UNIVERSIDADE FEDERAL
DE OURO PRETO
Instituto de Ciências Exatas e
Biológicas
Dissertação
O Uso de Sistemas Aquosos Bifásicos
Formados por Polímero PEG e Sal para a
Remoção de um Surfactante Aniônico de
Efluentes
Gabriella Frade Murari
Programa de Pós-Graduação em Química
PPGQ
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
Universidade Federal de Ouro Preto Instituto de Ciências Exatas e Biológicas Programa de Pós-Graduação em Química
O USO DE SISTEMAS AQUOSOS BIFÁSICOS FORMADOS POR POLÍMERO PEG E
SAL PARA A REMOÇÃO DE UM SURFACTANTE ANIÔNICO DE EFLUENTES
Autora: Gabriella Frade Murari
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Aparecida Barbosa Mageste
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós- Graduação Química da Universidade
Federal de Ouro Preto, como parte
dos requisitos para obtenção do título de
Mestre em Química.
Área de concentração:
Físico Química
Ouro Preto/MG
Março de 2016
Catalogação: www.sisbin.ufop.br
M972u Murari, Gabriella Frade. O uso de sistemas aquosos bifásicos formados por polímero PEG e sal pararemoção de um surfactante aniônico de efluentes [manuscrito] / Gabriella FradeMurari. - 2016. 53f.: il.: color; grafs; tabs.
Orientadora: Profa. Dra. Aparecida Barbosa Mageste.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto deCiências Exatas e Biológicas. Departamento de Química. Programa de PósGraduação em Química. Área de Concentração: Físico-Química.
1. Polimeros soluveis em agua. 2. Agentes tensoativos. I. Mageste,Aparecida Barbosa. II. Universidade Federal de Ouro Preto. III. Titulo.
CDU: 543.395
AGRADECIMENTOS
A Deus, fonte de todo o conhecimento e por ter sido luz nos momentos de dificuldade e
desânimo.
À Universidade Federal de Ouro Preto, por possibilitar a realização do trabalho.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela
concessão da bolsa de mestrado.
À minha mãe por tudo que proporcionou, pela ajuda incondicional, pelo incentivo,
amor, carinho, apoio e por sempre abrir mão dos seus sonhos para que eu pudesse realizar os
meus. Foi por me orgulhar e querer seguir seus passos que cheguei até aqui.
À toda minha família, pelas orações, incentivo e ajuda.
Ao Oscar, por ter sido minha família nesses dois anos, por me ajudar a superar a ausência
de casa, pelo carinho, cuidados, momentos, amizade e amor. Serei eternamente grata.
À minha “rimazinha” por me alegrar, me apoiar e me ajudar.
À minha orientadora Aparecida Mageste, pela oportunidade, orientação e por
principalmente, confiar em mim e em meu trabalho.
Aos meus colegas de laboratório, em especial a Jussara Penido, pelo muito que me
ensinou e me ajudou, pela amizade e por tornar as longas horas no laboratório em momentos
alegres.
Àqueles que acompanharam minha caminhada, torceram por mim e se alegraram por
cada vitória alcançada.
A todos que de forma direta ou indireta contribuíram para a realização deste trabalho.
Obrigada, obrigada, obrigada!
ii
RESUMO
Surfactantes, tal Alquilbenzeno sulfonato linear (LAS) são compostos anfifílicos amplamente
utilizados na indústria. No entando, a presença de LAS no meio ambiente é cada vez mais
comum, causando impacto negativo na flora e fauna. Com a necessidade de utilizar tecnologias
ecologicamente corretas para remoção de poluentes, este trabalho avalia o uso de sistemas
aquosos bifásicos (SABs) compostos por polímero PEG e sais sulfato na remoção de LAS de
matrizes aquosas. O SAB além de ser ambientalmente seguro ainda é economicamente viável,
uma vez que seus componentes são atóxicos, não inflamáveis, podem ser reciclados e
apresentam baixo custo, além disso, o componente principal do sistema é a água. Foram
determinados o coeficiente de partição de LAS (KLAS) e a eficiência de extração de LAS
(%ELAS) nos SABs estudados. O efeito do comprimento da linha de amarração (CLA), da massa
molar do polímero e do cátion formador do sal sobre o comportamento de partição de LAS
foram estudados. Todos os valores de KLAS foram maiores que a unidade e os valores de %ELAS
obtidos foram acima de 99%, indicando que o LAS se concentrou na fase superior dos SABs.
O sistema composto por PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O apresentou o maior valor de KLAS
(1083,34) e de %ELAS (99,9%). Este sistema foi usado para estudos de pré-concentração de
LAS na fase superior e mostrou que é possível remover LAS com uma eficiência acima de 99%
e gerar menores volumes de resíduos com uma alta concentração de surfactante. Foram
realizados experimentos na presença de um efluente real em experimentos de batelada e em
escala de bancada. Os experimentos em escala de bancada resultaram em valores de %ELAS
maiores que 98% e o KLAS obtido nos experimentos em batelada foi 9,52 (%ELAS = 78,17%).
Esses valores indicam que há um potencial aplicação do SAB na remoção de LAS de efluentes
industriais.
Palavras-chave: Alquilbenzeno sulfonato linear; Partição; Sistemas aquosos bifásicos;
iii
ABSTRACT
Surfactants, e.g Linear alkylbenzene sulfonate (LAS) are amphiphilic compounds widely used
in several industries.However, the presence of LAS in the environment is increasingly common,
negatively impacting flora and fauna. Presently, the use of ecofriendly technologies for the
removal of pollutants is of great importance. For this reason, this study evaluated the use of an
aqueous two-phase system (ATPS) formed by polymer PEG and sulfate salts for the removal
of LAS from aqueous matrices. ATPS can be considered environmentally safe and
economically viable, because its components are non-toxic, non-flammable, recyclable, and
low cost. Moreover, the main component of the system is water. The partition coefficient (KLAS)
and extraction efficiency of LAS (%ELAS) in polymer-salt aqueous two phase system (ATPS)
has been determined. The tie-line length (TLL) effect, molar mass of polymer and cation
forming-salt effects on the partition behavior of LAS was studied. All values for the KLAS were
greater than the unit, and the %ELAS values obtained were higher than 99%, indicating that LAS
was concentrated on the top phase of the ATPS. The system composed of PEG 1500 +
(NH4)2SO4 + H2O had the highest KLAS (1083.34) and %ELAS (99.9%). This system was used
for pre-concentration studies and show that is possible to remove LAS with efficiency higher
than 99% and generate smaller amounts of waste with a high surfactant concentration.
Experiments were carried out in the presence of a real effluent in laboratory scale, and batch
experiments in bench scale. The experiments in laboratory scale resulted in %ELAS values
greater than 98% and the KLAS obtained from batch experiments was 9.52 (%ELAS = 78.17%).
These values indicate the potential application of ATPS for the removal of LAS from industrial
effluents.
Keywords: Linear alkylbenzene sulfonate; Partition; Aqueous two-phase system
iv
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
%ELAS – Eficiência de extração de LAS
ATPS – Aqueous two phase system
CFI – Composição da fase inferior
CFS – Composição da fase superior
CG – Composição global
CLA – Comprimento da linha de amarração
CMC – Concentração micelar crítica
FI – Fase inferior
FS – Fase superior
KLAS – Coeficiente de partição de LAS
LAB – Alquilbenzeno linear
LAS – Alquilbenzeno sulfonato linear
PEG – Polietileno glicol (PEG)
POA – Processos oxidativos avançados
SAB – Sistema aquoso bifásico
v
LISTA DE FIGURAS
Capítulo 1: Revisão de Literatura
Figura 1 - Representação de uma molécula de surfactante. ....................................................... 4
Figura 2 - Estrutura molecular do Alquilbenzeno sulfonato linear (LAS) ................................. 9
Figura 3 - Composições das fases e do sistema global para um ponto de mistura do sistema
aquoso bifásico composto por polímero polietileno glicol (400 g mol-1), sal sulfato
de amônio e água à 10°C). (102). ........................................................................... 16
Figura 4 - Diagrama de fases em coordenadas retangulares de um SAB constituído por polímero
polietileno glicol, um sal inorgânico e água. .......................................................... 17
Figura 1 - Estrutura molecular do alquilbenzeno sulfonato linear (LAS) comercial ............... 36
Figura 2 - Efeito do CLA sobre o comportamento de partição de LAS a 25° C. SAB: (■) PEG
1500 + (NH4)2SO4 + H2O; (▲) PEG 1500 + Li2SO4 + H2O; (●) PEG 1500 + Na2SO4
+ H2O; (►) PEG 1500 + MgSO4 + H2O ................................................................ 41
Figura 3 - Efeito da massa molar do polímero sobre o comportamento de partição de LAS a
25°C. SAB: (□) PEG 400 + (NH4)2SO4 + H2O; (■) PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O;
(○) PEG 6000 + (NH4)2SO4 + H2O; (∆) PEG 10.000 + (NH4)2SO4 + H2O ........... 44
Figura 4 - Valores de KLAS em estudos de pré-concentração de LAS na fase superior a 25°C.
SAB: (■) PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O .............................................................. 45
Figura 5 - Comportamento de partição de LAS utilizando um efluente real em experimentos
realizados em escala de bancada a 25°C. SAB: (■) PEG 1500 + (NH4)2SO4 +
efluente ................................................................................................................... 46
vi
LISTA DE TABELAS
Capítulo 1: Revisão de Literatura
Tabela 1. Propriedades físico-químicas do alquilbenzeno sulfonato linear ............................... 9
Tabela 1 - Diferentes métodos para remoção de LAS de efluentes com suas respectivas
eficiências de remoção. ........................................................................................... 47
vii
Sumário
RESUMO .................................................................................................................................. ii
ABSTRACT ............................................................................................................................. iii
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .............................................................................. iv
LISTA DE FIGURAS ............................................................................................................... v
LISTA DE TABELAS ............................................................................................................. vi
Sumário .................................................................................................................................... vii
Capítulo 1: Revisão da literatura ............................................................................................... 1
1. Justificativa ............................................................................................................................ 1
2. Surfactantes ........................................................................................................................... 4
2.1 Surfactantes e o meio ambiente ............................................................................ 5
2.2. Surfactantes catiônicos ......................................................................................... 7
2.3.Surfactantes anfotéricos ........................................................................................ 7
2.4. Surfactantes não-iônicos ...................................................................................... 8
2.5. Surfactantes aniônicos .......................................................................................... 8
2.6 Alquilbenzeno sulfonato linear ............................................................................. 9
2.6.1 Efeitos ambientais e toxicológicos ............................................................... 10
2.7.Métodos de remoção de LAS de efluentes ...................................................... 11
2.7.1. Tratamentos biológicos ............................................................................... 11
2.7.2. Adsorção ...................................................................................................... 12
2.7.3.Processos oxidativos avançados ................................................................... 13
2.7.4. Tratamentos eletroquímicos ........................................................................ 14
2.7.5. Uso de mebranas ......................................................................................... 15
3. Sistemas aquosos bifásicos .................................................................................................. 16
3.1. Princípios e propriedades do sistema aquoso bifásico ....................................... 16
3.2 Histórico e aplicações ......................................................................................... 19
4. Objetivos .............................................................................................................................. 22
4.1. Objetivo geral ..................................................................................................... 22
4.2. Objetivos específicos ......................................................................................... 22
viii
Referências .............................................................................................................................. 23
Capítulo 2: O uso de sistemas aquosos bifásicos formados por polímero PEG e sal para remoção
de um surfactante aniônico de efluentes. ................................................................................. 33
Resumo .................................................................................................................................... 33
Abstract .................................................................................................................................... 34
Highlights ................................................................................................................................ 35
1. Introdução ............................................................................................................................ 36
2.1 Materiais .............................................................................................................. 38
2.2 Experimentos de partição .................................................................................... 38
2.2.1 Preparação dos sistemas aquosos bifásicos estoque ..................................... 38
2.2.2 Estudos de partição ....................................................................................... 39
2.2.3 Estudos de pré-concentração de LAS ........................................................... 39
2.2.4 Estudos de partição utilizando um efluente real ........................................... 39
2.5 Eficiência de extração de LAS (%ELAS) ............................................................. 40
3.1 Efeito do comprimento da linha de amarração ................................................... 40
3.2 Efeito do cátion formador do sal ......................................................................... 42
3.3 Efeito da massa molar do polímero ..................................................................... 43
3.4 Estudos de pré-concentração de LAS ................................................................. 44
3.5 Estudos de partição usando um efluente real ...................................................... 45
4 Conclusão ............................................................................................................................. 48
Referências .............................................................................................................................. 49
1
Capítulo 1: Revisão da literatura
1. Justificativa
O descarte maciço de efluentes industriais não tratados e esgotos domésticos em corpos
d’água é uma grande fonte de poluição ambiental (1). Além de comprometerem a qualidade da
água, substâncias tóxicas provenientes desses efluentes geram riscos à saúde humana e
perturbam os ecossistemas (2). Com isso, as regulamentações ambientais têm se tornado cada
vez mais exigentes e a busca por tecnologias sustentáveis para a remoção de contaminantes
tóxicos de ambientes aquáticos tem crescido em nível mundial (3).
Um dos contaminantes muito comuns em ambientes aquáticos são os surfactantes. Os
surfactantes compreendem um grupo de substâncias que, por suas propriedades, tais como, alto
poder de detergência e capacidade em alterar as propriedades interfaciais e superficiais de
líquidos, são amplamente utilizados na indústria. No ano de 2013, foram consumidos somente
na Europa Ocidental cerca de 2,98 milhões de toneladas de surfactantes (4). Devido ao
frequente e excessivo uso, sua presença em efluentes e consequentemente em corpos d’água é
inevitável (5).
Dos surfactantes comerciais o mais utilizado é o alquilbenzeno sulfonato linear (LAS)
(6). O LAS é um surfactante aniônico empregado principalmente na formulação de detergentes
industriais e domésticos. Com o intenso uso, a presença de LAS em grandes quantidades em
ambientes aquáticos é comum, e isso gera um grave problema ambiental. Por isso, em 1991 ele
foi classificado pela Associação Holandesa de Sabão e o Ministério do Meio Ambiente
Holandês como um dos principais compostos prejudiciais em ambientes aquáticos (7).
Apesar de apresentar biodegradabilidade, a presença de LAS em ambientes hídricos e
terrestres representa um problema, pois esse tensoativo pode aumentar a concentração de
compostos xenobióticos no ambiente, diminuir a quantidade de oxigênio dissolvido e ainda
causar espuma nos corpos d’água que diminuirá a permeabilidade da luz, afetando a atividade
fotossintética (8).
A remoção de LAS de águas residuais é um desafio, pois, muitas vezes, os efluentes
contêm vários tipos de surfactantes além de outras substâncias e a escolha de um único método
é muitas vezes ineficiente (9). Dos métodos mais utilizados, pode-se citar adsorção (10, 11),
degradação biológica (12, 13), eletrocoagulação/eletroflotação (14), e processos oxidativos
avançados (POA) (15, 16). No entanto, tais métodos apresentam algumas desvantagens. Nos
tratamentos realizados por adsorção, há a geração de uma fase sólida rica em surfactante,
2
tratamentos biológicos são afetados pela complexidade do efluente, algumas técnicas resultam
na formação de subprodutos tóxicos, como no caso dos POA. Além disso, outras, como
eletrocoagulação/eletroflotação, apresentam alto custo de implantação e operação, impedindo
que empresas de pequeno porte possam utilizá-las.
Tendo em vista a crescente demanda de LAS e os atuais desafios, faz-se necessário o
desenvolvimento de tecnologias sustentáveis e que sejam eficientes na remoção desse composto
de ambientes aquáticos. Uma alternativa é o uso de sistemas aquosos bifásicos (SABs). O SAB
é um sistema ternário que sob determinadas condições termodinâmicas de temperatura, pressão
e composição, apresenta duas fases em equilíbrio termodinâmico (17). Estas fases podem ser
formadas pela mistura de soluções aquosas de dois polímeros quimicamente distintos, um
polímero e um eletrólito ou dois eletrólitos (18).
O SAB apresenta diversas vantagens como baixo custo, possibilidade de extensão para
a escala industrial e reciclagem dos seus componentes, pode apresentar rápida separação de
fases e ser ambientalmente seguro. Além disso, a água é seu componente majoritário(19). O
SAB dispensa o uso de solventes tóxicos, ao contrário das técnicas de extração líquido-líquido
convencionais. Devido a transferência do soluto para uma das fases do SAB, esses sistemas tem
sido usados para a extração/remoção de diversos solutos tais como corantes (20), íons metálicos
(21), proteínas (22), DNA (23), nanopartículas (24), antibióticos (25), dentre outros.
Segundo nosso conhecimento, não há relatos na literatura de trabalhos que utilizem o
SAB para extrair o LAS de efluentes. Poucos trabalhos estudam a partição/extração de
surfactantes em SAB (26-28). Foi estudada a partição dos surfactantes Cetylpyridinium
chloride (CPC), nonidet P-40, dodecylbenzenesulfonic acid (DBSA) e alguns biossurfactantes
em SABs compostos pelos polímeros PEG e dextrano, na presença e ausência de tampão de
fosfato (26). Nesse estudo foi observada uma forte influência da carga sobre o comportamento
e partição desses surfactantes, uma vez que, na presença do tampão, o surfactante catiônico
CPC particionou-se preferencialmente para a fase inferior e DBSA (aniônico), para a fase
superior. Também foram relatados experimentos de partição dos surfactantes Triton X-100 e/ou
octyl glucoside, em SAB formado por PEG-dextrano (27) e (28), com o objetivo de separar e
isolar proteínas de clorofila de membranas de cloroplasto.
Além de existirem poucos dados referentes à partição de surfactantes em SAB, nenhum
trabalho foi realizado com o objetivo de extrair LAS de um efluente real. A possibilidade de
extensão do SAB para a escala industrial e o baixo custo, são vantagens que permitem sua
instalação e operação em indústrias. Portanto, é importante estudar e analisar as interações
3
existentes entre as moléculas de LAS e os componentes do SAB e inferir sobre a capacidade
desse sistema em remover esse composto.
4
2. Surfactantes
Os surfactantes são compostos de grande relevância por terem os mais diversos usos e
aplicações. A presença de alguns pigmentos coloidais em pinturas rupestres nas cavernas
Lascaux (França) e em escrituras de faraós egípcios são indícios de que o uso dos surfactantes
decorre desde o início das civilizações humanas (29) . Atualmente, são utilizados na indústria
têxtil, farmacêutica, na formulação de pesticidas, tintas, polímeros, detergentes, formulações
agrícolas, produtos de cuidado pessoal, em mineração, na recuperação de petróleo, agentes
amaciantes e emulsificadores dentre outros (6). Estima-se que em 2018 o mercado mundial de
surfactantes gere um faturamento de mais de US$41 bilhões (30).
Surfactantes, também conhecidos como agentes tensoativos, são compostos que
possuem uma parte liofílica (grande afinidade com a fase dispersante), e uma parte liofóbica
(pouca afinidade com a fase dispersante) (30). Quando a fase dispersante é água ou uma solução
aquosa, pode-se dizer que os surfactantes possuem uma porção hidrofílica e outra hidrofóbica.
Por isso, os surfactantes são considerados compostos anfifílicos.
O termo anfifílico foi empregado por Hartley para designar moléculas que contém
ambos os grupos liofílicos e liofóbicos em uma mesma molécula (31). Em um surfactante, os
grupos liofílicos são geralmente formados por um grupo iônico e o grupo liofóbico é uma longa
cadeia de hidrocarbonetos (32). A estrutura de um surfactante é apresentada na Figura 1.
Figura 1 - Representação de uma molécula de surfactante.
A palavra surfactante é uma abreviatura da expressão em inglês “surface active agent”
que significa literalmente ativo em uma superfície. Essa expressão significa que surfactantes
são caracterizados pela sua tendência de adsorção em superfícies e interfaces. Uma interface é
uma fronteira entre duas fases imiscíveis, enquanto superfície é a denominação usada para
quando uma das fases é gasosa (geralmente o ar) (33). Esta atividade na interface é caracterizada
pela capacidade do surfactante de diminuir a tensão superficial ou interfacial. A capacidade
dos surfactantes de adsorver na interface, permite a dispersão de dois líquidos não miscíveis.
5
Em uma solução aquosa, a redução da tensão superficial ocorre pois, com a presença de
grupos hidrofílicos e hidrofóbicos, moléculas de surfactante, em baixas concentrações, se
concentram preferencialmente na interface, no qual a parte hidrofílica fica orientada para a
solução e a parte hidrofóbica se orienta para a fase gasosa (33). Assim sendo, quando moléculas
de surfactante, adsorvem na interface, ocorre uma substituição de algumas moléculas de água
presentes na interface pelos grupos hidrofóbicos do surfactante. As forças intermoleculares de
atração entre moléculas de água e o grupo hidrofóbico do surfactante são menores quando
comparadas as forças atrativas entre duas moléculas de água. Por isso, reduz-se a tensão
superficial.
O efeito hidrofóbico é o principal fator que coordena a organização das moléculas de
surfactante em água. Na forma livre, as moléculas de surfactantes são denominadas
monômeros, que podem se auto agregar e formar micelas. Esse processo é chamado de
micelização (29), sendo negativa a variação da energia livre do sistema. Uma diminuição
entrópica seria esperada devido ao processo de agregação dos monômeros. No entanto, a
variação entálpica é comparativamente pequena ou até positiva. Então, o processo de agregação
é associado a um aumento considerável na entropia, que ocorre devido a liberação de moléculas
de água após a desidratação das cadeias hidrofóbicas. Um composto hidrofóbico é insoluvel
em um solvente aquoso, e a dissolução desse composto em água acarreta na diminuição da
entropia e queda na estabilidade do sistema (29).
Micelas são formadas a partir de uma determinada concentração que é típica de cada
surfactante, chamada concentração micelar crítica (CMC), devido à saturação da interface
ocasionada pela presença de moléculas de tensoativo (34). O processo de micelização é um
meio de minimizar as interações desfavoráveis que ocorrem entre a parte hidrofóbica do
surfactante e o solvente polar, e aumentar o contato entre as partes hidrofílicas com a água, o
que reduz a energia livre do sistema e é um mecanismo alternativo à adsorção na interface (30).
Resumidamente, a micelização promove a eliminação das interações desfavoráveis entre grupos
hidrofóbicos do surfactante e o solvente aquoso, levando a redução da energia livre do sistema
em um processo entropicamente dirigido (29). A possibilidade de formação de micelas confere
aos surfactantes propriedades de detergência e solubilização (35).
2.1 Surfactantes e o meio ambiente
Em consequência do elevado consumo mundial, os surfactantes têm se tornado um dos
maiores contaminantes ambientais (36). Efluentes industriais que contém altas cargas desses
6
compostos são diariamente despejados em estações de tratamento ou diretamente em águas
superficiais (37).
Nas estações de tratamento, o surfactante pode passar por uma remoção inicial feita pela
ação de microorganismos de forma aeróbica ou anaeróbica. Entretanto, concentrações de
surfactante de 100-500 mg.kg-1 de peso seco foram encontradas em lodos provenientes de
tratamentos aeróbicos e 5000-15.000 mg.kg-1de peso seco em digestores anaeróbicos. O uso
desse lodo na agricultura é relacionado como a principal fonte de contaminação de ambientes
terrestres por surfactantes (38).
Os agentes tensoativos são tóxicos para organismos aquáticos como peixes, algas e
algumas bactérias (35). Além de aumentar a concentração de poluentes orgânicos na água (39).
Em 1989, um estudo mostrou que a solubilidade de DDT e triclorobenzeno na água foi
aumentada na presença de surfactantes em concentrações superiores a CMC (40). Em 2005
Ying et.al. (41) mostrou que a solubilidade em água de compostos utilizados em herbicidas, por
exemplo triazinas, também era aumentada pela presença de surfactantes, porém em
concentrações muito superiores a CMC. No entanto, observou também que apenas uma pequena
porcentagem de agentes tensoativos na água era necessária para lixiviar triazinas em solos
estáveis.
Outro problema envolvendo a presença de surfactantes no ambiente é relacionado à sua
degradação. Produtos da degradação de surfactantes polietoxilados, como é o caso do nonilfenol
e octilfenol, podem atuar como desreguladores endócrinos (42). Além disso, esses compostos
apresentam capacidade de bioacumulação em organismos aquáticos (6). Ao mesmo tempo,
alguns surfactantes geram espumas nos corpos d’água, o que pode reduzir a entrada de luz,
sendo prejudiciais a fauna e flora aquática e também causam dermatites em seres humanos (43).
Devido aos efeitos negativos no meio ambiente, cresce o número de pesquisas para
encontrar métodos eficientes que visam remover surfactantes de efluentes antes de os lançarem
nos recursos hídricos (5). A adsorção é um processo bastante investigado. Adsorventes como
fibras de Luffa (43), carvão ativado (44), sílica gel (45), quartzo (46), celulose (47), dentre
outros são utilizados. Uma desvantagem evidente desse tipo de tratamento é a geração de uma
fase sólida rica em surfactantes que condiciona a necessidade de um tratamento suplementar
(48).
Tecnologias envolvendo processos oxidativos avançados (POA), como por exemplo,
fotocatálise por UV/TiO 2 também têm sido estudadas (49). Apesar de se mostrarem eficientes,
esses processos tem um alto custo relativo para sua operação e implantação em empresas de
7
pequeno porte. Além disso, a oxidação de alguns surfactantes pode gerar subprodutos tóxicos
(50).
Tratamentos biológicos são apontados como os mais econômicos métodos de remoção
de agentes tensoativos de efluentes. Porém, muitos surfactantes não são biodegradáveis ou são
de biodegradação lenta, o que torna o processo, muitas vezes, ineficaz (48). O tratamento de
efluentes contendo surfactantes é um processo complexo que é afetado tanto pela natureza do
efluente, como pelo tipo surfactante presente nele.
O que determina o tipo do surfactante é a carga da parte hidrofílica. Através dela, os
surfactantes são classificados em quatro grupos, sendo aniônicos, catiônicos, não iônicos e
anfotéricos (6). Cada grupo possui propriedades específicas que podem definir suas aplicações
(35).
2.2. Surfactantes catiônicos
Dos surfactantes catiônicos, são muito utilizados os compostos de amônio quaternário
(QUAC). QUACs são moléculas que possuem um hidrocarboneto de cadeia longa ligado a um
átomo de azoto que possui carga positiva. Suas principais aplicações envolvem a indústria
farmacêutica e de tecidos, sendo usados como amaciantes e ainda são utilizados em cosméticos,
agentes desinfetantes, dentre outros (37). Esses surfactantes também se destacam por suas
propriedades bactericidas (32) .
Recentemente, uma nova classe de surfactantes conhecidos como gemini, como por
exemplo o surfactante 12-3-12,2Br-, tem se destacado no ramo da química supramolecular e de
coloides. Surfactantes gemini compreende um grupo de surfactantes catiônicos que possuem
longas cadeias hidrofóbicas ligadas a átomos de hidrogênio quaternário por meio de algum
espaçador. Em comparação a surfactantes comuns, essa nova classe apresenta CMC
consideravelmente menor além de apresentarem maior eficácia na diminuição da tensão
superficial da água. Como os surfactantes catiônicos comuns, surfactantes gemini apresentam
boa atividade fungicida e bactericida, porém são superiores em suas capacidades de dispersão,
estabilização, emulsionantes e de formação de espuma (51) .
2.3.Surfactantes anfotéricos
Os surfactantes anfotéricos apresentam a capacidade de mudar de catiônicos para
aniônicos, dependendo do pH (52). Dentro da classe de surfactantes anfotéricos estão os
8
tensoativos fluorados que possuem propriedades físico-químicas importantes como capacidade
molhante, alta estabilidade em ambientes agressivos, capacidade de remoção de manchas,
dentre outras. Estes compostos são utilizados como aditivos em tintas e revestimentos, agentes
molhantes, na fabricação de espumas aquosas de extintores de incêndio, produtos de limpeza
para superfícies duras e emulsificação (53).
O uso de surfactantes anfotéricos em uma mistura com outros tipos de surfactantes vem
sendo recentemente estudado. Diversos trabalhos na literatura têm descrito as propriedades,
aplicações e o comportamento dessas misturas (54-56). Algumas dessas misturas têm a
vantagem de formar micelas mistas mais eficazes em soluções aquosas, levando a uma CMC
menor. Redução de custos e de impactos ambientais são outras vantagens citadas (57).
2.4. Surfactantes não-iônicos
Surfactantes não-iônicos são tensoativos que não apresentam carga em sua estrutura,
por isso apresentam um equilíbrio entre as porções hidrofílicas e hidrofóbicas de sua molécula.
Quando presentes em solução aquosa, esses surfactantes não sofrem ionização. A solubilidade
dessa classe de surfactantes é definida pela parte hidrofílica (35). Geralmente a parte
hidrofóbica é constituída de uma cadeia alquilada ou ácidos graxos e a parte hidrofílica formada
por cadeias de óxido de etileno (58).
Um tipo de surfactante não-iônico muito comum são os alquifenóis etoxilados, porém
sua biodegradação a compostos tóxicos como o nonilfenol e octilfenol tem gerado preocupação
da comunidade científica (6). Essa classe de surfactantes é empregada em produtos de limpeza,
aditivos, em formulações de pesticidas, dentre outras aplicações (59).
2.5. Surfactantes aniônicos
A classe de surfactantes mais comercializada é a dos aniônicos. Os surfactantes
aniônicos são constituídos geralmente por cadeias alquílicas de diversos tamanhos,
alquilbenzeno ou éteres alquilbenzenos (parte hidrofóbica) e sulfato, carboxilato e fosfato (parte
hidrofílica). São amplamente utilizados em produtos de limpeza, como detergentes, sabão para
roupas, e produtos de higiene pessoal (38). Devido ao intenso uso, está presente em grandes
quantidades no meio ambiente, o que gera um risco ambiental, uma vez que esses compostos
são prejudiciais para seres vivos e plantas (60).
9
Um dos surfactantes aniônicos mais comercializado mundialmente é o alquilbenzeno
sulfonato linear (LAS). O LAS é um surfactante sintético utilizado principalmente em produtos
de higiene pessoal e na fabricação de detergentes. Com o consumo excessivo, sua presença em
efluentes tem sido um problema, pois muitas vezes estes compostos não respondem bem aos
tratamentos biológicos, que são os mais utilizados por estações de tratamento (60). Por isso, faz
se necessária uma compreensão dos fatores, riscos e consequências da presença desse composto
no ambiente para que se busquem alternativas viáveis e ecologicamente corretas para sua
remoção.
2.6 Alquilbenzeno sulfonato linear
O LAS é um surfactante aniônico sintético que contém uma cadeia alquílica linear
formada por 10 a 14 átomos de carbono, estando ligada a um anel aromático sulfonado (12). O
LAS pode formar 26 tipos de diferentes moléculas apenas pela variação do grupo fenila, que
pode assumir qualquer posição, exceto o carbono da extremidade (61). LAS comercial é uma
mistura dos homólogos com diferentes massas moleculares. A estrutura molecular do LAS é
mostrada na Figura 2 e suas propriedades físico-químicas mais relevantes são apresentadas na
Tabela 1
SO3-
CH (CH2)n CH3(CH2)mH3C
m + n = 7 a 11
Figura 2 - Estrutura molecular do Alquilbenzeno sulfonato linear (LAS)
Fonte: O autor (2016)
Tabela 1. Propriedades físico-químicas do alquilbenzeno sulfonato linear
Propriedades físico-químicas
Massa molar média 342,4 g/mol
Densidade 1,060 g /cm3
10
Fonte: O autor (2016)
O LAS é obtido a partir da sulfonação do alquilbenzeno linear (LAB), utilizando-se
ácido sulfúrico ou trióxido de enxofre. A fabricação de LAB é feita basicamente por dois
processos. No primeiro, utiliza-se cloreto de alumínio para catalisar a reação de alquilação do
benzeno com cloroalcanos. No segundo a alquilação de benzeno com oleofinas ocorre
catalisada por ácido fluorídrico. A escolha do processo é importante, pois, a distribuição do
grupo fenila e o tamanho da cadeia podem variar o que altera as propriedades do produto final
(62). Posteriormente, o LAB é transformado em LAS através de uma reação de sulfonação,
conforme mencionado anteriormente. O LAS contém cerca de 1 a 3% de LAB devido à
sulfonação incompleta, o que faz com que LAB entre no ambiente aquático juntamente com o
LAS (63).
O LAS começou a ser empregado por volta de 1960 para substituir sulfonatos de
alquilbenzeno de degradação extremamente lenta, pois, o LAS era rapidamente degradado em
condições aeróbicas. Atualmente é utilizado principalmente na fabricação de detergentes
domésticos e industriais (64).O consumo mundial de LAS perfaz um total 25 a 30% entre os
surfactantes aniônicos sintéticos (65). Estima-se que em 2003 foram consumidas 18,2 milhões
de toneladas desse surfactante (60).
2.6.1 Efeitos ambientais e toxicológicos
A complexa estrutura do LAS comercial faz com que a avaliação toxicológica dos
componentes individuais seja um desafio. Porém, atualmente, com o maior conhecimento da
natureza química dos componentes, esta desafio começa a ser superado e seus efeitos
toxicológicos podem ser estimados com maior confiabilidade (63).
Em águas superficiais, o LAS exerce um impacto negativo sobre o ecossistema aquático.
Sabe-se que LAS pode aumentar a solubilidade de compostos xenobióticos no ambiente. Em
uma concentração próxima a 0,02 mg.L-1, o surfactante é capaz de danificar as brânquias dos
peixes, elevar a produção de muco e diminuir a respiração de algumas espécies marinhas. LAS
também causa redução na taxa de sedimentação, e mudanças no padrão de natação de larvas de
mexilhão azul (66). Além disso, ocorre também a diminuição do oxigênio dissolvido,
Solubilidade em água 250 g/ L (20°C)
Ponto de fusão 277°C
Ponto de ebulição 637°C
Pressão de vapor 3-5 x 10-13 Pa
11
consequência da diminuição da tensão superficial água/ar (63). A permeabilidade da luz no
ambiente aquático também é afetada, o que dificulta a atividade fotossintética.
Dentre outros problemas, a bioacumulação também foi constatada. Um estudo
utilizando Daphnia magna como bioindicador, mostra fatores de bioacumulação de 500 a 1300
e de 4 a 900 utilizando o peixe Cyprinus carpio. Esse mesmo estudo aponta que para esses dois
organismos, um aumento na cadeia linear do LAS resulta em um aumento de duas vezes na
toxicidade. Já para microorganismos, foi visto que o tamanho da cadeia não afeta a toxicidade
(67).
No solo, LAS também apresenta efeitos negativos. Concentrações de LAS, na média de
16 mg/Kg, foram encontradas em arroz irrigados com efluente doméstico (68) . Em ambientes
terrestres, estudos apontam que concentrações de LAS na faixa de 16 mg.Kg-1 de peso seco
podem influenciar a atividade microbiana dos solos. Esse surfactante também pode inibir a
atividade biológica e em concentrações superiores a 40-60 mg.Kg-1 apresenta efeitos tóxicos
sobre invertebrados no solo (38). A presença de LAS no solo pode lixiviar sais solúveis para
camadas mais profundas e aumentar a absorção de produtos químicos tóxicos (64).
Também foi relatado que o LAS interfere em processos biológicos pela troca do contra
íon do NH4+ pelo contra íon de LAS (Na+). Com isso, o ciclo do nitrogênio é perturbado o que
bloqueia o processo de nitrificação realizado por bactérias nitrossomas, levando a morte de
organismos (69).
2.7.Métodos de remoção de LAS de efluentes
2.7.1. Tratamentos biológicos
Processos biológicos se baseiam no fato de que alguns microorganismos são capazes de
degradar substâncias orgânicas que podem ser tóxicas. O tratamento consiste no uso do próprio
contaminante como substrato para o desenvolvimento dos microorganismos que pode se dar de
forma aeróbia ou anaeróbia. Na biodegradação aeróbia, o aceptor de elétrons é o oxigênio
molecular, e com isso são formadas espécies de CO2 e H2O. Já na biodegradação anaeróbia,
como há ausência de oxigênio molecular, espécies como NO3-, SO4
2- e CO2 participam como
substratos levando a formação de CO2 e CH4 (70). A vantagem desse tipo de tratamento é a
ausência de aditivos químicos durante o processo.
12
Após o uso, o LAS é geralmente descartado para o sistema de esgotos e portanto está
presente também em estações de tratamento de águas residuais (ETAR). Nas ETAR uma
quantidade significativa de LAS é removida antes do lançamento em águas de superfície. Nesse
tipo de tratamento, o LAS geralmente sofre biodegradação e adsorção por lodos ativados (65).
Porém a biodegradação depende de alguns fatores como o tamanho da cadeia do homólogo de
LAS, posição do grupo sulfônico, temperatura, disponibilidade de oxigênio, dentre outros.
Além disso, o LAS tem se mostrado bem biodegradado de forma aeróbia, porém é recalcitrante
quando degradado de forma anaeróbia (60, 71).
Apesar de ser rapidamente biodegradado sobre condições aeróbicas, as lamas derivadas
desse tipo de digestão são geralmente submetidas a tratamentos anaeróbios. Com isso, são
encontrados adsorvidos no lodo, cerca de 20% do LAS proveniente das ETAR (71). O uso desse
lodo no tratamento do solo é um dos principais fatores para a presença de LAS em ambientes
terrestres. O uso de pesticidas, que geralmente contém surfactantes e a irrigação com águas
residuais também contribuem para a entrada de LAS no solo (72).
Estudos indicam que com o tratamento nas ETAR, até 99% do LAS pode ser removido,
mas com o elevado consumo, grandes quantidades ainda são encontradas nas águas superficiais
(66). Em Twain, apenas 5% do esgoto doméstico é tratado em estações de tratamento e, taxas
de até 135 μg.L-1 de LAS foram encontradas nas águas dos rios locais (73).
2.7.2. Adsorção
A adsorção é um processo onde há interação entre uma ou mais espécies, definidas
como adsorvato com outra que contém sítios de adsorção. Mais especificamente, pode ser
definida como um processo em que ocorre transferência seletiva de massa do adsorvato,
presente em uma corrente gasosa ou líquida, para a superfície porosa do adsorvente, que é um
sólido (74). A adsorção pode ser química (quimiossorção) e adsorção física (fisiossorção).
A fisiossorção ocorre basicamente por forças de Van der Waals e forças eletrostáticas
entre as moléculas do adsorvato e os átomos presentes na superfície do adsorvente e não ocorre
reação química. Na fisiossorção, moléculas do adsorvato são retidas na superfície do
adsorvente, formando uma camada, onde outras moléculas podem se depositar. Esse tipo de
adsorção permite o processo inverso, chamado de dessorção, através do aumento da temperatura
ou abaixamento de pressão (75) .
A quimiossorção ocorre com a transferência ou compartilhamento de elétrons entre
adsorvente e adsorvato, formando um novo composto. Durante esse processo, as moléculas de
13
adsorvato são ligadas somente na camada superficial de adsorvente, mantendo as camadas
internas inutilizadas. Por se tratar de uma reação química, com ligações mais fortes entre as
moléculas, o processo de inverso na quimissorção é praticamente irreversível (75).
Além dos tratamentos biológicos, a adsorção tem sido muito utilizada na remoção de
LAS. Carvão-ativado(76), hematita (77), carbonatos naturais e sintéticos (78) dentre outros
foram recentemente avaliados e se mostraram eficientes. Milenkovic et.al. (79) utilizaram
espiga de milho carbonizada na presença e ausência de ultrassom para adsorção de íons de 4 -
dodecilbenzeno sulfonato (SDBS) de soluções aquosas e as capacidades de adsorção foram de
29,41 mg.g-1 e 27,78 mg.g-1, com e sem o uso da ultrassonografia, respectivamente. Polianilina,
um polímero condutor, também foi estudada na adsorção de SDBS e obteve-se capacidade de
adsorção de 32,3 mg.g-1 quando o polímero era dopado com CuCl 2 e 29,5 mg.g1 utilizando
polianilina dopada com ZnCl 2 (80). Nesses trabalhos não foram realizados estudos de
dessorção. Em 2009, Coll et. al (81) utilizaram materiais funcionalizados de sílica mesoporosa
para adsorção de LAS. Foi obtida eficiência de remoção máxima de 80% para soluções
contendo 200 ppm de LAS para 50 mg do adsorvente. Não foram feitos estudos de dessorção
em nenhum dos estudos aqui citados.
2.7.3.Processos oxidativos avançados
Processos oxidativos avançados (POA) também têm sido utilizados por sua capacidade
de degradar muitos poluentes não biodegradáveis. A tecnologia dos POA se baseia na formação
de espécies de oxigênio altamente reativas como radicais hidroxila, peróxido de hidrogênio e
superóxido, por exemplo, para a mineralização de compostos orgânicos (82). POA
compreendem ultrassons, fotocatálise, ozonização, fenton, peróxido de hidrogênio e outros
(83). As Equações 1 e 2 mostram os mecanismos de reação do ozônio que pode ocorrer de
forma direta (eletrofílica ou cicloadição) ou de forma indireta através do radical hidroxila,
formado na decomposição do ozônio (70).
O3 + OH. → O2. + HO2
. (1)
O3 + HO2. → 2O2 +
.OH (2)
As Equações 3 e 4 mostram a formação do radical hidroxila, a partir do ozônio na
presença de radiação ultravioleta (UV).
14
O3 + H2O ℎ�→ H2O2 + O2 (3)
H2O2 ��→ 2
.OH (4)
E a Equação 5 apresenta a formação de radicais hidroxila a partir da mistura de peróxido
de hidrogênio e sais ferrosos. Tal mistura é conhecida como “Reagente de Fenton” (70).
Fe2+ + H2O2 → Fe3
+ + .OH + OH- (5)
Em tratamento de efluentes que contém LAS, os processos baseados em ozônio são mais
utilizados. Rodríguez et. al. (84) aplicaram ozonização para remoção de LAS em efluentes reais,
observando que a formação de espuma tem um efeito negativo sobre a ozonização. Devido a
essa influência, alguns estudos têm avaliado o uso da ozonização aliado a processos de
degradação biológica (85-88).
Alguns trabalhos têm demonstrado o uso combinado de POA com técnicas de
coagulação/floculação (89, 90). Essa combinação é mais eficaz pois resolve problemas de
formação de espuma, turbidez da água e permite remover sólidos suspensos que forem gerados
em consequência do tipo de POA empregado.
2.7.4. Tratamentos eletroquímicos
Os tratamentos eletroquímicos consistem na aplicação de um potencial capaz de oxidar
ou reduzir substratos de interesse (70). A eletrocoagulação é uma técnica bastante utilizada no
tratamento de efluentes (91). A técnica se baseia na utilização de uma corrente elétrica contínua
permitindo que reações de oxirredução ocorram através de eletrodos metálicos. Há a formação
de íons hidroxila através da hidrólise de moléculas de água. Os íons metálicos se combinarão
com as hidroxilas e formarão hidróxidos metálicos. Esses últimos favorecem a formação de
flocos através da desestabilização dos contaminantes de interesse e partículas suspensas. A
formação dos flocos facilita sua separação da porção líquida através da sedimentação ou
flotação, dependendo da densidade dos flocos formados (92).
Oxidação eletroquímica direta foi utilizada por Koparal et. al. (93) para remover LAS
em duas diferentes faixas de concentração (10 mg L-1 e 50 mg L-1 ). Os autores obtiveram
eficiências de remoção acima de 95% nas condições ótimas, para as duas faixas de concentração
estudadas. A eletrocoagulação também foi investigada. Um estudo para remoção de LAS por
15
coagulação eletroquímica utilizando íons Fe2+ mostrou que para uma concentração de LAS de
10 mg L-1 foi obtida uma eficiência de remoção de 100% (94).
Processos que envolvem eletrocoagulação apresentam algumas desvantagens como a
necessidade de substituição periódica dos anodos de sacrifício e requer uma condutividade
mínima do efluente a ser tratado dependendo do reator o que limitaria seu uso em águas
residuais com alto teor de sólidos dissolvidos. Do mesmo modo a remoção de compostos
orgânicos na presença de cloretos pode levar a formação de compostos orgânicos clorados
altamente tóxicos. Além disso, o custo operacional tende a aumentar em regiões onde a
eletricidade tem alto custo (95).
2.7.5. Uso de mebranas
Tratamentos por membranas se baseiam no gradiente de pressão para reter partículas de
tamanho maior. Parecida com a filtração convencional, a filtração por membrana permite
também a retenção de solutos dissolvidos em soluções aquosas e gasosas (96). A nanofiltração
é uma técnica atraente no tratamento de resíduos que contém surfactantes pois, tem menos
problemas de incrustação e são mais eficientes que a ultrafiltração (5).
A nanofiltração para remoção de LAS de matrizes aquosas foi investigada por
Korzenowski et. al (5). Os autores obtiveram eficiência de retenção de 92% ao usarem águas
residuais e 95% ao usar uma solução ideal. A eficiência de retenção pode ser entendida como a
eficiência do filtro para reter partículas de um tamanho específico. Kaya et. al (9) também
fizeram o uso da nanofiltração para remoção de LAS e obtiveram eficiência de retenção acima
de 99,8%. Processos envolvendo membranas podem ser efetivos e ainda possibilitam a
reutilização de água. Porém, apresentam alto custo e a limpeza de membranas é um processo
complexo (97, 98).
Apesar de apresentarem vantagens, é possível perceber algumas limitações dos métodos
atuais, como a necessidade de combinar duas ou mais tecnologias para aumentar a eficiência
de extração, alto custo de operação, geração de subprodutos tóxicos ou grandes quantidades de
resíduos, dentre outras. Diante dos desafios e o elevado consumo mundial de LAS, é preciso
buscar métodos alternativos que sejam eficientes, economicamente viáveis, ecologicamente
corretos e que sejam viáveis para aplicação industrial. Diante disso, uma opção que atende a
essas expectativas é o uso de sistemas aquosos bifásicos (SABs).
16
3. Sistemas aquosos bifásicos
O SAB é um sistema de extração líquido-líquido que apresenta diversas vantagens.
Algumas são importantes ressaltar: dispensa o uso de solventes tóxicos e permite a extração
tanto de espécies carregadas quanto neutras, diferente das técnicas convencionais de separação
líquido-líquido. Além disso, o SAB possui baixa tensão interfacial, que facilita a difusão de
componentes pela interface, seus componentes são atóxicos, não inflamáveis, podem ser
biodegradáveis e apresentam baixo custo. Os SABs também são ambientalmente seguros,
simples e versáteis. A possibilidade de aplicação em larga escala e a capacidade de extração de
diversos tipos de soluto também os tornam atraentes do ponto de vista industrial (99, 100).
3.1. Princípios e propriedades do sistema aquoso bifásico
O SAB é um sistema ternário que em determinadas condições termodinâmicas de
temperatura, pressão e composição, apresenta duas fases distintas em equilíbrio termodinâmico
(17). A composição das fases é resultado da mistura das soluções aquosas de dois polímeros
quimicamente diferentes, dois eletrólitos ou um polímero e um eletrólito. Em ambas as fases o
componente majoritário do sistema é a água (101).
A Figura 3 mostra um esquema de um SAB formado por polímero e sal. Na Figura pode-
se observar que a fase superior (FS) é rica em polímero e a fase inferior (FI) rica em sal, sendo
a água o componente presente em maior quantidade em ambas as fases.
Figura 3 - Composições das fases e do sistema global para um ponto de mistura do sistema aquoso
bifásico composto por polímero polietileno glicol (400 g mol-1), sal sulfato de amônio e água à 10°C). (102). Fonte: O autor (2016)
17
Os tipos de SAB mais estudados são compostos por polímero, sal e água. O polímero
mais utilizado é o polietileno glicol (PEG) com diferentes massas molares (103). Em um
sistema como esse, geralmente a FS é rica em polímero e pobre em sal e a FI é rica em sal e
pobre em polímero. No entanto, alguns SABs podem apresentar inversão na composição das
fases, e a FS ser rica em eletrólito enquanto a FI é rica em polímero, como relatado por de
Oliveira et.al. (100).
Diversos trabalhos na literatura descrevem diagramas de fases com o polímero PEG e
diferentes sais (104-108) e ainda suas aplicações na separação/purificação de vários solutos
(109-112). Nos últimos anos, têm crescido o número de pesquisas que envolvem SABs
compostos por líquidos iônicos e sais (20, 113-118), devido a suas vantagens como elevada
estabilidade térmica e química e não inflamabilidade (119).
A determinação dos diagramas de fase é fundamental para a aplicação prática do SAB
em técnicas de extração, pois através do diagrama é possível obter informações como, por
exemplo, a concentração de cada componente que resultará em um sistema bifásico e a
influência de fatores como temperatura, pH, dentre outros.
O diagrama de fases representa a composição química dos componentes formadores do
SAB em cada uma das fases e a composição global do sistema. Um diagrama de fases é
representado geralmente em coordenadas retangulares, como mostra a Figura 4. Na Figura 4 é
apresentado graficamente um diagrama de fases de um SAB composto por um polímero, sal e
água. As concentrações de sal e polímero, em porcentagem mássica, estão expressas no eixo
das abscissas e ordenadas, respectivamente.
Figura 4 - Diagrama de fases em coordenadas retangulares de um SAB constituído por polímero
polietileno glicol, um sal inorgânico e água. Fonte: O autor (2016)
18
Através dos diagramas de fases é possível a obtenção de informações indispensáveis
para compreender as características do sistema que permitirão sua aplicação em técnicas de
extração. Na Figura 4 é possível observar essas informações, como a linha binodal que é
composta por vários pontos. As coordenadas desses pontos expressam os valores mínimos de
concentração de sal e polímero que irão originar um sistema bifásico. A curva binodal delimita
a região onde o sistema é homogêneo e onde é heterogêneo. A posição da curva é influenciada
pelos componentes do sistema e sua natureza química, pelo pH e temperatura no qual o sistema
se encontra em equilíbrio termodinâmico (120).
A determinação da linha binodal pode ser feita por diferentes métodos O método de
turvação ou titulação turbidimétrica é o mais utilizado. A metodologia se baseia na mudança de
aspecto de uma solução aquosa de polímero límpida, que quando adicionadas alíquotas pré-
determinadas de solução de sal, fica turva ao entrar na região bifásica. Análise gravimétrica,
quantificação do sal por condutividade e do polímero por índice de refração também são
utilizadas (121).
Também na Figura 4 podemos ver os pontos que expressam a composição global (CG)
a composição da fase superior (CFS) e a composição da fase inferior (CFI). Esses pontos são
ligados pelas linhas de amarração. Ao longo de uma mesma linha de amarração em qualquer
das composições globais representadas na Figura 4 pelos sistemas A, B e C, as propriedades
termodinâmicas intensivas de cada fase (como densidade, condutividade e índice de refração
por exemplo) são iguais enquanto que as propriedades termodinâmicas extensivas (volume,
massa) são distintas. Isso significa que os sistemas A, B e C terão a mesma composição de fase
superior (CFS) e uma mesma composição de fase inferior (CFI), enquanto que o volume das
fases é diferente em cada sistema (122).
No diagrama é possível observar as linhas de amarração, nessas linhas estão os pontos
do diagrama que representam as composições das fases em equilíbrio. O comprimento da linha
de amarração (CLA) é um parâmetro termodinâmico importante, pois expressa a diferença entre
as composições das fases e por isso, através dele é possível predizer o quanto são distintas as
propriedades termodinâmicas intensivas das fases em um SAB (20). Esse parâmetro pode ser
calculado de acordo com a Equação 6.
� � = [ ��� − ��� ] + [ ���− ��� ] / (6)
19
Na Equação 6 ��� e ��� representam as concentrações de polímero e ��� e ��� as
concentrações de sal nas fases superior e inferior, respectivamente. Quanto maior o valor de
CLA, maiores serão as diferenças entre as propriedades termodinâmicas intensivas das fases, o
que resulta em maior eficiência de extração de um soluto de interesse. Diminuindo
sucessivamente o CLA, chega-se ao ponto crítico (Pc) (Figura 4). Ao se aproximar desse ponto,
a diferença entre as composições das fases diminui, até surgir, hipoteticamente, duas regiões
distintas com as mesmas propriedades termodinâmicas intensivas (121).
Quando um soluto é adicionado a um SAB, ele se particionará preferencialmente para
uma das fases desde que este soluto tenha afinidade por essa fase. O processo de transferência
do soluto para uma das fases é o resultado de interações específicas entre o soluto e os
componentes das fases e interações entre os componentes das fases sem considerar a presença
do soluto, interações essas governadas por forças entálpicas e entrópicas (110). O coeficiente
de partição (K) de um soluto qualquer em um SAB representa a razão entre a atividade do soluto
na fase superior (��� pela atividade do soluto na FI (���). Para um soluto infinitamente
diluído, a atividade pode ser equivalente à concentração do analito na fase, conforme descrito
pela Equação (7)
3.2 Histórico e aplicações
Os SABs foram descobertos em 1896 quando Beijerinck misturou soluções aquosas de
gelatina e ágar ou gelatina e amido solúvel e observou que em certas condições de temperatura
e concentração, as misturas resultantes ficavam turvas e, após um tempo em repouso, ocorria a
formação de duas fases. Ele observou que a fase superior era sempre rica em gelatina e a fase
inferior era rica em amido ou ágar e que a água era o componente principal de ambas as fases
(123).
No final da década de 1940, um estudo sobre a miscibilidade de vários pares de
polímeros, dissolvidos em solventes orgânicos ou soluções aquosas, foi realizado com o
objetivo de constatar uma possível generalidade do fenômeno de segregação de fases em
sistemas que continham macromoléculas. Como resultado do estudo, verificou-se que dos 35
pares de polímeros estudados, apenas 4 não segregaram em duas fases o que permitiu concluir
que a incompatibilidade entre polímeros era uma generalidade (124, 125).
= ������ ≈ = [ �][ �] (7)
20
Foi somente em 1950 que os SABs foram descritos pela primeira vez como método de
separação em biotecnologia por Albertsson (126). Sendo a água o componente majoritário do
sistema, os SABs são estratégicos para a partição/separação de proteínas e material biológico,
pois, as duas fases possuem semelhança com o meio aquoso presente em seres vivos, o que
evita perda da atividade biológica do material (127).
Outro fator importante que evidenciou ainda mais a aplicabilidade dos SABs foi o fato
de possuírem baixos valores de tensão interfacial, quando comparados aos sistemas água-óleo
tradicionais. O primeiro estudo envolvendo a tensão interfacial em SABs foi feito em 1971, por
Ryden e Albertsson (128) . O sistema estudado era formado por PEG e dextrana e os autores
avaliaram os efeitos do CLA e da massa molar dos dois polímeros
Desde então, os SABs vêm sendo utilizados como um método de separação líquido-
líquido para remover solutos de interesse ambiental como íons metálicos (21, 129), corantes
têxteis (20, 111, 130, 131), flavonoides e açúcares (132), antibióticos (133), entre outros. Em
biotecnologia, diversos trabalhos demonstram o uso de SAB para recuperar e separar
biomateriais como proteínas (134-136), DNA (137), células-tronco (138, 139) e anticorpos
(140). Alguns trabalhos também apontam o uso de SAB como indicadores de poluentes
orgânicos em água (141, 142).
No entanto, os trabalhos que apresentam a partição de surfactantes em SABs são
escassos. Poucos artigos na literatura apresentam estudos sobre o comportamento de partição
de surfactantes em SAB. Em um estudo conduzido por Drouin e Cooper (26) foram
particionados os surfactantes Cloreto de cetilpiridínio (CPC), Nonidet P-40, ácido
dodecilbenzeno sulfônico (DBSA) e alguns biossurfactantes em SAB. O SAB estudado era
formado por PEG e dextrana, na presença e ausência de tampão de fosfato. Como resultados,
os autores observaram uma forte influência da carga dos surfactantes em seu coeficiente de
partição. Eles observaram que na presença do tampão fosfato, o surfactante catiônico CPC
particionou-se preferencialmente para a fase inferior do SAB e DBSA, um surfactante aniônico,
para a fase superior.
Albertsson e Anderson (27) e Svensson et al (28), com o objetivo de separar e isolar
isolar proteínas de clorofila de membranas de cloroplasto, realizaram a partição dos
surfactantes Triton X-100 e/ou octilbglucósido, em SAB formado por PEG-dextrana.
A revisão da literatura mostra que há uma falta de dados experimentais relacionados às
interações responsáveis pela partição de surfactantes em SABs e sobre o comportamento desses
surfactantes nesse tipo de sistema. De acordo com o melhor de nosso conhecimento, não há
21
relatos na literatura de estudos que avaliam o comportamento de partição de LAS em SABs
visando a sua remoção de efluentes industriais.
Por isso, é de fundamental importância que estudos sejam feitos com o objetivo de
conhecer as principais interações responsáveis pela partição de LAS em SAB e compreender
os efeitos de parâmetros como CLA e a influência dos componentes no SAB sobre o
comportamento de partição de LAS. Esses estudos são essenciais para uma futura aplicação do
SAB em escala industrial.
22
4. Objetivos
4.1. Objetivo geral
Desenvolver um método economicamente viável e ambientalmente seguro para a
remoção de surfactantes de efluente de uma empresa de pequeno porte de retífica de
automóveis.
4.2. Objetivos específicos
a) Estudar o comportamento de partição do surfactante LAS em SABs formados por
polímeros (PEO) e sais inorgânicos;
b) Compreender as principais interações responsáveis pela partição de LAS nos
sistemas bifásicos;
c) Avaliar a capacidade dos SABs na remoção de surfactante de um efluente real
23
Referências
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33
Capítulo 2: O uso de sistemas aquosos bifásicos formados por polímero PEG e sal para
remoção de um surfactante aniônico de efluentes.
Resumo
Alquilbenzeno sulfonato linear (LAS) é um surfactante aniônico sintético utilizado em diversas
indústrias. Com isso, grandes volumes de efluente com alta concentração desses compostos são
descarregados em corpos d’água, causando risco a flora e fauna aquática. Na busca por
tecnologias ambientalmente seguras e de baixo custo para remoção de LAS de matrizes
aquosas, este estudo avalia o uso de sistemas aquosos bifásicos (SABs) compostos por polímero
PEG e sais sulfato. O coeficiente de partição (KLAS) e a eficiência de extração (%ELAS) de LAS
nos SABs estudados foram avaliados, bem como o comprimento da linha de amarração (CLA)
e os efeitos da massa molar do polímero e do cátion formador do sal sobre o comportamento de
partição de LAS. Todos os valores de KLAS foram maiores que a unidade e os valores de %ELAS
obtidos foram acima de 99%. O sistema composto por PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O
apresentou o maior valor de KLAS (1083,34) e de %ELAS (99,9%), indicando que o método
apresentou uma boa extração de LAS para a fase superior. Este sistema foi usado para estudos
de pré-concentração e mostrou que é possível remover LAS com uma eficiência acima de 99%
e gerar menores volumes de fase superior rica em polímero com uma alta concentração de
surfactante. O SAB também foi aplicado utilizando-se um efluente real em experimentos em
escala de bancada e batelada. Os experimentos em escala de bancada resultaram em valores de
%ELAS maiores que 98% e KLAS obtido nos experimentos em batelada foi 9,52 (%ELAS =
78,17%). Esses valores demonstram o potencial de aplicação do SAB na remoção de LAS de
efluentes industriais.
Palavras-chave: Alquilbenzeno sulfonato linerar; Partição; Química verde
34
Abstract
The linear alkylbezene sulfonate (LAS) is a synthetic anionic surfactant widely used in several
industries. As a result, large volumes of effluents highly concentrated in this compound are
discharged into water bodies, causing risks to aquatic flora and fauna. In the search of
environmentally safe and low cost technologies for the removal of LAS from aqueous matrices,
this study evaluates the use of aqueous two-phase systems composed of PEG-sulfate salts. The
partition coefficient (KLAS) and extraction efficiency of LAS (%ELAS) in polymer-salt aqueous
two phase system (ATPS) has been evaluated as well as the tie-line length (TLL), molar mass
of polymer and cation foming-salt effects on the behavior partition of LAS. All the KLAS values
were greater than unity and the %ELAS values obtained were higher than 99%. The system
composed by PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O had the highest KLAS (1083.34) and %ELAS
(99.9%) indicating that the method had a good extraction of LAS to top phase. This system was
used for pre-concentrations studies and show that is possible to remove LAS with an efficiency
higher than 99% and generated lower volumes of polimeric-phase with high concentrations of
surfactant. The ATPS was also applied in a real effluent sample with experiments on laboratory
scale, as well as batch experiments on a bench scale. The experiments in laboratory scale
resulted in %ELAS values greater than 98% and the KLAS obtained from batch experiments was
9.52 (%ELAS = 78.17%). These values demonstrated the potential application of ATPS for the
removal of LAS from industrial effluents.
Keywords: Linear alkylbenzene sulfonate; Partition; Green Chemistry
35
Highlights
Técnicas verdes para remoção de Alquilbenzeno sulfonato linear de efluentes estão
sendo demandadas e são investigadas neste artigo.
Sistemas aquosos bifásicos empregando sais sulfato e polímero são avaliados na
remoção de LAS.
Estudos de partição utilizando um surfactante aniônico bastante presente em corpos
d’água e efluentes foram feitos em escala de bancada e em batelada.
O sistema otimizado apresentou valores satisfatórios de eficiência de extração (%ELAS)
do surfactante estudado.
A remoção de Alquilbenzeno sulfonato linear de um efluente real foi atingida com uma
eficiência de 78,17%
36
1. Introdução
Surfactantes são compostos anfifílicos que, quando presente em solução aquosa, se
concentram preferencialmente na interface. A partir de uma determinada concentração molar
relativamente baixa, formam agregados no seio da solução, em forma de micelas. Esses
compostos possuem alto poder de detergência e capacidade de mudar as propriedades
interfaciais de líquidos (1), e são por isso, utilizados em indústrias têxteis, farmacêuticas,
formulações de pesticidas, tintas, polímeros, detergentes, formulações agrícolas, produtos de
higiene pessoal, mineração, recuperação do petróleo e em indústrias de papel e celulose (2).
Um dos surfactantes mais comercializado é o alquilbenzeno sulfonato (LAS), e seu
consumo mundial perfaz um total de 25 a 30% entre os surfactantes da mesma classe (3). Ele
é utilizado principalmente na produção de detergentes domésticos e industriais. LAS é um
surfactante aniônico sintético que contém uma cadeia alquílica linear que contém de 10 a 14
átomos de carbono, ligada a um anel aromático sulfonado (4). O LAS pode formar 26 tipos de
moléculas diferentes apenas pela variação do grupo fenila, que pode assumir qualquer posição,
exceto o carbono da extremidade (5). O LAS comercial é uma mistura dos homólogos com
diferente massa molar e sua estrutura é mostrada na Figura 1.
SO3-
CH (CH2)n CH3(CH2)mH3C
m + n = 7 a 11
Figura 1 - Estrutura molecular do alquilbenzeno sulfonato linear (LAS) comercial
Devido ao uso extensivo em diversas indústrias, a presença do LAS no ambiente é cada
vez mais comum, acarretando problemas ambientais. Estudos indicam que concentrações de
LAS na faixa de 16 mg.kg-1 de peso seco no solo, pode influenciar a atividade microbiana; e
concentrações maiores que 40-60 mg.kg-1 tem efeitos tóxicos sobre os invertebrados (6).
Adicionalmente, isto pode resultar em uma lixiviação de sais solúveis para as camadas mais
profundas do solo e aumentar a absorção de produtos químicos tóxicos (7). Na água, o LAS
37
pode provocar aumento na concentração de compostos xenobióticos, diminuição da quantidade
de oxigênio dissolvida e espuma nos corpos d’água, o que afeta a atividade fotossintética (8).
A remoção de LAS de águas residuais é um desafio pois, muitas vezes, os efluentes
contêm diferentes tipos de surfactantes e outras substâncias, tornando-se ineficiente a escolha
de um único método de remoção (9). Os métodos mais empregados na remoção de LAS são
adsorção (10), tratamentos biológicos (4), eletrocoagulação/ eletroflotação (11) e processos
oxidativos avançados (12, 13). No entanto, tais métodos apresentam algumas desvantagens.
Tratamentos que utilizam adsorção geram uma fase sólida rica em surfactante que necessita de
dessorção. Tratamentos biológicos são afetadas pela complexidade do efluente e pode ser
ineficiente. Processos oxidativos avançados podem resultar na formação de subprodutos tóxicos
e eletrocoagulação / eletroflotação apresenta alto custo de implantação e operação. Neste
contexto, é necessário o desenvolvimento tecnologias ambientalmente seguras, de baixo custo
e eficientes para a remoção de LAS de efluentes.
Uma alternativa é o uso de sistema aquoso bifásico (SAB), que é um sistema ternário
que sob determinadas condições específicas de temperatura, pressão e composição, apresentam
duas fases em equilíbrio termodinâmico (14). Essas fases, são geralmente formadas por
soluções aquosas de um polímero e um sal (15), dois polímeros quimicamente diferentes (16)
ou dois eletrólitos (17) . O SAB apresenta diversas vantagens como, baixo custo, possibilidade
de uso em escala industrial e reciclagem de seus componentes, apresenta rápida separação de
fases, dispensa o uso de solventes tóxicos, o que o torna ambientalmente seguro, tendo a água
como seu componente majoritário. (18). Com isso, o SAB tem sido utilizado na remoção de
diversos solutos tais como: corantes (19), poluentes orgânicos (20, 21), íons metálicos (22),
proteínas (23), DNA (24), nanopartículas, (25) e antibióticos (26).
Poucos artigos na literatura apresentam estudos sobre o comportamento de partição de
surfactantes em SAB. Drouin e Cooper (27) estudaram a partição dos surfactantes Cloreto de
cetilpiridínio (CPC), Nonidet P-40, ácido dodecilbenzeno sulfônico (DBSA) e alguns
biossurfactantes em SABs compostos pelos polímeros PEG e dextrano, na presença e ausência
de tampão de fosfato. Foi observado que o comportamento de partição dos surfactantes é
fortemente influenciado pela carga. Na presença do tampão, o surfactante catiônico CPC
particionou-se preferencialmente para a fase inferior e DBSA, surfactante aniônico, para a fase
superior.
Albertsson e Anderson (28) e Svensson et al (29) relataram dados sobre a partição dos
surfactantes Triton X-100 e/ou octil glucósido, em SAB formado por PEG-dextrana, com o
objetivo de separar e isolar proteínas de clorofila de membranas de cloroplasto.
38
A revisão da literatura mostra que há uma falta de dados experimentais relacionados às
interações responsáveis pela partição de surfactantes em SABs. De acordo com o melhor de
nosso conhecimento, não há relatos na literatura de estudos que avaliam o comportamento de
partição LAS em SABs compostos por PEG e sal para a sua remoção de efluentes industriais.
Portanto, o objetivo deste estudo é compreender as principais interações responsáveis pela
partição de LAS neste tipo de SAB e avaliar a possibilidade de sua aplicação na remoção de
LAS a partir de um efluente real.
2. Material e métodos
2.1 Materiais
Polietileno glicol (PEG) com massa molar de 400, 1500, 6000, 10000 e 35000 g mol-1
(todos com 100% de pureza) e os sais sulfato de amônio ((NH4)2SO4) (99% de pureza), lítio
(Li2SO4.H2O) (99% de pureza), magnésio (MgSO4
.7H2O) (98-102% de pureza) e sódio
(Na2SO4) (99% de pureza) foram obtidos Synth (SP, Brasil). PEG com massa molar de 10000
g mol-1 e LAS (85% de pureza) foram obtidos de Sigma-Aldrich (St. Louis, MO, Estados
Unidos). O efluente foi doado gentilmente por uma oficina mecânica (Itabirito, Minas Gerais,
Brasil). Todos os reagentes tinham grau analítico e foram usados sem purificações adicionais.
Foi utilizada água destilada para o preparo das soluções.
2.2 Experimentos de partição
2.2.1 Preparação dos sistemas aquosos bifásicos estoque
Todas as soluções foram preparadas em porcentagem mássica utilizando uma balança
analítica (Shimadzu AX 200, com uma incerteza de ±0,0001 g). Quantidades apropriadas de
água, soluções estoque de polímero e sal foram misturadas em porções definidas de modo a se
obter, para cada SAB, cinco valores diferentes de CLA, obtidos em diagramas de fase descritos
na literatura (15, 30-33). Os sistemas foram misturados por 3 minutos e deixados em repouso
em um banho (Marconi, MA 184, com uma incerteza de ± 0,1°C) a 25ºC, por um período
mínimo de 24 horas, até o sistema atingir o equilíbrio termodinâmico. As fases foram coletadas
separadamente e utilizadas para os estudos de partição.
39
2.2.2 Estudos de partição
Para cada CLA, três SABs foram preparados misturando cerca de 3 g de cada fase do
SAB estoque. Em dois desses SABs, foi adicionado aproximadamente 0,1 g de solução de LAS
27% (m/m). O terceiro SAB foi utilizado como branco. Os sistemas foram agitados por 3
minutos e deixados em repouso em um banho termostático a 25°C por um período mínimo de
24 horas. Posteriormente, as fases superior e inferior foram coletadas separadamente e diluídas
para a quantificação de LAS, usando um espectrofotômetro UV–Vis (Thermo Scientific,
Evolution 60S) em um comprimento de onda de 223 nm, que é o comprimento de máxima
absorção para o LAS.
O coeficiente de partição de LAS (KLAS) é obtido através da razão entre suas
concentrações analíticas nas fases superior e inferior. Considerando a Lei de Lambert – Beer’s,
que diz que a concentração analítica é diretamente proporcional a absorbância, KLAS foi
calculado de acordo com a Equação 1.
��� = ����� ��������� ���� (01)
Onde �����e ����� são as absorbâncias na fase superior e inferior respectivamente,
multiplicados pelos respectivos valores de diluição, ���� e ����.
2.2.3 Estudos de pré-concentração de LAS
Para avaliar a possível aplicação industrial, foram realizados experimentos de pré-
concentração de LAS na fase superior com o objetivo de reduzir a quantidade de fase rica em
surfactante e minimizar a geração de resíduos. O procedimento adotado nesse estudo foi o
mesmo utilizado nos estudos de partição, no entanto, neste experimento, o SAB era composto
por aproximadamente 1 g de fase superior e 9 g de fase inferior.
2.2.4 Estudos de partição utilizando um efluente real
Os estudos de partição na presença de um efluente real foram realizados em escala de
bancada e em batelada. O efluente foi previamente filtrado através de papel filtro qualitativo
(tamanho do poro: 0,14 μm) para remoção de sólidos suspensos. Os experimentos em escala de
40
bancadas foram conduzidos da mesma maneira que os estudos de partição, no entanto, neste
experimento, as soluções estoque de polímero e sal foram preparadas utilizando o efluente como
solvente. Não houve adição de solução de LAS nos sistemas, pois o efluente já continha o
surfactante.
Para os experimentos em escala de bancada, aproximadamente 400 g de sal e 300 g de
polímero foram pesados (Martei, BL3200H com uma incerteza de ±0,01 g) e misturados em
uma cuba de vidro com capacidade para 3,0 L. Cerca de 1900g de efluente foram adicionados
com o auxílio de uma bomba (Pump Quimis, flow 601 I, power 1 / 6HP). O sistema foi agitado
por jar test (Nova Ética) por 10 minutos a 200 rpm para completa solubilização dos
componentes. Após esse período, o sistema permaneceu em repouso durante 30 minutos para
completa separação de fases. Então, amostras de cada fase foram coletadas, apropriadamente
diluídas e levadas para quantificação espectrofotométrica. Após 24 horas, amostras das fases
foram novamente coletadas para quantificação, enquanto o sistema permanecia fechado, em
repouso, a temperatura ambiente.
2.5 Eficiência de extração de LAS (%ELAS)
A eficiência de extração de LAS (%ELAS) expressa a razão da quantidade de surfactante
extraída para a fase superior em relação ao total de LAS no sistema. Este parâmetro pode ser
calculado de acordo com a Equação 2.
% ��� = ����� ���� × ������� ��� × �� + ����� ���� × �� × (02)
Onde ����� ���� e ����� ���� são as absorbâncias da fase superior e inferior com seus
respectivos fatores de diluição e �� e �� são as massas de cada fase.
3 Resultados e discussão
3.1 Efeito do comprimento da linha de amarração
O CLA influencia significativamente o comportamento de partição de diversos solutos
em SAB, como relatado em diversos estudos (20, 34, 35). O CLA é um parâmetro
termodinâmico importante, pois, quanto maior seu valor, maiores são as diferenças entre as
41
propriedades termodinâmicas intensivas das fases em equilíbrio em um SAB. O CLA pode ser
calculado de acordo com a Equação 3 obtida através da diferença na concentração dos
componentes nas fases superior e inferior.
CLA = [(���� − ����)]2 + [(���� − ����)] (2)
Onde ���� e ����são as concentrações de polímero e ���� e ���� as concentrações de sal,
nas fases superior e inferior respectivamente.
Devido a influência do CLA no comportamento de partição de solutos em SAB, este
efeito foi avaliado sobre os valores de KLAS (Fig. 2(a)) e %ELAS (Fig. 2(b)) em sistemas
formados por PEG 1500 e sais sulfato a 25 ° C.
27 36 45 54 63
270
540
810
1080
1350
KL
AS
CLA / %(w/w) 27 36 45 54 63
99,0
99,3
99,6
99,9
% E
LA
S
CLA / %(w/w)
(a) (b)
Figura 2 - Efeito do CLA sobre o comportamento de partição de LAS a 25° C. SAB: (■) PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O; (▲) PEG 1500 + Li2SO4 + H2O; (●) PEG 1500 + Na2SO4 + H2O; (►) PEG 1500 + MgSO4 + H2O
A Figura 2 (a) mostra que para todos os valores CLA, os valores KLAS foram maiores
do que a unidade, indicando assim que o LAS concentrou-se preferencialmente na fase superior
dos sistemas. Observou-se que valores maiores de CLA causaram um aumento nos valores
KLAS. Este comportamento pode ser explicado pelo fato de que o aumento do CLA provoca um
aumento na concentração de sal na fase inferior e um aumento na concentração de polímero na
fase superior. Portanto, cresce o número de interações entre o LAS e o componente com o qual
ele interage mais fortemente
42
Além disso, o aumento da concentração de sal na fase inferior faz com que mais íons do
sal possam competir com moléculas LAS para formar interações intermoleculares com
moléculas de água. Assim, as moléculas LAS são desidratadas por meio dos íons, causando um
aumento na hidrofobicidade do surfactante, favorecendo a interação LAS-PEG. Neste caso, o
efeito do volume excluído na fase rica em PEG devido ao aumento do CLA, é menos
significativo do que a interação favorável entre o polímero e o surfactante. Resultados
semelhantes foram obtidos por Chow et al (34) para partição de albumina de soro bovino em
SAB do tipo PEG-sal.
Com o objetivo de avaliar a eficiência do SAB na extração de LAS para a fase superior,
os valores de %ELAS foram calculados e relacionados com o CLA e são mostrados na Figura. 2
(b). É possível observar que para todos os valores de CLA, os valores de %ELAS foram maiores
que 99%. Este resultado confirma o potencial de aplicação do SAB, porque, no primeiro valor
de CLA, o valor de %ELAS foi de 99,17%. Nessas condições, são requeridas menores
quantidades de sal e polímero para formar o SAB, consequentemente, menores recursos
financeiros são gastos.
Os resultados apresentados neste estudo são promissores quando comparados com os
obtidos por outros autores como Özdemir et al (36) que encontraram 99,63% de eficiência para
a remoção de dodecilbenzeno sulfonato (SDBS) de soluções aquosas usando adsorção em
polímeros de polianilina. Outros pesquisadores como Zsilák et al (37) avaliaram o uso de
fotocatálise combinada com ozonização para degradação de LAS e encontraram eficiência de
remoção de 85% após 45 h. Além dos métodos físicos e físico-químicos, outros autores como
Duarte et al (38) avaliaram a degradação de LAS num reator anaeróbio. O reator foi alimentado
com substrato sintético contendo nitrato e o LAS foi adicionado numa concentração de 22 mg
L-1. Após 104 dias de operação, a degradação do LAS no reator foi de 87%.
Os resultados obtidos neste estudo para a remoção de LAS usando o SAB (99,2%),
quando comparados com os observados para outras técnicas de tratamento demonstram a
possibilidade de aplicação de tal sistema em escala real, especialmente porque os limites de
descarga ambiental para LAS são rigorosos.
3.2 Efeito do cátion formador do sal
Vários estudos vêm abordando o efeito do cátion sobre o comportamento de partição do
soluto em SAB (22, 39, 40). O estudo desse efeito é importante para inferir sobre a contribuição
43
de interações eletrostáticas existentes entre os componentes do sistema e o soluto particionado.
O efeito do cátion foi avaliado em sistemas formados por PEG 1500 + sais sulfato + água a
25°C, e o resultado é mostrado na Figura 2.
Na Figura 2 é possível observar que os valores de KLAS e %ELAS seguem a ordem NH4+
> Li+ > Na+ > Mg2+. O efeito da natureza do sal no processo de partição de solutos em SAB
não é um fenômeno elucidado e não apresenta um comportamento sistemático. Por exemplo,
Rodrigues et al (20) estudaram o comportamento de partição de p-aminophenol em SAB
composto por PEG 1500 com os sais sulfato de lítio ou sódio e PEG 1500 com sal fosfato de
potássio. Nesse estudo, o SAB composto por PEG 1500 e sal sulfato de lítio apresentou maiores
coeficientes de partição. Por outro lado, de Oliveira et al (40), usando SAB composto por PEG
1500 com os sais sulfato de sódio, lítio ou magnésio para partição de ovomucoid encontraram
que o coeficiente de partição para esses sais, seguiu a ordem de Na+>Li+>Mg2+. Silvério et al
(41) determinaram o coeficiente de partição da enzima lacase em vários SABs. Ao comparar
SAB compostos de PEG e sais de sulfato de amónio, lítio e sódio, foi obtido um maior
coeficiente de partição para SAB composto por PEG e sulfato de lítio. Estes resultados
demonstram que o comportamento de partição de solutos é específico para cada soluto em um
determinado SAB. No entanto, é importante que esses estudos sejam realizados com o objetivo
de se chegar a uma conclusão sobre o processo.
3.3 Efeito da massa molar do polímero
A massa molar do polímero formador do SAB influencia o comportamento de partição
do soluto. O aumento na cadeia polimérica provoca alterações na entropia configuracional e na
hidrofobicidade da fase rica em polímero. Esse efeito tem sido reportado em diversos artigos
(42-44), e nesse estudo foi avaliado e apresentado na Figura 3, para sistemas compostos por
PEG + (NH4)2SO4 + H2O.
44
27 36 45 54 630
500
1000
1500
2000
KL
AS
LA
S
CLA/% (w/w) Figura 3 - Efeito da massa molar do polímero sobre o comportamento de partição de LAS a 25°C. SAB:
(□) PEG 400 + (NH4)2SO4 + H2O; (■) PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O; (○) PEG 6000 + (NH4)2SO4 + H2O; (∆) PEG 10.000 + (NH4)2SO4 + H2O
Pode ser visto que o aumento da massa molar do polímero resultou na diminuição dos
valores de KLAS, embora essa diminuição não seja tão pronunciada. A redução nos valores de
KLAS acontece porque o aumento do tamanho da macromolécula faz com que a entropia
configuracional da fase superior rica em PEG diminui, diminuindo assim a contribuição
entrópica para a minimização da energia de Gibbs de transferência do soluto. Como resultado,
o número de diferentes configurações para o LAS na fase superior diminui. Além disso, o
aumento da entropia conformacional da fase superior, causado pelo aumento da cadeia
polimérica, é menor que a redução da entropia configuracional. O efeito não muito pronunciado
da massa molar permite inferir que a entropia não é a força motriz que rege o processo de
partição de LAS nos SABs estudados.
Alguns autores como Nagaraja e Iyyaswami (42), observaram que o aumento da massa
molar de PEG resultou em menores valores de coeficiente de partição de proteínas solúveis
provenientes de efluente industrial de processamento de peixes. Essa diminuição foi devido ao
efeito de volume excluído na fase superior rica em PEG. Este efeito também foi observado por
Khayati et.al. (43) e de Alvarenga et. al. (44) para partição de β-galactosidase e o corante azo
Amarelo Ouro Remazol, respectivamente.
3.4 Estudos de pré-concentração de LAS
45
A ciência e as indústrias têm procurado cada vez mais métodos para a remoção /
separação de compostos poluentes ou de valor agregado com geração mínima de resíduos.
Assim, os estudos de pré-concentração são importantes porque permitem a avaliar a capacidade
do SAB de pré-concentrar o soluto em uma pequena quantidade de fase. Os estudos de pré-
concentração de LAS foram realizados utilizando 1 g de fase superior rica em PEG e 9 g de
fase inferior. Os valores de KLAS em SAB composto por PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O são
mostrados na Figura 4.
27 36 45 54 63
600
1200
1800
2400
3000
CLA / (% w/w)
KL
AS
Figura 4 - Valores de KLAS em estudos de pré-concentração de LAS na fase superior a 25°C. SAB: (■)
PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O
Os altos valores de KLAS encontrados mostram a eficácia do SAB em uma situação onde
um menor volume de resíduos é gerado. Neste estudo, os valores %ELAS são superiores a 99%.
É importante salientar que, para uma aplicação industrial, é possível tratar grandes quantidades
de águas residuais e gerar menores volumes de fase superior com altas concentrações de
surfactante. Além disso, o fato de que o LAS é concentrado na fase superior favorece a sua
recuperação para processos posteriores e favorece a reutilização da fase inferior em um novo
SAB.
3.5 Estudos de partição usando um efluente real
46
A presença de LAS em efluentes e recursos hídricos, bem como seus efeitos indesejáveis
sobre o meio ambiente são amplamente conhecidos. Portanto, é extremamente importante que
estudos de partição LAS sejam realizados para amostras de efluente real, a fim de avaliar a
viabilidade e potencial de aplicação desses sistemas na indústria. Para estudos de partição de
LAS utilizando um efluente real, o SAB era formado por PEG 1500 e (NH4)2SO4. A Figura 4
mostra os valores de KLAS (a) e %ELAS (b) em função do CLA, em experimentos realizados em
escala de bancada.
40 48 56 6450
60
70
80
90
KL
AS
CLA/ (% w/w)
40 48 56 6498,2
98,4
98,6
98,8
99,0
% E
LA
S
CLA / (% w/w)
(a) (b)
Figura 5 - Comportamento de partição de LAS utilizando um efluente real em experimentos realizados em escala de bancada a 25°C. SAB: (■) PEG 1500 + (NH4)2SO4 + efluente
Observa-se que para todos os valores CLA estudados KLAS foram maiores do que a
unidade (Figura 2 (a)). Como discutido anteriormente, estes valores indicam que o LAS
distribuiu-se preferencialmente para a fase superior rica em PEG. Os valores de KLAS são
menores quando comparado com os experimentos realizadas com água destilada, e isto
acontece porque o efluente é uma matriz complexa que contém outros poluentes que competem
com LAS para a fase rica em PEG. Como resultado, o comportamento de partição de LAS é
influenciado por outros componentes e suas interações com os constituintes do SAB. Mesmo
utilizando um efluente real, foram obtidos valores de %ELAS acima de 98%, confirmando o
potencial deste método para o tratamento de efluentes contendo LAS.
Para comparação, a Tabela 1 mostra a eficiência de remoção/extração de LAS
proveniente de águas residuais com diferentes métodos reportados na literatura.
47
Tabela 1 - Diferentes métodos para remoção de LAS de efluentes com suas respectivas eficiências de remoção.
Método
Eficiência de
remoção/extração
máxima(%)
Reagentes
químicos usados Ref.
Sistema tipo Fenton 90% Fe2+/Fe0/H2O2 (45)
Biodegradação anaeróbica em
reator de leito fluidizado 57%
Sacarose
bicarbonato de
sódio, NaCl,
MgCl2, CaCl2
(46)
Ultrassom de alta frequência 42% Nenhum (47)
Coagulação combinada com
oxidação Fenton 98%
FeSO4, H2O2,
polymeric
aluminum ferric
chloride sulfate.
(48)
Sistemas aquosos bifásicos 98.85% Polietileno glicol,
sulfato de amônio
[Este
trabalho]
Os dados apresentados na Tabela 1 mostram que os métodos estudados apresentam
grandes diferenças em relação a eficiência de remoção de LAS de águas residuais. Mesmo o
mais eficiente (98%) requer a combinação de duas técnicas. Esta informação destaca o potencial
de aplicação do SAB, que além de ser um sistema seguro para o ambiente, é altamente eficaz e
de baixo custo
Nos experimentos em batelada realizados nesse estudo, em que o efluente foi bombeado
para uma cuba de vidro contendo polímero e sal, valores de KLAS de 6,19 (±5,5) e %ELAS de
65,43% foram obtidos na primeira quantificação, logo após o processo de separação de fases.
Na segunda quantificação realizada após 24 h, foram obtidos valores de KLAS de 8,50 (±1,75) e
%ELAS de 78,18%. Ambos os valores indicam que o processo é espontâneo e que o LAS
concentrou-se na fase superior rica em PEG. Nestes experimentos, o SAB foi formado a partir
do primeiro valor CLA. Este coeficiente de partição obtido mostrou que o processo ocorre
rapidamente, uma vez que houve pouca variação nos valores de %ELAS das amostras recolhidas
imediatamente após a separação das fases e após 24 h.
Ao avaliar a possibilidade de aplicação do presente sistema, os resultados aqui obtidos são
promissores, uma vez que os experimentos em batelada resultaram em uma remoção de LAS
48
para a fase superior de 78, 17%. Aém disso, esse estudo e mostra que a cinética do SAB para
recuperação LAS é favorável, de modo que o processo de separação é rápido. No entanto, mais
estudos são necessários com o objetivo de melhorar o sistema para sua implementação em uma
planta piloto.
4 Conclusão
Os resultados mostraram que a remoção de LAS em SAB foi efetiva em estudos realizados
com ou sem a presença do efluente. Os maiores valores de KLAS e %ELAS foram obtidos para
SAB formado por PEG 1500 + (NH4)2SO4 + H2O e este sistema foi usado para estudos de pré-
concentração, mostrando que é possível extrair LAS com eficiência > 99% e gerar menores
quantidades de resíduos. Este sistema também foi aplicado para remover LAS a partir de
amostras de efluentes reais em experimentos realizados em escala de bancada e os valores de
%ELAS obtidos foram superiores a 98%, demonstrando assim o potencial de aplicação industrial
do SAB na remoção/ recuperação deste surfactante de efluentes.
Agradecimentos
Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais
(FAPEMIG), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)pelo suporte
financeiro. Este trabalho é um pojeto de pesquisa colaborativo com membros da Rede Mineira
de Química (RQ-MG) apoiado por FAPEMIG (Project: CEX - RED-0010-14.). Finalmente os
autores gostariam de agradecer a Brittany Nicole (PROAMB-UFOP) pela revisão do
manuscrito para a língua inglesa.
49
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