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Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676 doi: 10.7213/psicol.argum.31.075.AO04 ISSN 0103-7013 Psicol. Argum., Curitiba, v. 31, n. 75, p. 665-676, out./dez. 2013 PSICOLOGIA ARGUMENTO ARTIGO [T] Estilos de fé e sentido da vida [I] Style of faith and meaning of life [A] Abstract The present paper attempts identify the stiles of faith and yours relationships with religiosity and existential emptiness levels. Then, the reference principal was the existential analyses of Viktor Frankl, this theory understand the religiosity as search for ultimate meaning of life. The sample was of 25 participants with mean age of 31 years. The instruments used were Purpose in Life Test of James C. Crumbauch e Leonard T. Maholick, an inventory of religios- ity attitude and the interview of the development of faith, of James W. Fowler. The results of the content analyses indicated types of God conceptions, what makes life meaningful; beliefs, values and commitments; moments of communion or harmony with God or the universe, pur- pose of life and what is a religious person. These results were discussed based on logotherapy and existential analyses of Viktor Frankl.#] [K] Keywords: Religiosity. Existential analyses. Meaning of life.#] [R] Resumo O presente trabalho teve como objetivo identificar os estilos de fé e relacioná-los com os níveis de religiosidade e vazio existencial. Para tanto, utilizou-se como principal referencial teóri- co a análise existencial de Viktor Frankl, que compreende a religiosidade como uma vontade de sentido último para a vida. A amostra foi constituída por 25 pessoas com idade média de 31 anos. Os instrumentos utilizados foram o Teste Propósito de Vida (PIL-Test), de James C. Crumbauch e Leonard T. Maholick, um questionário de atitude religiosa e seis perguntas da entrevista sobre o desenvolvimento da fé, originalmente elaborada por James W. Fowler. Por meio de análise de conteúdo foi possível identificar categorias pertinentes as concepções de Deus; o que faz a vida significante; crenças, valores e compromissos; momentos de comunhão ou harmonia com Deus ou com o universo; propósito da vida e o que é uma pessoa religiosa. Os resultados foram discutidos a luz da logoterapia e análise existencial de Viktor Frankl. [#] [P] Palavras-chave: Religiosidade. Análise existencial. Sentido da vida. [#] [A] Thiago Antonio Avellar de Aquino [a] , Cintya Thaiana Araújo Cabral Dantas [b] , Ianny Felinto Medeiros [b] , Imytissonara Oliveira A. Leôncio de Moraes [b] , Myriam de Oliveira Melo [b] , Najara Mirella Cordeiro do Nascimento [c] , Samkya Fernandes de O. Andrade [d] , Maria do Socorro Abrantes [e] , Vânia Nunes Pires [b] [a] Doutor em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), professor do Departamento de Ciências das Religiões da mesma instituição, João Pessoa, PB - Brasil, e-mail: [email protected] [b] Graduadas em Psicologia pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Campina Grande, PB - Brasil, e-mails: cintyadantas@ hotmail.com, iannyfelinto@hotmail. com, imytissonara.oliveira@hotmail. com, [email protected], [email protected] [c] Psicóloga do Núcleo de Atenção à Saúde da Família (NASF), Mossoró, RN - Brasil, e-mail: psinajara. [email protected] [d] Psicóloga, mestranda em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, PB - Brasil, e-mail: [email protected] [e] Psicóloga, atua na linha de pesquisa Saúde mental do adolescente e juventude: comportamentos específicos e procedimentos preventivos no campo da Saúde, na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Campina Grande, PB - Brasil, e-mail: [email protected] Recebido: 07/12/2010 Received: 12/07/2010 Aprovado: 16/11/2011 Approved: 11/16/2011

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  • Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676

    doi: 10.7213/psicol.argum.31.075.AO04 ISSN 0103-7013Psicol. Argum., Curitiba, v. 31, n. 75, p. 665-676, out./dez. 2013PSICOLOGIA ARGUMENTO ARTIGO

    [T]Estilos de f e sentido da vida[I]Style of faith and meaning of life

    [A]

    Abstract

    The present paper attempts identify the stiles of faith and yours relationships with religiosity

    and existential emptiness levels. Then, the reference principal was the existential analyses of

    Viktor Frankl, this theory understand the religiosity as search for ultimate meaning of life.

    The sample was of 25 participants with mean age of 31 years. The instruments used were

    Purpose in Life Test of James C. Crumbauch e Leonard T. Maholick, an inventory of religios-

    ity attitude and the interview of the development of faith, of James W. Fowler. The results of

    the content analyses indicated types of God conceptions, what makes life meaningful; beliefs,

    values and commitments; moments of communion or harmony with God or the universe, pur-

    pose of life and what is a religious person. These results were discussed based on logotherapy

    and existential analyses of Viktor Frankl.#][K]Keywords: Religiosity. Existential analyses. Meaning of life.#]

    [R]

    Resumo

    O presente trabalho teve como objetivo identificar os estilos de f e relacion-los com os nveis

    de religiosidade e vazio existencial. Para tanto, utilizou-se como principal referencial teri-

    co a anlise existencial de Viktor Frankl, que compreende a religiosidade como uma vontade

    de sentido ltimo para a vida. A amostra foi constituda por 25 pessoas com idade mdia de

    31 anos. Os instrumentos utilizados foram o Teste Propsito de Vida (PIL-Test), de James C.

    Crumbauch e Leonard T. Maholick, um questionrio de atitude religiosa e seis perguntas da

    entrevista sobre o desenvolvimento da f, originalmente elaborada por James W. Fowler. Por

    meio de anlise de contedo foi possvel identificar categorias pertinentes as concepes de

    Deus; o que faz a vida significante; crenas, valores e compromissos; momentos de comunho

    ou harmonia com Deus ou com o universo; propsito da vida e o que uma pessoa religiosa.

    Os resultados foram discutidos a luz da logoterapia e anlise existencial de Viktor Frankl. [#] [P]Palavras-chave: Religiosidade. Anlise existencial. Sentido da vida. [#]

    [A]Thiago Antonio Avellar de Aquino[a], Cintya Thaiana Arajo Cabral Dantas[b], Ianny Felinto Medeiros[b],

    Imytissonara Oliveira A. Lencio de Moraes[b], Myriam de Oliveira Melo[b], Najara Mirella Cordeiro do Nascimento[c], Samkya Fernandes de O. Andrade[d], Maria do Socorro Abrantes[e], Vnia Nunes Pires[b]

    [a] Doutor em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraba

    (UFPB), professor do Departamento

    de Cincias das Religies da mesma

    instituio, Joo Pessoa, PB - Brasil,

    e-mail: [email protected]

    [b] Graduadas em Psicologia pela Universidade Estadual da Paraba

    (UEPB), Campina Grande, PB -

    Brasil, e-mails: cintyadantas@

    hotmail.com, iannyfelinto@hotmail.

    com, imytissonara.oliveira@hotmail.

    com, [email protected],

    [email protected]

    [c] Psicloga do Ncleo de Ateno Sade da Famlia (NASF), Mossor,

    RN - Brasil, e-mail: psinajara.

    [email protected]

    [d] Psicloga, mestranda em Psicologia Social pela Universidade Federal da

    Paraba (UFPB), Joo Pessoa, PB -

    Brasil, e-mail: [email protected]

    [e] Psicloga, atua na linha de pesquisa Sade mental do adolescente e juventude: comportamentos especficos e procedimentos

    preventivos no campo da Sade, na

    Universidade Estadual da Paraba

    (UEPB), Campina Grande, PB -

    Brasil, e-mail: [email protected]

    Recebido: 07/12/2010

    Received: 12/07/2010

    Aprovado: 16/11/2011

    Approved: 11/16/2011

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    Introduo

    Muitos pesquisadores apontam a religio e a re-ligiosidade como um aspecto fundamental das so-ciedades e da estrutura da psique humana (Eliade, 1999; Otto, 2007; Jung, 1961, 1978). Esse fato pos-sivelmente decorre da busca de sentido da existn-cia humana, bem como da conscincia da finitude. Seguindo esse pensamento, o presente estudo tra-tou de uma investigao emprica das concepes de Deus e da f luz da logoterapia e anlise exis-tencial de Viktor Frankl.

    A anlise existencial de Viktor Frankl e a busca de sentido

    Segundo Lukas (1990), h um desejo profunda-mente enraizado na dimenso humana que apenas se satisfaz por meio da realizao de sentidos e, se ele for frustrado, o ser humano pode falhar na vida. Frankl (1991) foi o principal terico do sculo XX que investigou e descreveu a busca de sentido para a vida.

    Conforme esse mesmo autor, o fracasso na busca de sentido pode gerar a sensao de vazio existen-cial. A etiologia do vazio est direcionada s con-sequncias sofridas pelo homem, pois ele no usa o instinto para dizer o que fazer, nem a tradio, como os homens antigos faziam. Isso resulta em um ser humano conformista, querer o que os outros querem, ou at mesmo totalitarista, fazer o que os outros fazem (Frankl, 1990). As prprias neuroses atuais devem ser atribudas em muitos casos a tal frustrao (Frankl, 1973).

    No obstante, Frankl elenca trs tipos de valo-res em que o ser humano pode encontrar sentidos: os criativos, os vivenciais e os atitudinais (Frankl, 1991). Os criadores fazem referncia ao trabalho, que consiste nas atividades desempenhadas no am-biente em que est inserido, ou seja, criando um tra-balho ou praticando um ato. J os valores vivenciais se realizam em momentos vividos de forma pura e intensa, experimentando algo (verdade, beleza) ou algum. Uma forma de experimentar outro ser hu-mano em sua originalidade amando, pois o amor a forma mais eficaz de captar maior profundidade da personalidade humana, isso porque por meio do amor que o ser humano consegue demonstrar e conscientizar o outro a realizar suas potencialida-des (Frankl, 1991).

    A terceira categoria a da atitude, que compre-ende os valores descobertos diante de um destino trgico e imutvel. Frankl demonstra que o senti-do tambm pode ser encontrado no sofrimento, ao encontr-lo, este passa a no ser visto mais como desespero, e torna-se uma verdadeira realizao humana (Frankl, 1973, 1991).Religiosidade segundo Frankl

    Frankl (1973) afirma que um homem religioso, apoiado na f, torna a passagem pelo sofrimen-to mais suportvel pela atribuio de um sentido maior, de uma causa para tal sofrimento, ainda que desconhecida. Havendo assim, para o homem reli-gioso, uma crena na existncia de uma providn-cia. Frankl discorda da ideia de que, em certas situ-aes, h uma falta de sentido da vida; antes prope uma incapacidade de compreenso do sentido em termos racionais, o que esse autor passou a chamar de suprassentido, em outras palavras, uma crena incondicional no sentido da vida, mesmo quando o ser humano se encontre em um destino sofrido (Frankl, 1991). O suprassentido no seria apreens-vel na instncia da razo, mas s poderia ser alcan-ado por meio da f.

    Segundo a anlise existencial de Frankl, a reli-giosidade seria algo que distinguiria o homem dos outros animais, pois parte-se do princpio de que s o homem poderia temer a Deus. Compreende-se, ento, que a religiosidade uma manifestao ex-clusivamente humana, e que se constituiria tambm em um caminho ou recurso para a busca do sentido (Pintos, 2007).

    Segundo Frankl, o homem religioso apoia a cons-cincia na instncia divina. J o homem no religioso obedece apenas sua conscincia e a considera como ltima instncia. Para esse autor, a religio est muito mais presente no homem do que ele imagina conscientemente, posto que Deus seria o monlogo mais ntimo do homem (Frankl & Lapide, 2005).

    Frankl tambm reconhece que muito complexo definir Deus, pois a nica forma de se relacionar com Ele por meio do dilogo. Assim, at os ateus tam-bm necessitam dessa conversa interior, entretanto, eles afirmam estarem dialogando com sua prpria conscincia. No obstante, a religiosidade do homem atual encontra-se inconsciente, posto que reprimi-da pelo mundo cientificista (Frankl & Lapide, 2005).

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    A f e a cincia se necessitam mutuamente, isso porque uma f incapaz de se confrontar com a cin-cia corre o risco de se transformar em superstio. No entanto, o princpio e o fim, a origem e a consu-mao de todas as coisas so competncias exclusi-vas da religio. Isso porque por meio da divergn-cia que se possvel uma viso mais ampla. Dessa forma, apesar de terem segmentos distintos, tanto a religio quanto a cincia buscam o bem-estar do homem (Frankl & Lapide, 2005).

    At aqui foram delineadas as principais ideias de Frankl sofre a religiosidade. Entretanto, com o intuito de apontar as diferenas entre esse autor e outras abordagens, torna-se necessrio contrastar as vises de Frankl com a de Freud e a de Jung, o que ser descrito na sesso seguinte.

    A religiosidade na perspectiva de Freud e Jung

    Para Freud, tanto a religio como Deus so pro-jees de necessidades neurticas, que correspon-dem a situaes infantis relacionadas segurana e proteo ou, ainda, correspondem a uma interio-rizao da imagem do pai (Pintos, 2007). com essa perspectiva que ele tenta buscar a etiologia de mui-tos conceitos na obra Totem e tabu (1913-1914).

    Nessa obra, Freud apresenta o conceito de reli-gio usando como base as histrias do homem pri-mitivo. Segundo ele, esses homens apresentavam caractersticas similares com a dos homens de sua poca. Assim, as percepes construdas por meio das artes (entre elas as pinturas rupestres), mitos e contos de fadas serviram para melhor compreender essa relao que existe entre o homem e a religio. Dentre os estudos realizados, Freud no acredita que os homens primitivos poderiam ter qualquer tipo de religio na qual adorassem os seres superio-res, alm de, naquela poca, no existir nem um tipo de instituio religiosa (Freud, 1974a).

    Assim, a religio para Freud estar ligada ao complexo paterno, o desamparo e a necessidade de proteo do homem, que ele especifica em Totem e tabu (1913-1914). Em O futuro de uma iluso (1974b), Freud explica que a noo de desamparo inicia na criana, e que esta se ligar a objetos que lhe assegurem proteo e segurana. Dessa forma, a me que satisfaz as suas necessidades de fome e de segurana se torna o seu primeiro objeto de proteo, mas logo ela substituda pelo pai, mais

    forte, que assume tal posio pelo resto da infncia. Posteriormente, tal atitude para com o pai mo-dificada, devido ao sentimento peculiar de ambi-valncia, em que ela tanto o teme quanto o anseia e admira. De acordo com Freud, tal sentimento de ambivalncia talvez seja pelo relacionamento ante-rior que a criana teve com a me. Sendo assim, o indivduo cresce e descobre que ir sempre precisar de proteo contra estranhos poderes superiores, e cria para si deuses nos quais busca proteo, mas tambm os teme. Os deuses seriam, ento, a substi-tuio da figura materna e paterna de proteo.

    J para Jung, Deus um arqutipo universal, um conjunto de ideias e imagens inseridas no in-consciente coletivo (Pintos, 2007). Tanto para Freud como para Jung a religiosidade essencialmente instintiva, em que um inconsciente religioso de-terminaria uma pessoa. Jung d aspectos psicofsi-cos na definio de arqutipos, quando afirma que est de alguma forma ligada ao crebro.

    A religio, segundo Jung, vista como aquilo que Rudolf Otto (2007) chamou de numinosum, que sig-nifica dizer que um efeito ativo ou uma existncia no causada por um ato arbitrrio. Pelo contrrio, o efeito domina o ser humano. O numinoso pode ser considerado como a influncia de uma presena in-visvel ou pode ser propriedade de um objeto vis-vel, que produziu um efeito distinto na conscincia do indivduo. E todas as religies se engajam nessa definio, at mesmo as mais primitivas. Ento, po-de-se dizer que o termo religio a atitude de uma conscincia alterada pela experincia do numinoso (Jung, 1978).

    A religio uma das formas de expresses uni-versais mais antigas da alma humana, podendo ser considerada como uma atitude instintiva. eviden-te sua funo de manter o equilbrio psquico do indivduo, porque a religio nada mais que uma subordinao dos fatos irracionais da experincia, no se referindo somente s condies sociais e fsi-cas, e torna-se um assunto importante para muitos indivduos (Jung, 1961, 1978).

    Jung encara a religio como uma atitude do esprito humano, e que esta palavra propaga uma relao subjetiva com certos fatores extramunda-nos e metafsicos. O propsito e o sentido das re-ligies permanecem na relao do indivduo para com Deus (cristianismo, judasmo, islamismo) ou no caminho da libertao e da salvao (budismo). As religies pregam uma doutrina de dependncia

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    realidade objetiva da percepo subjetiva (Frankl, 1992; Pintos, 2007). Tendo em vista as considera-es tericas mencionadas, considera-se pertinente investigar empiricamente o fenmeno da religiosi-dade. Assim, a presente pesquisa teve por objetivo identificar a relao entre os estilos de f e as con-cepes de Deus com os nveis de percepo do sen-tido de vida e de religiosidade.Mtodo

    Participantes

    Foram entrevistadas 25 pessoas da cidade de Campina Grande - PB, sendo 15 do sexo feminino. A mdia de idade foi de 31 anos, com amplitude de 20 a 45 anos. Com relao atribuio religiosa, oito se diziam protestantes, 12 catlicos, dois espritas, dois sem religio e um judeu. No que se refere ao grau de escolaridade, 14 eram universitrios; qua-tro possuam curso superior completo; trs esta-vam cursando o Ensino Fundamental, enquanto um possua tal instruo; duas pessoas tinham o Ensino Mdio completo e uma estava cursando.

    Instrumentos para coleta de dados

    O Teste de Propsito de Vida (Pil-Test-R) foi originalmente elaborado por James C. Crumbaugh e Leonard T. Maholich (1964) e revisado por Harlow, Newcomb e Bentler (1987). Essa verso apresenta trs fatores: desespero existencial (alfa de Cronbach de 0,69), realizao existencial (alfa de Cronbach de 0,71) e vazio existencial (alfa de Cronbach foi 0,72) (Aquino et al., 2009). Esse ins-trumento tem como finalidade medir o nvel de re-alizao de sentido e o vazio existencial, e consiste em 12 itens dispostos em uma escala de avaliao de sete pontos, com os extremos: 1 = discordo to-talmente e 7 = concordo totalmente. Os itens dessa escala contemplam os seguintes aspectos: prop-sito na vida (sete itens, ex.: tenho na vida metas e objetivos muito claros); satisfao com a prpria vida (seis itens, ex.: se a vida rotineira, dolorosa, excitante, triste); liberdade (trs itens, ex.: eu no sou uma pessoa muito responsvel); medo da mor-te (um item, ex.: quanto morte, estou preparado e sem medo); ideias suicidas (um item, ex.: quanto

    do homem com relao a Deus, tendo uma ao to sugadora quanto do mundo sobre ele (Jung, 1961, 1978). E quanto s figuras simblicas das religies, elas representam a expresso da atitude moral e espiritual especficas. Portanto, a religio pode ser considerada como uma relao com valor supremo ou mais poderoso, podendo ser positiva ou negati-va, voluntria ou involuntria (Jung, 1978). Crticas de Frankl a Freud e a Jung

    Em se tratando de religio, Frankl considera que a teoria freudiana apresenta Deus como a imagem do pai e a religio como uma neurose da sociedade, degradando-a aos olhos dos pacientes e bloqueando a porta de entrada no supra-humano. Para a logote-rapia, embora a religio seja um objeto de estudo, ela um objeto de sumo interesse, pois todo passo dado pelo paciente religioso possui uma dimenso autntica e genuna (Frankl, 1973).

    Freud considera o aparelho psquico como algo cuja inteno consiste em liquidar e dominar as quantidades de estmulos e magnitudes de ex-citao que vm do exterior e interior. No entanto, Frankl contrape essa postura argumentando que, visto por esse ngulo, faltaria a caracterstica de au-totranscendncia da existncia no ser humano, que o interesse principal do homem no por condies internas dele prprio, prazer ou equilbrio, mas, ele orientado para o mundo l fora em busca de um sentido que pudesse realizar ou uma pessoa que pu-desse amar (Frankl, 1992).

    Com relao a Jung, Frankl aponta que este autor desloca a religiosidade inconsciente para o id, nesse caso, o eu no responsvel pelos elementos reli-giosos; o religioso no pertence responsabilidade e deciso do eu, ou seja, no o ser humano quem se decide por Deus, ficando claro que Jung no con-sidera o homem autnomo em relao religio. Em vista disso, Frankl faz uma crtica ao reducionismo junguiano, por tratar os fenmenos humanos como expresses de foras impulsivas. Dessa forma, pode--se falar de impulsos religiosos da mesma maneira que nos referimos a um impulso sexual ou agressivo.

    No que se refere a Deus, Jung o v como um ar-qutipo universal, isto , uma srie de imagens, cren-as e ideais que se inserem no nosso inconsciente coletivo, sendo assim, o tema da imagem tem uma grande importncia na psicologia junguiana, sendo vista como imago, termo usado para diferenciar a

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    Procedimentos ticos

    Inicialmente, a presente pesquisa foi submeti-da e aprovada no Comit de tica da Universidade Estadual da Paraba (UEPB), sob o protocolo n. 0519.0.133.000-09. Seguiu todas as diretrizes e normas que regulamentam as pesquisas que envol-vem seres humanos, como prescreve a Resoluo n. 196/96, do Conselho Nacional de Sade. Todos os participantes leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) antes de participar da pesquisa em foco.

    Procedimentos para coleta de dados

    A entrevista foi realizada de forma individual, em lugares pblicos junto populao em geral. O respondente era abordado e convidado a participar da pesquisa, se aceitasse, era conduzido a um local mais reservado para responder aos instrumentos. Os participantes receberam a informao de que as respostas dadas seriam confidenciais e analisadas em seu conjunto. Os pesquisadores utilizaram gra-vaes em udio para as perguntas abertas e, pos-teriormente, executaram a transcrio na ntegra. O tempo mdio para responder a todos os instrumen-tos foi de 30 minutos.

    Procedimentos para anlise dos dados

    Os dados foram tabulados no Pacote Estatstico para Cincias Humanas (SPSS) e foram realizadas anlises descritivas, tais como frequncias e o tes-te t de Student. No que se refere ao material qua-litativo, realizou-se inicialmente uma pr-anlise por meio de uma leitura flutuante das entrevistas. Em seguida, foi feita uma anlise temtica, que, se-gundo Rey (2005), uma forma de penetrar nas estruturas simblicas que configuram a vida co-tidiana das pessoas em contextos reais. Para tan-to, seguiu-se as recomendaes de Bardin (2002) para identificar ncleos comuns de sentido no dis-curso dos participantes, o que, posteriormente, foi agrupado em categorias. Os pesquisadores tiveram tambm a funo de juzes, e as categorias foram extradas por consenso. No Quadro 1 so explana-das as categorias emergentes dos discursos dos participantes.

    ao suicdio, tenho pensado seriamente ao seu res-peito como uma sada); se a vida vale a pena (um item, ex.: se eu morresse hoje, sentiria que minha vida foi muito valiosa). Apesar de a escala ser cons-tituda por trs fatores, pode ser utilizada como uma estrutura unifatorial.

    Escala de atitude religiosa: este instrumento composto por 20 itens distribudos de acor-do com os componentes da atitude afetivo--comportamental e cognitivo. Os itens esto dispostos em uma escala intervalar com os seguintes valores: 1 = nunca; 2 = raramente; 3 = s vezes; 4 = frequentemente; 5 = sempre. O estudo de Diniz e Aquino (2009) indicou uma estrutura unifatorial com a consistncia inter-na alta (alfa de Cronbach = 0,94).Entrevista sobre o desenvolvimento da f: esta entrevista foi originalmente elaborada por James W. Fowler (Fowler, Streib, & Keller, 2004) e tem por objetivo avaliar os estgios da f dos indivduos. Esse instrumento consti-tudo por 25 questes, que esto subdivididas em quatro partes: trama de vida ou reviso de vida; relacionamentos; valores e compromis-sos atuais; religio. No obstante, para a pre-sente pesquisa, foram utilizadas apenas seis perguntas do referido instrumento: (1) Como sua imagem de Deus e sua relao com Deus mudaram durante os captulos de sua vida? Quem ou o que Deus para voc agora?; (2) Voc sente que sua vida tem sentido atualmen-te? O que faz a vida significante para voc?; (3) Existem quaisquer crenas, valores ou com-promissos que parecem ser importantes para sua vida neste momento?; (4) Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou harmonia com Deus ou com o universo? Voc pensa que a vida humana tem um propsito? Em caso afir-mativo, qual voc acha que ?; (5) H um plano para nossas vidas, ou ns somos afetados por um poder ou poderes alm de nosso controle?; (6) Voc se considera uma pessoa religiosa? O que significa isto pra voc?Variveis sociodemogrficas: constitui-se de questes como idade, sexo, escolaridade, es-tado civil, nmero de filhos, religio, o quanto uma pessoa se sente religiosa, o que a pessoa faz a maior parte do tempo, se o sujeito apo-sentado, pensionista e profisso.

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    Aquino, T. A. A. et al. 670

    Quadro 1 - Categorias emergentes dos discursos dos participantes

    Pergunta Categoria Definio

    Quem ou o que Deus?

    Definio pelos atributos divinos Corresponde s atribuies direcionadas a Deus como ser supremo, infini-to, soberano. Definio como direo

    Corresponde s respostas que atribuem a Deus como sendo uma direo, um guia.

    Definio como relao/relacio-namento de amizade Corresponde definio da relao com Deus como uma relao de amiza-de, uma relao em que Deus sempre est ao seu lado.Definio como tudo Corresponde s respostas onde Deus foi determinado como tudo.

    Definio como princpio propulsor ajuda a superar as dificuldades.

    Corresponde s respostas que designam Deus como sendo o ser que d foras, encoraja, cria, ajuda a superar as dificuldades.

    Sem contedo Corresponde s respostas incoerentes.

    O que faz a vida significante?

    Deus Corresponde s respostas nas quais Deus colocado como Aquele em que depositada uma f, e que essa f estimula a capacidade de enfrentar os problemas, o dia a dia, superar tudo.

    Relacionamentos Corresponde s respostas que colocam as relaes familiares, de amizades, amorosas, como sendo de fundamental importncia e que so expostas como o sentido de sua vida.Ajudar o prximo

    Corresponde s respostas em que a satisfao se d medida que se ajuda o outro, sair de si para ir ao encontro do outro.Projetar o futuro

    Corresponde s respostas em que a vida faz sentido porque a ela so coloca-dos objetivos para o futuro, e o fato de querer conquist-los e alcan-los o que proporciona o sentido.

    Bem-estar Corresponde s respostas em que o fato de se ter sade, tanto fisicamente como psiquicamente, feliz consigo mesmo, j permite um sentido de vida.

    Estar vivo Corresponde s respostas que atribuem o sentido de vida ao fato de se ter mais uma oportunidade de acordar e ter mais um dia de vida, todo dia dia de renovao.

    Realizao profissional Corresponde s respostas em que o sucesso no trabalho ou nos estudos com-pleta o seu sentido de vida.

    Tudo Corresponde s respostas em que tudo na vida faz sentido.

    Crenas, valores ou com-promissos so importantes para a vida?

    F Corresponde s religies, f em Deus, salvao, crena em Deus, Deus.

    Relacionamentos Corresponde aos compromissos e valores atribudos famlia, amigos e outros.Relao profissional vida

    Corresponde s respostas em que o trabalho e os estudos foram colocados como compromissos importantes para sua vida.Nenhuma

    Corresponde resposta de que no existia nenhuma crena, valor ou com-promisso importante.Religio Corresponde aos valores cristos e religio.

    Valores morais Corresponde s respostas que envolvem respeito, altrusmo, amor.

    Sem contedo Corresponde s respostas incoerentes.

    (Continua)

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    Estilos de f e sentido da vida 671

    Quadro 1 - Categorias emergentes dos discursos dos participantes

    Pergunta Categoria Definio

    Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou em harmonia com Deus ou com o univer-so?

    Em orao Corresponde s respostas em que o ato de orar aproxima-se de Deus.

    Na igreja Corresponde s respostas em que nesse local pode-se encontrar comunho com Deus.

    SozinhoCorresponde s respostas em que estar sozinho significa estar em comu-nho ou em harmonia com Deus ou com o universo.

    No larA casa apontada como o local onde se pode alcanar essa comunho ou harmonia. Em contato com a naturezao universo Corresponde s respostas em que a natureza permite estabelecer uma comu-nho ou harmonia com Deus e com o universo.

    Todo momento e em todo luga-rou a comunho

    Corresponde s respostas em que generalizaram e colocaram todos os luga-res para encontrar a harmonia ou a comunho.Antes de dormirharmonia. Corresponde s respostas em que a hora antes de dormir o momento em que se pode encontrar a comunho ou a harmonia.Ouvindo msica Corresponde resposta em que o ato de ouvir msica permite encontrar essa comunho.

    Quando cumpro a vontade de Deus Corresponde s respostas em que foi ressaltada a vontade de cumprir o que Deus preconiza, na medida em que agrada a Deus pode se sentir em comunho com Ele.

    Qual o prop-sito da vida?

    Exaltar a Deus Corresponde s respostas em que Deus colocado como o que tem poder sobre as vidas e a exaltao faz parte desse propsito, como amar a Deus sobre todas as coisas.Busca pessoal

    Corresponde s respostas em que cada um segue e constri o seu prop-sito. Promoo dos propsitos

    Corresponde s respostas em que o propsito da vida render adorao a Deus e obedecer a seus preceitos. Ajudar o prximo Corresponde s respostas em que ajudar ao prximo faz parte da misso.

    Realizao pessoal Corresponde s respostas em que o viver bem, consigo e com o outro, faz com que se tenha um propsito.

    Sem contedo Corresponde s respostas incoerentes.

    O que significa ser uma pessoa religiosa?

    Ter uma crena/religio Corresponde s respostas que indicam que uma pessoa, para ser religiosa, precisa ter uma crena ou religio.

    Relacionar-se com Deus ter esse contato com o ser supremo, estar mais perto de Deus.

    Fazer o bem Corresponde s respostas em que as pessoas que fazem o bem so conside-radas religiosas. Realizar atividades espirituais Corresponde s respostas em que os atos de orar, fazer uma leitura bblica e participar de rituais classificam uma pessoa como sendo religiosa.

    Ter f Corresponde s respostas em que, para ser considerada uma pessoa religiosa, deve-se ter f, crer em alguma coisa.

    Seguir os ensinamentos bblicos Corresponde s respostas nas quais so consideradas pessoas religiosas as que seguem os preceitos cristos ou instrues bblicas.

    Tudo Corresponde resposta em que a palavra tudo est relacionada a um pero-do de mudana experimentado pelo entrevistado.

    Fonte: Dados da pesquisa.

    (Concluso)

  • Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676

    Aquino, T. A. A. et al. 672

    Na Tabela 2, observa-se que a maioria das pessoas que compem a amostra refere-se aos Relacionamentos (60%) como o que faz a vida signi-ficante para elas: A vontade que eu tenho de viver, de ajudar os outros, de estar com minha famlia; Meus filhos, a felicidade dos meus filhos, isso para mim o mais importante. Outras respostas foram verifi-cadas, como: Realizao profissional (32%): Meu trabalho profissional tambm algo que fao com intenso prazer; [...] estar empregada e no desem-pregada. Tambm foram observadas respostas com relao ao Projetar o futuro (24%): [...] porque eu tenho uma viso de futuro; Acho que a perspectiva do futuro tambm d significado vida. Com rela-o categoria Deus (20%), observa-se as seguintes respostas: A f em Deus supera tudo, n?; Eu tenho um Deus muito forte dentro de mim, ento tudo, tudo vale a pena. Na categoria Ajudar ao prximo (16%), verifica-se os seguintes discursos: A vontade que eu tenho de viver, de ajudar os outros; A possibilidade de estar me formando, terminando um curso e poder ajudar outras pessoas, faz com que a minha vida te-nha sentido. Em Bem-estar (16%), encontram-se falas como: Enquanto eu tiver sade, n?, paz [...]; porque hoje eu vivo bem, tenho sade, graas a Deus. Na categoria Estar vivo (16%), h os seguin-tes discursos: acordar todo dia e estar a vivendo; Eu acho que s voc ter condies de acordar. E, por fim, na categoria Tudo (8%), as seguintes falas:

    Resultados No que se refere perspectiva quantitativa do tra-balho, observou-se que a mdia de religiosidade da amostra investigada foi de 68,2 (DP = 14,6), tendo uma amplitude de 26 a 96 pontos. J o nvel mdio de vazio existencial foi de 23,2 (DP = 5,8), com uma amplitude de 14 a 36 pontos. Quanto anlise qua-litativa, na Tabela 1 possvel observar as catego-rias que emergiram por meio das respostas ao in-ventrio de James Fowler (Fowler et al., 2004).

    Tabela 1 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: Quem ou o que Deus para voc agora?

    Nome das categoriasFI

    (Frequncia absoluta)

    Fr%(Frequncia

    relativa)

    Tudo 11 44%Atributos divinos 9 36%Direo 6 24%Relacionamento de amizade 5 20%Princpio propulsor 4 16%

    Sem contedo 1 4%Fonte: Dados da pesquisa.

    De acordo com a Tabela 1, pode-se observar que a definio de Deus para a amostra pesquisada foi diversificada, porm, houve a predominncia da de-signao de Deus como Tudo (44%). Tal resultado verificado por meio dos seguintes recortes: Deus tudo pra mim; Deus tudo at agora... pra mim ele tudo. Alm dessa, outra resposta significativa foi a que traz a definio de Deus como Atributos divinos (36%): Deus pra mim um ser acima de tudo e de todos... e Eu toda vida acreditei que um ser supre-mo. Dentre as outras respostas esto as definies de Deus como Direo (24%), por exemplo: Deus hoje para mim um guia. Em seguida, algumas res-postas definem Deus pelo Relacionamento de ami-zade (20%): Hoje tenho uma relao de amizade com Deus; e como Princpio propulsor (16%): ele que move, que d esperana. Respostas sem conte-do foram apresentadas por 4% dos entrevistados.

    Tabela 2 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: O que faz a vida significante para voc?

    Nomes das categoriasFI

    (Frequncia absoluta)

    Fr%(Frequncia

    relativa)Relacionamentos 15 60%Realizao profissional 8 32%

    Projetar o futuro 6 24%Deus 5 20%Ajuda ao prximo 4 16%

    Bem-estar 4 16%Estar vivo 4 16%Tudo 2 8%

    Fonte: Dados da pesquisa.

  • Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676

    Estilos de f e sentido da vida 673

    Todo momento; Todo local. Alm dessa resposta, a referida questo apresenta outras como Na igreja (24%), exemplificada por: Ir pra Igreja porque l eu me sinto bem...; Todo local, mas, mais ainda na Igreja. Em relao categoria Sozinho(a) (24%), pode ser ilustrada por meio dos seguintes exemplos: Quando estou sozinho; Quando estou s, quando eu ligo os louvores. A categoria Lar (20%) constata--se por meio das respostas: Principalmente quan-do estou em casa...; No meu lar.... Na categoria Em contato com a natureza (16%), so encontradas as falas: Acho que sentado na areia da praia, no fim da tarde com uma lua bem linda; Ah! Quando estou em uma praia.... Em Antes de dormir (12%) percebe-se as seguintes falas: Acho que no final do dia. Quando voc vai dormir. Na categoria Em orao (8%), h os exemplos: Nos momentos de orao.; Numa prece tambm..., e em Quando cumpre a vontade de Deus (8%): Quando eu fao aquilo que Deus predisse, en-to amar a Deus sobre qualquer coisa. Em Ouvindo msica (4%): Quando estou ouvindo msica.

    Constatou-se que 100% das pessoas entrevista-das acreditam que a vida humana tem um propsi-to. Pode-se observar na Tabela 5, que, dentre os pro-psitos identificados por elas, o que mais se destaca a Busca pessoal (28%): Caber ao ser humano

    Tabela 3 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: Existem quaisquer crenas, valores, ou compromissos que parecem ser importantes pra sua vida neste momento?

    Nome das categoriasFI

    (Frequncia absoluta)

    Fr%(Frequncia

    relativa)

    F 12 48%Relacionamentos 7 28%Relao profissional 7 28%Valores morais 4 16%

    Religio 2 8%

    Sem contedo 2 8%

    Nenhuma 1 4%Fonte: Dados da pesquisa.

    Tudo, tudo...; Tudo, quando eu me levanto e olho as nuvens.

    Em relao s crenas, valores e compromissos, possvel observar na Tabela 3 maior incidncia de respostas direcionadas F (48%), indicada nos se-guintes recortes: Crena, a f, a f sempre, a f; A reza, a f. Outras respostas apresentadas foram ca-tegorizadas como Relacionamentos pessoais (28%), com as seguintes falas: Meus compromissos com a minha casa, com meu trabalho, com meus filhos; Meus filhos, minha famlia, minha vida. Com o mes-mo percentual, nos Relacionamentos profissionais encontra-se o seguinte exemplo: Compromissos, os prprios que eu tenho com a universidade, acho ex-tremamente importante para minha vida, o que es-tou tendo com meu curso, com a minha futura profis-so, esse compromisso tem relevncia muito grande. Nos Valores morais (16%) observam-se as seguin-tes falas: Amor e respeito; Valores, o de... ... tentar ajudar o prximo e no tentar interferir no bem-estar do outro.... E, quanto Religio (8%), constatou-se as seguintes afirmaes: Sim, a religio...; Todos os valores cristos que eu tenho so importantes. Tambm foram encontradas respostas categoriza-das como Sem contedo (8%) e Nenhuma (4%).

    Como se pode observar na Tabela 4, os entrevis-tados relataram que se acham mais em comunho, harmonia com Deus ou com o universo Em todos os momentos e em todos os lugares (36%). O que con-firma esse dado o tipo de discurso que se segue:

    Tabela 4 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou harmonia com Deus ou com o universo?

    Nome das categoriasFI

    (Frequncia absoluta)

    Fr%(Frequncia

    relativa)Em todo momento e em todo lugar 9 36%Na igreja 6 24%Sozinho(a) 6 24%No lar 5 20%Em contato com a natureza 4 16%Antes de dormir 3 12%Em orao 2 8%

    Quando cumpre a von-tade de Deus 2 8%Ouvindo msica 1 4%Fonte: Dados da pesquisa.

  • Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676

    Aquino, T. A. A. et al. 674

    observado neste recorte: pra mim ser religiosa voc ter um contato pleno e bonito, seja l com qual intensidade for, mas que voc tenha esse contato com o ser supremo, com Deus. Em Fazer o bem (16%), pode ser observado: [...] e fazer o bem sempre, eu acho que no h religio sem caridade. As respos-tas que correspondem categoria Ter f tambm apresentaram 16%, exemplificadas em: Tem que crer em alguma coisa e uma das coisas mais certas a se apegar a f. A categoria Seguir os ensinamentos bblicos tambm apresentou a mesma porcentagem de 16%, como em: Acredito e sigo as instrues b-blicas para uma vida de comunho com o Pai. A ca-tegoria Realizar atividades espirituais (12%) visi-velmente observada neste recorte: Ser religioso pra mim estar em orao.

    Aps a realizao da anlise de contedo, foi possvel explorar quais categorias se associam com o nvel de religiosidade e vazio existencial. Por meio de um teste t de Student, verificou-se que as pessoas que definem Deus por seus atributos divinos apre-sentam um escore mdio menor na escala de atitu-de religiosa (M = 60,9) em comparao com aque-les que no apresentaram a mesma categoria (M = 72,5) em seus discursos, t (21,7) = 2,20, p < 0,05. J as pessoas que definem Deus como Tudo apre-sentou as maiores mdias na pontuao da escala de atitude religiosa (M = 76,8) do que as pessoas

    procurar esse propsito de vida, em minha opinio isso. Na sequncia, as respostas com carter mais significativo foram as que se referiram Exaltao a Deus (24%): Adorao a Deus, que nosso criador, a ele devemos tudo que somos. Ajudar o prximo apa-rece em 20% das pessoas entrevistadas, como pode ser verificado neste recorte: Ns viemos pra ajudar o outro. Tambm foram verificadas respostas que se enquadram em Realizao pessoal (16%), como: Acho que a vida humana existe para voc viver. Em relao s respostas acerca da Promoo dos prop-sitos de Deus (12%), pode-se observar: Promover os propsitos de Deus. Foram categorizadas como Sem contedo 4% das respostas.

    Quando indagados acerca da existncia de pla-nos ou poderes maiores, se estes os atingem ou no, 80% dos respondentes disseram que sim, 12% disseram que no e 4% ficaram na categoria Sem contedo.

    Com relao pergunta Voc se considera uma pessoa religiosa?, 76% dos entrevistados disseram que sim, 20% disseram que no e 4% responderam de forma intermediria. Como sugere a Tabela 6, ao questionar as pessoas sobre o que isso significava para elas, obteve-se as seguintes respostas: 40% dos entrevistados responderam Ter uma crena/re-ligio, como ser religiosa seguir uma religio [...] sigo os preceitos de Deus, ento, acredito que sou re-ligiosa; 24% enfatizaram o Relacionar-se com Deus, Tabela 5 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: Voc pensa

    que a vida humana tem um propsito? Em caso afirmativo, qual voc acha que ? H um plano para nossas vidas, ou ns somos afetados por um poder ou poderes alm de nosso controle?

    Nome das catego-rias

    FI(Frequncia

    absoluta)

    Fr%(Frequncia

    relativa)

    Busca pessoal 7 28%Exaltar a Deus 6 24%Ajudar ao prximo 5 20%

    Realizao pessoal 4 16%

    Promoo dos pro-psitos de Deus

    3 12%Sem contedo 1 4%

    Fonte: Dados da pesquisa.

    Tabela 6 - Categorias e frequncias das respostas para a pergunta: Voc se considera uma pessoa religiosa? O que significa isso para voc?

    Nome das categoriasFI

    (Frequncia absoluta)

    Fr%(Frequncia

    relativa)

    Ter uma crena/religio 10 40%Relacionar-se com Deus 6 24%Fazer o bem 4 16%

    Ter f 4 16%

    Seguir os ensinamentos bblicos

    4 16%Realizar atividades espirituais 3 12%Tudo 1 4%

    Fonte: Dados da pesquisa.

  • Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676

    Estilos de f e sentido da vida 675

    humano interpreta a vida sempre em funo de algo ou algum que no ele mesmo. Nesse caso, relacio-namentos estariam vinculados aos valores viven-ciais, enquanto que a profisso estaria relacionada aos valores criativos.

    De forma mais especfica, os valores da amos-tra estudada emergiram na ocasio da pergunta: Existem quaisquer crenas, valores, ou compromis-sos que parecem ser importantes pra sua vida nesse momento? As respostas indicaram os seguintes te-mas: f, relacionamentos, relao profissional e va-lores morais. Frankl (1973) concebe que o homem no se satisfaz em estar no mundo, mas ele procura motivos e razes para viver. Nessa perspectiva, as respostas sugerem que as crenas e valores dos par-ticipantes da pesquisa constituem-se como sentidos e valores para atuar no mundo.

    Em outra pergunta Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou harmonia com Deus ou com o universo? Foi possvel identificar a ne-cessidade de algumas pessoas em ter um momento de solido e recolhimento. Segundo Frankl (1978), para que o ser humano possa escutar a sua cons-cincia, torna-se necessrio alguns momentos de solilquios, o que seria para o homem religioso seu dilogo interior. Assim, os resultados sugerem que para o homo religiosus o estar em comunho com Deus ou com o universo estar em lugares sagra-dos como a Igreja, em uma relao dialgica com a orao ou no cumprimento de uma vontade divina. Frankl (1992) compreende que a religiosidade s genuna quando existencial, quando a prpria pes-soa decide por ela, e que estamos caminhando para uma religiosidade profundamente pessoal e cada pessoa poder encontrar sua linguagem prpria para dirigir-se a Deus.

    Outro estilo de resposta foi a de que a harmonia pode ser alcanada pelos valores de vivncia, como ouvir msica e entrar em contato com a natureza. Por meio das entrevistas percebeu-se que todos os entrevistados sentem-se em sintonia com Deus em algum momento ou lugar. Esse aspecto corrobora com o pensamento de Frankl (1990), quando conce-be que a religiosidade pode ser vivenciada de forma consciente ou inconsciente e percebida no relacio-namento com um Deus pessoal, sendo este imanen-te no ser humano (Frankl, 1992).

    Outra questo investigada foi se a vida huma-na possui um propsito. Frankl concebe que a

    que no apresentaram esse significado (M = 61,4), t (3,1) = 23, p < 0,01. Por outro lado, as pessoas que concebem Deus como amigo (M = 17,4) apresentam menor grau de vazio existencial do que aquelas que no o fazem (M = 24,6), t (23) = 2,84, p < 0,01.

    Na pergunta sobre qual seria o propsito da vida humana, o teste t indicou que as mdias no nvel de religiosidade se diferenciaram nas categorias ajuda ao prximo e exaltar a Deus. Assim, as pessoas que apresentaram em seus discursos a categoria ajuda ao prximo obtiveram mdias superiores na escala de atitude religiosa (M = 84,3) quando comparadas com aquelas que no apresentaram esse contedo em suas respostas (M = 65,1), t (23) = 2,7, p < 0,01. Por sua vez, aquelas pessoas que concebem que o propsito da vida humana seria exaltar a Deus tam-bm apresentam mdias maiores (M = 80,0) do que aquelas que no apresentam esse contedo na escala de atitude religiosa (M = 64,4), t (23) = 2,52, p < 0,01.

    Discusso

    O objetivo da pesquisa foi identificar a relao entre os estilos de f e as concepes de Deus com os nveis de percepo do sentido de vida e de re-ligiosidade. Considera-se que ele foi plenamente alcanado, tendo em vista os resultados anterior-mente apresentados. Entretanto, ressalta-se que os resultados no so passveis de generalizao, ten-do em vista as limitaes da amostra investigada.

    Com relao aos resultados qualitativos, per-mitiram identificar os diversos estilos de f e reli-giosidade dos entrevistados. Dois estilos chamam especial ateno: o estilo racional, que define Deus por seus atributos, e o estilo vivencial, que o define como relacionamento. Nesse sentido, Frankl conce-be um relacionamento do homo religiosus com um Tu transcendente. Deus tambm foi definido pelos participantes da pesquisa por meio da categoria di-reo, ou seja, a traduo da palavra logos. Destarte, para o homem religioso, se h um sentido na exis-tncia humana tambm deve haver um provedor de sentido, ou um suprassentido.

    Com relao pergunta O que faz a vida significante pra voc, observa-se que as respostas, de forma geral, relacionam-se perspectiva da au-totranscedncia. Segundo Frankl (1991), por meio da autocompreenso ontolgica pr-reflexiva, o ser

  • Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676

    Aquino, T. A. A. et al. 676

    motivao primria do ser humano a vontade de sentido, em consonncia com essa perspectiva to-dos os respondentes afirmaram que a vida tem um propsito. Mas, quando indagados sobre qual seria o propsito da vida, os mesmos atriburam as se-guintes concepes: exaltar a deus, busca pessoal, promoo dos propsitos e ajudar o prximo. Frankl (1990) concebe que a meta da existncia humana a autotranscendncia, pois o ser humano no se-ria uma mnada, mas um ser aberto para o mundo. Assim, as respostas esto em consonncia com essa viso, na medida em que indicaram algo no mundo pelo qual a pessoa deve viver. Por meio da escala de atitude religiosa, pde-se perceber que as pessoas mais religiosas concebem que o propsito da vida seria ajudar o prximo e exaltar a Deus.

    Nesta pesquisa foi possvel identificar que as pessoas que pontuam mais em uma escala de ati-tude religiosa tendem a definir Deus como tudo, e aquelas que definem Deus por seus atributos tm menor pontuao nessa mesma escala. Dessa ma-neira, pode-se conceber que, para a pessoa religio-sa, a sua relao com Deus no seria impessoal, ou mesmo racional e distante de sua existncia. O que se confirma quando a resposta Deus como amigo sugeriu menor grau de vazio existencial na pontu-ao do Pil-test. Isso pode ser bem compreendido quando Frankl (1992) constata um efeito colateral da religiosidade na cura da alma, embora a funo primria da religio seja a salvao da alma. Dessa forma, parece plausvel conceber que a pessoa reli-giosa encontra um sentido na vivncia pessoal com um Deus quando este percebido como um ser en-raizado em sua existncia.

    Consideraes finais

    A presente pesquisa tentou demonstrar a riqueza e a amplitude dos estudos voltados para a questo da f e suas relaes com o sentido da vida, corrobo-rando, de forma emprica, as preocupaes ontol-gicas com questes metafsicas ainda presentes na sociedade atual. O estudo tambm permitiu mapear a subjetividade das pessoas religiosas e identificar qual o estilo de f que se associa negativamente ao vazio existencial. guisa de concluso, considera-se que a vontade de um sentido ltimo pode ser con-cebida como uma categoria imanente, e que a forma de expressar essa vontade est relacionada com a

    situao existencial de cada pessoa, cabendo ao ser humano ler na sua prpria existncia o anelo por um sentido transcendente.Referncias

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