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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES SCHLA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS - DECISO LISSIA STINGHEN CHAGAS A MUDANÇA DE GESTÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA OS TRABALHADORES DA FAS CURITIBA 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES – SCHLA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS - DECISO

LISSIA STINGHEN CHAGAS

A MUDANÇA DE GESTÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA

OS TRABALHADORES DA FAS

CURITIBA

2013

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LISSIA STINGHEN CHAGAS

A MUDANÇA DE GESTÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA

OS TRABALHADORES DA FAS

Monografia apresentada como requisito parcial para

a obtenção do grau de Bacharelado em Ciências

Sociais, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes

da Universidade Federal do Paraná.

Profª Orientadora: Drª. Maria Aparecida da Cruz

Bridi.

CURITIBA

2013

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LISSIA STINGHEN CHAGAS

A MUDANÇA DE GESTÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA OS TRABALHADORES DA

FAS

Monografia aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharelado no curso

de Ciências Sociais, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do

Paraná, pela seguinte Banca Examinadora:

Orientadora: Drª Maria Aparecida da Cruz Bridi

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

Drª Benilde Maria Lenzi Motim

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

Dr. José Elmar Feger

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

Curitiba, 02 de agosto de 2013.

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À Cassiane e Jonas por todo amor e dedicação.

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RESUMO

A presente pesquisa analisa as condições de trabalho dos funcionários públicos da Fundação

de Ação Social de Curitiba pela perspectiva de troca de gestão municipal no ano de 2013, a

qual acarretou inúmeras situações de instabilidade para o trabalho e decorrente disso, para a

vida destes funcionários. Para isso foram realizadas entrevistas com cinco servidores

concursados desta instituição no intuito de trazer à pesquisa informações que apontam quais

são as principais situações que tornam instáveis os trabalhos destes funcionários. As

principais situações apontadas pelos entrevistados foram as instabilidades, os conflitos, as

relações de poder e os sentidos do trabalho. As análises destas situações se pautaram nas

teorias de autores clássicos como Max Weber e Karl Marx, e de autores contemporâneos

como Richard Sennett e Robert Castel a fim de instigar um olhar sociológico sobre as

condições de trabalho dos funcionários públicos da FAS. Com isso, Constatou-se que os

funcionários públicos identificam situações em seus trabalhos que os tornam instáveis, como

a troca de gestão, os conflitos, as relações de poder, a falta de liderança e até mesmo a

instabilidade financeira, contradizendo parcialmente, a noção geral de que o emprego público

garante certos tipos de estabilidade.

PALAVRAS-CHAVE: Instabilidade no Trabalho; Condições de Trabalho; Assistentes

Sociais; FAS; Mudança de gestão; Conflito.

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ABSTRACT

The present research analyzes the work conditions of the public sector employees of the

Fundação de Ação Social de Curitiba over the city management change perspective of the

year 2013, which resulted in several instability situations in the work enviroment and also on

the life of these employees. For this, interviews were conducted with five public employees of

this institution in order to gather the information that points which are the main situations that

made their work unstable. The main situations pointed by the employees were the

instabilities, conflicts, power relations and the meaning of their work. The analysis of these

situations were based in classic authors theories such as Max Weber and Karl Marx, and

contemporary authors such as Richard Sennett and Robert Castel with the intention of

instigate a sociologic sight over the work conditions of the employees of the institution. It was

found that the public employees are able to identify situations in which their work became

instable, such as management change, conflicts, power relations, lack of leadership and even

the financial instability, partially contradicting the common notion that the public job in

Brazil ensures some kinds of stabilities.

KEY-WORDS: Job Instability; Working Condition; Social Workers; FAS; Management

change; Conflict.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 7

METODOLOGIA ....................................................................................................................... 9

A ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: UMA ABORDAGEM POLÍTICA ...................... 11

A HISTÓRIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL NO PARANÁ ................................................... 18

O ASSISTENTE SOCIAL ....................................................................................................... 20

FUNDAÇÃO DE AÇÃO SOCIAL DE CURITIBA ................................................................ 23

O CONCURSO PÚBLICO E A ESTABILIDADE NO TRABALHO .................................... 25

O PAPEL DA FAMÍLIA NA PROTEÇÃO SOCIAL: O TRABALHADOR DO CRAS E DO

CREAS ..................................................................................................................................... 29

A ESTABILIDADE NO TRABALHO: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIOLÓGICA ... 31

O PERFIL DOS ENTREVISTADOS ...................................................................................... 33

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL: A DESCARTABILIDADE DO EMPREGADO E A

QUESTÃO DA MERITOCRACIA ......................................................................................... 34

DINÂMICA E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO .............................................................. 39

OS CONFLITOS NO TRABALHO......................................................................................... 41

OS SENTIDOS DO TRABALHO: LIBERDADE E PARTICIPAÇÃO CABEM A ESTE

PAPEL SOCIAL? ..................................................................................................................... 46

ESTABILIDADE E INSTABILIDADE: DOIS CONCEITOS ............................................... 52

MUDANÇAS: UMA ANÁLISE OBJETIVA DA TROCA DE GESTÃO MUNICIPAL

COMO REFLEXO DA INSTABILIDADE NO TRABALHO ............................................... 56

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 58

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 62

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INTRODUÇÃO

A sociologia como ciência preocupada em estudar as relações sociais, as relações

entre indivíduo e sociedade, as classes sociais e o Estado, tem importante papel no que diz

respeito à construção, implementação e efetivação de políticas públicas que garantam o acesso

da população aos seus direitos e à cidadania. Seguindo este pensamento, a compreensão do

fazer sociológico tem espaço garantido na elaboração de projetos que efetivamente garantam

este acesso supracitado (ALMEIDA, 1967).

Pensando nisso, a sociologia do trabalho tem papel central não só para a

compreensão das relações sociais abordadas por teóricos clássicos como Karl Marx, Émile

Durkheim e Max Weber, mas como cerne imprescindível para a discussão do papel do

trabalho na construção de uma sociedade interdependente.

O trabalho tem papel central nas sociedades ocidentais centralidade essa, que foi e

tem sido, em certa medida, objeto de árduos e extensos debates para os autores que pesquisam

a relação capital-trabalho, haja vista a afirmação de alguns teóricos como Juergen Habermas

(1987), Claus Offe (1989) e André Gorz (1982) de que o trabalho não mais ocupa lugar

central para a vida social na sociedade contemporânea e na sua contraposição, autores como

Ricardo Antunes (1999) afirmando que o trabalho sofreu uma reordenação estrutural na

década de 1970, mas que sua centralidade é inegável no que diz respeito às relações sociais,

bem como para a própria produção de riquezas. É sob este último viés que o presente trabalho

se pauta para se estruturar como pesquisa que diz respeito ao trabalho e o papel central que ele

ocupa na vida dos funcionários públicos da Fundação de Ação Social de Curitiba.

Esta pesquisa tem por objetivo compreender como se dão as relações de trabalho e

principalmente as condições de trabalho dos funcionários públicos da Fundação de Ação

Social de Curitiba, que são concursados e que tem, a priori, uma relação de trabalho estável.

Apesar dessa estabilidade, identificamos situações de instabilidade pelas quais passam esses

trabalhadores principalmente devido as suas condições de trabalho. Para isso, conceitos

sociológicos como conflito (SIMMEL, 1964), consciência de classe (SENNETT, 2006), papel

social (GOFFMAN, 1999), relações de poder (Bourdieu, 1989), estabilidade e sentido do

trabalho (ANTUNES, 1999) serão abordados no intuito de definir os motivos pelos quais a

instabilidade figura também no trabalho público e não só no trabalho privado.

A instabilidade no trabalho é foco de sofrimento, de frustração, que pode resultar em

doença psicológica e até mesmo problemas financeiros para muitos trabalhadores. Esta

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pesquisa pretende analisar se essas situações ocorrem também no trabalho considerado

estável, como é o caso do trabalho público.

Seguindo esta perspectiva, esta pesquisa terá como contexto também a mudança de

gestão municipal que ocorreu no ano de 2013 em Curitiba, quando o então prefeito Luciano

Ducci, dando continuidade ao trabalho do agora governador do Paraná Beto Richa, perdeu as

eleições municipais para o atual prefeito Gustavo Fruet. Juntamente com a mudança de

governo, vieram a “dança das cadeiras” de cargos no interior da Fundação de Ação Social, o

remanejamento de pessoal e o reordenamento do trabalho definido pela política nacional de

assistência social, seguindo uma nova resolução imposta pelo Ministério do Desenvolvimento

Social e Combate à Fome. Portanto, compreender de que maneira a troca de governo e, em

consequência desta troca, o reordenamento da política nacional de assistência social refletiram

nas condições de trabalho e de vida dos funcionários públicos da FAS, que vinham exercendo

suas funções seguindo determinadas diretrizes e princípios - baseados em uma lei existente

por oito anos (2005-2013), que deixou de vigorar nesta nova gestão municipal de 2013, em

detrimento de uma nova organização e estrutura de ações de trabalho -, também é objetivo

deste trabalho.

Esta pesquisa estabelece em um primeiro momento a metodologia utilizada para a

elaboração da pesquisa e as dificuldades enfrentadas para a realização e organização da

mesma. Em um segundo momento estabelece uma breve análise política e histórica da

criação, implantação e expansão da Assistência Social no Brasil, baseada na caridade e na

filantropia e retrata o desenvolvimento dessa assistência até o ponto em que se torna uma

política nacional e direito do cidadão brasileiro. Na sequencia, traz como isso se expressa na

esfera regional, isto, é do Estado do Paraná e sua política de ação assistencial local, quando

trazemos à tona o município de Curitiba e sua Fundação de Ação Social, órgão criado com o

propósito de prestar assistência social aos cidadãos que se enquadram nesta necessidade de

assistência.Para fins de análise do objeto, esta pesquisa toma como recorte o trabalho dos

assistentes sociais e a importância deste trabalho no desenvolvimento de ações da FAS e o

quadro de funcionário necessários para a aplicação das politicas públicas estabelecidas pelo

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome em Curitiba, através da Fundação

de Ação Social.

Em um terceiro momento o texto traz trechos de entrevistas com funcionários

públicos da Fundação de Ação Social que, trabalhando em conjunto com o embasamento

teórico necessário, ajudam a explicar a área de atuação e a rotina desses trabalhadores tanto na

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administração anterior quanto na gestão atual do órgão publico em que trabalham, tendo em

vista a questão da estabilidade que o trabalho público oferece. São analisados

concomitantemente a esta perspectiva os motivos pelos quais estes funcionários passam por

situações de instabilidade (já supracitadas) em seus trabalhos no intuito de responder a

questão inicial da pesquisa: Quais são as situações, no campo das relações sociais, que geram

instabilidade para o trabalho e para a vida do funcionário público da Fundação de Ação Social

de Curitiba?

Na perspectiva de comprovar a hipótese de que são as relações de conflito, de poder

e as condições de trabalho as quais são sujeitados os funcionários públicos da FAS os

principais motivos de instabilidade no trabalho, ainda nesta terceira parte do trabalho fez-se

necessário expor ao leitor as consequências que estes momentos de instabilidade acarretam

para sua vida pessoal. Para isso, tornou-se indispensável as entrevistas semiestruturadas,

envolvendo questões sobre o sentido do trabalho, as situações de conflitos no trabalho, as

mudanças mais significativas pelas quais passaram e qual seu significado para os sujeitos

envolvidos nessas mudanças, de que modo receberam e/ou se adaptaram as mudanças e até

mesmo o conhecimento que possuem a respeito do trabalho exercido por eles, no intuito de

abrir novas possibilidades de estudos sobre esta categoria de trabalho e trabalhador.

METODOLOGIA

A metodologia utilizada para o desenvolvimento e elaboração desta pesquisa é

baseada em Quivy e Campenhoudt (1988) e segue, portanto o padrão estabelecido por eles

para melhor organizar a pesquisa em si e depois a estruturação do texto.

Pelo que toca a investigação social, o processo é comparável. Importa, acima de

tudo, que o investigador seja capaz de conceber, e de pôr em prática um dispositivo

para a elucidação do real, isto é, no seu sentido mais lato, um método de trabalho.

Este nunca se apresentará como uma simples soma de técnicas que se trataria de

aplicar tal e qual se apresentam, mas sim como um percurso global do espírito que

exige ser reinventado para cada trabalho. (QUIRVY e CAMPENHOUDT, 1988, p.

13).

Em um primeiro momento se definiu a questão sociológica norteadora da pesquisa:

Quais são as situações, no campo das relações sociais, que geram instabilidade para o trabalho

e para a vida do funcionário público da Fundação de Ação Social de Curitiba? A partir da

elaboração da pergunta norteadora da pesquisa, fizeram-se necessárias as leituras

bibliográficas que poderiam auxiliar na explicação e possível resposta para a pergunta inicial.

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Depois deste passo, a elaboração da entrevista de pesquisa foi estruturada, por

considerarmos que as entrevistas semiestruturadas seriam mais proveitosos para um

levantamento qualitativo de informações à respeito das condições de trabalho dos

entrevistados. Ainda neste momento foi preciso decidir quantas pessoas e quais pessoas

seriam entrevistadas.

Devido à burocracia da FAS, não foi possível realizar as entrevistas pelos meios

institucionais, em virtude do tempo que levaria para todos os documentos exigidos para a

realização desse tipo de pesquisa: que envolveria reunião dos documentos e análise pelo

conselho deliberativo da Fundação de Ação Social de Curitiba, para só então ser permitido

realizá-las. Por isso, foi preciso procurar outros meios de consumar as entrevistas, meios estes

alcançados graças à indicação de uma pessoa conhecida dentro da Instituição.

Por esta razão, só foi possível entrevistar 5 funcionários, cada um em um

equipamento diferente da FAS, para não haver nenhum tipo de problema maior que pudesse

inviabilizar a pesquisa. E por este motivo, as análises contidas no presente trabalho são

aproximativas, sem ter a pretensão de obter uma resposta final e definitiva sobre as situações

de instabilidade no trabalho público.

Para a elaboração das perguntas semiestruturadas, optou-se por reduzir ao máximo

possível o número de perguntas que pudessem gerar respostas objetivas (sim ou não) para que

todas as respostas dadas fossem aproveitadas em sua totalidade no desenvolver do trabalho.

Por isso, foram elaborados sete tópicos, no intuito de separar por categorias de análise as

perguntas feitas aos entrevistados, que abordaram por ordem: identificação, trajetória

profissional, dinâmica e organização do trabalho, problemáticas no trabalho, o sentido do

trabalho, estabilidade versus instabilidade e por fim as mudanças no trabalho.

Após a realização das entrevistas, foi necessário analisar as informações obtidas de

maneira a selecionar as bibliografias lidas anteriormente, para poderem embasar os informes

obtidos. Pelo fato de as perguntas serem semiestruturadas, nem todos os entrevistados

responderam a todas as perguntas pré-elaboradas, ainda que todos eles tenham suscitado

questões que não estavam presentes no questionário inicial. Deste modo, para o

desenvolvimento deste texto foram necessárias outras leituras que não haviam sido feitas e

uma seleção de leituras que não ajudaram a embasar cientificamente as questões trazidas para

este trabalho de monografia. Todo o material trabalhado culminou na conclusão presente no

final deste trabalho de pesquisa. A fim de captar informações qualitativas acerca do trabalho

dos funcionários entrevistados dos CREAS, o uso de entrevista semiestruturada se fez

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necessário porque esse tipo de entrevista “colabora muito na investigação dos aspectos

afetivos e valorativos dos informantes que determinam significados pessoais de suas atitudes

e comportamentos” (BONI & QUARESMA, 2005, p. 75). Além disso, as pesquisas deste tipo

possibilitam o surgimento de novas questões levantadas pelos entrevistados que, muitas

vezes, podem ser de extrema relevância para a pesquisa (idem, 2005).

Segundo Pierre Bourdieu (1999), para a realização de uma boa pesquisa são

necessários alguns cuidados como, por exemplo: os entrevistados escolhidos devem ser, na

medida do possível, conhecidos ou indicados por pessoas conhecidas, para estimular uma

maior segurança entre pesquisado e pesquisador; a linguagem utilizada nas entrevistas deve

ser a mesma linguagem do entrevistado, a fim de evitar qualquer violência simbólica1; além

disso, o método escolhido pelo pesquisador (no caso deste trabalho, a entrevista

semiestruturada), deve se manter operante durante toda a pesquisa; contato visual e sinais

verbais de entendimento devem ser sempre emitidos ao entrevistado, para transmitir a atenção

do pesquisador no informante.

Seguindo esses critérios, as entrevistas realizadas com cinco funcionários públicos da

Fundação de Ação Social se deram em seus ambientes de trabalho, com consentimento de

suas respectivas chefias imediatas. De forma a não constranger os entrevistados perante outros

funcionários, e de maneira a adquirir um depoimento sincero de cada um, as entrevistas foram

realizadas em locais reservados, onde os funcionários se sentiam mais à vontade. Num

primeiro momento, antes de o questionário ser aplicado, houve uma apresentação da

entrevistadora sobre a instituição de ensino Universidade Federal do Paraná, uma breve fala

sobre o curso de ciências sociais e a área de sociologia do trabalho, para depois ser

introduzida a proposta de pesquisa. Todos assinaram os termos de consentimento livre e

esclarecido e souberam que poderiam parar a entrevista a qualquer momento, caso se

sentissem desconfortáveis com as perguntas.

A ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: UMA ABORDAGEM POLÍTICA

1 Segundo o sociólogo Pierre Bourdieu (1992), violência simbólica caracteriza o processo pelo qual a classe

que domina economicamente impõe sua cultura aos dominados.

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O inicio da história política2 da Assistência Social no Brasil data de 1942 - com o

governo do então presidente da república Getúlio Vargas, que teve como premissa a criação

da Legião Brasileira da Assistência (LBA)3, - e foi marcado pelo assistencialismo no sentido

mais puro da palavra, isto é, na perspectiva da caridade e filantropia. Era inicialmente

oferecida às famílias dos combatentes brasileiros que foram à Segunda Guerra Mundial

(1939-1945), que se concentravam nos centros urbanos e estavam ligadas as atividades

econômicas mais dinâmicas (DI GIOVANNI & PRONI, 2006).

Nesse assistencialismo eram ofertados serviços ligados à saúde, alimentação e

educação, concedidos primordialmente às esposas, mães e filhos desses combatentes. Aos

poucos, esses benefícios foram estendidos à população em estado de vulnerabilidade social no

Brasil, “àqueles despossuídos de propriedade, de trabalho e permeados por vicissitudes da

vida natural ou social como a velhice, as doenças, os infortúnios e as privações” (DI

GIOVANNI & PRONI, 2006, p.165).

Cabe lembrar que, na sociedade capitalista, o trabalho assalariado se constitui como

relação social primordial, e pode ser analisada enquanto condição emancipadora dos

indivíduos ou enquanto condição alienante, opressora (ARANHA e DIAS, 2009). Robert

Castel (1998) estabelece uma tipologia da sociedade salarial francesa a partir do final do

século XVIII, afirmando que é o salário que define o modo de consumo e o modo de vida dos

operários e de suas famílias, e embora a condição operária seja de caráter participativo no que

diz respeito a conquista de direitos trabalhistas (como aposentadoria, por exemplo), possui

também um viés subordinado, já que sua condição “ocupa sempre, ou quase sempre, a base da

escala” (CASTEL, 1998, p. 417).

Se a condição do operário francês era indigna no início do século XX, no Brasil, até a

década de 1960, - quando direitos como décimo terceiro salário e Fundo de Garantia por

Tempo de Serviço (FGTS) foram conquistados - a condição do assalariado era quase

degradante. “A garantia progressiva de direitos previdenciários aos trabalhadores assalariados

seria explicada como a base de um compromisso politico fundado ao mesmo tempo no

populismo e no corporativismo” (FERREIRA, 1998, p.84 e 85). Diferente da França, no

2 Segundo termo de Di Giovanni & Proni (2006), ao analisarem a questão social no Brasil por três óticas

diferentes: patrimonial (acesso à bens materiais como terra e casa própria), de rendimentos (como por exemplo o

poder de compra) e política (que garante saúde, educação, cultura etc.). 3 Legião Brasileira da Assistência foi constituída em 1942, pela então primeira-dama do Brasil D. Darcy

Sarmanho Vargas. A LBA foi um marco na história do Brasil, pois agregou à prédica legislativa o cuidado com a

população socialmente vulnerável.

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Brasil não houve uma estruturação de um Estado Social pleno e uma condição salarial onde a

maioria de trabalhadores estivesse protegida pela legislação do trabalho.

A fraca estruturação do mercado de trabalho protegido, bem como o déficit de postos

de trabalho de empregos de qualidade (aqueles com carteira assinada e direitos assegurados)

para a maioria, mantiveram à margem amplas parcelas da população brasileira, o que tornava

a assistência social uma condição básica para uma sociedade que se pretendia inserida na

modernidade nos marcos com mínimos civilizatórios. Até a década de 1980 a situação da

Assistência Social no país permaneceu estagnada, devido às condições politicas desses 40

anos (ditadura militar).

Com a transição da ditadura militar para a democracia, as demandas sociais pediam

por novas práticas assistenciais que incluíssem direitos e seguridade social. Entram, neste

momento, os movimentos sociais organizados no âmbito dos sindicatos, partidos políticos,

grupos de intelectuais e até mesmo algumas igrejas, - caso das Comunidades Eclesiais de

Base (CEBS) na Igreja Católica -, lutando pelo direito dos cidadãos brasileiros à uma

assistência social que envolvesse várias esferas de cuidados. Neste contexto surge a primeira

organização de um projeto que mais tarde seria conhecido como Lei Orgânica da Assistência

Social – LOAS (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2009).

Assim que a Constituição Federal de 1988 foi instituída no Brasil, o projeto da Lei

Orgânica da Assistência Social (LOAS) teve embasamento assegurado por lei (Artigo 194 da

Constituição Federal de 1988) para se difundir e conquistar espaço nos debates políticos

centrais da época.

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de

iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos

relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único – Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a

seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e

rurais;

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - equidade na forma de participação no custeio;

VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a

participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e

aposentados.

(Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,Titulo VIII, Cap. II, Seção

I, p.33).

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Mesmo com a pressão social, a morosidade e a burocracia política4 vigoraram e

fizeram com que o projeto de lei desenvolvido pelos movimentos sociais citados acima ficasse

estagnado desde o dia 05 de outubro de 1988 no Poder Executivo. Este tinha um prazo de seis

meses para analisá-lo e apresentar ao Congresso Nacional – que teria mais seis meses para

tornar a LOAS um projeto de lei efetivamente - um plano de benefícios que seria oferecido à

população brasileira. Porém, esse plano só foi enviado ao Congresso um ano mais tarde e, o

que era para ter ocorrido até outubro de 1989 só foi deveras regulamentado dois anos depois,

em outubro de 1991, que segundo se constitui em “uma evidência do poder do atraso com

desdobramentos estruturais para o país” (MARTINS,1994, p. 101).

Neste período de três anos que transcorreu, muitas manifestações foram realizadas e

alguns eventos ocorreram em prol da concretização da LOAS como lei de direitos aos

cidadãos. Com o projeto quase regulamentado, eis que em setembro de 1990, o então

presidente da República Fernando Collor de Melo veta a Lei Orgânica de Assistência Social.

Como supracitado somente em 1991, com o incentivo dos então deputados Geraldo Alckmin

Junior e Reditário Cassol, foi que a LOAS foi colocada em pauta no Poder Legislativo como

projeto de lei, abrindo espaço para o acontecimento do 1º Seminário Nacional de Assistência

Social. Nesse primeiro encontro a nível nacional, formou-se a Comissão pela LOAS, que teve

suas ações vetadas por falta de regulamentação politica, na medida que essa lei ainda era

apenas um projeto.(MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, 2000).

O Ministro de Bem-Estar Social em vigor no ano de 1993, Jutahy Magalhães Junior,

articula o movimento da Comissão pela LOAS com a LBA e outros órgãos da União voltados

para a população e com isso promove encontros regionais no intuito de se debater a Lei

Orgânica. No mesmo ano aconteceu a primeira Conferência Nacional de Assistência Social, e

mais uma vez o projeto de lei da LOAS, já com algumas alterações, é enviado ao Poder

Executivo, que incentivado pela mobilização social aprova o projeto e o encaminha ao

Senado. Entretanto, em meio a uma crise social, o governo brasileiro armou uma estratégia de

cunho neoliberal5 que priorizava a oferta de serviços sociais (como programas de

transferência de renda) para o público socialmente mais vulnerável (DI GIOVANNI &

PRONI, 2006), o que acabou favorecendo a trajetória da LOAS. Em dezembro de 1993, o

4 Segundo o sociólogo alemão Max Weber (2001) o conceito de burocracia política diz respeito ao aparato

técnico-administrativo de um Estado, formado por funcionários extremamente capacitados para exercerem suas

funções de forma mais racional possível. O Estado moderno, de acordo com Weber, assume o mais alto nível de

racionalização provocando, assim, formas muito mais eficientes de administração estatal. 5 Neoliberalismo diz respeito à doutrina político-econômica mais geral, formulada, logo após a Segunda Guerra

Mundial, por Hayek e Friedman, entre outros - a partir da crítica ao Estado de Bem-Estar Social e ao socialismo

e através de uma atualização regressiva do liberalismo (Anderson, 1995).

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então presidente da República Itamar Franco sanciona a Lei Orgânica de Assistência Social,

que finalmente passa a ser uma política pública.

Entretanto, este foi apenas o inicio da luta, já que muitos esforços tiveram que ser

investidos para que se implementasse em todas as regiões do Brasil esta lei que beneficiaria

uma parte muito grande da população necessitada de assistência, conforme enunciava a

diretriz da politica social LOAS, que prezava pelo auxílio aos cidadãos em situações de

vulnerabilidade e pobreza6, porém com um viés moderno de atendimento continuo e

qualificado. A Lei Orgânica foi criada com o intuito de transformar o conceito vigente e,

concomitantemente, a ação da Assistência Social no país, propondo novas estratégias com

novos atores e uma maior articulação com outras políticas sociais, de forma a se estabelecer

como direito do cidadão e dever do Estado. (Lei nº8.742, de 07 de dezembro de 1993,

Presidência da Republica7).

Isso foi possível com o auxilio da sociologia, que tem papel importante na definição

das ações assistenciais pelo fato de ser a “principal vertente científica que se propõe a estudar

os fenômenos, as organizações, as relações e os sistemas de valores sociais” (ALMEIDA,

1967, p.104). Neste sentido, a assistência social como estratégia que compreende a sociedade

como um todo visa integrar os sujeitos a esta, já que na visão de Almeida, ao se atuar num

campo desta sociedade, como por exemplo, assistir indivíduos em situação de

vulnerabilidade, isso refletirá em todos os outros campos da sociedade (economia, politica,

educação). Ainda para Almeida:

Neste conhecimento do meio concreto a que se refere a ação do Serviço Social, da

sua estrutura, das relações entre os seus componentes, das suas aspirações e

concepções, pode o Serviço Social ser largamente ajudado pelos trabalhos de

investigação sociológica. O trabalhador social encontrará neles os conhecimentos

básicos indispensáveis à construção de uma resposta válida para os problemas que

quer ajudar a resolver. (ALMEIDA, 1967, p.105).

Ainda que o “trabalhador social” (chamado de assistente social), isto é, aquele

formado em serviço social, conhecedor das teorias das ciências humanas e do direito, que

exerce a função de interventor dos problemas sociais,8 ignore, sua função é sempre incumbida

de harmonizar seus próprios valores com os daqueles a quem presta assistência e buscar 6 Segundo Adorno (2001) vulnerabilidade é “um conjunto de elementos que caracterizam as condições de vida e

as possibilidades de uma pessoa ou de um grupo – a rede de serviços disponíveis [...] - e avaliar em que medida

essas pessoas têm acesso a tudo isso. (ADORNO, 2001, p. 12). Pobreza, é um conceito que pode ser definido

como “uma condição humana caracterizada por privações sustentadas ou crônicas de recursos, capacidades,

escolhas”. (COSTA et al, 2008, p. 29). 7 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8742.htm.

8 Definição que consta do código de ética do/a Assistente Social, Lei 8662/93).

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16

garantir dignidade e o pleno exercício da cidadania para todos. Mas além da contribuição da

sociologia à Assistência Social, esta contribui e muito para abrir o leque de novas questões

sociológicas muitas vezes ainda não percebidas. Pelo fato de o “trabalhador social” estar em

campo, inteiramente envolvido nas relações entre indivíduos e entre indivíduos e sociedade,

ele está mais propicio a descobrir problemas que a sociologia não “pensaria” por si. E, embora

a sociologia seja requisito para quem se forma assistente social, a assistência social é um

campo quase inexplorado pela sociologia, haja vista que pouco se produziu até os dias atuais

sobre esta questão. Isto se deve ao fato de que a Assistência Social tem um papel muito

diferente da sociologia, já que esta, enquanto ciência, busca analisar e investigar fatos sociais

enquanto a outra utiliza-se das ferramentas cientificas da sociologia - como os dados

levantados pelas investigações e análises – e de outras ciências, para se colocar em prática

(FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SOCIÓLOGOS – FNS, 2009)

Conforme informações do Ministério Público do Estado de Goiás9, a assistência

social no Brasil obteve de inicio, tímido incentivo intelectual de sociólogos, porém no ano de

1995, o presidente da República Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, extinguiu a LBA e

criou a Secretaria de Assistência Social vinculada ao Ministério da Previdência e Assistência

Social que, com baixos recursos da União, repassou aos governos estaduais esses serviços de

ação continuada. Seguindo a mesma linha, o que antes era dever dos Estados brasileiros foi

repassado aos cuidados dos municípios. Em 1998, a CNAS10

aprovou a Politica Nacional de

Assistência Social (PNAS), que corroborou com as ações assistenciais implantadas nos 26

Estados brasileiros (FEAS – Fundos Estaduais de Assistência Social) e Distrito Federal e em

aproximadamente 3.200 municípios (FMAS – Fundos Municipais de Assistência Social).

Num ambiente de compressão das receitas fiscais em razão da estagnação

econômica e de crescente endividamento público, o Ministério da Fazenda

providenciou o contingenciamento de gastos sociais, capturou receitas vinculadas ao

orçamento social, não repassou integralmente as conferências constitucionais

destinadas a governos estaduais e municipais. E quando aumentou a carga tributária,

o governo federal priorizou o pagamento de elevados juros e submeteu estados e

municípios a um ajuste fiscal draconiano, justamente depois de ter a eles repassado

maior responsabilidade na execução de políticas sociais. (DI GIOVANNI &

PRONI,2006, p. 174)

9 Disponível em: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/41/docs/historico_da_politica_de_assistencia_social_-

_2000.pdf 10

Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS foi instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social –

LOAS como órgão superior de deliberação colegiada, vinculado à estrutura do órgão da Administração Pública

Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência Social (atualmente, o Ministério do

Desenvolvimento Social e Combate à Fome), cujos membros, nomeados pelo Presidente da República, têm

mandato de 2 (dois) anos, permitida uma única recondução por igual período. Disponível em:

http://www.mds.gov.br/cnas/sobre-o-cnas/quem-somos-e-como-funcionamos/

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17

Di Giovanni e Proni (2006) estabelecem um panorama histórico sobre o papel do

Estado moderno de garantir sistemas de proteção social a seus habitantes, nos últimos 150

anos. Para isso, começam afirmando que desde o inicio do século XX, diversos os Estados

europeus já possuíam programas de benefícios para os trabalhadores e eventualmente suas

famílias. Em segundo lugar, os autores falam a respeito de uma metamorfose do Estado,

contextualizado por Antunes (1999) quando trata da crise capitalista da década de 1970,

quando os Estados modernos sofreram mudanças também impulsionadas pelo processo de

reestruturação econômica nos meios de produção, acarretando, segundo Di Giovanni e Proni

(2006), em novas politicas de proteção social. O novo ordenamento político - advindo do

contexto da Guerra Fria (1945-1991) onde a ideologia político-econômica socialista da extinta

União Soviética disputava lugar com a ideologia político-econômica capitalista dos Estados

Unidos - e econômico, fez com que se construísse o Estado Protetor (Welfare State), que

passou a garantir os direitos de cidadania:

[...] do ponto de vista da proteção social, essa foi a primeira metamorfose do Estado

moderno: assumir a proteção e a promoção sociais como funções inclusivas e

perenes, resultantes de um processo longo, complexo e multifacetado, que envolveu

aspectos econômicos, sociais e culturais, mas principalmente aspectos políticos,

configurados no surgimento, expansão e institucionalização da cidadania,

transformando súditos em cidadãos. (ZINCONE apud DI GIOVANNI E PRONI,

2006, p. 165).

Seguindo este panorama, os autores sugerem o acontecimento de uma segunda

metamorfose do Estado, que veio com o liberalismo politico e econômico, advindo com a

ideologia do neoliberalismo que se propagou entre diversos países do mundo capitalista. Com

ele, foram realizadas reformas nos sistemas de proteção social, como a fragmentação do

Estado Protetor (as políticas públicas tenderam a se distanciar do núcleo estatal), a

mercantilização da proteção social (que passou a seguir os interesses dos setores privados) e

as mudanças ideológicas que se estabeleceram no campo que dizia respeito aos direitos

sociais (a concepção passa de proteção para assistência social). É esta categoria de mudança

ideológica que direcionou a assistência à população considerada “vulnerável”.

Dentro desta perspectiva, faz sentido analisar a história da assistência social no Brasil

e entender porque a descentralização das ações assistenciais se tornou um foco tão importante

para o Estado. Dito isso, a CNAS contribuiu para uma das maiores questões levantadas pela

LOAS: a descentralização política da Assistência Social. Com a comissão tripartite, ocorreu a

emancipação das ações sociais e, em 2003, dez anos depois da sanção da Lei Orgânica, novas

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diretrizes foram estabelecidas para auxiliar na ação efetivamente organizada e padronizada da

assistência social em todo o país: o Suas - Sistema Único de Assistência Social 11

.

O Sistema Único de Assistência Social tem suas ações divididas em duas partes: a

primeira, chamada Proteção Social Básica (PSB), abrange cidadãos em situação de

vulnerabilidade que são assistidos por projetos, programas e benefícios específicos para

auxiliá-los a saírem desta situação; o segundo tipo de ação engloba a Proteção Social Especial

(PSE) que tem como objetivo assistir, incluindo em projetos, programas e benefícios

específicos, os cidadãos que já se encontram em situação de risco social, como aqueles

indivíduos que se encontram em situação de desemprego e/ou realizam trabalhos eventuais e

informais. As ações, assim como os recursos, são planejadas pela comissão tripartite já

supracitada e precisam ser aprovadas pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).

E através da Norma Operacional Básica do Suas (NOB/Suas) de 2005, cada uma das três

partes da comissão tiveram suas competências definidas, regularizadas e devidamente

fiscalizadas.

No próximo segmento deste texto, veremos, como afirma Batinni (2012), que a

história do serviço Social no Paraná, “é caudatária da história do Serviço Social no Brasil

surgido na década de 1930”. Nessa trilha, o serviço Social surge a partir da “iniciativa

particular de setores da burguesia, respaldados pela Igreja Católica, tendo como referencial o

Serviço Social franco-belga e, especialmente na sua institucionalização, a base funcional-

tecnocrática norte-americana”. (BATTINI,2012, p. 01 ).

A HISTÓRIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL NO PARANÁ

Todavia, a história moderna da Assistência Social no Paraná teve origem antes

mesmo de a Lei Orgânica ser sancionada em 1993 e data de 1947, quando o então governador

do Estado Moyses Lupion criou a Secretaria de Saúde e Assistência Social (FERNANDES,

2008), à medida que na capital deste Estado, intelectuais, sindicatos e outros setores

interessados já se articulavam sobre a LOAS, chegando a formar um Conselho Regional de

Serviço Social (CRESS-PR). O primeiro marco da instalação da Assistência Social no Paraná

foi:

11

Sistema Único de Assistência Social –“Sistema público que organiza, de forma descentralizada, os serviços

socioassistenciais no Brasil. Com um modelo de gestão participativa, ele articula os esforços e recursos dos três

níveis de governo para a execução e o financiamento da Politica Nacional de assistência Social (PNAS),

envolvendo diretamente as estruturas e marcos regulatórios nacionais, estaduais, municipais e do Distrito

Federal” (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME). Disponível em :

http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/suas.

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a Mobilização e Organização da Sociedade Civil e de Órgãos Governamentais, que

já tivera inicio em nível nacional na luta pela aprovação da LOAS antes de 1993,

agora procura focar sua atenção na aprovação e implementação desta lei no Estado.

(PRATES, 2011, p. 201).

Com a criação da SEDS (Secretaria de Estado da Família e Desenvolvimento Social),

puderam ser desenvolvidas e devidamente sistematizadas as Políticas Públicas de Assistência

Social que juntamente com o Conselho Estadual de Assistência Social (CEAS12

) - inaugurado

em 1996 com a responsabilidade de coordenar as Políticas Públicas estaduais em

concomitância às nacionais -, na intenção de promover a inclusão social das famílias em

situação de vulnerabilidade e risco social no Estado do Paraná. Dados levantados pelo censo

2010 em concordância com dados levantados pelo IPARDES (Instituto Paranaense de

Desenvolvimento Econômico e Social) divulgados em 2009, o Estado do Paraná demonstra

alto grau de desigualdade socioeconômica em seus municípios, assim como aponta também

para um maior índice de envelhecimento de sua população em sincronismo com uma menor

taxa de fecundidade. Ademais, esses dados revelam que, assim como acontece

nacionalmente, no plano estadual há uma grande e cada vez maior densidade populacional

concentrada nas áreas urbanas do território paranaense, ainda que em 312 municípios

registre-se uma população menor do que 20 mil habitantes. Todas essas considerações

revelam as dificuldades de se implantar de modo adequado e pleno as politicas públicas de

Assistência Social no Estado em questão.

Embora não seja objeto dessa pesquisa, cabe ressaltar que um dos papeis da

sociologia está centrado justamente em desvendar essas questões que impõem dificuldades

nas ações sócio assistenciais, de maneira a desenvolver pesquisas que embasem esses pontos

cruciais como a desigualdade social e econômica, as questões de gênero, os níveis

educacionais e a concentração populacional em meios urbanos, para que se invista em

planejamentos e estratégias de ações sociais que alcancem todas essas diferentes condições. A

sociologia e o fazer sociológico no desenvolvimento de pesquisas sociais têm papel

importante para a ação da Assistência Social e do assistente social. Um exemplo é que hoje

12

Cabe também ao Conselho Estadual de Assistência Social definir as diretrizes dos programas de assistência,

assim como o repasse dos subsídios fornecidos pelo Fundo Estadual de Assistência Social (FEAS) à esses

programas e aos municípios, principalmente aos municípios que não recebem diretamente verbas da União.

(MDS. Disponível em: http://www.mds.gov.br/cnas/viii-conferencia-nacional/manual-orientador/orientacoes-

aos-ceas-criacao-da-comissao-de-acompanhamento-aos-cmas.pdf/download).

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quem chefia o Núcleo de Estudos Populacionais e Sociais do IPARDES é um doutor em

sociologia pela Universidade Federal do Paraná: Anael Pinheiro de Ulhôa Cintra13

.

O estado do Paraná, assim como os outros Estados brasileiros recebe recursos

federais para a implantação e manutenção dos programas, projetos e serviços prestados à

população em situação de vulnerabilidade e risco em seu território e cabe ao CEAS

juntamente com a SEDS decidir o destino de tais recursos.

Hoje, seguindo as diretrizes do Suas regulamentadas pela NOB/Suas, a Assistência

Social paranaense é marcada pelas constantes mudanças no que diz respeito a atuação de seus

serviços prestados à população, isto é, até 1994, a cada mudança de gestão, novas ações eram

implementadas, direcionadas a diferentes segmentos populacionais, como por exemplo à

criança e ao adolescente. Foi com a transformação da LOAS em Politica Pública que estas

ações se regulamentaram, seguindo, independente da mudança de gestão, as mesmas

diretrizes, isto porque quando uma política alça o caráter de pública, significa que ela deixa de

ser parte de um plano de governo (que pode ser alterado a cada mudança de governo) e passa

a ser política de Estado, ou seja, não desaparece com a mudança de governo. Uma vez que se

fez o recorte para a pesquisa empírica, cabe a este trabalho estudar o exercício da assistência

social através da ação do(a) assistente social, portanto, cabe ao próximo segmento deste texto

contextualizar a atividade deste profissional.

O ASSISTENTE SOCIAL

Dado o caráter das políticas públicas de assistência social (caráter este de promover

ações que atendam às necessidades sociais, principalmente àqueles cidadãos em situação de

risco e vulnerabilidade social), o papel do assistente social se faz muito importante, pelo fato

de sua formação abranger conhecimentos científicos importantes que servem como pilar para

suas posteriores ações enquanto assistentes sociais.

O fato de as ações assistenciais se regulamentarem da forma como tratamos

anteriormente favoreceu o trabalho dos assistentes sociais do Paraná.

Foi na gestão de Manoel Ribas (governador do Estado do Paraná de 1935-37) que as

políticas sociais tomaram relevo desenhando-se possibilidades superadoras da

atenção aos trabalhadores, até então efetivadas pelo sistema protetivo privado,

13

Autor da tese de doutorado “Os Pequenos Municípios no Paraná: permanências e mudanças (censo 2000-

2010)”, defendida em 29 de abril de 2013. Também foi nomeado no ano de 2009 presidente do Instituto Neo-

Pitagórico de Curitiba, fundado por Dario Vellozo em 1909).

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inicialmente familiar e sob a responsabilidade de segmentos sociais, mormente

ligados a Igreja. (BATTINI, 2012).

O trabalho do assistente social exige nível superior de formação (graduação) e

registro junto ao Conselho Regional de Serviço Social (CRESS) de seu Estado.

A atuação do assistente social se faz desenvolvendo ou propondo políticas públicas

que possam responder pelo acesso dos segmentos de populações aos serviços e

benefícios construídos e conquistados socialmente, principalmente, aquelas da área

da Seguridade Social. (CRESS-SC, 2008,s/p14

).

A área de atuação do assistente social é abrangente, a medida que o profissional

qualificado pode ser contratado por prefeituras e governos estaduais através de concursos

públicos, entidades assistências não governamentais, sistemas jurídicos, de saúde, sindicatos,

entre outros (CRESS-SC, 2008). Como classe difundida em todo o país, sua luta por melhores

condições de trabalho é tema constante nos Congressos Brasileiros de Assistentes Sociais, que

ocorrem a cada três anos no Brasil e reúnem profissionais e estudantes da área a fim de

discutir tópicos de caráter político e científico para construir uma agenda de ações da

categoria a nível nacional que vigora até o próximo Congresso.

Dentro disso, é possível pensar na questão da instabilidade do profissional social,

pelo fato de haver luta constante por garantia de direitos trabalhistas e previdenciários. Uma

conquista relevante para esses trabalhadores foi a redução da jornada de trabalho do assistente

social para 30 horas semanais, de acordo com a lei nº 12.317/2010 – DOU de 27 de agosto de

2010. Como analisa Lopes, os direitos trabalhistas:

[...]objeto central das reflexões propostas pelas entidades representativas da

categoria para este dia 15 de maio, são instrumentos poderosos de fortalecimento

das lutas do trabalho frente às iniquidades do capital. Como mediação, as políticas

públicas, lugar onde os assistentes sociais exercem majoritariamente sua prática

profissional, atendem duplamente ao tema proposto: de um lado, fazem parte do

processo que garante direitos aos seus usuários e, por outro, não se realizam com

qualidade sem que haja condições de trabalho adequadas (com direitos) para quem

opera as políticas. (LOPES, 2010, s/p 15

).

A luta pela redução da carga horária de trabalho dos assistentes sociais de 40 horas

para 30 horas semanais se deveu em grande parte, pelas exigências crescentes de atuação do

profissional e de seu desgaste físico e emocional em lidar com situações limites, isto é, como

14

Disponível em: http://www.cress-sc.org.br/servicosocial/profissao.php. 15

Márcia Lopes foi Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome no ano de 2010 e seu texto está

disponível no site: http://www.mds.gov.br/saladeimprensa/artigos/artigos-dia-do-assistente-social

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22

característica de ação de trabalho, estes profissionais lidam desde usuários de droga até

indivíduos em situação de rua. Contribui para esse maior desgaste o quadro de precarização

do trabalho, discutido por Antunes (1999), Krein (et al, 2001), Véras de Oliveira (et al, 2011)

etc... como a falta de condições reguladoras e estabilizadoras no trabalho, quer sejam direitos

garantidos, quer sejam melhores condições de trabalho (e esta categoria diz respeito tanto às

condições físicas de trabalho, como infraestrutura, quanto às condições psíquicas, como por

exemplo a exploração intelectual, a humilhação, a pressão). Neste sentido, a luta pela redução

da jornada de trabalho dos assistentes sociais tem relação com a dinâmica de flexibilização e

precarização do trabalho, do mercado de trabalho de modo geral, como assinala Raichelis,

Essa dinâmica de flexibilização/precarização atinge também o trabalho do assistente

social, nos diferentes espaços institucionais em que se realiza, pela insegurança do

emprego, precárias formas de contratação, intensificação do trabalho, aviltamento

dos salários, pressão pelo aumento da produtividade e de resultados imediatos,

ausência de horizontes profissionais de mais longo prazo, falta de perspectivas de

progressão e ascensão na carreira, ausência de políticas de capacitação profissional,

entre outros. (RAICHELIS, 2011, s/p16

).

Dentro do Estado do Paraná, a Política Pública de Assistência Social tem suas ações

de maneira descentralizada, à medida que se dividem entre os municípios, que recebem

recursos federais, assim como estaduais. Na cidade de Curitiba, o órgão responsável pelo

desenvolvimento assistencial é hoje, a Fundação de Ação Social (FAS). Sua denominação e

suas competências nesta função foram criadas em 1993, na gestão municipal de Rafael Greca,

do então PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) em substituição à Fundação

de Recuperação do Indigente – FREI, e desde então segue as diretrizes estabelecidas pela

LOAS e se integra às propostas do Sistema Único de Assistência Social. A partir de 2004, já

na gestão do prefeito Carlos Alberto Richa (2004 a 2010), a FAS passou a atuar em

consonância com as diretrizes da Política Nacional da Assistência Social - PNAS/2004 e em

2005 habilitou-se ao exercício de gestão plena, isto é, a responsabilidade de todas as ações

socioassistenciais passou a ser do município, conforme condições estabelecidas na Norma

Operacional Básica - NOB/SUAS.(FAS, 2010, s/p17

). Como nosso objeto diz respeito ao

trabalho dos funcionários que atuam na FAS , o presente trabalho considerou relevante situar

essa instituição que se constitui como órgão público responsável pela assistência social no

município de Curitiba, como revela o próximo tópico.

16

Artigo publicado por Raquel Raichelis na Scientific Electronic Library Online Brazil, Serv. Soc. Soc. nº 107

São Paulo, jul/set. 2011. Desponivel em: http://dx.doi.org/10.1590/S010166282011000300003 17

Disponível em: http://www.fas.curitiba.pr.gov.br/conteudo.aspx?idf=71

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23

FUNDAÇÃO DE AÇÃO SOCIAL DE CURITIBA

A FAS (2008, s/p18

) tem como missão “coordenar e implementar a política de

assistência social no município, para a proteção social de famílias e indivíduos em situação de

risco e vulnerabilidade social”. Suas ações estão voltadas para a Proteção Social Básica

(PSB), que preza pelo atendimento de prevenção às situações de risco, e a Proteção Social

Especial, que trabalha com as famílias e indivíduos que já se encontram como vulneráveis, no

intuito de reintegrá-los à sociedade. Este setor se subdivide em média e alta complexidade e

as ações da FAS contam com projetos de capacitação profissional, oferecidos nos Liceus de

Ofício, oficinas de integração, entre outras.

Os CREAS – Centros de Referência Especializada de Assistência Social atendem

indivíduos em risco social e/ou individual (sejam idosos ou pessoas com deficiência que

necessitam atendimento especializado, sejam crianças, adultos ou adolescentes que possuam

seus direitos violados, casos de violência contra mulher e indivíduos ou famílias moradores de

rua) no nível de Proteção Social Especial de média complexidade. Este serviço é feito por

assistentes e educadores sociais, além de outros profissionais que trabalham de forma que a

assistência seja personalizada e contínua, a fim de reintegrar estes indivíduos à suas famílias e

à sociedade. Para isso, trabalha-se diretamente com a família, na sua reorganização e

fortalecimento.

A FAS tem como objetivo maior a integração social, à medida que suas ações são

todas voltadas para integrar as pessoas e as famílias em situações de risco e/ou

vulnerabilidade à sociedade, como dissemos anteriormente. Para a sociologia, a integração

social, é um conceito muito importante e está relacionado à divisão do trabalho nos termos de

Durkheim (2010). Para esse autor, a integração social é fazer parte de uma sociedade e

usufruir de seus direitos, deveres, crenças e normas; é pertencer a um grupo. Considera que a

melhor forma de se integrar socialmente é através do trabalho e sua divisão social, que

especializa os indivíduos e cria uma rede de interdependência onde cada um é dependente do

outro de forma solidária.

Ainda sobre integração social, Robert Castel (1998), um autor contemporâneo,

estabeleceu uma análise muito significativa sobre este conceito sociológico. Para o autor, a

não integração pelo trabalho e a não inserção nas relações sociais são responsáveis pela

ausência de participação do sujeito nas “estruturas portadoras de um sentido” (Castel, 1998,

18

Disponível em: http://www.fas.curitiba.pr.gov.br/conteudo.aspx?idf=54.

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24

p.536). Essa não participação, por sua vez, cria quatro zonas móveis diferenciadas

socialmente: a de integração (que diz respeito à garantia de trabalho estável), a de

vulnerabilidade (que diz respeito à precariedade do trabalho), a de desfiliação (que diz

respeito à ausência de emprego e isolamento social ) e por fim a zona de assistência (que diz

respeito à não perda de vínculos sociais). Ou seja, coube ao Estado, nas sociedades modernas,

segundo Castel (1998), buscar atender aos indivíduos em vulnerabilidade social e assegurar

mecanismos de integração para reinseri-los na sociedade como sujeitos capazes de produzir e

consumir, assim como de participar politicamente dos assuntos do Estado.

Desta maneira, tanto o trabalho dos CREAS quanto dos CRAS tem como papel a

integração social. Os CRAS – Centros de Referência da Assistência Social, estão vinculados à

Proteção Social Básica e tem como objetivo de trabalho garantir o cuidado com os cidadãos e

as famílias em situação de vulnerabilidade social. São estes órgãos os responsáveis pelo

Cadastro Único (CADU), que serve de referência para a participação dessas famílias e

indivíduos nos programas e benefícios oferecidos pelo Governo Federal como o Bolsa

Família19

. Além disso, os CRAS são responsáveis pelos atendimentos sociais (visitas

domiciliares, entrevistas, etc.), pela inserção dessa população vulnerável em grupos de

convivência e também pela oferta de cursos de capacitação profissional, juntamente com os

Liceus de Oficio. Estes cursos oferecidos pelos Liceus englobam várias áreas e têm como

objetivo capacitar os indivíduos para sua inserção no mercado de trabalho, de maneira

gratuita. Para a melhor compreensão desta estrutura organizacional da FAS seria necessário

um organograma, onde todos os equipamentos existentes na instituição ficariam

ordenadamente explicitados. Porém, a nova gestão da Fundação de Ação Social não

disponibiliza esta informação em forma de organograma e da mesma maneira com que as

entrevistas não puderam ser realizadas de maneira formal, ficou também inviável solicitar esta

informação pelos meios “legais”, devido a burocracia interna da instituição.

Há CREAS, CRAS e Liceus de Oficio localizados nas proximidades das 9 Regionais

da Fundação de Ação Social. Cada uma dessas Regionais é responsável pela implantação e

desenvolvimento dos projetos sociais elaborados pela FAS em concordância com a NOB/Suas

na sua região. Ao todo, a FAS integra 150 equipamentos (unidades de atendimento) e órgãos

em Curitiba e 1.800 funcionários municipais, sendo destes, cerca de 270 assistentes sociais.

19

O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda que beneficia cerca de 13

milhões de famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País. O Bolsa Família integra o

Plano Brasil Sem Miséria (BSM), que tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar

per capita inferior a R$ 70 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos

serviços públicos.

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25

O trabalho do assistente social na Fundação de Ação Social de Curitiba garante,

concomitante ao trabalho dos educadores sociais, dos técnico-administrativos, dos psicólogos,

profissionais da saúde e da educação garante o funcionamento da Assistência Social prescrita

pelo Suas e implantada nacionalmente pela NOB/Suas, Todavia:

Um fator que aparece de forma recorrente no que diz respeito ao exercício da função

de assistente social diz respeito às condições de trabalho, consideradas como

determinantes para o processo de consolidação da política de assistência. Essas

condições aparecem tanto na perspectiva objetiva, como subjetiva. Portanto,

impactam de forma significativa no fazer profissional do assistente social. Entre as

condições objetivas, destacam-se as condições e meios de trabalho, caracterizadas

pela inadequação na estrutura física, recursos materiais insuficientes e inadequados,

pela ausência de transporte que viabilize tanto uma aproximação maior com as

famílias, quanto articulação com a rede. Portanto, esses fatores são referenciados

como limitadores do exercício profissional, contribuindo para a realização de ações

pontuais e emergenciais. Logo, descaracteriza a proposta de ampliação do alcance,

de socialização das informações, de articulação comunitária, levando o profissional

à realização de ações emergenciais e pontuais. Outro aspecto evidenciado nos

estudos refere-se às demandas dos usuários, caracterizadas tanto pelo volume,

quanto pela complexidade e pelo agravamento das situações de risco e

vulnerabilidade sociais. (MONTEIRO, 2011, p. 4 e 5).

Como analisa Monteiro, as condições de trabalho dos(as) assistentes sociais

apresentam dificuldades de ordem estruturais, objetivas e subjetivas, tanto no que se refere as

possibilidades de fato do assistente em fazer a sua intervenção junto ao seu público, quanto ao

volume de trabalho.

O trabalho dos funcionários públicos da Fundação de Ação Social, embora de suma

importância para o desempenho das diretrizes da Assistência Social, passa por problemas

estruturais e funcionais que tornam instáveis suas condições tanto de trabalho quanto em

condição de trabalhador. São essas condições e situações de instabilidade que a segunda parte

do presente trabalho abordará, pautada na hipótese de que as dificuldades de relações no

trabalho, as situações de conflito e as constantes reorganizações estruturais (quer nas

mudanças de gestão, quer nas mudanças dos pressupostos norteadores da política de

assistência social) são os fatores que encerram estas situações instáveis. É objetivo, portanto,

trazer à cena para a reflexão, esse trabalhador que atua na FAS, suas condições de trabalho, os

conflitos que vivencia em seu trabalho, as situações de instabilidade que observa no trabalho e

como elas interferem em sua vida pessoal.

O CONCURSO PÚBLICO E A ESTABILIDADE NO TRABALHO

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26

Prestar um concurso público significa garantir benefícios que outros tipos de trabalho

não oferecem com tanta facilidade, como por exemplo, estabilidade financeira que permite o

planejamento de gastos à medida que o salário não sofre muitas alterações, aposentadoria do

mesmo valor que o salário, auxílios como vale transporte, plano de saúde (que muitas vezes

pode englobar outros membros da família do funcionário público), além de não exigir

experiências anteriores e de não discriminar nenhum candidato por gênero, raça/etnia, credo,

orientação sexual, classe social, ou outras. O emprego público pressupõe uma carreira

vitalícia, onde não se pode ser demitido com facilidade à medida que em casos extremos em

que se precisa demitir um funcionário, é necessário processo administrativo e o funcionário

público, ainda que em estágio probatório, tem direito à ampla defesa (Art. 22, Seção V do

Estatuto do Servidor Publico, 1990).

Pressupõe também, um trabalho estruturado em normas e políticas que direcionam o

trabalho do funcionário público, tornando-o de certa forma mais facilmente executável. Desta

forma, desde os anos 1990, quando o Brasil experimentou um quadro de desestruturação do

mercado de trabalho e uma piora nas condições salariais e de segurança no trabalho como

analisam diversos autores da Sociologia e da Economia do Trabalho como Pochmann (2007),

a procura pelo emprego público é grande. Passar em um concurso ambicionam muitas

pessoas, principalmente aquelas que concluíram o ensino médio e não tiveram oportunidade

de cursar uma graduação. Ainda que a nível médio de escolaridade os empregos públicos

garantam um salário acima da média do mercado formal, muitas vezes as funções por eles

exigidos não são acessíveis à todos.

Dito isso, a procura por um emprego público se dá também extensamente por

pessoas que possuem um nível de escolaridade mais elevado (como, por exemplo, graduados

e pós-graduados), enquanto mercado de trabalho que permite de modo mais direto que se

exerçam funções correspondentes ao conhecimento adquirido na graduação. Também por ser

considerado um setor que possibilita melhor oportunidade de se ter realização profissional,

estabilidade financeira e condições de trabalho mais estáveis, com direitos assegurados se

comparadas com as condições no setor privado, em que prevalece condições de contratação

mais adversas para os trabalhadores (contratações flexíveis, contratos por tempo determinado,

terceirizado etc) e cargas horárias de trabalho amenas. Com as crises econômicas eclodindo

mundo afora, o emprego público é garantia de estabilidade quando a situação fica difícil para

todos:

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27

Nos últimos anos, a volta da roda econômica tem ressaltado [...] que a maré baixa

contribuiu para clarificar e tornar mais nítido um fenômeno que não era tão bem

percebido durante o boom: quando as coisas ficam difíceis, os indivíduos que estão

no alto da escala dispõem de maior margem de manobra e adaptação do que os que

estão embaixo. (SENNET, 2006, p.74).

Especificamente na área da assistência social, o emprego público é basicamente a

única maneira de uma pessoa com formação em assistência social atuar na área em que seus

conhecimentos são úteis e valorizados. O papel do assistente social faz com que esse

profissional seja importante para o bom funcionamento e execução das políticas públicas que

garantem a seguridade social às pessoas em situação de vulnerabilidade social. Nesse sentido,

essa profissão, no Brasil, desde suas origens até os dias atuais,

tem se redefinido, considerando sua inserção na realidade social do Brasil,

entendendo que seu significado social se expressa pela demanda de atuar nas

seqüelas da questão social brasileira, que em outros termos, se revela nas

desigualdades sociais e econômicas, objeto da atuação profissional, manifestas na

pobreza, violência, fome, desemprego, carências materiais e existenciais, dentre

outras. A atuação profissional se faz, prioritariamente, por meio de instituições que

prestam serviços públicos destinados a atender pessoas e comunidades, que buscam

apoio para desenvolverem sua autonomia, participação, exercício de cidadania e

acesso aos direitos sociais e humanos; podem ser da rede do Estado, privada e

ONG's. A formação profissional é generalista, permitindo apreender as questões

sociais e psicossociais com uma base teórico-metodológica direcionada à

compreensão dos processos relacionados à economia e política da realidade

brasileira, contexto onde se gestam as políticas sociais para atendimento às mazelas

da sociedade. (Comissão de Orientação e Fiscalização Profissional,s/p).20

Além do assistente social, o SUAS (Sistema Único de Assistência Social) prevê a

articulação desse profissional com funcionários efetivos graduados em psicologia, cuidadores

(ou educadores sociais), para o qual se exige ensino médio completo, um coordenador, que

impreterivelmente deve possuir formação superior completa, quer seja em serviço social,

psicologia, pedagogia, e auxiliares administrativos, ainda que o nível de escolaridade exigido

na maior parte dos concursos públicos na área de assistência social seja o médio completo.

(MDS, NOB/SUAS, 2006).

Dentro deste quadro de funcionários necessários para compor uma equipe de

referência da assistência social são deveres éticos inerentes a todos quando se trata da

intervenção assistencial:

a) Defesa intransigente dos direitos socioassistenciais;

20

Texto elaborado pela Comissão de Orientação e Fiscalização Profissional - COFI – CFESS em:

http://www.cress-sc.org.br/servicosocial/profissao.php.

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28

b) Compromisso em ofertar serviços, programas, projetos e benefícios de qualidade

que garantam a oportunidade de convívio para o fortalecimento de laços familiares e

sociais;

c) Promoção aos usuários do acesso a informação, garantindo conhecer o nome e a

credencial de quem os atende;

d) Proteção à privacidade dos usuários, observado o sigilo profissional, preservando

sua privacidade e opção e resgatando sua historia de vida;

e) Compromisso em garantir atenção profissional direcionada para construção de

projetos pessoais e sociais para autonomia e sustentabilidade;

f) Reconhecimento do direito dos usuários a ter acesso a benefícios e renda e a

programas de oportunidades para inserção profissional e social;

g) Incentivo aos usuários para que estes exerçam seu direito de participar de fóruns,

conselhos, movimentos sociais e cooperativas populares de produção;

h) Garantia do acesso da população a política de assistência social sem

discriminação de qualquer natureza (gênero, raça/etnia, credo, orientação sexual,

classe social, ou outras),resguardados os critérios de elegibilidade dos diferentes

programas, projetos, serviços e benefícios;

i) Devolução das informações colhidas nos estudos e pesquisas aos usuários, no

sentido de que estes possam usá-las para o fortalecimento de seus interesses;

j) Contribuição para a criação de mecanismos que venham desburocratizar a relação

com os usuários, no sentido de agilizar e melhorar os serviços prestados. (MDS,

NOB/SUAS, 2006, p.13).

Dado o caráter ético do trabalho na assistência social, torna-se mais facilmente

observável a complexidade deste. Cada profissional possui suas funções bem estruturadas

dentro do quadro de serviços prestados à sociedade pelas unidades de assistência social nos

Estados e Municípios, embora essas funções estejam intrinsecamente interligadas para uma

melhor dinâmica de prestação de serviços. Segundo Prates (2011), não só a implementação do

SUAS é um desafio, mas também sua descentralização o é, posto que deve ocorrer no âmbito

da União, dos Estados, do Distrito Federal e do Municípios, tendo, estes últimos uma

proximidade e portanto uma responsabilidade maior em relação aos assistidos, à medida que

prioriza o vinculo familiar e comunitário.

“Uma forma de colocar em prática o principio da descentralização é implantar nos

territórios de maior vulnerabilidade os Centros de Referência da Assistência Social

(CRAS21

) e os Centros de Referência Especializados da Assistência Social

(CREAS22

)[...], pois eles permitem o atendimento territorializado, intersetorial e o

21

O CRAS - Centro de Referência da Assistência Social é uma unidade pública estatal localizada em áreas com

maiores índices de vulnerabilidade e risco social, destinada ao atendimento socioassistencial de famílias. O

CRAS é o principal equipamento de desenvolvimento dos serviços socioassistenciais da Proteção Social Básica.

Constitui espaço de concretização dos direitos socioassistenciais nos territórios, materializando a política de

assistência social. (s/p.) em: http://www.mds.gov.br/falemds/perguntas-frequentes/assistencia-social/psb-

protecao-especial-basica/cras-centro-de-referencias-de-assistencia-social/cras-instituciona, acesso em 03 de julho

de 2013. 22

De acordo com a definição expressa na Lei Nº 12.435/2011, o CREAS é a unidade pública estatal de

abrangência municipal ou regional que tem como papel constituir-se em lócus de referência, nos territórios, da

oferta de trabalho social especializado no SUAS a famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social,

por violação de direitos. Seu papel no SUAS define, igualmente, seu papel na rede de atendimento. Sua

implantação, funcionamento e a oferta direta dos serviços constituem responsabilidades do poder público local e,

no caso dos CREAS Regionais, do Estado e municípios envolvidos, conforme pactuação de responsabilidades.

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29

trabalho em rede. O CRAS e o CREAS têm grande importância para o Suas, pois é a

forma concreta de descentralizar os serviços, afim de chegar mais próximo possível

de seus usuários. Estando no território das famílias, os profissionais conhecem

melhor suas necessidades e o acesso aos seus direitos fica facilitado.” (PRATES,

2011, p.86).

A descentralização, portanto, é uma condição primordial para a promoção das ações

específicas para cada localidade em que a assistência social seguindo a política pública está

implantada. Desta maneira, o atendimento passa a ser personalizado, de acordo com as

necessidades de cada população (de um município, por exemplo) e pode chegar no interior de

cada família, onde a compreensão das suas necessidades fica ainda mais facilitado.

Como destacamos a seguir, a família é o lócus privilegiado de trabalho do assistente

social. Isso implica, para esse profissional a garantia de que não só um individuo poderá ter

suas necessidades atendidas e sim toda a sua família, pilar de sua sociabilidade. Os(as)

assistentes sociais acreditam que trabalhar com a família num todo, é garantir a reinserção

completa de todos os indivíduos em situação de vulnerabilidade na sociedade. Para E.M,

assistente social entrevistada para o presente trabalho “a família é o objeto central do trabalho

porque é dela que surgem as vulnerabilidades individuais. Se um pai não tem condição de

prover para seu filho suas necessidades básicas, a chance de esse filho ir pra rua e acabar se

drogando ou traficando é maior do que se a família tivesse uma estrutura melhor”.

O PAPEL DA FAMÍLIA NA PROTEÇÃO SOCIAL: O TRABALHADOR DO CRAS E

DO CREAS

Quanto ao papel da família “[...] a família vem sendo redescoberta como um

importante agente privado de proteção social” (PEREIRA, 2009, p. 26). Neste sentido, o

trabalho de implantação da Assistência Social pelos CRAS e CREAS nos Municípios tem seu

foco na família, que sozinha “não é uma instituição considerada capaz de prover todas as

necessidades de seus membros, embora haja certa tendência de afirmação disso por parte do

Estado e do mercado” (PRATES, 2011, p. 103). Dentro desse eixo de matricialidade

sociofamiliar (SUAS, s/p), se faz necessário discutir a centralidade da família no que diz

respeito às ações socioassistenciais, já que, segundo Prates (2011), a composição familiar

Devido à natureza público-estatal, os CREAS não podem ser administrados por organizações de natureza privada

sem fins lucrativos. Dada a especificidade das situações vivenciadas, os serviços ofertados pelo CREAS não

podem sofrer interrupções, seja por questões relativas à alternância da gestão ou qualquer outro motivo. (s/p) em:

http://www.mds.gov.br/falemds/perguntas-frequentes/assistencia-social/pse-protecao-social-especial/creas-

centro-de-referencia-especializado-de-assistencia-social/creas-instituciona, acesso em 03 de julho de 2013.

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resignifica seus papéis dadas as transformações econômicas e sociais pelas quais passam

constantemente. Isso se reflete na atividade do(a) assistente social, que tem que atuar não

apenas com o indivíduo em situação de vulnerabilidade, mas sim com toda a sua família, a

fim de que o individuo possa, em primeiro lugar, se reintegrar a ela, para depois buscar se

reintegrar na sociedade. Isto complexifica o trabalho da assistência social como um todo, pois

aumenta seu leque de responsabilidade social.

A partir desta perspectiva, levando em conta que a ação do CREAS, - segundo

política do SUAS definida pelo Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome - , é

continuada e não pode ser interrompida mesmo com alternância de gestão ou qualquer outro

motivo, foi que se estabeleceu a direção tomada por este trabalho. Como já dissemos, é o

Assistente Social que atua efetivamente nessa frente. Na cidade de Curitiba, esse trabalho é

realizado pela FAS, que contém cerca de 1800 funcionários sendo 270 funcionários exercendo

a função de assistente social, ou seja, trabalhando diretamente com as famílias. Há nesta

cidade 334.339 pessoas registradas no Cadastro Único23

, num total de 111.776 famílias

atendidas, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

levantados em abril de 2013. Neste sentido, é possível estimar que cada assistente social

atende em média 123 famílias por mês no município, o que leva a necessidade de que

educadores sociais, por exemplo, desempenhem as mesmas atividades dos assistentes sociais.

Embora a pesquisa tenha sofrido empecilhos burocráticos por parte da pesquisada, no

caso a Fundação de Ação Social de Curitiba (FAS), à medida que exigia documentações que

estavam fora de alcance prático e temporal para a conclusão da pesquisa, foi por meios não

formais que as entrevistas com funcionários da desta instituição foram realizadas. Dado o

objetivo deste trabalho, em definir os motivos pelos quais os funcionários da Fundação de

Ação Social passam por momentos de instabilidade no trabalho foi que se fez necessária a

escolha de um equipamento assistencial dentro de 133 equipamentos que prestam serviço de

assistência social à sociedade, principalmente à população em situação de vulnerabilidade e

risco social.

Os equipamentos escolhidos foram os CREAS, que possuem um programa de

assistência continuada. Para preservar a identidade dos entrevistados, além de siglas de

iniciais de nomes também fictícias, não caberá a este trabalho indicar quais Regionais dentro

das nove Regionais existentes no Munícipio de Curitiba eles pertencem. 23

O Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadastro Único) é um instrumento que

identifica e caracteriza as famílias de baixa renda e permite conhecer a realidade socioeconômica dessas

famílias, trazendo informações de todo o núcleo familiar, das características do domicílio, das formas de acesso a

serviços públicos essenciais e, também, dados de cada um dos componentes da família.

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Os CREAS atendem pessoas em “situação de risco social ou violação de direitos [...]

que acontecem pela violência física, sexual, psicológica, negligência, abandono, situação de

rua e mendicância, vivência de trabalho infantil e outras formas” (FAS24

, s/p.). E é função do

Estado “[...] utilizar-se da assistência social como instrumento que busca minimizar as

contradições sociais que emergem do acirramento do conflito capital-trabalho, dando corpo às

expressões da questão social25

” (FERNANDES, 2008, P. 132). Nesse sentido, é possível

afirmar que são os municípios e suas prefeituras os maiores responsáveis pela utilização da

assistência como instrumento minimizador das desigualdades sociais e, por causa disso, são

hoje os maiores responsáveis pelos gastos das verbas sociais:

“O gasto social26

descentralizado deve ser medido para além do gasto do Governo

Federal, uma vez que as áreas de saúde, saneamento, habitação, educação,

assistência, onde as esferas local ou estadual são fortemente atuantes, se mostram

essenciais à promoção de mais bem-estar, favorecendo a inclusão social e a

equidade” (LAVINAS 2006, p. 249).

Não só os gastos sociais são distribuídos entre as esferas de proteção social – que

englobam a saúde, a educação, a habitação, o saneamento e a assistência – como também as

ações de cada uma dessas esferas criam uma rede de interdependência, isto é, uma rede em

que cada uma depende das ações das outras. Isto, de certa forma, dificulta a fluidez dessas

ações e dentro das esferas de proteção social, a assistência é a que mais depende das outras

para ter suas ações bem efetuadas, à medida que a pessoa em situação de vulnerabilidade

atendida por ela muitas vezes está sob esta condição por não ter acesso à saúde, ao

saneamento, à educação.

A ESTABILIDADE NO TRABALHO: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIOLÓGICA

Enquanto funcionários de uma instituição governamental, no caso específico da

Fundação de Ação Social de Curitiba e como foi supracitado, os pesquisados se encontram

contratualmente em situação de estabilidade no trabalho, à medida que possuem um plano de

24

Texto elaborado pela Fundação de Ação Social: Disponível em: www.fas.curitiba.pr.gov.br /nucleoRegional. 25

A questão social foi abordada por Robert Castel (1998) como a tomada de consciência por parte da classe

trabalhadora sobre sua condição de classe explorada pelo capital; Pode-se também aplicar no texto como

“questão social” a visão difundida na área de Serviço Social: “manifestação, no cotidiano da vida social, da

contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da

caridade e repressão.” (CARVALHO; IAMAMOTO, 1983, p. 77). 26

“Gasto social é aquela parte do gasto público - qualquer que seja o nível de governo – que se destina a atender

a demandas sociais” (LAVINAS, 2006, p. 255).

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carreira vitalícia garantida por lei e muitos benefícios que esse plano traz consigo como

aposentadoria integral, plano de saúde, vale transporte, entre outros.

A fim de se compreender mais a fundo a estabilidade que se quer dizer neste

trabalho, se faz necessária uma breve análise histórica que abrange as estratégias do

capitalismo27

em assegurar, segundo Richard Sennett (2006) “a longevidade dos negócios” e o

aumento do número de empregados. Essa perspectiva do capitalismo, a qual Sennett (2006)

chama de “a arte da estabilidade” marcou um período que durou mais de um século (de 1860

à 1970) e repercutiu na forma de atuar do Estado:

“Quando a lição do lucro estratégico foi transferida igualmente para os ideais de

eficiência governamental, a posição dos servidores públicos foi elevada, isolando-se

cada vez mais as suas práticas burocráticas das oscilações da politica” (SENNET,

2006, p. 29).

Todavia, ao se justapor a relação trabalho, capital e Estado como os três pilares do

capitalismo, como faz Ricardo Antunes (1999), se tem a categoria trabalho como valor de

troca a partir do capital. Antunes, em “Os Sentidos do Trabalho” (1999), fala a respeito da

crise do capitalismo que se deu na década de 1970, quando o modo capitalista de produção

que seguia o modelo fordista28

, sofreu mudanças estruturais, tanto economicamente, quanto

como forma de dominação e organização social, dando lugar a uma forma reestruturada de

produção e acumulação de capital inspirada no modelo japonês denominado toyotismo, ou

modelo de acumulação flexível29

.

O modelo de acumulação flexível é caracterizado pela valorização da ciência e da

tecnologia nos modos de produção onde, segundo Lyra e Spinelli (2007), as unidades de

produção passam a ser menores e deslocáveis, há a necessidade de a produção ser “just in

time”, precisam-se de respostas rápidas às exigências do mercado, mais capacidade de

adaptação à mudança, terceirização de atividades etc. Isso, no entanto, é apenas uma parte das

transformações mais visíveis.

27

Capitalismo aqui se refere ao conceito de Max Weber (1889) onde sob a égide de um Estado racional pautado

em um direito racional e em uma burocracia profissional é que irá se assentar o desenvolvimento do capitalismo

moderno. 28

O Modelo Fordista de produção é uma criação de Henry Ford e surge na década de 1910 como forma de

racionalização da produção capitalista. Esta racionalização se dá através da reorganização da produtividade, cuja

maior característica é a linha de montagem, onde cada trabalhador da produção exerce uma única função

repetitiva, aumentando a quantidade de produtos fabricados, reduzindo o tempo de produção e a jornada de

trabalho (HARVEY, 1993). 29

Termo criado pelo geógrafo David Harvey, na obra “Condição Pós-Moderna : uma pesquisa sobre as origens

da mudança cultural . 6 ed. São Paulo: Loyola, 1996.

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Além das mudanças nos modos de produção, o toyotismo também modificou a forma

como os trabalhadores passaram a exercer suas funções. Enquanto no modo de produção

fordista as empresas possuíam grandes espaços físicos e muitos trabalhadores, cada um

concentrado em manipular uma parte muito especifica da linha de produção, alheios à

totalidade dos processos de produção; no toyotismo se tem empresas com espaços físicos

enxutos e poucos trabalhadores, cada qual exercendo um grande número de funções, de

maneira a ocupar todo o tempo ocioso e de facilitar a compreensão dos processos produtivos.

Não obstante, além de as empresas exigirem maiores capacidades dos trabalhadores,

manipulam mecanismos ideológicos que coagem os trabalhadores a agregarem os valores da

empresa para si, “vestirem a camisa” da empresa em troca de participação nos lucros,

bonificações, etc., o que Rui Fausto (1989) chama de subordinação formal-intelectual do

trabalho ao capital. Embora o trabalho público não se enquadre no trabalho flexível pelo

ponto de vista de produção e acumulação de capital, as maneiras como os funcionários

públicos passaram a trabalhar se adequam em parte a este tipo de flexibilidade do trabalho à

medida que o embasamento operacional e técnico do trabalho, onde poucos funcionários

desempenham inúmeras atividades, revela a mudança.

Essas são mudanças, chamadas pela Sociologia do Trabalho, de “reestruturação

produtiva” que envolveram alterações de base técnica, política e econômica uma remodelação

da produção, do trabalho e das relações de trabalho que passaram as empresas e trabalhadores

no âmbito privado (Bridi, 2009; Krein, 2001). Os efeitos da reestruturação produtiva foram

sentidos pelos trabalhadores de empresas privadas. Porém, é possível afirmar que o setor

público, em certa medida, também foi afetado por esse movimento que ocorreu no setor

privado, posto que o Estado também adotou, em certa escala, processos de terceirização de

seus serviços. É o caso da FAS que possibilitou à outras organizações de cunho assistencial

estabelecer ações em parceria com seus próprios equipamentos, diminuindo a possibilidade de

abertura de novos processos seletivos para se trabalhar nesta Fundação pública.

O PERFIL DOS ENTREVISTADOS

Feita esta breve contextualização com a finalidade de trazer elementos para pensar as

questões levantadas nesta pesquisa, é possível analisar as entrevistas realizadas com os

funcionários públicos da Fundação de Ação Social, cujos nomes serão preservados,

utilizando-se iniciais de nomes fictícios , como já assinalamos anteriormente. Os entrevistados

exercem a atividade, dentro da FAS, de Assistente Social e de Educador Social, porém, como

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foi enfatizado acima, o assistente social tem papel fundamental no desenvolvimento de ações

assistenciais e por isso, os educadores sociais aqui entrevistados exercem também, o mesmo

trabalho executado pelos assistentes sociais, por motivo organizacional, dos equipamentos em

que trabalham.

Com 30 anos de idade, E.M tem curso superior completo em serviço social e ocupa o

cargo de assistente social no equipamento em que trabalha hoje. Há nove anos nesta fundação,

prestou concurso para exercer a profissão em que se graduou na universidade e sempre

exerceu a mesma função em todos os equipamentos da FAS em que trabalhou antes do atual.

Hoje, não possui um cargo considerado chefia.

D.O. tem 41 anos e é pós-graduada em gestão publica e gestão de pessoas. Prestou

concurso para trabalhar na FAS como educadora social há 8 anos e desde então trabalha no

mesmo equipamento em que trabalha hoje. Não ocupa e nunca ocupou dentro desta instituição

um cargo de chefia.

M.P., 35 anos, é formado no curso superior de serviço social e atua como educador

social na FAS, posição que ocupa devido o concurso que prestou há 10 anos. Atualmente no

equipamento em que trabalha, atua como educador social (não chefia), mas há quatro meses

era coordenador de outro equipamento, isto é, ocupava um cargo de chefia.

L.A. tem 26 anos e é formada em serviço social. Prestou concurso para a Fundação

de Ação Social como assistente social em 2012, e há quatro meses é coordenadora do

equipamento em que trabalha (cargo de chefia). Antes disso foi assistente social em outro

equipamento.

A.P. 48 anos, é formada em psicologia e prestou concurso para trabalhar na

prefeitura como educadora social há 17 anos, embora somente em 2003 passou a trabalhar na

FAS, ainda como educadora. Hoje, no equipamento em que trabalha, ocupa um cargo de

apoio técnico à chefia.

O perfil dos entrevistados portanto, é de maioria do sexo feminino (quatro entre

cinco entrevistados), com média de idade de trinta e seis anos, todos concursados com média

de serviço na FAS de oito anos. .

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL: A DESCARTABILIDADE DO EMPREGADO E A

QUESTÃO DA MERITOCRACIA

O motivo pelo qual optou-se por desenvolver essa pesquisa, foi a observação do que

aconteceu com os funcionários nessa instituição a partir da mudança de prefeito no ano de

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2013, quando os funcionários concursados adentrados no quadro próprio do funcionalismo

público municipal passaram por mudanças de cargos, de funções e de ambiente de trabalho.

Como característica deste tipo de trabalho, o funcionário público tem a possibilidade de

construir um plano de carreira se realizar cursos de capacitação, treinamentos e avaliações

para que tenha seu salário aumentado gradativamente. Mas embora o plano de carreira seja

garantia de aumento de salário, o cargo que um funcionário irá ocupar dentro da Fundação é

estritamente indicado e não conquistado por este tipo de plano. Dentro desta perspectiva, o

cargo que um funcionário ocupa dentro da FAS não corresponde necessariamente com o

cargo para o qual prestou concurso público; assim um educador social pode desempenhar

função administrativa, de chefia e até mesmo de assistente social, como relatou A.P. e está

sujeito a perder o cargo a qualquer sinal de mudança, seja ela de gestão ou de plano de ação.

Ao se indagar sobre a trajetória profissional dos entrevistados, identificou-se que,

desde o momento em que entraram na FAS, eles mudaram de posto de trabalho, de função,

por razões diversas: por vontade própria de mudar de local de trabalho, por indicação de

chefias, por mudanças de gestão, etc...

Três dentre os cinco entrevistados apontaram como motivo para a mudança de

função, a troca de gestão e a “politicagem30

” dentro da Instituição. O termo “politicagem” foi

enunciado por E.M, quando questionada se sempre ocupou o mesmo cargo dentro da FAS

(cuja resposta foi sim) e imediatamente complementou a afirmativa, informando que desde

que entrou na Fundação sempre trabalhou no mesmo equipamento, mas que há dois meses

passou a trabalhar no local em que se encontra hoje, onde ocupa um cargo de menor prestígio

dentro da Fundação, ao passo que cargos de confiança dentro da instituição são prerrogativas

dos novos gestores, os quais E.M. não tinha nenhum contato. Ao se referir ao motivo da

mudança, enunciou que se tratava de “politicagem, não politica, politicagem, exercício

politiqueiro da politica”. Neste sentido, cabe analisar a trajetória profissional de E.M como

um respeito obrigado às fronteiras ou barreiras de cunho politico que ela não pode transpor,

por não estar ao seu alcance.

Quando relatam suas trajetórias [...], mais especialmente quando estas são marcadas

por uma mobilidade social, escolar, profissional, geográfica, residencial mais ou

menos importante, os indivíduos também descrevem as fronteiras que tiveram de

respeitar ou procuraram ultrapassar, contornar ou transgredir. De fato, nessas

narrativas, as experiências de ruptura ou estabilização remetem a diferentes

30

Politicagem quer dizer política que tem por objetivo atender aos interesses pessoais ou trocar favores

particulares em benefício próprio. Política reles e mesquinha de interesses pessoais. Refere-se aos ou políticos

adeptos dessa política. Disponível em: http://www.dicio.com.br/politicagem/.

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fronteiras sociais e simbólicas a serem ultrapassadas, ou então muito difíceis,

quando não impossíveis de se transpor, as quais variam segundo as trajetórias.

(LABACHE & MARTIN, 2008,p. 334).

Esta análise também pode ser feita nas respostas dos entrevistados M.P. e A.P. O

primeiro teve como característica importante de sua trajetória profissional a perda de um

cargo de chefia há 4 meses, perda esta que ele afirma ter sido causada pela troca de gestão

municipal em 2013:

“eu tinha um cargo de chefia, né, aí mudou a gestão e não havia interesse que eu

ficasse. Aí me tiraram, mas me deram a oportunidade de escolher pra onde que eu ia,

aí já era uma vontade minha vir pra cá e aí eu optei por vir pra cá, como uma

oportunidade de fazer o que eu gosto.” (Entrevista com M.P., educador social, no dia

26 de junho de 2013).

Ao ser questionado sobre quem não tinha interesse de que ele permanecesse no cargo

em que se encontrava na antiga gestão, ele respondeu: “ah, isso é difícil de responder, porque

é tudo interesse político” (M.P. 26 de junho de 2013). A diferença de trajetória do M.P. e da

E.M ao mesmo tempo em que é acentuada é equivalente. Acentuada porque aquele, embora

tenha passado por uma mudança drástica de local de trabalho, pode escolher um novo local,

enquanto esta mantém o mesmo cargo, porém em um local de trabalho diferente; equivalente

porque ambos sofreram mudanças em suas trajetórias profissionais pelo mesmo motivo, a

troca de gestão municipal e a nova politica que veio agregada à ela. De modo geral, essas

mudanças são comuns no serviço público, nos três poderes: Executivo, Legislativo e

Judiciário. Podemos dizer que essa é uma peculiaridade do serviço público em geral, visto que

quando muda um juiz ou um presidente do Fórum, no caso do poder Judiciário, mudam

também os assessores, os diretores e até a equipe técnica. Isto ocorre também nas

universidades federais, em caso de mudança de reitor. Mas estes fatores não se devem

necessariamente á politicagem e sim às relações de convivência política e de compadrio.

No caso do Executivo aqui em análise, com a mudança de prefeito e de partido no

comando da Prefeitura, o mesmo nomeou pessoas de sua confiança ou de seu partido para

ocupar certas funções. Isso provoca situações de incertezas, de instabilidades para os

funcionários de carreira, pois eles podem ser deslocados de seus posto e realocados para

outros, muitas vezes considerados de menor prestígio. O prestigio, segundo Weber (2001) é

um dos fatores determinantes para o juízo de valor que as pessoas fazem uma das outras

dentro de um determinado grupo ou sociedade.

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A.P. também passou por situação semelhante aos dos outros dois entrevistados. Na

FAS há 10 anos, passou oito deles mudando pausadamente de equipamento, mas sempre por

receber convite de outras pessoas para ocupar cargos cada vez mais altos na Fundação. No

final de 2012 era gerente de uma das Regionais e estava responsável por toda PSB desta, ou

seja, 15 dos 16 equipamentos desta Regional estavam sob sua gerência. Porém, no começo de

2013, toda a equipe com quem trabalhava foi remanejada de equipamento, incluindo a

coordenação, e devido a este fato, ela ficou sem lugar para trabalhar: “aqui você é tratado

como um produto descartável, à medida que atende ou não as intenções da nova gestão”

(Entrevista com... em junho de 2013). Esse profissional ficou mais de uma semana em casa

até receber uma ligação de uma pessoa que a chamou para integrar uma nova equipe em um

equipamento totalmente diferente, com um cargo bem abaixo do que estava no ano anterior.

Essas mudanças, apesar de serem comuns no serviço público, são vividas pelos funcionários

como momentos de muita inquietação. Trazem implicações para a vida do funcionário e em

sua autoestima, ainda que as razões não sejam por meritocracia, mas de alterações de políticas

e de gestão.

Como característica da flexibilidade das formas de produção, a descartabilidade do

trabalhador é um fator ocorrente, fruto das nuances do sistema econômico e politico

capitalista. Entretanto, no caso do serviço público, em que os trabalhadores são concursados e

não podem ser descartados simplesmente tal como ocorre no setor privado, a flexibilidade

também acontece, na medida em que os trabalhadores-funcionários podem ser deslocados de

postos, de atividade de acordo com a conveniência das chefias.

Em Robert Castel (1998), a nova questão social surge, entre outros motivos, como a

volta da vulnerabilidade social, isto é, o retorno de uma desestabilidade vivida pelos

trabalhadores, incluindo aqueles que possuem uma aparente estabilidade empregatícia, como

os funcionários públicos, por exemplo. Neste caso, é possível falar de uma subjetiva

desestabilização dos estáveis, posto que não são os empregos dos funcionários públicos que se

põem em risco com as trocas de gestão e sim seus cargos e salários, a continuidade do

trabalho executado por eles e as condições que todos estes elementos juntos impõem para suas

vidas pessoais.

Essas mudanças são vividas de modo individualizado pelos trabalhadores e

percebidas pelos mesmos a partir de sua condição pessoal Nesse sentido, foram entrevistadas

duas pessoas que passaram por situações diferenciadas dos demais. D.O. de 44 anos, há 8 na

FAS como educadora social trabalha desde o início no mesmo equipamento e com a troca de

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gestão permaneceu nele. Para ela, sua permanência no mesmo equipamento se deve a sua

competência, embora dentro do quadro de funcionários, o educador social ocupe um status de

menor prestígio do que o assistente social, por exemplo. Outro caso que se distancia dos

demais por sua particularidade é o de L.A. de 26 anos. Ela prestou concurso para assistente

social pela FAS no final de 2012, e ingressou no trabalho em dezembro do mesmo ano,

quando assumiu o posto de assistente social num equipamento da Fundação. Depois de 2

meses neste equipamento, foi promovida à coordenadora de outro. Questionada sobre o por

quê desta promoção tão repentina ela disse:

eu atribuo essa mudança pela minha competência profissional, pelo histórico

profissional e por uma oportunidade de uma nova gestão que veio pra fazer algumas

mudanças e deu credibilidade pra quem é novo pra estar assumindo o trabalho

(Entrevista com L.A., assistente social, em 27 de junho de 2013).

A meritocracia diz respeito a conquista de posição hierárquica pelo merecimento ou

mérito e é atribuída principalmente à competência. Segundo Richard Sennett:

Quando a herança e a sucessão eram os fatos dominantes da vida para os europeus,

não poderia haver um conceito de meritocracia tal como o entendemos: o de

recompensar uma pessoa pelo trabalho que executa. [...] A moderna meritocracia

tomou forma quando as instituições começaram a se estruturar com base nesse tipo

de desigualdade (de perícia para a meritocracia). [...] Hoje, as empresas testam e

avaliam obsessivamente os empregados, para que o talento seja recompensado e,

mais decisivamente, o fracasso seja atestado e portanto legitimado. (SENNETT,

2006, p. 101-104).

Sennett (2006, p. 106), estabelece uma análise perspicaz da meritocracia, ao afirmar

que “as burocracias costumam tentar legitimar a dispensa de camadas ou categorias de

empregados alegando que permanecem apenas os mais capazes”. Para o autor, as instituições

dispensam os empregados com base em julgamentos personalizados sobre quem deve ou não

permanecer em seus cargos ou empregos. Ainda segundo o autor:

No esquema da meritocracia, o processo de avaliação do talento tem, portanto um

núcleo macio, que diz respeito ao talento entendido de uma forma especifica, como

aptidão potencial. Em termos de trabalho, o ‘potencial humano’ de uma pessoa

define-se por sua capacidade de transitar de um item a outro, de um problema a

outro. A aptidão para se movimentar dessa maneira assemelha-se ao trabalho dos

consultores, no sentido amplo. Mas a aptidão potencial já representa um corte

cultural mais fundo; temos aqui uma medida de talento prejudicial. (SENNETT,

2006, p. 108).

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No que diz respeito à aptidão potencial, Sennett (2006) afirma que ela está

totalmente vinculada ao processo de meritocracia, à medida que capta em alguém a

capacidade de “pensar de maneira prospectiva” sobre o que se pode fazer. A aptidão potencial

e a meritocracia reduzem a necessidade de experiência e ignoram o apego emocional e são

características da “modernidade liquida31

” ou o que vem a ser nas palavras de Sennett (idem)

“pura e simplesmente, a condição social do trabalho nos setores de ponta”. Essa tese explica o

discurso de L.A. sobre o porquê de sua promoção tão rápida.

DINÂMICA E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

Buscamos, em nossa pesquisa empírica compreender sobre a dinâmica e organização

do trabalho na qual estão inseridos os nossos entrevistados. Indagamos sobre os cargos que

ocupam, sobre a estrutura do local onde trabalham, sobre a organização e a dinâmica do

trabalho que exercem e sobre como percebem seus ambientes de trabalho. Dentro disto, E.M

não ocupa um cargo considerado de chefia dentro do equipamento em que trabalha e executa

seu trabalho pautado em atendimentos às pessoas em situação de vulnerabilidade social, em

realização de entrevistas e em visitas domiciliares. Como assistente social, realiza seu

trabalho de modo individual , mas necessita da ajuda de outros colegas de trabalho para dar

continuidade a ele e ainda segundo ela, seu novo equipamento de trabalho recebe uma

demanda de atendimentos muito maior do que pode suportar, deixando o ambiente conturbado

e desorganizado.

D.O. também não ocupa um cargo de chefia em seu equipamento e considera seu

ambiente de trabalho bem agitado e complicado, segundo ela “aqui é bem variado, não dá pra

prever o que vai acontecer no dia, não é um trabalho que você organiza num dia pra realizar

no outro. Aqui cada dia é um dia”. Assim como E.M, ela também enfatiza a grande demanda

de trabalho e a falta de estrutura, tanto física quanto profissional para atendê-la corretamente.

Como educadora social, D.O. sempre trabalha com a ajuda de pelo menos mais um educador,

à medida que o trabalho que executa diretamente com as pessoas em situação de

vulnerabilidade social muitas vezes é conturbado.

M.P. assim como D.O. trabalha agora como educador social em seu equipamento e

não ocupa mais um cargo de chefia. Sua atividade consiste em fazer encaminhamentos de

adolescentes em situação de vulnerabilidade para abrigos e dos abrigos para o lar, embora

segundo afirme que o seu trabalho tenha perdido o foco, já que antes atendia somente jovens

31

Expressão elaborada por Zygmunt Bauman, em Modernidade Líquida, 2000.

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em situação de rua e hoje atende qualquer jovem em situação de risco social. Seu discurso é

significativo porque direciona essa perda de foco do trabalho que é pessoal também para a

gestão atual. Ou seja, há uma interdependência entre o seu trabalho e as diretrizes políticas

que também se encontram em transição:

o trabalho tá tumultuado. É..., como vou te dizer? Está um pouco sem direção essa

nova gestão. Eles ainda não conseguiram atribuir qual é a real função desse

equipamento aqui, não sei se por conta desse reordenamento32

do SUAS ou por

conta da mudança da gestão, eu sinto que tá meio perdido. (Entrevista com M.P.,

educador social, em 26 de junho de 2013).

Trata-se de uma particularidade no serviço público, que nesse caso, a transição não

se deve a busca de maior produtividade e ou lucratividade como acontece com o setor

privado, mas devido as alterações de direcionamento nas políticas públicas que interferem

diretamente sobre o trabalho do funcionário.

Já o discurso de L.A. segue por um caminho oposto por dois motivos visíveis: seu

cargo de chefia lhe confere uma visão diferente dos fatos e sua recente entrada na FAS não

lhe fornece dados para um balanceamento das mudanças que os outros funcionários

entrevistados têm por terem presenciado a troca de gestão. Para ela, o trabalho se dá em ter

disponibilidade integral, já que o equipamento em que trabalha oferece atendimento 24 horas,

e ir há muitas reuniões, pelo fato de estar participando do reordenamento de todos os serviços

da FAS pautados na nova resolução do SUAS já supracitado. L.A. como chefia depende não

só do trabalho das outras pessoas como depende também do trabalho de outras politicas

publicas como a educação, a saúde, a habitação, posto que o trabalho da assistência social per

si, muitas vezes, não dá conta de situações que dizem respeito à saúde, por exemplo, tendo

como função encaminhar essas situações ao regimento de outras politicas públicas. Para a

entrevistada, o equipamento em que trabalha é conflituoso, estressante, frustrante, mas muitas

vezes surpreendente à medida que enfrenta muitas dificuldades de adaptação e de aceitação

por parte dos outros colegas de trabalho.

A.P. assim como L.A. também ocupa um cargo considerado de chefia. Sua função no

equipamento em que trabalha é de apoio técnico à chefia, isto é, é ela quem gere a equipe,

mas esta não está sob sua responsabilidade objetivamente e sim a dinâmica do trabalho. Isto,

32

A resolução nº 01, de 21 de fevereiro de 2013, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e

do Conselho Nacional de Assistência Social, dispõe sobre o reordenamento do Serviço de Convivência e

Fortalecimento de Vínculos - SCFV, no âmbito do Sistema Único da Assistência Social – SUAS, pactua os

critérios de partilha do cofinanciamento federal, metas de atendimento do público prioritário e, dá outras

providências.

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em sua visão, dificulta a fluidez do trabalho, visto que organiza mas não tem

responsabilidade sobre o trabalho. Desta forma, necessita do trabalho de outros para bem

exercer o seu. A.P. percebe seu ambiente de trabalho como desorganizado porque as funções e

atribuições de tarefas não estão bem direcionadas, devido à burocracia, inscrita na teoria da

burocracia de Weber (2001) como, dentre outros fatores, o aumento quali e quantitativo das

tarefas administradas pelo Estado moderno, ajustada aqui ao aumento qualitativo e

quantitativo do serviço prestado pelos equipamentos da FAS à sociedade.

OS CONFLITOS NO TRABALHO

A organização ou no caso a falta dela é provida, dentre outros motivos, pelas

situações de conflito no trabalho, posto que são também os conflitos, juntamente às questões

apontadas pelos entrevistados anteriormente, os responsáveis por tornarem o trabalho mais

moroso, mais dificultoso e portanto mais desorganizado e conturbado.. Como afirmam

Putnam e Poole (1987), o conflito é uma questão de percepção entre um ou mais indivíduos

acerca de fatores opostos ou incompatíveis de alguma forma de interação, que pode gerar um

sério problema organizacional à medida que evoca a dificuldade de se conviver em grupo e

ainda de se trabalhar em equipe. Numa visão marxista, em uma sociedade capitalista o

conflito é inerente aos processos de trabalho em que envolve interesses diversos e classes em

oposição: empregadores e empregados, dos meios de produção e vendedores de sua força de

trabalho. Em se tratando de um serviço público essas relações não são assim tão claramente

visualizadas.

Ao serem indagados sobre as dificuldades que enfrentam em seus trabalhos, os

entrevistados apontaram duas questões: a primeira diz respeito a dificuldade de conseguirem

apreender e realizar a grande demanda de atendimentos que o trabalho deles impõe

diariamente; a segunda discorre sobre a política. Para E.M é a politica social a grande

responsável pelas dificuldades enfrentadas por ela no trabalho, a medida que a nova

organização do SUAS sobre a qual seu trabalho é ordenado trouxe consigo mudanças que

abalaram a forma como a assistência social em Curitiba vinha sendo executada. Este ponto

levantado por ela foi novamente colocado em pauta quando da entrevista de M.P. as

dificuldades por ele enfrentadas se devem à falta de liderança no seu equipamento, que não

auxilia na compreensão das novas práticas de trabalho impostas pela reordenação do Suas e

assim não define qual é a sua real função no trabalho.

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Identificamos nessas falas, uma situação de crise expressas pelos funcionários. Tal

crise se estabeleceu a partir da mudança de gestão e da mudança na própria política pública. A

crise pode ser entendida como transição, analisa Bridi (2009) e toda transição é crítica, pois

implica situações de aparente falta de ordem, de caos, de incerteza...

No depoimento dado por L.A. as dificuldades enfrentadas por ela em seu trabalho

como chefia de um equipamento se devem pela falta de consciência politica dos outros

funcionários. Ela alega compreender as reclamações de seus colegas sobre as condições de

trabalho por um olhar crítico, e acaba por fazer uma análise complexa da questão que para

este trabalho é importante citar na íntegra:

quando você tem propriedade do que você esta reivindicando e dizendo numa

reunião de coordenação com a equipe que você coordena você consegue dizer, ‘olha,

a responsabilidade do que está acontecendo ou não, não é minha. Existem estas

situações, você consegue entender’. Se as pessoas têm a mesma propriedade que

você elas conseguem não ficar personificando os problemas, elas conseguem fazer

parte para trabalhar com os recursos que tem, para qualificar aqueles recursos, mas

também conseguem tencionar de uma maneira crítica e politica pra que o que está

faltando aconteça, sabe? E aí acho que é difícil para o funcionário ter essa

propriedade, ter esse tempo pra poder se apropriar, sabe, o que está acontecendo não

é culpa de uma entidade, de uma instituição. É culpa de um sistema, porém não dá

pra ficar achando que tem uma perseguição e nunca vai dar certo. Eu vou trabalhar

com o que tem e vou me fazer presente nos espaços possíveis pra poder melhorar,

mas eu percebo que não existe muito essa cultura, acho que a cultura política em

geral peca muito nesse quesito de as pessoas serem mais criticas. (Entrevista com

L.A., educadora social, em 27 de junho de 2013).

Expressa assim, os conflitos que se estabelecem entre os próprios funcionários, mas

que se distinguem entre si pela posição que ocupam na organização pública, entre quem tem

o poder de direção, (a chefia) e os demais funcionários (subordinados), que embora não

possam ser comparados com os trabalhadores do setor privado devido as peculiaridades do

serviço público, também oferecerem resistências de diferentes ordens.Ao tomar este discurso

de L.A. como um discurso coerente, pode-se fazer uma analise sobre consciência de classe. A

discussão sobre classes sociais é uma discussão cara à sociologia e é analisada por muitos

autores, entre eles Erik Olin Wright (1985), teórico neomarxista33

que explora o conceito de

classes sociais no marxismo. Segundo o autor, o conceito de classe é um conceito relacional e

ao mesmo tempo antagônico. Relacional porque está definida no âmbito das relações sociais e

33

O neomarxismo ou marxismo ocidental é uma corrente teórica inspirada das ideias exposta por Karl Marx,

nascida na década de 1920 que traz como precursor principal o teórico György Lukács (1923 - História e

Consciência de Classe). O neomarxismo reconstitui algumas das principais teorias marxistas como ideologia,

reificação e consciência de classe.

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principalmente na relação entre as classes. Antagônica porque só pode ser compreendida no

rol das relações sociais de produção e exploração capitalista.

Classes dizem respeito a localizações estáveis e estruturalmente determinadas na

esfera das relações sociais de produção; definem-se em termos de relações de

propriedade, ou seja, dos ativos produtivos controlados, e formam categorias de

atores sociais caracterizados pelas relações de propriedade que geram exploração.

De modo geral, pode-se especificar uma série de tipos de relações de classe levando-

se em conta os recursos produtivos que fornecem a base para a exploração. Classes

definem-se em termos de um mapa estrutural de interesses materiais comuns

baseados na exploração. (SANTOS, 1998, s/p34

).

Quando nos referimos a consciência de classe, nos referimos a consciência de

pertencer a um grupo estruturalmente explorado pelas relações de produção e exploração do

capital. De fato, quando se fala de consciência de classe ao mesmo tempo se fala da

identidade dos trabalhadores e de seu “entender a si mesmo” (SENNETT, 2006, p. 69). Para o

autor, antes das transformações provocadas pela reestruturação produtiva advindas desde os

anos 1970, “as pirâmides (estruturais das organizações) tinham identidades relativamente

claras e estáveis, o que era importante para o senso de identidade dos trabalhadores” (idem, p.

71). Sendo assim, entender a si mesmo é entender a posição que se ocupa nas relações sociais,

é entender a posição que se ocupa na estrutura da instituição em que se trabalha e acima de

tudo é ter consciência de classe. Segundo Poulantzas (1977), diferente da luta de classes mais

geral, no aparelho do Estado essas lutas se revestem da forma de disputa entre membros dos

diversos aparelhos do Estado, onde o reconhecimento e a posição que se ocupa são objetos de

constantes conflitos, intrínsecos à consciência de se pertencer a ordem estatal.

Em nossa pesquisa empírica, buscando ainda identificar situações de conflito, para

nós, aquelas situações que são vistas pelos próprios entrevistados como conflituosas em seus

trabalhos, como essas situações são resolvidas (se são resolvidas) e como essas situações de

conflito interferem no trabalho de cada um deles. Seguindo essa linha de questões, os

entrevistados, cada um em seu equipamento, responderam de modo muito semelhantes.

Os conflitos identificados por eles se encontravam no âmbito da relação chefia-

equipe técnica e esses conflitos podem ser explicados pela teoria dos conflitos ou sociologia

dos conflitos, originalmente proposta por Karl Marx e Friedrich Engels (1848), cujo

pensamento prevê que todas as organizações sociais e todas as relações sociais são

conflituosas porque revelam desigualdades. Essas desigualdades provem das elites

34

Artigo publicado por José Alcides Figueiredo Santos na Scientific Electronic Library Online Brazil, vol. 41,

n. 2, Rio de Janeiro, 1998. Disponivel em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-

52581998000200004.

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econômicas que detêm os meios de produção e impõe por meio do poder de sua classe social

sua ideologia sobre as classes sociais dominadas, as que não detêm os meios de produção, ou

no caso da teoria marxista, o proletariado. No caso do serviço público aqui analisado, as

relações não são entre proprietários e não proprietários dos meio de produção, mas sim

relações de poder entre funcionários públicos concursados, muitas vezes de um mesmo

processo seletivo, mas que pela posição que ocupam acabam se diferenciando entre si. Esta

relação de poder é analisada por Miliband (1987) como o controle da classe dominante

delineada por três tipos distintos: dos meios de produção, dos meios da administração e

coerção do Estado, e dos principais meios para estabelecer a comunicação e o consenso.

Ainda segundo o autor, o Estado é um grande extrator de mais-valia se analisado como

empregador, pois controla enfaticamente os meios de administração e coerção e coage para a

existência do que denomina “elite de poder”, onde há pessoas que comandam o sistema

estatal; no caso da FAS, a primeira-dama, que nomeia os coordenadores, e assim por diante.

[...]entre ambos deve-se encontrar também uma pequena burguesia substancial [...]

uma grande e sempre crescente subclasse de homens e mulheres semiprofissionais

[...] de previdência social, de controle, de coerção e de serviço do Estado –

assistentes sociais, funcionários governamentais locais, etc. Embora num nível da

pirâmide social diferente do da classe trabalhadora, tais pessoas são também, na

verdade, parte da população subordinada das sociedades capitalistas adiantadas. [...]

E o fato de serem parte da população subordinada tampouco significa que eles sejam

necessariamente conscientes de sua posição subordinada. (MILIBAND, 1987,

p.482).

George Simmel (1964) por sua vez estabelece uma sociologia do conflito sob a ótica

da sociação. Segundo o autor, a natureza do conflito é uma questão dual visto que produz

mudanças nas organizações sociais ao mesmo tempo em que estas mudanças provocam

conflitos:

“[...] do ponto de vista comum, pode parecer paradoxal se alguém perguntar,

desconsiderando qualquer fenômeno que resulte do conflito ou que o acompanhe, se

ele, em si mesmo, é uma forma de sociação. À primeira vista, essa parece uma

questão retórica. Se toda interação entre os homens é uma sociação, o conflito –

afinal, uma das mais vívidas interações e que, além disso, não pode ser exercida por

um individuo apenas – deve certamente ser considerado uma sociação. E de fato, os

fatores de dissociação – ódio, inveja, necessidade, desejo – são as causas do conflito;

este irrompe devido a estas causas.” (SIMMEL, in MORAES FILHO (org), 1983, p.

122).

Se para um de nosso entrevistados, o E.M “o conflito é inerente ao ser humano”, para

outro, são resultados de insatisfação, como podemos acompanhar: L.A.:

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eu identifico conflitos por causa da insatisfação, sabe? Os funcionários nunca estão

satisfeitos e pode ser por uma valorização, um retorno financeiro que eles não têm.

Eu ainda não consegui identificar e ter isso como algo concreto. As vezes eu penso o

que é que eles querem, porque por muito tempo a bandeira do SISMUC35

foi de

aumentar salário. Daí agora a gente tem 30%, tem isso, tem aquilo, tem aquilo outro,

mas ainda não está bom. Será que é a demanda que é muito pesada, oito horas de

trabalho pra educador social ‘eu falo educador, porque a maioria do coletivo na FAS

é educador’ é muito pesado? Eu acho pesado. Pra assistente social é seis horas, por

que pra eles tem que ser oito? Então eu acho que este tipo de coisa, sabe, que vai

criando certos conflitos interiores, dentro deles mesmos, tipo ‘será que vale a pena,

será que não vale’ continuar nesse trabalho é que vai surgindo a necessidade, e é daí

que vem o conflito (Entrevista com L.A., educadora social, em 27 de junho de

2013).

Deste modo, os conflitos não podem ser resolvidos, apenas amenizados quando os

fatores de dissociação também os são (Simmel, 1964). Assim, os entrevistados como D.O.

tentam resolver as situações de conflito em seus ambientes de trabalho expondo suas

frustrações e dialogando com os outros indivíduos envolvidos nos conflitos. Porém, nem

sempre as medidas tomadas para amenizar os conflitos são eficazes: “muitas vezes as

situações são colocadas embaixo do tapete, simplesmente não são resolvidas”, diz M.P.

Quando as tentativas de amenizar os conflitos não são eficazes, as dificuldades no

trabalho dos funcionários públicos aumentam proporcionalmente, como podemos depreender

do depoimento:

“a gente presta serviço pra sociedade. Quando tem conflito aqui e ele não é

resolvido, isso prejudica o diálogo, prejudica o bom funcionamento e a continuidade

do nosso trabalho. As vezes a gente se sente frustrado, eu me sinto frustrado

(Entrevista com M.P. educador social, em 26 de junho de 2013).

A frustração tem como sinônimo o fracasso. Richard Sennett (2006) afirma que o

fracasso é o novo tabu da modernidade:

O fracasso não é mais a perspectiva normal apenas dos muitos pobres ou

desprivilegiados; tornou-se mais conhecido como um fato regular nas vidas da

classe média36

. A dimensão decrescente da elite torna mais fugidia a realização. O

mercado em que o vencedor leva tudo é uma estrutura competitiva que predispõe ao

fracasso grandes números de pessoas educadas. [...] um dos motivos pelos quais é

difícil aliviar com dólares os sentimentos de fracasso é que ele pode ser de um tipo

mais profundo – não tornar coerente o nosso futuro, não realizar alguma coisa

35

SISMUC – Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba – CUT (Central Única dos

Trabalhadores). 36

Classe média é um conceito muito abrangente e muito discutido pelas ciências humanas e principalmente pelas

ciências sociais. Pela vertente teórica que Sennett utiliza em sua produção cientifica, classe média aqui está no

sentido usado por Weber (1974); a classe média é a classe que não detém os meios de produção e ao mesmo

tempo não executa trabalhos manuais. É a classe localizada entre os operários e os proprietários.

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valiosa em nós mesmos, não viver, mais do que simplesmente existir. (SENNETT,

2006, p.141-142).

Sennett (2006), afirma ainda que o fracasso está intrinsecamente relacionado ao

desejo de conquistar status ou uma carreira, e que estes, por sua vez, são responsáveis por

desenvolver o caráter dos indivíduos. Responder perguntas pessoais como “quem sou?”, “em

que acredito?” está diretamente relacionado com a carreira profissional dos indivíduos e com

o status que ela dispensa sobre eles. O sentido de “Beruf” (carreira, em alemão) está presente

também na obra de Max Weber (2004) e diz respeito ao desenvolvimento do caráter pessoal

estimulado pelo trabalho.

Procuraremos trabalhar e atender às ‘exigência do momento’ nas relações humanas e

em nossa vocação. Isto, porem, é claro e simples, se cada um de nós encontrar e

obedecer ao demônio que controla os cordões de nossa própria vida. (WEBER,

2004, p. 27).

Dito isto, o fracasso passa por três estágios para ser superado: o primeiro estágio está

relacionado a culpabilidade. Neste sentido, o individuo fracassado toma para si que foi vitima

de trapaça, de traição, o que desloca a culpa pelo seu fracasso para outros indivíduos. O

segundo estágio perpassa também pela culpabilidade, mas neste momento, após reflexões

sobre o trabalho e as situações ocorridas para que levassem o individuo fracassado a esta

situação, este acaba por desviar a culpa de outros indivíduos para forças externas a ele, como

por exemplo, a troca de gestão da instituição em que trabalha, ou ainda a política

organizacional de sua empresa, situação encontrada na presente pesquisa empírica. Somente

no terceiro estágio é que o individuo percebe que o sentimento de fracasso só existe porque

estava muito ligado ao seu trabalho e é neste momento que o senso de integridade aparece e

ele passa a observar que não percebeu as novas demandas, ou ainda que não correu riscos

suficientes para evitar a situação em que se encontra (SENNETT, 2006).

[...] apesar de seus vários resultados, a mobilidade empresarial descendente gera

uma condição liminar flutuante, ambígua [...] ser um executivo de mobilidade

descendente é primeiro descobrir que não se é uma pessoa tão boa quanto se

pensava, e depois acabar não sabendo quem ou o que se é. (NEWMAN apud

SENNETT, 2006, p. 158).

OS SENTIDOS DO TRABALHO: LIBERDADE E PARTICIPAÇÃO CABEM A ESTE

PAPEL SOCIAL?

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Estes pontos levantados por Sennett (2006) explicam o motivo pelo qual M.P. cita a

sensação de fracasso que o seu trabalho lhe confere ante as situações de conflito que enfrenta

como educador social. De certo modo, acreditamos que isso tem relação com o sentido que o

trabalho tem para os indivíduos. O trabalho traz conflito, sentimentos de fracasso ou de auto

realização porque importa ao individuo. Esse foi um dos aspectos , que se buscou identificar.

Desse modo, indagou-se sobre questões como participação no trabalho, liberdade no trabalho,

o papel do trabalho, a utilidade do trabalho, o reconhecimento e por fim, o sentido do

trabalho. A liberdade no trabalho é idealizada quando se procura um emprego em que se

acredita ter espaço para realizações pessoais. Liberdade, segundo André Gorz (2007), “é

aquilo que é propriamente humano e só começa além do reino da necessidade”, o que quer

dizer que o homem só é livre e pode agir de acordo com sua própria vontade a partir do

momento em que supre as necessidades do corpo e escapa da dependência do meio em que

vive. Entretanto, com o desenvolvimento das forças produtivas no capitalismo, os indivíduos

não possuem mais a possibilidade da liberdade quando adentram ao trabalho que “produz e

reproduz as bases materiais necessárias para a existência” (MARX apud GORZ, 2007, p. 23).

Dentro desta perspectiva, a liberdade no trabalho não existe, todavia, é possível

imaginar que ela exista de outra forma, quando a conjugamos com o conceito de participação

no trabalho. A participação no trabalho está relacionada ao modo capitalista de produção

flexível, onde o trabalhador deixa de ser apenas funcionário para se tornar um “colaborador”,

um integrante da empresa, possuidor de valor próprio, já que neste modelo de produção o

trabalho exige maior participação, multifuncionalidade e qualificação do trabalhador

(ANTUNES, 1999). Essa chamada à participação ativa do trabalhador é uma das

características das modalidades de gestão do trabalho no atual quadro do capitalismo. Essa se

constitui em uma das inovações adotadas pelas empresas privadas. Mas esta é uma

modalidade que se faz presente também no serviço público, ainda que com muitas

peculiaridades, que não são objetos dessa pesquisa.

Seguindo esta linha de raciocínio, quando questionados se havia liberdade dentro de

seus espaços de trabalho, foi no sentido de liberdade participativa. Os entrevistados todos

responderam que há liberdade sim, à medida que consideram poder questionar as normas, as

regras e a direção do trabalho que exercem diretamente às suas chefias imediatas. Entretanto,

o fato de participarem e de se considerarem livres para questionar não quer dizer, segundo os

entrevistados, que são ouvidos ou respondidos: “eu posso questionar, conversar, mas quase

nunca sou ouvido, pelo menos nada do que eu questionei teve retorno pra mim”, diz M.P.

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“Assim como os conflitos não são resolvidos, sempre colocados embaixo do tapete, as

perguntas que faço nunca tem respostas”, afirma também E.M

Desta maneira, participar, mas não inteiramente das atividades do trabalho abre

espaço para uma análise também proposta pela flexibilidade do trabalho que vem implicando

em novas formas de intensificação deste. Para ANTUNES (1999), a liofilização das empresas

(e aí entram também as organizações estatais, como no caso da FAS), isto é, o enxugamento

dos padrões tradicionais de produção, exige avanços tecnológicos e traz inovações

organizações no trabalho e que demanda o trabalho em grupo e indivíduos

participativos.Visando captar a relação que os funcionários entrevistados estabelecem com o

trabalho perguntamos sobre: “quais as suas tarefas no trabalho?” e “qual o sentido do seu

trabalho para você?”.

Os depoimentos revelam que as atividades dos funcionários entrevistados são

variados, estipulados pelas suas funções (estabelecidas ou não pelo cargo que prestaram

concurso para ocupar). E.M como assistente social, tem como tarefa fazer trabalho de campo

(no sentido de ter que ir às ruas realizar seu trabalho), realizar entrevistas, encaminhar

indivíduos em situação de vulnerabilidade às politicas públicas pertinentes a seus casos

individuais, etc. D.O., como educadora de um equipamento da FAS, tem como tarefa educar e

orientar os indivíduos atendidos pelo equipamento em que trabalha, realizando dinâmicas e

atividades criadas por pedagogos sociais. M.P., também educador, atividades muito parecidas

com a de D.O. É de sua responsabilidade, em suas palavras: “ensinar coisas boas para os

atendidos, para que levem mudanças boas para suas vidas”. L.A. tem como cargo definido

pelo concurso que prestou há pouco tempo, a assistência social. Hoje, em cargo de chefia, seu

papel é o de coordenar as ações dentro do equipamento, direcionar os trabalhos segundo uma

linha de proteção social e dar sugestões. Já A.P. prestou concurso para ser educadora social,

mas hoje seu papel no equipamento em que trabalha é o de apoiar a coordenação em todas as

suas atribuições, com foco nas questões administrativas e de processos de trabalho.

Para analisar melhor a questão das atividades que desempenham em seus trabalhos, o

conceito de papéis sociais de Erving Goffman (1999) se faz pertinente à título de

complementariedade. Segundo essa teoria, os indivíduos interagem uns com os outros

seguindo normas de comportamento, ou representando papéis sociais, à medida que são estes

papéis os responsáveis pela análise e conhecimento do outro num determinado espaço. Para

esta teoria, os indivíduos, ao interagirem uns com os outros, tem que levar em conta algumas

informações para bem representarem seus papéis, sendo estas informações o espaço em que se

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encontram, o grupo com que interagem, etc. Desta forma, espera-se que os indivíduos

ignorem seus sentimentos pessoais quando estiverem em grupo e ajam de maneira aceitável a

todos, a fim de evitar “conflitos dos papéis sociais”, isto é, para evitar a mistura dos papéis

sociais que cada indivíduo interpreta. Quando os indivíduos não conseguem separar seus

papéis de acordo com o contexto, a probabilidade de ele não ser bem aceito em seus grupos é

grande, e isso pode refletir inclusive na imagem profissional e nas relações profissionais

destes. Em parte, isso pode explicar alguns dos conflitos identificados nos depoimentos

recolhidos.

Quanto ao sentido do trabalho, existem inúmeras produções sociológicas voltadas

para o tema e dentre elas destaca-se aqui a de André Gorz (2007) cuja análise reflete a

respeito do surgimento do trabalho como o entendemos hoje:

O que chamamos ‘trabalho’ é uma invenção da modernidade. A forma sob a qual o

conhecemos e praticamos, aquilo que é o cerne de nossa existência, individual e

social, foi uma invenção mais tarde generalizada, do industrialismo. O ‘trabalho’ no

sentido contemporâneo do termo, não se confunde nem com os afazeres, repetidos

dia após dia, necessários à reprodução e à manutenção da vida de cada um; nem com

o labor, por mais penoso que seja, que um individuo realiza para cumprir uma tarefa

da qual ele mesmo e seus próximos serão os destinatários e os beneficiários; nem

com o que empreendemos por conta própria, sem medir nosso tempo e esforço, cuja

finalidade só interessa a nós mesmos e que ninguém poderia realizar em nosso lugar.

[...] trabalho, fundamento da existência da sociedade, ao mesmo tempo sua essência

e sua finalidade última. Pois, a característica mais importante desse trabalho –

aquele que ‘temos’, que ‘procuramos’, ‘oferecemos’ – é ser uma atividade que se

realiza na esfera publica solicitada, definida e reconhecida útil por outros além de

nós e, a este título, remunerada (GORZ, 2007,p. 21).

Esta analise se volta para o surgimento do trabalho num sentido contemporâneo, que

floresceu após o século XVIII, meados do século XIX, quando ganhou sentido duplo, já que

ao mesmo tempo em que significa meio de subsistir também significa modo de vida. (GORZ,

2007). Dentro desta perspectiva, Weber (2004) entende que o trabalho na lógica capitalista,

seguindo a ética protestante, passou de labor a uma instituição repleta de ideologia e cultura

motivada pela racionalidade capitalista. Desta forma, a lógica da racionalidade econômica

expôs os trabalhadores à destituição de suas personalidades e de seus desejos próprios em prol

de fins que lhes são alheios (GORZ, 2007).

Motivo de infelicidade para muitos, os funcionários públicos entrevistados, embora

sobrecarregados, se sentindo de certa forma atados pelos conflitos, encontram em seu trabalho

um sentido que lhes traz satisfação. Este sentido de realização profissional, atribuído a

possibilidade em atuar na área em que se formaram efetivamente, está explicito em suas

respostas, quando questionados: “o seu trabalho tem sentido para você?”. E.M afirma que “o

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meu trabalho tem sentido para mim porque foi o que eu escolhi fazer da minha vida”. D.O.

diz: “Por mais cansativo e estressante que seja, é gratificante ver que às vezes o meu trabalho

modifica a vida das pessoas que atendo”. Já M.P. responde: “Eu me sinto estagnado no meu

trabalho agora, porque não estou onde gostaria de estar, mas antes disso sempre senti orgulho

e sempre fez sentido para mim ser educador, porque foi a forma que encontrei de me

satisfazer enquanto ajudo o outro”. E.A.P., recentemente no serviço público vê que “atuar na

área que eu me formei, onde eu sempre acreditei que ia ser feliz, para mim está sendo

gratificante” e finalmente para A.P. a satisfação de poder fazer o que gosta é todo o sentido de

seu trabalho.

As pesquisas sociológicas demonstram que essa possibilidade de atuar na área de

formação tem sido bastante restrita. Por isso, os entrevistados, dessa pesquisa, conscientes das

dificuldades impostas pelo mercado de trabalho altamente competitivo e excludente

identificam o fato de poderem trabalhar na área de formação como uma satisfação em si.

Quando não adentrados na lógica capitalista de disputa por trabalho, de competição,

de produção acirrada, de metas abusivas, de exploração é compreensível a satisfação no

trabalho que esses funcionários exemplificaram, mas há uma dimensão a considerar que se

refere ao reconhecimento do trabalho. Ao mesmo tempo em que o trabalho que exercem tem

sentido para os entrevistados, o reconhecimento de seu trabalho perante os outros, muitas

vezes, é fator de descontentamento.

A teoria do reconhecimento elaborada por Axel Honneth (2003), mostra que a luta

pelo reconhecimento individual perante a sociedade vem da consciência que ele tem de ser

um sujeito de direito. O autor analisa a transição para a modernidade como uma mudança

estrutural da sociedade, em que o status já não é mais levado em conta perante as leis do

direito, o que faz com que as leis de reconhecimento sejam gerais e abranjam a todos. Dentro

desta teoria, o reconhecimento também perpassa pela esfera da solidariedade, onde os

indivíduos seriam reconhecidos socialmente por suas contribuições sociais repletas de valores

fundantes da sociedade a qual pertence (HONNETH, 2003). É este segundo aspecto da teoria

do reconhecimento de Honneth (idem) que buscamos refletir a partir de nossa indagação se

eles (funcionários entrevistados) se sentiam reconhecidos pelo seu trabalho Os depoimentos

revelam situações díspares , pois ao mesmo tempo em que encontram satisfação e mesmo

sentido no trabalho que realizam, não identificam que haja reconhecimento, como atestam os

depoimentos analisados.

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E.M não se sente reconhecida no trabalho porque foi transferida do equipamento em

que trabalhou durante 9 anos sem ao menos ser consultada. Já D.O. está no equipamento em

que trabalha hoje há 8 anos e por este fato, acredita que seu trabalho é reconhecido por todas

as chefias que já passaram por seu ambiente de trabalho. Diferentemente disso, M.P. não

enxergou nenhum reconhecimento do trabalho que vinha executando há quatro anos como

coordenador quando foi rebaixado ao cargo de educador e transferido de unidade de trabalho.

“Já não bastasse ter meu salário reduzido, ter meu cargo retirado e ter meu ambiente de

trabalho trocado, ver o trabalho que eu estava realizando há 4 anos ir por ralo abaixo é o

sinônimo do não reconhecimento, é humilhante.” Em contrapartida, L.A. passou por processo

inverso ao de M.P. Com apenas 2 meses de trabalho foi promovida a coordenação do

equipamento em que trabalha hoje: “para mim não poderia ter acontecido reconhecimento

melhor do meu trabalho do que ter sido promovida tão cedo a um cargo tão alto como eu

ocupo agora”, afirma. Já A.P. continua exercendo a mesma função que exercia na outra

unidade em que trabalhava, o que significa para ela um “meio reconhecimento”: “Eu não fui

rebaixada, mas também não fui promovida de cargo, estou estagnada, só troquei de ambiente

de trabalho”, afirma.

Ser ou não reconhecido, depende das promoções e das mudanças de posições na

estrutura da organização consideradas de maior ou menor prestígio dentro da instituição. São

essas mudanças de ambiente de trabalho, os rebaixamentos de cargo, as diminuições de

salário, o foco deste trabalho. Tais mudanças denotam instabilidades por que passam alguns

funcionários, em momentos de mudança de gestão. A instabilidade que os funcionários

públicos da Fundação de Ação Social sofrem em seus trabalhos tem como motivo estas

situações apontadas por eles, subjetivamente, por que traçaram relações entre perguntas e

respostas que trouxeram esta pesquisa a este ponto crucial.

A diferença entre estabilidade e instabilidade é primeiramente linguística:

Estabilidade37

significa qualidade daquilo que é estável; equilíbrio; firmeza; segurança;

situação de um empregado que, depois de dez anos de serviço permanente numa empresa, não

podia ser demitido, senão nos casos previstos por lei. Instabilidade38

tem como significado:

qualidade de instável; falta de estabilidade; falta de permanência; fase de transição entre

desorganização e reorganização social.

A estabilidade do trabalho do funcionário público está intrínseca ao próprio caráter

do trabalho, cuja característica é a prestação de um concurso público para conquistar uma

37

Segundo Dicionário Michaelis da Língua Portuguesa, Ed. Melhoramentos. São Paulo, 2009. 38

Segundo Dicionário Michaelis da Língua Portuguesa, Ed. Melhoramentos. São Paulo, 2009.

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vaga. Esta vaga é vitalícia e só é ocupada por outra pessoa quando quem a ocupa se aposenta

por tempo de trabalho prestado. Ainda assim, a estabilidade também está relacionada com o

equilíbrio financeiro que o funcionário público concursado conquista ao longo dos anos de

serviço prestado à sociedade e a certeza de que não terá nenhum desconto salarial fora da

normalidade, sem contar os benefícios que este tipo de trabalho traz aos indivíduos, que

garantem vale transporte, vale alimentação, plano de saúde e aposentadoria integral. Portanto,

deste ponto de vista todos os funcionários públicos são estáveis. Entretanto, como revela

nossa pesquisa, os mesmos vivenciam situações de instabilidades, como vimos anteriormente,

nas mudanças que se processam com a troca da gestão municipal que atinge uma parcela,

ainda que reduzida, dos funcionários, fundamentalmente aqueles que ocupavam cargos de

direção.

ESTABILIDADE E INSTABILIDADE: DOIS CONCEITOS

No intuito de pensar essa relação Estabilidade e Instabilidade buscamos identificar as

situações que levam o trabalho dos funcionários públicos a se tornar instável (no sentido de

situação de crise e insegurança), mesmo com todas as garantias que a estabilidade assegurado

para esse tipo de trabalho. A primeira questão levantada aos entrevistados foi: “Você

considera seu trabalho estável? Por quê?”. Os depoimentos foram os mais variados possíveis.

E.M afirmou não considerar seu trabalho estável por causa da “politicagem”, já explicada

tópico 4.5 de perguntas, ao passo que D.O. alega que a estabilidade financeira seja o motivo

pelo qual seu trabalho seja sim, estável.

M.P. acredita que a estabilidade em seu trabalho exista por ser concursado, o que

garante a sua permanência do trabalho independente de qualquer situação externa. L.A. afirma

que seu trabalho é, sim, estável, também por se tratar de um concurso o qual ela passou, mas

ao mesmo tempo afirma que o seu cargo não é estável, por sempre haver remanejamento na

estrutura de cargos dentro da FAS. A.P. Analisou que seu trabalho não é estável ao passo que

seus cargos e funções sempre são descartados a seu contragosto.

A instabilidade surge como a negação da estabilidade no sentido de equilíbrio, de

inalterabilidade, de controle. Quando o funcionário público se depara com a falta de controle

sobre seu próprio trabalho, sobre seu próprio cargo e até sobre seu próprio salário, a

estabilidade que imaginara encontrar neste tipo de emprego se refere apenas a relação

contratual de fato. Há outras dimensões a considerar, ou seja, as situações, elementos que

tornam seu trabalho instáveis, o que nos permite pensar em instabilidades também dentro do

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serviço público estável mais visíveis do que se estivesse sujeito ao mercado de trabalho

convencional, onde a concorrência, a economia, a incompetência são dispositivos certeiros de

instabilidade.

Para essas situações captadas a partir das indagações “Você identifica situações em

que seu trabalho se torna instável? Que situações são essas? A que (ou quem) você atribui

essas situações de instabilidade?” - feitas aos entrevistados tiveram posições diferenciadas

para o que consideram estável em seus trabalhos, assim como quanto ao que consideram,

instável. E.M afirma enfrentar situações instáveis em seu trabalho, como os conflitos, a

politicagem e a falta de organização, provindas, segundo ela, do trabalho em equipe. Afirma:

Trabalhar em equipe é uma coisa que naturalmente vai gerar conflito, porque as

pessoas são instáveis39

e fora isso a gente depende dos outros pra fazer nosso

trabalho. Quando o trabalho não tem uma continuidade, as coisas ficam instáveis

(Entrevista com E.M., assistente social, 25 de junho de 2013).

D.O. também percebe que a instabilidade provém da não continuidade do trabalho.

Embora ela tenha sido a única dos entrevistados a não perder o cargo ou não trocar de local de

trabalho nos últimos meses, percebe que o trabalho que vinha seguindo com outra chefia em

seu equipamento não é mais o mesmo trabalho que efetua hoje. Para ela, essa mudança gera

instabilidade no trabalho e na vida pessoal também:

eu acho que a instabilidade é mais emocional mesmo. Tem dias que o trabalho é

bem agito e você sai daqui bem abalado, porque não consegue fazer o que tem que

fazer. Mas acho que é mais porque eu ainda não me acostumei com o novo tipo de

trabalho que eu tenho que fazer agora, com essa nova chefia. Mudou tudo, né? Tá

tudo instável. (Entrevista com D.O., educadora social, em 28 de junho de 2013.)

M.P. credita as situações de instabilidade que identifica à operacionalização do

trabalho, que não funciona, e também ao remanejamento de cargos.

A operacionalização acaba tornando o trabalho instável. Às vezes você tem vontade

de sair fazer outras coisas, mas por conta de precisar trabalhar e precisar do dinheiro

você acaba ficando acomodado, ainda mais porque não tem pra onde se mexer aqui.

A gente faz o que os outros mandam e as vezes o que os outros mandam você vê que

não dá certo. (Entrevista com M.P., educador social, em 26 de junho de 2013).

39

Instabilidade neste sentido está ligada ao viés psicológico de instabilidade emocional, bem elaborada por Mark

Twain (sem data), onde a instabilidade emocional é caracterizada por fácil irritabilidade, dificuldade de

concentração, sensibilidade e humor imprevisível.

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Já na resposta da coordenadora L.A. as situações de instabilidade se dão devido às relações de

poder: “aqui é um campo minado. As pessoas são minadas. Você tem que tomar cuidado com

o que você fala, com quem você fala, porque estão toda hora querendo estar onde você está”,

diz ela. Isso nos remete as relações de poder, poder esse, definido por PERISSINOTTO

(2007) parafraseando Bourdieu (1989) e Foucault (1982) como:

uma estrutura de relações que distribui os indivíduos em posições hierarquizadas,

definindo acessos desiguais a recursos sociais estratégicos. Entretanto, tal estrutura,

por efeito da luta simbólica que a envolve, apresenta-se aos atores sociais

(dominantes e dominados) como ‘legítima’, ‘natural’, ‘necessária’, ’consensual.

(PERISSINOTTO, 2007, p.4-5)

As relações de poder podem ser entendidas também por um viés objetivista, que não

leva em conta o fator histórico, elaborada pelo sociólogo Max Weber (1984), que descreve

que “poder significa a probabilidade de impor a própria vontade dentro de uma relação social,

mesmo que contra toda resistência e qualquer que seja o fundamento dessa probabilidade”

(WEBER apud PERISSINOTTO, 2007, p.6). Neste sentido, as relações de poder expostas por

L.A. são caracterizadas pelas relações hierárquicas construídas dentro da organização

institucional na qual trabalha, no caso a FAS, em que cada segmento, ou cargo, obedece a

ordens de cargos mais elevados, constituindo uma cadeia de obediência disposta em “quem

manda em quem, quem obedece quem”. Com isso é justificável a fala da entrevistada que diz

respeito a quererem ocupar seu lugar, que na ordem hierárquica da instituição é considerado

um lugar de poder, privilegiado.

Por fim, A.P. acredita que as situações de instabilidade que percebe em seu trabalho

provêm da falta de organização da chefia, que não define a operacionalização do trabalho e

“nem dá conta de sua função como chefe”, em suas palavras. “A falta de liderança gera

instabilidade para o restante da equipe, que não se sente estimulada e nem valorizada pela

chefia”, diz ainda.

Sobre liderança, Barroso (2003) discorre:

A explosão emocional que experimentam as multidões, a que Durkheim chamou

efervescência é um lado dos sentimentos produzidos pela vida grupal. O acalento, o

poder e, sobretudo a exclusão são também sentimentos da vida em grupo, mas existe

um sentimento poderoso posicionado na outra ponta da efervescência. É o

sentimento de comando sobre os destinos do grupo. Tal sentimento, geralmente

experimentado por uma só pessoa, é o que podemos chamar de fenômeno da

liderança. (BARROSO, 2003, p. 01).

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Neste aspecto, pode-se compreender porque a falta de liderança é vista por A.P.

como um motivo de instabilidade para o seu trabalho, e também de seus colegas, à medida

que é o líder quem guia o que deve ser guiado, no caso, o trabalho realizado pelo equipamento

em que lidera. Essa situação tem relação com a própria natureza do trabalho realizado nessa

organização, a de atender pessoas em situação de risco social. Não há como ter uma produção

ou atividade de trabalho massificada, mas individualizada. As reinvenções são cotidianas e as

dificuldades em atendê-las podem ser percebida como falt de experiência.

Essas situações de instabilidade se refletem, em certa medida, nas suas vidas

pessoais. O trabalho exercido pelos funcionários entrevistados lhes é apresentado como

vocação40

, posto que se sentem úteis para a sociedade. “Sentir-se útil significa contribuir com

algo de importância para si e para os outros” (SENNETT, 2006, p. 172).

Valores mais consequentes em matéria de utilidade manifestam-se em dois terrenos:

entre trabalhadores remunerados do serviço publico e entre as pessoas que realizam

trabalhos domésticos não-remunerados. (SENNETT, 2006, p. 174).

Como um dos resultados da avalanche neoliberal das últimas décadas do século XX,

o trabalho do servidor público passou a ser tachado por setores da sociedade como

ineficiente, posto que é comum ouvir que funcionário público não trabalha e, até mesmo no

pensamento e no discurso do funcionário público essa premissa de concretiza, à medida que

“sabem, por experiência própria que essas pirâmides burocráticas públicas são rígidas e

avessas ao risco” (SENNETT, 2006, p. 174).

A instabilidade que os funcionários entrevistados enfrentam em seus trabalhos

refletem diretamente em suas vidas pessoais, à ponto de D.O. ter precisado fazer um ano de

terapia (acompanhamento psicológico) por não conseguir separar a vida profissional da

pessoal, e levar sempre, os problemas do trabalho para casa: “precisei fazer terapia, porque

chagava em casa e chorava muito. As frustrações são muito grandes e as dificuldades

também. As vezes você sabe o que pode fazer pra melhorar o trabalho, mas não pode porque

não é chefe, não tem espaço.”

Enquanto D.O. precisou de terapia para ajudá-la a enfrentar os problemas no

trabalho, E.M afirma que se sente desanimada:

me sinto desanimada, sabe? Eu estava fazendo um trabalho legal na ultima gestão, a

chefia era incentivadora e o trabalho estava caminhando bem. Mas agora eu me sinto

40

Fazendo apologia à obra de Max Weber: Ciência e Política: duas vocações (2001).

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desanimada, desmotivada, tá tudo tão desorganizado, sem sentido. (Entrevista com

E.M., assistente social, em junho de 2013).

Assim também se sente M.P. que alega que até seu humor foi afetado pelas situações

instáveis que enfrenta no trabalho. Ele afirma não gostar de levar assuntos do trabalho para

casa, mas que está cada vez mais difícil não fazer isso, porque se sente estressado, cansado e

desmotivado.

Até L.A. em seu cargo de chefia afirmou que não consegue separar a vida

profissional da pessoal, porque a vida profissional dela ocupa muito mais tempo e espaço em

sua vida como um todo, que não consegue distinguir mais a profissional L.A. da pessoa L.A.

A noção de que o trabalho influi na saúde física e psíquica do trabalhador é uma

noção explorada pela sociologia e aparece na obra de Friedmann e Naville (1962) que fazem

uma análise da saúde do trabalhador na era fordista, em que as linhas de produção exigiam

muitas horas de concentração e esforço físico voltado para a mesma função de “apertar

parafusos”. Marx (1968), em O capital, analisou as condições as quais os trabalhadores eram

submetidos após a Revolução Industrial e constatou que as extensas cargas horárias, as

atividades mecanizadas, isto é, a organização do trabalho em si, era prejudicial à saúde física

e mental dos trabalhadores.

Esta questão analisada por Marx (idem) pode ser compreendida hoje, depois do

emprego do modelo de produção flexível, sob o ponto de vista de que o trabalhador deixou de

exercer uma atividade para executar, em um determinado espaço de tempo inúmeras

atividades, o que exige capacidade, qualificação, e dedicação do trabalhador à empresa em

que trabalha. Esta dedicação, abraçada a noção de vocação para o trabalho são os fatores que

mais prejudicam a saúde do trabalhador, pois exigem a totalidade de seu âmago (fator que

corresponde a “quem sou eu?”) e, desta maneira, acabam por tornar as frustrações vivenciadas

pelos trabalhadores objetos de extrema relevância para suas vidas.

MUDANÇAS: UMA ANÁLISE OBJETIVA DA TROCA DE GESTÃO MUNICIPAL

COMO REFLEXO DA INSTABILIDADE NO TRABALHO

Regido por estas considerações, este trabalho ruma para o ultimo tópico que cumpre

também a função de sistematizar a nossa hipótese de pesquisa: a de que as mudanças de

gestão se constituem em um dos fatores que trazem instabilidade para e no trabalho dos

funcionários públicos. Tal mudança ocorreu sob o regimento da troca de gestão municipal

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ocorrida em 2013 (do então regimento de Luciano Ducci para o atual governo de Gustavo

Fruet).

Ainda que haja outros fatores decorrentes da natureza do trabalho, considerou-se que

o principal motivo organizacional para a instabilidade que se instalou desde o segundo

semestre de 2012 no trabalho deles, se deveu a troca de gestão municipal de Curitiba no ano

de 2013. As mudanças são expressas nos depoimentos que analisamos no decorrer deste

trabalho e abaixo.

Para M.P., por exemplo, o que mudou foram as estratégias de trabalho, que eram por

muito tempo executadas de uma maneira (intervencionista) e com esta mudança e

consequentemente com a mudança da estrutura piramidal da instituição (muda a gestão,

concomitantemente mudam as coordenações, as gerências, as equipes técnicas), a estratégia

passou a ter outro viés (continuada). Para E.M o que mudou foram as chefias, que por sua vez,

modificaram todo o trabalho que vinha sendo feito há mais de 8 anos pela FAS. D.O. enxerga

mudanças tanto no que diz respeito a reordenação das politicas públicas utilizadas para o

trabalho que exerce quanto nas chefias, na reorganização do trabalho e do ambiente de

trabalho.

L.A. enquanto chefia, enxerga as mudanças num panorama geral. Segundo ela:

a FAS inteira, todos os equipamentos, estão passando por uma reorganização

estrutural. Essa limpeza é necessária para cortar pela raiz o que vinha acontecendo

de errado na maneira com que se concretizava o trabalho (Entrevista com L.A.

coordenadora, em 27 de junho de 2013).

Questionada a respeito de o que havia de errado ela respondeu: “havia muita

intransigência. As pessoas não estavam interessadas em cumprir as politicas estabelecidas por

lei para a realização do trabalho assistencial, queriam resolver tudo nas coxas”. Sua visão, no

entanto, é de alguém que entrou recentemente na instituição, foi rapidamente promovida e

que, em certa medida, reproduz o que lhe foi dito, pois não participou efetivamente da antiga

gestão e não “sentiu na pele” a mudança.

A.P. como a entrevistada com mais tempo de instituição, percebeu na troca de gestão

uma mudança disfarçada.

Nada mudou efetivamente. Enquanto essa desorganização continuar, tudo vai ficar

na mesma, porque só quando todo mundo perceber que mudou a gestão e as chefias

mudaram pra valer, é que as coisas vão se ajeitar (Entrevista com A.P., educadora

social, em 25 de junho de 2013).

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Essas mudanças disfarçadas podem caracterizar um quadro de confusão

organizacional nas ações de trabalho e nas condições de trabalho dos funcionários

entrevistados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A assistência social tem por responsabilidade, pautada em políticas públicas, a

integração social daqueles em situação de risco e/ou vulnerabilidade social. Seguindo este

viés, a Fundação de Ação Social de Curitiba preza por expandir suas ações por todo o

município a fim de amenizar destas situações a população que necessita de assistência, quer

seja ela social, educacional, habitacional, ou outras. Desta forma, o trabalho da FAS é de

grande importância e relevância social, pois é responsável não só por integrar aqueles que não

estão integrados, como para adentrá-los a cidadania.

Cidadania aqui está posta no sentido de sujeito dotado de direitos e deveres sociais,

que garantem a inserção deste sujeito na vida social igualitariamente em relação aos outros

sujeitos. Para exercer plenamente sua cidadania, o sujeito deve ter algumas condições

garantidas pelo Estado, garantias essas como saúde, habitação, saneamento, educação,

alimentação que nem sempre são tão acessíveis quanto parecem. Deste modo, um conjunto de

políticas públicas elaboradas pelo próprio Estado entra em ação de maneira a assegurar estas

condições básicas a toda a sociedade. Porém, abarcar toda uma sociedade é uma questão

complexa, e por isso são necessários órgãos específicos, designados pelo Estado, para cuidar

de cada questão importante.

Mas de nada adianta a criação de órgãos específicos sem a contratação de “mão-de-

obra” específica para cada situação. Por isso, se fazem necessários os concursos públicos.

Neles, a exigência para a obtenção de um cargo depende apenas da qualificação do sujeito,

sujeito este que deve obedecer às exigências solicitadas na hora de sua efetiva contratação,

como por exemplo, a apresentação do documento que o certifica especialista para o cargo.

Gênero, raça/etnia, credo, orientação sexual, classe social, são fatores não excludentes para

este tipo de vinculo empregatício.

Neste sentido, o emprego público é uma oportunidade de o sujeito atuar na área em

que se formou, garantir estabilidade financeira, construir uma carreira sólida e contar com

benefícios como aposentadoria integral, posto que as chances de demissão são quase

inexistentes e são necessários inúmeras sindicâncias para que esta situação aconteça

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efetivamente. Mas, mesmo com todas as condições favoráveis que o emprego público oferece,

a realidade aponta para outras questões.

O presente trabalho pretendeu, modestamente, traçar um panorama em que situações

de conflito, desorganização, falta de liderança e até mesmo falta de diálogo aparecem como

questões centrais para os trabalhadores, que processam essas situações como preconizadoras

de instabilidade. A dicotomia existente entre estabilidade e instabilidade não é só linguística,

mas aparece também como assunto relevante para a sociologia em um todo e mais ainda para

a sociologia do trabalho. Como esta pesquisa se pautou em uma perspectiva do trabalho,

foram sobre as dicotomias entre a estabilidade e a instabilidade no trabalho público que ela se

permeou, utilizando de bibliografia específica para validar cientificamente as constatações

feitas a partir de entrevistas semiestruturadas realizadas com funcionários públicos da

Fundação de Ação Social de Curitiba.

Robert Castel, Max Weber, Karl Marx, Richard Sennett e Ricardo Antunes –

clássicos e contemporâneos - são alguns autores que dão embasamento teórico às reflexões

aqui realizadas a partir da pesquisa empírica.

Constatou-se que os funcionários públicos identificam situações em seus trabalhos

que os tornam (os trabalhos) instáveis, até mesmo financeiramente, contradizendo

parcialmente, a noção geral de que o emprego público garante estabilidade financeira, à

medida que quando eles perdem uma função (cargo de chefia), por exemplo, eles perdem um

plus salarial que recebiam pela função. Ou seja, se eles recebem por oito anos um valor x,

quando perdem essa função, ocorre a redução de seu ganho. Estes funcionários estão sujeitos

a momentos de instabilidades no trabalho, embora em proporção diferente de outros tipos de

trabalho (como os trabalhos nos setores privados).

Os entrevistados foram apresentados a questões que os fizeram refletir sobre as

situações que enfrentam no trabalho, de maneira que puderam expor abertamente o que

pensam, observam e vivem em cada uma delas. A presente pesquisa prezou por abordar

conceitos sociológicos quando da elaboração do questionário de entrevistas, porque a

sociologia é a ciência preocupada em compreender os fatos sociais (DURKHEIM, 2007) com

o intuito de elaborar padrões gerais para então descobrir particularidades que fazem com que

uma sociedade seja sempre diferente das outras. São essas particularidades que este trabalho

pretendeu versar, não com o objetivo de criticar os fenômenos apontados, e sim de possibilitar

uma nova visão sobre o trabalho público, tachado com um caráter de estabilidade que nem

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sempre corresponde a realidade efetiva, quando pensada para além da dimensão contratual de

trabalho.

Max Weber (1982) descreve a sociologia, ao contrário de Durkheim (2007), como a

ciência responsável por determinar ações sociais, onde os diferentes agentes se comportam na

sociedade, orientados pelos comportamentos dos outros agentes. Esta perspectiva permitiu a

esta pesquisa analisar interpretativamente as ações dos agentes em questão: os funcionários

públicos da Fundação de Ação Social de Curitiba. Estas ações, segundo a ideal-tipologia de

Weber (1982) podem ser: tradicionais, afetivas, racionais referentes à valores e racionais

referentes à fins, e auxiliam a sociologia como ciência a contribuir com métodos de

pensamento que racionalizam a relação causal entre “meios possíveis e fins obtidos”

(WEBER, 1982, p. 177).

As questões sociológicas expostas aqui surgiram conforme os depoimentos

recolhidos e tiveram grande importância como meios para atingir o fim pretendido. Estes

conceitos foram - não seguindo regularmente a ordem que seguem na estrutura deste texto: -

família enquanto instituição social, o trabalho e seus sentidos, vulnerabilidade social,

meritocracia, conflito, consciência de classe, fracasso, liberdade, papéis sociais, teoria do

reconhecimento, estabilidade e instabilidade, relações de poder, saúde do trabalhador e

mudança.

Em que alguns destes conceitos discutidos pela sociologia foram sugeridos nas

entrevistas, pontuando, inclusive, blocos específicos, a maioria deles surgiu durante as falas

dos entrevistados e acabaram por se tornar fundamentais para a compreensão dos fatos, como

meios que acabaram por facilitar o fim pretendido.

Com o auxílio destes conceitos, o presente trabalho constatou que os funcionários

públicos da FAS passam, sim, por situações de instabilidade em seus trabalhos, apesar das

inúmeras afirmações de que se trata de um trabalho estável. E esta instabilidade aparece até

mesmo naquela que é a maior característica de estabilidade no emprego publico: o salário. A

troca de gestão municipal não garante o cargo em que se está e a troca de cargo nem sempre

representa uma ascensão, como no caso de L.A., que foi promovida à chefia. M.P. passou de

coordenador (cargo que ocupava até o ano de 2012) à educador social (cargo considerado

abaixo do que ocupava antes), em 2013, revelando nesta mudança não só uma frustração

pessoal como uma redução considerável em seu salário.

O trabalho público, portanto, não está destituído das instabilidades as quais o

trabalho privado já está acostumado, embora as situações de instabilidade para aquele tipo de

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trabalho sejam, de certa forma, diferenciadas deste. Esta pesquisa entra para um pequeno rol

de pesquisas que abordam a questão da instabilidade no trabalho público, com a modesta

esperança de que possa suscitar o interesse de estudiosos das relações de trabalho para outros

tipos de trabalho que não os pautados objetivamente pelo capital, como, por exemplo, sobre as

novas leis federais de assistência social e suas repercussões nos estados e municípios, tais

como problemáticas de implementação e adaptação; sobre o limite de contratações diretas

(através de concurso público) imposto ao poder executivo nas diversas instâncias e que até

certo ponto faz com que também o poder público passe a promover reestruturações nos

moldes dos sistemas flexíveis, como terceirizações, contratações temporárias entre outras.

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