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V - APELACAO CRIMINAL 2008.50.01.000754-0 RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO APELANTE : L. O. C. - REU PRESO ADVOGADO : JAIR DE MENDONÇA CARDOSO E OUTRO APELANTE : R. C. P. M. M. - REU PRESO ADVOGADO : AGENOR JORGE FERNANDES CORREA E OUTRO APELANTE : R. R. S. - REU PRESO ADVOGADO : LISIMAR COUTINHO BARBOSA E OUTRO APELANTE : W. S. R. - REU PRESO ADVOGADO : LISIMAR COUTINHO BARBOSA E OUTRO APELANTE : A. G. C. J. - REU PRESO ADVOGADO : LISIMAR COUTINHO BARBOSA E OUTRO APELANTE : E. L. A. - REU PRESO ADVOGADO : MARIA APARECIDA SILVA CAMPOS APELANTE : C. A. S. ADVOGADO : LUIS EDUARDO NOGUEIRA MOREIRA APELADO : MINISTERIO PUBLICO FEDERAL ORIGEM : 1ª VARA FEDERAL CRIMINAL DE VITÓRIA/ES (200850010007540) RELATÓRIO Trata-se de Apelações Criminais de ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR, WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA, LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO, EDUARDO LOPES ALVES e RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO, em face de sentença prolatada pelo MM Juiz da 1ª Vara Federal Criminal do Espírito Santo, que julgou PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR os réus pela prática dos crimes descritos nos arts. 230, 231 e 288, na forma do art. 69, todos do CP. A denúncia narra que os apelantes integram organização criminosa voltada ao rufianismo e ao tráfico de pessoas para a prática de prostituição na Itália. Convencido de que eram verdadeiros os fatos narrados na inicial acusatória, o MM Juiz a quo condenou os então réus às seguintes penas: i) ALTOMIR – 22 anos de reclusão e 1370 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes dos arts. 230, 231 (2 vezes) e 288, na forma do art. 69, todos do CP; ii) WESLEY – 15 anos de reclusão e 1080 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes previstos nos arts. 230, 231 e 1

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V - APELACAO CRIMINAL 2008.50.01.000754-0

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO

APELANTE : L. O. C. - REU PRESOADVOGADO : JAIR DE MENDONÇA CARDOSO E OUTROAPELANTE : R. C. P. M. M. - REU PRESOADVOGADO : AGENOR JORGE FERNANDES CORREA E

OUTROAPELANTE : R. R. S. - REU PRESOADVOGADO : LISIMAR COUTINHO BARBOSA E OUTROAPELANTE : W. S. R. - REU PRESOADVOGADO : LISIMAR COUTINHO BARBOSA E OUTROAPELANTE : A. G. C. J. - REU PRESOADVOGADO : LISIMAR COUTINHO BARBOSA E OUTROAPELANTE : E. L. A. - REU PRESOADVOGADO : MARIA APARECIDA SILVA CAMPOSAPELANTE : C. A. S.ADVOGADO : LUIS EDUARDO NOGUEIRA MOREIRAAPELADO : MINISTERIO PUBLICO FEDERALORIGEM : 1ª VARA FEDERAL CRIMINAL DE VITÓRIA/ES

(200850010007540)

RELATÓRIOTrata-se de Apelações Criminais de ALTOMIR GOMES

CARDOSO JÚNIOR, WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA, LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO, EDUARDO LOPES ALVES e RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO, em face de sentença prolatada pelo MM Juiz da 1ª Vara Federal Criminal do Espírito Santo, que julgou PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR os réus pela prática dos crimes descritos nos arts. 230, 231 e 288, na forma do art. 69, todos do CP.

A denúncia narra que os apelantes integram organização criminosa voltada ao rufianismo e ao tráfico de pessoas para a prática de prostituição na Itália.

Convencido de que eram verdadeiros os fatos narrados na inicial acusatória, o MM Juiz a quo condenou os então réus às seguintes penas: i) ALTOMIR – 22 anos de reclusão e 1370 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes dos arts. 230, 231 (2 vezes) e 288, na forma do art. 69, todos do CP; ii) WESLEY – 15 anos de reclusão e 1080 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes previstos nos arts. 230, 231 e

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288, na forma do art. 69, todos do CP; iii) ROGÉRIO – 15 anos de reclusão e 1080 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes previstos nos arts. 230, 231 e 288, na forma do art. 69, todos do CP; iv) LIANDRA - 11 anos de reclusão e 415 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes previstos nos arts. 231 (2 vezes) e art. 288, na forma do art. 69, todos do CP; v) EDUARDO – 6 anos de reclusão e 265 dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos arts. 231 e 288, na forma do art. 69, todos do CP; vi) RALPH – 4 anos e 6 meses de reclusão e 370 dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática dos crimes previstos nos arts. 230 e 288, na forma do art. 69, todos do CP.

ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR, WESLEY DE SOUZA RAMOS e ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA apelaram (fls. 674/697), pugnando, em síntese: i) pela absolvição de ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR da acusação de ter praticado o crime de tráfico internacional de pessoas quanto a ao argumento de insuficiência probatória para a condenação; ii) pela absolvição de WESLEY e ROGÉRIO da acusação de terem praticado o crime de tráfico internacional de pessoas em relação a iii) pelo reconhecimento de crime continuado entre rufianismo e tráfico internacional de pessoas, por se tratar de crimes da mesma espécie; iv) o reconhecimento da continuidade delitiva entre os dois crimes de tráfico internacional de pessoas, pelos quais foi condenado o apelante ALTOMIR, no caso de não vir a ser absolvido; v) pelo reconhecimento da inexistência do crime de quadrilha.

LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO apelou (razões às fls. 619/635), sustentando a insuficiência probatória para a sua condenação pelos quais foi condenada (art. 231, duas vezes e art. 288 do CP) e, subsidiariamente, requer seja reduzida a pena aplicada e, conseqüentemente, alterado o regime inicial para o seu cumprimento.

EDUARDO LOPES ALVES apelou (razões às fls. 712/735) pugnando por sua absolvição por insuficiência probatória da sua participação nas práticas dos delitos. Segundo afirma, seu envolvimento nos fatos se deve unicamente ao fato de ser homossexual e ter travado apenas um diálogo com WESLEY em 01/07/2009. Alega que os próprios policiais federais esclareceram que não havia sido o denunciado, ora apelante Eduardo (Duda), quem ajudou ou intermediou a viagem da ida de para a Itália.

RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO apelou ás fls. 604/617, pugnando, em síntese, pela sua absolvição, tendo em vista a insuficiência probatória de que tenha participado dos crimes de rufianismo e

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de quadrilha. Alega que a interceptação telefônica é nula, eis que não era o único meio viável para a investigação, de forma que a sua autorização e as prorrogações violaram o art. 5º, XII, da CF, por ter atingido a garantia constitucional do sigilo das correspondências e das comunicações telefônicas. Pugna, ainda, pela desconsideração da agravante do art. 62, IV, do CP e, finalmente, invoca em seu favor o pedido de absolvição feito pelo MPF, em alegações finais, que evidenciaria a inocência do recorrente.

CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, Delegado Federal, apela de parte da sentença que o condenou a pagar multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo suposto descumprimento da ordem judicial de transferir os presos, bem como, que requisitou a instauração de inquérito policial para apurar a suposta prática do crime de falsidade ideológica.

Contrarrazões aos recursos de RALPH CARDOSO PEREIRA MERIGELLO MACHADO e LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO, às fls. 637/645, pelo desprovimento dos recursos.

Contrarrazões ao recurso de CARLOS ALBERTO DOS SANTOS pelo desprovimento do recurso.

Contrarrazões aos recursos de ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR, WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA e EDUARDO LOPERS ALVES, às fls. 739/750, pelo desprovimentos de todos os recursos.

Parecer do Ministério Público às fls. 761/799, pelo provimento dos recursos de RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO e CARLOS ALBERTO DOS SANTOS; pelo parcial provimento dos recursos dos apelantes ALTOMIR GOMES CARDOSO JUNIOR, WESLEU DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES SILVA e pelo desprovimento do recurso da apelante LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO.

É o Relatório.À d. revisão.

DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETORelator

2ª T. Especializada

VOTO VENCEDOR

Trata-se de apelações criminais interpostas por ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR, WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA, LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO,

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EDUARDO LOPES ALVES, RALPH CARDOSO PEREIRA e CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal Criminal do Espírito Santo/ES.

O eminente Relator do feito, Desembargador Federal Messod Azulay Neto, em seu substancioso voto acostado às fls. 860/889, deu PROVIMENTO ao recurso de RALPH MACHADO, deu PARCIAL PROVIMENTO aos recursos de ALTOMIR CARDOSO, WESLEY RAMOS e ROGÉRIO DA SILVA para absolvê-los da prática do delito previsto no artigo 230 do Código Penal, NEGOU PROVIMENTO aos recursos de LIANDRA CARDOSO e EDUARDO ALVES, JULGOU PREJUDICADO o recurso de CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, em razão de anterior concessão de ordem em mandado de segurança, cujo objeto era idêntico ao presente pedido, e, de ofício, determinou o afastamento da pena de multa para o crime de quadrilha, em atenção ao princípio da reserva legal.

No que tange aos recursos dos acusados RALPH, LIANDRA e EDUARDO, do terceiro interessado CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, e da ordem de ofício no que se refere à exclusão da pena de multa quanto ao delito de quadrilha, adiro integralmente ao voto prolatado pelo eminente Relator, adotando sua fundamentação como razões de decidir.

Com efeito, no que concerne ao acusado RALPH, não há provas suficientes para sua condenação pelos delitos de rufianismo e quadrilha, vez que a única conduta descrita na sentença em seu desfavor foi o pedido do corréu ALTOMIR para localizar a família de para cobrar uma dívida, o que nunca se concretizou.

Não obstante haja indícios de que RALPH sabia das atividades de ALTOMIR, diante do diálogo contido na denúncia, não há mais nenhuma informação concernente ao fato de o mesmo ter efetivamente realizado a cobrança de valores dos familiares de valores que teriam relação com o seu envio ao exterior para prostituição.

No tocante ao delito de tráfico internacional de pessoas, previsto no artigo 231 do Código Penal, igualmente ao Relator, entendo que deve ser mantida a condenação de ALTOMIR, que inclusive confessou este fato, e de LIANDRA, pelo envio de bem como WESLEY, ROGÉRIO e EDUARDO, pelo envio de Adriele e não havendo observações adicionais a serem feitas, vez que o voto do Relator analisou minuciosamente as questões apresentadas, consoante fls. 865/883.

Sob outro giro, com a devida vênia ao entendimento perfilhado pelo eminente Desembargador Federal Messod Azulay Neto, divirjo apenas no que pertine à absolvição de ALTOMIR, WESLEY e ROGÉRIO pela

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prática das condutas tipificadas como rufianismo, previsto no artigo 230 do Código Penal.

Isto porque, entendo que a sentença deve ser mantida neste ponto, vez que devidamente comprovado o delito. A despeito de o MPF ter sustentado em parecer que não havia prova suficiente quanto a este delito, há diálogos nos quais os acusados negociam o pagamento de taxas com mulheres e travestis que utilizam seus apartamentos para a prostituição, como o colacionado na sentença às fls. 455/458 e os colacionados na denúncia às fls. 22/32.

Ademais, nos diálogos de fls. 31 e 32 é possível depreender que ALTOMIR (“Carminha”), WESLEY e ROGÉRIO controlam a movimentação de travestis brasileiros na Itália, alterando de lugar as pessoas que não “rendem” o esperado por eles, evidenciando que os acusados se beneficiavam da prostituição alheia, tal como reconhecido nos autos da ação penal anterior (nº 2006.5101.008164-0), julgada à unanimidade pela 2ª turma, em voto de minha relatoria, que os condenou pelo mesmo delito em razão de fatos anteriores.

Ainda no que concerne a tais acusados, observo que as penas-base fixadas pelo Magistrado a quo foram fixadas bem acima do mínimo. Contudo, além de não se distanciarem muito das penas fixadas por esta 2ª Turma no julgamento da ação penal nº 2006.50.01.008164-0, de minha Relatoria, que julgou ALTOMIR, WESLEY e ROGÉRIO pelos mesmos crimes em fatos diversos, a circunstância de os acusados continuarem a delinquir deve ser severamente repreendida, uma vez que a condenação anterior não foi capaz de alterar suas condutas, além de evidenciar que os mesmos, de fato, fazem dessa atividade sua profissão, seu meio de vida.

Desta forma, com a devida vênia ao eminente Relator, divirjo de seu voto apenas no tocante à absolvição de ALTOMIR, WESLEY e ROGÉRIO pelo delito do artigo 230 do Código Penal, aderindo, por outro lado, às suas conclusões expendidas no voto acostado às 860/889, que ora passam a fazer parte deste, quanto aos demais acusados e aos demais capítulos da apelação interposta pelos réus acima mencionados.

Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso de RALPH MACHADO, NEGO PROVIMENTO aos recursos de ALTOMIR CARDOSO, WESLEY RAMOS, ROGÉRIO DA SILVA, LIANDRA CARDOSO e EDUARDO ALVES, JULGO PREJUDICADO o recurso de CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, em razão de anterior concessão de ordem em mandado de segurança, cujo objeto era idêntico ao do recurso interposto, e, de ofício, determino o AFASTAMENTO da pena de multa para o crime de quadrilha, em atenção ao princípio da reserva legal.

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É como voto.

LILIANE RORIZRelatora

VOTO

Como relatado, trata-se de Apelações Criminais de ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR (conhecido como CARMINHA), WESLEY DE SOUZA RAMOS (LEILA ou LEILINHA), ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA (ROGÉRIA), LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO, EDUARDO LOPES ALVES (conhecido por DUDA), RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO e CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, em face de sentença prolatada pelo MM Juiz da 1ª Vara Federal Criminal do Espírito Santo, que julgou PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR os réus pela prática dos crimes descritos nos arts. 230, 231 e 288, na forma do art. 69, todos do CP.

Os autos revelam, em suma, que os apelantes foram julgados e condenados pela participação alternada em três eventos criminosos, a saber, os envios de

já que quanto ao envio de Bianca, restou demonstrado que não passaram de atos preparatórios, tal como tratado na própria denúncia por “tentativa de aliciamento”.

Inicialmente, impende afastar a preliminar aduzida no recurso de RALPH CARDOSO PEREIRA MERIGELLO MACHADO. Trata-se da alegação de nulidade da interceptação telefônica, por violação ao que dispõe o art. 2º, II, da Lei nº 9.296/96, ao argumento de que tal medida somente deve ser deferida diante da ausência de outros meios de prova, é dizer, deve ser o último meio de que se deva lançar mão para a comprovação do fato apontado delituoso. Alega que a autorização da medida em questão sem a observância do referido dispositivo afronta ao art. 5º, XII, da CF, por aquele regulamentado. Aduz, finalmente, o excesso de prazo da interceptação que teria sofrido prorrogações indiscriminadas.

Não assiste razão ao apelante.Como se sabe a garantia constitucional do sigilo das comunicações

telefônicas não é absoluta, tendo a própria CF excetuado quanto a esta, para os fins de investigação criminal ou instrução processual penal, desde que por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer.

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Por outro lado, de fato, a Lei nº 9.296/96, em seu art. 2º, determina que a interceptação telefônica somente tenha lugar na instrução processual na falta de outros meios de prova disponíveis.

É este o caso dos autos. A medida foi regularmente requerida pelo Departamento de Polícia

Federal, obteve a anuência do MPF e se fundou na existência de fortes indícios da prática de crimes graves, que já vinham sendo investigados por meio de trabalhos de campo realizados pela inteligência policial. Estas diligências acabaram por culminar na identificação de uma quadrilha com ramificações no norte da Itália especializada em exploração sexual de vítimas brasileiras em situação de escravidão.

Segundo arrazoado da Polícia Federal de fls. 03/24, do apenso que traz a cautelar nº 2009.50.01.000695-2, foram efetivadas diligências de campo e utilizados informantes que confirmaram a existência do veículo indicado na denúncia do restaurante utilizado, provavelmente na lavagem de dinheiro auferido com a prática criminosa. O grupo de trabalho verificou também diversos elementos que se somaram à reunião indiciária em que se fundou o requerimento da medida ora atacada. Verifique-se o documento de fl. 22 do mesmo apenso, onde se especificam os referidos fatores.

Daí se infere que não houve violação ao art. 2º, II, da Lei nº 9.296/96, eis a alegação de que os órgãos encarregados do ônus acusatório não lançaram mão de outros meios de prova é inverídica, vide as fotografias e documentos que estão insertos nas cautelares apensadas ao presente feito.

Tanto os requerimentos quanto as autorizações para a efetivação da medida nos dão conta da imprescindibilidade das escutas para as apurações, dada inclusive a natureza do crime e o modus operandi da quadrilha, cujas transações eram feitas por telefone.

No que concerne às prorrogações das interceptações, a alegação merecerá o mesmo destino já que, como bem posto pelo Parquet, “O dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei nº 9.296/96, a qual, em seu art. 5º, estabelece um prazo inicial de quinze dias de interceptações, renováveis por igual tempo, uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova para as investigações.”

E continua:“E, embora a lei não tenha fixado o número de vezes em que

prorrogável o período inicial da escuta, a jurisprudência pátria já se fixou no sentido de que é possível a renovação por mais de uma vez, desde que comprovada a indispensabilidade da medida, isto é, desde que demonstrada a persistência dos pressupostos que justificaram o deferimento da medida extrema.”

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Superada a preliminar, passo ao exame do mérito.Os apelantes foram condenados pela prática dos crimes dos arts.

230 (ALTOMIR, WESLEU, ROGÉRIO e RALPH), 231 (todos, exceto RALPH) e 288 (TODOS), na forma do art. 69, todos do CP.

Talvez seja oportuno breve comentário sobre os crimes em tese antes de amoldar as condutas praticadas pelos apelantes aos tipos penais.

O art. 230 assim dispõe:“Art. 230. Tirar proveito da prostituição alheia,

participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:

Pena – reclusão, de 1 a 4 anos, e multa.”

E o art. 231:“Art. 231. Promover, intermediar ou facilitar a

entrada, no território nacional, de pessoa que venha exercer a prostituição ou a saída de pessoa para exercê-la no estrangeiro:

Pena – de 3 a 8 anos, e multa.”

Para a consumação do primeiro crime, é imprescindível que fique provado que o agente efetivamente tirou proveito da prostituição alheia. A doutrina exige a habitualidade na participação e ressalta que o proveito deve ser natureza econômica e não sexual.

Já para que se consuma o crime do art. 231, tráfico de pessoas, são requeridos outros elementos apontados na doutrina como ações que envolvam a facilitação, não só em arregimentar as pessoas, como também de organizar tudo aquilo que seja necessário para que o tráfico internacional seja bem-sucedido.

O consentimento da vítima não exclui a culpabilidade do traficante ou do explorador, pois que ainda que tenham consciência de que exercerão a prostituição, não têm ideia das condições em que a exercerão e, menos ainda, da dívida que em geral contraem antes de chegar ao destino.

Também não altera a culpabilidade dos agentes do crime do art. 231, a ausência de prova de que de fato as vítimas exerceram efetivamente a prostituição, pois que se trata de mero exaurimento do delito.

Por fim, importa salientar que foi incluída na configuração típica do crime a conduta “intermediar”, passando a punir também o agente que é utilizado como intermediário entre aquele que ingressar ou sair do território nacional como o fim de exercer a prostituição, e aquele outro que já

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participa da atividade, seja da prostituição ou da facilitação desta atividade.Dito isto, passemos aos fatos e à análise das alegações recursais.No que concerne à prática deste crime, do art. 231 do CP, a

condenação se fez com base nos eventos delituosos, de tal forma que restaram condenados pelo envio de somente, ALTOMIR e LIANDRA; já pela participação do envio de (conhecida como

, estiveram envolvidos os dois precitados, além dos demais, WESLEY, ROGÉRIO, EDUARDO, restando RALPH absolvido da prática deste crime.

Quanto ao envio de ALTOMIR e LIANDRA tiveram suas condutas precisamente delineadas ao longo da instrução e na sentença condenatória.

De fato, as ações de ambos se amoldam com perfeição ao tipo na modalidade promover, de vez que ambos facilitam e organizam toda a dinâmica criminosa, até a chegada da vítima na Itália, e mesmo depois, mantêm-se em contato com elas, como se vê das transcrições.

A materialidade do crime está demonstrada pelo documento emitido pela empresa aérea TAM, inserto na cautelar 2009.50.01.000695-2, às fls. 164, que informa o itinerário da vítima, bem como certifica o embarque da mesma. No seguinte teor, o conteúdo do documento:

“Em atenção ao ofício em epígrafe, no qual nos solicitaram informar o destoe final, bem como quais os vôos que a nacional

embarcou no dia 02 de fevereiro de 2009, no Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim/RJ, vimos pela presente informar o que segue:

De acordo com o nosso banco de dados, constatamos que a referida passageira embarcou no Aeroporto Internacional do Galeão/RJ com destino à cidade de Frankfurt/Alemanha, no dia informado por V. Sa., tendo utilizado os vôos JJ8 084, trecho Galeão-Guarulhos, vôo JJ8070, trecho Guarulhos-Frankfurt/Alemanha e vôo CD3154, trecho Frankfurt-Florence, apresentando o passaporte CY1 03470, conforme passagem aérea anexada nesse documento.”

A autoria se vê incontroversa nos diálogos interceptados que nos dão conta de que ALTOMIR (Carminha) se comunicava com e tinha a assessoria de LIANDRA na organização das atividades, tais como fazer depósitos, trazer e levar recado de um ao outro e, o mais sintomático, há comprovação de que LIANDRA recebia pagamento por sua contribuição.

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Ao que os diálogos indicam, LIANDRA fazia a interface entre e a organização aliciadora. Confira-se:

Índice 314177Operação MEDIADOR 4Nome Alvo CARMINHA - MEDIADOR 4Fone alvo 2799542656Localização do Alvo...:Fone Contato 21 3357 675Localização do Contato:Data 02/02/2009Horário :18:52:15Observações l© CARMÍNHA X -

DEGRAVARTranscrição: A chamada foi realizada do n° 21

3367 6375, trata-se de um TELEFONE PUBLICO IDENTIFICADO

diz que estava sem cartão e que está ligando para dizer que a mulher parou ela lá e disse que para embarcar tem que ter o seguro saúde. Carminha diz que não precisa fazer não. Para dizer que vai sem.

diz que ela tinha dito que era 180 reais que ela tinha que pagar Carminha diz que não precisa não. Para que ela diga que vai viajar sem.

diz: aí eu vou pra Frankfurt, né, e depois...”

Carminha interrompe muito nervosa: “NÃO, NÃO, DEPOIS A GENTE CONVERSA, FILHA, SOBRE ISSO!”

Despedem-se.”

Em 30 de março de 2009 foi captada ligação entre CARMINHA e em que se pode ver em que condições exercia a prostituição

na Europa. Eis o resumo do diálogo:Índice: 599386Data 30/03/2009Horário 12.29:15Observações . c© CARMINHA

COBRANÇA

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Transcrição liga se referindo à Carminha como Júnior.

Carminha pergunta se está tudo bem com ela. diz que não. Fala que, se não fosse a

mãe dela para conseguir o telefone de Carminha, nunca mais teria o número dela. Conta que

saiu da Jô (JOCÉLIA, IRMÃ DE CARMINHA NA ITALIA). no final da semana do último contato que tiveram. Diz que se falaram numa terça e que na sexta, da mesma semana, ela foi embora. Fala que a “filha” da Jô (julgamos não ser filha de verdade, mas uma protegida) tem problema com álcool, que a agrediu dentro do apartamento.

Carminha diz que é um absurdo. diz que não ia contar nada, mas como

está em situação difícil, quer falar. Pergunte se Carminha está com tempo.

Carminha diz que sim.comenta que na briga que teve,

(uma terceira pessoa não pulou em cima dela, que não é lésbica, mas que quando bebe perde a

noção. Que a tal “filha de Jô” começou a falar da vida de da mãe dela, disse que ela deveria ficar lá o tempo necessário... Conta que, em certo momento, falou que ia dormir pois, no dia seguinte. nó estaria lá às 08 horas, pois elas estavam com horário (com tempo) de manhã e que a Jô estava indo todo dia de manha lá no local onde ela e as mulheres viviam. Conta que quando foi dormir a mulher surtou, que chegou a quebrar uma garrafa de vodca. As duas discutiram e disse que iria encher a cara dela de porrada e voltaria para o Brasil direita. fala que só conseguiu fazer 50 euros na semana toda com apenas um programa. Conta que acabou rendo que dormi, fora, que teve sair às 3 da manhã e quando a Jô foi lá de manhã pediu para

não contar nada pro Junior (Carminha). Fala que Carminha não está a par de meia crina.

Carminha fala que não sabia de nada. fala que mandou um depoimento para

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Liandra (no Orkut) pedindo o número de Carminha e que Liandra disse que tinha apenas o antigo (julgamos que a resposta de Liandra tenha sido mentirosa). diz que ainda argumentou: “Liandra, como que é o antigo se era você que estava tratando as coisas comigo’?”(tratando com

e Carminha sobre os detalhes da viagem ocorrida em 02/02).

Carminha diz que acha que ele tinha o correto. diz que não teve muita dificuldade para

conseguir o número de Carminha, já que também perdeu o contato com inclusive no Orkut.

conta que diz pra Jô: “olha, pra ficar aqui na sua casa ganhando 50 euros, você liga pro Júnior e fala pra ele que vai me mudar de lugar ou então fala pra ele que eu vou voltar para o Brasil e que eu pago a ele (a Junior, Caminha) lá, com meu trabalho, fico trabalhando num cabaré normal e fico pagando a ele por mês, por semana, do jeito que ele quiser”.

diz que a Jô falou que não tinha necessidade, que ela foi até lá e iria voltar sem nada. voltar em vão.

falou para Jô que tem uma amiga que está numa casa .chamada “Viva em Madri’, que aquela amiga falou que lá está muito bom. E perguntou para a Jô se ela a deixaria ir trabalhar lá. Então ela ria e levaria e Michele junto, porém se ela beber ou se drogar não a conheceria. Jô deu a permissão e elas foram trabalhar na “Viva em Madri. Com uma semana trabalhando na casa, a Michele surtou, foi embora para Valência. A amiga havia mentido que a casa que estava bombando não tinha ninguém.

Carminha ri.. falou para a Jô que quer arrumar uma

maneira de pagar, porque ela quer ir embora, que não quer mais ficar lá, pois não tem trabalho em luar nenhum e que está muito difícil. Fala que encontrou uma amiga que vai para Málaga, que agora começa

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o verão e agora é a época do dinheiro. disse que não interessa onde ela vai trabalhar, que ela só precisa de dinheiro urgente, pra ontem (para pagar a dívida com Carminha). Diz que ficou na casa de um cliente para não pagar o piso, que faz uma semana e ficará lá até arrumar outro trabalho. diz que a vida dela está um caos. diz que o rapaz da viagem ligou pra lá muito nervoso (provavelmente para cobrar)

Júnior interrompe dizendo que ligou calmo. não ligou nervoso não. (A LIGAÇÃO NÃO FOI INTERCEPTADA POR MOTIVO DAS CAUTELAS DE CARMINHA, MAS AQUI ELA MESMO CONFIRMA TER TELEFONADO).

diz que falou pra Jô que ela não pode ficar lhe cobrando dinheiro, porque a Jô não ta na rua rodando a bolsinha junto com ela. Que uma coisa era ela estar dentro da casa da Jô com a calcinha enfiada no rabo esperando os homens ligarem e o telefone não tocar.

fala que o dinheiro se foi todo com anúncios de propaganda. Conta que a Jô pegou 800 euros de e ficou pra ela e o restante do dinheiro ela botou de anúncio, mas que o telefone não tocava nem por um c...

conta que a Jô mandava os amigos de Antonio lá, que falava que o programa era 100 euros mas na hora o cara queria dar 30, 35, .50 euros.

Carminha se limita a responder sem comentários: “verdade...”

diz que, reclamando com a Jô, falou que ela tem a intenção de pagar , mas só que diante disso tudo está com dificuldades.

fala que disse p Jô: eu quero te pagar, mas convenhamos o seu irmão (Júnior, Carminha, irmão de Jocélia) quando falou comigo esse assunto de vigem foi muito delicado. E os doze mil caíram super bem nos meus ouvidos (...) como uma coisa que vai acontecer e que acontece mesmo, se a garota tiver disponibilidade de ficar aqui um ano ela paga a

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dívida e ainda volta rica”.Carminha diz que não está com pressa de

receber não, que só queria saber notícias dela como ela estava, se estava bem.

fala que essa mulher é doida, que falou que Carminha estava atrás de e dela. fala que estava no Rio até semana passada. Que se tivesse algum problema para resolver com Carminha já teria feito.

diz que Jô falou se fez, foi direto com Carminha, pois Carminha não falou nada com ela (Jô). disse que não quer saber do assunto deles, quer apenas saber da vida dela, que a mãe dela está doente, que a casa dela vai ser entregue e sua mãe ficará na rua.

Carminha interrompe e fala que conhece gente na Itália e, se quiser, ela arruma um lugar para ficar na Itália.

pergunta se outro piso igual aquele (apartamento).

Carminha fala que sim, que não é boate. pergunta quando Carminha poderá dar

uma resposta.Carminha diz que estará na internet e

conversará com a menina. pergunta se ligar amanhã para

Carminha se ela terá alguma coisa para falar.Carminha diz que terá.

fala que tem que aproveitar agora, pois ainda tem um mês para se locomover legalmente. Depois que ficar ilegal terá que permanecer somente em um só lugar.

Carminha diz que depois vai mandar um numero que elas vão conversar melhor, que elas pegam e acertam entre elas mesmo.

fala que não quer deixar a Jô na mão, pois a Jô foi muito legal com ela no início, só que agora e Jô está tratando-a como pilantra, ligando p casa dela (no Brasil) pedindo o endereço da casa dela, dizendo que quer ver a mãe dela

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(COBRANÇAS, AMEAÇAS)Carminha diz que é conversa fiada.

explica para Carminha que foi para Itália determinada, que quer pagar, mas pede que Carminha entenda que será na medida das dela.

Carminha diz que vai ver um lugar para ela ficar e pede para amanhã outra vez.

diz que falou sobre isso com a Jô e ela disse que avisaria à Carminha, mas que não sabe se ela avisou mesmo.

Carminha diz que não fala com a Jô (COMO UM PROCEDIMENTO), ela não se liga pra dizer nada não. (...) Quando foi pra levar você ela ficou louca quando eu falei que tinha que dividir, porque ela achava que não tinha que dividir nada comigo não. Entendeu?”

fala que Jô ficou muito chateada num determinado dia que ligou para Carminha, pois dó disse que não tem nada pra tratar com Carminha, que, sobre esses assuntos, ela mesma (Jô) trata. diz que respondeu para Jô que se acertou com Carminha de ir para a Itália, não há motivo para não falar com ela signa combinam de se falarem no dia seguinte.

Combinaram de se falarem no dia seguinte. Despedem-se.

Restou, portanto, demonstrado o dolo de ambos na prática do crime descrito, caindo por terra as suas alegações de que queriam ajudar

a conquistar seu objetivo de ir prostituir-se na Itália.Importante ressaltar que quanto ao envio de o próprio

ALTOMIR confessou ter dele participado, tendo negado, no entanto, o seu envolvimento na ida de

LIANDRA, ao contrário, nega a sua participação alegando que a sua proximidade com ALTOMIR é de cunho familiar, já que ela é sobrinha do corréu.

Há, entretanto, diálogos que infirmam tal assertiva. Encontram-se nos autos provas de que LIANDRA era membro do grupo e que participava exercendo mais de uma tarefa. Assim, há diálogos em que fica claro que ela recebe dinheiro de ALTOMIR, como as que constam dos índices 392977 e

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1051669; outras provas, tal como a mensagem de texto enviada por ela no dia do embarque de em 02 de fevereiro de 2009, com o seguinte conteúdo: “Oi tio. A pediu pra vc ligar pra ela pq ela quer tirar uma dúvida com vc. Bju” (fl. 124 da cautelar nº 2009.50.01.000695-2)

Os elementos de prova constantes dos autos também convergem no sentido da responsabilidade de WESLEY e ROGÉRIO na saída de No entanto, o magistrado deixou de responsabilizá-los por este crime, à vista de que não se comprovou o acerto entre estes e ALTOMIR anterior à consumação do crime, requisito indispensável para a consideração da “cooperação póstuma”, consistente, segundo Celso Delmanto, no seguinte: “Há coautoria se os agentes da conduta posterior à consumação do crime, antes dela, já haviam acertado com os autores do fato típico a cooperação póstuma, essencial à obtenção do proveito por todos visado”.(STF, HC 72315, DJU 26.05.95)

O mesmo se passou em relação a RALPH, que esteve incumbido de cobrar da dívida com ALTOMIR. Não há mínimos indícios de que RALPH tenha participado do envio de tampouco, que tenha acordado assumir a função de cobrador da dívida de ALTOMIR, razão pela qual não se pode falar em colaboração póstuma em relação a este apelante.

Correto o Magistrado singular. O raciocínio demonstra que atuou com cuidado na análise das participações, buscando de maneira equilibra a melhor solução para o caso.

No que concerne ao envio de também se encontram nos autos os elementos de prova angariados na instrução criminal que fazem livre de dúvidas a correção do raciocínio do Magistrado singular que concluiu pela condenação dos réus, à exceção de RALPH.

A materialidade está comprovada pela informação da autoridade policial. Segundo informa, embarcou no vôo LH507, os companhia LUFTHANSA, com destino a Frankfurt/Alemanha no dia 04 de dezembro de 2008, segundo procedimento idêntico àquele que seria adotado três meses depois por Almeida Guimarães.

Mais uma vez, os elementos coligidos apontam para o envio de para o exterior por ALTOMIR GOMES CARDOSO JUNIOR,

tendo LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO intermediado o contato, sendo que a vítima foi enviada para a Europa para exercera prostituição coma codinome

A função de LIANDRA fica evidente pelas mensagens de texto enviadas para ALTOMIR, in verbis:

Oi junio. Deixei o recado pra ontem a noite q vc pediu ok.bjus. (fl. 158 dos autos de nº

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2009.50.01.000695-2.)Oi tio. Falei com a ela pediu pra eu

te dar um recado se der me liga (fl. 159 dos autos de n° 2009.50.01.000695-2.)

Tal como aponta o Magistrado sentenciante, a proximidade entre as datas e o fato de que LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO sequer havia sido identificada, até então, revela que a pessoa referida no diálogo abaixo com “Alianda” não era outra, senão a própria LIANDRA

Índice: 336663Observações: X CARMINHA - $$

ENVIO DE DINHEIROTranscrição:- Oi CARMINHA, é a A Alianda te deu o recado?Que a (interferência)

CPF?- CARMINHA: Me falou.- Me passa o CPF da pessoa que eu

tenho que mandar.- CARMINHA: Deixa eu te falar um negócio

manda pra mim no meu nome, pela Western Union pelo negócio e a taxa você desconta do dinheiro que você vai mandar.

Ta, então vou mandar cinco então.CARMINHA: Sim, sabe por que, porque olha só,

porque eu tô precisando muito desse dinheiro e já fiz um compromisso essa semana, não pude nem resolver porque aí não deu pra você mandar por causa desse negócio. Tá bom.

- Manda daquele nome, mas por Western Union né.

- CARMINHA: É, manda por aquele nome ou por Western Union ou pela Posta, pelo banco Posta, aí chega no ltaú, aí você me passa o código.

- Corno faz por esse banco Posta? É a mesma coisa do Western Union? (sotaque do Rio de Janeiro: ‘banco Poixta).

- CARMINHA: Mesma coisa você tem só que mandar escrever o nome igualzinho que a gente escreve aqui no Brasil nó, porque

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aqui eles trocam o nome.. Hamham. Te mando as cinco amanhã

sem falta.- CARMINHA: AÍ você manda descontar do meu...

desse aí, desconta daí mesmo, aí eu pago a taxa não tem problema.

- Ah, tá bom então. Amanhã cedinho eu tô te mandando.

- CARMIN1A: Mas não deixa de fazer não, já bom, por favor.

- Não vou deixar de fazer não. Pode ficar tranquila.

- Despedem-se.

Sobre o envio de vulgo Aline, também se logrou provar a atividade da quadrilha, especificamente as atuações de WESLEY, MARCIO BRONZE, ROGÉRIO e EDUARDO LOPES ALVES.

A materialidade restou indubitável pela operação policial que fotografou o embarque de além da interceptação de diálogo em que a própria vítima (ligação de 18.05.2009 – ÍNDICE 887765) informa ao interlocutor que sua passagem lhe teria sido providenciada por alguém que a “empregaria” na Itália.

Ao que tudo indica, WESLEY DE SOUZA RAMOS teve participação preponderante, tal como revelam os diálogos interceptados em 08.05.2009 (interceptação telemática) e diversas ligações entre WESLEY, MARCIO BRONZE e

Nas ligações identificadas pelos índices 862988, 1137090 e 1139263, WESLEY e ROGÉRIO tratam da colocação de anúncios de “Aline” nos jornais italianos. Nesta última ligação se verifica que WESLEY conversa com sobre o pagamento da dívida que esta contraiu com o grupo no seu envio ao exterior.

Há diversas ligações em que se pode atestar a participação de ROGÉRIO nos fatos criminosos. Na conversa identificada pelo índice 1113947, ROGÉRIO e WESLEY conversam sobre o melhor roteiro para o envio de e sobre o custo da operação. Já a conversa identificada pelo índice 1111115, temos diálogo entre ROGÉRIO e um contato na Suíça, para o qual informa o roteiro da vítima e expõe sua preocupação com possível deportação de devido ao pouco dinheiro que levava consigo.

Confira-se a conversa entre ROGÉRIO (ROGÉRIA) e MARCIO

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BRONZE (MARCIA VOGUE), às vésperas do embarque de

Índice: 1131051Data: 01/07/2009 Hora: 13:22:00(continuação da chamada anterior..)

- WESLEY: a pessoa vai sair daqui sábado de manhã, o marido vai pegar domingo, segunda-feira ela está na estação de Livorno pra você pegar. E ainda tenho que providenciar o dinheiro junto com ROGÉRIA, se ROGERIA não me arranjar, eu a estou aqui com um cheque pra ver se a outra criatura troca pra mim para comprar pelo menos uns 500 erros. Vou me virar né bicha porque eu tenho que dar um jeito de ganhar um ‘aqué” e ver se você ganha um dinheiro né.

-MARCIA VOGUE: Como?WESLEY: Eu vou me virar pra resolver isso pra ver

se eu ganho um dinheiro e ver se você ganha um dinheiro né.

MARCIA VOGUE: Aí bicha eu só quero botar essas coisas em dia.

WESLEY: MARCIO não tem como você arranjar 100 euros com alguém aí emprestado agora?

- MARCIA VOGUE: Agora no momento não tem WESLEY onde eu estou, estou de pés e mãos atadas. Cem euros.

- WESLEY: E ROGERIO já apareceu aí pra pegar a chave com você? Outra coisa MARCIO, você tem que tomar cuidado com essa estória de aluguel. Sabe pra que viado?

- MARCIA VOGUE: A primeira coisa que eu vou fazer é isso. Eu vou lá amanhã de manhã. Você sabe, quando eu fizer eu te ligo. Vou lá conversar.

WESLEY: Você vai conversar com a dona SONIA.MARCIA VOGUE: É pronto, eu converso. Agora o

outro vai estar que dia?- MARCIA VOGUE: ah, minha filha vai saber,

porque essa semana pelo andar da carruagem não vai ter dinheiro lá do apartamento, o apartamento ta fechado até hoje. Não vai ter dinheiro, O outro vence domingo e não

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vai ter dinheiro pra pagar, porque se a bicha estivesse trabalhando lá sexta-feira teria dinheiro pra pagar o outro. Não tem.

Segundo a lógica dos fatos extraída dos autos, neste ponto entra a participação de EDUARDO LOPES ALVES, que se comunica com WESLEY menos de uma hora após a conversa anterior, de maneira cifrada, mas se consegue inferir que a pessoa de que WESLEY falava na outra conversa era EDUARDO.

Confira-se o trecho da sentença em que se tratou do assunto: “índice: 1131248Data: 01/07/2009Horário: 14:05:59WESLEY. "Lembra daquela pessoa que eu te apresentei aqui no apartamento?"EDUARDO: "Lembro."WESLEY: "Que a gente falou que ia comprar umas flores pra mim?" EDUARDO: "Sim, lembro."WESLEY"Que ia fazer uma visita la na floricultura?"EDUARDO: "Sim, lembro."WESLEY. "Ela vai fazer essa visita na floricultura sábado (..) e a gente ta precisando comprar o buquê para ela levar. Ta querendo o aquie (dinheiro) pra comprar o buquê pra ela levar, entendeu? E a gente ta precisando nesse valor. Ela vai chegar lá e vai me dar a metade do dinheiro com dois dias e eu já passo pra você para completar o cheque e com quinze dias o restante."

A linguagem cifrada não da margem a incertezas sobre o acerto da interpretação dos agentes policiais de Inteligência: "ir na floricultura" significava "ir para Itália" e o "dinheiro para comprar o buquê" era o valor que faltava para apresentar a imigração italiana. Interpretar literalmente (ou em qualquer outro sentido) a conversa acima esbarraria na falta de nexo com todo o contexto probatório.

Obtido o valor necessário junto a EDUARDO LOPES AL

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VES, pôde embarcar. Considero portanto plenamente demonstrada a materialidade do crime de tráfico da nacional

pela autoria de WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES SILVA e EDUARDO LOPES ALVES (dentre os réus ora em julgamento).

O dolo resulta da conduta dos acusados, todos cientes de que estava indo para o exterior exercer a prostituição. Especificamente quanto ao acusado EDUARDO LOPES ALVES, observo que a ciência da finalidade do empréstimo fica implícita no dialogo acima transcrito. E, se pudesse ainda haver duvida razoável, o fato de EDUARDO LOPES ALVES ter intermediado o envio de "Manu", pessoa inclusive referida em seu interrogatório explicita semelhante conhecimento.

Tenho então por comprovada a materialidade de três crimes distintos de tráfico internacional de pessoas, sendo ALTOMIR GOMES CARDOSO JUNIOR e LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO autores de dois deles, e WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES SILVA e EDUARDO LOPES ALVES autores do terceiro."

Assim, tem-se que o Magistrado analisou com minúcias as questões apresentadas, atuou de maneira regular e válida e expôs as razões de seu convencimento de maneira consistente, não havendo razão para que se reforme o seu entendimento pela condenação nas penas do crime do art. 231 do CP.

Por outro lado, quanto à condenação dos apelantes pela prática do crime de rufianismo descrito no art. 230 do CP, a sentença merece reparo.

Conforme as considerações feitas sobre o crime, o tipo penal traz em seu conteúdo material a participação direta nos lucros de alguém que se prostitua, ou que se faça por este sustentar-se.

De pronto identificam-se os elementos tirar proveito e participação direta ou indireta nos lucros daquela(e) que exerce a prostituição.

Tirar proveito, ensina-nos a melhor doutrina, possui natureza econômica e se encerra, no caso dos autos, na forma de participação direta nos lucros das pessoas que se prostituíam. Por seu turno, a participação direta dá o tom da prática reiterada, habitual, constante, normalmente relacionada à proteção e organização das atividades daquele que pratica a prostituição. Essa participação deve ser efetiva e se caracterizar por uma relação parasitária no ganho alheio, não se configurando o delito pela

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simples paga unitária seja a que título for por parte da prostituta ao rufião (sem importar o gênero de um ou de outro).

Pois bem. Esta relação parasitária não está configurada nos autos. Não há elementos nos autos que nos façam inferir haver

habitualidade dos ganhos provenientes da prostituição alheia. Tudo o que se pode afirmar concretamente é que as vítimas contraíam dívidas para serem enviadas ao exterior e se mantinham ligadas ao grupo criminoso pelo menos até saldar tais dívidas, no entanto, não há provas de que os depósitos efetuados em nome dos apelantes fossem fruto de prostituição, devendo a dúvida ser interpretada em favor dos réus.

Ademais, como bem posto pelo e. membro do Parquet, a conduta sequer foi devidamente narrada na denúncia, pelo que não deveria ter sido recebida, em relação a este crime. Confira-se o trecho: “Da simples leitura, é possível constatar que não descreve a denúncia os elementos essenciais do artigo 230 do Código Penal tampouco apontando quais teriam sido as vítimas da conduta criminosa.”

Também quanto ao apelante RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO, pelas razões expostas, deve ser absolvido da prática do crime do art. 230 do CP. Deve, ainda, ser absolvido da prática do crime do art. 288, do CP, por não existir prova alguma de sua participação no esquema, exceto pelo fato de ter ido à casa de segundo alega, em seu interrogatório, para prestar um favor a ALTOMIR, e mesmo assim, não chegou a realizá-lo.

Ressalte-se que o Ministério Público Federal, em suas alegações finais, já havia pedido a absolvição do então réu. Nos seguintes termos o arrazoado do MPF:

‘Cabe destacar, finalmente, que, não que se refere ao 7º denunciado, RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO, não restaram provados elementos indicativos de que o mesmo participasse do esquema criminoso retratado nos autos. Com efeito, apurou-se que RALPH foi contatado por ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR em uma situação específica, no que se refere às despesas pelo envio da vítima para o exterior. De fato, ALTOMIR teria encarregado RALPH de localizar a família da vítima no Rio de Janeiro, e fazer a cobrança do valor que seria devido por . Tal cobrança, no entanto, não chegou a ser concretizada, conforme já ressaltado, o que reclama a absolvição do r´´eu PALPH elos delitos a si

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imputados por ocasião da denúncia.”Nesse contexto, ante o ditame do in dubio pro reo, devem ser

absolvidos do crime descrito no art. 230 do CP, os apelantes ALTOMIR GOMES CARDOSO JUNIOR, WESLEU DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES SILVA e RALPH CARDOSO PEREIRA MERITHELLO MACHADO; e, ainda, este último pela prática do art. 288 do CP.

ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR, pugna ainda pelo reconhecimento da continuidade delitiva em lugar do concurso material entre os crimes de tráfico internacional de pessoas.

No entanto, não se atenderá ao pleito.É certo que a prática dos dois crimes se deu de maneira autônoma um

em relação ao outro, eis que lesavam bens materiais distintos e possuem características diversas, além de claro dolo diversificado em cada caso, razão pela qual se está, sem dúvida, diante de relação de concurso material entre os crimes em questão.

Assim sendo, crimes autônomos praticados sob circunstâncias que denotam projetos com finalidades distintas se amoldam, com maior senso de justiça, à previsão legal de concurso material e não de crime continuado, de vez que a ficção jurídica não foi criada com objetivo de unificar propósitos tão diversos de violar o ordenamento.

Quanto à pena de multa aplicada para o crime de quadrilha, é de se lhe retirar a incidência, por afronta ao princípio da reserva legal, de vez que o legislador não a cominou no art. 288 do CP.

Por fim, quanto ao recurso do delegado CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, julgo o prejudicado, tendo em vista que foi concedida a ordem nos autos do Mandado de Segurança 2010.02.01.005497-3, em voto proferido por este Relator, cujo objeto era rigorosamente o mesmo do que trata o presente recurso.

CARLOS ALBERTO, Delegado Regional Executivo da Superintendência da Polícia Federal/ES, interpôs o presente recurso contra ato praticado pelo MM. Juízo da 1ª Vara Federal Criminal de Vitória/ES, consistente na aplicação de multa no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), por ocasião da prolação da sentença nos autos da presente ação penal.

Segundo nos relatam as razões recursais, a multa em questão teria sido aplicada em razão de suposto descumprimento de ordem judicial, a qual determinava que a Polícia Federal se abstivesse de transferir alguns presos provisórios custodiados em sua sede, em razão do risco que a transferência daqueles réus para o sistema prisional estadual traria à sua integridade física, por se tratar de homossexuais com fenótipo feminino.

Nos seguintes termos, trecho do voto prolatado no referido MS:

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“O fato relevante é que não houve, quer por parte do Delegado em exercício na época dos fatos, muito menos por parte do Delegado CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, qualquer descumprimento à ordem judicial, simplesmente porque não houve ordem judicial que determinasse a não transferência do preso EDUARDO.

A determinação de não transferência de presos contemplou os réus ROGÉRIO, WESLEY E ALTOMIR e foi proferida no rosto de petição formulada em nome exclusivamente destes réus, sendo vazada nos seguintes termos:

“Aos 27.07.09. considerando que os autos estão no Ministério Público Federal para manifestação sobre este pedido e em virtude da urgência decorrente de notícia das transferências dos presos para esta data, determino que a autoridade custodiante se abstenha de transferir os presos até posterior decisão. Fixo multa equivalente a R$10.000,00 em caso de descumprimento. Expeça-se mandado. Com avinda dos autos, junte-se esta petição, cuja cópia deve ser entregue ao advogado de defesa.”

Como se vê, a decisão sequer se refere aos motivos da não transferência, não sendo possível esperar que 3 meses depois o Delegado atentasse para o fato de que o preso EDUARDO possui as mesmas características femininas dos demais presos contemplados com a ordem de não transferência.

Verifica-se, portanto, que inexistiu ordem expressa de não transferência do preso EDUARDO LOPES.

Ademais, observa-se que a transferência de presos provisórios da carceragem da Polícia Federal, para os estabelecimentos prisionais estaduais é praxe realizada todos os dias, eis que aquele núcleo de custódia não faz parte do sistema prisional.

Assim, é imperioso concluir que não houve descumprimento à ordem judicial que justifique a aplicação da multa em questão.

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Pelo exposto, CONCEDO A SEGURANÇA para anular a decisão que, nos autos da ação penal nº 2008.50.01.000754-0, aplicou ao Delegado Regional Executivo da Superintendência da Polícia Federal/ES, multa no valor de R$10.000,00 (dez mil reais).”

Por todo o exposto, meu voto é no sentido de DAR provimento ao recurso de RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO para absolvê-lo das imputações que lhe foram feitas na denúncia; DAR PARCIAL provimento aos recursos de ALTOMIR GOMES CARDOSO JÚNIOR, WESLEY DE SOUZA RAMOS, ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA e EDUARDO LOPES ALVES, para absolvê-los da prática do crime do art. 230 do CP; NEGAR provimento ao recurso de LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO; JULGAR PREJUDICADO o recurso de CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, em vista de lhe ter sido concedida a ordem em mandado de segurança, cujo objeto era idêntico ao objeto da sua apelação e, de ofício, retirar a incidência da pena de multa para o crime de quadrilha em atenção ao princípio da reserva legal.

É como voto.

DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETORelator

2ª T. Especializada

E M E N T A

PENAL. PROCESSO PENAL. ARTIGOS 230, 231 e 288 DO CÓDIGO PENAL. TRÁFICO DE PESSOAS. QUADRILHA. RUFIANISMO. MATERIALIDADE E AUTORIAS COMPROVADAS. CONTINUIDADE DELITIVA. CRIMES AUTÔNOMOS. APLICAÇÃO DO CONCURSO MATERIAL.

1. Para que se consume o crime do artigo 231 do Código Penal, tráfico de pessoas, são requeridos outros elementos apontados na doutrina como ações que envolvam a facilitação, não só em arregimentar as pessoas, como também de organizar tudo aquilo que seja necessário para que o tráfico internacional seja bem sucedido.2. O consentimento da vítima não exclui a responsabilidade do traficante ou

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do explorador, pois que ainda que tenham consciência de que exercerão a prostituição, não têm idéia das condições em que a exercerão e, menos ainda, da dívida que em geral contraem antes de chegar ao destino.3. Comprovadas a materialidade e autoria pelas interceptações telefônicas que evidenciaram que os apelantes tinham plena consciência da natureza criminosa das atividades realizadas pelo bando, bem como dos seus papéis dentro do esquema criminoso. As ações dos apelantes se amoldam com perfeição ao tipo na modalidade promover, de vez que, todos, exceto RALPH, facilitam e organizam toda a dinâmica criminosa, até a chegada das vítimas na Itália, e mesmo depois, mantêm-se em contato com elas, como se vê das transcrições.4. Do mesmo modo, no que tange ao delito de rufianismo, há diálogos nos quais os acusados negociam o pagamento de taxas com mulheres e travestis que utilizam seus apartamentos para a prostituição.5. Ademais, é possível depreender que ALTOMIR, WESLEY e ROGÉRIO controlam a movimentação de travestis brasileiros na Itália, alterando de lugar as pessoas que não “rendem” o esperado por eles, evidenciando que os acusados se beneficiavam da prostituição alheia, tal como reconhecido nos autos da ação penal anterior (nº 2006.5101.008164-0), julgada à unanimidade pela 2ª turma, em voto de minha relatoria, que os condenou pelo mesmo delito em razão de fatos anteriores.6. Crimes autônomos praticados sob circunstâncias que denotam projetos com finalidades distintas se amoldam, com maior senso de justiça, à previsão legal de concurso material e não de crime continuado, de vez que a ficção jurídica não foi criada com objetivo de unificar propósitos tão diversos de violar o ordenamento.7. Recurso de CARLOS ALBERTO prejudicado em razão da concessão anterior de ordem em mandado de segurança, cujo objeto era rigorosamente o mesmo do que trata o presente recurso.8. Recurso de RALPH provido.9. Negado provimento aos recursos de ALTOMIR, WESLEY, ROGÉRIO, EDUARDO e LIANDRA.10. Determinado, de ofício, a exclusão da pena de multa referente ao delito de quadrilha, por ausência de previsão legal.

A C Ó R D Ã O

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas,

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decidem os Membros da 2ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação de RALPH CARDOSO PEREIRA MERITELLO MACHADO, negar provimento aos recursos de LIANDRA OLIVEIRA CARDOSO e EDUARDO LOPES ALVES, julgar prejudicado o recurso de CARLOS ALBERTO DOS SANTOS, bem como determinar, de ofício, a exclusão da multa cominada pelo delito de quadrilha, e, por maioria, negar provimento às apelações de ALTOMIR GOMES CARDOSO, WESLEY DE SOUZA RAMOS e ROGÉRIO RODRIGUES DA SILVA, nos termos do voto vencedor da Desembargadora Federal Liliane Roriz.

Rio de Janeiro, 19 de julho de 2011.

LILIANE RORIZ Redatora para acórdão

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