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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE ARTES CURSO DE BACHARELADO EM DESIGN O DESIGN DE SERVIÇOS COMO FERRAMENTA PARA O ESTUDO DE CONTEXTOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM DO ALUNO SURDO: UMA OBSERVAÇÃO DO CURSO DE LETRAS-LIBRAS DA UFRN Sofia de Andrade e Andrade NATAL, 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTECENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE ARTESCURSO DE BACHARELADO EM DESIGN

O DESIGN DE SERVIÇOS COMO FERRAMENTA PARA O ESTUDO DE CONTEXTOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM DO ALUNO SURDO:

UMA OBSERVAÇÃO DO CURSO DE LETRAS-LIBRAS DA UFRN

Sofia de Andrade e Andrade

NATAL, 2017

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O DESIGN DE SERVIÇOS COMO FERRAMENTA PARA O ESTUDO DE CONTEXTOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM DO ALUNO SURDO:

UMA OBSERVAÇÃO DO CURSO DE LETRAS-LIBRAS DA UFRN

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina DGN0401, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Design pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________Prof. MSc. Luiza Falcão Soares Cunha - Orientadora

Departamento de Artes - UFRN

_________________________________________________Prof. MSc. Lorena Gomes Torres de Oliveira - Examinadora

Departamento de Artes - UFRN

_________________________________________________Prof. Renata Nogueira Machado - Examinadora

Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação - UFRN

NATAL, 2017

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RESUMO

Nos últimos 10 anos, a inclusão de pessoas com deficiência no ambiente acadêmico tem aumentado. No entanto, essas pessoas ainda têm muitos obstáculos durante sua trajetória no ensino superior. Este trabalho compreende um estudo de caso do contexto de ensino e aprendizagem da pessoa Surda no curso de Letras LIBRAS da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), utilizando o Design de Serviços e a abordagem de Design Centrado no Humano para identificar e compreender as dificuldades e potencialidades dos alunos em questão. Ferramentas do Design Thinking voltado para o Design de Serviços foram utilizadas no processo, auxiliando na percepção de seis problemas que atrapalham no percurso do Surdo no ensino superior, gerando duas sugestões de resolução: a reorganização da sala de aula e a implantação do programa PET.

Palavras-chave: Surdez, Inclusão, Ensino Superior, Design de Serviços.

ABSTRACT

In the last 10 years, the inclusion of people with disabilities in the academic environment has increased. However, these people still have many issues during their path in higher education. This work includes a case study of teaching and learning in the context of a Deaf person in LIBRAS Literature course of the Federal University of Rio Grande do Norte (UFRN), using the Service Design and Human-Centered Design approach to identify and understand the difficulties and potentialities of the Design Thinking tools aimed to Service Design were used in the process, helping in the perception of six problems that disturb the path of the Deaf in higher education, generating two suggestions for resolution: the reorganization of the classroom and the implementation of the PET program.

Keywords: Deafness, Inclusion, Higher Education, Service Design

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Evolução dos números de deficientes auditivos matriculados em universidades brasileiras entre 2011 e 2015. ....................................................................... 8

Gráfico 2 - Ocupação e salário da população brasileira acima de 15 anos e que possui algum tipo de deficiência. .................................................................................... 10

Gráfico 3 - Nível de instrução da população brasileira acima de 15 anos e que possui algum tipo de deficiência. ............................................................................................................ 10

Gráfico 4 – As três lentes do DHC ............................................................................................................12

Gráfico 5 - Etapas do HCD ........................................................................................................... 13

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Caracterização da surdez 16

Figura 2 - Configuração de mãos. 20

Figura 3 - Ponto de articulação. 20

Figura 4 - Movimento. 21

Figura 5 - Orientação. 21

Figura 6 - Expressão facial e/ou corporal. 22

Figura 7 - Disposição das cadeiras em sala e trajetória dos alunos 33

Figura 8 - Matriz CSD 34

Figura 9 - Disposição das cadeiras antes e depois. 35

Figura 10 - problemas encontrados 39

Figura 11 - Comparação entre a disposição das cadeiras sugerida e a atual 40

Figura 12 - Comparação da circulação entre as cadeiras atualmente e com a disposição sugerida 41

Figura 13 - Comparação visualização da professora atualmente e com a disposição sugerida 41

Figura 14 - Atividades que podem ser exercidas pelos alunos do PET 42

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 7

1.1 Motivação ........................................................................................................................... 9

1.2 Justificativa ......................................................................................................................... 9

1.3 Objetivos ...........................................................................................................................11

1.3.1 Objetivo geral ...................................................................................................... 11

1.3.2 Objetivos específicos ......................................................................................... 11

1.4 Metodologia ....................................................................................................................11

2. REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................................14

2.1 Surdez e LIBRAS ..............................................................................................................15

2.1.1 Caracterização da surdez ................................................................................. 15

2.1.2 Educação dos Surdos ......................................................................................... 16

2.1.3 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS ................................................................ 18

2.1.4 Inclusão do Surdo na sociedade ...................................................................... 22

2.1.5 Contexto da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) .......... 24

2.2 Ergonomia ........................................................................................................................26

2.2.1 Ergonomia cognitiva .......................................................................................... 28

2.3 Design de Serviços..........................................................................................................29

3. DESENVOLVIMENTO .................................................................................................................30

3.1 Ouvir ..................................................................................................................................31

3.1.1 Entrevista Contextual ......................................................................................... 31

3.1.2 Shadowing 01 ...................................................................................................... 32

3.1.3 Shadowing 02 ...................................................................................................... 34

3.2 Criar ...................................................................................................................................36

3.2.1 Cocriação ............................................................................................................. 36

3.3 Implementar .....................................................................................................................39

4. CONCLUSÃO ...............................................................................................................................43

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................45

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1. IN

TRO

DU

ÇÃO

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INTRODUÇÃO

No Brasil, sabe-se que o acesso de pessoas com deficiência ao ensino superior sempre foi difícil, no entanto com o passar dos anos e o aumento de políticas governamentais de inclusão social, o número de pessoas matriculadas em universidades federais vem crescendo consideravelmente.

Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), no formato das publicações Sinopse Estatística da Educação Superior 2011 (BRASIL, 2012) e Sinopse Estatística da Educação Superior 2015 (BRASIL, 2016), indicam que entre 2011 e 2015 o número de pessoas portadoras de necessidades especiais matriculadas em universidades (públicas ou particulares) no Brasil cresceu em aproximadamente 63,13%, representando uma média anual de 15,78% de aumento. Dentre os alunos com algum tipo de deficiência auditiva (surdos ou parcialmente surdos), nesse mesmo período, o número de matrículas cresceu em aproximadamente 23,73%, gerando uma média de crescimento anual de 5,95%.

Gráfico 1 - Evolução dos números de deficientes auditivos matriculados em universidades brasileiras entre 2011 e 2015.

Fonte: Elaboração da autora com base em dados do INEP1

Com esse crescimento deve vir também a preocupação com a permanência da pessoa com deficiência no âmbito da universidade, pois o processo de ensino e aprendizagem, assim como a estrutura destas universidades, ainda não foi

1 Segundo análise dos documentos BRASIL, 2012, BRASIL, 2013, BRASIL, 2014, BRASIL, 2015 e BRASIL, 2016.

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INTRODUÇÃO

totalmente adaptado para as pessoas com deficiência, fazendo assim com que muitos não cheguem a concluir o curso em que ingressaram.

Sendo assim este trabalho tem por objetivo observar e entender o processo de ensino e aprendizagem da pessoa com deficiência auditiva no intuito de encontrar formas de facilitar o percurso dessas pessoas no ensino superior.

1.1 MotivaçãoO meu interesse pela diversidade humana já existia antes mesmo de

entrar no curso de Design, porém durante a disciplina de LIBRAS na UFRN pude ter contato mais próximo com a deficiência auditiva. Nesta, foi possível não só aprender a língua, mas conhecer melhor sobre a conjuntura social do Surdo e suas necessidades.

Em paralelo, a história acadêmica de uma amiga (que precisou abandonar o curso que fazia e mudar de área graças à perda de sua visão) também me tocou de forma a questionar se não haveriam formas de rever o ensino e a aprendizagem na universidade a fim de facilitar o processo de formação de pessoas com deficiências e mesmo impedir que elas venham a abandonar o ensino superior.

Considerando este contexto somado à curiosidade em saber um pouco mais sobre as dificuldades de inclusão e socialização do Surdo, em especial, surgiu a vontade de saber como o profissional de Design poderia ajudar a permitir ou facilitar tal processo da forma mais natural e rápida possível, considerando o designer como profissional multidisciplinar, podendo atuar nas mais diversas áreas e contextos, principalmente no ensino superior.

1.2 JustificativaSegundo o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia

e Estatística (IBGE) feito em 2010, a inserção de Surdos no mercado de trabalho enfrenta algumas dificuldades: dentre as pessoas com algum tipo de deficiência auditiva, 12% não possuem nenhuma ocupação e dos 88% que possuem, apenas 2,3% tem rendimento acima de 10 salários mínimos, 20,4% ganha entre 2 e 10 salários mínimos e 65,3% ganha até 2 salários mínimos.

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INTRODUÇÃO

Gráfico 2 - Ocupação e salário da população brasileira acima de 15 anos e que possui algum tipo de deficiência.

Fonte: Elaboração da autora com base em dados do IBGE (2010).

Do ponto de vista da educação, os Surdos encontram mais dificuldade: ainda de acordo com o Censo 2010, 61,1% da população brasileira acima de 15 anos e que possui algum tipo de deficiência (mental/intelectual, motora, auditiva ou visual) não possui instrução ou não finalizou o ensino fundamental. Desse grupo, apenas 24,4% teve acesso ao ensino superior e apenas 6,7% de fato concluiu uma graduação.

Gráfico 3 - Nível de instrução da população brasileira acima de 15 anos e que possui algum tipo de deficiência.

Fonte: Elaboração da autora com base em dados do IBGE (2010).

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INTRODUÇÃO

Em função desses dados, podemos perceber a baixa inserção do Surdo no ensino superior, possível consequência da baixa quantidade de políticas e/ou mecanismos para a inclusão do Surdo nas mais diversas áreas do ensino superior para que ele tenha melhor oportunidade de trabalho no mercado e inserção na sociedade.

Sendo assim, esta pesquisa objetiva investigar de que maneira se dá a inclusão do aluno Surdo na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e como o Design pode contribuir e favorecer esse contexto.

1.3 Objetivos

1.3.1 Objetivo geralA pesquisa tem como objetivo geral estudar o contexto de ensino e

aprendizagem da pessoa Surda no curso de Letras LIBRAS da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a fim de entender como o profissional do Design pode contribuir facilitando e melhorando o processo de aprendizagem e apreensão de conteúdo.

1.3.2 Objetivos específicosComo objetivos específicos temos:• Identificar e entender as dificuldades e potencialidades no processo de

aprendizagem do aluno Surdo;• Conhecer as iniciativas existentes na UFRN que trabalham em prol do

acesso do deficiente auditivo e do Surdo ao conteúdo e às aulas do curso de Letras LIBRAS;

1.4 MetodologiaNeste projeto será utilizado o processo de Design DCH (Design Centrado

no Humano) como guia para as etapas do estudo de caso, assim como algumas ferramentas do Design Thinking para serviços.

O processo de DCH considera todo o contexto que envolve as pessoas para quem o problema será resolvido, sendo, assim, compatível com a ideia de estudo de caso. Segundo a IDEO (empresa de consultoria em Design e Inovação de renome internacional),

O processo do HCD (DHC) começa por examinar as necessidades, desejos e comportamentos das pessoas cujas vidas queremos

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INTRODUÇÃO

influenciar com nossas soluções. Procuramos ouvir e entender o que querem, a chamada “lente do Desejo”. Enxergamos o mundo através desta lente durante as várias etapas do processo de design. (DESIGN KIT, 2016)

A IDEO explica que o Design Centrado no Humano considera três lentes através das quais são enxergadas as soluções para o problema que será resolvido, são elas: a lente do Desejo, a lente da Praticabilidade e a lente da Viabilidade. A lente do desejo procura saber qual a necessidade do usuário (ou do público alvo) do produto (ou o que quer que seja o fruto do trabalho). Já a lente da Praticabilidade procura saber se a solução poderá ser implementada técnica e organizacionalmente. A lente da Viabilidade investiga se a proposta é viável financeiramente. Sendo assim, um projeto que utiliza o DCH gerará uma solução que estará contida na união dessas três lentes e, portanto, será desejável, praticável e viável como demonstra o Gráfico 4.

Gráfico 4 – As três lentes do DHC

Fonte: DESIGN KIT (2016).

Desejo

Praticabilidade Viabilidade

As soluções que nascem doDesign Centrado no Humano devem

estar contidas na zona deinterseção dessas três lentes.

Precisam serDesejáveis, Praticáveis e Viáveis.

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INTRODUÇÃO

Na apostila Human-Centered Design: Kit de Ferramentas, percebe-se que o DCH é dividido em três fases principais: Ouvir, Criar e Implementar. Na fase de ouvir a equipe identifica histórias a fim de se inspirar nas próprias pessoas para quem as soluções de design serão geradas, através da pesquisa de campo. A fase de criar consiste em um trabalho em equipe para traduzir o que foi absorvido na fase anterior, identificando temas e oportunidades para, posteriormente, criar as soluções. A última fase, de implementação, nada mais é que um sistema rápido de modelagem de custos e receitas, verificando a viabilidade do projeto, podendo gerar novas soluções. O Gráfico 5 demonstra como se dá a organização das fases com relação ao tempo de projeto e ao tipo de pensamento (concreto ou abstrato) envolvido no processo.

Gráfico 5 - Etapas do HCD

Fonte: DESIGN KIT (2016).

O DHC é importante, pois aproxima o público alvo do processo de desenvolvimento da solução e da equipe de Design, aumentando a afinidade do usuário final com o projeto, assim como minimiza a possibilidade de incompatibilidade da proposta gerada, já que considera e se baseia em histórias retiradas diretamente da observação do público em questão. Como o projeto trata sobre a inclusão de pessoas Surdas, incluí-las também no processo de desenvolvimento de soluções desde o começo se faz essencial.

Conc

reto

Conc

reto

Abst

rato

Conc

reto

Conc

reto

Abst

rato

Ouvir

Tempo

Observações Plano de implementação

Narrativas Soluções

Protótipos

Temas Oportunidades

Criar Implementar

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2. R

EFER

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AL T

EÓRI

CO

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REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Surdez e LIBRAS

2.1.1 Caracterização da surdez Segundo Lima (2006), a surdez é caracterizada pela perda, em qualquer

grau, da percepção normal dos sons, sendo assim, existem diferentes graus de perda da audição, que são calculados através da perda média de decibéis na zona conversacional (frequência de 500 – 1000 – 2000 hertz).

De acordo com Lima (2006), existem quatro classificações de surdez que são divididas em duas categorias. São elas:

• Parcialmente surdo (com deficiência auditiva - DA):º Surdez leve: pessoa com déficit auditivo de até 40 decibéis. Impede

a percepção normal de alguns fonemas e a audição da voz fraca ou distante. Geralmente considerada uma pessoa desatenta. Não impede a aquisição da língua oral, mas pode dificultar a leitura e/ou a escrita;

º Surdez moderada: indivíduo com perda auditiva entre 40 e 70 decibéis. A pessoa necessita que as palavras sejam ditas em certa intensidade para que haja percepção adequada da palavra. Ocasiona atraso de linguagem e alterações articulatórias, podendo acarretar maiores problemas linguísticos. Sua compreensão verbal está intimamente ligada à sua percepção visual.

• Surdo:º Surdez severa: pessoa com perda auditiva entre 70 e 90 decibéis. O

indivíduo consegue reconhecer alguns ruídos familiares e poderá perceber apenas a voz forte. Causa retardo no aprendizado da fala, existe possibilidade de aquisição da linguagem oral.

º Surdez profunda: pessoa com déficit auditivo superior a 90 decibéis. Privação total das informações auditivas necessárias para perceber a voz humana, impedindo-a de adquirir linguagem oral, pois não tem acesso à estimulação auditiva externa. Geralmente utiliza linguagem gestual.

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REFERENCIAL TEÓRICO

Figura 1 - Caracterização da surdez

Fonte: Autoria própria.

Atualmente, muitos Surdos e pesquisadores consideram que o termo ‘surdo’ refere-se ao indivíduo que percebe o mundo por meio de experiências visuais e opta por utilizar a língua de sinais, valorizando a cultura e a comunidade surda. (LIMA, 2006)

A pesar de todas essas nuances de classificação da deficiência auditiva, o estudo vai contemplar principalmente os alunos Surdos (com surdez severa ou profunda), considerando que seu contexto de ensino e aprendizagem difere um pouco do contexto de alunos parcialmente surdos, no entanto não é descartada a possibilidade de que os resultados obtidos ao final do processo possam igualmente oferecer melhorias aos mesmos.

2.1.2 Educação dos SurdosEm decorrência da falta de informação da sociedade com relação à pessoa

Surda e à surdez, o Surdo sempre esteve marginalizado pois as pessoas não aceitavam o diferente como algo natural, tendendo assim a estereotipar o Surdo, generalizando suas limitações e minimizando suas conquistas e potenciais, como se seus sucessos e/ou fracassos estivessem unicamente ligados à deficiência auditiva.

Ao longo dos anos a língua oral foi considerada a única forma de linguagem,

No século IV AC, Aristóteles supunha que todos os processos envolvidos na aprendizagem ocorressem através da audição e que, em consequência, os Surdos seriam menos educáveis que os cegos. Na Idade Média, supunha-se que os Surdos não teriam acesso a salvação, já que, de acordo com Paulo na Epístola aos Romanos, a fé provém do ouvir a palavra de Cristo. (CAPOVILLA, 2000)

Surdez Leveaté 40 decibéis

Surdez Moderadaentre 40 e 70 decibéis

Surdez Severaentre 70 e 90 decibéis

Surdez Profundaacima de 90 decibéis

Parcialmente Surdo Surdo

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REFERENCIAL TEÓRICO

Esse pensamento contribuiu para a formação dos preconceitos com relação ao povo Surdo2, pois era considerado que os mesmos não eram capazes de aprender e pensar, ou seja, o Surdo não teria direito ao raciocínio, pois este dependeria da linguagem e a única linguagem considerada plena era a linguagem oral, não acessível à pessoa com surdez. Em Psicologia Étnica (1911), o fundador da Psicologia Experimental, Wilhelm Wundt, foi o único acadêmico a estimular a ideia da língua de sinais como linguagem de fato, pois anteriormente a iconicidade de certos sinais e a limitação de vocabulário (sem estrutura hierárquica, sem gramática e sem abstração) eram vistas como prova da inferioridade da língua de sinais com relação à linguagem oral.

Na segunda metade do século XVIII existiam basicamente dois métodos de ensino de Surdos, o método francês, que se baseava num sistema de sinais, e o método alemão, que evidenciava a oralização3. A partir do Congresso de Milão em 1880, o método oralista tornou-se dominante (Volterra, 1990). A partir daí a educação do Surdo foi reduzida ao ensino através da oralização, consequentemente os professores Surdos foram expulsos, a língua de sinais, banida e a comunidade surda excluída da política das instituições de ensino, pois era pensada como um perigo para o desenvolvimento e a manutenção da língua oral (Sacks, 1990) fazendo com que o nível educacional do Surdo caísse muito com relação ao do ouvinte4.

O método oralista objetivava levar o Surdo a falar e a desenvolver competência linguística oral, o que lhe permitiria desenvolver-se emocional, social e cognitivamente do modo mais normal possível, integrando-se como um membro produtivo ao mundo dos ouvintes.

Ainda assim, apesar das intenções de integração, não se pode dizer que o método oralista tenha tido sucesso em atingir seus objetivos, quer em termos de desenvolvimento da fala, quer da leitura e escrita. Em todo o mundo, apenas um pequeno percentual daqueles que perderam a audição precocemente consegue falar de modo suficientemente inteligível a terceiros. (CAPOVILLA, 2000).

2 Segundo STROBEL (p.29, 2008) povo surdo são “(...) sujeitos surdos que não habitam no mesmo local, mas que estão ligados por uma origem, por um código ético de formação visual, independente do grau de evolução linguística, tais como a língua de sinais, a cultura surda e quaisquer outros laços”.3 Oralização é um método de ensino para surdos, defendido principalmente por Alexander Graham Bell no qual se defende que a maneira mais eficaz de ensinar o surdo é através da língua oral, ou falada. Surdos que foram educados através deste método de ensino são considerados surdos oralizados.4 Ouvinte: como é chamada a pessoa que não possui deficiência auditiva.

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REFERENCIAL TEÓRICO

Entre os anos 60 e 90 foram desenvolvidos diferentes metodologias e tecnologias, todas voltadas para a restauração do déficit auditivo, porém nenhuma delas atingiu satisfatoriamente o objetivo principal que é permitir ao Surdo a aquisição e o desenvolvimento normais da linguagem oral.

Mais recentemente começou-se a pensar em linguagens alternativas antes desconsideradas frente à linguagem oral. Foi idealizada uma filosofia que inclui o uso de todos os meios que possam facilitar a comunicação (palavras, símbolos, sinais artificiais ou naturais, etc.) com o objetivo de abrir canais de comunicação para o povo Surdo, essa filosofia foi chamada comunicação total (Ciccone, 1990; Denton, 1970; Raymann & Warth, 1981), que, nos anos 70, tomou o lugar da filosofia educacional oralista estrita, estimulando o desenvolvimento de novas pesquisas sobre a estrutura linguística das línguas de sinais e fazendo com que surgissem diversos sistemas de sinais cujo objetivo central era tornar a língua falada mais compreensível ao Surdo, melhorando seu desempenho na leitura e na escrita.

Atualmente a sociedade tem se voltado mais para a questão da inclusão da pessoa surda, sua língua e sua cultura, porém este processo ainda é lento dentro das políticas educacionais da sociedade brasileira, pois a LIBRAS ainda era vista como tabu até pouco tempo, até ser atribuída a ela o status de língua. Segundo Monteiro (2006),

Hoje, as Associações de Surdos estão vivendo um momento de “crise” na sociedade, onde ainda lutam para garantir os direitos dos Surdos já previstos nas leis, mas os resultados dessa luta ainda não são suficientemente fortes para promover mudanças favoráveis em suas vidas. (MONTEIRO, 2006)

2.1.3 Língua Brasileira de Sinais - LIBRASNo Brasil, a primeira escola de Surdos foi oficialmente criada no dia 26 de

setembro de 1857 no Rio de Janeiro, através da Lei 839, assinada por D. Pedro II. Reis (1992) explica que o interesse pelo Instituto Nacional de Surdos-Mudos (INSM, atual Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES) viria do fato de que a princesa Isabel teria tido um filho Surdo e seria casada com o Conde D’Eu, parcialmente surdo. Foi então trazido para o país o francês Ernest Huet, professor Surdo vindo do Instituto de Surdos-Mudos de Paris e, por esse motivo, a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) acabou por sofrer grandes influências da Língua

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REFERENCIAL TEÓRICO

Francesa de Sinais (LFS).Em 1873, inspirado por um livro publicado na França e disponível na

Biblioteca do INSM, o aluno Surdo Flausino José da Gama escreve o mais importante documento encontrado até hoje sobre a LIBRAS, o Iconographia dos Signaes dos Surdos-Mudos, com ilustrações dos sinais separadas por categorias, produzido e impresso pelo próprio autor.

Em 1880, como no resto do mundo e por determinação do Congresso de Milão, o INSM passa a adotar o método oralista puro em todas as disciplinas, porém percebe resistência por parte de muitos professores e funcionários Surdos e de ex-alunos que mantinham o habito de frequentar a escola, o que contribuiu para a manutenção da Língua de Sinais.

Em depoimento informal, uma professora que atuou naquela época de proibições (que durou, aliás, até a década de 1980) contou-nos que os sinais nunca desapareceram da escola, sendo feitos por debaixo da própria roupa das crianças ou embaixo das carteiras escolares ou ainda em espaços em que não havia fiscalização. É evidente, porém, que um tipo de proibição desses gera prejuízos irrecuperáveis para uma língua e para uma cultura. (REIS, 1992)

A partir de 1970, com a filosofia da Comunicação Total e do Bilinguismo, atividades e pesquisas relativas à LIBRAS têm aumentado enormemente no Brasil. Em 2001, em um projeto coordenado pelo Professor Doutor Fernando Capovilla, foi lançado o Dicionário Enciclopédico Ilustrado de LIBRAS e em março de 2002, INES/MEC lança o Dicionário LIBRAS/Português em CD-ROM, coordenado pela Professora Doutora Tanya Mara Felipe, mesmo ano em que a LIBRAS foi oficialmente reconhecida como língua dos Surdos brasileiros através da Lei nº 4.857/2002 que, aliada à aceitação da LIBRAS pelo MEC, tornou a educação e a vida dos Surdos cada vez mais fácil.

Assim como outras línguas de sinais, a LIBRAS é uma língua de modalidade gestual-visual, se utilizando de movimentos gestuais e expressões faciais, sendo esse o principal ponto de diferenciação entre ela e a língua portuguesa, pois esta é de modalidade oral-auditiva (utilizando sons articulados). Outra diferença entre a LIBRAS e a Língua Portuguesa é a estrutura gramatical: enquanto a Língua Portuguesa possui elementos como verbo, sujeito, predicado, etc. a LIBRAS conta com 5 elementos (parâmetros) que formam os sinais. São eles:

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REFERENCIAL TEÓRICO

• Configuração de mãos: é a forma que a mão assume para compor o sinal. Pode ser da datilologia (alfabeto manual) ou outras formas. Os sinais para as palavras ‘aprender’, ‘laranja’ e ‘adorar’, por exemplo, têm a mesma configuração de mão.

Figura 2 - Configuração de mãos.

Fonte: Adaptação de FELIX 2010.

• Ponto de articulação: é o lugar no espaço onde o sinal será articulado. Pode tocar o corpo ou estar em um espaço neutro à frente do emissor. Os sinais para as palavras ‘trabalhar’ e ‘brincar’ são feitos no espaço neutro, ao passo que os sinais para ‘esquecer’ e ‘aprender’ são feitos sob a testa.

Figura 3 - Ponto de articulação.

Fonte: Adaptação de FELIX 2010.

Mão - “s” Aprender Sábado

Espaço-neutro Trabalhar Brincar

AprenderEsquecerNa testa

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REFERENCIAL TEÓRICO

• Movimento: consiste no deslocamento que as mãos farão para compor o sinal no espaço. Existem sinais que não possuem movimentos, como ‘pensar’ e ‘ajoelhar’.

Figura 4 - Movimento.

Fonte: Adaptação de FELIX 2010.

• Orientação: é a direção que o deslocamento da mão assume na composição do sinal. Sinais com direções opostas podem significar ideias opostas sobre o mesmo assunto, por exemplo, sinais como ‘abrir’ e ‘fechar’ ou ‘acender’ e ‘apagar’.

Figura 5 - Orientação.

Fonte: Adaptação de FELIX 2010.

Rir

Ajoelhar Em pé

Chorar Conhecer

Sentar

Abrir Fechar

ApagarAcender

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REFERENCIAL TEÓRICO

• Expressão facial: somado aos quatro parâmetros citados acima, a expressão facial e/ou corporal é usada como traço diferenciador ou potencializador de um sinal como no caso dos sinais para ‘triste’ e ‘muito triste’.

Figura 6 - Expressão facial e/ou corporal.

Fonte: Adaptação de FELIX 2010.

É a combinação de todos ou alguns dos parâmetros citados nas Figuras 2 a 6 acima que formam os sinais usados na LIBRAS, formando as palavras que, juntas formam as frases em um contexto, proporcionando a comunicação entre o povo Surdo.

2.1.4 Inclusão do Surdo na sociedadeAtravés das décadas os Surdos, assim como pessoas com outros tipos

de deficiência, foram marginalizados por não conseguir se comunicar ou agir da mesma forma que as pessoas não deficientes (consideradas normais).

No período compreendido entre o final do século XIX até a década de 1940, a sociedade vivenciou a política da exclusão e segregação. Na exclusão, os deficientes eram considerados inválidos, inúteis, chegando, em algumas culturas, ao extermínio. Já no século XX a fase da segregação se instaura, criaram-se grandes instituições para abrigá-los, em regime de internato, um progresso da humanidade, visando apenas ao bem-estar da pessoa com deficiência, período eminentemente assistencial. (CHAVEIRO; BARBOSA, 2005, apud SASSAKI, 1997).

Alegre Triste

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REFERENCIAL TEÓRICO

Em 1930 surgiu Associação Brasileira de Surdos-Mudos, no Rio de Janeiro, primeira associação de Surdos brasileira e formada por ex-alunos do INES, com a intenção de organizar modalidades esportivas que competiam com escolas ouvintes. Esta associação está atualmente desativada e não possuía estatuto.

Após os estudos no INES, os ex-alunos retornavam a seus estados de origem, fundando outras associações de Surdos, como a segunda delas, fundada em 1954, a Associação de Surdos-Mudos de São Paulo e, a terceira, a Associação de Surdos de Belo Horizonte, fundada em 1956.

Hoje existe uma Confederação, oito Federações e 95 Associações de Surdos espalhadas pelo Brasil. Porém, por dificuldades financeiras, algumas associações tiveram que ser fechadas e outras estão com dificuldade de atender seus sócios.

As associações promovem atividades de integração, competições esportivas, festas comemorativas e outras práticas, permitindo que o povo Surdo se encontre, contribuindo para a preservação da Língua de Sinais e da Identidade Cultural Surda e para o fortalecimento da luta pelos direitos surdos (MONTEIRO, 2006).

Apesar das associações de Surdos, apenas a partir de 1980 que começou a surgir a concepção de que a família e a sociedade devem adaptar-se às necessidades de todas as pessoas, sejam elas deficientes ou não. A intenção é que a pessoa com deficiência possa ter autonomia e liberdade de viver assim como a pessoa não deficiente.

Conviver no universo das pessoas com deficiência envolve uma mudança de paradigmas. Para os Surdos, as mudanças acontecem quando são aceitos e respeitados em suas diferenças e contar com a presença de intérpretes da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), no atendimento aos Surdos é exemplo de valorização das diversidades. (CHAVEIRO; BARBOSA, 2005).

Atualmente existem mecanismos como a Lei nº 10.436/02 (chamada Lei de LIBRAS) e o Decreto nº 5.626/05 que fazem com que seja “reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS e outros recursos de expressão a ela associados” (art. 1º da lei), garantem que alunos surdos tenham acesso regular à escola e incluem a LIBRAS como disciplina curricular formando e certificando professores, instrutores e tradutores/intérpretes de LIBRAS, assim como asseguram o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua para alunos Surdos (MEDEIROS, 2015).

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REFERENCIAL TEÓRICO

Entretanto, esses ainda continuam preocupados com o processo dos movimentos sociais e políticos Surdos promovidos pelas associações de Surdos dentro na sociedade brasileira, já que na lei, não há nem um item que estabeleça normas e regras de funcionamento que regularizem e valorizem as associações de Surdos. Assim, a luta continuará até que sejam alcançados e cumpridos todos os seus direitos previstos na lei. (MONTEIRO, 2006)

Além disso, os Surdos ainda não possuem o direito de ter profissionais capacitados entre professores Surdos e ouvintes e entre os interpretes de LIBRAS, garantindo acesso irrestrito aos conhecimentos socialmente compartilhados.

2.1.5 Contexto da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

A UFRN foi criada em Natal em 25 de junho de 1958 (então Universidade do Rio Grande do Norte), e federalizada em 18 de dezembro de 1960. Sua estrutura inicial foi composta pela junção de faculdades e escolas de nível superior já existentes na cidade, como a Faculdade de Farmácia e Odontologia, a Faculdade de Direito, a Faculdade de Medicina, a Escola de Engenharia, entre outras.

Segundo o site institucional da UFRN5, atualmente os mais de 37.000 estudantes se distribuem em 84 cursos de graduação na modalidade presencial, nove na modalidade à distância e 86 cursos de pós-graduação. A comunidade acadêmica é, ainda, formada por 3.146 servidores técnico-administrativos e 2.000 docentes efetivos, além de professores substitutos e visitantes.

Na UFRN já existem registros de pesquisas acadêmicas voltadas para a inclusão da pessoa com deficiência desde 1998, segundo Melo (2009), que foram desenvolvidas pela Base de Pesquisa sobre Educação da Pessoa com Necessidades Especiais, do então Departamento de Educação. Essas pesquisas

[...] vem contribuído sobremaneira para a formação inicial e continuada dos professores no que diz respeito ao atendimento voltado para os estudantes com necessidades educacionais especiais, com ênfase para aqueles com deficiência, nas instituições de ensino regular. (MELO, 2009)

Existe ainda a Comissão Permanente de Apoio a Estudantes com Necessidades Educacionais Especiais (CAENE), criada com o objetivo de:

5 Acesso em 26 jan 2017.

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REFERENCIAL TEÓRICO

• Apoiar e orientar a comunidade universitária acerca do processo de inclusão de estudantes com necessidades educacionais especiais [...];

• Propor soluções para a eliminação de barreiras atitudinais, arquitetônicas, pedagógicas e de comunicação no âmbito da instituição [...];

• Apoiar e orientar os Colegiados de Cursos de qualquer unidade acadêmica [...];

• Acompanhar o desenvolvimento da política de inclusão do estudante com necessidade educacional especial na UFRN [...]. (Site CAENE, 2016)

Desde 2000 a CAENE tem promovido ações com a finalidade de facilitar o acesso de deficientes à UFRN e/ou melhorar e intensificar a permanência dos mesmos no ambiente universitário. Estão entre elas:

• Contratação de bolsistas para assessorar estudantes com deficiência visual no uso de recursos de informática a fim de permitir ou facilitar o acesso a materiais de pesquisa;

• Construções e reformas na UFRN com adequações arquitetônicas visando tornar seus espaços mais acessíveis;

• Projeto institucional “Criação do Núcleo de Apoio e Orientação ao Acesso e Permanência de Estudantes com Deficiência da Universidade Federal do Rio Grande do Norte”;

• Contratação de bolsistas de apoio técnico do curso de Arquitetura para mapeamento e diagnóstico das condições de acessibilidade da UFRN.

Além das iniciativas citadas acima, existe ainda o curso de Letras LIBRAS, ministrado pelo Departamento de Letras, pertencente ao Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFRN. Segundo a coordenação do curso, este foi criado em 2013 motivado pelo programa Viver Sem Limite, do Governo Federal, de incentivo à inclusão (lançado em 2011 com o objetivo de implementar novas iniciativas, assim como intensificar ações em desenvolvimento em benefício das pessoas com deficiência) e pela iniciativa de professores do já existente Departamento de Letras. A coordenação conta que o curso, que tem todas as suas aulas ministradas em LIBRAS,

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REFERENCIAL TEÓRICO

[...] foi criado com o objetivo de favorecer a inclusão de Surdos, tanto prevendo a presença de Surdos na universidade, sendo um atrativo para os Surdos entrarem aqui (na universidade), como também formando pessoas para futuramente atuar na educação básica e promover a inclusão do Surdo, seja em escolas de Surdos ou escolas inclusivas. (COORDLL6, 2017)

Atualmente todos os 33 alunos Surdos usuários de LIBRAS da UFRN estão no curso de Letras LIBRAS, sendo assim, percebe-se que o número de deficientes auditivos inseridos no ensino superior na UFRN é ainda muito baixo e que comissões como a CAENE e as ações que ela realiza são extremamente necessárias não só para a permanência do aluno com deficiência no ensino superior, mas também para o aumento do seu acesso ao ambiente acadêmico, favorecendo sua permanência no mesmo.

2.2 ErgonomiaA ergonomia trata das relações entre as pessoas e os ambientes que as

cercam com a intenção de melhorar os mesmos para que possam adaptar-se às suas necessidades. Para um projeto que deseja discutir e melhorar a acessibilidade e a inclusão de pessoas com deficiência, a ergonomia pode ser muito útil para entendermos melhor os contextos em que elas estão inseridas e como esses contextos podem ser melhorados. Segundo a Ergonomics Society (www.ergonomics.org.uk), da Inglaterra,

Ergonomia é o estudo do relacionamento entre o homem e seu trabalho, equipamento, ambiente e particularmente, a aplicação dos conhecimentos de anatomia, fisiologia e psicologia na solução dos problemas que surgem desse relacionamento. (Economics Society)

A Associação Brasileira de Ergonomia (ABERGO - www.abergo.org.br) define que:

Entende-se por Ergonomia o estudo das interações das pessoas com a tecnologia, a organização e o ambiente, objetivando intervenções e projetos que visem melhorar, de forma integrada e não-dissociada, a segurança, o conforto, o bem-estar e a eficácia das atividades humanas. (ABERGO)

6COORDLL: Fala da coordenação do curso de Letras LIBRAS.

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REFERENCIAL TEÓRICO

Em 2000, a International Ergonomics Association (IEA - www.iea.cc) aprovou uma definição que conceitua a ergonomia e suas especializações:

Ergonomia (ou Fatores Humanos) é a disciplina científica, que estuda as interações entre os seres humanos e outros elementos do sistema, e a profissão que aplica teorias, princípios, dados e métodos, a projetos que visem otimizar o bem-estar humano e o desempenho global de sistemas. (IEA)

Considerando que os especialistas em ergonomia precisam considerar aspectos físicos, cognitivos, sociais, organizacionais, ambientais, dentre outros, para analisar o trabalho torná-lo compatível com as necessidades, habilidades e/ou limitações do indivíduo, Itiro (2005) divide a ergonomia em 3 grandes áreas, a ergonomia física, a ergonomia cognitiva e a ergonomia organizacional. Assim ele define:

Ergonomia Física: Ocupa-se das características da anatomia humana, antropometria, fisiologia e biomecânica, relacionados com a atividade física. Os tópicos relevantes incluem a postura no trabalho, manuseio de materiais, movimento repetitivos, distúrbios músculo-esqueléticos relacionados ao trabalho, projeto de postos de trabalho, segurança e saúde do trabalhador.Ergonomia Cognitiva: Ocupa-se dos processos mentais, como a percepção, memória, raciocínio e resposta motora, relacionados com as interações entre as pessoas e outros elementos de um sistema. Os tópicos relevantes incluem a carga mental, tomada de decisões, interação homem-computador, estresse e treinamento.

Ergonomia Organizacional: Ocupa-se da otimização dos sistemas sócio-técnicos, abrangendo as estruturas organizacionais, políticas e processos. Os tópicos relevantes incluem comunicações, projeto de trabalho, programação do trabalho em grupo, projeto participativo, trabalho cooperativo, cultura organizacional, organizações em rede, teletrabalho e gestão da qualidade. (ITIRO, 2005)

Desta forma, a ergonomia se faz bastante necessária no dia a dia das pessoas, contribuindo para a melhora não só da forma como os indivíduos trabalham, mas como elas interagem com objetos, sistemas e até entre eles próprios no seu cotidiano, adaptando não só ferramentas e postos de trabalho (como se pensa mais comumente), mas também sistemas, interfaces, sinalizações, serviços, interações entre pessoas, etc.

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REFERENCIAL TEÓRICO

2.2.1 Ergonomia cognitivaA ergonomia cognitiva faz uso de conceitos e teorias sobre a cognição

humana na intenção de compatibilizar soluções tecnológicas com as características e/ou limitações do usuário em estudo. Segundo Abrahão (2005), essa área da ergonomia tem como objetivo explicitar como se acumulam os processos cognitivos frente às situações de resolução de problemas independentemente do seu nível de complexidade, sem interferir diretamente, nem elaborar conceitos no âmbito da cognição, ou seja, ela apenas se utiliza de conceitos anteriormente estabelecidos, para elaborar estudos e projetos na área da ergonomia ou uma área que possa fazer uso da ergonomia.

Abrahão (2005), defende ainda que a ergonomia cognitiva (EC)

[...] investiga esses processos (cognitivos) para compreender como um indivíduo gerencia o seu trabalho e as informações disponibilizadas para, assim, apreender a articulação que ele constrói e que o leva a realizar determinada ação. Da mesma forma, por exemplo, que a Ergonomia não estuda o funcionamento do olho, do músculo, mas sim, a expressão desse funcionamento por meio do olhar das posturas, dos gestos, dos movimentos, à EC interessa a expressão da cognição humana. O procedimento de análise e intervenção adotado nessas circunstâncias considera as capacidades e os limites, tanto os de natureza fisiológica quanto cognitiva do ser humano e, por essa via consegue, muitas vezes, explicar a gênese dos erros e dos incidentes imputados à falha humana. (ABRAHÃO, 2005)

Sendo assim, é preciso compreender como se dão os processos cognitivos do indivíduo, para compreender suas formas de agir e pensar, só então podendo adaptar ou criar um novo artefato (seja ele um objeto, um sistema, um serviço ou qualquer que seja o produto resultante do estudo) adaptado e baseado nesses processos cognitivos, a fim de diminuir a taxa de erro humano e aumentar o aproveitamento e a eficiência deste mesmo produto.

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REFERENCIAL TEÓRICO

2.3 Design de ServiçosPor volta de 1990, design de serviços desapontou como disciplina na Köln

International School of Design (KISD) na Alemanha, no entanto Stickdorn (2014) defende que design de serviços é muito mais que apenas uma disciplina, é uma forma de pensar, “uma abordagem em constante evolução” e a prova disso é a ausência de uma “definição comum ou uma linguagem claramente articulada associada ao design de serviços”.

Segundo o Instituto de Design de Interação de Copenhagen,

O design de serviços, enquanto prática, geralmente resulta no design de sistemas e processos que têm como objetivo oferecer ao usuário um serviço holístico. Essa prática interdisciplinar combina inúmeras habilidades de design, gestão e engenharia de processos. [...] serviços conscientemente projetados por designers, que incorporam novos modelos de negócios, são empáticos às necessidades do usuário e buscam criar um novo valor socioeconômico. (THE COPENHAGEN INSTITUTE OF INTERACTION DESIGN, 2008 apud STICKDORN, 2014, p. 32)

Livework (2010 apud STICKDORN, 2014, p. 34) descreve design de serviços como uma forma criativa e prática de melhorar os serviços já existentes ou inovar na criação de novas propostas, aplicando processos e técnicas já estabelecidos no design ao desenvolvimento desses sistemas.

Juntamente às definições acima, Stickdorn (2014) ainda sugere cinco princípios do design thinking de serviços a fim de determinar, não uma definição comum para o design de serviços, mas o modo de pensar necessário para o design de serviços. Tais princípios seriam eles: centrado no usuário; cocriativo; sequencial; evidente e holístico. Essas regras assegurariam um bom design de serviços, pois determinam quesitos como a participação do usuário em várias etapas de projeto, tanto para entender seus hábitos, cultura e contexto social, como para integrá-lo ao processo como um todo, fazendo com que o mesmo ajude na criação do serviço. Outros quesitos que está incluído nos princípios determinados por Stickdorn (2014) e tidos como essenciais para um dito bom design de serviços é o respeito às etapas do processo e ao tempo necessário para que elas ocorram (não apressando, nem atrasando sua conclusão), a evidenciação do serviço, mesmo ele sendo sutil ou intencionalmente discreto e a consistência de todos os fatores que englobam não só o serviço, mas o ambiente em que ele realizará e os agentes que atuarão no mesmo.

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3. D

ESEN

VOLV

IMEN

TO

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DESENVOLVIMENTO

Como descrito na metodologia, o desenvolvimento desde trabalho se deu em três etapas: Ouvir, Criar e Implementar, baseado no processo de Design Centrado no Humano.

3.1 OuvirA etapa Ouvir é, nada mais nada menos, do que a etapa investigativa do

processo de DCH. Para isso foram usadas duas ferramentas de Design de Serviços: foi feita uma Entrevista Contextual com duas professoras do curso de Letras LIBRAS da UFRN, seguida do uso do Shadowing em duas ocasiões diferentes.

3.1.1 Entrevista ContextualStickdorn (2014) caracteriza como Entrevista Contextual a “técnica

etnográfica que permite que os entrevistadores observem e investiguem o comportamento no qual estão interessados”. Sendo assim, para iniciar a imersão no contexto de ensino e aprendizagem da pessoa Surda, foi marcada uma Entrevista Contextual com duas professoras do curso em questão na intenção de explicar para elas como seria o projeto e conversar sobre as questões do objeto de estudo para que se pudesse começar a entender como se dão as relações nesse âmbito.

Durante a entrevista, que foi feita de forma não estruturada, sendo norteada apenas por alguns pontos de conhecimento geral, as professoras se mostraram empolgadas com o fato de haver alunos de outras áreas interessados na inclusão de pessoas Surdas e falaram um pouco sobre as defasagens que o curso ainda possuía em sua estrutura como um todo.

As professoras deixaram claro que o curso, como ainda tem quatro anos de criado, possui algumas defasagens, principalmente de ordem estrutural, e que ao longo dos anos a coordenação tem tentado fazer adaptações à estrutura existente da universidade, porém o ideal seria que o curso tivesse seu prédio próprio com os ambientes construídos e pensados para o contexto específico de ensino e aprendizagem de pessoas Surdas.

Dessa discussão gerou-se uma lista de fatores que podem configurar um obstáculo no processo de ensino e aprendizagem do aluno Surdo:

• A intervenção na aula por parte do aluno pode ser complicada, já que a forma de expressão do Surdo é através de linguagem visual;

• Deve-se garantir que todos os alunos estejam enxergando a professora, os colegas de sala e o conteúdo projetado;

• A forma como é feita a projeção em sala de aula atrapalha o quadro

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DESENVOLVIMENTO

onde a professora deveria fazer anotações;• A iluminação da sala não é feita da melhor forma, podendo atrapalhar

a aula ou a visão dos alunos.A partir desse ponto e já com algumas informações iniciais, é dado

prosseguimento à etapa de imersão em contexto, iniciando o uso das ferramentas de Design de Serviços.

3.1.2 Shadowing 01A ferramenta de Shadowing, segundo Stickdorn (2014), consiste na “imersão

dos pesquisadores na vida dos usuários, pessoal de atendimento e funcionários de retaguarda, para observar seu comportamento e suas experiências”, ou seja, o pesquisador se insere no dia a dia do objeto da pesquisa de forma a não perturbar o ambiente em questão, a fim de observar como se dão as relações naquele ambiente e como ele funciona, verificando pontos positivos e problemáticos, obtendo, assim, uma visão mais clara e real da situação.

Nesta etapa, foram feitos dois momentos de Shadowing em sala de aula, observando a dinâmica entre a professora e os alunos, assim como o comportamento dos alunos e todos os aspectos envolvidos na aula. As aulas observadas foram em turmas de alunos do curso de Letras - LIBRAS, ministradas totalmente em LIBRAS.

A primeira observação em Shadowing foi feita durante a disciplina Educação De Surdos e Novas Tecnologias, que possui 33 alunos (Surdos e ouvintes). Ao chegar na sala de aula foi possível perceber que as cadeiras estavam previamente arranjadas em semicírculo com duas fileiras, as cadeiras estavam um pouco desorganizadas, a pesar do semicírculo.

Os alunos que foram chegando, colocaram-se principalmente na primeira fileira do semicírculo, porém não haviam cadeiras para todos nesta fileira, portanto os alunos restantes se distribuíram na segunda fileira e nas demais cadeiras da sala. Alguns alunos que chegaram atrasados na aula tiveram dificuldades em chegar a suas cadeiras, dada a arrumação em semicírculo, que dificulta a circulação entre as mesmas. Essa dificuldade e a demora do aluno para chegar à cadeira escolhida visivelmente atrapalhou a aula, fazendo com que a professora, em alguns momentos, precisasse parar a aula para esperar o aluno se sentar. Além disso, enquanto o aluno está a caminho da cadeira, ele passa na frente de outros alunos que estão prestando atenção à professora, perturbando a visualização dos sinais e, por vezes, quebrando a linha de raciocínio tanto dos outros estudantes quanto da própria professora.

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DESENVOLVIMENTO

Para entender melhor, pode-se perceber na esquematização a seguir como a sala estava organizada no início da aula e como se deu a chegada dos alunos e a trajetória dos mesmos em direção às suas cadeiras: as setas verdes representam a trajetória dos estudantes que sentaram nas cadeiras da frente, já as setas vermelhas representam o caminho que os alunos que chegaram com atraso e tiveram que sentar nas cadeiras das fileiras de trás, enfrentando dificuldades, pois as cadeiras não são projetadas para este tipo de disposição, dificultando o trânsito entre elas:

Figura 7 - Disposição das cadeiras em sala e trajetória dos alunos

Fonte: Autoria própria.

No decorrer da aula, observou-se também que alguns alunos precisaram trocar de lugar, pois não conseguiam enxergar direito a professora, fazendo com que os mesmos não conseguissem acompanhar satisfatoriamente a aula.

Foi percebido, também, que a atenção fica totalmente voltada para a professora em praticamente todo o tempo de aula, pois como a aula é ministrada em LIBRAS, se o aluno voltar sua atenção para outra coisa, acaba perdendo parte da explicação da professora. Essa questão traz como consequência a impossibilidade de algum aluno Surdo fazer qualquer anotação sobre a aula.

Outro fato importante sobre esta observação é que, em duas ocasiões, alunos precisaram se levantar de suas cadeiras e ir para a frente da sala para

Trajetória dos alunos que sentaram nas primeiras cadeirasTrajetória dos alunos que sentaram nas cadeiras de trás

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

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DESENVOLVIMENTO

tirar uma dúvida ou fazer uma colocação sobre a explicação da professora, a fim de que todos pudessem vê-los, pois mesmo com a disposição de semicírculo nem todos os alunos podiam ver todos os colegas, dada a quantidade de alunos em sala. Uma das alunas que precisou se levantar demonstrou incômodo ao fazê-lo, dando a entender que não se sentia muito à vontade com a situação.

Após a primeira sessão de Shadowing, foi feita uma Matriz de Certezas, Suposições e Dúvidas (Matriz CSD), que foi baseada nas informações colhidas nesta observação e na entrevista com as professoras, para esquematizar as impressões percebidas nas situações em questão. Uma Matriz CSD nada mais é que uma tabela em que se coloca todas as impressões que se teve sobre um determinado contexto na intenção de clarear as ideias e ter uma visão mais ampla, porém simplificada sobre esse determinado contexto.

Figura 8 - Matriz CSD

Fonte: Autoria própria.

3.1.3 Shadowing 02Com a Matriz CSD pronta, a etapa seguinte foi a segunda sessão de Shadowing,

feita com o objetivo de validar as considerações feitas na primeira. A segunda observação foi feita durante a disciplina Compreensão de Textos em Língua Portuguesa, que possui 12 alunos (Surdos e ouvintes). Nesta ocasião, as cadeiras estavam dispostas em fileiras horizontais como visto mais comumente em salas de aula.

Matriz CSD

Certezas• A disposição das cadeiras em fileiras não é adequada para uma aula ministrada em LIBRAS;• A sala precisa ser bem iluminada para facilitar a visão dos alunos e, portanto, a compreensão dos sinais;• A atenção dos alunos fica totalmente voltada para o professor, impedindo anotações sobre a aula.

Suposições• O material didático precisa ser mais visual, facilitando a compreensão do surdo, dado o não domínio daLíngua Portuguesa;• Aumentar a altura do professor facilita a visualização dos sinais;• Cadeiras não projetadas para disposição de semicírculo dificultam a movimentação no seu entorno;• A sala de aula não está projetada para receber alunos Surdos e seus contextos de ensino.

Dúvidas• Porquê a disposição das cadeiras em semicírculo é melhor?• Os alunos se sentem disconfortáveis ao se levantar e ir para a frente da turma para tirar dúvidas ou fazer observações durante a aula?

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DESENVOLVIMENTO

Foi possível perceber que alguns alunos que não estavam sentados na primeira fileira precisavam se mexer de um lado para o outro tentando enxergar totalmente a professora, assim como os da frente precisavam se virar para trás para ver seus colegas, na intenção de entender sua dúvida ou colocação. Se alguns alunos ficarem de costas para outros dificulta a comunicação entre alunos (quando um aluno precisa tirar uma dúvida ou fazer uma observação sobre a aula, por exemplo, quem estiver de costas para ele tem a necessidade de se virar para visualizar os sinais feitos pelo primeiro). Sendo assim, a turma sentiu necessidade de que as cadeiras fossem rearranjadas em semicírculo, pois uma das alunas reclamou de não poder ver os colegas. Para melhor entendimento, abaixo mostra-se duas imagens: na primeira pode-se observar como as cadeiras estavam dispostas assim que a aula começou; na segunda, a organização em semicírculo feita a pedido dos alunos.

Figura 9 - Disposição das cadeiras antes e depois.

Fonte: Autoria própria.

As duas aulas transcorreram de formas bastante semelhantes, fazendo com que a segunda observação pudesse confirmar e reforçar os aspectos problemáticos encontrados na primeira observação. Sendo assim, podemos resumir os pontos observados da seguinte forma:

• Problema 1 – disposição das cadeiras: foi possível concluir que a distribuição das cadeiras em semicírculo é a melhor para uma aula com alunos Surdos, porém nem sempre as cadeiras estão arranjadas desta forma e nem sempre cabem todos os alunos no semicírculo (caso de turmas maiores);

• Problema 2 - deslocamento para dúvidas/intervenções: para ser visto

PortaQuadro/projetor

Cadeiras

Mesa daprofessora

PortaQuadro/projetor

Cadeiras

Mesa daprofessora

Antes: cadeiras em fileiras Depois: cadeiras em semicírculo

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DESENVOLVIMENTO

por todos em sala, o aluno que precisar interferir na aula é obrigado a se levantar e ir para a frente da sala;

• Problema 3 - visualização da professora: os alunos que estão atrás dos outros podem ter dificuldades em ver a professora, fazendo com que, durante a aula, alguns mudem de lugar, procurando enxerga-la melhor;

• Problema 4 - circulação entre as cadeiras: como as cadeiras das salas de aula foram projetadas para ser dispostas em fileiras, a colocação em semicírculo dificulta a circulação entre as mesmas, o que acaba atrapalhando a aula;

• Problema 5 - anotações de aula: a falta de anotação durante a aula pode fazer com que o aluno tenha dificuldades de fixar os assuntos apresentados em sala e, consequentemente, problemas com o estudo posterior do assunto.

3.2 CriarO passo de criação consiste na reunião e interpretação das informações

colhidas na etapa anterior. Para isso foi desenvolvido um quadro resumindo os problemas encontrados e suas possíveis consequências.

Com essas informações claras e visando incluir o objeto de estudo em todo o processo do projeto, foi feita uma sessão de cocriação com uma professora e uma aluna Surda do curso de Letras LIBRAS da UFRN.

3.2.1 CocriaçãoA intenção dessa sessão de cocriação é validar os pontos percebidos nas

duas observações de Shadowing e pensar em possíveis soluções para os problemas encontrados.

Durante a Cocriação, confirmaram-se os problemas observados nos dois Shadowings. Conforme o decorrer dessa sessão, foi lido os pontos observados e tanto a professora quanto a aluna comentavam como aquele problema era visto por elas.

Com relação à organização das cadeiras (problemas 1 e 3), a aluna disse que essa é uma questão realmente importante, pois a LIBRA é uma língua gesto-visual, ou seja, baseada na visão e nos gestos, sendo assim, o aluno surdo é muito visual e para que todos consigam ver a professora de forma satisfatória, a melhor disposição seria a de semicírculo. No entanto ela frisou que em turmas com grande quantidade de alunos essa questão se torna ainda mais difícil, pois às vezes não

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cabem todos os alunos no semicírculo e algumas pessoas acabam precisando sentar atrás de outras ou muito perto do quadro, o que dificulta a visualização da professora ou do material exposto no quadro, respectivamente. A aluna chegou à conclusão que uma opção para sanar esse problema seria diminuir a quantidade de alunos em cada disciplina, possibilitando a formação em semicírculo sem que ninguém fique em posição desvantajosa.

Já sobre o problema 2, a professora disse que prefere quando os alunos se levantam, porque é uma forma de todos em sala poderem visualizar os sinais. A aluna disse que não se incomodava em levantar de sua cadeira para que todos pudessem fazer contato visual com ela e, consequentemente, compreender suas colocações. Ela deixou claro que isso depende de cada pessoa e que, para muitos que já estão acostumados a fazer esse movimento, não é necessariamente um problema, já para outras pessoas torna-se um incômodo. Nesse caso a aluna reforçou que a solução, mais uma vez, seria a colocação das cadeiras em semicírculo, o que anularia a necessidade de qualquer pessoa se levantar.

No decorrer da conversa a aluna confirmou que não poder fazer anotações durante a aula atrapalha muito na apreensão do conteúdo por parte do aluno surdo (problema 5). Ela disse que alguns surdos tentam anotar o que apreenderam da aula ao final desta, mas que é difícil lembrar das observações da aula inteira e as ideias acabam se confundindo. Somado a esse problema, a estudante frisou sobre mais um obstáculo enfrentado pelos alunos Surdos relacionado à língua portuguesa: alguns deles entram no curso sem ter domínio deste idioma, o que prejudica ainda mais o problema 5 (pois a aula é dada em LIBRAS e para eles fazerem as anotações precisam traduzir o conteúdo dado em sala para o Português) além de afetar a compreensão dos materiais disponibilizados pelos professores através do SIGAA (Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas), trazendo à tona mais uma questão a ser observada (Problema 6).

Sobre a questão da dificuldade de leitura do material disponibilizado pelos professores, ocasionada pelo problema 6, a aluna explica que a melhor forma de melhorar isso provavelmente seria traduzir todo o material textual (que é disponibilizado em Português) para a LIBRAS. Segundo ela as disciplinas do ensino superior assim como a Língua Portuguesa tem alguns conceitos que são complexos para o Surdo, já que a LIBRAS é uma Língua de Sinais e, portanto, mais visual e menos abstrata, sendo assim, ter acesso aos textos traduzidos para LIBRAS faria com que os Surdos pudessem não só ter melhor acesso ao conteúdo, como entender melhor o conteúdo dado, chegando em sala já com o conteúdo visto, podendo ter

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um melhor aproveitamento da aula. Ela diz que para se esquivar desse problema, muitos alunos Surdos recorrem à família para ajudar com a tradução do texto para que ele entenda, porém essa não é a melhor forma, visto que nem sempre a família entende do que se trata o texto.

A professora e a aluna comentaram como aquela questão afetava a aula e, consequentemente o curso como um todo. Se os alunos tivessem o acesso a esses textos facilitado iria certamente melhorar o desempenho deles em sala de aula e no curso como um todo.

Ao final da apresentação e discussão dos pontos percebidos nas observações, foi perguntado se havia mais alguma questão que dificultasse ou impedisse o aprendizado de alguma forma. Nesse momento a aluna explicou que mais um problema encontrado é que, quando o professor não é fluente em LIBRAS, a aula exige a tradução feita por um interprete. O departamento possui dois tipos de intérprete, aquele que possui o nível superior e o que possui nível médio. A diferença entre esses interpretes pode causar ruído na comunicação e na tradução da aula, pois, segundo a aluna, alguns intérpretes de nível médio também não possuem fluência total de LIBRAS, fazendo com que eles não consigam, algumas vezes, traduzir o conceito claramente para os alunos Surdos. A Língua de Sinais, por ser muito visual, exige que o interprete explique todo o contexto em que aquele conceito está inserido, por não possuir fluência total, estes intérpretes não conseguem contextualizar satisfatoriamente os conceitos. A aluna explica que, como a tradução é simultânea, se ela não entender direito o que o intérprete está traduzindo, é necessário parar a aula e pedir para ele traduzir novamente. Segundo ela, às vezes os alunos continuam sem entender depois de parar a aula para o intérprete repetir, sendo assim, muitos ficam constrangidos de pedir para ele ficar repetindo, com receio de que o intérprete possa ficar chateado, e acabam por ficar sem entender os conceitos dados pelo professor. Na opinião da aluna, seria necessário trocar os intérpretes de nível médio pelos que tem nível superior.

Sendo assim, encerramos a sessão de cocriação com 6 problemas identificados no processo de ensino e aprendizagem do surdo. Dividindo os seis problemas encontrados entre aspectos estruturais e aspectos educacionais, a Figura 12 abaixo resume os problemas encontrados até este ponto.

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Figura 10 - problemas encontrados

Fonte: Autoria própria

Além da sessão de cocriação, foi feita uma pesquisa acerca de programas e processos já existentes que pudessem ser aplicados na resolução deste tipo de problema.

Em todo o país existem diferentes tipos de programas de monitoria e assistência estudantil criados pelo Governo ou pelas próprias Instituições de Ensino Superior (IES). O Programa de Educação Tutorial (PET) representa o que poderia ser considerada a união de vários desses programas.

O PET é um programa do Governo Federal, criado pela CAPES em 1979, para estudantes de graduação, no qual os alunos se inscrevem e, sob a tutoria de um professor do curso ao qual está vinculado, participam de projetos a fim de proporcionar a si e aos outros colegas uma formação mais ampla através de projetos e atividades interdisciplinares como monitorias, grupos de estudo e de pesquisa, organização de eventos acadêmicos, dentre outros.

Segundo o site institucional do Ministério da Educação, atualmente existem 842 grupos PET distribuídos entre 121 IES pelo país, totalizando a concessão de 10.104 bolsas para os estudantes e 842 bolsas para professores tutores.

3.3 ImplementarCom algumas ideias de como seria possível resolver os problemas

encontrados nas etapas anteriores, a fase de implementação é a última fase. É nela que se compreende e determina como as soluções serão colocadas em prática.

No caso desse projeto, serão mostradas possibilidades de soluções, visto que o contexto de uma universidade federal é complexo e a implementação dessas

Problemas Estruturais• Disposição das cadeiras• Deslocamento para dúvidas/intervenções• Visualização da professora• Circulação entre as cadeiras

Problemas Educacionais• Anotações de aula• Interpretação do material

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soluções depende, muitas vezes, de um processo burocrático dentro da instituição e de seus departamentos, tornando sua realização imediata inviável.

Para a resolução dos problemas estruturais encontrados no decorrer da pesquisa e baseado no espaço disponibilizado atualmente para as aulas do curso de Letras LIBRAS na UFRN, sugere-se a diminuição do número de alunos por turma em sala de aula para no máximo 15 pessoas e a reorganização das cadeiras em semicírculo sem que nenhum aluno fique atrás de outro, retirando (ou não utilizando) as outras cadeiras da sala. Desta forma não será mais necessário se levantar para tirar dúvidas ou fazer intervenções na aula, visto que todos os alunos conseguirão se ver (uns aos outros) e ver o professor. Ao mesmo tempo, a diminuição dos alunos em sala e a reorganização das cadeiras resolve também a questão da circulação entre estas (e interrupção da aula), pois, nesse caso, haveria apenas uma fileira de cadeiras.

Figura 11 - Comparação entre a disposição das cadeiras sugerida e a atual

Fonte: Autoria própria

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

Atual: cadeiras em semicírculo com várias fileiras para acomodar muitas pessoas

Sugestão: cadeiras em um único semicírculo com até 15 pessoas

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Figura 12 - Comparação da circulação entre as cadeiras atualmente e com a disposição sugerida

Fonte: Autoria própria

Figura 13 - Comparação visualização da professora atualmente e com a disposição sugerida

Fonte: Autoria Própria

No caso dos problemas educacionais, sugere-se a implantação do programa PET. Como parte das responsabilidades dos alunos inscritos neste programa estaria: tradução para a LIBRAS dos textos e demais materiais disponibilizados pelo professor, facilitando o acesso dos alunos Surdos aos conteúdos antes

Trajetória dos alunos que sentaram nas primeiras cadeirasTrajetória dos alunos que sentaram nas cadeiras de trás

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

Atual: cadeiras em semicírculo com várias fileiras (dificuldade de circulação)

Sugestão: cadeiras em um único semicírculo (circulação livre)

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

PortaQuadro/projetor

CadeirasMesa da

professora

Atual: cadeiras em semicírculo com várias fileiras (dificuldade em ver o professor)

Sugestão: cadeiras em um único semicírculo (nenhum obstáculo)

Professora Alunos que conseguem ver a professora Alunos que não conseguem ver a professoraAlunos que conseguem ver a professora

Campo de visão dos alunos que conseguem ver a professora

Campo de visão dos alunos que nãoconseguem ver a professora

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mesmo da aula, aumentando o aproveitamento da mesma; monitoria de Língua Portuguesa para alunos Surdos, pois muitos entram no curso de Letras-LIBRAS sem domínio do idioma. O Programa de Educação Tutorial seria uma aquisição riquíssima para o curso de Letras LIBRAS, inclusive podendo trazer benefícios não só para os alunos Surdos como para os alunos ouvintes, com monitoria de LIBRAS para Surdos e ouvintes (visto que alguns alunos entram no curso sem a fluência na língua) assim como de outras disciplinas da estrutura curricular do curso Letras LIBRAS que for necessária, palestras sobre assuntos relevantes para os alunos do curso, organização ou ajuda na organização de eventos da área e oferecendo o apoio que os alunos e os professores deste curso necessitarem.

Figura 14 - Atividades que podem ser exercidas pelos alunos do PET

Fonte: Autoria própria

As soluções sugeridas visam contribuir para o incremento do desempenho não somente dos alunos Surdos do curso de Letras LIBRAS, mas igualmente dos ouvintes, assim como auxiliar os professores e colaborar para o crescimento do curso.

PET

Tradução de materiais para LIBRAS

Atividades sugeridas no projeto

Monitoria de Língua Portuguesa

Monitoria de LIBRAS

Palestras diversas

Monitoria de disciplinas da estrutura curricular

Organização de eventos

Outras atividades

Outras atividades

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4. C

ON

CLU

SÃO

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Como constatado na introdução deste trabalho, a inclusão da pessoa com deficiência no ensino superior ainda é relativamente pequena, a pesar de seu aumento gradativo no decorrer dos anos. Ainda mais complicada é sua trajetória dentro da universidade, pois nossa cidade, de forma geral, ainda não é um espaço inclusivo e isso inclui a UFRN.

No decorrer do projeto e focando no percurso do Surdo no ensino superior, através do processo de Design Centrado no Humano e com o auxílio de ferramentas do Design Thinking aplicado ao Design de Serviços, pôde-se perceber que ainda existem diversos obstáculos a serem ultrapassados para que o Surdo possa ter pleno acesso ao ensino superior e que consiga, não apenas entrar no curso, mas finalizá-lo de forma menos onerosa ao próprio aluno.

Com esse objetivo, foram utilizadas as ferramentas de Entrevista Contextual e Shadowing para imersão em contexto e identificação de problemas, assim como a ferramenta de Cocriação no intuito de fazer com que o objeto de pesquisa participasse do processo e ficasse à par do que estava sendo feito.

Durante o processo houveram algumas dificuldades com relação a choques de horários e devido à minha falta de domínio da LIBRAS, no entanto foi possível entender como se dá o processo de ensino e aprendizagem do Surdo no ensino superior e, mais especificamente, no curso de Letras LIBRAS na UFRN. Sendo assim, foi possível identificar seis problemas neste processo, que foram divididos em dois tipos: problemas estruturais e educacionais, e para cada um, foram encontradas soluções levando em conta as particularidades do público alvo que podem melhorar e facilitar a trajetória do Surdo no contexto em questão.

Por se tratar de uma instituição pública de ensino superior, as soluções não puderam ser colocadas em prática, visto que existem processos e etapas a serem cumpridas antes disso e, portanto, foram feitas somente sugestões de soluções. De toda forma, futuramente estas soluções podem ser implantadas pelo próprio Departamento de Letras.

Depois de todo o processo, reforçou-se a importância do design de serviços nas mais diversas áreas existentes, usando-o como ferramenta para o aperfeiçoamento de processos já existentes ou de criação de novos processos sem a imposição da criação de novas tecnologias ou grandes investimentos, apenas remodelando a forma de pensar sobre os problemas.

CONCLUSÃO

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