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Manual de Formação Vencendo a Inumerologia Proposta de Intervenção Pedagógica J.J. Filipe da Silva 2006

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Manual de Formação

Vencendo a

Inumerologia

Proposta de Intervenção Pedagógica

J.J. Filipe da Silva 2006

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Índice 1 Objectivos Pedagógicos ……………………………… 12 Introdução ……………………………………………………. 13 Entraves à numerologia: …………………………….. 43.1 Convenções …………………………………………………… 43.2 Distracções …………………………………………………… 43.3 Sofismas ………………………………………………………... 53.4 Falácias …………………………………………..................... 63.5 Paradoxos ………………………………….………………….. 64 Sistemas numéricos ……………………….……………. 74.1 Decimal …………………………………………..................... 74.2 Binário e Hexadecimal ………………………………… 85 Algumas qualidades dos números: …………… 95.1 Zero ………………………………………………………………... 95.2 Perfeitos ………………………………………………………… 105.3 Primos ……………………………………………………………. 105.4 Mágicos …………………………………………………………. 125.5 Número de Ouro (Divina Proporção) ……….. 145.6 Infinito …………………………………………………………... 166 Tuteando os números – O cálculo mental .. 207 Conclusão ……………………………………………………… 228 Referências Bibliográficas …………………........... 229 Anexo - Texto de Apoio ………………………………. 23

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1 – Objectivos Pedagógicos. É objectivo principal deste pequeno curso dar a perceber que a capacidade “numerológica” individual pode ser amplamente desenvolvida e explicar os entraves à numerologia, a origem dos números e operações aritméticas, os sistemas numéricos de diferentes bases, características de alguns números e as potencialidades de cálculo mental. 2 – Introdução. Nos dias de hoje as pessoas vivem com um certo “pavor” dos números. O insucesso escolar encontra nas ditas “matemáticas”, uma das suas mais fortes razões de ser. Mais interessante ainda é notar que, algumas pessoas, fazem gala do seu desconhecimento das regras mais básicas da matemática, empolando até, de alguma forma, esse desconhecimento. É a este inconforto com os números que chamaremos de “Inumerologia” (neologismo), posicionando esta palavra em relação aos números, da mesma forma que “Analfabetismo” está para as letras. Fica então claro que, para nós, numerologia tem um sentido mais lato e menos cabálico do que aquele que lhe era tradicionalmente atribuído, segundo o qual: “Numerologia é o estudo das influências e qualidades místicas dos números. Segundo a numerologia (no sentido que não lhe atribuímos), cada número ou valor numérico é dotado de uma vibração ou essência individual e indicaria tendências de acontecimentos ou de personalidade, apesar de não haver qualquer evidência científica de que os números apresentem tais propriedades. O filósofo grego Pitágoras é considerado por alguns numerólogos o pai da numerologia, apesar de não haver qualquer relação entre os cálculos que formam o mapa numerológico e o filósofo grego. Na verdade a numerologia é uma derivação da Gematria, um ramo da Cabala, que utiliza o alfabeto hebraico como base. A numerologia seria então uma adaptação dos princípios da Gematria para o alfabeto romano.” Segundo Almeida (1998) a dactilonomia, ou cálculo digital, foi historicamente a primeira resposta do Homem às exigências de contagem impostas pela vida social de relação. Este procedimento está rastreado na história da Matemática e desempenha importante papel, a par do sistema dos seixos ou pequenas pedras (calculus em latim, ex: cálculos renais), no desenvolvimento material das comunidades humanas da pré-história.

Na Idade Média a utensilagem de cálculo limitava-se ao ábaco, réguas e tabuleiros. O uso do ábaco generalizou-se nas escolas das Catedrais, e só foi destronado pela implantação do cálculo escrito, tornado possível só pelo uso da numeração árabe. Nas mãos dos abacistas, o ábaco era eficaz, e proporcionava grande rapidez de manejo (Almeida, 1998).

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Ábaco

O cálculo mental foi um concorrente eficaz do ábaco e de todas as formas mecânicas de calcular. Numa fase em que os cálculos eram morosos e difíceis, havia interesse em incrementar o cálculo mental, pela rapidez que oferecia.

O cálculo mental é um conjunto de regras, de artifícios, que tendem à fixação de soluções operatórias dentro de um quadro da maior economia de esforço. Mas é também uma técnica de combinações mnemónicas que se transformam em elementos operatórios e de enorme eficácia, e que só está ao alcance de muito poucos. O cálculo mental resistiu sempre a tudo e todos, e até ao cálculo escrito (Almeida, 1998).

Também é importante referir as Tábuas Numéricas, que eram correntes na cultura europeia desde o século XII, e que haviam já sido amplamente utilizadas pelos Árabes. Basicamente eram correspondências entre dois conjuntos e eram de grande utilidade nos estudos de astronomia e de matemática (Almeida, 1998).

A origem da informação científica que no século XIV se utilizava em Portugal provém de uma fonte comum a quase toda a cultura europeia: a Escola de Tradutores de Toledo que, entre meados do século XII e todo o século seguinte, elaborou a síntese do conhecimento antigo e indo-árabe, e seguidamente, promoveu a difusão desses saberes milenares pela estrutura cultural cristã (Almeida, 1998). Este conhecimento acantonou-se em torno de importantes paradigmas dos quais os mais importantes, do ponto de vista da aceitação e uso na cultura portuguesa quatrocentista são o aristotélico, o euclidiano, o ptolomaico e o boeciano. Seguir-se-ia o árabe e em meados do século XV, viria acrescentar-se-lhes o mediterrânico (Almeida, 1998).

Em Portugal, por volta de 1330, começava o uso da numeração árabe que tão importantes consequências viria a ter, ainda que demorasse mais de trezentos anos a impor-se. Al-Khwarizmi e o seu Algorismus são o seu ponto de partida. A recepção do matemático árabe na cultura europeia começou com a tradução latina da sua obra, atribuída a Roberto de Chester e a Gerardo de Cremona, num texto datado de princípios do século IX (Almeida, 1998).

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Nos Tratados peninsulares do século XVI encontra-se a «conta castelhana» que designa uma aplicação particular do sistema de numeração romana. Sobretudo os tratadistas espanhóis reservaram-lhe grande espaço e difundiram-na vigorosamente, apesar do seu processo operatório ser de difícil excussão. Ao contrário, os aritméticos portugueses ignoraram-na, a ponto de, ainda no século XVI, esta técnica estar em desuso. A aritmética que então se praticava em Portugal era mais rápida e moderna, pelo uso da «conta guarisma» em notação árabe (Almeida, 1998).

A ruptura com a tradição milenar ocorreu em momentos sucessivos do processo global de desenvolvimento, e foi antecedida pela implantação social da notação de posição e pelo uso generalizado da numeração árabe (Almeida, 1998).

Segundo Almeida (1998) a aritmética e a «conta guarisma» permanecem como utensílios de uma mesma realidade mental. O processo de transformação por que passava a sociedade da primeira formação do capitalismo mercantil consolidou-se e, por fim, muitas questões, até aí resolvidas pela aritmética, começaram a ter solução algébrica, o que prova de modo indiscutível, a eficácia do paradigma mediterrânico.

De acordo com Almeida (1998) a própria palavra «aritmética» é muito antiga, fazia parte das sete artes liberais e ocupava lugar de honra no «Quadrivium». Segundo o Aritmético Bento Fernandes (1555) sendo uma das sete artes liberais, ela é a principal, porque, para alcançar as outras ciências, é preciso ter conta, peso e medida. Os números, com o grafismo que lhe conhecemos, derivam dos números árabes:

Europeu 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9Arábico - Índico ٠ ١ ٢ ٣ ٤ ٥ ٩ ٨ ٧ ٦

Os caracteres ou glifos (neste caso hieróglifos) dos números europeus são por vezes chamados de “números angulares” pelo facto do seu grafismo ter eventualmente origem no número de ângulos que formam:

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3 – Entraves à numerologia: Convenções; Distracções; Sofismas; Falácias e Paradoxos. Antes de avançarmos, e por medida cautelar, será talvez importante chamar a atenção para alguns dos aspectos que constituem entraves à numerologia, representando verdadeiros escolhos aos que se aventuram no mundo dos números e, por vezes, forte razão para total perda de interesse pela matéria. Fá-lo-emos de uma forma breve, à giza de chamada de atenção. 3.1 Convenções – As pessoas tem dificuldade em perceber que uma parte da nossa vida se rege por convenções. Tem ainda maior dificuldade em perceber que por vezes essas convenções não são universais, ou seja que há diferentes convenções, sobre o mesmo assunto, em diferentes partes do mundo ou ainda, que uma convenção se sucede por vezes a outra sobre o mesmo assunto e, ao invés de se fazer a sua substituição, vamos placidamente deixando-as coexistir (a antiga e a nova). Como exemplo do primeiro caso temos o bilião, que na Europa é igual a 1012 ou seja um milhão de milhões (um conto de contos, sendo um conto = um milhão - Bento Fernandes) e na América é igual a 109 ou seja, mil milhões (mil contos). Esta diferença de convenção provoca no dia a dia as mais tremendas confusões, para não falar nos disparates que acabamos lendo ou ouvindo nos meios de comunicação social. Quem de entre vós não disse já ou ouviu que a Terra tem mais de seis biliões de habitantes? (É verdade para um americano, é falso para um europeu). Como exemplo de segundo caso temos o Euro. A nossa nova moeda tem já 5 anos mas, confessem-no, toda a gente raciocina em escudos (diria 99,999% sem risco de errar). Porque admirar-nos? O escudo substitui o real no dia 22 de Maio de 1911, pouco depois da implantação da República e, até à chegada do Euro há cinco anos, como já referimos, era frequente ouvir dizer: - Empresta aí um conto de réis; ou seja, empresta ai um milhão de réis (moeda que saiu de circulação em 1911). 3.2 Distracções – As pessoas vivem distraídas para os números. E as provas estão à vista. Quando pergunto a alguém quantos meses tinha o calendário que antecedeu o calendário Juliano (que é o antecessor do nosso calendário Gregoriano de 12 meses), costumo obter por resposta: pouca gente saberá. Significa isto que as pessoas passam a vida atrapalhadas a tentar não esquecer que os meses 9, 10, 11 e 12 são respectivamente, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro e não conseguem vislumbrar que o calendário antigo tinha 10 meses, aos quais o Augusto Júlio César juntou Júlio (Julho) e Augusto (Agosto).

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Mais paradigmático desta distracção colectiva para os números é quase ninguém ter reparado que a quase totalidade dos relógios com números romanos tem os quatro (IV) escritos de forma errada. Andaremos todos cegos para os números?

3.3 Sofismas – Diz-se que há sofisma quando alguém, de forma voluntária (deliberada), conduz o raciocínio alheio ao erro. O sofisma é a arma dos manipuladores e permite todo o tipo de armadilhas. É usado e abusado na manipulação estatística. Cega e desinteressa as pessoas dos números. Um dos exemplos que sempre dou inclui uma pequena conta, em que o maior número envolvido é 30, vejamos: - 3 amigos vão a um restaurante e a conta são 30 euros; - resolvem dividir a conta pelos 3, cabendo pagar a cada um 10 euros; - entregam o dinheiro ao empregado mas, quando este o entrega ao patrão aquele resolve fazer um desconto de 5 euros, entregando 5 moedas de euro ao empregado para que as leve de volta à mesa; - o empregado, não sabendo como dividir as 5 moedas pelos 3, entrega 1 moeda a cada um e mete 2 no seu próprio bolso. Ora: Se os amigos tinham pago cada um 10 euros e receberam 1 de troco pagaram, efectivamente, 9 euros cada um; Se 3 x 9 são 27 e o empregado tem só 2 euros no bolso, onde está o outro euro? Bom, se ainda não descobriu, terá oportunidade de o fazer mais tarde.

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3.4 Falácia – Ao contrário do sofisma, não há atitude voluntária na falácia. Na falácia quem induz em erro acredita nesse erro, tem-no como certo. É isso que se passa, associando distracção com falácia, quando alguém nos diz que os habitantes da Terra são mais de 6 biliões. Uma falácia importante foi a que levou à convenção de que uma circunferência tem 360 graus. Durante muito tempo o Homem julgou que o ano tinha 360 dias. Desenhava o Sol (uma circunferência) e ia marcando esses mesmos dias (hoje graus). A circunferência (logo do Deus Sol) ficou vinculada à contagem do tempo, até mesmo na forma original de todos os tipos de relógio. Subdivisões menores, como minutos e segundos, ainda hoje persistem, com o mesmo nome, na subdivisão dos graus. Quando o Homem descobriu os 5 dias e quase seis horas restantes considero-os uma dádiva Divina e dedicou-os ao descanso e celebrações (período actual entre o Natal e o Ano Novo). Da falácia à convenção foi apenas uma questão de tempo. 3.5 Paradoxos – Há paradoxo quando a lógica atenta contra o bom senso. Quando falarmos do Infinito referiremos o Paradoxo de Zenão. Os paradoxos, muitas vezes intuídos pelo mais comum dos mortais, são, quando mal percebidos, escolhos à numerologia. Citemos a título de exemplo o, primeiramente chamado, Paradoxo de Cantor. A humanidade viveu confortavelmente, durante milénios, com o postulado Aristotélico de que o todo é maior que as partes. É uma máxima intuitiva, que não deixa margem para dúvidas. É de bom senso. Um dia, pensando logicamente, Cantor chegou à conclusão de que o todo pode ser igual à metade. Como? Pensou nos números inteiros positivos 1, 2, 3, 4, … n e determinou que se tratava de um conjunto infinito; A seguir pensou nos números pares inteiros positivos 2, 4, 6, 8, … n e determinou que era igualmente um conjunto infinito; Obviamente e logicamente concluiu que a metade (números pares positivos) era um conjunto de igual tamanho ao do todo (números inteiros positivos). Aristóteles só pode ter dado uma volta na tumba.

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4 – Sistemas numéricos. Binário; Decimal; Hexadecimal. Podemos considerar, a fim de simplificação, que base numérica é um conjunto de símbolos (ou algarismos) com o qual podemos representar uma certa quantidade ou número. 4.1 Sistema Decimal. No dia a dia costuma-se utilizar a base dez, ou base decimal, que como o próprio nome já diz é composta por 10 algarismos diferentes: 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9. Dessa forma, uma sequência de contagem para a base decimal pode ser expressa através da seguinte sequência de números: 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Dado que o algarismo ‘9’ é o algarismo de maior valor numérico disponível nessa base, para poder representar um número maior do que 9 é necessário adicionar mais um dígito ao número original, sendo que esse dígito deve ter um peso igual ao peso do número representado até então mais um. Para o caso da base decimal, se o último número representado foi 9 então o peso do próximo dígito é 9 + 1 = 10, o que leva a: 10 11 12 13 … 97 98 99 As possibilidades esgotaram-se novamente, e todos os dígitos do número já apresentam o algarismo de maior valor numérico. Mais uma vez, deve ser adicionado um dígito extra ao número, sendo o seu peso igual a 99 + 1 = 100 e gerando então: 100 101 … A sequência se repete indefinidamente, gerando o padrão de representação dos números na base decimal. Sabendo-se que o peso de cada novo dígito à esquerda é igual ao valor do número já representado mais um, obtém-se a Tabela 1; para a base decimal deduzimos então que o peso de um dígito qualquer N, sendo N a posição do dígito da direita para a esquerda iniciando pelo dígito zero, é igual a 10N ou, de forma mais genérica, baseN. Vendo na prática, para o sistema decimal:

b9 b8 b7 b6 b5 b4 b3 b2 b1 b0

Ou seja, 109 108 107 106 105 104 103 102 101 100

Ou ainda,

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b9 b8 b7 b6 … 10.000 1.000 100 10 1

Significando isto que, por exemplo o nº 10.325, nada mais é do que:

104 103 102 101 100

1 x 104 + 0 x 103 + 3 x 102 + 2 x 101 + 5 x 100 = 10.325, verbalizando:

cinco unidades, 2 dezenas, 3 centenas, nenhum milhar e uma dezena de milhar ou, verbalizando de outra forma: dez mil, trezentos e vinte e cinco; 4.2 Sistema Binário e Hexadecimal. Tendo percebido a convenção das bases numéricas, e relembrando o que vimos acima, então, para o sistema binário b=2, usando-se os caracteres 0 e 1 (dois “glifos”):

b9 b8 b7 b6 b5 b4 b3 b2 b1 b0

29 28 27 26 25 24 23 22 21 20

512 256 128 64 32 16 8 4 2 1

Então em binário o número 111, por exemplo, representará: 1x1+1x2+1x4= 7 No sistema hexadecimal (16), b=16 precisaremos de 16 “glifos”, pelo que se convencionou usar os algarismos de 0 a 9 e ainda as letras de A a F, sendo A=10 … e … F=15. Seguindo o mesmo raciocínio teremos

… … … … … … 4.096 256 16 1

Vejamos um exemplo numérico: 3E0,A (16) = 3×162 + E×161 + 0×160 + A×16-1 = 3×256 + 14×16 + 0×1 + 10×0,0625 = 992,625 Como curiosidade referiremos que a dúzia e a grosa são palavras que derivam da primeira e segunda posição do sistema duodecimal com que durante muito tempo se tentou substituir o sistema decimal, dada a base ser um número abundante (mais que perfeito; veremos os números perfeitos no próximo capítulo) enquanto a base do sistema decimal é um número deficiente (menos que perfeito).

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5. Algumas qualidades dos números: Primos; Perfeitos; Mágicos; Número de Ouro (Divina Proporção).

Do Zero ao Infinito – Algumas “qualidades” dos números

Os algarismos arábicos foram trazidos da Índia para o Ocidente e por isto também são chamados indo-arábicos.

Os números indo-arábicos foram criados por Abu Abdullah Muhammad Ibn Musa al-Khwarizmi (778 (?) - 846 d.C.).

Al-Khwarizmi (o étimo da palavra algarismo é o último apelido deste matemático) nasceu na região central da Ásia, onde hoje está localizado o Uzbequistão. Posteriormente emigrou para Bagdade, onde trabalhou na “Casa da Sabedoria” como matemático durante a era áurea da ciência islâmica.

5.1 ZERO

Zero (0, ou valor nulo) é o número que precede o inteiro positivo um (1), e todos os números positivos, e sucessor do um negativo (-1), e todos os números negativos. Ele é definido como a cardinalidade de um conjunto vazio.

É elemento neutro na adição e absorvente na multiplicação.

História

Refere-se que a descoberta do zero somente ocorreu em três povos, pelos: babilónios, hindus e maias.

Na Europa, a definição do símbolo zero ocorreu durante a Idade Média após a aceitação dos algarismos arábicos.

A representação gráfica do zero do demorou cerca de 400 anos para ser incorporada ao sistema decimal indo-arábico de numeração.

Definir graficamente um símbolo para o zero foi de extrema importância a fim de se poder posicionar precisamente os dígitos que formam qualquer número desejado, tanto em um sistema numérico zerozerozero decimal, quanto no uso do ábaco que representava o zero como sendo uma casa vazia. Originalmente o zero, representado como uma casa vazia, foi o maior avanço no sistema de numeração decimal. Portanto, o Zero evoluiu de um vácuo para a uma casa vazia ou a um espaço em branco para enfim transformar-se em um símbolo numérico usado pelos hindus e pelos árabes antigos. No início dos anos de 1600, ocorreu uma importante modificação no formato da grafia do décimo número ou do zero, que inicialmente era pequeno e circular “o” evoluindo para o actual formato oval “0” o que possibilitou sua distinção da letra “o” minúscula ou da “O” maiúscula.

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Na literatura matemática actual, o significado do valor do zero é usado como se não houvesse nenhum valor numérico ou substancial propriamente dito, mas sim desempenhando o papel chave da notação necessária ao sistema decimal, para expressar todos os números com nove dígitos, do um ao nove e, o zero como o décimo numeral.

Como curiosidade diremos ainda, nunca subestime o valor do zero à esquerda. Ele terá no mínimo um valor informativo. Imagine que compra uma rifa para o sorteio e que lhe é atribuído um talão com o número 7. A sua informação está reduzida a saber que está habilitado com o número 7 para um determinado sorteio. Imagine agora que lhe dão o mesmo talão com o número 007 ou 0007. Na primeira hipótese você saberá que está habilitado a um sorteio com o número 7 e a probabilidade mínima de ganhar de 1/999 e no segundo caso, que a probabilidade mínima baixa para 1/9999. O zero à esquerda forneceu-lhe informação e informação é a chave do poder.

5.2 Número perfeito

Em Matemática, um número perfeito é um número inteiro cuja soma de todos os seus divisores positivos próprios (excluindo ele mesmo) é igual ao próprio número.

Por exemplo, 6 é um número perfeito, pois seus divisores positivos próprios são1, 2 e 3, e 1 + 2 + 3 = 6. O próximo número perfeito é 28 (1 + 2 + 4 + 7 + 14); daí então 496 e 8128. Esses quatro primeiros números perfeitos eram os únicos conhecidos pelos gregos antigos. O seguinte da lista é 33550336, consideravelmente maior.

Chamam-se deficientes os números cuja soma de todos os seus divisores positivos próprios (excluindo ele mesmo) é inferior ao próprio número (o caso que referimos para o 10) e abundantes quando é superior (o caso que referimos para o 12).

5.3 Número Primo

Número primo é um número natural maior do que 1 e que tem exactamente dois divisores positivos distintos: 1 e ele mesmo. Se um número natural é maior que 1 e não é primo, diz-se que ele é composto. Por convenção, os números O e 1 não são primos nem compostos.

O conceito de número primo é muito importante na teoria dos números. Um dos resultados da teoria dos números é o Teorema Fundamental da Aritmética, que afirma que qualquer número inteiro positivo pode ser

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escrito univocamente como o produto de vários números primos (chamados factores primos).

Por curiosidade, para exemplo do Teorema Fundamental da Aritmética, escreveremos o chamado número da besta: 666= 2x3x3x37

Ao processo que recebe como argumento um número e devolve os seus factores primos chama-se decomposição em factores primos (factoração). Antes do desenvolvimento do cálculo automático, a determinação dos factores primos era um processo em extremo trabalhoso, mas em finais do século XVIII já existiam, graças ao labor de alguns matemáticos, entre os quais Anton Felkel e Jurij Batolomej Vega, extensas tabelas abrangendo o intervalo desde a unidade até alguns milhões. O maior número primo conhecido possui mais de 7000 dígitos!

Colocando os números primos por ordem crescente temos que os primeiros elementos são:

2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29, 31, 37, 41, 43, 47, 53, 59, 61, 67, 71, 73, 79, 83, 89, 97...

Exemplos de decomposições:

• 4 = 2 × 2 • 6 = 2 × 3 • 8 = 2 × 2 × 2 • 9 = 3 × 3 • 10 = 2 × 5

Maior número primo

Actualmente o maior número primo encontrado é 2 − 130.402.457 descoberto pelos doutores Curtis Cooper e Steven Boone no dia 15 de Dezembro de 2005, num projecto de computação distribuida pela Internet, que usa o tempo ocioso do processador de computadores pessoais, procurando por números primos específicos, do tipo 2 − 1p , chamados primos de Mersenne. Este último primo encontrado é o primo de Mersenne de número 43 e tem 9.152.052 dígitos.

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5.4 Números Mágicos

O MÁGICO 7 (SETE) Sabem, os que me conhecem, que sou um cidadão do mundo de alma lusitana. Viajante sôfrego, tenho corrido as sete partidas do mundo, sobrevoando ou navegando os sete mares e apreciado as sete artes. Como homem dos sete ofícios e sem fazer disso um bicho-de-sete-cabeças, vou revelar-lhes um segredo guardado a sete chaves: -a magia do número sete, que se me revelou há muito, numa das muitas cidades de sete colinas do nosso planeta. Sim, o 7 é um número mágico. Fabulosamente mágico. Deve a sua forma como carácter (7) ao número de ângulos que a sua primitiva forma possuía. Este mágico 7, número inteiro, real, primo, tem ainda a particularidade curiosa de que o resultado da divisão de qualquer inteiro não múltiplo de 7, por 7 é sempre a sequência 142857 periódica. Encalhei com a magia do sete na infância, ouvindo cantar as meninas (sete e sete são 14, com mais sete 21, tenho sete namorados e não gosto de nenhum), depois foi a leitura da Branca de Neve (e seus sete companheiros) ou a história do Gato das Botas que tão facilmente palmilhavam sete léguas. Já na adolescência, o conhecimento dos povo judeu e sua diáspora, o seu candelabro de sete braços (imagem em baixo) e a sua cabala repleta de setes (e o ano sabático, no fim de cada período de sete anos (como ainda hoje fazem os lentes universitários) ou o ano de jubileu a cada sete anos sabáticos (pois é, o ano de jubileu era ao fim de cada período de sete x sete anos (49 anos, que o sistema decimal arredondou para 50). Porque será o sete tão mágico desde os mais remotos tempos? Eu tenho uma teoria possível. A do “Homo Sapiens Sapiens “Atento””. O homem primitivo, curioso, temeroso, olhou os céus perscrutando os deuses e a razão da sua existência. Viu e ouviu nos céus. Querendo medir essa subjectividade a que chamamos tempo, chamou nomes aos dias, atribuindo-lhes os nomes das divindades visíveis a olho nu. Sete são os “astros” que via com os seus olhos: Sol, Lua, Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno. Sete foram os dias de semana que criou. Reservou o dia alto da semana para o “Deus Maior” SOL (ainda hoje Sun+day em inglês) e aos outros, como melhor se vê na língua espanhola ou francesa, atribuiu os nomes restantes (Espanhol: Lunes – segunda – lua; Martes – terça – Marte; Miercoles – quarta – Mercúrio; Jueves – quinta – Júpiter; Viernes – quinta – Vénus; e, agora voltando ao inglês, Satur+day – sábado – Saturno. Fácil perceber esta magia, do convívio a “olho nu” com estes “Deuses” que se deixavam ver.

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Mais via esse primitivo homem olhando os céus. Nos dias de chuva redentora, benfeitora das colheitas devidas a Hera, a primeira dama do Olimpo enviava à terra a sua mensageira Íris (mensageira predilecta de Hera, conforme refere Homero na Ilíada). Esta descida era feita num arco de sete cores (cores fortes do espectro). Mas este “curioso” homem via e ouvia o seu “Universo”. De ouvido atento, escutou o pulsar harmonioso dos céus e “percebeu” as sete distintas notas da sua musicalidade. Terá concluído esse pragmático ser, que emergia na inteligência, que não pode haver tanta coincidência. O sete é mágico, um segredo dos Deuses. Explicada esta minha modesta teoria, resta desejar-vos tantas vidas quantas as dum gato (sete), que não partam nenhum espelho (sete anos de azar) que se abstenham dos sete pecados capitais (gula, soberba, luxúria, inveja, avareza, preguiça e ira), que aproveitem os períodos de vacas gordas (sete anos), que vos seja permitido conhecer as sete maravilhas do mundo, para que a vida vos seja tão colorida quanto um arco-íris, com as suas sete cores, e se vos afaste o temor do “Sétimo Selo” (Apocalipse - "Quando o Cordeiro abriu o sétimo selo, houve silêncio no céu cerca de meia hora. Então vi os sete anjos que se acham em pé diante de Deus, e lhes foram dadas sete trombetas.").

Menorah

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5.5 Número de Ouro (Divina Proporção). Imagine um número, cujo quadrado é igual a si mesmo acrescido de uma unidade.

φ 2= φ + 1 Sem saber, está imaginando o número de ouro: 1,618033 Se dois segmentos de recta (figura abaixo) medirem, por exemplo o valor do quadrado achado a partir do número de ouro, ou seja: 2.618033 ou qualquer outra medida na mesma proporção, então:

a/b = a+b/a = 1,618033

Na matemática, os Números de Fibonacci são uma sucessão definida como recursiva pela fórmula abaixo:

Na prática: você começa com 0 e 1, e então produz o próximo número de Fibonacci somando os dois anteriores para formar o próximo. Os primeiros Números de Fibonacci para n = 0, 1,... são

0, 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, 144, 233, 377, 610, 987, 1597, 2584, 4181, 6765, 10946...

Uma grade preenchida com quadrados cujos lados são números de Fibonacci, formando sucessivamente rectângulos cada vez maiores e tendentes à razão áurea (1,618033).

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A Proporção áurea ou Número de Ouro ou número áureo é uma constante transcendente assim chamada por ser um número da categoria transcendente. Número tal, que há muito tempo é empregado na arte. Também é chamada de: razão áurea, razão de ouro, divina proporção, proporção em extrema razão, divisão de extrema razão.

Muito frequente é a sua utilização em pinturas renascentistas. Este número está envolvido com a natureza do crescimento. Phi (não confundir com o número Pi, quociente da divisão do comprimento de uma circunferência pela medida do seu respectivo diâmetro), como é chamado o número de ouro, pode ser encontrado na proporção em conchas (o nautilus, em exemplo), seres humanos (o tamanho das falanges, ossos dos dedos, por exemplo) e em inúmeros outros exemplos que envolvem a ordem do crescimento.

Concha do Nautilus

Justamente por estar envolvida no crescimento, este número se torna tão frequente. E justamente por haver esta frequência, o número de ouro ganhou um status de "quase mágico", sendo alvo de pesquisadores, artistas e escritores. Apesar deste status, o número de ouro é apenas o que é devido a natureza em que está: está envolvido em crescimentos biológicos, por exemplo.

Como é um número extraído da sucessão de Fibonacci, representa directamente uma constante de crescimento.

O número áureo é retirado da proporção desta sucessão numérica e, como outras constantes, pode ser aplicada. E o foi em obras como O Nascimento de Vénus, quadro de Botticelli, em que Afrodite está na proporção áurea. Esta proporção estaria ali aplicada pelo motivo do autor representar a perfeição da beleza.

Na história da arte renascentista a perfeição da beleza em quadros foi bastante explorada em base desta constante.

Mas este número, assim como outros, como por exemplo o PI, estão presentes no mundo por uma razão matemática existente na natureza.

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Phi, tem este nome em homenagem ao arquitecto grego Phídias (o seu nome começa com a letra grega phi (leia-se fi) ), construtor do Parthenon e que utilizou o número de ouro em muitas de suas obras. Algumas correntes místicas acreditam que objectos cujas dimensões sejam relacionadas a Phi, harmonizam-se com a glândula pineal, o que provocaria ou estimularia uma sensação de beleza e harmonia no ser humano.

Proporção áurea em rectângulos

Proporções áureas em uma mão

O homem sempre tentou alcançar a perfeição seja nas pinturas, nos projectos arquitectónicos ou até nas músicas. A partir daí os gregos criaram o rectângulo dourado. Trata-se do rectângulo no qual a proporção entre o comprimento e a largura é aproximadamente o número Phi, ou seja, 1,618. O Parthenon (arquitecto Phídias) e muitos outros edifícios foram construídos nessa proporção.

O Homem de Vitrúvio, de Leonardo da Vinci. As ideias de proporção e simetria aplicadas à concepção da beleza humana

Os Egípcios fizeram o mesmo com as pirâmides. Por exemplo, cada bloco da pirâmide era 1,618 vezes maior que o bloco do nível a cima. As câmaras no interior das pirâmides também seguiam essa proporção, de forma que os comprimentos das salas são 1,618 vezes maior que as larguras.

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Actualmente essa proporção ainda é muito usada. Ao padronizar internacionalmente algumas medidas usadas em nosso dia a dia, os projectistas procuraram "respeitar" a proporção divina. Por exemplo, meça o comprimento de seu cartão de crédito e divida pela sua largura. Você irá encontrar um número próximo de 1,618. É claro que existirão erros devido às milimétricas variações entre os diferentes fabricantes e a imprecisão da medida de um régua convencional.

Mas por que esse número é tão apreciado por artistas, arquitectos, projectistas e músicos? Porque a proporção áurea, como o nome sugere, está presente na natureza, no corpo humano e no universo. A proporção entre abelhas fêmeas e machos em qualquer colmeia é 1,618. A proporção com que o raio do interior da concha de um caramujo cresce é de 1,618. A proporção entre a medida do seu ombro à ponta do seu dedo e a medida do seu cotovelo à ponta do seu dedo também é de 1,618. Bem como a medida do seu quadril ao chão em relação à medida do seu joelho ao chão. Essas proporções anatómicas foram bem representadas pelo "Homem Vitruviano", obra de Leonardo Da Vinci.

ORGANIZAÇÃO

ORGANON

HARMONIA

Terminamos comentando as imagens acima, que nos levam do infinitamente pequeno ao infinitamente grande. Do lado esquerdo uma molécula de ácido desoxirribonucleico, vulgarmente conhecida pelo seu acrónimo ADN, onde a sua estrutura de pentágonos sobrepostos nos revela a proporção de ouro entre cada lado dos pentágonos e as suas diagonais. Do lado direito uma galáxia, distribuindo as suas estrelas em espiral angular, adivinhe-se, segundo a razão (ou proporção) de ouro. Somos forçados a aceitar que, se a natureza tem alguma forma de organização (étimo em organon, que em grego significa harmonia) ou seja, de harmonia, ela é ditada pelo número de ouro.

Expansão decimal

O valor da proporção áurea pode ser descoberto facilmente numa calculadora pela expressão:

= ou

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5.6 O INFINITO

Infinito Potencial

Infinito Potencial é usado para processos que podem, em princípio, continuar para sempre, ou para objectos que podem, em princípio, crescer para sempre.

A sucessão abaixo é potencialmente infinita: é possível estendê-la indefinidamente.

O conceito de infinito potencial é geralmente aceite e não apresenta controvérsias.

Infinito Real

Infinito Real (ou Infinito Completo) é um assunto mais complexo: será possível existir uma entidade completa e existente de tamanho infinito?

Na Matemática

Em matemática, conjuntos infinitos foram primeiramente considerados por Georg Cantor, por volta de 1873. Cantor observou que conjuntos infinitos podem ter tamanhos diferentes, distinguindo entre conjuntos infinitos contáveis e incontáveis, e desenvolveu sua teoria de números cardinais baseada nesta observação. A matemática moderna aceita o infinito real.

Certos sistemas numéricos estendidos, tais como os números surreais, incorporam os números (finitos) ordinais e os números infinitos de diferentes tamanhos.

No Universo

"Será que o infinito real existe no universo físico? Existem infinitas estrelas? O universo tem volume infinito? O espaço cresce para sempre?"

A questão de algo ser infinito é logicamente separada da de não ter fronteiras. Por exemplo, a superfície bidimensional da Terra é finita, embora não tenha fronteiras. Se algo se locomover em uma linha recta paralela ao solo, vai retornar ao ponto exacto da partida. O universo, pelo menos a princípio,

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poderia operar de forma similar: se um corpo se locomover sempre na mesma direcção e por tempo suficiente, talvez passe exactamente pelo ponto de onde saiu.

"O conceito matemático de infinito tem alguma relação com o conceito religioso de Deus?"

Esta questão foi feita tanto por Cantor, com o seu conceito de infinito absoluto, no qual ele iguala infinito e Deus, como também por Kurt Gödel com sua "prova ontológica" da existência de uma entidade, que Gödel relacionou com Deus.

Representação Matemática

O infinito é representado matematicamente pelo símbolo .

Quando o símbolo é precedido por um sinal de mais ( ), representa um número positivo infinito. Quando é precedido por um sinal de menos ( ), representa um número infinito negativo.

Considerações Místicas

Há quem considere que o Homem temeu sempre a indeterminação matemática (valor n) e o infinito (representado pelo 8 deitado) a tal ponto, que a palavra noite (temida pelos povos primitivos como símbolo das trevas, que a todos os aspectos negativos associavam a negritude: a fome é negra, a morte também.) derivaria em quase todas as línguas, da conjugação de n com oito:

Português – noite (n+oito); Espanhol – noche (n+ocho); Francês – nuit (n+huit); Inglês – night (n+eight) e por ai adiante.

Paradoxo de Zenão – O paradoxo em questão, resumido em baixo como argumento da dicotomia, poderia levar à conclusão que o infinito não existe

Argumento da dicotomia – Imagine um móvel que está no ponto A e quer atingir o ponto B. Este movimento é impossível, pois antes de atingir o ponto B, o móvel tem que atingir o meio do caminho entre A e B, isto é, um ponto C. Mas para atingir C, terá que primeiro atingir o meio do caminho entre A e C, isto é, um ponto D. E assim, até ao infinito.

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6 – Tuteando os números – O cálculo mental. Conforme já dissemos acima: A dactilonomia, ou cálculo digital (dactylo = dedo, do Grego; digitu = dedo, do latim) foi historicamente a primeira resposta do Homem às exigências de contagem impostas pela vida social de relação. O cálculo mental foi um concorrente eficaz do ábaco e de todas as formas mecânicas de calcular. Atrevemo-nos a dizer que o cálculo mental será sempre, nas suas formas menos sofisticadas, um concorrente de todas as formas de calcular. O cálculo mental implica prática e simplificação. Quem o quiser dominar não deve perder oportunidades de o praticar. Uma das coisas que pessoalmente gosto de fazer é pensar que as quatro operações aritméticas se reduzem a uma, a adição. Vejamos: Na adição temos por exemplo que 3 (1+1+1) + 2 (1+1) = 5; Na subtracção, operação inversa (em vez de pôr, tira-se), teríamos, utilizando os mesmos valores, 3 (1+1+1) + (-2 (-1-1)) = 1 ou seja, continua-se a adicionar, só que agora um valor negativo. Na multiplicação, utilizando por exemplo a notação 3 x 5 = 15, estaríamos apenas simplificado a conta 3 + 3 + 3 + 3 + 3 = 15, ou seja, continuamos a adicionar, só que, sendo uma soma de muitas parcelas, fizemos uma notação simplificada, 3 x 5 (para evitar repetir o 3). A divisão é apenas a operação reversa da multiplicação (adição com notação simplificada) ou seja, por exemplo 15 / 3 significa quantas vezes o 3 está contido no 15, o que é igual a 5 vezes. A questão é só, pois, quantas vezes o dividendo contém o divisor. Postas as coisas nestes termos, vamos dar dois exemplos do processo de cálculo mental, para que possam depois praticar. Exemplo I Quantos são 12 x 19? O resultado, 228 deve sair de forma quase instantânea. Como? Ninguém multiplica mentalmente 12 por 19, no cálculo mental tudo é simplificado, arredondado e feito por etapas com recurso à memória de trabalho (curto prazo). A conta mental será feita por exemplo de duas formas:

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(10 x 19 = 190) + (2 x 19 = 38) = 228 ou, mais facilmente ainda: 12 x 20 = 240 (como se arredondou por excesso, acrescentou-se 1, terá que se subtrair a valor que esse excesso provocou no resultado = 12), menos o excesso de 12 = 228 Exemplo II Contas do tipo x2 - y2

Exemplo 122 - 82 = 80, também é um resultado que deve sair quase instantaneamente. Como? Ou sabendo que x2 - y2 = (x+y) x (x-y) que transforma a conta num simples 20 x 4 = 80, ou Sabendo que o quadrado de 12 é uma grosa (144) e subtraindo o quadrado de 8 (64) que faz parte da tabuada clássica, chegando novamente a 80, ou Fazendo como explicámos: (10 x 12 = 120) + (2 x 12 = 24) = 144, menos 8x8 = 64 => 80 (Costumo dizer que quem tem dificuldade no 8 x 8, poderá pensar sempre num 10 x 8 = 80, menos o excesso considerado (2 x 8 = 16) => 64). Mas como disse acima, essencial é praticar.

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7 – Conclusão. Julgamos ter podido contribuir para os vossos primeiros passos na luta contra a Inumerologia. Desmistificando alguns aspectos e chamando a atenção para as principais barreiras com que, afinal, todos nos defrontamos no mundo dos números. Quisemos também deixar algumas noções fundamentais, abrindo caminho para um maior interesse, e uma maior compreensão, desse mesmo mundo. Esperamos sinceramente que depois desta formação venham a adquirir um maior gosto pelas matemáticas, tendo presente o conselho de Bento Fernandes: “para alcançar as outras ciências, é preciso ter conta, peso e medida.” Temos por experiência que a melhor aprendizagem advêm do reconhecimento dos nossos erros. É possível até que, o saber, seja a mera memória desses erros. Este é um campo por excelência para se avançar de peito aberto, sem temor, munidos da máxima de outro grande mestre da área, Bento de Jesus Caraça, que sempre dizia; “Não temo o erro, porque estou sempre pronto a corrigi-lo.” Deixo-vos com um texto de apoio cuja leitura recomendo “A Apologia de um Matemático”. Que a sua leitura vos seja tão agradável quanto o foi para mim. 8 – Referências Bibliográficas. Luís Pedro G. Novo Fornelos (2003) As Quatro Operações Aritméticas Básicas; Bento Fernandes Tratado da Arte de Arismética (1555); Almeida, A. A. Marques de (1992) Aritmética Como Descrição do Real (1519 – 1679). Lisboa. Imprensa Nacional da Casa da Moeda. Volume I e II; Almeida, A. A. Marques de (1998) A Matemática no Tempo dos Descobrimentos. Lisboa. Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses; Wilkipédia – Enciclopédia Livre On-Line; G.H. Hardy The World of Mathematics - A Apologia de um Matemático.

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9 – Anexo – Texto de Apoio – A Apologia de um Matemático – G.H. Hardy The World of Mathematics;

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Um matemático, tal como um pintor ou um poeta, é um criador de padrões. Se os padrões do matemático são mais permanentes do que os daqueles, é porque são formados por ideias. Um pintor cria padrões com formas e cores, um poeta com palavras. Uma pintura pode dar corpo a uma "ideia", mas essa ideia é frequentemente um lugar comum e sem importância. Em poesia, as ideias são bem mais importantes. Porém, como Housman insistiu, a importância das ideias em poesia é habitualmente exagerada: "Não me consigo convencer de que possam existir ideias poéticas... A poesia não é aquilo que é dito mas uma forma de dizer". Not all the water in the rough rude sea Can wash the balm of an anointed king Poderiam estes versos ser melhores? E, simultaneamente, poderiam estas ideias ser mais triviais e mais falsas? A pobreza das ideias dificilmente parece afectar a beleza do padrão verbal. Por seu lado, o matemático não tem outro material com que trabalhar a não ser ideias e, portanto, é provável que os seus padrões sejam mais permanentes, uma vez que as ideias se desgastam menos do que as palavras com o tempo. Os padrões dos matemáticos, tal como os dos pintores ou os dos poetas, devem ser belos. As ideias, como as cores ou as palavras, devem encaixar de um modo harmonioso. A beleza é o primeiro teste: não existe lugar permanente no mundo para matemática feia. E aqui vejo-me obrigado a encarar uma incompreensão ainda muito disseminada (embora, provavelmente, muito menos agora do que há vinte anos atrás), aquilo que Whitehead designou por "superstição literária", ou seja que o amor e a apreciação estética da matemática constituem "uma monomania confinada, em cada geração, a um pequeno número de excêntricos". É difícil encontrar hoje, um homem instruído absolutamente insensível ao apelo estético da matemática. Pode ser muito difícil definir a beleza matemática mas isso acontece com qualquer tipo de beleza. Não sabemos exactamente o que é um belo poema, o que não nos impede de reconhecer um quando o lemos. Até o Professor Hogben, que pretende minimizar a todo o custo a importância do elemento estético em matemática, não se arrisca a negar essa realidade. "Existem, certamente, indivíduos para os quais a matemática exerce uma atracção friamente impessoal... O apelo estético da matemática pode ser muito real para alguns eleitos". Mas são apenas "alguns", afirma ele, alguns que sentem "friamente" (na verdade, pessoas bastante ridículas, que vivem em tolas cidadezinhas universitárias, abrigadas da brisa fresca dos espaços amplos e abertos). Com este comentário, Hogben está meramente a fazer-se eco da "superstição literária" de Whitehead. A verdade é que não há muitos assuntos mais "populares" do que a matemática. A maioria das pessoas aprecia de algum modo a matemática, do

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mesmo modo que aprecia uma melodia agradável e, muito provavelmente, haverá mais pessoas realmente interessadas em matemática do que em música. A aparência pode sugerir o contrário. No entanto, há explicações fáceis para esse facto. A música pode ser utilizada para estimular emoções das massas enquanto que a matemática não. A incapacidade musical é reconhecida (sem dúvida, correctamente) como algo levemente negativo, ao passo que a maior parte das pessoas tem um pavor tão grande da palavra matemática que não se importa de, sem qualquer afectação, exagerar a sua própria "estupidez" matemática. Uma pequena reflexão é suficiente para expor o absurdo da "superstição literária". Há grandes quantidades de jogadores de xadrez em todos os países civilizados. Na Rússia, quase toda a população educada e cada um dos jogadores de xadrez pode reconhecer e apreciar um "belo" jogo ou problema. Contudo, um problema de xadrez é simplesmente um exercício em matemática pura (não me refiro ao jogo, que não o é inteiramente, uma vez que a psicologia também desempenha nele um papel) e todo aquele que classifica um problema como "belo" está a aplaudir a "beleza" matemática, mesmo que seja uma beleza comparativamente baixa. Os problemas de xadrez são odes à matemática. Podemos aprender a mesma lição, a nível mais elementar mas para um público mais alargado, a partir do bridge ou, se descermos ainda um pouco mais, a partir de quebra-cabeças das colunas dos jornais populares. Quase toda a sua imensa popularidade é um tributo ao poder de representação da matemática rudimentar e os melhores criadores de quebra-cabeças, como Dudeney ou ‘Caliban’, usam pouco mais que isso. Sabem o que estão a fazer: o que o público quer é um pequenino "toque" intelectual e nada há que tenha o poder da matemática. Posso acrescentar que não há nada no mundo que satisfaça tanto até homens famosos (e homens que usaram linguagem depreciativa acerca da matemática) como descobrir, ou redescobrir, um teorema matemático genuíno. Herbert Spencer republicou, na sua autobiografia, um teorema sobre círculos que ele demonstrou quando tinha vinte anos (desconhecendo que havia sido demonstrado, dois mil anos antes, por Platão). O Professor Sody é um exemplo mais recente e mais notável (mas o seu teorema é realmente seu). Um problema de xadrez é matemática genuína mas, de certo modo, é matemática "trivial". Por muito engenhosas e complexas, por muito originais e surpreendentes que as jogadas sejam, falta qualquer coisa de essencial. Os problemas de xadrez não são importantes. A boa matemática é tão séria quanto bela - se preferirem, "importante" palavra esta que é muito ambígua ao passo que "séria" exprime muito melhor o que pretendo transmitir. Não estou a pensar nas consequências "práticas" da matemática, ponto a que, adiante, terei de voltar. Por agora, direi apenas que, se um problema de xadrez é, por assim dizer, "inútil", o mesmo se passa com a maior parte da melhor matemática. Muito pouca matemática é útil na prática e essa é relativamente enfadonha. A "seriedade" de um teorema matemático reside, não nas suas consequências práticas, que são geralmente desprezíveis, mas no significado das ideias matemáticas que ele conjuga. Podemos mesmo dizer que uma ideia matemática é "significante" se puder ser conjugada de modo natural e iluminador, com um grande conjunto de outras ideias matemáticas. Por conseguinte, que um teorema matemático sério, um teorema que conjuga ideias significativas é aquele que conduz a avanços importantes na matemática e até nas outras ciências. Nenhum

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problema de xadrez afectou, alguma vez, o desenvolvimento geral do pensamento científico. Pitágoras, Newton, Einstein produziram, no seu tempo, uma mudança completa dessa direcção. A seriedade de um teorema não reside, pois, nas suas consequências. Elas são simplesmente a prova da sua seriedade. Shakespeare teve uma influência enorme no desenvolvimento da língua Inglesa, Otway quase não teve nenhuma. Mas não é por isso que Shakespeare foi melhor poeta. Ele foi melhor poeta porque escreveu muito melhor poesia. A inferioridade do problema de xadrez, como o da poesia de Otway, reside, não nas suas consequências, mas no seu conteúdo. Há um outro ponto que tenciono abandonar rapidamente, não porque seja desinteressante, mas porque é difícil e porque eu não tenho qualificações suficientes para entrar numa discussão séria sobre estética. A beleza de um teorema matemático depende, em grande parte, da sua seriedade, assim, em poesia a beleza de um verso pode depender, até um certo ponto, do significado das ideias que contém. Citei dois versos de Shakespeare como exemplo da beleza absoluta de um padrão verbal; porém After life’s fitful fever he sleeps well parece ainda mais belo. O padrão é igualmente belo e, neste caso, as ideias têm significado e a tese é sólida, razão pela qual as nossas emoções são abaladas muito mais profundamente. Quer dizer que as ideias são muito importantes para o padrão até mesmo em poesia e, naturalmente, muito mais, em matemática. Mas não posso tentar discutir seriamente esta questão. Já está claro, porventura, que só poderemos ter alguma hipótese de produzir progresso, se apresentarmos exemplos de "verdadeiros" teoremas matemáticos, teoremas esses que todos os matemáticos admitam como sendo de primeira qualidade. E, aqui, estou francamente condicionado pelas restrições sob as quais escrevo. Por um lado, os meus exemplos devem ser simples e inteligíveis para um leitor que não possua conhecimento matemático especializado. Não devem ser necessárias explicações preliminares elaboradas. O leitor deverá ser capaz de acompanhar, tanto as demonstrações, como os enunciados. Estas condições excluem, por exemplo, muitos dos teoremas mais belos da teoria dos números, tais como o último teorema de Fermat ou a lei da reciprocidade quadrática. Por outro lado, os meus exemplos deveriam ser retirados da matemática "pura", da matemática dos matemáticos profissionais, condição que exclui muita coisa que, comparativamente, seria facilmente inteligível mas que, abusivamente, entra no campo da lógica e da filosofia matemática. Por essa razão, dificilmente poderei fazer melhor do que regressar aos Gregos. Enunciarei e demonstrarei dois dos famosos teoremas da matemática Grega. São teoremas "simples", tanto na ideia como na execução, sem que, de modo algum, haja qualquer dúvida sobre o facto de serem teoremas da mais alta categoria. Cada um deles é tão actual e cheio de significado como quando foi descoberto. Dois mil anos não imprimiram uma única ruga em nenhum deles. Finalmente, ambos os enunciados e demonstrações podem ser dominados numa hora por um leitor inteligente, por mais reduzido que seja o seu equipamento matemático.

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1. O primeiro exemplo é a demonstração de Euclides da existência de uma infinidade de números primos. Os números primos são os números (A) 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29, ... que não podem ser decompostos em factores menores. Por conseguinte, 37 e 317 são números primos. Os números primos são o material a partir do qual todos os números são construídos por multiplicação: assim 666 = 2×3×3×37. Todo o número que não é primo é divisível pelo menos por um número primo (geralmente, é claro, por vários). Queremos demonstrar que existe um número infinito de números primos, ou seja, que a sucessão (A) nunca chega ao fim. Suponhamos que a sequência tem fim, e que 2, 3, 5, 7, ... , P é a sucessão completa (de tal modo que P seja o maior número primo) e, sob esta hipótese, consideremos o número primo Q definido pela fórmula Q = (2×3×5× ... ×P) + 1. É evidente que Q não é divisível por nenhum dos números 2, 3, 5, ..., P; uma vez que se obtém resto 1 quando é dividido por qualquer um desses números. Mas, se não é ele próprio um número primo, é divisível por algum número primo e, portanto, existe um número primo (que pode ser o próprio Q) maior que qualquer um deles. O que contradiz a nossa hipótese, de que não existe nenhum número primo maior que P, hipótese esta que, portanto, é falsa. A demonstração é feita por reductio ad absurdum, e esse reductio ad absurdum, que Euclides tanto apreciava, é, de facto, uma das melhores armas da matemática. É uma jogada, de longe, muito melhor, do que qualquer jogada de xadrez. Um jogador de xadrez pode sacrificar um peão ou até uma peça de maior valor, mas um matemático arrisca o próprio jogo. 2. O meu segundo exemplo é a demonstração de Pitágoras da "irracionalidade" de √2. Um "número racional" é uma fracção a/b, em que a e b são números inteiros. Podemos supor que a e b não têm factores comuns, visto que, se tivessem, poderíamos removê-los. Dizer que "√2 é irracional" é simplesmente outro modo de dizer que 2 não pode ser representado na forma (a/b)². E isto é o mesmo que dizer que a equação (B) a² = 2b² não pode ser satisfeita por valores inteiros de a e b que não tenham factores comuns. Trata-se aqui de um teorema de aritmética pura, que não exige qualquer conhecimento de "números irracionais" nem depende de nenhuma teoria acerca da sua natureza. Argumentemos novamente por reductio ad absurdum. Suponhamos que (B) é verdadeira, sendo a e b números inteiros sem factores comuns. Segue-se de (B) que a² é par (dado que 2b² é divisível por 2) e, portanto, que a é par (pois o quadrado de um número impar é impar). Se a é par, então a = 2c para algum valor inteiro de c e, portanto, (C) 2b² = a² = (2c)² = 4c² ou (D) b² = 2c². Logo, b² é par e, como tal, (pela mesma razão que anteriormente) b é par. Isto significa que a e b são ambos pares e, assim, têm o factor comum 2. O que contradiz a nossa hipótese e, portanto, prova que essa hipótese é falsa.

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Do Teorema de Pitágoras segue-se que a diagonal de um quadrado é incomensurável com o lado (que a sua razão não é um número racional, que não existe uma unidade da qual ambos sejam múltiplos inteiros). Pois, se tomarmos o lado como a nossa unidade de comprimento e o comprimento da diagonal for d, então, por um teorema muito familiar também atribuído a Pitágoras, d² = 1² + 1² = 2², pelo que d não pode ser um número racional. Poderia citar vários belos teoremas da teoria de números cujo significado qualquer pessoa pode compreender. Por exemplo, há um que é designado por "teorema fundamental da aritmética", segundo o qual qualquer inteiro pode ser representado de uma única forma como produto de números primos. Assim 666 = 2×3×3×37, e não existe outra decomposição possível. É impossível que 666 = 2?11?29 ou que 13×89 = 17×73 (e podemos verificar que assim é sem calcularmos os resultados dos produtos). Este teorema é, tal como o seu nome sugere, a base da aritmética superior. Mas a sua demonstração, embora não seja “difícil”, requer alguma informação prévia razão pela qual pode ser considerada enfadonha por um leitor que não seja matemático. Outro belo e famoso teorema é o último teorema de Fermat. Os números primos podem (se ignorarmos o primo especial 2) ser dispostos em duas categorias: os primos 5, 13, 17, 29, 37, 41, ... que têm resto 1 quando divididos por 4, e os primos 3, 7, 11, 19, 23, 31, ... que têm resto 3. Todos os primos da primeira categoria, e nenhum da segunda, podem ser representados como a soma de dois quadrados inteiros, assim: 5 = 1² + 2², 13 = 2² + 3² 17 = 1² + 4², 29 = 2² + 5²; mas 3, 7, 11 e 19 não se podem representar deste modo (como o leitor pode verificar por tentativa). Este é o teorema de Fermat que está, muito justamente, classificado como um dos melhores da aritmética. Infelizmente, não existe uma demonstração compreensível por todos, senão pelos peritos em matemática. Também há belos teoremas na "teoria dos conjuntos" (Mengenlehre), tal como a hipótese do contínuo de Cantor. Aqui existe precisamente a dificuldade oposta. A demonstração é bastante acessível, desde que a linguagem seja dominada, mas são necessárias algumas explicações antes de se tornar claro o significado do teorema. Assim sendo, não vou tentar dar mais exemplos. Aqueles que já dei são test-cases e um leitor que não os consiga apreciar provavelmente não apreciará nada em matemática. Afirmei que um matemático era um criador de padrões de ideias e que a beleza e a seriedade eram os critérios pelos quais os seus padrões deveriam ser avaliados. Dificilmente posso acreditar que alguém que compreenda os dois teoremas referidos tenha dúvidas acerca de ambos terem passado estes testes. Se os compararmos com os quebra-cabeças mais engenhosos de Dudeney, ou com os melhores problemas de xadrez criados pelos mestres dessa arte, a sua superioridade destaca-se em ambos os aspectos: existe uma inequívoca diferença de nível. Os teoremas são muito mais sérios e também muito mais belos. Poderemos definir, um pouco mais cuidadosamente, onde reside essa superioridade?

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Em primeiro lugar, a superioridade dos teoremas matemáticos no que se refere à seriedade é óbvia e arrebatadora. Um problema de xadrez é o produto de um complexo de ideias engenhoso mas muito limitado, que não se diferenciam entre si fundamentalmente e que não têm repercussões externas. Pensaríamos da mesma maneira, mesmo que o xadrez nunca tivesse sido inventado, enquanto que os teoremas de Euclides e Pitágoras influenciaram profundamente o pensamento, mesmo fora da matemática. Logo, o teorema de Euclides é vital para a toda a estrutura da aritmética. Os números primos são a matéria-prima a partir da qual temos de construir a aritmética e o teorema de Euclides assegura-nos que temos material suficiente para essa tarefa. Mas o teorema de Pitágoras tem aplicações mais vastas e fornece um melhor exemplo. Primeiramente, deveríamos observar que o argumento de Pitágoras é capaz de um longo alcance tremendo e que pode ser aplicado, com pequena alterações de princípio, a classes muito extensas de "irracionais". Podemos demonstrar, de modo análogo, (como Theaetetus parece ter feito) que √3, √5, √7, √11, √13, √17 são números irracionais, ou (indo além de Theaetetus) que ³√2 e ³√17 são irracionais . O teorema de Euclides assegura que temos uma boa "provisão" de material para a construção de uma aritmética coerente dos inteiros. O teorema de Pitágoras e as suas extensões asseguram que, quando tivermos construído essa aritmética, ela não constituirá prova suficiente para o que necessitamos, uma vez que existirão muitas grandezas que irão obstruir a nossa atenção e que serão impossíveis de calcular: a diagonal do quadrado é apenas o exemplo mais óbvio. A extrema importância desta descoberta foi imediatamente reconhecida pelos matemáticos gregos. Começaram por admitir (em conformidade, suponho, com o que é naturalmente "ditado" pelo senso comum) que todas as grandezas do mesmo tipo são comensuráveis, que dois comprimentos quaisquer, por exemplo, são múltiplos de alguma unidade comum, e construíram uma teoria das proporções baseada nesta suposição. A descoberta de Pitágoras tornou visível a falta de solidez deste fundamento e conduziu à construção da teoria, muito mais profunda, de Eudóxio que é apresentada no quinto livro de Os Elementos e que é considerada por muitos matemáticos modernos como o maior feito da matemática grega. Esta teoria é surpreendentemente moderna em espírito, podendo ser encarada como o início da teoria moderna dos números irracionais, que tem revolucionado a análise matemática e tido uma grande influência na filosofia recente. Não existe, pois, dúvida acerca da "seriedade" de qualquer um dos dois teoremas. Neste sentido, é do maior interesse observar que nenhum destes teoremas tem a mais pequena importância "prática". Em aplicações práticas apenas interessam números relativamente pequenos. Só a astronomia estrelar e a física atómica lidam com números "grandes" e, até agora, esses teoremas têm pouco mais importância prática do que a mais abstracta matemática pura. Desconheço qual seja o mais alto grau de exactidão necessário a um engenheiro mas creio que já seremos generosos se considerarmos dez algarismos significativos.

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Então: 3.141592654 (o valor de л com nove casas decimais) é a razão: 3141592654 1000000000 de dois números de dez dígitos. O número de primos inferiores a 1,000,000,000 é 50,847,478, o que é suficiente para um engenheiro que pode ser perfeitamente feliz sem o restante. E isto no que respeita ao teorema de Euclides. No que respeita ao teorema de Pitágoras, é óbvio que os números irracionais são desinteressantes para um engenheiro, uma vez que este está interessado apenas em aproximações e todas as aproximações são números racionais. O contraste entre a matemática pura e aplicada é talvez mais claramente visível em geometria. Há a ciência da geometria pura, na qual há várias geometrias: geometria projectiva, geometria euclidiana, geometria não euclidiana, e assim por diante. Cada uma destas geometrias é um modelo, um padrão de ideias, e deve ser avaliado pelo interesse e beleza do seu padrão específico. É um mapa ou uma ilustração, o produto conjunto de muitas mãos, uma cópia parcial e imperfeita (no entanto, exacta em toda a sua extensão) de uma secção da realidade matemática. Mas o aspecto que, neste momento, é importante é o seguinte: há uma coisa, em qualquer caso, da qual as geometrias puras não são representações e essa é a realidade espacio-temporal do mundo físico. E é óbvio que não o possam ser, uma vez que terramotos e eclipses não são conceitos matemáticos. Isto pode parecer um pouco paradoxal para um leigo, mas é um truísmo para um geómetra e posso talvez conseguir torná-lo mais claro por meio de uma ilustração. Suponhamos que estou a dar uma palestra acerca de algum sistema de geometria, como a geometria euclidiana vulgar, e que desenho figuras no quadro para estimular a imaginação da minha audiência, esboços de linhas rectas, ou círculos, ou elipses. É evidente, em primeiro lugar, que a veracidade dos teoremas que demonstro não é afectada, de modo algum, pela qualidade dos meus desenhos. A sua função é meramente fazer compreender o meu pensamento aos meus ouvintes razão pela qual não há vantagem em mandá-los redesenhar pelo mais hábil dos desenhadores. São ilustrações pedagógicas e não parte do verdadeiro tema da palestra. Avancemos um pouco mais. A sala na qual dou a palestra faz parte do mundo físico e tem, em si, um determinado padrão. O estudo desse padrão e dos padrões da realidade física é uma ciência em si própria, que podemos designar por "geometria física". Suponhamos agora que um dínamo violento, ou um corpo maciço a gravitar, são introduzidos na sala. Os físicos dizem-nos que a geometria da sala foi alterada, que todo o seu padrão físico foi, ligeira, mas definitivamente deformado. Será que os teoremas que eu demonstrei passaram a ser falsos? Seria disparatado supor que as demonstrações apresentadas se alteram de algum modo. Seria como supor que uma peça de Shakespeare é alterada quando um leitor entorna o seu chá sobre uma página. A peça é independente das páginas nas quais está impressa e as "geometrias puras" são independentes das salas de conferências, ou de qualquer outro pormenor do mundo físico. Este é o ponto de vista de um matemático puro. Os matemáticos aplicados, os físicos matemáticos têm naturalmente um ponto de vista diferente, pois estão preocupados com o mundo físico em si, que também tem a sua estrutura ou padrão. Não é possível descrever os padrões físicos exactamente, como acontece se se tratar de geometria pura.

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Porém, podemos dizer algo significativo. Podemos descrever, por vezes de forma bastante exacta outras de forma muito rudimentar, as relações que se verificam entre alguns dos seus constituintes e compará-las com as relações exactas que se estabelecem entre os constituintes de alguns sistemas de geometria pura. Podemos identificar alguma semelhança entre os dois tipos de relações e, então, a geometria pura poderá ser interessante para os físicos, na medida em que poderá dar um mapa que "se ajusta aos factos" do mundo físico. O geómetra proporciona ao físico todo um conjunto de mapas por onde escolher. Um dos mapas será talvez mais adequado aos factos do que outros e, então, a geometria que proporciona esse mapa particular será a geometria mais importante para as matemáticas aplicadas. Mesmo um matemático puro poderá sentir um maior interesse no seu apreço por esta geometria, uma vez que não há nenhum matemático tão "puro" que não sinta qualquer tipo de interesse pelo mundo físico. Mas, na medida em que sucumbe a esta tentação, estará a abandonar a sua posição matemática completamente pura. Terminarei com um sumário das minhas conclusões colocando-as, porém agora de forma mais pessoal. Como disse, no início, quem defende a sua especialidade deve perceber que se está a defender a si próprio e que a justificação da minha vida como matemático profissional acaba, no fundo, por ser uma justificação da minha própria vida. Assim, esta secção final será, substancialmente, um fragmento autobiográfico. Não me consigo recordar de, alguma vez, ter querido ser outra coisa que não matemático. Suponho que foi sempre claro para mim que as minhas capacidades específicas se encontravam nesse campo e nunca me ocorreu questionar o veredicto dos mais velhos. Não me recordo porém de enquanto rapaz, alguma vez ter sentido qualquer paixão pela matemática e as noções que possa ter tido acerca do que é a carreira de um matemático estavam longe de ser nobres. Pensava nos matemáticos em termos de exames e de bolsas. Queria ser melhor do que os outros rapazes e esta parecia-me uma forma de o conseguir de forma mais decisiva. Teria cerca de quinze anos quando (de modo muito estranho) as minhas ambições sofreram uma grande mudança. Há um livro de Alan St. Aubyn denominado A fellow of Trinity, que faz parte de uma colecção que aborda o que deve ser a vida na Universidade de Cambridge. Suponho que é um livro pior do que a maioria dos de Marie Correli. Porém, um livro não pode ser inteiramente mau se desperta a imaginação de um rapazinho inteligente. Há no livro dois heróis, um herói principal chamado Flowers, que é absolutamente bom, e um herói secundário, um tipo muito mais fraco, chamado Brown. Flowers e Brown encontram diversos perigos na vida universitária, mas o pior é um salão de jogos em Chesterton dirigido pelas Meninas Bellenden, duas jovens fascinantes mas extremamente más. Flowers sobrevive a todos estes perigos, ganhando os prémios de Second Wrangler (segundo lugar em matemáticas) e Senior Classic (primeiro lugar em línguas clássicas), e é automaticamente admitido no corpo docente da faculdade (o que eu supunha que acontecesse). Brown sucumbe, arruína os seus pais, envolve-se na bebida, é salvo de delirium tremens durante uma tempestade pelas preces de Junior Dean (responsável pelos alunos não finalistas), tem imensa dificuldade até em terminar a licenciatura e, por fim, torna-se missionário. A amizade não é destruída por estes tristes acontecimentos e os pensamentos de Flowers vagueiam até Brown, com uma piedade afectuosa, enquanto bebe um Porto e como nozes pela primeira vez no Senior Combination Room (sala comum para professores e alunos em Cambridge).

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Ora bem, Flowers era um tipo bastante decente (tanto quanto "Alan St. Aubyn" o podia conceber). Porém, até mesmo a minha mente pouco sofisticada se recusava a aceitá-lo como inteligente. Se ele conseguiu fazer essas coisas, porque não o conseguiria eu? Em particular, a cena final de Combination Room fascinou-me completamente e, desde aí, até conseguir semelhante posição, a matemática significava para mim, principalmente, ser professor em Trinity. Quando vim para Cambridge descobri imediatamente que pertencer ao corpo docente de uma faculdade implicava realizar "trabalho original". Passou-se, no entanto, bastante tempo antes que eu encontrasse uma ideia definitiva do que iria investigar. Na escola, tinha descoberto, como acontece com todos os futuros matemáticos, que muitas vezes era capaz de fazer coisas melhor do que os meus professores e, mesmo em Cambridge, descobri, embora naturalmente com muito menos frequência, que podia por vezes fazer coisas melhor do que os professores do College. Porém, era realmente muito ignorante, até mesmo quando fiz o exame para obter aprovação nos temas em que me debrucei durante o resto da minha vida. Ainda pensava na matemática essencialmente como uma matéria de "competição". Foi o Professor Love, meu professor durante alguns semestres, quem primeiramente me abriu os olhos e me deu a primeira concepção séria do que é a análise. A grande dívida que tenho para com ele - ele que era, afinal de contas, um matemático aplicado - foi o seu conselho para ler o famoso Cours d’Analyse de Jordan. Nunca esquecerei o espanto com que li esse trabalho notável, primeira inspiração para tantos matemáticos da minha geração. Aí, pela primeira vez, aprendi, à medida que lia, o que significa realmente a matemática. Desde essa altura, o meu percurso foi o de um verdadeiro matemático com sólidas ambições matemáticas e uma paixão genuína pela matemática. Escrevi muita coisa durante os últimos dez anos, mas pouco realmente importante. Não há mais do que quatro ou cinco artigos dos quais ainda me consigo lembrar com satisfação. A verdadeira crise na minha carreira "chegou" dez ou doze anos mais tarde, em 1911, quando comecei a minha longa colaboração com Littlewood e, em 1913, quando descobri Ramanujan. Todo o meu melhor trabalho, desde então, tem estado em ligação com o deles e é óbvio que essa minha associação foi o acontecimento decisivo da minha vida. Ainda hoje digo para mim mesmo, quando estou deprimido e sou obrigado a escutar pessoas pomposas e maçadoras, "Bem, eu fiz uma coisa que tu nunca poderias ter feito: colaborar com Littlewood e Ramanujan em igualdade de posições.". É a eles que devo uma maturidade invulgarmente tardia. Dei "o meu melhor" pouco depois dos quarenta, quando era professor em Oxford. Desde essa altura sofro de uma deterioração contínua que é o "destino" comum dos mais velhos e, particularmente, dos matemáticos mais velhos. Um matemático ainda pode ser bastante competente aos sessenta anos, mas é inútil esperar dele ideias originais. É óbvio, agora, que a minha vida, naquilo que vale a pena, está terminada, e que nada do que possa fazer pode, de forma perceptível, aumentar ou diminuir o seu valor. É muito difícil ser "desapaixonado" mas considero isso um sucesso. Já tive muitas compensações, certamente, não menos do que eram devidas a um homem com o meu particular grau de competência. Já ocupei uma série de posições confortáveis e "prestigiantes". Tive poucos problemas com a rotina enfadonha das universidades. Detesto "ensinar" e tive que ensinar muito pouco, uma vez que o ensino que fiz teve a ver, quase inteiramente, com a supervisão de pesquisas. Adoro dar palestras e dei bastantes a grupos extremamente capazes. Sempre tive tempo suficiente para a investigação que constitui a grande e

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permanente alegria da minha vida. Considerei fácil trabalhar com outros e colaborei amplamente com dois matemáticos excepcionais. Isto permitiu-me acrescentar à matemática muito mais do que alguma vez poderia esperar. Tive as minhas desilusões, tal como qualquer outro matemático, mas nenhuma deles foi demasiado séria ou me tornou particularmente infeliz. Se me tivessem oferecido uma vida nem melhor, nem pior, quando tinha vinte anos, tê-la-ía aceitado sem hesitação. É absurdo supor que poderia ter "feito melhor". Não tenho capacidades linguísticas ou habilidades artísticas e tenho pouco interesse pela ciência experimental. Poderia ter sido um filósofo tolerável, mas não um filósofo verdadeiramente original. Penso que poderia ter sido um bom advogado. O jornalismo é a única profissão, fora da vida académica, na qual me teria sentido, realmente, confiante das minhas possibilidades. Não há qualquer dúvida de que tive razão em ser matemático, se o critério for o que vulgarmente se designa por sucesso. A minha escolha foi correcta nessa altura, se o que eu queria era uma vida razoavelmente confortável e feliz. Mas os solicitadores e corretores e agentes de apostas também têm frequentemente vidas confortáveis e felizes e é muito difícil ver o que o mundo beneficiou com a sua existência. Há alguma maneira em que eu possa afirmar que a minha vida foi menos fútil que a deles? Parece-me, novamente, que existe apenas uma resposta possível: sim, talvez, mas se for assim, só por uma única razão. Nunca fiz nada "útil". Nenhuma descoberta minha fez, ou é provável que venha a fazer, directa ou indirectamente, para o bem ou para o mal, a menor diferença na amenidade do mundo. Ajudei a formar outros matemáticos, mas matemáticos do mesmo tipo que eu e o seu trabalho foi, pelo menos naquilo em que os ajudei, tão inútil quanto o meu. Em termos práticos, o valor da minha vida matemática é nulo e, fora da matemática, é de qualquer maneira trivial. Só tenho uma possibilidade de escapar a um veredicto de completa trivialidade e essa possibilidade reside em considerar-se que eu tenha criado uma coisa que valesse a pena ser criada. Ora, que eu tenha criado alguma coisa é incontestável. A questão põe-se quanto ao seu valor. A defesa da minha vida, ou da de qualquer outra pessoa que tenha sido matemático no mesmo sentido que eu, é esta: ter acrescentado alguma coisa ao conhecimento e ajudado outros a acrescentar e que essas pequenas coisas tenham um valor que difere apenas em grau, mas não em qualidade, das criações dos grandes matemáticos, ou das de quaisquer outros artistas, grandes ou pequenos, que deixaram qualquer espécie de memória atrás de si.