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31 Bahia Agríc., v.7, n.3, nov. 2006 *Médico Veterinário, M.Sc. em Produção Animal, Consultor da Associação dos Criadores de Caprinos e Ovinos de Petrolina e Região – ASCCOPER e do SEBRAE; e-mail: [email protected] **Médico Veterinário, Mestre em Reprodução Animal, Pesquisador da Embrapa Caprinos; e-mail: [email protected] valorização dos produtos caprinos e ovinos através da fixação de um padrão diferenciado de qualidade e de sua certificação é, no contexto atual de grande expansão destas atividades econômicas em quase todas as regiões do país, a grande, senão única, alternativa estratégica capaz de assegurar a plena expressão do seu potencial no Semi-árido e, ao mesmo tempo, de preservar os recursos da caatinga e promover o bem estar das A Clovis Guimarães Filho* Daniel Maia Nogueira** Foto: Silvio Ávila - Editora Gazeta Santa Cruz populações que nela vivem e dela dependem (GUIMARÃES FILHO, 2005). A diferenciação dos produtos se dá a partir da incorporação aos mesmos de uma identidade territorial e cultural ligada estreitamente ao ambiente geográfico onde são pro- duzidos. A idéia inicial é trabalhar mais com o caprino que com o ovino, em função da maior facilidade de associação desta espécie com o bioma caatinga, responsável maior pelas suas especificidades. Outro fator favorável ao caprino diz respeito às maiores limitações de competitivi- dade do ovino em face de forte concorrência que se delineia com o crescimento exponencial da ativi- dade, especialmente no Centro-Oeste e Sudeste. Há base para essa expan- são. Apenas em São Paulo o déficit estimado é de 25 mil toneladas anuais de carne ovina (FORTES, 2004). O Cabrito do Vale do São Francisco: valorizando o bioma caatinga

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*Médico Veterinário, M.Sc. em Produção Animal, Consultor da Associação dos Criadores de Caprinos e Ovinos de Petrolina e Região – ASCCOPER e doSEBRAE; e-mail:[email protected]**Médico Veterinário, Mestre em Reprodução Animal, Pesquisador da Embrapa Caprinos; e-mail: [email protected]

valorização dos produtoscaprinos e ovinos atravésda fixação de um padrão

diferenciado de qualidade e de suacertificação é, no contexto atual degrande expansão destas atividadeseconômicas em quase todas asregiões do país, a grande, senãoúnica, alternativa estratégica capaz deassegurar a plena expressão do seupotencial no Semi-árido e, ao mesmotempo, de preservar os recursos dacaatinga e promover o bem estar das

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populações que nela vivem e deladependem (GUIMARÃES FILHO,2005). A diferenciação dos produtosse dá a partir da incorporação aosmesmos de uma identidade territoriale cultural ligada estreitamente aoambiente geográfico onde são pro-duzidos.

A idéia inicial é trabalhar maiscom o caprino que com o ovino,em função da maior facilidade deassociação desta espécie com o

bioma caatinga, responsável maiorpelas suas especificidades. Outrofator favorável ao caprino diz respeitoàs maiores limitações de competitivi-dade do ovino em face de forteconcorrência que se delineia com ocrescimento exponencial da ativi-dade, especialmente no Centro-Oestee Sudeste. Há base para essa expan-são. Apenas em São Paulo o déficitestimado é de 25 mil toneladas anuaisde carne ovina (FORTES, 2004).

O Cabrito do Valedo São Francisco:

valorizando o bioma caatinga

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Somente a diferenciação darácondições de competitividade aosnossos produtos caprinos e ovinos. Acriação de uma ou mais marcas de“cabrito” ou de “borrego da caatinga”com certificação de indicação geo-gráfica se fundamentaria nas rela-ções do animal com o bioma, via umsistema produtivo utilizador de ummínimo de insumos externos e ma-ximizador de tipicidades locais/regio-nais disseminados pelos distintosespaços do Semi-árido.

De forma resumida, a proposiçãoexposta a seguir, como modelo pre-liminar para discussão, foi apre-sentada à Associação de Criadores deCaprinos e Ovinos de Petrolina eRegião (ASCCOPER) para a criação deum Cabrito do Vale do São Francisco,abrangendo municípios baianos epernambucanos. O modelo, contudo,pode servir de base para a imple-mentação de empreendimentos si-milares, envolvendo outros produtoscaprinos e ovinos, que eventual-mente possam surgir em outros es-paços do Semi-árido. Para os in-teressados, os autores podem dis-ponibilizar a versão completa domodelo.

A certificaçãode indicaçãogeográfica

A certificação de indicação geo-gráfica para o Cabrito do Vale do

São Francisco deverá ser obtida me-diante registro no Instituto Nacionalde Propriedade Industrial – INPI, po-dendo ser do tipo Denominação deOrigem (DO) ou do tipo Indicação deProcedência (IP).

Podem ser certificados com oselo DO todos os produtos cuja au-tenticidade e tipicidades se devamexclusiva ou essencialmente ao meiogeográfico, incluídos aí fatores na-turais (solo, clima) e/ou humanos(tradição, cultura). É necessário quehaja uma clara ligação estabelecidaentre o produto, o território e o talentodo homem (o “saber-fazer”). No casodo selo IP a vinculação do produtocom os fatores naturais e humanos

são bem menores, fundamentando-semais na notória tradição de umadada região como produtora de umdeterminado bem. Essa opção tem avantagem de acelerar e simplificar oprocesso de concessão do selo.

No país só existem dois produtoscom selo de indicação geográfica: ovinho do Vale dos Vinhedos, RS e ocafé do Cerrado mineiro. Na Europa,os produtos caprinos e ovinos comcertificação de origem são inúmeros.Os exemplos mais conhecidos sãoo “borrego Serra da Estrela”, emPortugal, o “cordero Manchego”, naEspanha, e os queijos “roquefort”, deleite de ovelha, e “chabichou dePoitou”, de leite de cabra, na França.

Para obter o reconhecimento eutilizar o selo DO ou IP em seuproduto a associação, ou o grupode associações, deve atender umconjunto de exigências. Antes, po-rém, é necessário que sejam defini-das as especificidades do produtoa ser certificado, vinculando-as a umaou mais características próprias da-quele espaço e se delimite a sua zo-na de produção. A certificação deindicação geográfica, uma vez con-cedida, é propriedade dos produ-tores. Além de implicar a melho-ria acentuada do produto, estabe-

lecendo sua diferenciação, agregavalor ao mesmo, facilita a inserçãodo produtor no mercado, protege oproduto, fortalece as organizaçõesdos produtores e, sobretudo, valori-za a região pela promoção e preser-vação da cultura e da identidadelocais.

Caracterizaçãodo produto ede sua áreade produção

A produção do Cabrito do Vale

do São Francisco deverá se processarem bases agroecológicas, utilizandogenótipos baseados em raças ouecotipos nativos, criados em umsistema semi-extensivo, caracterizadopelo pastejo na caatinga e pelacomplementação alimentar, nosperíodos críticos, com pastos eforragens tolerantes à seca. As qua-lidades mercadológicas e as espe-cificidades técnicas propostas para oproduto estão expostas nos Quadros1 e 2.

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O “sabor da caatinga”, implícitona carne do cabrito, viria da asso-ciação dos genótipos nativos com avegetação de caatinga, da qual sealimentam, pelo menos em partede sua vida. Na realidade as quali-dades da carne e da pele estão in-trinsecamente associadas ao proces-so de seleção natural a que foram sub-metidos os caprinos trazidos peloscolonizadores a partir de 1535, per-meado por longas caminhadas atra-vés da vegetação seca e espinho-sa, intensa incidência solar, altastemperaturas, prolongados perío-dos de escassez de água e outrosalimentos, acarretando uma alta

rusticidade, sem perda de pro-lificidade, embora em detrimentoda função leiteira e do porte. São,portanto, uma carne e uma pele cons-truídas ao longo de 470 anos. Hánecessidade, contudo, de um tra-balho complementar de pesquisapara identificar e caracterizar embases científicas essas e outras espe-cificidades do produto vinculadas aosfatores naturais e humanos da zonade produção.

A seleção para o abate será feitacom base na avaliação da condiçãocorporal, segundo SUSIN (1996).Os cortes comerciais da carcaça,a serem feitos nas unidades de

beneficiamento, seguirão o sistemarecomendado pela UniversidadeFederal de Lavras (SANTOS, 2002).

As qualidades organolépticas,especialmente sabor, maciez e su-culência, serão periodicamente mo-nitoradas nos pontos de distribui-ção e de comercialização, aplican-do-se, eventualmente, painéis-testede degustação (MADRUGA et al.,2002).

A área geográfica natural propos-ta inicialmente para a produção doCabrito do Vale do São Francisco

corresponde aos sertões baiano epernambucano do Sub-Médio SãoFrancisco, onde predomina a unidadede paisagem definida no zoneamentoagroecológico feito pela Embrapa,como Depressão Sertaneja. A área,visualizada na Figura 1, é formadapelas microrregiões de Juazeiro ePetrolina. Esta zona abrange umasuperfície total de 54 mil km2, comuma população rural superior a 200mil habitantes. Seus rebanhos caprinoe ovino somam quase dois milhõesde cabeças (60% de caprinos),correspondendo a aproximadamente13% do rebanho nordestino.

O clima da área é quente, Semi-árido, com média pluviométricaanual da ordem de 500 mm, irre-

Figura 1 - Área delimitada para produção do Cabrito Ecológico do Vale

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gularmente distribuídos Os solosapresentam em geral baixa fertili-dade natural. A vegetação predo-minante é de caatinga hiperxerófi-la, onde espécies arbustivo-arbóre-as como o moleque-duro (Cordialeucocephala Moric, o quebra-faca(Croton spp.), o mororó (Bauhiniacheilanta Steud.), o carqueja(Calliandra depauperata Benth), ajurema-preta (Mimosa hostilis Benth),a caatingueira (Caesalpina microphyllaMart.), o pau-de-sete-cascas (Tabebuiaspongiosa Rizzini), a maniçoba(Manihot pseudo-glaziovii Pax etHoffm.) e a faveleira (Cnidoscolusphyllacanthus (Pohl.) Müell. Arg.)constituem a dieta base dos caprinos,associada, portanto, ao sabor carac-terístico da carne.

O sistemade produçãoproposto

O sistema produtivo proposto éfundamentado nos trabalhos daEmbrapa Semi-árido. Utiliza genó-tipos de raças nativas (Moxotó,Canindé, Repartida, Marota, Graúna,etc.) e seus cruzados, desde que

mantida a predominância do sanguenativo, e uma alimentação baseadano pastejo e ramoneio na caatinga,complementada, nos períodos secos,com pastos diferidos (caatinga, capinsbuffel, corrente, etc.); feno e/ousilagem de leucena, gliricídia, guan-du, maniçoba; palma-forrageira,algaroba, melancia forrageira, grãosde sorgo, raspas de mandioca, alémde restolhos culturais.

Além de um manejo reprodutivobaseado em estações de montaespecialmente delineadas para aque-las zonas produtoras responsáveispela oferta de animais nos períodosde entressafra, o sistema insere asboas práticas de produção agro-pecuária (BPA) como estágio inicialde um plano de gestão, com controlede qualidade e certificação.

O sistema produtivo acima des-crito é apenas uma referência,devendo ser adaptado às circuns-tâncias de cada unidade e de cadaprodutor. Não é flexível, contudo, noque concerne à exigência de raçasnativas e de processos agroecológicosde cultivo e criação. Nesse sentido,o sistema procura contemplar asprincipais práticas de convivênciacom a seca e de preservação am-biental recomendadas, para zonassemi-áridas, sistematizadas no uso

preferencial de recursos autóctones,de pastos cultivados tolerantes a seca,de métodos racionais de uso davegetação nativa, de arborização dospastos cultivados, de estabelecimentode reservas estratégicas alimentarespara períodos de estiagem prolon-gada e de preservação de áreas dereservas legal e permanente.

A utilização da vegetação dacaatinga e de raças nativas são pre-missas básicas no processo pro-dutivo do Cabrito do Vale do São

Francisco. Mesmo que esses fatoreslimitem um pouco a capacidade deum abate em idade mais precoce,isto não constitui problema maior,já que essa aparente desvantagempoderia ser neutralizada pela pro-dução de carcaças mais leves oulargamente compensada, tanto porcustos unitários de produção me-nores, quanto pelo maior valor agre-gado ao produto pelas suas especi-ficidades mercadológicas.

Os resultados esperados com ouso desse sistema tendem a con-firmar valores não muito distintosdos registrados, na prática, para osgenótipos especializados e suascruzas. O Quadro 3, a seguir, com-para o desempenho técnico esperadodo Cabrito do Vale do São Francisco

com o desempenho médio observado

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nos sistemas convencionais exten-sivos, ainda predominantes no Valedo São Francisco.

O controle da

qualidade dos

produtos

A certificação de origem a serconcedida pelo INPI implica, parasua manutenção, o estabelecimentode um eficiente sistema de controleinterno de todos os processos envol-vidos na produção, processamentoe distribuição dos produtos. Seráinstituído um Conselho Regulador(CR), que terá, entre suas tarefas, amissão de zelar pelo cumprimentode todos os procedimentos previstospara tais processos, especificadosno Manual de Procedimentos. Esteinstrumento é um tipo de cadernode especificações ou de encargos a

que deverão se sujeitar os pro-dutores associados da cooperativapara produzir o Cabrito do Vale

do São Francisco. O Manual a-brange, portanto, a descrição com-pleta do produto, a delimitação daárea geográfica, as provas de ori-gem exigidas, a descrição dos mé-todos de obtenção do produto (in-cluindo alimentação, genótipos,manejo reprodutivo e controlesanitário) e do sistema de controlede qualidade.

Caberá ao CR, através de ins-peções periódicas às unidades pro-dutoras, abatedouros e pontos dedistribuição e comercialização, o mo-nitoramento desses processos, im-plementando os ajustes e aplicandoas medidas corretivas que se fizeremnecessárias à preservação da qua-lidade dos produtos.

Como importante instrumento dosistema de gestão de qualidade, arastreabilidade será priorizada noprocesso de produção do Cabrito do

Vale do São Francisco na buscade identificar os pontos de estran-

gulamento e proceder, em tempooportuno, as ações necessárias. Oobjetivo é que todos os produtossejam conhecidos e controlados, bemcomo, todas as unidades produtorase transformadoras que enviam essesprodutos. A implantação do sistemaidentificará animais, carcaças e cortesem suas embalagens e configuraçõesde transporte e estocagem, em todasas etapas de produção e suprimento,utilizando brincos especiais nosanimais e etiquetas adesivas e marcasindeléveis nas carcaças e nos cortes.

A estratégiade implantação

A estratégia de implantação maisrecomendável seria iniciar o processoatravés de um projeto-piloto deprodução e comercialização doCabrito do Vale do São Francisco,envolvendo um número limitadode associados. Validados os pro-cessos produtivo e de organização e

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foco mais objetivo, em termos deagronegócio.

A estratégia de lançamento doproduto Cabrito do Vale do São

Francisco no mercado se baseará,ainda, em um plano de marketing, oqual procurará promover e fixar aimagem dessa linha de produtos juntoaos potenciais consumidores.

O modelode integração

O modelo de integração (Figura2) terá, preferencialmente, por baseuma cooperativa e terá implemen-tação gradual. Ele implica umaperfeita articulação entre a co-operativa e as diversas atividadesda cadeia produtiva, representa-das principalmente pela criação,processamento e distribuição doproduto, constituindo um modelopróximo ao concebido pelos pro-

dutores de ovinos da região deBrasília (MEDEIROS; RIBEIRO, 2006).

O apoio tecnológico estará acargo da Embrapa Semi-Árido eda Empresa Baiana de Desenvol-vimento Agrícola (EBDA), apoiadosainda pelo Centro Federal de Edu-cação Tecnologia (CEFET). Outrosatores se incluem nessa rede deapoio, destacando-se o SEBRAE e osbancos oficiais.

Os animais a serem abatidos serãoselecionados ainda na unidadeprodutora, sob a supervisão do CR,com base nas exigências mínimasestabelecidas no Manual de Proce-dimentos. Os cabritos poderão serainda selecionados na condição desemiprontos ou desmamados, sendo,nestes casos, encaminhados parauma unidade central de terminação(semiconfinamento) da cooperativa,para concluir seu desenvolvimento.No sistema proposto, o semicon-finamento de animais não prontos edesmamados constitui um apoioimportante para aqueles produtores

confirmada a aceitabilidade do pro-duto pelo mercado, o modelo estariaapto para uma segunda etapa, demudança de escala, expandindo-opara os demais associados e buscandonovos mercados.

O projeto-piloto deve incluir aformação de uma rede de articulaçãoprodutor-processador-distribuidor,incorporando, em um modelo deintegração de pequena escala, asações de financiamento, assistênciatécnica, promoção e comercializaçãodo produto. A validação do produtojunto ao mercado teria por base a suacomercialização experimental comclientes previamente articulados(redes de supermercado, programasgovernamentais, restaurantes e casasespecializadas) e/ou em pontos devenda direta da associação. Esseprojeto-piloto seria facilmente imple-mentado do lado baiano do Vale,aproveitando-se a infra-estruturae o conjunto de ações do progra-ma Cabra Forte, dando-lhe maisvisibilidade e conferindo-lhe um

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mais vulneráveis a períodos severosde seca e uma estratégia essencialpara uma melhor padronização doproduto.

Os produtos intermediários, es-terco e peles, serão comercializa-dos na própria região, forte deman-dadora dos mesmos em funçãoda presença da fruticultura de ex-portação e de dois grandes cur-tumes exportadores, localizados emJuazeiro e Petrolina. Os produtosfinais, cárneos, serão comercia-lizados diretamente pela coope-rativa junto aos mercados maisexigentes das capitais (classes A eB), bem como junto a comprado-res institucionais, pequenas agro-indústrias, ou, ainda, através depontos de comercialização direta,estrategicamente localizados.

Consideraçõesfinais

Em suma, esta proposta buscaconsolidar o reconhecimento local eregional do Cabrito do Vale do São

Francisco e iniciar sua caminhadapara uma dimensão nacional. Deveráser o primeiro produto de origemcaprina com certificação de identifi-cação geográfica no país. Os obje-tivos buscados nessa caminhada po-dem ser consubstanciados nos se-guintes aspectos:

· melhoria da eficiência bio-econômica e da sustentabilidadedas suas unidades produtivas, via ele-vação dos níveis de produtividadeanimal e adequação dos sistemasprodutivos às condicionantes naturaisda região;

· melhoria da capacidade deadaptação desses sistemas à eco-nomia de mercado, via ajuste dadinâmica da produção e dos pa-drões de qualidade dos produtos àsdemandas e especificidades dosmercados;

· atendimento às demandas so-ciais, via promoção do desenvol-vimento, preservando a paisagemrural e valorizando a cultura e osaber-fazer como instrumentos dereafirmação da identidade local.

Empreendimentos com esse en-foque, no Semi-árido, poderiamabranger não apenas produtos ca-prinos e ovinos de outras regiões(“cabrito de Uauá”, “cordeiro doInhamuns”, “queijo de cabra doCariri”), mas, também, diversos outrosprodutos (queijos de leite de vaca,

Figura 2 - Modelo de Integração

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produtos apícolas de abelhas come sem ferrão, aves caipiras, frutasnativas, etc.), demandando, natu-ralmente, para seu sucesso, o estabe-lecimento de normas e serviços queregulamentem e facilitem o processo,o fortalecimento das associaçõesde produtores, a estruturação deredes locais de apoio técnico, e, prin-cipalmente, uma linha específicade crédito, mais adequada às cir-cunstâncias sob as quais operam osprodutores e à capacidade remu-neratória de capital dessas ativida-des. Uma ação inicial por parteda pesquisa seria essencial parafundamentar um processo de iden-tificação e espacialização das poten-ciais marcas e produtos, capazesde, aproveitando as tipicidades eos patrimônios culturais e sociaisespecíficos, desenvolver novos negó-cios relacionados com agregação devalor (FLORES, 2003).

É bastante procedente o alerta deAltmann (2006) de que a simplesaplicação de um selo de garantia dequalidade por si só não assegura acolocação dos produtos no mercadoem condições vantajosas. O produtoe seu sistema têm que ser plena-

mente conhecidos e respeitados porprodutores, processadores e distri-buidores e, sobretudo, reconhecidopelos consumidores, o que exige,também, concomitantes investi-mentos em marketing.

Concebidos e operados dessamaneira, tais empreendimentos per-mitiriam a obtenção de resultadosefetivamente impactantes na me-lhoria nos processos de utilização dosrecursos naturais de solo, água, plantae animal do bioma caatinga e degestão do espaço rural como um todo,na maior valorização da cultura e dosaber-fazer locais e no melhor orde-namento e equilíbrio no processo deintegração econômica e social entreas distintas condições agroecológi-cas e sócio-econômicas existentes noVale do Rio São Francisco.

REFERÊNCIAS

ALTMANN, R. Certificação de qualidade eorigem e desenvolvimento rural. In: LAGES,Vinicius (Org.). Valorização de produtos comdiferencial de qualidade e identidade:indicações geográficas e certificações paracompetitividade nos negócios. Brasília:Sebrae, 2005. p.133-140

FLORES, M. X. Projeto de fortalecimento dascapacidades competitivas dos pequenosprodutores rurais: desenvolvimento territorial eestratégias inovadoras. Brasília: EMBRAPA eoutros, 2003. 46p (documento não publicado)

FORTES, G. Ovino composto vem aí. DBO, SãoPaulo, v.23, n.281, p.80, mar. 2004.

GUIMARÃES FILHO, C. Uma estratégia deinserção no mercado para a caprino e aovinocultura de base familiar do Semi-árido. In:SEMINÁRIO NORDESTINO DE PECUÁRIA –PECNORDESTE, 9. 2005, Fortaleza, CE: Anais...Fortaleza: FAEC/CNA/SENAR/SEBRAE, 2005.CD-ROM

MADRUGA, M. S. et al. Influência da idade deabate e da castração nas qualidades físico-químicas, sensoriais e aromáticas da carnecaprina. Revista Brasileira de Zootecnia, v.31,n.3, p.1562-1570, 2002.

MEDEIROS, J. X.; RIBEIRO, J. G. B. L. Omercado como instrumento de modernizaçãoda caprino-ovinocultura de corte no Brasil: abusca de formas mais eficientes de organizaçãoprodutiva. In: ENCONTRO NACIONAL DE CA-PRINO-OVINOCULTURA, 1., 2006, CampinaGrande, PB. Anais... João Pessoa: SEBRAE, 2006.CD-ROM

SANTOS, C. L. dos. Montagem de pequenosabatedouros e cortes comerciais de ovinos.Viçosa: CPT, 2002. 120p.

SUSIN, I. Exigências nutricionais de ovinose estratégias de alimentação. In: SILVASOBRINHO, A. G. et al. Nutrição de Ovinos.Jaboticabal: Funep, 1996. p.119-141.

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