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230 Estilos da Clínica, 2009, Vol. XlV, n° 27, 230-251 RESUMO O presente artigo visa a expli- citar como se deu a apropriação lacaniana da noção de das Ding a partir do Projeto de uma psi- cologia (1895) de Freud. Ao re- tomarmos a ideia de vivência de satisfação, buscaremos mostrar em que medida das Ding, en- quanto Real, é essencial à cons- tituição do aparelho psíquico. Além disso, será ressaltado como a relação do infante com o Outro pode determinar um modo de apreensão da realida- de marcado pelo gozo. Descritores: das Ding; Pro- jeto; Outro; constituição psíqui- ca; gozo. Fundamentos DAS DING E O OUTRO NA CONSTITUIÇÃO PSÍQUICA Ariana Lucero Ângela Vorcaro O psicanalista francês Jacques Lacan bus- cou a noção de das Ding no texto freudiano do Proje- to de uma psicologia (1895). Ele afirma que muitos lei- tores, especialmente aqueles que conservam o espírito crítico, podem questionar a legitimidade de sua apropriação do conceito freudiano de das Ding, pensando se tratar apenas de um pequeno detalhe que ele foi “pescar” no Projeto 1 . No entanto, Lacan acredita que nos textos de Freud nada é “caduco”, nem pode ser descartado, sendo necessário perce- ber e desenvolver os pontos que permaneceram abertos, hiantes. É nesse sentido que ele assume plena responsabilidade por das Ding (Lacan, 1997, pp. 127-8). Acompanhando Lacan (1997), devemos buscar as origens e o desenvolvimento de das Ding em Freud, mas sem esquecer de sua advertência: “não é sim- Mestranda em Psicologia na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Psicanalista, membro da Association Lacanienne Internationale, Professora do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade do Mato Grosso (FAFICH – UFMT).

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230 Estilos da Clínica, 2009, Vol. XlV, n° 27, 230-251

RESUMO

O presente artigo visa a expli-citar como se deu a apropriaçãolacaniana da noção de das Dinga partir do Projeto de uma psi-cologia (1895) de Freud. Ao re-tomarmos a ideia de vivência desatisfação, buscaremos mostrarem que medida das Ding, en-quanto Real, é essencial à cons-tituição do aparelho psíquico.Além disso, será ressaltadocomo a relação do infante com oOutro pode determinar ummodo de apreensão da realida-de marcado pelo gozo.Descritores: das Ding; Pro-jeto; Outro; constituição psíqui-ca; gozo.

Fundamentos

DAS DING E O OUTRONA CONSTITUIÇÃO

PSÍQUICA

Ariana LuceroÂngela Vorcaro

O psicanalista francês Jacques Lacan bus-cou a noção de das Ding no texto freudiano do Proje-to de uma psicologia (1895). Ele afirma que muitos lei-tores, especialmente aqueles que conservam oespírito crítico, podem questionar a legitimidade desua apropriação do conceito freudiano de das Ding,pensando se tratar apenas de um pequeno detalheque ele foi “pescar” no Projeto 1. No entanto, Lacanacredita que nos textos de Freud nada é “caduco”,nem pode ser descartado, sendo necessário perce-ber e desenvolver os pontos que permaneceramabertos, hiantes. É nesse sentido que ele assumeplena responsabilidade por das Ding (Lacan, 1997,pp. 127-8).

Acompanhando Lacan (1997), devemos buscaras origens e o desenvolvimento de das Ding em Freud,mas sem esquecer de sua advertência: “não é sim-

Mestranda em Psicologia na Universidade Federaldo Mato Grosso (UFMT).

Psicanalista, membro da Association Lacanienne

Internationale, Professora do Departamento de Psicologiada Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da

Universidade do Mato Grosso (FAFICH – UFMT).

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plesmente serem fiéis ao texto freudiano e fazerem sua exegese comose aí estivesse a fonte de uma verdade ne varieteur que seria o modelo,o leito, a vestimenta a impor a toda a nossa experiência.” (p. 51).

Lacan equaciona a consistência da conquista da psicanálise pormeio da afirmação: “há um lugar, o inconsciente, em que se enunciauma verdade que tem a propriedade de nada podermos saber dela”(Lacan, 2008, p. 198). Para o autor, desde quando Freud ponderouque a manutenção do princípio de prazer era tributária da possibili-dade de alucinação, ele concebeu um modo inédito de funciona-mento do prazer na realidade humana. Para isso, na organizaçãobiológica do neonato, presidida pelo mecanismo do arco reflexoestímulo-motricidade, Freud enquistou um aparelho inconsciente.

Efetivamente, no Projeto, Freud descreve o aparelho psíquico apartir da diferenciação de três grupos de neurônios – f, y e w –responsáveis pela percepção, memória e consciência, respectivamen-te. O sistema y se divide em: sistema y núcleo, que recebe direta-mente os estímulos endógenos; e sistema y manto, que recebe asinformações do mundo externo a partir de f.

O aparelho descrito por Freud se apoia na noção de quantida-de (Q), entendida como o que diferencia atividade e repouso (Freud,1895/1995, p. 9). A tendência do organismo seria a de manterinalterada essa diferença entre atividade e repouso, de modo que eleaspira a libertar-se de Q. Esse é o princípio de inércia (p. 10), que justi-fica a existência do movimento reflexo: qualquer aumento na quan-tidade ocasionada por um estímulo externo deve ser eliminado pelavia da ação motora, pois seria sentido como desprazer. Já o prazer,adviria da sensação de eliminação de Q (Freud, 1895/1995, p. 26). Oprincípio de prazer é um dos princípios que regem o funcionamentomental e tem por objetivo evitar o desprazer e proporcionar prazer.

O psicanalista vienense percebe que as quantidades endógenasnão cessam nunca, o que constitui a verdadeira “mola pulsional domecanismo psíquico” (p. 30). O organismo não pode se livrar delemesmo e esse excesso de estimulação exige um grande trabalho doaparelho psíquico.

Freud descreve no Projeto a vivência de satisfação 2: primeiramente,o bebê sente fome e a resposta do organismo se dirige a um esforçode eliminação, que se verifica na forma do grito ou do choro; masestes não logram êxito em diminuir a tensão em y. É preciso umaintervenção que, por um certo tempo, remova no interior do corpoa liberação de quantidades, e uma intervenção dessa ordem requer

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uma alteração no mundo externo(como a provisão de alimento, no casoda fome), que, enquanto ação especí-fica, só pode se efetuar a partir de de-terminados caminhos.

O organismo humano é, a prin-cípio, incapaz de promover essa açãoespecífica. Ela se efetua por ajudaalheia, quando a atenção de um ou-tro é atraída pelo grito do bebê. Adescarga motora, ocasionada pela al-teração interna, é originariamente aúnica via de eliminação possível. Ogrito adquire, assim, a função de co-municação, na medida em que umoutro ser humano pode interpretá-locomo apelo e como demanda a serrespondida; donde o famoso adágiofreudiano: “o desamparo inicial do serhumano é a fonte originária de todos osmotivos morais” (p. 32).

Quando a ação específica se efe-tiva, o organismo deve executar ime-diatamente, no interior de seu corpo,por meio de dispositivos reflexos, aatividade necessária para remover oestímulo endógeno. A totalidade doevento resulta em uma vivência desatisfação, que possui duas conse-quências essenciais:

1) Produz-se no manto a ocupaçãodos neurônios (a), que correspondemà percepção do objeto (“pessoa pres-tativa”), estabelecendo-se uma facili-tação entre essas ocupações e os neu-rônios nucleares;2) Em outros neurônios do manto (b),chegam as notícias de eliminação, sen-tidas como prazer (w), devido ao mo-

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vimento reflexo desencadeado apósa ação específica. Estas notícias reali-zam-se porque todo movimento, atra-vés de suas consequências laterais, dálugar a novas excitações sensoriais(provenientes da pele e dos múscu-los) que produzem em ø uma ima-gem de movimento.

A formação das facilitações(Bahnungen) nos permite uma com-preensão mais ampla do desenvolvi-mento de y. Não só se estabelece umafacilitação entre os neurônios y donúcleo e os neurônios y do manto,como os próprios neurônios y domanto estabelecerão facilitações en-tre si. Se os neurônios a e b de y domanto forem ocupados simultanea-mente, a ocupação quantitativa de apassa para o neurônio b, resultandoem uma barreira de contato facilitadaentre a – b. A lei de associação porsimultaneidade constitui o fundamen-to das ligações entre os neurônios y(Freud, 1895/1995, p. 33).

Assim, como resultado davivência de satisfação, origina-se umafacilitação entre as duas imagensrecordativas (percepção do objeto (a)e imagem de movimento (b)) e, entreelas, e os neurônios nucleares. Com oreaparecimento do estado de urgên-cia ou de desejo, a ocupação prosse-gue dos neurônios y do núcleo paraas duas recordações, reativando-as. Aimagem recordativa do objeto é a pri-meira a ser afetada pela ativação dodesejo, o que ocasiona algo idênticoa uma percepção, equivalente a uma

alucinação. Se, em consequência disso,uma ação reflexa for iniciada, o pro-cesso acabará em desilusão, uma vezque a satisfação não será possível (p.33). Desse modo, o aparelho psíqui-co deve evitar tal situação.

A criação das facilitações faz comque as quantidades percorram sem-pre determinados trilhamentos(Bahnungen). O que garante a manu-tenção desses caminhos é a ocupaçãoconstante dos neurônios (p. 36). Se,em um primeiro momento, Freudaventou a hipótese de que o aparelhopsíquico podia eliminar as Qs, con-servando-se sem estímulos – princí-pio de inércia –, logo se deparou coma necessidade vital. Esta, impelida pelapulsão, obriga o organismo a umarmazenamento de Q (Freud, 1895/1995, p. 36), que o permita, não so-mente conservar os caminhos de des-carga (eliminação), mas também aten-tar3 para o mundo externo, buscandoa ação específica que garanta a satis-fação.

Atender à regência da lei da ho-meostase, que mantém o sistema au-tônomo, implica, para Lacan (2008),supor a interceptação desse sistemareflexo pelo aparelho y que mantémas regulações constantes. Interpondo-se ao automatismo do arco-reflexo,este aparelho operaria, em sua insufi-ciência, buscas e desvios. Por isso seufuncionamento encontra e reencon-tra repetidamente uma percepçãoidêntica. Tal “percepção” não teriainicialmente nenhum critério de rea-lidade, ela é apenas alucinada.

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Considerando o funcionamentoparadoxal desse aparelho do incons-ciente que rege a economia dos nos-sos pensamentos e comportamentossobrepondo-se à realidade, Lacan(2008) lê que Freud teria problemati-zado radicalmente qualquer conivên-cia da representação com um pontode referência representado. Portanto,nessa leitura, a representação não seliga ao referente da realidade, mas ésustentada por uma estrutura de tra-mas e redes que passa fora da cons-ciência individual que, pretensamen-te, unificaria a representação. Em cadacruzamento dessas redes inconscien-tes inscreve-se um elemento linguís-tico, designando uma lembrança e fi-xando relações, cunhando o sintomaengramático (p. 190).

O psicanalista vienense propõeque chamemos a totalidade das ocu-pações em y de Eu (Freud, 1895/1995, p. 37), do qual pode-se separaruma parte permanente – núcleo – deuma variável, o manto. O eu é res-ponsável por impedir processos psí-quicos primários através de ocupa-ções laterais. Estas impedem que aimagem recordativa do objeto sejaabundantemente ocupada, o que re-sultaria em uma alucinação. Nestescasos, a ocupação de desejo não étão intensa a ponto de iniciar umaeliminação, de tal forma que apenasuma percepção externa real teriaquantidade suficiente para ativar essecircuito.

É a inibição (p. 40) do eu que pos-sibilita um critério de diferenciação

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entre percepção e recordação, mas este mecanismo pode falhar se oobjeto de desejo for ocupado com abundância.

Segundo Freud (1895/1995), a experiência biológica ensinaráo organismo a não ocupar as imagens recordativas desejadas acimade certa medida e a não iniciar a eliminação antes do aparecimentode um signo de realidade (p. 40). Ora, mas o signo de realidade édefinido como a própria notícia de eliminação (b) (p. 39), de modoque ele será útil para chamar a atenção de y para uma percepção, oupara a ausência da mesma.

O psicanalista afirma que, raramente, uma nova percepção darealidade coincide totalmente com a recordação, sendo a identidadeexata entre elas uma situação hipotética, impossível na vida real, emesmo disfuncional, já que dispensaria a função do juízo (p. 41).Vejamos como Freud exemplifica essa situação (pp. 41-42):

1) A ocupação de desejo é formada pelo neurônio a + neurônio b;2) A ocupação de percepção é formada pelo neurônio a + neurônio c.

Uma vez que, na perspectiva freudiana do Projeto, seria insegu-ro iniciar a eliminação enquanto os signos de realidade não concor-darem com a totalidade da ocupação de desejo, o complexo percep-tivo deve decompor-se em:

1) Um componente neurônio a, que quase nunca muda e que passa-rá a se chamar “a coisa” (das Ding);2) Um componente neurônio b, que quase sempre varia e se chama-rá seu predicado, sua atividade ou atributo.

Nesse ponto, Freud destaca a semelhança entre o núcleo do eue a componente constante da percepção em y do manto (das Ding);e entre as ocupações mutáveis do manto e a componente incons-tante (p. 42).

É interessante notar que, apesar de se referir ao componenteperceptivo, o que Freud decompõe é a ocupação de desejo, o que nosleva a pensar que ambos comportam duas propriedades distintas. Al-gumas linhas à frente (p. 42), ele mostra que é a partir do neurônio cque será perseguida a identidade para reencontrar o neurônio b. Emgeral, o que se intercala entre o neurônio c e o neurônio b é umaimagem de movimento que advém de uma notícia de eliminação, oque nos leva a pensar que o neurônio a seja a percepção do objeto.

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Vejamos como isso pode ser ilustrado pelo esquema abaixo:

Pois bem, pode-se concluir do exposto que, independentementedo objeto percebido, o aparelho psíquico perseguirá a imagem demovimento que corresponde ao prazer proporcionado pela vivênciade satisfação. Freud ressalta que o fundamento da existência do jul-gar está nas experiências corporais, sensações e imagens de movi-mento (p. 46). O que é bem descrito pela seguinte afirmação dePatrícia Porchat (2005): “Na medida em que não há uma corres-pondência absoluta entre o objeto percepcionado e o objeto de de-sejo, o que garante o término da busca pelo objeto que proporcionasatisfação é a interrupção do processo de somação (da fome, noexemplo de Freud), a representação de uma sensação corporal...Freud considera como último elemento do circuito desiderativo arepresentação de uma sensação corporal (de prazer) que indica ainterrupção do processo de somação” (Porchat, 2005, p. 136).

Ainda a esse respeito, Moustapha Safouan (1988) nos ofereceuma preciosa explicação: “a pressão das necessidades conduz não apensar a coisa, (seja ela o seio ou o Nebenmensch) que restabelecia orepouso, ou a desejá-la, mas sim a crer percebê-la, dito de outro modo,a aluciná-la. Lidamos, então, não apenas com um organismo pouco

1ª Experiência de satisfação

Núcleo Manto

Ocupação de desejo Quantidades endógenas (pulsão)

Facilitações Percepção do objeto

Imagem de movimento

Facilitações

Nova ocupação de desejo

Neurônio a – das Ding (quase nunca muda)

Neurônio b (quase sempre varia)

Percepção

Neurônio a – das Ding (objeto)

Neurônio c (imagem de movimento) Identidade

α

Eu

β

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preparado para a vida, como o admi-tiria qualquer biólogo e qualquer ob-servador da primeira infância, masainda, e sobretudo, com um psiquis-mo positivamente dotado de um prin-cípio contrário às exigências da vidacomo tal, porquanto esta requer umaadesão mínima aos sinais ou, se qui-sermos, aos logros do Umwelt. Nomomento o qual supomos que o apa-relho psíquico não se contenta empensar o que quer, mas “realiza” seupensamento antes de reconhecê-lo noreal, colocamos, ao mesmo tempo,que esse aparelho existe em uma ade-são principal às suas próprias ficçõesou aos seus próprios logros; um apa-relho, em suma, que não tem necessi-dade de se opor para se pôr, um apare-lho que não espera, que não espera nemmesmo que a realidade o decepcione antes desubstituí-la alucinatoriamente por uma ou-tra realidade.” (Safouan, 1988, p. 28,grifos nossos).

Assim, afirma Lacan, a lei dahomeostase que regula o princípio deprazer define o funcionamento in-consciente como um obstáculo à fun-ção adaptativa. Testemunhada pelasformações do inconsciente, a funçãodo princípio de realidade mostra suaprecariedade. Mesmo que a realidadese imponha, ela é, no que o humanotem de singular, submetida ao princí-pio de prazer.

Enfim, segundo Lacan, a impor-tância da descoberta de Freud é a depermitir conceber que a verdade quenão se sabe está articulada ao princípiode prazer. A despeito dos meandros

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e desvios pelos quais esse princípiobusca realizar-se, a partir do instanteem que a realidade se impõe para asobrevivência, a busca da satisfaçãoinsiste, correndo paralela à realidadeconcreta.

Das Ding e o Outro

Freud também supõe a situaçãoem que um outro, um próximo, sejao objeto da percepção do sujeito(Freud, 1895/1995, p. 44). Este obje-to interessa porque é, ao mesmo tem-po, o primeiro objeto de satisfação,o primeiro objeto hostil4 e o únicopoder auxiliar. Mesmo sendo seme-lhante ao sujeito, o complexo percep-tivo do outro se decompõe em doiselementos:

1) Um dos quais impressiona por umaestrutura constante e permanece reu-nido como Coisa (das Ding) – é inas-similável;2) Enquanto o outro é compreendi-do através do trabalho recordativo, ouseja, enquanto pode ser rastreado atéuma notícia do próprio corpo.

Essa indicação é suficiente paranos esclarecer que o outro que res-ponde aos apelos do recém-nascido,não é um outro totalmente identifi-cado por ele como semelhante, masum sujeito que possui um traço dife-rencial – está submetido à ordem sim-bólica. A experiência de satisfação

depende inteiramente desse Outro5 e,nesse ponto, Lacan nos adverte queo princípio de realidade não tem so-mente a função de regular o princí-pio de prazer, mas é o que o articula eo faz existir: “O prazer não se arti-cula na economia humana senãonuma relação com esse ponto, certa-mente deixado vazio, enigmático,mas que apresenta uma certa relaçãocom o que é para o homem a reali-dade” (Lacan, 1997, p. 54).

A primeira apreensão da realida-de pelo sujeito se dá pelo Outro quearticula o “à-parte e a similitude, a se-paração e a identidade” (Lacan, 1997,p. 68). Pela ilustração acima, pudemosconstatar que das Ding é comum tan-to aos investimentos do manto comoaos do núcleo, sem ser, no entanto,redutível a um ou a outro. Ela é umaestrutura constante, presente no es-tado de desejo e na percepção, massem pertencer propriamente a ne-nhum dos dois; das Ding se localizariana interseção vazia de dois conjuntosseparados (Dreyfuss citado porGarcia-Roza, 1991, p. 160).

Para Lacan, das Ding é o elemen-to que é originalmente isolado pelosujeito em sua experiência do Outrocomo sendo, por sua natureza, estra-nho (Fremde): “O Ding como Fremde,estranho e podendo mesmo ser hostilnum dado momento, em todo casocomo o primeiro exterior, é em tornodo que se orienta todo o encaminha-mento do sujeito” (Lacan, 1997, p. 69).

Apesar de ser inassimilável, dasDing serve de referência para o dese-

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jo, na medida em que permite ao aparelho atentar para o mundo daspercepções. Das Ding enquanto vazio, furo na subjetividade, funcio-na como índice de exterioridade. É algo interno à subjetividade quefunciona como índice da realidade.

No texto de 1925, A negativa, Freud nos diz que a função dojuízo é saber se algo que está disponível na forma de uma represen-tação psíquica no eu pode ser reencontrado também na esfera darealidade. Ele nos lembra que todas as representações mentais seoriginaram de percepções, de modo que, a princípio, a própria exis-tência de uma representação já seria uma garantia de sua realidade.A oposição entre o subjetivo e o objetivo só se estabelece porque oaparelho psíquico presentifica a percepção do objeto (alucina) semque ele esteja efetivamente presente no mundo externo, o que, comovimos, resulta em desprazer. Dessa maneira, o objetivo do juízo –neste artigo chamado teste de realidade – não é encontrar na percep-ção um objeto correspondente à recordação, mas reencontrá-lo, cer-tificar-se de que ele ainda permanece presente. Por fim, Freud acres-centa que “o teste de realidade só entrará em cena quando e se osobjetos, que outrora trouxeram satisfação, já tiverem sido perdidos”(Freud, 1925/2007, p. 149).

Segundo Lacan, o objeto que se almeja reencontrar é das Ding,como “Outro absoluto do sujeito” (Lacan, 1997, p. 69). O proble-ma é que este objeto é, desde o início, perdido: trata-se de reaver oque não pode ser reencontrado. Deparamos com suas coordenadasde prazer; o que é buscado é o objeto em relação ao qual o princípiode prazer funciona: “Todos os ataques de tonteiras e acessos dechoro visam a uma outra pessoa – mas, basicamente, visam àquelaoutra pessoa pré-histórica e inesquecível, que jamais é igualada porninguém posteriormente (Freud, 1986 [1896], p. 213).

O objetivo da ação específica – e, segundo Freud (Freud, 1986[1896], p. 213), de toda ação – é ser um meio de reprodução doprazer. Trata-se sempre de reproduzir o estado inicial, de reencon-trar das Ding.

Lacan propõe que tomemos das Ding como o que é, original-mente, fora-do-significado (Lacan, 1997, p. 71). É em torno delaque se organizam as representações. Estas dependem das qualida-des, ou atributos, do objeto, de tal forma que deve ficar claro que omovimento sempre parte dos predicados ou das propriedades, ouseja, da parte variável (neurônios b, c, d...), e nunca da parte quepermanece idêntica. É em função dos neurônios que variam que

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poderão ser feitas as comparações entre os vários complexos queapresentam um ponto de interseção a.

Das Ding e as Vorstellungsrepräsentanz

Na orientação ao objeto dada por das Ding, as representaçõesatraem-se uma à outra segundo as leis de uma organização de me-mória – das facilitações (Bahnungen), cujo funcionamento é reguladopelo princípio de prazer. Lacan sugere que a melhor tradução paraBahnung seria trilhamento, que remete também à concatenação, as-sociação, ou cadeia significante (Lacan, 1997, p. 53).

O psicanalista assevera que “é entre percepção e consciênciaque aquilo que funciona no nível do princípio do prazer se insere”(p. 80). Para entender essa colocação é preciso retroceder ao esque-ma de Freud, presente na Carta 52, de 6 de dezembro de 1896:

I II IIIW Wz Ub Vb Bew

W [Wahrnehmungen (percepções)]: neurônios em que se originamas percepções, às quais a consciência se liga, mas que não retêmnenhum traço do que aconteceu; correspondem aos neurônios fdo Projeto.I) Wz [Warnehmungszeichen (indícios de percepção)]: primeiro re-gistro das percepções, organizado de acordo com associações porsimultaneidade.II) Ub [Unbewusstsein (inconsciência)]: segundo registro, dispostode acordo com relações, talvez causais. Os traços Ub correspon-dem a lembranças conceituais.III) Vb [Vorbewusstsein (pré-consciência)]: terceiro registro, ligado àrepresentação-de-palavra.Bew [Bewusstsein (consciência)]: neurônios perceptivos e desprovi-dos de memória; correspondem aos neurônios w do Projeto.

Pois bem, entre percepção e consciência temos o funciona-mento do aparelho psíquico – ou de memória (y) – formulado porFreud. Apesar de ter sido primeiramente elaborado em 1896, esseesquema estará presente, de maneira implícita, na última parte de

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seu artigo de 1915, O Inconsciente. Nes-te escrito, Freud sugere que separe-mos a representação-de-objeto, istoé, a ideia consciente que temos do ob-jeto, em representação-de-palavra erepresentação-de-coisa (Freud, 1915/2006, p. 49). Se tomarmos o modeloda Carta 52, estas correspondem àslembranças conceituais situadas noregistro Ub, ou inconsciência.

Lacan destaca que a Coisa (dasDing) é diferente da representação-de--coisa (Sachvorstellung). A Sachvorstellungcorresponde à Vorstellungsrepräsentanz,ou à gravitação das Vorstellungen emtorno de das Ding, e pode se tornarconsciente ao se ligar a umaWortvorstellung (representação-de-pala-vra). É válido lembrar que a repre-sentação-de-coisa é um complexoassociativo composto pelas mais va-riadas representações visuais, acústi-cas, táteis, sinestésicas, etc. Ela não éuma representação fechada ou passí-vel de fechamento.

Para entender a sutileza da no-menclatura lacaniana, é preciso con-ceber que algo se instala no lugar daCoisa, fazendo com que ela se apa-gue, ao mesmo tempo em que garan-te a sua existência, por significá-la.Isso que aparece para organizar a“realidade muda” (Lacan, 1997, p. 72)de das Ding é o significante.

Lacan nos lembra que: “Antesainda que se estabeleçam relações quesejam propriamente humanas, certasrelações já são determinadas. Elas seprendem a tudo que a natureza possaoferecer como suporte, suportes que

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se dispõem em temas de oposição. A natureza fornece, para dizer otermo, significantes, e esses significantes organizam de modo inau-gural as relações humanas, lhes dão as estruturas, e as modelam”(Lacan, 1979, p. 26).

Ele dirá que o primeiro sistema com o qual lidamos é o dasWahrnehmungszeichen, os sinais de percepção que expressam-se naalternância a partir de uma sincronia fundamental. Estes sinais depresença/ausência, tensão/apaziguamento já são significantes advin-dos da imersão na ordem simbólica e terão um papel essencial naprópria capacidade de alucinação da Coisa. É porque existe ummomento, um período, uma constância no aparecimento do Outroque a realidade pode existir – não nos esqueçamos que o real éaquilo que retorna sempre ao mesmo lugar (Lacan, 1997, p. 90).

Se é próprio da natureza nos fornecer significantes, é própriodos seres de linguagem o tomarem simbolicamente. É a partir deum agente em função de Outro que tais significantes poderão sertraduzidos para o recém-nascido e algumas patologias graves, comoo autismo, ilustram bem o que pode acontecer quando o agente emfunção de transmissão desse Outro não consegue desempenhar afunção6. Ao falar de um real e de um lugar, Lacan busca enfatizaressa função de referência, de orientação, que o agente desse Outrodeve ocupar. Assim como, na Antiguidade, o conhecimento se arti-culava em torno do que se repetia, do que retornava – o movimentodos astros, as estações do ano –, nos primórdios da constituiçãopsíquica, é preciso que algo possa dar alguma garantia da realidadeao bebê. Esse primeiro agente do Outro comporta algo de real,enigmático, e não será jamais plenamente assimilável, permanecen-do “reunido como coisa” (Freud, 1895/1995, p. 45), para utilizaruma expressão freudiana.

Pois bem, essa “coisa”, ou mais precisamente das Ding no voca-bulário lacaniano, é o primeiro modo de aparição do Real ou a “pri-meira emergência da falta própria ao Real antes da castração propriamentedita” (Safatle, 2006, p. 51, grifos do autor).

Vladimir Safatle assinala que o Eu, responsável por uma certaconstância do aparelho psíquico, procura expulsar de si tudo o querompe com o equilíbrio deste aparelho. Tal expulsão permite o de-senvolvimento das operações primordiais de simbolização (Bejahüng)que formarão o sistema de representações significante. Contudo, aimpossibilidade de simbolização de das Ding, obriga o aparelho psí-quico a um processo de forclusão desse real (p. 157). É nesse senti-

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do que se fala em uma Verwerfung ge-neralizada, presente nas três grandesestruturas clínicas: neurose, psicose eperversão.

Essa pequena digressão foi ape-nas para mostrar que a falta instauradapor das Ding independe do “complexode castração”. Se o Nome-do-Pai é osignificante que transmite a lei do in-cesto, nomeando a falta da Coisa eorganizando a cadeia significante, éapenas a posteriori que teremos essaconfiguração e, ainda assim, apenasnos neuróticos. Nos psicóticos, a for-clusão do Nome-do-Pai levará, nãopor coincidência, a atividade alucina-tória.

Nota-se que o fato de nomear afalta e, por conseguinte, o desejo, nãoos elimina ou os esgota. Trata-se dealgo irredutível. Nesse sentido, asrepresentações (Vorstellungen) quegravitam em torno da Coisa são sem-pre Vorstellungsrepräsentanz, uma vezque o mundo das representaçõesserá, desde então, organizado segun-do as possibilidades do significante.Citamos Lacan: “Em outros termos,é na medida em que a estrutura sig-nificante interpõe-se entre a percep-ção e a consciência que o inconscien-te intervém, não mais enquantoGleichbesetzung, função da manuten-ção de um certo investimento, masna medida em que ele concerne asBahnungen. A estrutura da experiênciaacumulada reside aí e permanece aíinscrita” (Lacan, 1997, p. 67).

Garcia-Roza (1991) afirma queo sentido de uma Vorstellung não de-

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corre daquilo ao qual ela supostamen-te se refere, mas da relação que elamantém com as outras Vorstellungen.Afinal, essa relação é arbitrária eregida, primeiramente, pela lei de dasDing, que busca o prazer e a identi-dade entre coisas que, aparentemen-te, não têm relação nenhuma. A re-presentação-de-coisa só adquire suasignificação pela articulação com arepresentação-de-palavra, de manei-ra que é apenas a posteriori que pode-mos observar a evolução que os es-quemas apresentam em dimensãocronológica.

Com efeito, a função da repre-sentação é aquilo que melhor defineo significante (Thomas-Quilichini,2004, p. 113): “Nossa definição dosignificante (não existe outra) é: umsignificante é aquilo que representa osujeito para outro significante. Essesignificante, portanto, será aquele parao qual todos os outros significantesrepresentam o sujeito: ou seja, na fal-ta desse significante, todos os demaisnão representariam nada. Já que nadaé representado senão para algo”(Lacan, 1998, p. 833).

Um significante não representaa si próprio: “uma definição coerentenão pode atribuir ao significante umsignificado, mas deve apenas e tão--somente descrever uma relação – re-lação esta fundada no princípio dadiferença” (Iannini, 2000, p. 81), talcomo dito acima.

As representações (Vorstellungen)têm uma organização significante(Thomas-Quilichini, 2004, p. 113),

mas são as Vorstellungsrepräsentanzque equivalem à noção e ao termode significante7. A tradução propos-ta por Lacan para o termoVorstellungsrepräsentanz não é a mais fielà gramática alemã. No Vocabulário dapsicanálise, Laplanche e Pontalis (2004)adotam o termo “representante-re-presentação”, mas Lacan opta por“representante da representação”para enfatizar que uma representaçãosempre remeterá a outra.

O termo “representante da re-presentação” demarca o vazio no lu-gar de das Ding, impossível de ser pre-enchido ou traduzido, ao mesmotempo em que é capaz de reunir asrepresentações [Vorstellungen] que re-presentam os atributos da Coisa.

É sempre válido ressaltar que dasDing está além do sistema dasVorstellungsrepräsentanz; ela não é sig-nificante. É aquilo com que se lida damaneira menos operacional: “Diga-mos, hoje, que se ela [das Ding] ocupaesse lugar na constituição psíquica queFreud definiu sobre a base temáticado princípio do prazer, é que ela é,essa Coisa, o que do real – entendamaqui um real que não temos ainda quelimitar, o real em sua totalidade, tan-to o real que é o do sujeito, quanto oreal com o qual ele lida como lhe sen-do exterior – o que, do real primordial,padece do significante” (Lacan, 1997, p.149, grifos nossos).

A Coisa, como real, insiste, per-siste e retorna, não sendo jamais re-presentada ou articulada em uma ca-deia significante.

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Das Ding e a Lei

Na perspectiva de Lacan, a lei fundamental destacada por Freud,aquela a partir da qual começa a cultura, é a lei da interdição doincesto. No nível da interpsicologia mãe-criança, costuma-se dizerque aquilo que ocupa o lugar de das Ding na primeira experiência desatisfação descrita no Projeto é a mãe, de modo que o desejo peloobjeto é o desejo de incesto. Mas esse desejo não poderia ser satis-feito, pois ele é o fim, a abolição da demanda, que é, precisamente,aquilo que estrutura o inconsciente do homem (Lacan, 1997, p. 87).

Vimos que Lacan não identifica a causa da falta com a perda doobjeto materno produzida pela interdição do incesto, mas essa leisitua-se em estreita relação com das Ding. É na ordem da cultura queessa lei se exerce e Lévi-Strauss confirma seu caráter primordial aomostrar a introdução do significante e de sua combinatória na natu-reza humana por intermédio das leis do casamento (estruturas ele-mentares). Ainda assim, segundo Lacan, o antropólogo explicariaporque o pai não desposa sua filha, mas não explicaria porque amãe não pode desposar seu filho. Algo aí permanece velado, que éexatamente o que Freud salienta: o incesto filho-mãe. Esse é o pon-to central, mais enigmático, mais irredutível entre natureza e cultura(p. 87).

Para Lacan, essa inspeção só mereceria ser retida se pudésse-mos confirmá-la no nível do discurso pré-consciente ou conscien-te, e é isso que ele buscará fazer ao recorrer aos dez mandamentos.Ele sugere que aquilo que se passa nos dez mandamentos pode serinterpretado como algo próximo daquilo que funciona na introdu-ção do Nome-do-Pai no inconsciente, isto é, eles seriam destinadosa manter o sujeito à distância de toda realização do incesto; condi-ção fundamental para que subsista a fala (p. 89).

Após analisar alguns mandamentos, o psicanalista encontracomo ápice da reflexão sobre as relações do desejo o seguintemandamento: “Não cobiçarás a mulher do próximo... nem nada doque lhe pertence” (p. 105).

Essa lei, sempre presente na vida dos homens que a violam acada dia – aliás como acontece com qualquer lei –, também guardauma forte relação com das Ding, na medida em que ela “é a primeiracoisa que pôde separar-se de tudo o que o sujeito começou a no-mear e a articular, que a própria cobiça em questão se dirige, não a

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uma coisa qualquer que eu deseje, masa uma coisa na medida em que é aCoisa de meu próximo” (p. 106).

Mais uma vez, Lacan nos remetea esse Outro primordial encarnado,esse próximo estranho que, nessemomento, pode ser entendido comoa mãe. Nesse sentido, a Coisa de meupróximo seria a ‘Coisa da mãe’ – amãe detém aquilo que se deseja. Con-tudo, a mãe em si pode ser o objetodo desejo, mas ela é uma coisa quepertence ao meu próximo, a “Coisado pai”.

De qualquer maneira, o psicana-lista francês aponta que não se conhe-ce a Coisa senão pela Lei. É apenas aposteriori, pelo significante, que a Coi-sa pode existir: “Porque não teria ideiada concupiscência se a Lei não dis-sesse – Não cobiçarás. Foi a Coisa,portanto, que, aproveitando-se daocasião que lhe foi dada pelo manda-mento, excitou em mim todas as con-cupiscências; porque sem a Lei a Coi-sa estava morta. Quando eu estavasem a Lei, eu vivia; mas, sobrevindoo mandamento, a Coisa recobrou vida,e eu morri. Assim, o mandamento queme devia dar a vida, conduziu-me amorte. Por que a Coisa, aproveitan-do-se da ocasião do mandamento,seduziu-me, e por ele fez-me desejode morte” (Lacan, 1997, p. 106).

Esse é o famoso discurso de SãoPaulo concernente às relações da leie do pecado, (Romanos, 7:7), modifi-cado por Lacan, ao substituir a pala-vra pecado pelo termo Coisa. Para ele,a relação entre a Coisa e a Lei não

poderia ser melhor definida do quenessa passagem bíblica.

Retornando à Freud, vemoscomo ele não apenas coloca no lugarde das Ding a mãe, como substitui aLei pela figura do pai, tal como podeser exemplificado em seu mito dahorda primeva presente em Totem etabu (Freud, 1913/1969). O pai, tira-no da horda, possuidor de todas asmulheres, atraía a inveja dos filhos queo assassinaram. Esse crime, seguidode culpa e remorso, longe de permi-tir o acesso à coisa em questão, refor-çou a interdição, introduzindo a or-dem, a essência e o fundamento doâmbito da lei.

Segundo Lacan, o que Freud nosdiz é que Deus está morto desde sem-pre: “O mito do assassinato do pai éjustamente o mito de um tempo parao qual Deus está morto” (Lacan,1997, p. 217). Deus só pode ser o paina mitologia do filho, quer dizer, nomandamento que ordena amá-lo erespeitá-lo (p. 217).

Safatle assinala que se o pai deque se trata fosse aquele de Totem etabu, no qual não incide a castração, osujeito só teria como saída a perver-são: identificação com um Outro semfalta (Safatle, 2006, p. 124). Portanto,o pai simbólico deve diferir do paiempírico, na medida em que ninguémpode ocupar seu lugar: “Eu sou aqueleque é”. Esse adágio tão trabalhadopor Lacan mostra que Deus – a figu-ra por excelência do pai simbólico –porta em si mesmo sua própria de-signação, sem reenviar o problema de

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sua significação a um outro significan-te (p. 120).

Conclusão

De acordo com Safatle, “oimpasse do desejo [em Lacan] ganhaforma no interior do drama edípico, oque não quer dizer que ele é produzidopor ele” (Safatle, 2006, p. 87 – grifosdo autor). Vimos que é muito preco-cemente que se impõe o assentimentoda falta inerente ao Real e é essa faltaque impulsiona a experiência humanaa ir além do princípio de prazer.

Não basta uma possível satisfa-ção da necessidade para apaziguar oorganismo humano. Ele é arrebatadode tal maneira pelo Outro que todasua atividade a partir de então se guia-rá para reproduzir sensações de pra-zer. Deve vir também do Outro oslimites a essa busca incessante de pra-zer, sob a pena desse organismo aban-donar-se a si mesmo. É nesse sentidoque Lacan aponta uma tendência aobter tal excesso de prazer que sópode ser concebido como gozo. Mes-mo a interdição à “coisa” que propor-ciona prazer só faz acender e reani-mar o desejo pelo proibido objeto,abrindo sempre as vias para um gozomortífero, na medida em que suaassunção ocasionaria o fim da deman-da que impulsiona a vida.

A hipótese freudiana do apare-lho psíquico permite localizar a mon-tagem pulsional. Nesta, algo se satis-

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faz pelo funcionamento de um aparelho. Este mecanismo de satis-fação pelo funcionamento do aparelho conduz Lacan a interrogar:como definir a satistação?

Alguma coisa se inscreve como horizonte da satisfação, lembraLacan: o sexual, e é nessa medida, como horizonte da satisfação,que a psicanálise aborda a sexualidade. Entretanto, argumenta Lacan,esta constatação não implica considerar que a psicanálise é um sa-ber sobre a sexualidade, pois a psicanálise não é um saber sobre osexual. A psicanálise aborda o saber sexual apenas pela via do inter-dito que pesa sobre esse saber. Afinal, o interdito afeta o lugar em que sefala do sexual, o lugar em que se investe no sexual, o lugar que já seocupava do sexual antes da instauração do princípio de realidade: oprincípio de prazer.

Graças à sexualidade como horizonte da satisfação – mantidacomo horizonte – que as pulsões se inscrevem em sua função deaparelho, pois a satisfação é essencial à pulsão. O prazer comportaum nível de estimulação dialético, ao mesmo tempo buscado e evi-tado, um limiar que implica a centralidade de uma zona proibidaporque nela o prazer seria intenso demais. Essa centralidade é ocampo do gozo, que implica tudo o que decorre da distribuição doprazer no corpo. O limite íntimo dessa distribuição condiciona aproibição no centro que constitui o que nos é mais próximo, embo-ra só possa ser reconhecido do lado de fora – esse estranho tãofamiliar – é a iminência intolerável do gozo.

Essa iminência intolerável do gozo não é a articulação signifi-cante do inconsciente, ou seja, o A maiúsculo do sistema lacaniano.Ao contrário, o terreno do Outro fez assepsia do gozo ou, nas pala-vras de Lacan: “O Outro é apenas a terraplenagem higienizada dogozo”.

Não existe uma realidade natural, funcionando sem um Outro,que imporia seus limites ao organismo humano. Por isso, Lacanquestiona o princípio de realidade formulado por Freud, tal como opróprio pai da psicanálise acabará por fazer em sua segunda tópica.A realidade só é assimilada a partir das experiências de prazer/desprazer e sua percepção será por elas determinada.

Essa dialética entre o Universal e o Particular perdurará portodo o ensino de Lacan e será a partir de uma retomada da noção deImaginário que ele poderá articular os registros do Real, Simbólicoe Imaginário.

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DAS DING AND THE OTHER IN THECONSTITUTION OF THE PSYCHISM

ABSTRACT

This article aims to explicitate the Lacanian usageof the notion of das Ding extracted from Freud’sProject for a Scientific Psychology (1895).Resuming the idea of an experience of satisfactionwe will try to show at which point das Ding, as theReal, is essential to the constitution of the psychism.Moreover, it will be pointed out how the relationshipof the infant with the Other can determine a wayof dealing with reality marked by the jouissance.

Index ter ms: das Ding; Entwurf; Other ;constitution of the psychism; jouissance.

DAS DING Y EL OTRO EN LACONSTITUCIÓN PSÍQUICA

RESUMEN

El artículo tiene como objetivo explicitar la apropiaciónlacaniana de la noción del das Ding partindo delProyecto de Psicologia Científica (1895) de Freud. Alretomar la idea de vivencia de satisfacción buscaremosdemostrar en que medida das Ding, como Real, esesencial a la constitución del aparato psíquico. Por otraparte, será destacado como la relación del niño con elOtro puede determinar una manera de aprehensión dela realidad marcada por el goce.

Palabras clave: das Ding; Entwurf; Otro;constitución psíquica; goce.

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NOTAS

1 Daqui por diante, nos referiremos ao Projeto de uma psicologia apenas como Pro-jeto.

2 A vivência de satisfação encontra-se descrita no item 11 da “Parte I: PlanoGeral do Projeto” do Projeto, pp. 31-33.

3 “O mundo das percepções nos é dado por Freud como que dependendo des-sa alucinação fundamental sem a qual não haveria nenhuma atenção disponível”(Lacan, 1997, p. 69).

4 Assim como o bebê precisa da ajuda alheia para se alimentar, precisa dela paraaplacar a dor, provocada pelos estímulos do ambiente, de modo que o outrotambém é o primeiro objeto hostil, pois aparece como uma das facilitações resul-tantes dessa experiência. Esse também é um dos motivos pelos quais o acesso aoobjeto deve ser impedido – defesa primária.

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5 A partir daqui, utilizaremos a grafia Ou-tro com “o” maiúsculo para indicarmos quenão se trata do outro semelhante do “estádiodo espelho”. Trata-se de um Outro submeti-do ao simbólico, que trata o bebê de acordocom as regras estabelecidas pela cultura.

6 Aludimos aqui à questão proposta porLacan de como o aparelho psíquico “contor-na os desencadeamentos de catástrofes acar-retadas fatalmente por um tempo, grande oucurto demais, de abandono do aparelho doprazer a si mesmo” (Lacan, 1997, p. 41).Nossa hipótese é a de que tanto um excessode intervenções quanto um possível descasonos primeiros cuidados com o bebê pode-riam ser danosos a uma constituição psíqui-ca, levando tanto a casos de um total desliga-mento do mundo das percepções – autismo–, quanto a um ritmo alucinatório de vivênciasde satisfação que podem levar à morte –mericismo.

7 De acordo com Josiane Thomas--Quilichini, autora do verbete “O conceitode representação” do Dicionário de psicanálise:Freud e Lacan, na lição de 26/11/1958 de Oseminário, livro 6: O desejo e sua interpretação (iné-dito) – Lacan teria feito a seguinte afirma-ção: “esse Vorstellungs-Repräsentanz é es-tritamente equivalente à noção e ao termode significante” (Thomas-Quilichini, 2004,p. 113).

[email protected]@uol.com.br

Recebido em março/2009.Aceito em julho/2009.

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