidante na restauração das ruínas de Chan-Chan, no Peru.
No Brasil, no processo denominado caiação, a mucilagem de cacto atua como agente
fixador da cal ao substrato. No Rio Grande do Sul, relatos orais sobre a utilização de cactos
como aditivos em argamassas históricas de cal e areia puderam ser comprovados mediante
11
pesquisas laboratoriais nessas argamassas e análises dos benefícios do uso do cacto à sua
composição (SAWITZKI, 2006).
Diante da principal desvantagem do gesso, ou seja, sua dissolução em água, torna-se
necessário evitar o contato com a mesma ou adicionar aditivos, impermeabilizantes ou
hidrofugantes. Magalhães (2009) propõe a adição de um impermeabilizante natural
encontrado no cacto.
Em suma, diversos estudos apontam para o ganho de resistência em pastas e
argamassas de gesso, cimento ou cal com a utilização da mucilagem de cactos do gênero
Opuntia, devido às suas propriedades aditivas.
12
2 OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
Este trabalho tem como objetivo reunir informações que possam contribuir para o
desenvolvimento de tecnologias construtivas a partir de matéria-prima disponível em
abundância na região do semi-árido nordestino brasileiro - o cacto.
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Revisar literatura acerca do cacto e sua utilização, com destaque para o uso na
construção civil;
- Identificar propriedades aditivas da mucilagem de cacto em componentes
construtivos;
- Apresentar dados que comprovem os benefícios da utilização da mucilagem de cacto
em componentes construtivos.
13
3 METODOLOGIA
Este trabalho foi desenvolvido mediante realização de pesquisa bibliográfica,
abrangendo leitura, análise e interpretação de informações contidas em livros, dissertações,
artigos, revistas, sites, etc, acerca do tema em foco, ou seja, acerca do uso da mucilagem do
cacto e suas propriedades aditivas em componentes construtivos.
14
4 REVISÃO DE LITERATURA
4.1 AGLOMERANTES
Os aglomerantes são produtos empregados na construção civil com o objetivo de fixar
ou aglomerar materiais entre si. Comumente são pulverulentos e quando misturados à água
têm capacidade de aglutinar e formar suspensões coloidais, endurecendo por simples secagem
e/ou em consequência de reações químicas. Dessa forma, aderem à superfície na qual foram
postos em contato. São utilizados na obtenção de pastas, argamassas e concretos.
Quanto à atividade química, classificam-se em:
Quimicamente inertes: endurecem ao ambiente pela evaporação da água de
amassamento, processo esse, reversível, e possuem baixa resistência mecânica, como é o caso
das argilas.
Quimicamente ativos: endurecem, nas condições ambientes de temperatura e pressão,
em decorrência de uma reação química irreversível, atingindo altas resistências físico-
mecânicas.
Os aglomerantes quimicamente ativos dividem-se em:
- Aglomerantes aéreos: endurecem pela ação química do CO2 e não resistem satisfatoriamente
à ação da água. Ex.: Cal área e gesso.
- Aglomerantes hidráulicos: endurecem pela ação da água e resistem satisfatoriamente à ação
da água. Ex.: Cal hidráulica e Cimento Portland.
Os principais aglomerantes são o gesso, a cal e o cimento.
4.1.1 Gesso
De acordo com Ribeiro et al. (2002), o gesso é um aglomerante obtido pela britagem e
desidratação da gipsita. A gipsita é constituída predominantemente de sulfato de cálcio
(CaSO4).
15
Segundo Munhoz apud Magalhães (2009), o beneficiamento da gipsita envolve as
operações de coleta manual, britagem, moagem, peneiramento, ensilamento, calcinação,
estabilização térmica em silos, nova moagem e novo ensilamento, e, por último, o
ensacamento.
A calcinação da gipsita conduz à formação de semi-hidratos e sulfatos-anidro solúveis
e insolúveis, dependendo do limite das temperaturas e pressões correntes na operação de
cozimento. Os sulfatos-anidro solúveis colocados em presença de água reconstituem
rapidamente o sulfato biidratado original. Como a hidratação é uma reação exotérmica, ocorre
elevação da temperatura. O sulfato-anidro insolúvel por não ser suscetível a reidratação
rápida, sendo praticamente inerte, participa do conjunto desempenhando papel de material de
enchimento, como a areia na argamassa.
O gesso é um material relativamente abundante em algumas regiões do mundo, onde o
seu preço é comparável ou até mesmo inferior ao da cal. Por este motivo, é utilizado como
material de revestimento de paredes e forros, conferido fino acabamento. Apresenta excelente
resistência ao fogo e contribui para o equilíbrio da umidade relativa do ar, devido à sua
facilidade de absorção de água.
Duas particularidades devem ser levadas em consideração acerca do uso do gesso: não
pode ser utilizado em exteriores, por ser solúvel em água, e só pode ser armado com
armaduras galvanizadas, pois provoca a corrosão do aço (RIBEIRO et al., 2002).
Segundo o Sindicato da Indústria do Gesso do Estado de Pernambuco (Sindusgesso,
2012), o Pólo Gesseiro de Pernambuco, responsável por 95% da produção anual brasileira,
possui uma reserva estimada em 1,22 bilhões de toneladas, com capacidade de exploração
prevista para 600 anos. Dessa forma, constitui-se numa das mais expressivas e importantes do
mundo, levando-se em consideração o alto teor de pureza do gesso.
4.1.2 Cal
Bauer (2011) define cal como sendo o nome genérico de um aglomerante simples
resultante da calcinação de rochas calcárias. O óxido de cálcio puro é o resultado dessa
calcinação. Nas rochas calcárias naturais, o carbonato de cálcio é comumente substituído, em
menor ou maior proporção, pelo carbonato de magnésio, o que não constitui impureza
16
propriamente dita, sendo esse papel desempenhado pela sílica e pelos óxidos de ferro e de
alumínio. Outras matérias-primas destinadas à produção de cal são os depósitos de resíduos
de esqueletos de animais, como ocorre em nossos sambaquis.
Durante a calcinação do calcário natural, o carbonato de cálcio, submetido a
temperaturas próximas de 900°C, decompõe-se em óxidos de cálcio e anidridos carbônicos. O
produto da calcinação ainda não é o aglomerante usado na construção, denomina-se cal viva e
apresenta-se sob a forma de grãos de tamanhos variados, sendo comuns dimensões de 10, 15
ou 20 cm, em média.
Reação química da calcinação: CaCO3 + calor CaO + CO2
O óxido deve ser hidratado, processo esse denominado extinção, e transforma-se em
hidróxido, que é o constituinte básico do aglomerante cal. Quando a hidratação se dá no
canteiro de serviço, o hidróxido resultante denomina-se cal extinta, mas quando se dá na
fábrica, denomina-se cal hidratada. A extinção é uma reação bastante exotérmica,
acompanhada de considerável aumento de volume, e quando se dá na variedade cálcica de
grande pureza, o processo é violento.
Reação química da extinção: CaO + H2O Ca(OH)2
As argamassas de cal são elaboradas misturando-se a cal extinta com água e areia.
Possuem consistência mais ou menos plástica e endurecem, de fora para dentro, por
recombinação do hidróxido com o gás carbônico presente na atmosfera, reconstituindo o
carbonato original. Essa dependência do ar atmosférico para endurecer explica o nome
ordinariamente dado a esse aglomerante – cal aérea. A reação denominada carbonatação
ocorre na temperatura ambiente e exige a presença de água.
Reação química da carbonatação: Ca(OH)2 + CO2 CaCO3 + H2O
De acordo com a composição química, as variedades de cal aérea classificam-se em
cal cálcica (mínimo de 75% de CaO) ou cal magnesiana (mínimo de 20% de MgO), e de
acordo com o rendimento em pasta, classificam-se em cal gorda (rendimento maior que 1,82)
ou cal magra (rendimento inferior a 1,82).
A cal hidratada apresenta-se como um produto seco, em forma de flocos de cor branca,
e oferece sobre a cal virgem algumas vantagens, como facilidade de manuseio, transporte e
armazenamento. Trata-se de um produto pronto para ser utilizado.
17
Cal hidráulica é o nome aplicado para uma família de aglomerantes de composição
variada, também obtida pela calcinação de rochas calcárias, porém contém uma porção
apreciável de materiais argilosos e a propriedade de endurecer sob a água, apesar de sofrer
igualmente a ação de endurecimento pela carbonatação proveniente da fixação de CO2 do ar.
Contudo, não é um produto apropriado para construções sob a água. De pega muito lenta,
torna-se mais adequada a emprego de menor responsabilidade.
4.1.3 Cimento
Cimento Portland é o aglomerante obtido pela moagem do clinker (resultante da
calcinação até fusão incipiente de uma mistura de calcário e argila) mais gipsita. A argila
utilizada para a sua fabricação é essencialmente constituída de um silicato hidratado
complexo de alumínio, geralmente contendo ferro e outros óxidos minerais, em menores
porcentagens. A gipsita é adicionada no final do processo de fabricação com a função de
regular o tempo de pega (ALVES, 1977).
Trata-se de um pó fino, com propriedades aglomerantes, que endurece sob ação da
água. Uma vez endurecido, mesmo que seja novamente submetido à ação da água, não se
decompõe mais. É produzido em instalações industriais de grande porte, comumente
localizadas junto às jazidas em situação favorável para o transporte do produto acabado até os
centros consumidores (BAUER, 2011).
A fabricação do cimento Portland se dá mediante seis processos principais, a saber:
extração da matéria-prima, britagem, moedura e mistura, queima, moedura do clinker e
expedição.
O produto acabado é ensacado em sacos de papel apropriado, acarretando a exigência
de cuidados no seu armazenamento a fim de se evitar qualquer risco de hidratação, uma vez
que os sacos não garantem a impermeabilização necessária. Não é recomendado o
armazenamento de cimento por mais de três meses.
De acordo com a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP, 2002), dentre os
principais tipos de cimento Portland existentes no Brasil, os mais empregados nas diversas
obras de construção civil são: cimento Portland comum, cimento Portland composto, cimento
Portland de alto-forno e cimento Portland pozolânico.
18
4.2 ARGAMASSAS
De acordo com Isaia (2007), “argamassas são materiais de construção, com
propriedades de aderência e endurecimento, obtidos a partir da mistura homogênea de um ou
mais aglomerantes, aglomerado miúdo (areia) e água, podendo conter ainda aditivos e adições
minerais”. As pastas são misturas íntimas de um ou mais aglomerantes e água, mas quando
preparadas com excesso de água, são denominadas natas.
4.2.1 Classificação
A Tabela 1 mostra a classificação das argamassas quanto às suas funções.
Tabela 1 - Classificação das argamassas segundo as suas funções na construção.
Função Tipos
Para construção de alvenarias
Argamassa de assentamento (elevação da
alvenaria)
Argamassa de fixação (ou encunhamento)
– alv. de vedação
Para revestimento de paredes e tetos
Argamassa de chapisco
Argamassa de emboço
Argamassa de reboco
Argamassa de camada única
Argamassa para revestimento decorativo
monocamada
Para revestimento de pisos
Argamassa de contrapiso
Argamassa de alta resistência para piso
Para revestimentos cerâmicos
(paredes/pisos)
Argamassa de assentamento de peças
cerâmicas – colante
Argamassa de rejuntamento
Para recuperação de estruturas Argamassa de reparo
Fonte: Isaia (2007).
19
As argamassas são classificadas ainda com relação a vários critérios, como mostra a
Tabela 2.
Tabela 2 - Classificação das argamassas.
Critério de classificação Tipo
Quanto à natureza do aglomerante Argamassa aérea
Argamassa hidráulica
Quanto ao tipo de aglomerante
Argamassa de cal
Argamassa de cimento
Argamassa de cimento e cal
Argamassa de gesso
Argamassa de cal e gesso
Quanto ao número de aglomerantes Argamassa simples
Argamassa mista
Quanto à consistência da argamassa
Argamassa seca
Argamassa plástica
Argamassa fluida
Quanto à plasticidade da argamassa
Argamassa pobre ou magra
Argamassa média ou cheia
Argamassa rica ou gorda
Quanto à densidade de massa da
argamassa
Argamassa leve
Argamassa normal
Argamassa pesada
Quanto à forma de preparo ou
fornecimento
Argamassa preparada em
obra
Mistura semipronta para
argamassa
Argamassa industrializada
Argamassa dosada em
central
Fonte: Isaia (2007).
As argamassas produzidas para assentamento de componentes de alvenaria,
revestimento de tetos e paredes, revestimento de pisos ou contrapisos nos mais variados
processos construtivos, hoje em dia, são comercialmente chamadas de argamassas de múltiplo
uso (SELMO et al., 2002).
20
4.2.2 Propriedades
As argamassas apresentam as seguintes propriedades no estado fresco e no estado
endurecido (ROCHA e XAVIER, 2000):
4.2.2.1 Estado fresco
Período decorrido entre a mistura de aglomerantes e agregados com a água e o início
das reações de pega.
Consistência: propriedade pela qual a argamassa tende a resistir à deformação
(CINCOTTO et al., 1995 apud SILVA, 2006). É influenciada pela quantidade de água
adicionada e pelo uso de aditivos especiais.
Retenção da consistência: propriedade da argamassa em manter sua consistência após
o contato com um substrato. Dependem da retenção de água (ROCHA e XAVIER, 2000).
Coesão e tixotropia: a coesão é a capacidade de a argamassa manter seus
constituintes homogêneos sem sofrer segregação. Argamassas tixotrópicas exigem baixa
energia para alterarem sua forma, mas depois de alterada, conseguem mantê-la mesmo sob a
ação da gravidade (ROCHA e XAVIER, 2000).
Plasticidade: propriedade pela qual a argamassa tende a conservar-se deformada após
a redução das tensões de deformação (SILVA, 2006).
Retenção de água: capacidade de a argamassa manter sua trabalhabilidade quando
sujeita a solicitações que provocam a perda de água (ISAIA, 2007).
Adesão inicial: propriedade de a argamassa manter-se adequadamente unida à base
após a sua aplicação (ROCHA e XAVIER, 2000).
4.2.2.2 Estado endurecido
Período decorrido entre a mistura de aglomerantes e agregados com a água e o fim das
reações de pega.
21
Resistência mecânica: está relacionada à capacidade da argamassa resistir a esforços
de tração, compressão ou cisalhamento, oriundas de cargas estáticas ou dinâmicas atuantes
das edificações ou de efeitos das condições ambientais (NAKAKURA, 2003).
Deformabilidade: propriedade de a argamassa se deformar sem criar tensões no
material (ROCHA e XAVIER, 2000).
Permeabilidade: capacidade de a argamassa se deixar atravessar por um fluido
(ROCHA e XAVIER, 2000).
Retração volumétrica: retração resultante da reação química dos aglomerantes e
remoção da água adsorvida nos produtos de hidratação durante a secagem (ROCHA e
XAVIER, 2000).
Aderência: capacidade da argamassa se fixar ao substrato onde for aplicada (ROCHA
e XAVIER, 2000).
4.3 ADITIVOS
Em 1824, Joseph Aspdin patenteou um cimento artificial que foi denominado cimento
Portland. Em 1873 esse cimento passou a ser aditivado com gesso cru e cloreto de cálcio, a
fim de se regular o seu tempo de pega. Após pesquisas feitas com diversos materiais, chegou-
se a certos aditivos, tais como impermeabilizantes, aceleradores e retardadores que
começaram a ser comercializados no início do século passado. Desde então, a tecnologia dos
aditivos tem se desenvolvido acompanhando o crescente ritmo da construção civil.
A Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT através da NBR 13529 (1995)
define aditivo como sendo “produto adicionado à argamassa em pequena quantidade, com a
finalidade de melhorar uma ou mais propriedades, no estado fresco ou endurecido”. As
substâncias ativas de suas formulações podem ser orgânicas ou inorgânicas, sendo
distribuídas num veículo líquido, pastoso ou sólido.
A NBR 11768 (ABNT, 1992) estabelece a seguinte classificação e definições para os
aditivos para concreto de cimento Portland:
- Aditivo plastificante (tipo P): produto que aumenta o índice de consistência do concreto
mantida a quantidade de água de amassamento, ou que possibilita a redução de, no mínimo,
22
6% da quantidade de água de amassamento para produzir um concreto com determinada
consistência.
- Aditivo retardador (tipo R): produto que aumenta os tempos de início e fim de pega do
concreto.
- Aditivo acelerador (tipo A): produto que diminui os tempos de início e de fim de pega do
concreto, bem como acelera o desenvolvimento das suas resistências iniciais.
- Aditivo plastificante retardador (tipo PR): produto que combina os efeitos dos aditivos
plastificante e retardador.
- Aditivo plastificante acelerador (tipo PA): produto que combina os efeitos dos aditivos
plastificante e acelerador.
- Aditivo incorporador de ar (tipo IAR): produto que incorpora pequenas bolhas de ar ao
concreto.
- Aditivo superplastificante (tipo SP): produto que aumenta o índice de consistência do
concreto mantida a quantidade de água de amassamento, ou que possibilita a redução de, no
mínimo, 12% da quantidade de água de amassamento, para produzir um concreto com
determinada consistência.
- Aditivo superplastificante retardador (tipo SPR): produto que combina os efeitos dos
aditivos superplastificante e retardador.
- Aditivo superplastificante acelerador (tipo SPA): produto que combina os efeitos dos
aditivos superplastificante e acelerador.
Há ainda os aditivos impermeabilizantes, utilizados com a finalidade de diminuir a
absorção de água por capilaridade de argamassas e concretos. Reforçam a impermeabilidade
do concreto, pois atuam em seus poros formando uma fina película higroscópica, além de
tamponá-los superficialmente.
No passado, foram utilizados compostos orgânicos com propriedades aditivas, como é
o caso dos polissacarídeos (mucilagem vegetal). Segundo Kanan (2008), a durabilidade de
argamassas históricas tem sido atribuída a aditivos orgânicos como óleo, sangue, urina,
mucilagem de cactos e caseína.
23
4.4 CACTÁCEAS
Milhares de espécies distribuídas em várias famílias botânicas são conhecidas como
plantas suculentas. São plantas carnudas e ricas em água, que trazem essas características para
suportarem grandes períodos de seca (BALLESTER OLMOS, 1995). As principais espécies
são as dos cactos (CACTACEAE ou cactáceas). A palavra cacto, do grego Kaktos, significa
planta que tem espinhos. A primeira vez que esta palavra foi utilizada foi pelos gregos, e data
de 300 anos a.C., para designar uma espécie semelhante à alcachofra.
As cactáceas apresentam anatomia diferenciada em algumas estruturas (folhas, caules
ou raízes), o que as torna capazes de armazenar água, e, portanto, suculentas. Além disso,
possuem uma especialização fisiológica importante que as permite sobreviver em condições
extremas, que é a abertura dos estômatos durante a noite evitando a desidratação durante os
períodos mais críticos do dia (TAKANE et al., 2009).
4.4.1 Distribuição geográfica dos cactos
Segundo Takane et al. (2009), a grande maioria dos cactos se encontra ao longo do
continente americano, desde o Canadá até o sul do Chile. Algumas espécies ainda são
encontradas em Madagascar, em alguns países do continente africano e no Sri-Lanca.
São, ao todo, aproximadamente 2.000 espécies, que podem ser encontradas ao nível do
mar, mas também em montanhas a cerca de 4.500 metros de altitude. Na cordilheira dos
Andes, passam o inverno debaixo da neve, o que também ocorre com as espécies do centro
dos Estados Unidos e dos altiplanos do México. Podem ser encontradas em troncos de árvores
(epífitas), sobre pedras e geralmente à sombra. Dessa forma, nota-se que não são plantas
exclusivas de desertos, mas de climas extremos, frios ou quentes.
Na caatinga do nordeste brasileiro ocorre a dominância de cactáceas dos gêneros
Cereus, Opuntia e Pilosocereus, dos quais fazem parte o Mandacaru (Cereus jamacaru), a
Palma (Opuntia fícus-indica) e o Facheiro (Pilosocereus pachycladus), respectivamente,
Figura 1.
24
Figura 1: Espécies de cactos dominantes do nordeste brasileiro.
Fonte: http://pt.wikipedia.org
4.4.2 Morfologia geral das cactáceas
As raízes das cactáceas são superficiais, muito finas, longas e bastante ramificadas
(Figura 2), o que as permite aproveitar qualquer indício de umidade, como por exemplo,
orvalho ou neblina. Há ainda espécies que possuem uma raiz principal bastante grossa, com a
finalidade de manter uma reserva de água e substâncias nutritivas, chegando a serem até
mesmo mais grossas que a parte aérea da planta
(http://www.jardimdeflores.com.br/floresefolhas/A17cactos.htm).
Figura 2: Raiz do cacto barril-dourado.
Fonte: http://www.deolhonasorigens.com.br
25
Quanto aos caules, possuem formatos variados, podendo ser esféricos, cilíndricos,
discóides, ovóides, articulados, alados, poligonais, sulcados, ramificados ou não. São sempre
verdes, possuem função de caule, que é conferir resistência à planta e função clorofiliana
(http://www.itograss.com.br/informativoverde/edicao67/mat5ed67.htm).
Os caules dos cactos são espessos e suculentos, e pelos seus aspectos anômalos, são
chamados cladódios. A seiva comumente espessa, com aspecto de gel, proporciona um grande
volume para o armazenamento de materiais alimentares e contribui para a retenção de água,
sendo denominada mucilagem. Segundo Chandra et al. (1998), esse gel contém proteínas e
polissacarídeos. São nos caules dos cactos que estão localizados os estômatos da planta –
estruturas semelhantes aos nossos poros, que durante o dia se mantêm fechados a fim de se
evitar a perda de água na forma de vapor.
Uma característica marcante dos cactos são os espinhos (Figura 3), considerados
folhas modificadas que se reduziram no processo de evolução da planta, contribuindo também
para a redução da perda de água. Podem ter diferentes formas (recurvados, largos, eretos),
tamanhos e até cores (avermelhados, cor-de-rosa, pretos, castanhos, brancos ou cinzentos)
variando entre as espécies. Protegem a planta de possíveis predadores e ainda são capazes de
promover a dispersão da mesma, uma vez que alguns animais podem ter algumas partes
aderidas aos seus pelos e assim transportá-los para outros locais em que poderão vir a brotar.
Figura 3: Espinhos de cacto.
Fonte: http://www.terradagente.com.br
Todos os cactos florescem. No entanto, para algumas espécies, isso só ocorre após os
80 anos, ou ainda, ao atingirem a altura mínima de 2 m. Constituem flores perfeitas, ou seja,
possuem sépalas, pétalas, pistilos funcionais e estames. Também variam em tamanho e cor, e
26
podem exalar algum tipo de cheiro para atrair morcegos e mariposas. As flores dos cactos são
efêmeras, ou seja, raramente duram mais de uma semana. Aparecem isoladas ou em grupos.
Algumas espécies de cactos produzem frutos comestíveis, como é o caso da Opuntia
fícus-indica, que produz o figo-da-índia (Figura 4). Nas espécies globosas, são produzidos
frutos em grande quantidade. Exibem cores brilhantes e possuem formato de baga alongada
ou esférica que geralmente arrebenta durante a maturação, espalhando suas inúmeras
sementes de tamanho muito pequeno no solo. Os cactos reproduzem-se tanto por sementes,
quanto por estacas, e os seus principais agentes polinizadores são insetos, aves e morcegos.
Figura 4: Figo-da-índia.
Fonte: dreamstime.com
4.5 UTILIZAÇÃO DOS CACTOS
As cactáceas apresentam ampla utilização. Segundo Sáenz (2006), os nopalitos (brotos
jovens) da Opuntia fícus-indica e de outras espécies são utilizados como verdura,
principalmente no México. A fruta desta espécie é utilizada na produção de doces, sucos,
néctares, produtos desidratados, polpas concentradas, xaropes e licores. Tanto a O. fícus-
indica quanto a Nopalea cochenillifera são utilizadas como hospedeiras na criação da
cochonilha, inseto que dá origem ao corante conhecido como carmim, utilizado em larga
escala pela indústria cosmética e alimentícia.
O baixe índice pluviométrico na região do semi-árido brasileiro compromete a
produção de forragem utilizada na alimentação animal. Como fonte alternativa de alimento, a
palma forrageira oferece boa disponibilidade no período da seca, bom coeficiente de
27
digestibilidade da matéria seca e alta produtividade, o que a permite ser introduzida na
alimentação de bovinos, caprinos, ovinos e avestruzes (COSTA, 2006).
Entre outras finalidades para os cactos, destaca-se a ampla utilização na ornamentação
de casas e jardins, por inspirar beleza e mistério. Para o Feng Shui, são considerados
guardiões, por serem purificadores de ambientes. Os cactos também constituem as chamadas
cercas-vivas, conferindo segurança ao ambiente, através de seus espinhos afiados e
intimidantes. Contribuem ainda no controle da desertificação e da erosão.
Segundo Hollis & Scheinvar (1995) apud Andrade (2002), rituais de magia utilizando
um chá da raiz do peiote (Lophophora williamsii), uma espécie de cacto pequeno, são
realizados por indígenas mexicanos como meio para purificar corpo e alma, e promover a cura
de enfermidades. Os cactos ainda possuem ampla utilidade para a indústria farmacêutica, para
fins medicinais.
Alguns estudos também apontam a ação de um polímero natural extraído de cactos no
tratamento de água. Lenz et al. (2011) desenvolveram um polímero natural a partir do
Mandacaru (Cereus jamacaru), que possibilitou o aumento na eficiência da remoção de
turbidez da água bruta, comprovando que o polímero de cacto possui boa perspectiva de
aplicação no tratamento da água.
4.6 USO DO CACTO NA CONSTRUÇÃO CIVIL
4.6.1 Introdução
De acordo com Kanan (2008), com o intuito de conhecer aproximadamente a
composição das argamassas históricas, pode-se realizar análises que sirvam para orientar
novas formulações, a partir de amostras íntegras e representativas das argamassas antigas. A
Figura 5 retrata a coleta de amostras de reboco à base de cal com mucilagem de cactos para
exames laboratoriais no Instituto Getty de Conservação na Igreja de San Xavier Del Bac
(construção em adobe), Arizona, US.
28
Figura 5: Coleta de amostras de reboco à base de cal com mucilagem de cactos.
Fonte: Kanan (2008).
Segundo Cárdenas et al. (1998), no México a preparação de argamassa de cal pode
conter suco de cacto. Esta é uma prática milenar e é também usada para proteger e restaurar
prédios históricos, uma vez que o uso de cimento com estas finalidades possui efeitos
prejudiciais, devido à incompatibilidade com o adobe, além de restringir a transpiração e
aumentar o risco de danos causados pela umidade. A Figura 6 mostra o resultado de
intervenções com cimento, causando problemas de umidade e alteração estética.
Figura 6: Igreja São Sebastião, SC.
Fonte: Kanan, 2008.
29
Para Oliveira et al. (2005), é do conhecimento de especialistas em conservação o
emprego de variedades de cactos, entre elas a Opuntia fícus-indica, para consolidação de
monumentos de terra, ou seja, como consolidante de terra crua. Hoyle (1990) apud Oliveira et
al. (2005), afirma que a experimentação mais destacada nesse segmento foi efetivada nas
ruínas de Chan-Chan, no Peru (Figura 7).
Figura 7: Restauração das ruínas de Chan-Chan, Peru.
Fonte: dreamstime.com
A caiação é uma pintura que utiliza como aglutinante a cal, na qual tradicionalmente
eram utilizados aditivos. A mucilagem de cactos, em vários lugares da América Latina e
Estados Unidos, tem sido utilizada como aditivo em pinturas à base de cal para aplicação em
edifícios históricos (KANAN, 2008), como pode ser visto na Figura 8.
30
Figura 8: Igreja Matriz, Olhão, Portugal.
Fonte: http://domusmater.blogs.sapo.pt/2011/08/
Segundo Andrade (2002), a prática da pintura de casas com a mucilagem da palma
associada à cal (Figura 9) beneficia os moradores do município de Valente com redução de
custos e prevenção de doenças, pois, segundo a mesma, supõe-se que esta técnica previna que
insetos, como o Barbeiro, se instalem nas frestas das casas de taipa.
Figura 9: Pintura de casa com mucilagem de palma associada à cal, Valente, Bahia.
Fonte: Andrade (2002).
“Misturando sumo de cactos com outros materiais de construção, pode-se melhorar a
qualidade de paredes, pisos e tetos, tornando-os mais resistentes contra os estragos causados
pelas chuvas e a umidade.” (LENGEN, 2004, p. 172)
31
A mucilagem de cactos utilizada como aditivo para pastas e argamassas de gesso, cal
ou cimento melhora a resistência desses materiais, aumenta sua trabalhabilidade, além de ser
uma substância orgânica, natural e de baixo custo (MAGALHÃES, 2009).
4.6.2 Cactos como aditivo em pastas de gesso
Magalhães e Almeida (2009) realizaram estudo comparativo entre as mucilagens
extraídas do cacto Opuntia fícus-indica e do cacto Nopalea cochenillifera (espécie semelhante
à Opuntia, como mostra a Figura 10), ambos de mesma família e subfamília, na forma de pó e
de gel, produzindo placas de gesso com mucilagem nessas duas formas, com o objetivo de
esclarecer a dúvida quanto a melhor forma de adição e método de extração da mesma.
Figura 10: Nopalea cochenillifera.
Fonte: Magalhães (2009).
Na forma de pó, para ambas as espécies a mucilagem foi obtida mediante desidratação
em estufa das raquetes verdes cortadas em pedaços durante 36h, sendo também realizada de
maneira natural para o cacto Nopalea. Posteriormente a esse processo, os cactos foram
triturados, peneirados e reservados para utilização. Foram então denominados Opuntia Pó e
Nopalea Pó as mucilagens obtidas através da desidratação dos cactos em estufa, e Nopalea Pó
Natural, a mucilagem obtida pela desidratação natural do cacto Nopalea.
32
Na forma de gel, a mucilagem foi extraída mediante repouso por 2 dias de pedaços de
cactos em água natural em temperatura ambiente (25 ), e também do cozimento dos pedaços
de cactos por 30 min, sempre na proporção de 1:3 cacto:água. Após estes processos, a
mucilagem foi coada e reservada para posterior utilização. Denominaram Opuntia Água
Natural (OAN) e Nopalea Água Natural (NAN) as mucilagens extraídas em água natural, em
temperatura ambiente, e Opuntia Água Quente e Nopalea Água Quente, as mucilagens
extraídas pelo cozimento dos cactos. No entanto, decorridos os 2 dias de repouso dos cactos,
observaram que ainda havia grande quantidade de mucilagem nos pedaços de cacto Nopalea,
e por este motivo, após terem sido coados, colocaram novamente os pedaços de cacto em um
novo recipiente com água, respeitando a proporção cacto:água e mantiveram o repouso por
mais 4 dias. Estes cactos foram novamente coados, sendo denominados Nopalea Água
Natural Segunda Extração (NAN 2). Dessa forma, foram preparadas pastas de gesso com 50%
e com 100% de substituição da água do amassamento pela mucilagem em gel (água quente e
água natural), e com 0,35% e 1,0% de adição de cacto em pó em relação à massa do gesso.
Prepararam ainda pastas de gesso controle utilizando apenas água e pastas de gesso
com a adição de 1/3 da água de amassamento de impermeabilizante (Chapix Ar) e 2/3 de
água, e pastas de gesso com 0,5% de superplastificante (Glenium 51) em relação à massa de
gesso. Utilizaram gesso calcinado ou gesso estucador (CaSO4.
H2O). Os materiais foram
colocados em uma bandeja de mistura na seguinte ordem: água, impermeabilizante ou
superplastificante ou mucilagem de cacto (dependendo do caso), e por último, o gesso. Para
todas as pastas procuraram obter uma mistura homogênea e de fácil manipulação com as
quais foram moldados 3 corpos-de-prova.
Realizaram os ensaios de absorção 14 dias após a desmoldagem. Este ensaio também
foi realizado em corpos de prova retirados de uma placa de gesso acartonado Resistente à
Umidade. Para os ensaios de absorção de água, primeiro determinaram a massa inicial de cada
corpo de prova e em seguida, os submergiriam em um tanque com água durante 120 min.
Transcorrido esse tempo, retiraram os corpos de prova da água, removeram o excesso da água
com um pano úmido e determinaram a massa final. A porcentagem de absorção dos corpos de
prova foi determinada mediante o seguinte cálculo:
33
Onde:
= absorção de água (%);
= massa final do corpo de prova (g);
= massa inicial do corpo de prova (g).
Os ensaios de flexão estática foram realizados nos mesmos corpos de prova
submetidos aos ensaios de absorção, mas com 90 dias de moldagem, portanto, os Autores
deixam claro que a resistência obtida em cada corpo de prova pode não significar sua máxima
resistência. Realizaram este ensaio também para os corpos de prova retirados da placa de
gesso acartonado Resistente à Umidade. Os corpos de prova foram colocados sobre dois
apoios cilíndricos de 15 mm de diâmetro e 250 mm de comprimento, espaçados entre si em
250 mm. No meio do vão, uma carga progressiva foi aplicada por um rolo cilíndrico de igual
diâmetro dos apoios e 350 mm de comprimento, com velocidade de 250 ± 50 N/min. A
resistência à flexão foi então calculada a partir da seguinte equação:
Ff =
×
Onde:
Ff = Força de Flexão (MPa);
= Carga de ruptura (N);
= Espaçamento entre os apoios (mm);
= Base do corpo de prova (mm);
h = Altura do corpo de prova (mm).
Os resultados dos ensaios de absorção de água e de flexão estática dos corpos de prova
são apresentados na Tabela 3.
34
Tabela 3 – Média da absorção de água dos corpos de prova com 14 dias de moldagem e média
da resistência à flexão estática dos corpos de prova com 90 dias de moldagem.
Tipo Relação
(am/g)
Absorção
média (%)
Flexão média
(MPa)
Água Quente
OAQ 50 0,45 17,13 3,53
OAQ 100 0,45 17,14 2,00
NAQ 50 0,45 17,52 1,79
NAQ 100 0,45 16,66 1,99
Água Natural
OAN 50 0,40 14,33 4,62
OAN 100 0,40 13,77 4,46
NAN 50 0,40 14,02 4,49
NAN 100 0,40 13,14 3,70
NAN 2 50 0,40 15,21 4,69
NAN 2 100 0,40 14,66 4,31
Tipo Relação
(am/g)
Absorção média
(%)
Flexão média
(MPa)
Opuntia Pó OP 0,35 0,40 13,30 4,69
OP 1,0 0,40 12,10 2,75
Nopalea Pó
NP 0,35 0,40 13,50 3,66
NP 1,0 0,40 12,59 2,28
NPN 0,35 0,50 19,91 2,98
NPN 1,0 0,55 20,64 1,21
Controle
GC 0,60 27,64 2,37
GI 1/3 0,60 20,75 3,73
GP 0,50 23,38 3,66
Fonte: Magalhães e Almeida (2009).
Legenda:
am/g – Relação água e mucilagem/gesso.
OAQ - Opuntia em Água Quente. NAQ – Nopalea em Água Quente. OAN - Opuntia em
Água Natural. NAN - Nopalea em Água Natural. NAN 2 – Nopalea em Água Natural,
segunda extração. OP – Opuntia em Pó (estufa). NP – Nopalea em Pó (estufa). NPN –
Nopalea em Pó Natural.
50 – 50% de substituição da água de amassamento pela mucilagem. 100 – 100% de
substituição da água de amassamento pela mucilagem.
GC – Gesso Controle. GI 1/3 – Gesso com 1/3 de impermeabilizante. GP – Gesso com
superplastificante.
0,35 – 0,35% de pó de cacto em relação à massa de gesso. 1,0 – 1,0% de pó de cacto em
relação à massa de gesso.
35
A taxa de absorção média dos corpos de prova retirados das placas de gesso
acartonado Resistentes à Umidade era de 4,35%, e a resistência à flexão dos mesmos era de
2,21 MPa para a resistência transversal e 4,95 MPa para a resistência longitudinal.
Da análise dos resultados, os autores concluíram haver uma relação direta entre o
consumo de água e a taxa de absorção de água, e uma relação indireta entre esse consumo e a
resistência à flexão estática. Assim, verificaram que a adição de mucilagem de cacto permitiu
a redução do consumo de água nas pastas de gesso, implicando em menores taxas de absorção
de água e maiores resistências à flexão estática. O aumento da quantidade de mucilagem
adicionada resultou na diminuição da taxa de absorção de água e da resistência à flexão, mas
em menores quantidades, favoreceu o aumento dessa resistência. Concluíram que o tipo de
mucilagem e a quantidade adicionada nas pastas de gesso influenciam os resultados obtidos.
Desde a mistura dos materiais, notaram que a adição da mucilagem possibilitou a preparação
de uma pasta consistente, o que não ocorre geralmente nas pastas de gesso sem aditivo, que
necessitam de uma proporção maior de água para que, após alguns minutos, a pasta rala
adquira consistência adequada para a utilização. Como não verificaram diferenças
significativas nos resultados analisados das pastas de gesso com mucilagem dos cactos
Opuntia fícus-indica e Nopalea cochenillifera, concluíram que ambos possuem características
de aditivos.
4.6.3 Cactos como aditivo em argamassas de cimento portland
Chandra et al. (1998) investigaram o uso do extrato do cacto, da espécie Opuntia, em
argamassas de cimento Portland. O cacto utilizado era proveniente do México, onde é
conhecido por Nopal. No Brasil este mesmo cacto é conhecido por Palma. Para se obter o
extrato, a Palma sem espinhos cortada em pedaços finos foi misturada à água, na proporção
1:3 em massa e deixada em repouso por 2 dias, temperatura ambiente, em recipiente de
plástico com tampa. Após esse tempo, os pedaços de palma foram descartados e a substância
de caráter viscoso que sobrou foi utilizada nos experimentos. Essa solução, que denominaram
Cactus Extract Solution (CEX) foi liofilizada, com o objetivo de separar a água do gel e assim
obter apenas mucilagem liofilizada.
36
Fizeram prismas de argamassas de cimento Portland e areia nas dimensões
40x40x160mm, na proporção 1:3 em massa, e mantiveram constante a razão de água:cimento
de 0,50. As amostras foram curadas durante 5 dias em água, após a desmoldagem, e 22 dias
em uma sala de clima controlado, à 22°C e umidade do ar 50%. Confeccionaram três séries de
amostras denominadas R (amostras de referência sem extrato de cacto), C50 (amostras com
50% de extrato de cacto e 50% de água) e C100 (amostras com 100% de extrato de cacto).
Algumas amostras foram secas a 105°C e ao determinarem o teor de água das mesmas,
verificaram que o das amostras que continham CEX era maior, obedecendo a seguinte ordem:
C100 > C50 > R.
Os resultados que obtiveram para a consistência e resistência à compressão e à flexão
das amostras são apresentados na Tabela 4.
Tabela 4 – Resistência à flexão e à compressão das argamassas de cimento Portland e areia,
na proporção 1:3.
Tipo CEX
(%)
Consistência
(mm)
Resistência à flexão/compressão (MPa)
1 dia 7 dias 28 dias 90 dias
R 0 124 5,2/16,8 7,5/35,9 9,8/48,0 10,7/51,2
C50 50 128 4,2/15,7 6,8/26,0 10,1/48,5 11,5/54,3
C100 100 132 3,8/14,9 5,9/22,3 10,0/43,5 11,8/57,4
Fonte: Chandra et al. (1998).
Notaram que a trabalhabilidade da argamassa C100 mostrou-se melhor que a da
argamassa C50 e ainda melhor que a da argamassa de referência R. Chandra et al. (1998)
atribuíram esta melhoria pelo efeito proporcionado pelo polissacarídeo presente na Palma, que
reduz a fricção e aumenta a suavidade, assim como se dá o efeito do uso de óleo numa
máquina.
Pelo atraso visto no desenvolvimento da resistência em idade precoce, conclui-se que
os polissacarídeos atuam como retardadores. A resistência das argamassas aditivadas se
aproximou da resistência das argamassas de referência após 28 dias, sendo mais evidente nas
amostras C100, e mais tarde aumentou a ponto de ultrapassar. A adição de 100% CEX
introduziu hidrofobicidade, diminuindo o processo de secagem e consequentemente a
formação de fendas, o que implica no aumento da resistência, como visto na resistência de 90
dias para essas amostras.
37
Hernández-Zaragoza et al. (2008) estudaram o aperfeiçoamento das propriedades
físicas e mecânicas do concreto utilizando um aditivo natural, proveniente da Palma. Para
tanto, compararam os resultados obtidos para os ensaios de consistência, tempos de pega,
inicial e final, e de resistência das pastas padrão e aditivada com pó de cacto desidratado em
forno. As pastas estudadas, denominadas M1 e M2, foram produzidas a partir da combinação
de Cimento Portland Tipo 1 e água, ambas na proporção água/cimento de 0,40, mas somente
M2 teve a adição de 5% de Palma em pó para cada quilograma de cimento.
As Tabelas 5 e 6 mostram os resultados obtidos para o ensaio da Consistência Normal
para as duas pastas, M1 e M2, respectivamente.
Tabela 5 - Consistência da pasta M1.
Mistura Penetração da
haste (mm)
Média da
penetração da
haste (mm)
Desvio Padrão
(mm)
M1 (0% de cacto
em pó)
2
3 1,4142 2
3
5
Fonte: Hernández-Zaragoza et al. (2008).
Tabela 6 - Consistência da pasta M2.
Mistura Penetração da
haste (mm)
Média da
penetração da
haste (mm)
Desvio Padrão
(mm)
M2 (5% de cacto
em pó)
6
8 1,4142 8
9
9
Fonte: Hernández-Zaragoza et al. (2008).
Concluíram então que houve aumento da trabalhabilidade da pasta M2, que contém
cacto, pois na medida em que a Consistência Normal era adquirida, a mistura M2 se mostrava
mais fluida que a mistura M1.
Os resultados obtidos para os tempos de pega inicial e final das duas pastas foram
plotados em gráfico, como mostra a Figura 11. O tempo de pega inicial para a mistura M1
38
ocorreu 330 minutos após ser colocada no Aparelho de Vicat, e o tempo de pega final,
ocorreu a 390 minutos, enquanto para a mistura M2, o tempo de pega inicial ocorreu em 435
minutos, e o tempo de pega final, em 495 minutos. Os resultados apontam para um
retardamento nos tempos de pega inicial e final quando utilizado o aditivo de cacto.
Figura 11 - Comparação entre os tempos de pega inicial e final das argamassas M1 (0% de
cacto em pó) e M2 (5% de cacto em pó).
Fonte: Hernández-Zaragoza et al. (2008).
Os autores avaliaram ainda a resistência à compressão dessas pastas em idades
precoces de 3, 7 e 14 dias, verificando um aumento na resistência em todas as idades na pasta
contendo cacto (M2), como mostra a Figura 12.
39
Figura 12 - Resistência à compressão das misturas M1 (0% de cacto em pó) e M2 (5% de
cacto em pó).
Fonte: Hernández-Zaragoza et al. (2008).
Da análise dos resultados, puderam constatar que a resistência à compressão das
argamassas aditivadas foi melhorada em até 72%.
4.6.4 Cactos como aditivo em argamassas de cal
Oliveira et al. (2005) desenvolveram estudos sobre a utilização da mucilagem de cacto
como aditivo em argamassas de cal, buscando avaliar o efeito da aditivação a argamassas com
e sem a adição de arenoso (termo regional utilizado para nomear o solo com grandes
concentrações de areia, no qual o material argiloso preponderante é a caulinita). Para tanto,
utilizaram como matérias-primas cal CH-1, areia, arenoso e cacto do gênero Opuntia.
Os autores confeccionaram dezesseis lotes de corpos de prova cilíndricos (5x10 cm)
de argamassas aditivadas e não aditivadas, que foram desmoldados após sete dias e
submetidos a ensaios, depois de um período de cinco meses em carbonatação natural.
Realizaram a comparação entre os resultados dos ensaios para os corpos de prova de
argamassas aditivadas e os de argamassas padrão (sem aditivação).
As argamassas padrão foram preparadas sendo postos na argamassadeira os materiais
secos na seguinte ordem: metade da areia, cal e o restante da areia. Estes materiais foram
40
misturados por cerca de 30s em velocidade 1. A quantidade de água foi medida em proveta e
adicionada à mistura, batida por mais 30s na velocidade 1, adicionando-se mais água quando
não se obtinha a consistência adequada. Conseguida a consistência adequada, os corpos de
prova foram preenchidos e submetidos à vibração por 4s. Depois de a superfície ser
regularizada com ajuda de espátula, foram submetidos novamente à vibração por mais 4s. De
maneira semelhante foram moldados os corpos de prova com adição de arenoso, com a
diferença de ser acrescentado o arenoso logo após a primeira metade de areia. Os grupos eram
compostos de oito corpos de prova, geralmente.
Antes da preparação das argamassas aditivadas com cacto, preparou-se primeiro a
mucilagem. O cacto foi cortado em pequenos pedaços e triturado em liquidificador, na
potência mais baixa por 60s, com 50% da água reservada para a moldagem. Na primeira
preparação, obteu-se uma pasta altamente viscosa de coloração verde, a qual foi posta para
descansar por uma hora a fim de que se tornasse mais fluida. Após este tempo, a pasta foi
coada em um pano de algodão para a retirada do bagaço do cacto. O resultado dessa filtração
foi medido em proveta e incorporado aos materiais secos já na argamassadeira. A água foi
acrescentada logo em seguida até que se atingisse a consistência adequada. O processo de
moldagem dos corpos de prova foi idêntico ao utilizado para as argamassas padrão, rendendo
oito corpos de prova.
A segunda preparação foi realizada vinte dias após a primeira, e por este motivo,
acreditou-se que o resultado da trituração do cacto com água não se assemelhou a uma pasta
viscosa, e sim, a um suco. A coagem foi realizada sem que se aguardasse o descanso de uma
hora, e então foram moldados os corpos de prova da mesma forma que os anteriores. Como
observaram que a consistência não influía muito no resultado final, decidiram moldar o
restante do lote dos corpos de prova de cal e areia e aqueles com adição de “arenoso”
utilizando a mucilagem mais fluida. Horas após a moldagem, observaram na superfície dos
corpos de prova um líquido de coloração esverdeada. Manchas levemente esverdeadas
puderam ser observadas no topo dos corpos de prova sem adição de arenoso após a
desmoldagem.
Os corpos de prova foram denominados da seguinte maneira: padrão (argamassa de cal
e areia), padrão S (argamassa de cal, areia e arenoso), cacto (argamassa de cal e areia
aditivada com cacto) e cacto S (argamassa de cal, areia e arenoso aditivada com cacto). Após
41
terem sido desmoldados, foram conservados nos moldes por um período de 7 dias, sendo
então desmoldados definitivamente e mantidos em prateleiras.
Realizados ensaios de compressão axial (capacidade de resistência à compressão) e
compressão diametral (avalia a resistência à tração), obtiveram os seguintes resultados
expressos nas Figuras 13 e 14, respectivamente:
Figura 13 - Gráfico comparativo entre as médias de resistência à compressão.
Fonte: Oliveira et al. (2005).
Figura 14 - Gráfico comparativo entre as médias de resistência à tração.
Fonte: Oliveira et al. (2005).
42
A ruptura dos corpos de prova aditivados permitiu observarem que a coloração
diferenciada restringia-se apenas a superfície externa, ou seja, em seu interior os corpos de
prova tinham o mesmo aspecto daqueles moldados com argamassa padrão.
Da análise dos resultados, Oliveira et al. (2005) concluíram que a argamassa “cacto”,
comparada com a argamassa “padrão”, teve um aumento de 38% na resistência à compressão
e de 20% na resistência à tração, enquanto que para a argamassa “cacto S”, comparada com a
argamassa “padrão S”, os resultados obtidos para os ensaios nessa mesma ordem foram de
aumento de 25% e 18%, respectivamente. O aditivo natural apresentou ação plastificante,
propriedade esta que provavelmente influenciou as demais, uma vez que uma menor adição
de água acarreta numa menor porosidade, normalmente, e isso influencia positivamente na
resistência mecânica. A adição de arenoso não modificou a ação do aditivo, visto que os
resultados para as argamassas com essa adição seguiram a mesma tendência que os daqueles
sem a mesma.
Oliveira et al. (2005) realizaram ainda ensaios de absorção de água por capilaridade
nos corpos de provas obtendo os resultados indicados na Tabela 7. O coeficiente de absorção
capilar (CA) é diretamente proporcional à velocidade de ascensão de água, enquanto o valor
assintótico da quantidade de água absorvida por unidade de superfície (M*) indica o ponto de
saturação do corpo de prova.
Tabela 7 - Coeficiente de absorção (CA) e valor assintótico da quantidade de água absorvida
por unidade de superfície (M*) para cada tipo de argamassa.
Argamassa CA M*
Padrão 0,051 2,947
Padrão S 0,049 2,842
Cacto 0,034 2,434
Cacto S 0,031 2,473
Fonte: Oliveira et al. (2005).
Do ensaio da absorção de água por capilaridade, observaram que os corpos de prova
aditivados apresentaram uma menor velocidade de ascensão e um menor grau de saturação.
43
5 CONCLUSÃO
O Brasil, como país em desenvolvimento, necessita investir em novas tecnologias,
recorrendo muitas vezes à importação das mesmas. No entanto, nem sempre as tecnologias
aprovadas em outros países são condizentes com as nossas características. Deve-se levar em
consideração a realidade cultural e socioeconômica dos usuários das mesmas, bem como a
disponibilidade local dos materiais envolvidos.
Para o setor da construção civil os avanços da tecnologia são de grande importância e
muito bem-vindos, mas também se faz necessário recorrer ao conhecimento do passado e
aproveitar práticas comprovadas pelo uso e senso comum da população, como fontes
alternativas mais viáveis. Com essa motivação, realizou-se revisão de literatura acerca do uso
de um aditivo natural presente no cacto, por ser uma planta encontrada em abundância na
região do semi-árido nordestino deste país.
Constatou-se que diversos autores realizaram estudos acerca da utilização da
mucilagem de cacto em pastas e argamassas de gesso, cimento ou cal. A seguir é feita uma
síntese do que foi observado em suas experimentações:
Magalhães e Almeida (2009) comprovaram que a adição da mucilagem de cactos
permitiu a redução no consumo de água e possibilitou menores taxas de absorção de água e
maiores resistências à flexão em pastas de gesso. Verificaram ainda que o tipo e a quantidade
de mucilagem adicionada influenciaram os resultados obtidos.
Chandra et al. (1998) verificaram melhorias na trabalhabilidade e resistências à flexão
e à compressão em argamassas de cimento Portland aditivadas com a mucilagem de cacto
liofilizada. A mucilagem de cacto teve efeito retardador.
Hernández-Zaragoza et al. (2008) ao compararem as consistências, os tempos de pega
inicial e final e as resistências à compressão de pastas de cimento Portland padrão e pastas
aditivadas, verificaram aumento na trabalhabilidade, retardamento nos tempos de pega e
aumento da resistência em todas as idades para as pastas contendo cacto em pó.
Oliveira et al. (2005) verificaram aumento nas resistências à compressão axial e
compressão diametral para argamassas aditivadas com o aditivo natural, apontando para a
ação plastificante do mesmo. As argamassas aditivadas apresentaram ainda uma menor
velocidade de ascensão e um menor grau de saturação.
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Portanto, pode-se verificar que a mucilagem de cacto atua em pastas e argamassas
desempenhando papel de aditivo, uma vez que promove melhorias em algumas de suas
propriedades. Conclui-se que o uso da mucilagem de cacto como aditivo contribui para o
desenvolvimento de materiais de construção alternativos, apresentando-se como alternativa
viável na região do semi-árido brasileiro, por ser de origem orgânica e estar disponível em
abundância localmente, diminuindo assim os custos.
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