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TEORIA DAS PERTURBAÇÕES DEPENDENTES DO TEMPO A regra de ouro de Fermi e taxas de transição A equação de Schrödinger dependente do tempo é dada por t i H (1) Se o hamiltoniano H não depende do tempo, a função de onda pode ser escrita como / t iE e (2) onde a função não depende do tempo. Substituindo a Eq.(2) na Eq.(1) encontramos facilmente a equação de Schrödinger independente do tempo E H (3) As funções de onda como aquela dada pela Eq.(2) representam estados estacionários, para os quais a densidade de probabilidade não depende do tempo. Quando o hamiltoniano H contém alguma componente que depende do tempo, as soluções da equação de Schrödinger não mais corresponderão a estados estacionários. Consideremos que H pode ser separado em uma componente independente e outra dependente do tempo, H 0 e V(t), respectivamente, tal que ) t ( V H H 0 (4) Consideremos, em seguida, que as soluções da equação de Schrödinger dependente do tempo, na ausência da componente V(t), sejam conhecidas. Essa premissa significa que

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TEORIA DAS PERTURBAÇÕES DEPENDENTES DO TEMPO

A regra de ouro de Fermi e taxas de transição

A equação de Schrödinger dependente do tempo é dada por

tiH

(1)

Se o hamiltoniano H não depende do tempo, a função de onda pode ser escrita como

/tiEe (2)

onde a função não depende do tempo. Substituindo a Eq.(2) na Eq.(1) encontramos

facilmente a equação de Schrödinger independente do tempo

EH (3)

As funções de onda como aquela dada pela Eq.(2) representam estados estacionários, para

os quais a densidade de probabilidade não depende do tempo.

Quando o hamiltoniano H contém alguma componente que depende do tempo, as

soluções da equação de Schrödinger não mais corresponderão a estados estacionários.

Consideremos que H pode ser separado em uma componente independente e outra

dependente do tempo, H0 e V(t), respectivamente, tal que

)t(VHH 0 (4)

Consideremos, em seguida, que as soluções da equação de Schrödinger dependente do

tempo, na ausência da componente V(t), sejam conhecidas. Essa premissa significa que

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dispomos de um conjunto completo de funções do tipo /tiEn

ne

, onde as funções n

satisfazem a equação

nnn0 EH (5)

Dessa forma podemos interpretar a componente V(t) como um agente modificador dos

estados estacionários representados pelas funções /tiEn

ne

, e os novos estados (não

estacionários) serão representados por funções , que podem ser escritas como

combinações lineares das funções do conjunto completo { /tiEn

ne

}, isto é

/tiE

n

nnne)t(a

(6)

onde é importante notar que os coeficientes na dependem do tempo. A função

representa o estado , originalmente definido por

/tiE

e

, modificado pela ação de V(t).

Queremos que essa função satisfaça a equação de Schrödinger dependente do tempo, com o

hamiltoniano H dado pela Eq.(4). Utilizando a Eq.(6) na Eq.(1), e o fato de que H0 e V(t)

são operadores lineares, obtemos o seguinte desenvolvimento

n

/tiEn

nn

n

/tiEnn

n

/tiEn0n

nnn eiE

)t(aie)t(V)t(aeH)t(a

+

/tiEn

n

nne

t

)t(ai

(7)

Considerando a Eq.(5), podemos perceber que o primeiro somatório do lado

esquerdo da equação acima é exatamente igual ao primeiro somatório do lado direito dessa

equação; esses termos, portanto, cancelam-se mutuamente. Multipliquemos, da esquerda

para direita, a Eq.(7) pelo complexo conjugado de uma dada função, digamos /tiE

mme

,

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e façamos uma integração nas coordenadas espaciais. Dessa forma obtemos a seguinte

equação

t

aie)t(V)t(a

m

n

/t)EE(inmn

nm

(8)

onde o elemento de matriz rd)t(V)t(V 3nmmn

, e do lado direito da Eq.(7)

utilizamos a condição de ortonormalidade n,m3

nm rd . A Eq.(8) é a equação mestra

que permite encontrar os coeficientes na e, consequentemente, as funções .

Neste ponto, vamos tecer algumas considerações que são de fundamental

importância para a compreensão dos resultados que virão a seguir. A combinação linear

dada pela Eq.(6) significa que os estados /tiEn

ne

se misturam devido à ação de V(t), e

essa mistura apresenta uma evolução temporal. Cada coeficiente na (t) mede o grau de

participação do respectivo estado, indicado pelo índice n, na composição do novo estado

não estacionário . Consideremos que a componente V(t) é “ligada” no instante t = 0 e

“desligada” no instante t = . A quantidade 2

n )(a é interpretada como sendo a

probabilidade de que, decorrido o intervalo de tempo , o sistema quântico que encontrava-

se inicialmente no estado

/tiE

e

encontre-se agora no estado /tiEn

ne

, ou seja, a

probabilidade de que, sob a ação de V(t), o sistema quântico tenha realizado uma transição

de para n.

Voltemos à Eq.(8). Nas situações mais comuns a condição V(t) H0 é satisfeita,

ou seja, V(t) é uma perturbação sobre H0. Nesses casos, os coeficientes na (t) com n

são muito pequenos com relação ao coeficiente )t(a , o qual é aproximadamente igual

a 1, pois o estado inicial é muito pouco modificado pela ação de V(t), devido à condição

V(t) H0. Dessa forma podemos assumir que em ordem zero nn )t(a , o que nos leva

à seguinte equação

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/t)EE(im

mme)t(V

t

ai

(9)

Nessa aproximação, obtemos a seguinte expressão para o coeficiente ma em primeira

ordem

0

/t)EE(im

)1(m dte)t(V

i

1)(a m

, m (10)

O termo de segunda ordem para ma é obtido utilizando-se a Eq.(10), com m = n, no lado

esquerdo da Eq.(8), e assim sucessivamente, de modo que

)(a)(a)(a)2(

m)1(

mmm (11)

Quando V(t) representa a interação da radiação eletromagnética com um sistema quântico,

o termo de primeira ordem na expansão acima dá origem aos chamados processos lineares

de absorção ou de emissão de fótons, enquanto que os termos de ordem mais alta dão

origem aos chamados processos não lineares, também denominados por processos de

absorção ou de emissão multifotônica.

Vamos aqui nos restringir ao termo de primeira ordem, que é o termo mais relevante

para transições entre estados de um sistema quântico. Consideremos o caso da interação da

radiação eletromagnética com um sistema quântico, levando em conta apenas o campo

elétrico da radiação. Nesse caso a interação V(t) é dada por

)t(E)t(V (12)

onde

é o operador dipolo do sistema quântico, cujo hamiltoniano na ausência da radiação

é H0, e E

é o campo elétrico da radiação, que é uma função das coordenadas espaciais e do

tempo. Podemos verificar, sem muito trabalho, que para os campos eletromagnéticos

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usuais, nos quais )t(E

10-10-2

statvolt/cm, a condição V(t) H0 é satisfeita. Tomemos

como exemplo o átomo de hidrogênio. Neste caso 0ea

10-18

statcoulomb cm =

1Debye, onde 0a é o raio de Bohr. Portanto, )t(E

10-17

-10-20

erg ( 10-4

-10-7

eV), que

é muito menor que a ordem de grandeza dos valores de energia fornecidos por H0, os quais

são 10 eV.

Vamos considerar uma onda plana monocromática com campo elétrico dado por

)trk(i)trk(i00 eeE

2

1)trkcos(E)t(E

(13)

onde r

é o vetor posição, cuja origem é tomada geralmente no centro de massa do sistema

quântico, )2( é a freqüência angular da radiação e k

é o seu vetor de onda, cujo

módulo é igual a 2/, onde é o comprimento de onda. Do ponto de vista quântico, essa é

uma radiação eletromagnética constituída por fótons com energia . Para comprimentos

de onda que vão da região do ultravioleta à região do infravermelho e microondas, que

cobre o intervalo de freqüências mais comum em espectroscopia, tendo em vista as

dimensões típicas de sistemas atômicos e moleculares (1-10 Å), pode-se verificar que o

produto rk é muito menor que a unidade e pode ser desprezado na expressão (13). Isto é

equivalente a considerar 1e rki

. Essa aproximação chama-se, em espectroscopia, a

aproximação de dipolo, ou aproximação de longos comprimentos de onda. Dessa forma

podemos escrever a interação V(t) como

titio eeV)t(V (14)

onde 0o E)2/1(V

. A partir da Eq.(10) obtemos

dtedteVi

1)(a

0

t)(i

0

t)(iom

)1(m

mm

(15)

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onde utilizamos a relação /)EE( mm . Após as integrações em t, a Eq.(15) leva à

seguinte expressão

)(i

1e

)(i

1eV

i

1)(a

m

)(i

m

)(iom

)1(m

mm

(16)

Uma análise mais detalhada dos dois termos entre colchetes na equação acima pode

mostrar que o primeiro termo é muito mais relevante que o segundo quando m ,

enquanto que o segundo termo é muito mais relevante que o primeiro quando m .

Num caso ou no outro temos a chamada condição de ressonância entre a freqüência da

radiação eletromagnética e a freqüência associada à transição entre o estado inicial e o

estado final m do sistema quântico. Ora, lembrando que a freqüência da radiação é uma

quantidade positiva, no primeiro caso temos que Em E , enquanto que no segundo caso

Em E , na condição de ressonância. Temos, portanto, duas situações físicas distintas: no

primeiro caso o sistema ganha energia, absorvendo um fóton com energia , e no

segundo caso o sistema perde energia, emitindo um fóton com energia . Essas duas

situações podem, portanto, ser tratadas separadamente. Assim, a probabilidade de

absorção(-) ou de emissão(+) de um fóton, )(W)(

m , é dada por

2

m

m2

om2

2

m

)(i2

om2

)(m

)(

])cos[(1V

21eV

1)(W

m

(17)

Vamos agora tecer algumas considerações sobre a função

2x

xcos1)x(F

(18)

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onde mx . A figura 1 abaixo mostra o comportamento de F(x) para um valor fixo

de . A função F tem um máximo absoluto em x = 0 (ressonância perfeita), cujo valor é

2/2. Neste ponto de máximo a probabilidade de transição vale

22

om2

)(m V

1)(W

(19)

Figura 1

A Eq.(19) nos diz que a probabilidade de transição, na ressonância, cresce sem restrições

com o intervalo de tempo , o que, obviamente, não é correto, pois uma probabilidade não

pode ser maior que 1. Isto significa que o tratamento perturbativo dado acima, em primeira

ordem, é válido sob a condição

omV

(20)

Por outro lado, é necessário que haja tempo suficiente para que o sistema quântico possa

perceber a radiação como uma onda oscilando com freqüência angular , e para isso várias

oscilações precisam ser realizadas no intervalo de tempo , o que impõe a condição

X

F(X)

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m

11

(21)

As condições (20) e (21) implicam que

EEm

omV

(22)

ou que omV EEm , que é compatível com a condição inicial V(t) H0.

A Eq.(19) é válida na condição de ressonância perfeita e para uma radiação

rigorosamente 100% monocromática. Na natureza isso não acontece, pois a radiação

eletromagnética sempre apresenta, por menor que seja, uma certa dispersão na freqüência,

isto é, sempre há um certo em torno do valor de . Esse fato tem conseqüências

importantes. Ele implica que numa transição de para m, valores de )(W)(

m em torno do

valor máximo dado pela Eq.(19), o qual corresponde a x = 0, devem ser levados em conta.

Isto pode ser feito da seguinte maneira. A função F(x) tem mínimos em 2/, 4/,

As separações entre mínimos simétricos são 4/, 8/, Portanto, quanto maior o

intervalo de tempo , mais próximos, mais estreitos e mais intensos serão os picos de F(x).

Assim, para suficientemente grande, dentro das condições (20) e (21), F(x) pode ser

expressa em termos de uma função de Dirac. A expressão é a seguinte

)x()x(F (23)

Desse modo, a probabilidade de transição passa a ser dada por

])EE[(V2

)(V2

)(W m

2omm

2om2

)(m

(24)

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a qual varia linearmente com . Nessa equação utilizamos a propriedade (ax) = (x)/a .

Quando a radiação acopla com o sistema quântico, devido à dispersão na freqüência , os

estados e m passam a não ter mais energias rigorosamente bem definidas. Há, portanto,

uma densidade de estados )E()EE( m . A probabilidade total da transição de para

m é então dada por

)(V2

dE)E()E(V2

)(P2

om

2om

)(m

(25)

onde utilizamos a propriedade )a(fdx)ax()x(f

, e )( é a densidade de estados

da radiação eletromagnética calculada em . Como a probabilidade )(P)(

m varia

linearmente com o intervalo de tempo , a probabilidade de transição por unidade de tempo,

ou taxa de transição(número de transições por unidade de tempo), não depende do tempo e

é dada por

)(V2

P~ 2

om

)(m

(26)

Essa expressão é conhecida como a regra de ouro de Fermi.

O elemento de matriz omV quadrado, na aproximação de dipolo, para uma radiação

com vetor de polarização

(

00 EE ) é dado por

2

m

20

2om

4

EV

(27)

O quadrado da amplitude 0E do campo elétrico está relacionado com o número de fótons,

, em um certo volume V, através da equação

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V8

E20

(28)

onde a quantidade 8/E20 é a densidade média de energia (média temporal) da radiação

eletromagnética (Jackson, 1975). A densidade de estados da radiação no volume V é dada

por

3

2

c2

V)(

(29)

onde c é a velocidade da luz. Combinando as Eqs.(27), (28) e (29) na Eq.(26) encontramos

2

m3

3)(

mc

2P~

(30)

Vamos analisar o produto escalar

m nessa equação. Para isso, ao invés de

trabalharmos em coordenadas cartesianas, é mais conveniente trabalharmos em

coordenadas esféricas, expressando os vetores

me em termos dos versores esféricos

qe (q = 0, 1) definidos como

)yix(2

1e 1 , ze0 (31)

onde zey,x são os versores das direções x, y e z. Os versores esféricos satisfazem a

condição de ortonormalidade q,qqq ee

, onde qq

q e)1(e . De modo geral, qualquer

vetor zvyvxvv zyx

pode ser escrito da seguinte forma

q

q

q evv

(32)

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No caso do vetor

as componentes esféricas são proporcionais aos harmônicos esféricos

de posto 1. Temos então as seguintes expressões

q

qeeq,1

21

e),(Y3

4 (33)

e

q

q

mqm e)(

(34)

O fator (4/3)1/2

na Eq.(33) garante a condição 1 . Dada a condição de

ortonormalidade dos versores esféricos encontramos a seguinte equação

mqmqeeq,1

q,q

eeq,1

2

m )()(),(Y),(Y3

4 (35)

Se não há uma direção espacial diferenciada, devemos fazer uma média sobre todas as

orientações espaciais, ou seja, devemos considerar a quantidade

e

2

m

2

m d4

1

(36)

Tendo em vista a condição de ortonormalidade dos harmônicos esféricos, encontramos

2

m

2

q

mq

2

m3

1)(

3

1

(37)

Além disso, se a radiação não for polarizada devemos levar em conta as contribuições das

duas polarizações, e , que são independentes. Isso é feito multiplicando-se a Eq.(37) por

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2, pois as médias, sobre todas as orientações espaciais, das duas contribuições são iguais.

Dessa forma a taxa de transição é dada por

2

m3

3)(

mc3

4P~

(38)

Vejamos agora o caso em que há uma direção espacial diferenciada. Por exemplo,

consideremos uma radiação -polarizada na direção z. Neste caso 0ee ,

2/10,11,1 )4/3()0,0(Ye0)0,0(Y . Portanto, obtemos da Eq.(35)

2

mz

2

m )(

,

e a taxa de transição é dada por

2

mz3

3),(

m )(c

2P~

(39)

Para uma radiação -polarizada nas direções x e y temos

ei2/1e1,1e0,1e e)8/3(),2/(Ye0),2/(Y,2/

. Neste caso devemos fazer

uma média sobre as orientações no plano (x,y), ou seja, devemos considerar

2

my

2

mx

2

0q

mqe

2

m

2

m )()(2

1)(

2

1d

2

1

(40)

A taxa de transição é então dada por

2

my

2

mx3

3),(

m )()(c

P~

(41)

O número médio de fótons, , em cada um desses casos, também chamado de número

médio de ocupação, para a radiação eletromagnética em equilíbrio a uma temperatura T

(temperatura da radiação em equilíbrio com um corpo negro) é dado por

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1e

1Tk/ B

(42)

onde kB é a constante de Boltzmann.

A partir das equações acima, podemos perceber que as taxas de absorção e emissão,

induzidas pela radiação, são iguais. Neste ponto vamos considerar, sem nenhuma

demonstração, um aspecto de fundamental importância. Os resultados acima foram obtidos

a partir de um tratamento semi-quântico, pois a radiação foi essencialmente considerada do

ponto de vista ondulatório clássico. Do ponto de vista quântico a interação do sistema

quântico com o “vácuo” do campo eletromagnético, o qual corresponde à chamada energia

do ponto zero, deve ser levada em conta (Davydov, 1976). Quando isso é feito (a maneira

usual de faze-lo é através de técnicas de segunda quantização), ocorre que, no caso do

processo de emissão, o número de fótons, , que aparece nas equações acima deve ser

substituído por ( 1 ). Assim, a taxa de emissão é constituída de duas parcelas: uma que é

proporcional a , chamada de taxa de emissão induzida, e outra que não depende de ,

chamada de taxa de emissão espontânea, mA , que é dada por

2

m3

3

mc3

4A

(43)

Para campos eletromagnéticos usuais, não muito intensos, a taxa de emissão espontânea é

muito maior que a taxa de emissão induzida. Para que essas taxas sejam comparáveis é

preciso ter a radiação eletromagnética em temperatura de equilíbrio, com o corpo negro,

muito alta. Por exemplo, para radiação no visível ( 1015

s-1

) essa temperatura estaria

acima de 5000K.

A força do oscilador

No eletromagnetismo clássico o elétron, como constituinte da matéria, é

considerado como um oscilador, com uma freqüência própria, que pode ser excitado por

radiação eletromagnética que tenha essa mesma freqüência (condição clássica de

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ressonância). A intensidade (potência) da radiação absorvida por N átomos ou moléculas,

com um oscilador por átomo ou molécula, é dada por

3

e

32

clássicocm

e2fNI

(44)

onde o fator f é igual a 1 para um oscilador tridimensional, igual a 2/3 para um oscilador

bidimensional e igual a 1/3 para um oscilador unidimensional. Se há mais de um oscilador,

por átomo ou molécula, com uma dada freqüência, então o fator f mede o número efetivo

de elétrons que dão origem a uma dada linha ou banda de absorção. Dessa forma a soma de

todos os valores de f, correspondentes à todas as linhas ou bandas de absorção, é igual ao

número total de elétrons por átomo ou molécula. Isso é conhecido como a regra da soma de

Kuhn-Thomas.

Do ponto de vista quântico a intensidade (potência) de absorção é dada por

2

m3

3)(

mquânticoc3

4NP

~NI

(45)

Podemos então dar uma interpretação quântica ao fator f comparando as Eqs.(44) e (45),

donde obtemos

2

m2

em

e3

m2ff

(46)

que é a chamada força do oscilador. A regra da soma de Kuhn-Thomas passa a ter a

seguinte forma

Zfm

m (47)

onde Z é o número de elétrons por átomo ou molécula.

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Do ponto de vista experimental, para transições eletrônicas, a força do oscilador é

dada por

~d)~(C303.2

1032.4f

expm

9expm (48)

onde ~ é a freqüência em cm-1

, é o coeficiente de absorção (em cm-1

) e C é a

concentração molar (moles por litro, ou 1000 cm3) das espécies absorventes. A constante

4.3210-9

=(1000/NA)(me c2/e

2)2.303, onde NA é o número de Avogadro, me c

2 é a energia

de repouso do elétron e e a sua carga. Experimentalmente, o valor do coeficiente de

absorção para uma dada freqüência é obtido através da relação

I

Iln

L

1)~( 0exp

m (49)

onde I0 é a intensidade da luz que incide sobre uma amostra de comprimento L (percurso

óptico) e I é a intensidade da luz após ter atravessado a amostra. A Eq.(49) é uma expressão

da chamada lei de Beer-Lambert. É comum também se utilizar o coeficiente de extinção

molar, dado por

I

Iln

CL

1)~( 0

m (50)

Em geral, quando se compara o valor teórico da força do oscilador com o seu valor

experimental o lado direito da Eq.(46) deve ser multiplicado pelo fator de correção de

campo local de Lorentz, dado por

n9

)2n( 22 (51)

onde n é o índice de refração do meio (amostra).

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Alguns instrumentos de medidas de absorção de luz medem a relação I0/I através do

logaritmo decimal, log(I0/I), e neste caso temos

~d)~(1032.4f m

9expm (52)

onde

I

Ilog

CL

1)~( 0

m (53)

As Eqs.(48) e (52) são aplicáveis aos casos de transições eletrônicas, e as integrais nessas

equações são proporcionais à área sob a curva de absorção.

Para dois estados m e o coeficiente de emissão espontânea de para m está

relacionado com a força do oscilador de m para da seguinte forma

m3e

22

m

2m f

cm

e2

g

gnA

(54)

onde g e gm são as degenerescências dos estados e m , respectivamente.

Intensidade de emissão: equações de taxas e tempo de vida

Valores absolutos de forças do oscilador podem ser obtidos experimentalmente.

Entretanto, o mesmo não ocorre, em geral, no caso de processos de emissão de fótons

(luminescência). Normalmente se tem uma imprecisão considerável sobre o número de

espécies emissoras numa dada amostra e, mais importante, em geral não se faz uma coleta

completa de fótons emitidos em todas as direções. Portanto, no caso de emissão

normalmente se trabalha com intensidade relativa de emissão. A intensidade (potência) de

emissão que corresponde a uma transição de para m é dada por

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mmm NAI (55)

onde é a população normalizada do estado . Esta quantidade representa a fração média

de espécies emissoras que se encontram no estado ( 10 ), e a quantidade

NN representa o número médio de espécies emissoras que se encontram nesse

estado, ou simplesmente a população desse estado. A Eq.(55) é a análoga, para o caso de

emissão, da Eq.(45).

As populações dos diversos níveis de energia do sistema atômico ou molecular

devem satisfazer as chamadas equações de taxas, que têm a seguinte forma

j

j

j

i

i PPdt

d

(56)

onde iP representa a taxa de transição de para i e jP a taxa de transição de j para . As

equações de taxas constituem, portanto, um sistema de equações acopladas envolvendo

taxas de transição e as populações. No regime estacionário, ou seja, quando o "fluxo

negativo de população" é igual ao "fluxo positivo de população", 0dt/d (isso é válido

para todos os níveis de energia envolvidos). Neste caso

i

i

j

jj

P

P

(57)

No caso de intensidade relativa de emissão, normalmente se compara intensidades

provenientes de um mesmo nível emissor. Dessa forma evita-se trabalhar com a população

deste nível. Assim,

m

m

m

m

m

m

A

A

I

I

(58)

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O transiente, ou a curva de decaimento de um nível , quando processos não usuais,

como transferência de energia, não estão presentes, pode ser obtido a partir da Eq.(56)

quando os canais de fluxo positivo de população são interrompidos, ou seja, 0Pj

jj

.

Neste caso

i

iPdt

d (59)

donde

i

i0 Ptexp)t( (60)

onde 0 é o valor da população normalizada do nível em t = 0. Este é o chamado

decaimento exponencial. O intervalo de tempo dado por

i

iP

1 (61)

é chamado de tempo de vida do nível . É, portanto, o intervalo de tempo após o qual a

população de diminui por um fator igual a 1/e.

População térmica

Vimos acima que o sistema quântico envolvido pela radiação eletromagnética

("banhado por fótons") pode evoluir, e isto ocorre muito rapidamente, para um regime

estacionário, no qual as variações com o tempo das populações dos estados envolvidos nos

processos de absorção e emissão é nula, ou seja, nesse regime as populações são constantes.

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Nas considerações feitas acima, os estados são populados, ou despopulados, unicamente

devido à interação com um campo eletromagnético externo. Nada foi mencionado com

relação à temperatura do meio em que se encontra o sistema quântico. Entretanto, efeitos de

temperatura são muito importantes. O próprio conceito de temperatura, que do ponto de

vista da termodinâmica clássica é uma propriedade intensiva macroscópica do meio, pode

aqui ser elaborado de forma bastante interessante.

Este conceito está diretamente ligado à absorção e emissão de radiação, por um

"ensemble" de um sistema atômico ou molecular, na região do infravermelho, que é a faixa

de freqüência que produz a sensação de calor. Portanto ele pode ser inserido num contexto

mais geral que é a interação da radiação com a matéria. Imaginemos, por exemplo, um gás

cujas moléculas (todas iguais) têm, individualmente, uma certa distribuição de níveis de

energia, como mostra a figura abaixo, e que elas estão fixas no espaço.

4

3

figura 2

2

h

1

Vamos assumir que h corresponde a radiação no infravermelho, fornecida pelas

paredes do recipiente que contém o gás. Se h, esses fótons podem ser absorvidos e

posteriormente devolvidos (emitidos). Se estiver presente só radiação h os dois estados (na

notação de Dirac) 1 e 2 estarão populados, e no regime estacionário

0dt/ddt/d 21 . Podemos dizer que o gás está aquecido. Se todas as moléculas do

gás não tivessem movimento de translação e, portanto não houvesse colisões entre elas e

nem entre elas e as paredes do recipiente (o que é irreal), poderíamos dizer que a

temperatura do gás seria da ordem de / kB. Nas situações reais a radiação contém fótons

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com muitas freqüências, como um contínuo no infravermelho, e as moléculas do gás têm

movimento de translação, o qual, em última análise, é adquirido através da interação com

esses fótons. O estado 2 é também populado por transferência de energia através das

colisões entre as moléculas e das colisões entre elas e as paredes do recipiente. O regime

estacionário é dado por um balanceamento complexo entre todos esses processos, os quais

estão diretamente relacionados com a temperatura do meio. Dizemos que estados excitados

podem ser populados através de efeitos de temperatura. São as chamadas populações

térmicas. Quando T = 0, apenas o estado fundamental encontra-se populado.

A importância desses efeitos se manifesta em várias situações na espectroscopia, em

particular no caso das intensidades de transições. Imaginemos, por exemplo, na figura 2

uma absorção do estado 1 para o estado 4 . Se T = 0 veremos uma linha fina de

absorção com uma certa intensidade; apenas o estado fundamental encontra-se inicialmente

populado. Quando T 0, o estado 2 passa a ter uma certa população, o que significa que

a população de 1 diminui. Portanto, existem, em média, menos moléculas no estado

inicial 1 e a intensidade da linha de absorção deve diminuir. A figura 3 abaixo

esquematiza essa situação.

T = 0

T 0

figura 3

A chamada largura de linha também se modifica devido ao movimento de translação e às

colisões das moléculas do gás.

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A forma mais usual de se tratar os efeitos de temperatura é considerar o "ensemble"

de átomos ou moléculas de um dado sistema em um "banho térmico" a uma dada

temperatura. O "banho" transfere energia para o "ensemble" populando termicamente

estados excitados. No regime estacionário, "banho" e "ensemble" entram em equilíbrio. Se

a interação entre os átomos ou moléculas pode ser negligenciada, de modo que uma

distribuição de níveis de energia pode ser associada a cada átomo ou molécula

individualmente, a chamada lei de distribuição de Boltzmann nos diz que a fração

(população térmica) de átomos ou moléculas em um certo estado i é dada por

i

Tk

E

i

Tk

E

ii

B

i

B

i

eg

eg)T(p (62)

onde g i é a degenerescência do estado i. A função Tk

E

i

iPB

i

egZ

é a chamada função de

partição. Na maioria dos casos, no cálculo da função de partição, o somatório em i é restrito

a apenas alguns estados.

A população térmica deve ser levada em consideração no cálculo da intensidade de

uma transição. Porém, isto deve ser feito com bastante cuidado, principalmente no caso da

intensidade de emissão. Vejamos esse aspecto mais detalhadamente através de um

exemplo. Consideremos o diagrama de níveis de energia da figura 2 e que os estados 1 e

2 , e 3 e 4 , formam dois grupos de estados bastantes isolados energeticamente, sendo

que em cada grupo os estados estão bem próximos, no sentido de que, estando o de mais

baixa energia populado, o de energia mais alta possa adquirir uma população térmica

significativa.

A intensidade de absorção inicial, isto é, antes do sistema atingir o regime

estacionário, do estado 1 para o estado 3 , por exemplo, será dada por (Eq.(45))

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1)(

313131 pP~

NI

(63)

onde p1 é a população térmica do estado 1 , dada pela Eq.(62). Da mesma forma a

intensidade de absorção inicial de 2 para 3 será dada por

2)(

323232 pP~

NI

(64)

A intensidade de absorção inicial é aquela que os instrumentos medem, no laboratório,

varrendo as freqüências de absorção.

Consideremos agora que o estado 3 foi populado a partir da absorção 1 3 . A

intensidade de emissão 3 2 , por exemplo, será dada por

33232323 pNAI (65)

onde 3 é a população normalizada do estado 3 na temperatura T = 0, e 3p a sua

população térmica com relação ao estado 4 . Neste caso, podemos considerar que o estado

3 corresponde ao zero de energia e, portanto,

Tk/)EE(

43

33

B34egg

gp

(66)

e

Tk/)EE(

43

Tk/)EE(4

4B34

B34

egg

egp

(67)

Se o sistema atingiu o regime estacionário a partir de absorção para o estado 4 , as

populações devem ser determinadas pelo sistema de equações de taxas (Eq.(56)) para

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quatro níveis, levando-se em conta as populações térmicas. Em geral, no caso de níveis de

energia eletrônicos, se a radiação incidente não tem intensidade extraordinariamente alta, a

população normalizada do estado fundamental, 1, tem valor próximo de 1.