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ISSN 1807-6017 Repositório autorizado de jurisprudência SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (inscrição sob nº 036/05, em 20.10.2005). SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA nº 55 (Portaria nº 1, de 23.05.2005, do Exmo. Sr. Ministro Diretor da Revista do STJ, publicada no Diário da Justiça de 30.05.2005, Seção 1, p. 555). TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO (Portaria COJUD nº 4, de 08.08.2005, do Exmo. Sr. Des. Fed. Diretor da Revista do TRF da 1ª Região, publicada no Diário da Justiça de 12.08.2005, Seção 2, p. 2). TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO nº 34 (Portaria nº 1, de 10.03.2008, do Exmo. Sr. Des. Fed. Diretor da Escola da Magistratura do TRF da 4ª Região, publicada no Diário Eletrônico nº 64, de 25.03.2008). TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO nº 13 (Despacho do Exmo. Sr. Des. Fed. Diretor da Revista do TRF da 5ª Região, publicado no Diário da Justiça de 05.09.2005, Seção 2, p. 612). Juris Plenum Doutrina - Jurisprudência - Legislação

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Juris PlenumAno VIII - número 43 - janeiro de 2012

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ISSN 1807-6017

Repositório autorizado de jurisprudência

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (inscrição sob nº 036/05, em 20.10.2005).

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA nº 55 (Portaria nº 1, de 23.05.2005, do Exmo. Sr. Ministro Diretor da Revista do STJ, publicada no Diário da Justiça de 30.05.2005, Seção 1, p. 555).

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO (Portaria COJUD nº 4, de 08.08.2005, do Exmo. Sr. Des. Fed. Diretor da Revista do TRF da 1ª Região, publicada no Diário da Justiça de 12.08.2005, Seção 2, p. 2).

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO nº 34 (Portaria nº 1, de 10.03.2008, do Exmo. Sr. Des. Fed. Diretor da Escola da Magistratura do TRF da 4ª Região, publicada no Diário Eletrônico nº 64, de 25.03.2008).

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO nº 13 (Despacho do Exmo. Sr. Des. Fed. Diretor da Revista do TRF da 5ª Região, publicado no Diário da Justiça de 05.09.2005, Seção 2, p. 612).

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Juris PlenumAno VIII - número 43 - janeiro de 2012

EditorFlávio Augustin

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Índice para o catálogo sistemático:1. Direito 3402. Ciências jurídicas 3403. Direito Civil 347

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Editoração eletrônica: Editora Plenum Ltda.Tiragem: 5.000 exemplaresDistribuída em todo território nacionalOs acórdãos selecionados correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos tribunaisServiço de atendimento ao cliente: DDG 0800.979.7447

J95 Juris Plenum / Editora Plenum . Ano VIII, n. 43 (jan./fev. 2012). - Caxias do Sul, RS: Editora Plenum, 2012.

184p. ; 23cm.

Bimestral ISSN 1807-6017 1. Direito. 2. Ciências jurídicas. 3. Direito Civil. I. Editora Plenum.

CDU: 340

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SUMÁRIO

DOUTRINA

Infração de Menor Potencial Ofensivo - Quando a Ingenuidade dá Lugar à DesconfiançaBERNARDO MONTALVÃO VARJÃO DE AZEVEDO ..................................................7

Competência da Justiça do Trabalho para Expedir Alvará Judicial Destinado à Libe-ração do FGTS Independentemente do Ajuizamento de Reclamação TrabalhistaCLÁUDIO DIAS LIMA FILHO .....................................................................................25

O Fenômeno do Superendividamento - Inexistência de Direito do Consumidor à Re-negociação e de Justa Causa para Intervenção Judicial nos ContratosDEMÓCRITO RAMOS REINALDO FILHO ................................................................49

A Possibilidade de Antecipação Terapêutica da Gestação nos Casos de Anencefalia: Uma Análise da Legislação Interna Vigente como Fonte Suficiente para esse Fim e o Direito ComparadoHELENO FLORINDO DA SILVA ................................................................................63

Do Prequestionamento nos Recursos Excepcionais CíveisMÁRCIA SILVANA FELTEN .......................................................................................95

A Relativização da Qualidade de Segurado como Requisito para a Concessão dos Benefícios Previdenciários. Uma Nova Abordagem à Luz do Princípio Constitucional do Caráter Contributivo da Previdência SocialRODRIGO MOREIRA SODERO VICTORIO ...........................................................105

JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA

AcórdãosSTF - Ag. Reg. nos Emb. Div. no Ag. Reg. no Agravo de Instrumento nº 725.078 ........115

STJ - Recurso Especial nº 1.187.637 ............................................................................119

STJ - Recurso Especial nº 1.267.402 .......................................................................123STJ - Recurso Especial nº 1.276.415 .......................................................................125TRF1 - Apelação Cível nº 2008.38.00.013639-2 ..........................................................128

TRF4 - Agravo de Instrumento nº 0038787-03.2010.404.0000 .....................................134

TRF5 - Apelação Criminal nº 7311 .................................................................................137

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EMENTÁRIO

Cível ..............................................................................................................................141Penal .............................................................................................................................161

LEGISLAÇÃO ...............................................................................................................173

ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

Cível ..............................................................................................................................175Penal .............................................................................................................................181

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INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO - QUANDO A INGENUIDADE DÁ LUGAR à DESCONFIANÇA

BERNARDO MONTALVÃO VARJÃO DE AZEVEDOMestre em Direito Público pela UFBA. Pós-Graduado em Ciências

Criminais pela Fundação Faculdade de Direito, vinculada ao Programa de Pós-Graduação da UFBA. Professor de Direito Penal da Universidade

Salvador - UNIFACS. Professor de Processo Penal da Universidade Católica do Salvador - UCSAL. Analista Previdenciário da Procuradoria

Federal Especializada do INSS.

SUMÁRIO: 1. Infração de menor potencial ofensivo: jurisdição constitucional, estrutura do ordenamento e metodologia normativa - 2. Infração de menor potencial ofensivo: o problema de uma definição legal no contexto da sociedade contemporânea - 3. Alguns problemas do conceito de infração de menor potencial ofensivo - 4. Infração de menor potencial ofensivo: o problema da legitimidade - Conclusão - Referências.

RESUMO: O presente texto desenvolve um olhar cético acerca da infração de menor potencial ofensivo e de sua relação com os Juizados Especiais Criminais. Com este objetivo o texto analisa a infração de menor potencial ofensivo a partir de uma concepção retórica. Feita tal análise, o texto procura estudar as relações entre os Juizados Especiais Criminais e as instâncias ilícitas de controle.

PALAVRAS-CHAVE: infração de menor potencial ofensivo; Juizados Especiais Criminais; retórica; legitimidade; instâncias ilícitas de controle.

ABSTRACT: This paper develops a skeptical about the violation of lower offensive potential and its relation to the Special Criminal Courts. With this goal the paper analyzes the violation of lower offensive potential from a rhetorical conception. Made this analysis, the text attempts to study the relationship between the Special Criminal Courts and the instances of illegal control.

KEYWORDS: violation of lower offensive potential; Special Criminal Courts; rhetoric; legitimacy; instances of illegal control.

Em algum remoto canto do universo, que se deságua fulgurante-mente em inumeráveis sistemas solares, havia uma vez um astro, no qual animais astuciosos inventaram o conhecimento. Foi o minuto mais audacioso e hipócrita da “história universal”: mas, no fim das contas, foi apenas um minuto. Após alguns respiros da natureza,

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o astro congelou-se, e os astuciosos animais tiveram de morrer. (NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Sobre a verdade e a mentira. Tra-dução Fernando de Moraes Barros. São Paulo: Hedra, 2007. p. 25).

1. INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO: JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL, ESTRUTURA DO ORDENAMENTO E METODOLOGIA NORMATIVA

O leitor menos avisado, ao se deparar com o conceito de infração de menor po-tencial ofensivo, pode ser levado a equívoco. Isto porque ele é quase que imediatamente induzido a pensar que tal conceito deva ser definido, necessariamente, como o gênero composto pelas espécies contravenção penal e os delitos cuja pena máxima em abstrato não ultrapasse o limite de dois anos, cumulada ou não com multa.

Todavia, a precipitação é irmã do erro e madrasta da prudência. E com o legislador infraconstitucional não foi diferente. Já se sabe, não de agora, que a lei não deve definir conceitos, pois tal tarefa deve ficar a cabo da doutrina e da jurisprudência. Não porque este seja um dogma da hermenêutica clássica,1 mas, sim, porque se trata de um corolário da Jurisdição Constitucional, no sentido que lhe empresta João Maurício Adeodato.2

Afinal, definições não são estáticas, antes são mutantes e circulares,3 e isso é o próprio legislador constituinte que ensina ao consignar que cabe ao Supremo Tribunal Federal a guarda da Constituição. Ora, se o texto constitucional (CR, artigo 102) atribui ao Supremo o papel de intérprete legítimo da Constituição, força é convir que neste instante foi subvertida a tradicional hierarquia das fontes do Direito, pois o próprio texto constitucional

1 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 90.2 ADEODATO, João Maurício. Retórica constitucional: sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos

éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 139.3 “Do ponto de vista pragmático, é preciso considerar validade e imperatividade como conceitos diferentes,

não redutíveis um ao outro, e o conceito de ordenamento como um sistema que admite não uma, mas várias hierarquias, o que elimina hipótese de uma (única) norma fundamental e a correspondente concepção de unidade. A posição pragmática é de que uma norma pode ser válida e, não obstante isso, não ter império, isto é, força de obrigatoriedade, e vice-versa, ter império e não ser válida. Assim, uma norma tem imperatividade à medida que se lhe garante a possibilidade de impor um comportamento independentemente do concurso ou da colaboração do destinatário, portanto, a possibilidade de produzir efeitos imediatos, inclusive sem que a verificação de sua validade o impeça... Ademais, a posição pragmática é de que o sistema do ordenamento, não se reduzindo a uma (única) unidade hierárquica, não tem estrutura de pirâmide, mas estrutura circular de competências referidas mutuamente, dotada de coesão. Por exemplo, o Supremo Tribunal Federal recebe do poder constituinte originário sua competência para determinar em última instância o sentido normativo das normas constitucionais. Desse modo, seus acórdãos são válidos, com base em uma norma constitucional de competência, configurando uma subordinação do STF ao poder constituinte originário. No entanto, como o STF pode determinar o sentido de validade da própria norma que lhe dá aquela competência, de certo modo, a validade da norma constitucional de competência do STF também depende de seus acórdãos (norma), configurando uma subordinação do poder constituinte originário ao STF.” Cf. FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 189-190.

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9INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

estabeleceu a preferência da Jurisprudência em prejuízo da lei. É dizer, a Jurisprudência não apenas prefere à lei, como esta preferência resulta da própria lei.4

A Jurisdição Constitucional, como definição que o é, também apresenta aspecto cir-cular. Isto porque, de um lado, ela é o conjunto de interpretações, argumentações e decisões produzidas pelo Judiciário em questões relativas aos textos constitucionais. E, de outro, ela é o mosaico dos textos decisórios (sentenças ou acórdãos) e constitucionais, o qual acaba servindo de base para novas interpretações. Em outras palavras, se o texto da Constituição serve como ponto de apoio para interpretações jurídico-normativas, estas interpretações, quando concretizadas em forma de acórdão, por exemplo, irão influir sobre as novas inter-pretações que venham a ser feitas a partir do mesmo texto diante de um novo caso concreto.

Sendo assim, antes de o operador do Direito se debruçar sobre o texto do artigo 98, inciso I, da Constituição, imperioso se faz que ele melhor compreenda a estrutura do ordenamento jurídico. Isto porque, enquanto conjunto de normas genéricas, a estrutura do ordenamento é piramidal, no sentido que lhe atribui Kelsen. Contudo, enquanto conjunto de normas casuísticas, esta mesma estrutura apresenta feição circular, vez que as normas são concretizações construídas pelo magistrado a partir do texto de lei, do caso concreto e dos valores determinantes em jogo.5 Ora, se assim o é, as normas, ao mesmo tempo em que determinam o sentido dos textos, o tomam como ponto de apoio para futuras concre-tizações. Em uma só palavra, normas pressupõem normas que, por sua vez, pressupõem outras normas, e todas se utilizam do texto.6

4 ADEODATO, op. cit., p. 149.5 “Mas o sistema vai muito além dessas bases textuais, é uma conclusão direta: o sentido e o alcance dos

termos, a coerência argumentativa e os conflitos não estão ali nesse livro que se chama ‘a Constituição’ e, nem por isso, deixam de fazer parte do universo constitucional. Ao conjunto de interpretações, argumentações e decisões apreciadas pelo Judiciário, em questões que envolvem os textos constitucionais, dá-se a denominação de jurisdição constitucional (Verfassungsgerichtbarkeit). Observe-se que jurisdição constitucional, por sua vez, é também composta de textos, decisórios, os quais vêm somar-se aos textos do livro constitucional e servir de partida para novas interpretações, argumentações e decisões.” Cf. ADEODATO, op. cit., p. 140. Em outra obra, o aludido autor afirma que, “em lugar de fato, valor e norma, procura construir uma teoria do direito que una evento real, idéia e expressão simbólica, ou, mais especificamente, estudar as interferências recíprocas entre o fato juridicamente relevante, a norma jurídica e as fontes do direito. As diferenças entre a norma (o significado ideal para controle de expectativas atuais sobre condutas futuras) e os símbolos lingüísticos que a exprimem (os significantes revelados pelas fontes do direito) são particularmente importantes para a interpretação e a argumentação jurídicas. Essas três dimensões do conhecimento não podem ser reduzidas uma à outra. O valor não é considerado uma quarta dimensão por estar presente em todas as outras três, sempre”. Cf. ADEODATO, João Maurício. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. XXIII.

6 Importa esclarecer que, a rigor, não há um abismo entre a norma e o texto. Não porque esteja certa a premissa da Escola de Exegese, ao identificar as duas figuras, mas, sim, porque não existe um texto exclusivamente texto, já que todo texto traz embutidos, em si, dados linguísticos e reais, bem como referências externas à própria expressão. Cf. ADEODATO, op. cit., p. 146. Em outras palavras, se a linguagem é mais do que o texto, logo não há um precipício separando-o da norma, pois os dois elementos encontram-se inseridos no universo da linguagem. Trata-se apenas de diferentes formas de representação, dado que a linguagem não é

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Mas, por favor, não compreendam mal essas assertivas. Os textos (por exemplo, o do artigo 98, inciso I, da CR) não desempenham, dentro do ordenamento jurídico, o papel de ponto de partida para o processo de concretização da norma jurídica. Textos funcionam como ponto de apoio, e não como ponto de partida.7 E assim o é, pois a abertura normativa do sistema jurídico8 se dá por meio do caso concreto. Logo, é o caso o ponto de partida da concretização da norma, e não o texto. De outra forma, retira-se a temporalidade do direito,9 vez que o texto é a tentativa de objetivação de um consenso por meio da linguagem, o qual termina por suspender a temporalidade da constituição da norma.

Esta circunstância remete, então, a outra conclusão, qual seja, a metodologia norma-tiva não é dedutivo-subjuntiva, antes se mostra indutivo-casuística. Ou seja, a concretização da norma parte do caso em busca de um texto, sendo, nesse ponto, indutivo-casuística. Todavia, ao escolher um dado texto a partir de opções valorativas, logo a seguir justifica-se a mencionada escolha segundo outros textos, tornando-se aqui dedutivo-silogística.10 E, depois de feita e justificada a escolha, retorna-se ao caso objeto do processo e, neste ins-tante, a escolha é testada pela pretensão e resistência das partes, as quais são exercitadas por meio dos recursos cabíveis, voltando a ser aqui, novamente, indutivo-casuística.11 Em suma, a metodologia de concretização da norma é indutivo-dedutivo-indutiva.

estática, antes é constituída por diversos e simultâneos jogos que se encontram em constante metamorfose. Para entender melhor o comportamento da linguagem, indispensável se faz a leitura de WITTGENSTEIN, Ludwig. Tratado lógico-filosófico: investigações filosóficas. Tradução e prefácio M. S. Lourenço. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. passim.

7 Nesse ponto, diverge-se da lição de João Maurício Adeodato, o qual compreende o texto como um ponto de partida para concretização da norma jurídica. Cf. ADEODATO, op. cit., p. 139.

8 Quando se faz uso aqui da noção de abertura normativa do sistema jurídico, não se tem por finalidade qualquer aproximação com a proposta elaborada por Claus-Wilhelm Canaris, até porque não se adota aqui a definição por ele oferecida ao conceito de “sistema jurídico”. Consulte-se CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do Direito. Tradução e introdução Antônio Menezes Cordeiro. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. p. 103-125.

9 Op. cit., p. 148.10 Para maior esclarecimento quanto ao método dedutivo, veja-se: DESCARTES, René. Discurso do método.

Tradução Maria Ermantina Galvão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. passim.11 O teste a que são submetidas a escolha do texto de lei e a sua justificação aproxima-se, em grande medida,

do método proposto por Karl Popper, o da refutabilidade da hipótese cognitiva. Todavia, o refutável é, antes de tudo, uma derivação indutiva, pois só se verifica a resistência da hipótese a partir da experiência da análise. Caso contrário, admitir-se-ia que a refutabilidade é uma hipótese inverificável. Nesse passo, Karl Popper, lecionando sobre o conhecimento e a ignorância, assevera que “se é possível dizer que a ciência, ou o conhecimento, ‘começa’ por algo, [...] o conhecimento não começa de percepções ou observações ou de coleção de fatos ou números, porém, começa, mais propriamente, de problemas. Poder-se-ia dizer: não há nenhum conhecimento sem problemas; mas, também, não há nenhum problema sem conhecimento. Mas isto significa que o conhecimento começa da tensão entre conhecimento e ignorância. [...] não há nenhum problema sem conhecimento; [...] não há nenhum problema sem ignorância. [...] cada problema surge da descoberta de que algo não está em ordem com nosso suposto conhecimento; descoberta de uma contradição interna entre nosso suposto conhecimento e os fatos [...]”. Consulte-se: POPPER, Karl. Lógica das ciências sociais. Tradução Estevão de Rezende Martins. Apoio Cláudio Muniz, Vilma de Oliveira Moraes e Silva. 3. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2004. p. 14-15.

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11INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

Como se percebe dentro do ambiente de uma metodologia indutivo-dedutivo--indutiva, o caso ganha grande importância no processo de concretização da norma e, por consequência, a própria definição daquilo que se venha a entender por infração de menor potencial ofensivo. Se a partir de uma metodologia dedutivo-subjuntiva o texto do artigo 61 da Lei nº 9.099/95 é o protagonista da aplicação da norma, no cenário metodológico indutivo-casuístico, o caso se torna o ator principal no processo de construção da norma. Por conseguinte, torna-se fundamental dedicar um olhar atento ao caso e, a partir da sua importância, desconfiar que ele possa interferir significativamente, por exemplo, na fixação da competência dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº 9.099/95, artigo 77, parágrafo 2º).12 Afinal, o texto “sequer fixa os limites da interpretação, servindo, quando muito, para justificar posteriormente uma decisão já tomada como base em normas ocultas pelos próprios procedimentos decisórios”.13

É certo que o caso exerce um papel relevante na constituição da norma jurídica e, portanto, na reconstrução do conceito de infração de menor potencial ofensivo. Todavia, o caso não é o toque de Midas14 da dogmática jurídica contemporânea, vez que ele não reflete o conflito real, mas, sim, um relato artificialmente selecionado pelo sistema jurídico. E esta seletividade é dúplice, pois tanto decorre do caráter metafórico da linguagem, com os abismos gnosiológicos e axiológicos que lhe constituem, quanto da operacionalidade do sistema. Disto resulta que o conflito resolvido pelo sistema jurídico é sempre um conflito artificial, dado que é impossível alcançar o conflito real, quiçá resolvê-lo. Logo, o sistema jurídico é um sistema de administração de conflitos artificiais ou, quando muito, de controle deles. Até porque nada permite concluir que o sistema jurídico, mesmo que tivesse em tese capacidade de resolver o conflito real, estaria imbuído em fazê-lo. Os conflitos, em última análise, justificam a existência do Estado e do seu aparato de controle.15

12 “Ora, eis aqui uma indagação a exigir pronta resposta: que espécie de juiz natural é esse que tem sua competência condicionada à citação pessoal do acusado ou à menor complexidade da produção probatória, conforme o disposto no art. 66 e no art. 77, § 2º, ambos da Lei nº 9.099/95? E, agora, condicionado também à inexistência de conexão e continência com crimes mais graves? O que realmente importa são a presença do acusado e a facilidade da prova para a definição da competência de jurisdição? Se a resposta for afirmativa, tudo quanto se disse, aqui e acolá, sobre o princípio ou garantia do juiz natural terá virado pó.” Cf. OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 13. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 719.

13 ADEODATO, op. cit., p. 143.14 COMMELIN, P. Mitologia grega e romana. Tradução Eduardo Brandão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,

1997. p. 349-350.15 Apesar de não se adotar aqui a concepção de Marx quanto ao papel exercido pelo Estado na sociedade

capitalista, não se recusam por completo as suas considerações acerca do tema. Cf. MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. Tradução Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2004. passim. Convém transcrever as palavras de Tércio Sampaio Ferraz Junior sobre o assunto: “O poder disciplinar confere à soberania (do Estado) um sentido mais abstrato, simultaneamente, mais racionalizável e duradouro. Antes, ela emergia do apossamento de terra e da riqueza. Agora, ela constitui a possibilidade de apossamento. O Estado serve ao desenvolvimento do capitalismo e à acumulação contínua e eficiente da riqueza”. Cf. FERRAZ JUNIOR, op. cit., p. 179-180.

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12 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

E são eles, os conflitos, que ajudam a traçar a diferença entre a Jurisdição Constitu-cional e a concretização da norma constitucional. A Jurisdição Constitucional é a gama de concretizações normativas realizadas pelo Poder Judiciário a partir dos conflitos levados ao seu conhecimento. A concretização da norma constitucional, por seu turno, não constitui, necessariamente, um corpo harmônico e sistemático de concretizações normativas, nem é fruto da atuação do Poder Judiciário, antes resulta da interpretação que cada cidadão confere ao texto constitucional diante dos conflitos da vida cotidiana. É dizer, se a socie-dade é uma arena de conflitos, a concretização da norma constitucional é aquilo que Peter Häberle denomina como “Sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”.16

Admitindo-se que tais premissas são verossímeis, necessário se faz concluir que, à medida que os anos passam, a Constituição terá tanto mais normas quanto mais concretizações forem feitas pelo Poder Judiciário e pelos cidadãos. “Daí por que se tem ‘mais Constituição’ hoje do que em 1988, em um sentido bem literal.”17 Por conseguinte, forçoso é inferir que o texto constitucional do artigo 98, inciso I, da CR, ao estabelecer o conceito de infração de menor potencial ofensivo, não tem o seu significado delimitado pelo esboço de definição dado pelo malfadado artigo 61 da Lei nº 9.099/95 (recentemente alterado pela Lei nº 11.313/06). Este esboço de definição antes agrava o conflito real, na medida em que aumenta, uma vez mais, o abismo que o separa do conflito artificialmente selecionado pelo sistema jurídico. Em síntese, o mencionado dispositivo se mostra um arremedo de definição.

2. INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO: O PROBLEMA DE UMA DEFINIÇÃO LEGAL NO CONTEXTO DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

Este arremedo é tanto mais evidente quanto mais a sociedade se torna complexa e diferenciada. Complexa, porque a sociedade contemporânea, no dizer de Niklas Luhmann, é um sistema social constituído por muitos subsistemas que se intercomunicam entre si mediante acoplamentos estruturais. E diferenciada, porque os subsistemas sociais, a exemplo da Economia e do Direito, constituem e preservam as suas autonomias por meio de aberturas e fechamentos normativos levados a cabo pelos códigos de linguagem. Códigos

16 “Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um intérprete dessa norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que se pode supor tradicionalmente, do processo hermenêutico. Como não são apenas os intérpretes jurídicos da Constituição que vivem a norma, não detêm eles o monopólio da interpretação da Constituição.” Cf. HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Tradução Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997. p. 15.

17 ADEODATO, op. cit., p. 147.

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13INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

como o do ter ou não ter ou, ainda, como o do lícito e ilícito.18 Quanto mais complexa a sociedade, maior será a dificuldade de consenso sobre a conotação e a denotação dos textos legais.19 Daí por que a norma se torna um consenso casuístico e provisório construído por meio da força do melhor argumento.

É neste contexto intelectual que a definição de infração de menor potencial ofensivo precisa ser repensada. Sendo mais claro, o que se deve repensar não é apenas a definição em si, mas a circunstância de ela se encontrar lançada em texto de lei. Uma dogmática jurídica contemporânea deve, antes de tudo, ser um sistema inacabado, uma estrada sem linha de chegada. Eis o caráter retórico necessário à dogmática jurídica contemporânea. Um caráter que deve ser compreendido em suas três dimensões, ou seja, enquanto método, metodologia e metódica, no sentido que ensina Ottmar Ballweg.20 Somente repensando a dogmática jurídica, o seu uso e as definições por ela oferecidas, a exemplo da que é dada à infração de menor potencial ofensivo, é que será possível controlar a complexidade crescente da teia social.

Sendo assim, a dogmática jurídica contemporânea deve ser antes de tudo uma dogmática comprometida com o caso, vez que a crescente complexidade social acentua a distinção entre o texto de lei e a norma. Uma distinção que sinaliza para necessidade de se refletir sobre a definição legal de infração de menor potencial ofensivo. Seja porque a definição que é dada a tal grupo de infrações se encontra engessada, vez que está lançada em texto de lei, seja porque, e principalmente, ela parece menosprezar a impor-tância do caso. Afinal, se até a Escola de Exegese reconhece que há textos que reclamam interpretação, basta interpretar a contrario sensu o famoso brocardo latino in claris cessat interpretatio,21 forçoso é admitir a infelicidade do legislador ao definir, por meio da lei, o conceito de infração de menor potencial ofensivo.

18 “Cada aumento de complexidade dum sistema pode ser designado como diferenciação em geral, mediante a criação dum subsistema. Existe uma diferenciação funcional quando os sistemas não são comparados como unidades semelhantes, mas se referem a funções específicas e estão então ligados uns aos outros. As vantagens do aumento de rendimento da diferenciação funcional são evidentes. Que elas tenham de ser resgatadas mediante determinadas dificuldades e problemas de conseqüências, sempre se viu, mas era compreendido de forma muito diferente, por exemplo, como necessidade de coordenação em cada distribuição de tarefas, como contexto de elevação da diferenciação e integração, diferenciação e autarquia dos sistemas parciais, especificação ou generalização, ou então como discrepância inevitável entre estrutura e função, que aumenta no caso duma diferenciação mais marcada.” Cf. LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento. Tradução Maria da Conceição Côrte-Real. Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 195.

19 AZEVEDO, Bernardo Montalvão Varjão de. Desconstruindo a ordem pública e reconstruindo a prisão preventiva. Revista Jurídica, Sapucaia do Sul: Notadez, ano 58, n. 394, p. 119-122, 2010.

20 BALLWEG, Ottmar. Retórica analítica e direito. Tradução João Maurício Adeodato. Revista Brasileira de Filosofia, São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, n. 163, 1991. Fasc. 39, p. 175-184.

21 Só é possível afirmar a clareza do texto de lei e, com isso, afastar a sua interpretação, se aquele que aplica a lei antes a interpretar, pois a clareza do texto pressupõe interpretação. Sendo assim, “não é a falta de clareza (linguístico-hermenêutico-exegética) das leis que justifica a interpretação, é a problemático-concreta realização normativa do direito que a não pode nunca dispensar”. Cf. NEVES, Antônio Castanheira. O actual problema metodológico da interpretação jurídica. Coimbra: Coimbra Editora, v. I, 2003. p. 14-28.

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Refletir sobre a definição legal de infração de menor potencial ofensivo, conferindo maior importância ao caso, é admitir, uma vez mais, o caráter retórico da dogmática jurídica. E aqui cabe uma importante advertência, não se deve conferir qualquer conotação pejora-tiva ao emprego do vocábulo retórico ao caráter que a dogmática jurídica deve apresentar diante da complexidade da sociedade atual. É certo que a retórica, no sentido que Platão atribui a tal palavra,22 apresenta um significado negativo, pois ela logo é identificada com a ideia de ornamento da linguagem e com a arte de enganar o outro. Todavia, esta não é a única definição que se pode atribuir a este signo. Basta tomar contato com a obra de Aristóteles, para se perceber que a retórica pode ser compreendida de forma positiva e construtiva, “como a contrapartida da dialética”.23 E é a partir deste viés que se compre-ende aqui a “retórica como uma espécie de filosofia, mais do que uma ‘escola’, dada sua amplitude, longevidade e abrangência”.24

Quando se percebe a retórica como uma espécie de filosofia, logo se compre-ende que ela é constituída por três dimensões, são elas: a retórica material, a retórica prática e a retórica analítica. A retórica material é a maneira pela qual os seres humanos efetivamente se comunicam (a arte e a técnica da comunicação), as relações humanas enquanto comunicação. Nesse sentido, a retórica material corresponde ao método, que são as maneiras pelas quais efetivamente ocorre a comunicação no ambiente. E, quando se afirma que a “realidade” é retórica, assevera-se, também, que a linguagem controla as relações humanas por meio de promessas. As promessas podem, ou não, ser cumpridas, mas o controle dos comportamentos é imediato. Logo, as normas jurídicas são promessas caracterizadas pelo abismo cronológico entre a expectativa presente e o futuro inexistente.25

Por sua vez, a retórica prática ou estratégica é uma metarretórica, uma retórica sobre a retórica material. Ela observa como funciona a retórica material e verifica que fórmulas dão certo. Desta forma, a retórica prática constitui uma pragmática finalística e normativa da comunicação. E, nesse sentido, a retórica prática é uma metodologia (teoria sobre os métodos) da retórica material, dentro da qual se encontram inseridas a tópica, a teoria da argumentação e as figuras de linguagem. Em outras palavras, a retórica prática é a estratégia para modificar casos (relatos da retórica material) e erigi-los em objetos (conceitos instituídos pela linguagem de controle e tomados como se fossem verdades). Por conseguinte, a infração de menor potencial ofensivo é um conceito produzido pela retórica prática a partir da modificação e recorte do caso.

22 PLATÃO. A República. Tradução Enrico Corvisieri. São Paulo: Nova Cultural, 1999. p. 21-23.23 ARISTÓTELES. Retórica. Tradução Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Rideel, 2007. p. 19.24 ADEODATO, op. cit., p. 16.25 ADEODATO, João Maurício. As retóricas na história das idéias jurídicas no Brasil: originalidade e continuidade

como questões de um pensamento periférico. Revista da ESMAPE, Recife, v. 14, n. 29, p. 243-278, jan./jun. 2009.

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15INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

A retórica analítica,26 por fim, é a metódica que analisa a relação entre as retóricas, material e prática. É a dimensão desestruturante da retórica que procura ter uma visão descritiva e abstrair-se de preferências axiológicas, uma tentativa de neutralidade. Nesse sentido, a retórica analítica amplia a semiótica e busca conferir igual importância ao sig-no, ao significado e aos utentes dentro do sistema linguístico. É dizer, a retórica analítica procura conferir igual relevância ao texto de lei, à norma, que é sempre concreta, e aos sujeitos envolvidos no processo de construção normativa. Desta forma, a retórica analítica acaba por demonstrar o equívoco de reduzir metonimicamente a retórica à retórica prática.

Se a retórica não se reduz à retórica prática e a sociedade contemporânea se carac-teriza pela sua complexidade, então, faz-se necessário concluir que toda norma jurídica é concreta e que é possível compreender a retórica como uma espécie de filosofia. Ora, se a retórica é uma espécie de filosofia, não há qualquer demérito em compreender a dogmática jurídica a partir de um viés retórico e, desta forma, reconstruir o conceito de infração de menor potencial ofensivo. Pelo contrário, é exatamente o caráter retórico da dogmática jurídica que permitirá controlar a complexidade da sociedade atual. Até porque, a rigor, des-considerar o caso no processo de concretização da norma, como parece ter ocorrido com a definição legal de infração de menor potencial ofensivo, é admitir que a decisão judicial que recebe a denúncia ou a queixa-crime, por exemplo, é carente de fundamentação.27

Como se percebe, então, o conceito delineado pelo texto do artigo 61 da Lei nº 9.099/95 apresenta alguns problemas. Problemas que remetem a uma possível incompa-tibilidade entre o conceito de infração de menor potencial ofensivo e a própria noção de Juizados Especiais Criminais. Problemas que precisam ser analisados detalhadamente para que, a seguir, seja possível avaliar se, de fato, eles são, ou não, problemas.

3. ALGUNS PROBLEMAS DO CONCEITO DE INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

A esta altura da exposição, desconfia-se de que uma indagação insiste em incomo-dar o leitor: por que a definição, em si, de infração de menor potencial ofensivo reclama uma

26 “A retórica analítica diferencia-se das retóricas práticas e material por não estar submetida aos constrangimentos destas, quais sejam: a obrigatoriedade de estabelecer normas, a obrigatoriedade de decidir, a obrigatoriedade de fundamentar e a obrigatoriedade de interpretar. Isto significa apenas que a retórica analítica se submete a constrangimentos inteiramente diferentes, desde que lhe baste a exigência de averiguabilidade de seus resultados: a limitação e enunciados formais; a consideração permanente de que tais enunciados podem vir a se tornar empíricos; a necessidade de sua complementação através de outros princípios analíticos; a possibilidade de controle das proposições e sua compatibilidade com outras teorias analíticas; o caráter parcial das análises e de seus resultados, assim como a possibilidade de reprodução, acumulação e generalização dos mesmos.” Cf. BALLWEG, Ottmar. Retórica analítica e direito. Tradução João Maurício Adeodato. Revista Brasileira de Filosofia, São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, n. 163, 1991. Fasc. 39, p. 175-184.

27 ADEODATO, op. cit., p. 154.

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reflexão tão cautelosa? Por muitas razões. A primeira delas é a incompatibilidade existente entre a definição legal de infração de menor potencial ofensivo e a própria instituição dos Juizados Especiais Criminais. Ora, se os juizados foram instituídos com o escopo de proporcionar celeridade ao julgamento da chamada infração de menor potencial ofensivo, não é possível chegar à outra conclusão que não seja a da infelicidade da definição dada pelo artigo 61 da Lei nº 9.099/95. Como é possível conferir celeridade ao procedimento e ao julgamento de um processo, se o conceito de infração de menor potencial ofensivo pressupõe a figura da contravenção penal?

E qual é a incompatibilidade entre a contravenção penal e os motivos político--criminais que orientaram a instituição dos Juizados Especiais Criminais? A primeira é a circunstância de a contravenção penal ser apurada mediante ação penal de iniciativa pública incondicionada (Decreto-Lei nº 3.688/41, artigo 7º). Ora, se é o Ministério Público que terá que oferecer a ação penal e deverá fazê-lo necessariamente, caso a transação penal (Lei nº 9.099/95, artigo 76) seja frustrada, fica fácil concluir que os Juizados Especiais Criminais já surgem em meio a uma imensa gama de ações penais a apreciar. Isto porque às contravenções penais não são aplicáveis institutos processuais, como, por exemplo, o da desistência do processo ou o do perdão do ofendido. Por conseguinte, faz-se indispensável formular aqui outra pergunta: como é possível compatibilizar a velocidade de julgamento do processo com a exponencial quantidade de ações penais oferecidas?

Mas não é só isso. A própria noção de contravenção penal é incompatível com os motivos político-criminais que justificaram a criação dos juizados. Como harmonizar constitucionalmente uma definição formulada no ambiente ditatorial de 1941 com uma instituição gestada no cenário constitucional de 1988? Como conciliar uma definição ofen-siva aos princípios penais da subsidiariedade, lesividade e bagatela28 com uma instituição que tem como uma de suas finalidades a “despenalização” das infrações praticadas? Como conformar uma espécie de infração penal destinada a vigiar os pequenos deslizes formais na conduta de qualquer cidadão com um instituto que pretende implementar um procedimento sumaríssimo informal?

Não fosse tudo isso suficiente, outra circunstância que revela a incompatibilidade entre a definição dada pelo artigo 61 da Lei nº 9.099/95 e o instituto dos Juizados Especiais Criminais é a própria figura do delito cuja pena máxima em abstrato não ultrapasse o limite de dois anos, cumulada ou não com multa. Ora, como é possível definir, aprioristicamente, a maior ou menor complexidade de um caso, partindo-se, exclusivamente, de um crité-rio quantitativo baseado no limite máximo da pena em abstrato? A quantidade da pena máxima em abstrato é capaz de definir a maior ou menor complexidade de um caso? A definição legal de infração de menor potencial ofensivo com espeque na quantidade de

28 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Manifesto contra os juizados especiais criminais: uma leitura de certa “efetivação” constitucional. In: SCAFF, Fernando Facury (Org.). Constitucionalizando direitos: 15 anos da Constituição brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 347-438.

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17INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

pena máxima em abstrato parece pressupor um tipo de situação padrão, desprezando, assim, a individualidade de cada caso.

Torna-se perceptível, então, que não é possível delimitar o conceito de infração de menor potencial ofensivo com base apenas no critério da quantidade de pena máxima em abstrato. Nem é possível concluir que a competência dos Juizados Especiais Criminais seja estabelecida a partir deste conceito. E, tanto não é possível chegar a tais conclusões, que a própria Lei nº 9.099/95 reconhece esta impossibilidade, em seu artigo 77, parágrafo segundo. É dizer, se o delito, cuja pena não ultrapassa o limite de dois anos, apresentar complexidade, consoante as circunstância do caso concreto, não restará alternativa ao Ministério Público que não seja a de requerer ao magistrado o encaminhamento das peças existentes ao juízo que entender ser o competente.

E, aí, uma pergunta se impõe: qual a utilidade prática em definir a infração de menor potencial ofensivo como o delito cuja pena máxima em abstrato não ultrapassa o limite de dois anos, se esta definição não é garantia de fixação da competência dos Juizados Espe-ciais Criminais? Para que definir algo segundo uma determinada forma, se ela é falível? Eis o que é a definição legal de infração de menor potencial ofensivo, um ato de precipitação. E, como se sabe, a precipitação é o primeiro sintoma do desespero. O desespero que assalta o Estado Moderno e que impulsiona as legislações de emergência,29 o desespero pela manutenção de sua legitimidade e do seu aparato de controle.

4. INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO: O PROBLEMA DA LEGITIMIDADE

Foi dito anteriormente que a noção de infração de menor potencial ofensivo é incompatível com a própria instituição dos Juizados Especiais Criminais. Também foi dito que a definição legal de infração de menor potencial ofensivo precisa ser repensada a partir da valorização do caso e da distinção entre texto de lei e norma. Afirmou-se ainda que, no contexto de uma sociedade complexa e diferenciada como a atual, é preciso compreender a dogmática jurídica a partir de um viés retórico, o qual não pode ser reduzido apenas a uma retórica prática. E, por fim, foi dito, também, que a definição legal de infração de menor potencial ofensivo apresenta alguns problemas, os quais foram rapidamente abordados. Diante disso, uma pergunta se impõe: qual a finalidade do legislador constituinte ao se valer do conceito de infração de menor potencial ofensivo no artigo 98, inciso I, da CR e, ao mesmo tempo, correlacioná-lo à ideia de Juizados Especiais Criminais?

Sugere-se, aqui, uma resposta: tentar resgatar a legitimidade do Poder Judiciário perante a sociedade contemporânea. Isto mesmo, se o Poder Judiciário é a última tábua

29 “Desse fino equilíbrio surge o estado de paz, para o qual não contribui em muita coisa a (in)cultura e a (in)disciplina da emergência, mormente quando deixa no ar a falsa impressão que os mecanismos por ela preconizados são inerentes ao estado de direito.” Cf. CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal de emergência. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 13.

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de salvação da dogmática jurídica,30 em meio ao espetáculo da diluição da tripartição de poderes, os Juizados Especiais se constituem em uma das mais recentes estratégias de sobrevivência do moribundo Estado Moderno. Esse Estado que, no século XIX, buscou se legitimar por meio do Poder Legislativo - e, para isso, basta observar a França que sucedeu à Revolução Francesa e o seu minucioso Código Civil de 1804 (Código de Napoleão) - e que hoje, no século XXI, procura justificar a sua existência, utilidade e legitimidade a partir do Poder Judiciário. Mas, no momento em que a legitimidade deixa de ser sinônimo de legalidade, surge para o Estado e o seu Poder Judiciário um novo desafio, o desafio de reconstruir o seu discurso de justificação. O desafio de sobreviver!

E este desafio não é fácil, vez que o que se assiste hoje é exatamente a crise do Poder Judiciário. Se é certo afirmar que nunca antes o Poder Judiciário foi tão valorizado, não é menos certo admitir que ele nunca se viu tão questionado. Todo bônus traz consigo os seus ônus, e com o Judiciário não é diferente. A luz que põe em evidência a estrela da companhia teatral do Estado Moderno é a mesma que lhe expõe às vaias da plateia.31 Ora, não é o Poder Judiciário que é acusado de lento? Não é o Poder Judiciário que é questionado pelas suas decisões variáveis e imprevisíveis? Não é o Poder Judiciário que é achincalhado pela circunstância de que os acusados não são devidamente punidos? Não é Poder Judiciário que é criticado pelos seus altos salários e pela estrutura altamente dispendiosa aos cofres públicos? Enfim, não é o Poder Judiciário que, muitas vezes, acaba por agravar o conflito que deveria, em tese, solucionar?32

E é em meio a este cenário que os Juizados Especiais Criminais surgem como a es-tratégia do Estado na disputa pela legitimidade. Uma disputa travada, aparentemente, com as

30 OLIVEIRA, Ana Carla Farias de; NASCIMENTO, Guadalupe Feitosa Alexandrino Ferreira do. Dogmática jurídica na produção acadêmica nacional: estado da arte. No prelo, passim.

31 Se se admitir que a plateia, em questão, é o povo, surge, então, uma das mais importantes questões da ciência política, relativa à democracia: quem é o povo? Essa é a questão que atormenta Friedrich Müller. Nesse sentido, consulte-se MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo?: a questão fundamental da democracia. Tradução Peter Naumann. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Max Limonad, 2003. passim. Ainda com espeque na lição de Friedrich Müller, convém indagar: quem é o povo do qual a Constituição fala? Quem pertence ao povo, se a população não quer (ou não pode) participar? Como adverte Adeodato, a “unidade do povo, assim como a unidade entre Estado e Constituição, não parecem algo óbvio, sobretudo se o povo não pode ou não quer ‘participar’. A grande questão passa a ser justamente ‘quem’ pertence ao povo, quem é o povo, essa é a questão fundamental da democracia. Mais crucial ainda se torna esse problema com a participação cada vez menor dos cidadãos nas eleições das democracias centrais, quando até o Estado social e democrático de direito encontra dificuldade em despertar fidelidade e compromisso em cidadãos que não se consideram beneficiários dele”. Cf. ADEODATO, op. cit., p. 153.

32 “Compreende-se porque as instituições penais de privação de liberdade (e sócio-educativas, no caso dos adolescentes) terminam por agravar a sensação de desvinculação social em relação ao mundo ‘legítimo’ e, assim, reforçam a referência do ‘mundo do crime’ nas trajetórias. [...] Este circuito monotemático, que fortalece a identidade do ‘criminoso’, aparece justamente quando o Estado passa a mediar suas relações sociais.” Cf. FELTRAN, Gabriel de Santis. O legítimo em disputa: as fronteiras do mundo do crime nas periferias de São Paulo. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 1, p. 116, 2008.

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instâncias ilícitas de controle. É dizer, os Juizados surgem como a mais nova arma do Estado na guerra pela manutenção do monopólio do poder de punir. Uma guerra que caracteriza a sociedade contemporânea e que traz alguma preocupação ao Estado Moderno, na medida em que este, no âmbito criminal, nunca antes se viu tão incomodado pela concorrência das instâncias ilícitas de controle social, a exemplo das organizações criminosas. Neste con-texto, melhor se compreendem institutos como o da infração de menor potencial ofensivo.

Institutos que funcionam como chaves de acesso a uma nova tecnologia de preser-vação do monopólio do poder de punir do Estado. Uma tecnologia que compreende, por exemplo, a transação penal,33 a qual é vendida como uma ferramenta ágil que propicia a rápida resolução do conflito, mas que, na verdade, não passa de uma mercadoria em meio a um jogo de barganha,34 na luta pela manutenção do poder de punir. Em outras palavras, o Estado dá a impressão de que cede uma parte do seu poder de punir à vítima, por exemplo, e em troca garante a sua sobrevivência, isto é, a legitimidade do seu monopólio.

Sendo assim, convém formular a seguinte pergunta: o Estado está vencendo esta guerra? Ao que tudo indica, não, seja porque os juizados não apresentam a celeridade e a efetividade que deles se espera, seja porque não parecem ter ajudado em nada a conter o crescente e preocupante número de infrações penais que não chegam ao conhecimen-to do Estado. Aliás, desconfia-se de que os juizados acabaram por agravar o problema das cifras ocultas, vez que a sua instituição e a definição de infração de menor potencial ofensivo, ao que parece, terminaram servindo de incentivo para o aumento desta situação.

E o pior é que, se essa premissa estiver certa, os juizados, que foram instituídos com a finalidade de aproximar o Estado da população, parecem estar ampliando, ainda mais, o fosso que os separa. Um fosso danoso ao controle dos conflitos criminais, na medida em que esses deveriam, em tese, ser resolvidos pelo Estado por meio do caminho necessário35 do processo penal, o que, por sua vez, compromete a credibilidade de qualquer política de segurança pública e propicia uma desconfiança ainda maior quanto ao aparato do Estado, em especial no que se refere à polícia. Qual é o embasamento racional e estratégico de uma política de segurança pública fundada em dados sem qualquer correspondência com a realidade social?

33 Para uma crítica contundente à transação penal, faz-se necessário estudar a obra de Geraldo Prado. O autor critica a transação penal a partir dos seguintes pilares, são eles: a inquisitorialidade da transação penal, a desigualdade entre os sujeitos envolvidos, o desrespeito à autonomia da vontade do suposto autor do fato aparentemente delituoso e a privação do devido processo legal por meio das técnicas de sumarização. Sobre o assunto consulte-se PRADO, Geraldo. Elementos para uma análise crítica da transação penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 173-220.

34 O jogo de barganha é um dos ramos da teoria dos jogos de maior interesse prático, se não for o maior. Cf. BIERMAN, H. Scott; FERNANDEZ, Luis. Teoria dos jogos. 2. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2010. passim.

35 Sobre o princípio da necessidade no processo penal, consulte-se LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 23-26.

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20 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

CONCLUSÃO

E a guerra que é travada pelo Estado é, de fato, contra as instâncias ilícitas de controle social? O que parece é que, em verdade, não há uma guerra entre o Estado e as instâncias ilícitas de controle. O que parece é que os Juizados Especiais Criminais não substituem estas instâncias, nem estas representam uma forma de poder paralelo, como relata Gabriel de Santis Feltran, referindo-se ao Primeiro Comando da Capital (PCC).36 Estes dois organismos de controle social, os juizados e as instâncias ilícitas, antes parecem concorrer entre si e, ao mesmo tempo, completar-se um ao outro, como etapas de uma escala de resolução de conflitos. Concorrem porque coexistem em um mesmo espaço de conflito e complementam-se porque ambos se aproveitam um do outro.

É certo que as resoluções levadas a efeito pelas instâncias ilícitas de controle não são reconhecidas pelo Direito, nem tampouco funcionam como mecanismos de media-ção. Todavia, não é menos certo que elas acabam por filtrar alguns dos muitos conflitos que chegariam aos juizados e que acabariam por abarrotar ainda mais as prateleiras do Poder Judiciário. Sendo assim, é inegável que, se o Estado não incentiva a existência de tais instâncias ilícitas de controle, ele também se aproveita, e muito, da existência delas.

E com os Juizados Especiais Criminais isso não é diferente. Afinal, a infração penal de menor potencial ofensivo, ao mesmo tempo em que amplia os domínios do poder punitivo do Estado, símbolo de uma política criminal fundada na teoria das janelas quebradas,37 con-vive e se aproveita das instâncias ilícitas de controle. Nesse sentido, a concepção retórica em torno da dogmática jurídica guarda grande afinidade com a concorrência travada entre o Estado (representado pelos Juizados Especiais Criminais) e essas instâncias ilícitas.

Isto porque a concepção retórica acerca da dogmática jurídica tem como um de seus objetivos enfrentar o problema da legitimidade que caracteriza a sociedade complexa atual.38 E, por sua vez, o problema da legitimidade é, em última análise, o problema da disputa estabelecida entre o Estado e o “mundo do crime” em torno do que é socialmente legítimo.39 Definir o que é socialmente legítimo é, antes de tudo, um risco ao qual o Estado

36 O Primeiro Comando da Capital, conhecido tanto pela sigla PCC como pela alcunha de “Partido”, é uma das organizações criminosas mais importantes do Estado de São Paulo. As fronteiras do mundo do crime nas periferias de São Paulo e, por consequência, a atuação do PCC, é o tema da linha de pesquisa de Gabriel Feltran. Nesse sentido, consulte-se: FELTRAN, op. cit., p. 93.

37 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; CARVALHO, Edward Rocha de. Teoria das janelas quebradas: e se a pedra vem de dentro? Revista de Estudos Criminais, Porto Alegre: Notadez; ITEC, v. 3, 2003. Fasc. 11, p. 23-29.

38 ADEODATO, João Maurício. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 189.

39 A expressão “mundo do crime” é aqui empregada como sinônimo das instâncias ilícitas de controle. O uso dessa expressão é feito aqui em referência ao sentido que Gabriel Feltran atribui a tal locução. Segundo ele, mundo do crime é “o conjunto de códigos e sociabilidades estabelecidas, prioritariamente no âmbito local, em torno dos negócios ilícitos do narcotráfico, dos roubos e furtos”. Cf. FELTRAN, op. cit., p. 93. Mais

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e o seu monopólio do poder de punir se encontram sujeitos, vez que esta definição passa pelo questionamento do monopólio estatal sobre o poder de punir. E é em meio a esse risco que a concepção retórica acerca da dogmática jurídica se torna uma importante aliada do Estado nesta batalha.

Um excelente exemplo da contribuição que uma concepção retórica acerca da dogmática jurídica oferece é a análise cética que ela tem capacidade de fazer a respeito dos juizados e do conceito de infração de menor potencial ofensivo. Uma análise que pode ser empreendida sobre a própria produção da sentença por meio do procedimento sumaríssimo. Afinal, como sustentar o discurso da busca pela verdade, seja lá ela qual for,40 diante de um procedimento sumaríssimo, de uma estrutura inquisitorial e de uma instrução demasiadamente restringida?41 Fica claro que a sentença não é um ato de certeza, mas, sim, de confiança.42 Ora, quando se percebe que é a confiança que legitima a norma jurídica que resulta da sentença, logo se conclui que decidir não é encontrar a verdade, e, sim, persuadir quem se encontra sujeito à decisão.

O juiz não é um padre que diz a verdade porque foi tocado por Deus, antes se mostra um político que busca convencer o seu eleitorado, as partes. Eis, então, o ponto fundamental no que toca à legitimidade e à disputa em torno dela na sociedade contem-porânea. Legítimo não é o que se encontra definido em lei, mas, sim, aquilo que tem a capacidade de despertar a confiança dos sujeitos envolvidos no conflito, do qual a infração de menor potencial ofensivo é um exemplo. Por conseguinte, o ponto fundamental da dogmática jurídica contemporânea é conseguir, na produção da norma jurídica, despertar a confiança nos sujeitos, estejam eles envolvidos, ou não, no conflito levado a juízo. É dizer, o problema fundamental do Estado na atualidade é, ao mesmo tempo, despertar a confiança da sociedade e fragilizar a confiança que as instâncias ilícitas de controle

adiante, referindo-se à disputa pela legitimidade, Feltran arremata, afirmando que “a política não se resume à disputa de poder em terrenos institucionais, mas pressupõe um conflito anterior, travado no tecido social, constitutivo da definição dos critérios pelos quais os grupos sociais podem ser considerados legítimos. É nessa perspectiva que a disputa pela legitimidade que emerge das fronteiras do ‘mundo do crime’, nas periferias de São Paulo, sugere significados políticos bastante mais amplos”. Cf. FELTRAN, op. cit., p. 123.

40 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Glosas ao “Verdade, dúvida e certeza” de Francesco Carnelutti, para os operadores do Direito. In: Anuário Ibero-Americano de Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.

41 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Manifesto contra os juizados especiais criminais: uma leitura de certa “efetivação” constitucional. In: SCAFF, Fernando Facury (Org.). Constitucionalizando direitos: 15 anos da Constituição brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 347-438.

42 “A retórica se fundamenta na confiança. Esta frase parece revelar ingenuidade ou intenções demagógicas. Na Alemanha pode-se dizer: retórica causa desconfiança. Também no passado o apoio a este ressentimento foi declaradamente um dever do filósofo. Os alemães nunca demonstraram um talento especial para com a ‘gaia ciência’ e a retórica é justamente uma das disciplinas desta.” Cf. BALLWEG, Ottmar. Retórica analítica e Direito. Tradução João Maurício Adeodato. Revista Brasileira de Filosofia, São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, n. 163, 1991. Fasc. 39, p. 175-184.

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provocam, por exemplo, na periferia de São Paulo.43 Afinal, na disputa pela legitimidade, a confiança é a mais importante de todas as armas.

Mas é preciso noticiar um risco inerente à concepção retórica na tentativa de reconstruir a legitimidade do Estado. Quando a infração de menor potencial ofensivo se compromete com o caso, corre-se o risco de que o caso, aquilo que singulariza a norma, que busca consolidar a confiança abalada, torne-se um novo rótulo de consumo. Se é certo que o caso torna a norma única e diferente, e isso auxilia o Estado na disputa pela legitimidade, não é menos certo que esta mesma diferença parece ter sido elevada à última moda pela sociedade do consumo, esta forma sutil de violência44 produzida pela razão moderna ocidental capitalista. E, quando se percebe isso, logo se constata que a razão moderna capitalista, em sua constante transformação, se adapta e se apodera das novas ferramentas que procuram denunciá-la. Neste momento, então, tudo começa de novo, em um processo de eterno retorno.45

43 “A depender do problema enfrentado, um jovem de Sapopemba pode, por exemplo, propor uma ação trabalhista ou exigir justiça em ‘tribunais’ do PCC; pode integrar os atendimentos de uma entidade social ou pedir auxílio ao traficante.” Cf. FELTRAN, op. cit., p. 123.

44 Convém pôr em relevo, com espeque na lição de Jean Baudrillard, que a violência empreendida pela sociedade de consumo desempenha as seguintes funções e apresenta os seguintes aspectos: (a) a grande massa “pacificada” é quotidianamente alimentada pela violência consumida e pela violência alusiva a toda substância apocalíptica do mass media, como forma de dar vazão à agressividade e ao instinto destrutivo inerente ao ser humano (além do fascínio - poder e prazer - exercido pela morte); (b) a violência como estratégia para despertar uma obsessão por segurança e bem-estar e provocar uma febre de consumo bélico; (c) a violência “espetacularizada” e o conformismo da vida quotidiana como realidades abstratas que se alimentam de mitos e signos; (d) a violência ministrada em “doses homeopáticas” pela mídia como forma de realçar a fragilidade real da vida pacificada, vez que é o espectro da fragilidade que assedia a civilização da abundância, à medida que evidencia o equilíbrio precário que firma a ordem de contradições que constitui a sociedade contemporânea; (e) a violência inexplicada como uma imposição de revisão das ideias de abundância e das taxas de crescimento da economia, em face das contradições fundamentais da abundância; (f) a violência que desperta como consequências, dentre outras, a destrutividade das instituições e a depressividade contagiosa da população, passando por condutas coletivas de fuga (como, por exemplo, o aumento do consumo de drogas ilícitas ou não); (g) a violência que resulta da pulsão desencadeada pelo consumo, o condicionamento do espectador diante do apelo do espetáculo, como estratégia de manipulação do desejo; (h) a violência que conduz à reabsorção das angústias mediante a proliferação das terapias, dos tranquilizantes, ou seja, a sociedade de abundância, produtora de satisfação sem finalidade, esgota os recursos a produzir o antídoto para a angústia derivada da satisfação. Consulte-se: BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Lisboa: 70 Arte & Comunicação, 2007. p. 184-191.

45 “Causa e efeito. Costumamos empregar a palavra ‘explicação’, quando a palavra correta seria ‘descrição’, para designar aquilo que nos distingue dos estágios anteriores de conhecimento e de ciência. Sabemos descrever melhor do que nossos predecessores; explicamos tão pouco como eles. Descobrimos sucessões múltiplas onde o homem e o sábio ingênuos das civilizações precedentes viam apenas duas coisas, ‘causa’ e ‘efeito’, como se dizia; aperfeiçoamos a imagem do devir, mas não fomos além dessa imagem. Em cada caso, a série de ‘causas’ se apresenta mais completa; deduzimos que é preciso que esta ou aquela coisa tenha sido precedida para que se lhe suceda outra; mas isso não nos leva a compreender nada. [...] Só operamos com coisas que não existem: linhas, superfícies, corpos, átomos, tempos divisíveis; como havia de existir sequer possibilidade de explicar quando começamos por fazer de qualquer coisa uma imagem, a nossa imagem! [...] Causa e efeito: trata-se de uma dualidade que certamente nunca existirá; assistimos,

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23INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

O eterno retorno no qual a razão aprisiona os mortais, a exemplo do castigo imposto por Hades a Sísifo.46 Afinal, quando Zeus venceu seu pai, Cronos, que havia colocado ordem no Caos original do universo,47 a razão se tornou a nova ferramenta de controle dos mortais. Nesse instante, quando Zeus se tornou o deus dos deuses, o senhor do Olimpo, inaugurou-se uma nova forma de tirania, a tirania da razão. A razão, essa sofisticada forma de violência, a mais perfeita das formas de poder, aquela que controla sem ser percebida. Eis o que é a infração de menor potencial ofensivo, mais um dos artefatos da razão moderna.

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46 COMMELIN, op. cit., p. 200.47 COMMELIN, op. cit., p. 11.

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COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALhO PARA EXPEDIR ALVARÁ JUDICIAL DESTINADO à LIBERAÇÃO DO FGTS INDEPENDENTEMENTE DO AJUIzAMENTO DE

RECLAMAÇÃO TRABALhISTA

CLÁUDIO DIAS LIMA FILHOMestre em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia - UFBA.

Procurador do Trabalho da 5ª Região/BA. Professor de Direito Processual do Trabalho da Faculdade de Tecnologia e Ciências - FTC.

SUMÁRIO: Introdução - 1. Perspectiva histórica acerca da competência para a expedição do alvará judicial relativo à liberação do FGTS: 1.1. Histórico constitucional acerca da competência da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal; 1.2. Legislação do FGTS e a jurisprudência sedimentada no Superior Tribunal de Justiça - 2. A mudança de competência provocada pela Emenda Constitucional nº 45/2004: 2.1. As expressões “oriundas” e “decorrentes”; 2.2. Relação de trabalho sem postulação em face do empregador ou do tomador - 3. A evolução da jurisprudência do TST a respeito do assunto: 3.1. Antes da Emenda Constitucional nº 45/2004; 3.2. Após a Emenda Constitucional nº 45/2004 - Conclusões - Referências.

RESUMO: O texto analisa a competência da Justiça do Trabalho para julgar os pedidos de concessão de alvará judicial destinados ao levantamento das quantias depositadas na conta vinculada do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), tendo em vista a norma do art. 114, I, da Constituição. A partir de um estudo calcado no Direito Processual do Trabalho e no Direito Constitucional, objetiva-se, com base numa análise qualitativa calcada nos métodos dialético e hipotético-dedutivo, demonstrar que essa demanda deve ser ajuizada perante a Justiça do Trabalho, não sendo justificável a manutenção de entendimentos, sustentados por parte da doutrina e da jurisprudência, restritivos a essa competência.

PALAVRAS-CHAVE: competência da Justiça do Trabalho; Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); alvará judicial; demanda oriunda da relação de trabalho.

ABSTRACT: The text analyzes the jurisdiction of Labor Court to judge the concession requests of court order for the withdrawal of amounts deposited in the escrow account

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26 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

of the Unemployment Guarantee Fund (FGTS), in view of the norm of Art. 114, I, of the Brazilian Constitution. As from a study based on Labor Procedure Law and Constitutional Law, the text, leaving from a qualitative analysis based in the dialectical method and in the hypothetical-deductive method, aims to demonstrate that this claim must be filed before the Labor Court, not being justified the maintenance of understandings, supported by part of the doctrine and jurisprudence, which aim to restrict this jurisdiction.

KEYWORDS: jurisdiction of Labor Court; Unemployment Guarantee Fund (FGTS); court order; claim arising out of the employment relationship.

INTRODUÇÃO

A redação atribuída ao art. 114 da Constituição pela Emenda Constitucional nº 45/2004, embora já não seja tão recente assim, ainda suscita muitos questionamentos na jurisprudência. Apesar do perfil conservador do texto da Emenda, sua promulgação modificou profundamente a delimitação da competência constitucional da Justiça do Tra-balho, sendo este o ramo do Poder Judiciário mais afetado pela reforma constitucional.

Diante dessas mudanças constitucionalmente estabelecidas - alterações que não foram acompanhadas por um regramento infraconstitucional condizente com esse novo perfil -, existem ainda diversos pontos de incerteza quanto ao efetivo alcance dessas modificações. Uma dessas indefinições - talvez a principal delas - é a que diz respeito à delimitação do sentido da expressão “oriundas da relação de trabalho”, que consta no art. 114, I, da Constituição, como regra principal a definir a competência da Justiça do Trabalho.

Tradicionalmente a doutrina e a jurisprudência sempre rejeitaram a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar os pedidos de “alvará” de liberação dos valores depositados nas contas vinculadas atinentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Os textos constitucionais e a legislação infraconstitucional reforçaram essa ideia, não permitindo a adoção de outra conclusão a respeito.

A mudança provocada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, porém, inseriu novos aspectos relevantes quanto ao tema, que ainda não foram dimensionados adequadamente.

Para os fins deste texto, propõe-se a análise acerca da competência da Justiça do Trabalho e da legislação do FGTS, enfatizando suas transformações no decorrer do tempo, até a promulgação da EC nº 45/2004. Depois, passa-se à análise das modificações constitucionais promovidas por essa Emenda. Por fim, pretende-se abordar a competência da Justiça do Trabalho para apreciar demanda autônoma, ajuizada perante a Vara do Tra-balho, com a finalidade de obter-se alvará judicial para a liberação dos valores do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) depositados na conta vinculada do trabalhador, cujo saque esteja sendo negado pela Caixa Econômica Federal.

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27COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

1. PERSPECTIVA hISTÓRICA ACERCA DA COMPETÊNCIA PARA A EXPEDIÇÃO DO ALVARÁ JUDICIAL RELATIVO à LIBERAÇÃO DO FGTS

1.1. histórico Constitucional Acerca da Competência da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal

A Constituição de 1937 havia promovido a extinção da Justiça Federal (art. 185),1 situação mantida pela Constituição de 1946. Já sob o regime ditatorial militar, foi editado, em 27 de outubro de 1965, o Ato Institucional nº 2 (AI-2), que reinseriu a Justiça Federal na organização judiciária nacional (nova redação ao art. 94, II, da Constituição de 1946), competindo-lhe julgar, dentre outras, “as causas em que a União ou entidade autárquica federal for interessada como autora, ré, assistente ou opoente, exceto as de falência e acidentes de trabalho” (nova redação ao art. 105 § 3º, a, da Constituição de 1946). A mesma regra foi inserida na Lei Orgânica da Justiça Federal (art. 10, I, da Lei nº 5.010/66). Quanto à Justiça do Trabalho, a Constituição de 1946 dispunha competir a ela “conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores, e as demais controvérsias oriundas de relações do trabalho regidas por legislação especial” (art. 123, caput). Assim, tendo em vista que a competência da Justiça Federal não excepcionava as relações de emprego envolvendo a União e suas autarquias, o AI-2 fixou a competência da Justiça Federal para essas causas, excluindo a competência da Justiça do Trabalho.

A Constituição de 1967, em sua redação original, dispunha competir aos juízes federais processar e julgar “as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal for interessada na condição de autora, ré, assistente ou opoente, exceto as de falência e as sujeitas à Justiça Eleitoral, à Militar ou à do Trabalho, conforme determina-ção legal” (art. 119, I). Com isso, a Justiça do Trabalho tornava a ser competente para julgar todas as demandas trabalhistas, incluindo aquelas que envolvessem as pessoas jurídicas de direito público pertencentes à Administração Pública federal, pois o texto constitucional não consignava qualquer exceção (art. 123, caput: “compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e as demais controvérsias oriundas de relações de trabalho regidas por lei especial”).

Com o advento da Emenda Constitucional nº 01/69, o art. 142 da Constituição de 1967 foi alterado para estipular que competiria à Justiça do Trabalho “conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e, mediante lei, outras controvérsias oriundas de relação de trabalho”. Limitando-se a julgar dissídios entre empre-gados e empregadores, remanescia a ideia de que nenhuma pessoa ou entidade estranha à relação de emprego poderia demandar na Justiça do Trabalho, salvo se houvesse lei

1 “Art. 185. O julgamento das causas em curso na extinta Justiça Federal e no atual Supremo Tribunal Federal será regulado por decreto especial que prescreverá, do modo mais conveniente ao rápido andamento dos processos, o regime transitório entre a antiga e a nova organização judiciária estabelecida nesta Constituição.”

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28 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

específica em sentido contrário, estendendo a competência a outras questões atinentes a relações de trabalho. As relações empregatícias travadas pela União, autarquias e em-presas públicas federais, independentemente do regime jurídico adotado, seriam julgadas pela Justiça Federal (art. 110 da Constituição de 1967, com a redação que lhe foi atribuída pela Emenda Constitucional nº 01, de 1969), não havendo, na delimitação da competência desse ramo do Judiciário, a exclusão a causas de competência da Justiça do Trabalho, pois o art. 125, I, modificado pela Emenda nº 01/69, estipulava competir aos juízes federais processar e julgar “as causas em que a União, entidade autárquica ou emprêsa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés assistentes ou opoentes, exceto as de falência e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Militar”.

A Constituição de 1988 ampliou timidamente esse rol (art. 114), prevendo a com-petência da Justiça do Trabalho para processar e julgar demandas entre trabalhadores e empregadores, incluindo os empregados estatais da União e das pessoas jurídicas com-ponentes da Administração Pública federal, ao contrário da ordem constitucional anterior. Também se assinalou a competência para “litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas”, bem como as demandas que veiculassem, “na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho”. É curioso cons-tatar, nessa breve retrospectiva, que o art. 142 do texto constitucional anterior utilizava a expressão “oriundas de relação de trabalho”, enquanto a redação original do art. 114 da Constituição de 1988 consignava a expressão “decorrentes da relação de trabalho”.

Essa, pois, a evolução constitucional no tratamento da competência da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho. O advento da Emenda Constitucional nº 45/2004 refor-mulou profundamente essas noções, o que será analisado pormenorizadamente adiante, em tópico próprio.

1.2. Legislação do FGTS e a Jurisprudência Sedimentada no Superior Tribunal de Justiça

O FGTS, originariamente, era regido pela Lei nº 5.107/66, que estipulava caber ao empregador a abertura de conta vinculada em favor do empregado, em estabelecimento bancário de escolha patronal (art. 2º, parágrafo único). A instituição escolhida deveria ser credenciada pelo Banco Central da República do Brasil e admitida à rede arrecadadora por meio de convênio firmado junto ao BNH - Banco Nacional da Habitação2 (art. 10 do Decreto nº 59.820/1966, que regulamentou a Lei).

A Lei nº 5.107, que instituiu o FGTS, é de setembro de 1966, alguns meses antes, portanto, da Constituição de 1967 e ainda sob a égide da Constituição de 1946 alterada

2 O Banco Nacional da Habitação foi criado pelo art. 16 da Lei nº 4.380/64: “Fica criado, vinculado ao Ministério da Fazenda, o Banco Nacional da Habitação (BNH), que terá personalidade jurídica de Direito Público, patrimônio próprio e autonomia administrativa, gozando de imunidade tributária”. Foi extinto pelo Decreto-Lei nº 2.291/86, em face de sua incorporação à estrutura da Caixa Econômica Federal.

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29COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

pelo AI-2, que negava competência à Justiça do Trabalho para as causas envolvendo a União, as autarquias federais e as empresas públicas federais. O seu art. 31 dispunha que “esta Lei entrará em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da publicação de seu Regulamento, revogadas as disposições em contrário”. O Regulamento do FGTS, Decreto nº 59.820, somente foi editado em dezembro de 1966, entrando em vigor, juntamente com a Lei, em 1º de janeiro de 1967, ao passo que a Constituição de 1967 somente entraria em vigor em 15 de março de 1967, conforme dispunha o art. 189 desse texto constitucional.

A competência para processar e julgar as demandas que tratassem do FGTS era regida pelo art. 22 da Lei nº 5.107/66, que estipulava o seguinte:

Art. 22. É competente a Justiça do Trabalho para julgar os dissídios entre os empregados e as emprêsas oriundos da aplicação desta Lei, mesmo quando o BNH e a Previdência Social figurem no feito como litisconsortes.

Como visto anteriormente, o AI-2, ao reinstituir a Justiça Federal como órgão do Poder Judiciário nacional, atribuiu-lhe competência para julgar, dentre outras, “as causas em que a União ou entidade autárquica federal for interessada como autora, ré, assistente ou opoente, exceto as de falência e acidentes de trabalho” (nova redação ao art. 105, § 3º, a, da Constituição de 1946). Assim, a competência da Justiça Federal não excepcionava as relações de trabalho, atraindo as causas trabalhistas que envolvessem a União ou autarquia federal. Essa exclusão somente veio a figurar no texto constitucional seguinte, de 1967, nos termos do art. 119, I, que excluía da competência da Justiça Federal as causas “de falência e as sujeitas à Justiça Eleitoral, à Militar ou à do Trabalho, conforme determinação legal”.

Sendo assim, e tendo em vista que a Lei nº 5.107/66 entrou em vigor em 1º de janeiro de 1967, dois meses e meio antes da entrada em vigor da Constituição de 1967, é possível concluir que esse litisconsórcio era inconstitucional, pois não era possível que, sob a égide da Constituição de 1946 com as alterações dos Atos Institucionais posterio-res, pessoa jurídica de direito público pertencente à Administração Federal pudesse ser demandada na Justiça do Trabalho. A intervenção do BNH e/ou do INPS, como entidades federais que eram, deveria deslocar a competência para a Justiça Federal, sendo inviável a manutenção do feito na Justiça do Trabalho.

Outorgada a nova Constituição (a de 1967), a norma legal amoldou-se ao novo texto constitucional, ao contrário do que ocorria à época de sua edição. Ocorreu, pois, o fenômeno da constitucionalidade superveniente, segundo o qual o texto constitucional novo promoveria uma convalidação de norma que, originariamente, era incompatível com a ordem constitucional então vigorante.3

3 Por entender que a norma inconstitucional é natimorta e, portanto, nula, o Supremo Tribunal Federal tem rejeitado a ideia de constitucionalidade superveniente no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido: “CONSTITUCIONAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE INATIVOS E PENSIONISTAS.

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30 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

A Emenda nº 01/69, ao contrário do texto de 1967, promoveu mais uma restrição à competência da Justiça do Trabalho, ao estipular que aos juízes federais competia processar e julgar “as causas em que a União, entidade autárquica ou emprêsa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés assistentes ou opoentes, exceto as de falência e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Militar” (art. 125, I). Assim, mais uma vez, a especialização da competência da Justiça Federal sobrepujava a da Justiça do Trabalho. E, a partir daí, a disciplina do art. 22 da Lei nº 5.107/66 tornou-se, nesse ponto, “novamente inconstitucional”, não havendo como a eventual intervenção do BNH e/ou do INPS no feito não provocar o deslocamento de competência.

Já sem a pecha da inconstitucionalidade - pois o art. 114 da Constituição de 1988, em sua redação original, estipulava que a Justiça do Trabalho deteria competência inclusive para apreciar causas envolvendo “os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União” - a Lei nº 8.036/90 revogou a Lei nº 5.107/66 integralmente, mas regulou a matéria de maneira praticamente idêntica à sua antecessora legislativa:

Art. 26. É competente a Justiça do Trabalho para julgar os dissídios entre os trabalhadores e os empregadores decorrentes da aplicação desta lei, mesmo quando a Caixa Econômica Federal e o Ministério do Trabalho e da Previdência Social figurarem como litisconsortes.

CONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE. TESE REJEITADA PELA JURISPRUDÊNCIA DO STF. AGRAVO IMPROVIDO. I - A jurisprudência do Tribunal é no sentido de que é inconstitucional a cobrança de contribuição previdenciária sobre os proventos de inativos e pensionistas após o advento da EC 20/98 até a edição da EC 41/2003. II - A EC 41/2003 não constitucionalizou as leis editadas em momento anterior à sua edição que previam aquela cobrança. Necessária a edição de novo diploma legal, já com fundamento de validade na EC 41/2003, para instituir a exação questionada. III - Agravo regimental improvido” (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 490676 AgR/MG, Relator: Ministro Ricardo Lewandowski, Órgão julgador: Primeira Turma, Brasília, DF, 09 de novembro de 2010. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?id=617049>. Acesso em: 19 jul. 2011). E ainda: “Ação Direta de Inconstitucionalidade. AMB. Lei nº 12.398/98-Paraná. Decreto Estadual nº 721/99. Edição da EC nº 41/03. Substancial alteração do parâmetro de controle. Não ocorrência de prejuízo. Superação da jurisprudência da Corte acerca da matéria. Contribuição dos inativos. Inconstitucionalidade sob a EC nº 20/98. Precedentes. 1. Em nosso ordenamento jurídico, não se admite a figura da constitucionalidade superveniente. Mais relevante do que a atualidade do parâmetro de controle é a constatação de que a inconstitucionalidade persiste e é atual, ainda que se refira a dispositivos da Constituição Federal que não se encontram mais em vigor. Caso contrário, ficaria sensivelmente enfraquecida a própria regra que proíbe a convalidação. 2. A jurisdição constitucional brasileira não deve deixar às instâncias ordinárias a solução de problemas que podem, de maneira mais eficiente, eficaz e segura, ser resolvidos em sede de controle concentrado de normas. 3. A Lei Estadual nº 12.398/98, que criou a contribuição dos inativos no Estado do Paraná, por ser inconstitucional ao tempo de sua edição, não poderia ser convalidada pela Emenda Constitucional nº 41/03. E, se a norma não foi convalidada, isso significa que a sua inconstitucionalidade persiste e é atual, ainda que se refira a dispositivos da Constituição Federal que não se encontram mais em vigor, alterados que foram pela Emenda Constitucional nº 41/03. [...] 7. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente” (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2158/PR, Relator: Ministro Dias Toffoli, Órgão julgador: Tribunal Pleno, Brasília, DF, 15 de setembro de 2010. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?id=617876>. Acesso em: 19 jul. 2011).

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31COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

Em ambas as leis, a amplitude do objeto da contenda (competência da Justiça do Trabalho para julgar, nos dois casos, dissídios a respeito da “aplicação desta lei”) parece alargar a competência da Justiça do Trabalho, mas uma limitação subjetiva reafirma a restrição de seu alcance: na lei de 1966, os dissídios referiam-se somente a “emprega-dos e empresas”, enquanto na lei de 1990, a “trabalhadores e empregadores”, tal como ocorria nos textos constitucionais vigentes à época da edição de cada uma dessas leis.4 A possibilidade de outras instituições ingressarem no feito - BNH e Previdência Social na lei de 1966 e Caixa Econômica Federal e Ministério do Trabalho e da Previdência Social na lei de 1990 - somente ocorreria na hipótese de litisconsórcio, pouco comum, na prática.

Atento à limitação da competência da Justiça do Trabalho quanto ao critério subjetivo (apenas demandas contra empregadores), o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 82, segundo a qual “compete à Justiça Federal, excluídas as reclamações trabalhistas, processar e julgar os feitos relativos a movimentação do FGTS”. O entendimento estava lastreado na redação original do art. 114 da Constituição, segundo o qual a Justiça do Trabalho teria competência para julgar dissídios entre “trabalhadores e empregadores”. Não figurando a Caixa Econômica Federal, agente operadora do Fundo (art. 7º da Lei nº 8.036/90), como empregadora do trabalhador reclamante, a hipótese seria enquadrada na disciplina do art. 109, I, da Constituição, que impõe a competência da Justiça Federal para processar e julgar demandas em que empresa pública federal, como a Caixa Econômica,5 figure como autora, ré, assistente ou opoente.

Em sentido assemelhado é a Súmula 161 do STJ, ao afirmar que “é da compe-tência da Justiça Estadual autorizar o levantamento dos valores relativos ao PIS/PASEP e FGTS, em decorrência do falecimento do titular da conta”. Verifica-se, contudo, que, embora alinhada à redação da Súmula 82 quanto à exclusão da competência da Justiça do Trabalho nesse caso, a Súmula 161 alude à “Justiça Estadual”, dissociando-se, pois, da conclusão firmada no verbete anterior.

4 Em 1966 ainda era vigente a Constituição de 1946, embora já bastante deformada pelos Atos Institucionais. Nela, a competência da Justiça do Trabalho era assim definida: “Art. 123. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores, e as demais controvérsias oriundas de relações do trabalho regidas por legislação especial [...]”. Já a lei vigente acerca do FGTS foi promulgada sob a égide da Constituição de 1988, que previa o seguinte na redação originária do art. 114: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas. [...]”.

5 Essa natureza de empresa pública federal consta no Decreto-Lei nº 759, de 12 de agosto de 1969: “Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a constituir a Caixa Econômica Federal - CEF, instituição financeira sob a forma de emprêsa pública, dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e autonomia administrativa, vinculada ao Ministério da Fazenda”. Seu estatuto é veiculado por Decreto e, atualmente, é disciplinado pelo Decreto nº 6.473, de 2008.

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Isso se deve ao fato de que, nesses casos, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o pedido será dirigido ao juízo do inventário ou arrolamento, não havendo, pois, intervenção da Caixa Econômica Federal no feito, salvo se ela ingressar no processo como opoente ou assistente, caso em que, nos termos do art. 109, I, da Constituição, a controvérsia será solucionada pela Justiça Federal.

É o que se constata das decisões a seguir transcritas:CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM E JUIZADO ESPECIAL. ALVARÁ LIBERATÓRIO. [...] 1. Em se tratando de pedido de expedição de alvará judicial requerido nos termos da Lei 6.858/80, ou seja, em decorrência do falecimento do titular da conta, inexiste lide a ser solucionada. Cuida-se, na verdade, de medida de jurisdição voluntária com vistas à mera autorização judicial para o levantamento, pelos sucessores do de cujus, de valores incontestes depositados em conta de titularidade de pessoa falecida “independente de inventário ou arrolamento”. 2. Desse modo, a Caixa Econômica Federal não é parte integrante da relação processual, mas mera destinatária do alvará judicial, razão por que deve ser afastada a competência da Justiça Federal [...].6

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EX-PEDIÇÃO DE ALVARÁ DE LEVANTAMENTO DE SALDOS DE FGTS. [...] Em se tratando de pedido formulado pelos herdeiros, para o levantamento dos valores relativos ao FGTS em virtude do falecimento do titular da conta, deve-se levar em consideração o se-guinte: (a) nos casos em que o requerimento for realizado mediante simples procedimento de jurisdição voluntária, a competência para o julgamento da demanda é da Justiça Estadual, conforme dispõe a Súmula 161/STJ [...]; (b) quando, no entanto, a Caixa Econômica Federal se opõe ao levantamento do FGTS, resulta inconteste a competência da Justiça Federal, nos termos da Súmula 82/STJ [...]. Da análise dos autos, verifica-se que houve pedido de expe-dição de alvará para o levantamento do FGTS, deferido pelo Juiz da Comarca de Taubaté. No entanto, a Caixa Econômica Federal apresentou resistência ao cumprimento da autorização judicial, com a instauração de processo contencioso, consoante se pode constatar às fls. 66/74. Há, pois, elementos nos autos, capazes de demonstrar a existência de oposição da CEF ao levantamento dos valores a título de FGTS, de maneira que se configurou a competência da Justiça Federal para solucionar a demanda. Aplica-se, na espécie, a Súmula 82/STJ. 4. Recurso ordinário provido.7

6 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Conflito de Competência (CC) nº 102854/SP, Relator: Ministro Benedito Gonçalves, Órgão julgador: Primeira Seção, Brasília, DF, 11 de março de 2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200900171226&dt_publicacao=23/03/2009>. Acesso em: 19 jul. 2011.

7 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança (RMS) nº 20352/SP, Relatora: Ministra Denise Arruda, Órgão julgador: Primeira Turma, Brasília, DF, 21 de agosto de 2007. Disponível em:

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33COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

As decisões supramencionadas representam, pois, o entendimento atual do Su-perior Tribunal de Justiça a respeito do assunto: sempre que se versar sobre liberação do FGTS, a competência será ora da Justiça Federal, ora da Justiça Estadual, a depender da maneira como a Caixa Econômica Federal participará no processo: se como parte, por opor alguma resistência à liberação desses valores, a competência será, no entendimento do STJ, da Justiça Federal (art. 109, I, da Constituição e Súmula 82 do STJ); se como mera destinatária da ordem judicial, para que os valores sejam entregues aos sucessores do trabalhador titular da conta, a competência será da Justiça Estadual (Súmula 161 do STJ).

2. A MUDANÇA DE COMPETÊNCIA PROVOCADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004

2.1. As Expressões “Oriundas” e “Decorrentes”

Com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, o núcleo da competência da Justiça do Trabalho, antes limitado a “conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores” (art. 114, caput, na redação original do texto de 1988), foi substancialmente alargado.

O atual art. 114 recebeu vários novos incisos a delimitar a competência da Justiça do Trabalho, destacando-se o inciso I, segundo o qual à Justiça do Trabalho compete processar e julgar “as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” (destacou-se). Por sua vez, o mesmo art. 114 con-signa, no inciso IX, competir à Justiça do Trabalho o julgamento de “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei”.

A expressão “relações de trabalho”, comum aos dois incisos, será, por ora, deixada de lado nesta abordagem. Interessa, na oportunidade, delimitar o alcance dessas duas expressões - “oriundas” e “decorrentes” - para que, posteriormente, já integradas com a locução “relação de trabalho”, seja possível definir o alcance deste texto.

Segundo o dicionarista, oriundo tem o mesmo significado de proveniente, que, por sua vez, tem o mesmo sentido de fonte ou origem.8 Já decorrente pode significar, também, proveniente, mas também pode assumir o sentido de consequente ou resultante.9

Como se verifica, não há uma delimitação estanque entre os sentidos dessas palavras. Na maioria das vezes em que são empregadas, aliás, elas assumem, de fato, uma sinoní-mia, sendo tarefa das mais ingratas dissociar os sentidos de cada uma dessas expressões.

<https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200501162710&dt_publicacao=20/09/2007>. Acesso em: 19 jul. 2011.

8 BORBA, Francisco S. (Coord.). Dicionário UNESP do português contemporâneo. São Paulo: UNESP, 2004. p. 1.139.

9 Ibidem, p. 380.

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Não por acaso, os primeiros estudos divulgados a respeito do impacto da Emenda Constitucional nº 45/2004 na competência da Justiça do Trabalho chegaram a sustentar a ideia de que a previsão do inciso IX do art. 114 (“decorrentes”) era desnecessária, haja vista a amplitude da disposição constante no inciso I (“oriundas”). Foi o caso, dentre outros destacados nomes, de Arnaldo Süssekind10 e de José Augusto Rodrigues Pinto.11

Em sentido diverso - depois de hercúleo esforço para delimitar o alcance de um e outro termo, reconheça-se - figuram outros expoentes da área, como Reginaldo Melhado e Francisco Gérson Marques de Lima. E é com base nas construções formuladas por ambos que se pretende desfazer o aparente pleonasmo cometido pela Emenda Constitucional nº 45/2004.

Reginaldo Melhado coloca a questão nos seguintes termos:O dilema do suposto conflito entre os incisos I e IX do art. 114 pode ser resolvido no próprio campo da argumentação dogmática. Note-se que, enquanto o inciso I do art. 114 menciona as ações oriundas da relação de trabalho, o inciso IX incorpora controvérsias decorrentes dela. Que diferença há entre os vocábulos oriundo e decorrente? Lexicologicamente, “oriundo” tem o sentido de originário, natural. A raiz latina da palavra guarda alguma relação com “oriente” (oriens, orientis), que designa a nascente do sol (oriente é o leste, a parte do céu onde nasce o Sol). O adjetivo “decorrente” significa aquilo que decorre, que se origina. Vale dizer: no inciso I está a relação de trabalho ontologicamente considerada; ela própria em seu estado natural. O substrato é o próprio trabalho. Já no inciso IX há menção à controvérsia decorrente dela, numa relação mediata e indireta, que

10 “O novo art. 114 contém uma contradição, por nós anteriormente apontada, porque no inciso I inclui na competência da Justiça do Trabalho ‘as ações oriundas da relação de trabalho’ - todas, portanto -, entretanto, no inciso IX, refere ‘outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei’. Afigura-se-nos que o inciso IX ‘choveu no molhado’, porquanto, havendo ou não lei especial afirmando a competência da Justiça do Trabalho para conhecer de litígio sobre qualquer modalidade de relação de trabalho, essa competência está afirmada no inciso I.” Cf. SÜSSEKIND, Arnaldo. As relações individuais e coletivas de trabalho na reforma do Poder Judiciário. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Justiça do Trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005. p. 20.

11 “Menos ainda compreendemos a razão de ser do inciso IX, que arrola na competência da Justiça do Trabalho ‘outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei’. Com o devido respeito pelos que conseguem distinguir ‘outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho’ da própria relação de trabalho, já que obrigatoriamente estarão incluídas no seu gênero, expresso no inciso I, preferimos perfilhar a conclusão (irônica, pelo menos) do douto Ministro Arnaldo Süssekind [...]. Note-se que a redação do inciso IX da Emenda é igual à que estava intercalada no artigo 114, caput, originário. Mas ali tinha razão de ser, pois a competência era determinada em função exclusiva da relação de emprego. Desde o momento em que o critério de determiná-la pela pessoa do trabalhador atraiu todas as relações de trabalho, a transposição só pode ser atribuída a um ato falho do constituinte derivado.” Cf. PINTO, José Augusto Rodrigues. A Emenda Constitucional 45/2004 e a Justiça do Trabalho: reflexos, inovações e impactos. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Justiça do Trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005. p. 235.

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35COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

dependeria de lei formal para extensão de competência. Inscrevem--se nessas situações, por exemplo, as ações previdenciárias (aquelas em que se discutem benefícios da Previdência Social) ou as ações incidentais na execução trabalhista, como os embargos de terceiro e os embargos à arrematação.12

Percebe-se que, na forma colocada pelo autor, as demandas referidas no art. 114, inciso I (“oriundas”), são aquelas que dizem respeito a questionamento intrínseco à própria relação de trabalho, ao passo que as demandas a que alude o art. 114, IX (“decorrentes”) seriam indiretamente atreladas a essa relação. No primeiro caso, a Constituição já reco-nheceria, de imediato, a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a causa pertinente. Já no segundo, essa competência necessitaria de interpositio legislatoris, dependendo, pois, de lei formal para que a Justiça do Trabalho estivesse habilitada a receber tais causas.

Há, na exposição de Reginaldo Melhado, alguns exemplos quanto à competência que seria ampliada por via legal, como é o caso das ações previdenciárias e dos embar-gos. Mas os exemplos ainda não ajudam a esclarecer o que se pretende com este texto.

Em outro estudo a respeito da distinção entre “oriundas” e “decorrentes”, Francisco Gérson Marques de Lima lança as seguintes ponderações:

[...] as ações oriundas (inciso I) são aquelas nas quais se discutem fatos, direitos e obrigações que nascem da relação de trabalho, direta e imediatamente, como nos conflitos entre o trabalhador e o tomador do serviço, a propósito da labuta prestada, sendo o palco onde se discutirão os direitos e obrigações desta relação contratual, sejam os convencionados entre as partes, sejam os impostos por lei [...]. Já as controvérsias decorrentes são aquelas que surgiram da labuta, mas apenas indireta ou reflexamente, por via oblíqua, podendo se referir a terceiros que se viram atingidos, de alguma forma, pela prestação dos serviços, ou cujas obrigações não sejam especificamente laborais; são decorrências jurídicas alheias ao objeto próprio do contrato em si, que fora celebrado entre tomador e prestador de serviços; cuida-se de outras obrigações não congênitas à relação contratual.13

Percebe-se que essa análise avança um pouco mais no que concerne ao âmago do problema, qual seja, estipular um critério prático para distinguir os casos em que a Justiça

12 MELHADO, Reginaldo. Da dicotomia ao conceito aberto: as novas competências da Justiça do Trabalho. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Justiça do Trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005. p. 314 (destaques conforme o original).

13 LIMA, Francisco Gérson Marques de. Explorando o sentido etimológico dos termos “oriundas” e “decorrentes” do art. 114 da Constituição Federal. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, Fortaleza, n. 29, p. 138, jan./dez. 2006 (destaques conforme o original).

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do Trabalho poderá, de logo, julgar determinada causa, por reconhecimento constitucional de sua competência, daquelas outras situações em que, não havendo lei formal que lhe amplie a competência, a parte deverá empreender a sua postulação perante a Justiça comum, estadual ou federal.

Mas a solução ainda não se apresenta tão clara. Tanto que o próprio autor, numa passagem posterior desse mesmo estudo, parece utilizar dois critérios para firmar a distin-ção entre os casos que estariam abrigados no inciso I ou no inciso IX. Disse-se “parece” porque não fica tão evidente a adoção dessa opção por uma análise dual, já que o autor não se pronuncia explicitamente sobre esse aspecto.

Primeiramente, Francisco Gérson Marques de Lima expõe entendimento que pode ser denominado de critério objetivo ou material14 para a definição do alcance dessas proble-máticas expressões constantes no art. 114, incisos I e IX. Veja-se o seu pronunciamento:

As obrigações imanentes e próprias das relações contratuais (as congênitas, enfim) são as oriundas e estão nelas presentes direta e naturalmente, conforme exposto há pouco; enquanto as obrigações decorrentes, exatamente por não serem ínsitas nem próprias do contrato, nem sempre surgem, qualificando-se como incertas, even-tuais, fortuitas, acidentais, de acontecimento apenas provável, pois a relação de trabalho pode originá-las ou não, donde ser possível afirmar que elas nem sempre sobrevirão. Uma relação de trabalho traz, sempre, obrigações trabalhistas, mas só eventualmente pro-voca conseqüências decorrenciais, de outra natureza (civil, penal, administrativa...). [...] Os títulos propriamente trabalhistas nascem com o contrato de trabalho ou da sua relação jurídica. Vale dizer, há sempre um substrato jurídico anterior, que os sustenta como obrigação. A prática de um dano moral ou de um crime, no entanto, não carecem obrigatoriamente da existência prévia de uma relação jurídica ou de um contrato anterior; não raro, há mera situação fática que, com a prática do ilícito, faz nascer a obrigação e, portanto, a relação jurídica. Daí, dizer-se que aquelas obrigações são “oriun-das”, enquanto estas são “decorrentes”. “Decorrentes” porque, por coincidência e obra do destino, nasceram em uma relação jurídica anterior, a relação de trabalho.15

Esse momento de sua análise evidencia que o critério inicialmente “escolhido” foi o objetivo, visto que seria relevante, para a definição do alcance constitucional de “oriun-das” e de “decorrentes”, o fato de o título jurídico postulado ser congênito à relação de

14 Esses adjetivos não constam no texto citado. A inserção desses qualificativos é de responsabilidade do autor do presente estudo.

15 LIMA, Francisco Gérson Marques de. Explorando o sentido etimológico dos termos “oriundas” e “decorrentes” do art. 114 da Constituição Federal. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, Fortaleza, n. 29, p. 138-139, jan./dez. 2006 (destaques conforme o original).

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trabalho ou não. Assim, caso se postulasse algum direito inerente à relação de trabalho, estaria configurada a hipótese prevista no art. 114, I, da Constituição. Caso o direito não fosse inerente à relação de trabalho, mas fosse conexo a ela (daí sendo, nos termos da Constituição, dela “decorrente”), o caso seria regido pelo art. 114, IX, necessitando, pois, de disciplina infraconstitucional expressa em lei (sentido formal).

Em seguida, porém, o autor parece endossar a ideia de um critério subjetivo, calca-do nas pessoas envolvidas na demanda, como se verifica pelo excerto abaixo transcrito:

Observe-se que o contrato de trabalho, por ser bilateral e por ser contrato, só vincula os contratantes. Seus efeitos devem se limitar ao tomador e ao prestador de serviço, sem atingir terceiros. Contudo, é possível que, excepcionalmente, traga conseqüências a outras pessoas. A relação entre estas e qualquer um dos contratantes não é, obviamente, de trabalho. Seu interesse ou a obrigação daí surgidos não se qualificam como oriundos. Porém, são decorrentes da relação de trabalho existente entre duas outras pessoas, pois, ao fundo, havia, inegavelmente, uma prestação de serviço. [...] a autorização do inc. IX do art. 114, CF, referente a controvérsias decorrentes da relação de trabalho, é melhor compreendida, sob o ponto de vista pragmático, na instância processual. Com efeito, este tipo de ação envolverá o trabalhador e outra pessoa que não seja o tomador de serviço, ou o tomador e um terceiro (alheio à relação originária); a matéria em si não será propriamente trabalhista e o bem tutelado não é revertido diretamente para o trabalhador nem para o tomador.16

Adotando-se esse critério, que ora se denomina de subjetivo, seria qualificada como demanda oriunda da relação de trabalho aquela que teria como partes o trabalhador e o tomador do serviço, atrelados contratualmente pelo vínculo de trabalho, e como demanda decorrente aquela que envolveria o trabalhador e um terceiro ou o tomador do serviço e um terceiro. Aparentemente, portanto, seria possível conceber que, diante desse raciocínio, a demanda “oriunda” seria aquela que teria como partes os envolvidos num contrato de trabalho (em sentido lato, não correspondendo necessariamente a contrato de emprego), ao passo que a demanda “decorrente” pressuporia que ao menos um dos polos originários da contratação não figuraria como parte na causa.

Como já afirmado anteriormente, apesar da engenhosidade dessas construções teóricas, com louvável senso de depuração científica, o autor não se posiciona a respeito da adoção de um e outro critério. Seu estudo parece adotar ambos os critérios para diferençar demandas “oriundas” de “decorrentes”.17 Assim, para que se trate de demanda “oriunda”

16 LIMA, Francisco Gérson Marques de. Explorando o sentido etimológico dos termos “oriundas” e “decorrentes” do art. 114 da Constituição Federal. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, Fortaleza, n. 29, p. 139, jan./dez. 2006 (destaques conforme o original).

17 Francisco Gérson Marques de Lima observa, argutamente, que “oriundas” e “decorrentes” deveriam referir-se aos títulos jurídicos postulados, não às demandas mesmas. Em suas palavras: “a rigor, o inc. I (art. 114, CF)

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da relação de trabalho, nos dois polos deveriam figurar apenas sujeitos que participaram dessa relação, devendo a postulação estar voltada à satisfação de direitos congênitos à relação de trabalho. Ausente qualquer desses pressupostos (ou uma das partes não figurou como integrante da relação de trabalho e/ou os direitos postulados não são inerentes à relação de trabalho), estar-se-ia diante da hipótese do art. 114, IX (demanda “decorrente” da relação de trabalho), de modo que, enquanto não sobreviesse lei específica a respeito, a Justiça do Trabalho não deteria competência para processar e julgar essa demanda. Esse raciocínio restritivo não se coaduna, porém, com a ampliação de competência da Justiça do Trabalho advinda com a Emenda Constitucional nº 45/2004, razão pela qual não será adotado no decorrer do presente estudo.

2.2. Relação de Trabalho sem Postulação em Face do Empregador ou do Tomador

O conceito constitucional de “oriundas da relação de trabalho” não mais necessita que, na demanda trabalhista, estejam presentes tanto o trabalhador quanto o tomador de sua força produtiva. Pode-se, pois, afirmar que a competência da Justiça do Trabalho, tal como delineada no art. 114, I, da Constituição, também abarca demandas que não sejam voltadas ao tomador do serviço, nos termos do que aponta o Min. João Oreste Dalazen:

[...] a nova norma constitucional, consoante já se anotou, não mais circunscreve a competência da Justiça do Trabalho aos dissídios “entre trabalhadores e empregadores”, como o fazia a redação an-terior. Assim, porque o suposto da determinação da competência é unicamente a controvérsia derivar da “relação de trabalho”, o novo texto constitucional preenche uma omissão de que se ressentia a disciplina da competência material da Justiça do Trabalho: os litígios da relação de emprego e que não envolvam os seus sujeitos. De sorte que, presentemente, inscrevem-se na competência da Justiça do Trabalho, ao revés do que sucedia antes [...] quaisquer outras lides a propósito de direitos e obrigações que decorram da relação de emprego, mesmo que não se estabeleçam entre empregado e empregador, como se dá com [...] o dissídio sobre complementação de aposentadoria entre empregado e entidade de previdência priva-da fechada instituída pelo empregador, quando a complementação de aposentadoria não é criada pelo empregador.18

quis dizer ações ‘pertinentes’ a ‘títulos oriundos’ das relações de trabalho. A redação, reconheça-se, não é perfeita, pois, a rigor, as ações não são oriundas das relações de trabalho, uma vez que não lhes são efeitos. Os títulos é que o são. E a ação constitui o remédio jurídico para se postular estes títulos, quando não satisfeitos” (LIMA, Francisco Gérson Marques de. Explorando o sentido etimológico dos termos “oriundas” e “decorrentes” do art. 114 da Constituição Federal. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, Fortaleza, n. 29, p. 141, jan./dez. 2006).

18 DALAZEN, João Oreste. A reforma do Judiciário e os novos marcos da competência material da Justiça do Trabalho no Brasil. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Nova competência da Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p. 153 (destaques conforme o original).

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Percebe-se, pois, que a restrição existente na ordem constitucional anterior à Emenda Constitucional nº 45/2004 - que enunciava ser competente a Justiça do Trabalho para “conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empre-gadores” (antigo art. 114, caput) - não persiste quanto à limitação subjetiva nos polos da demanda submetida ao Judiciário Laboral. Com efeito, se antes da reforma promovida em 2004, a demanda, além de ser atinente a uma relação de emprego, deveria, ainda, contar com trabalhadores e empregadores nos polos processuais, essa configuração não mais subsiste, porquanto, a partir da EC nº 45/2004, foi eliminada a restrição quanto aos sujeitos da demanda serem, também, efetivos integrantes da relação de emprego (hoje, relação de trabalho).

Assim, como “oriundas da relação de trabalho” devem ser compreendidas não as demandas (ou melhor: os títulos jurídicos) que dizem respeito somente aos envolvidos na relação de trabalho (trabalhador e tomador), mas sim as demandas em que controvérsias a respeito desses títulos jurídicos - direitos congenitamente vinculados à relação de trabalho - sejam discutidas, quer se trate de causa tendo como partes trabalhador e tomador do serviço, quer se trate de causa que tenha terceiro estranho à relação de trabalho, desde que, em face desse terceiro, sejam postulados direitos indissociáveis da relação anterior-mente firmada, no sentido bem exposto pelo Min. João Oreste Dalazen.

A configuração da competência prevista no art. 114, I, da Constituição prescinde, pois, da presença, como partes no processo, dos sujeitos diretamente envolvidos na relação originária, pois o critério subjetivista (levando-se em conta as partes da deman-da e as respectivas vinculações - diretas ou indiretas - à relação de trabalho) não mais remanesce após a reforma constitucional. O texto do inciso I do art. 114 não apresenta, para fins de caracterização da competência da Justiça do Trabalho, qualquer exigência voltada à replicação, na demanda, dos sujeitos da relação de trabalho, mas apenas que a discussão seja oriunda dela.

Por isso, o entendimento do Min. João Oreste Dalazen mostra-se afinado com o propósito da Emenda Constitucional nº 45/2004, razão pela qual ele é defendido e seguido nesta oportunidade.

Resta, ainda, a definição acerca do que remanesceria ao inciso IX, que trata das demandas “decorrentes” da relação de trabalho. Propôs-se, até aqui, uma interpretação ampliativa da expressão “oriundas”, para abranger as demandas que não somente envol-vessem as partes da relação de trabalho, mas também quaisquer outras que versassem acerca de direitos inerentes a essa relação, independentemente de identificação ou não dos sujeitos da relação de trabalho com as partes na demanda. Em face disso, o que teria restado à competência prevista no art. 114, inciso IX?

A resposta é encontrada por exclusão ao que se definiu anteriormente quanto ao alcance da expressão “oriundas”: se esta expressão atrela-se aos títulos jurídicos ineren-tes à relação de trabalho, o termo “decorrentes” alinha-se com os direitos não inerentes à relação de trabalho, mas conexos ou dependentes dela. Novamente, a qualificação das

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partes envolvidas na demanda e/ou a sua interação na relação de trabalho originária em nada impacta a definição de competência da Justiça do Trabalho. E, como bem adverte o mesmo art. 114, inciso IX, nos casos em que a competência é decorrente (demandas que tratem de direitos não propriamente intrínsecos à relação de trabalho), a fixação dessa competência à Justiça do Trabalho dependerá de expressa previsão em lei formal.

Seria o caso da demanda do trabalhador contra entidade de previdência comple-mentar não instituída pelo empregador, como já sinalizou o Min. João Oreste Dalazen no trecho anteriormente transcrito; da ação penal movida pelo Ministério Público do Trabalho contra crimes ocorridos no curso da relação de trabalho (exceto os crimes definidos pelo Código Penal como “crimes contra a organização do trabalho”, pois, nos termos do art. 109, VI, da Constituição, essa competência cabe aos juízes federais); do mandado de injunção trabalhista (art. 83, X, da Lei Complementar nº 75/93); da imposição e execução ex officio, pela Justiça do Trabalho, das penalidades administrativas atinentes ao descumprimento da legislação trabalhista; das demandas atinentes ao pagamento de benefícios previden-ciários decorrentes de acidente de trabalho; da ação rescisória promovida pelo Ministério Público do Trabalho contra as partes de demanda trabalhista em que se tenha constatado a ocorrência de colusão (art. 836 da CLT c/c art. 487, III, b, do CPC), dentre outras.

Em todos esses casos, será necessária a existência de lei formal que expressa-mente consigne a competência da Justiça do Trabalho, conforme exigência do art. 114, IX, da Constituição. Isso porque são hipóteses de competência “decorrente” da relação de trabalho, em que se trata de direitos não inerentes à relação de trabalho, mas que se ligam, de algum modo, a essa relação - ou seja, são dela “decorrentes”.

Perceba-se, ainda, que a própria Constituição adota essa técnica, utilizando “de-corrente” com o sentido aqui exposto. É o que ocorre com o art. 114, VI, que estipula ser competente a Justiça do Trabalho para processar e julgar “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”. Essa indenização não é congênita à relação de trabalho. Não é, pois, inerente a ela. Por isso mesmo, não se configura como direito “oriundo” dessa relação, e sim “decorrente” dela.

Esmiuçando um pouco mais o que se pretendeu afirmar acima: as quantias en-volvidas numa relação de trabalho não se caracterizam por deter cunho indenizatório. De fato pode haver a obrigação de indenizar, mas geralmente isso ocorre por um ilícito de um dos envolvidos na relação de trabalho ou, ao menos, o descumprimento de algum dever legalmente imposto. A hipótese que mais enseja a invocação do art. 114, VI, é, sem dúvi-da, a demanda indenizatória movida pelo empregado (ou seus sucessores, se o obreiro estiver morto) contra o empregador, pelos danos decorrentes do acidente de trabalho. A indenização, nesse caso, não é congênita à relação firmada - ou seja, o simples fato de ser empregado não assegura indenização ao trabalhador em caso de acidente de trabalho que lhe provoque algum dano pessoal - mas, uma vez ocorrido algum dano, o dever de indenizar nasce no âmago da relação de trabalho, decorrendo dela.

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41COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

Essa hipótese do inciso VI, acaso não estivesse presente na Constituição, neces-sitaria de lei em sentido formal para implementá-la (art. 114, IX). Mas, estando constitu-cionalmente prevista de forma expressa, essa providência, obviamente, é desnecessária. Observe-se que, nesse caso específico, a Constituição também utiliza a expressão “decorrentes” para se referir à questão que nasce no âmbito da relação de trabalho, mas que não veicula direito congênito a ela - o art. 114, VI, dispõe serem da competência da Justiça do Trabalho “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”. Reforça-se, portanto, o argumento anteriormente apresentado, no sentido de que “decorrente” faz referência àquilo que não é próprio da relação de trabalho, mas resulta dela. E também se robustece a ideia de que é irrelevante perquirir-se acerca da situação subjetiva dos envolvidos - se os sujeitos da relação de trabalho devem ou não se identificar com as partes da demanda -, pois, também no art. 114, VI, da Constituição, não há qualquer exigência, implícita ou explícita, a esse respeito.

Fixadas essas premissas, não se mostra tão complexa a tarefa de analisar a com-petência para a demanda entre o trabalhador e a Caixa Econômica Federal, que visa à obtenção de alvará judicial para a liberação dos valores depositados na conta vinculada do FGTS. Sendo o FGTS um direito inerente a uma relação de trabalho (mais especificamente, inerente a uma relação de emprego, espécie daquela), e obrigação do polo contratante da mão de obra (art. 15 da Lei nº 8.036/90), a contenda surgida entre trabalhador e Caixa Econômica Federal, por ocasião da ausência de liberação, total ou parcial, dos valores depositados, é demanda que envolve direito oriundo da relação de trabalho. Dessa forma, a hipótese enquadra-se no art. 114, I, da Constituição, sendo, pois, dispensável a exigên-cia de lei formal para configurar plenamente a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar essa causa.

3. A EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO TST A RESPEITO DO ASSUNTO

3.1. Antes da Emenda Constitucional nº 45/2004

Em 1976 o Tribunal Superior do Trabalho, no exercício da atribuição que lhe pres-crevia o revogado art. 902 da CLT,19 editou o Prejulgado 57, firmando posição no seguinte sentido:

Prejulgado 57. A Justiça do Trabalho só tem competência para au-torizar o levantamento de depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na ocorrência de dissídio entre empregado e empregador e após o trânsito em julgado da sentença.

19 O art. 902 da CLT dispunha o seguinte: “Art. 902. É facultado ao Tribunal Superior do Trabalho estabelecer prejulgados, na forma que prescrever o seu Regimento Interno. § 1º Uma vez estabelecido o prejulgado, os Tribunais Regionais do Trabalho, as Juntas de Conciliação e Julgamento e os juízes de Direito investidos da jurisdição da Justiça do Trabalho ficarão obrigados a respeitá-lo [...]”. De acordo com Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena, “é o prejulgado o julgamento antecipado ou prévio de uma tese jurídica susceptível de mais de uma interpretação, cujo sentido será fixado - com anterioridade -, via de regra, por órgão judicante diverso

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Esse entendimento seguia uma interpretação mais restritiva - e, àquela época, correta - no sentido de que o alvará para o levantamento do FGTS, na Justiça do Traba-lho, só poderia ser concedido em meio a uma demanda entre empregado e empregador, sendo impossível concedê-lo se a postulação dirigia-se apenas contra a Caixa Econômica Federal. A referência “após o trânsito em julgado da sentença” explica-se por duas razões: primeiro, porque a técnica da antecipação dos efeitos da tutela ainda não era difundida, limitando-se a algumas poucas postulações especiais, como o mandado de segurança e as cautelares; e segundo porque, ao exigir o “trânsito em julgado”, implicitamente se reiterava a impossibilidade de alguma postulação ter por objeto apenas a obtenção do alvará, pois este caso, tido como “jurisdição voluntária”, gera uma decisão judicial que, segundo a doutrina processualista tradicional, não teria aptidão para formar coisa julgada material.20

Um aspecto inusitado merece destaque quanto ao ponto. Os registros existentes dão conta de que o Prejulgado 57 não decorreu de jurisprudência iterativa do TST a respeito do tema. Pelo contrário, como afirma Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena, seu texto “irrompeu de uma resolução administrativa sem nexo com qualquer julgamento anterior”,21 estando caracterizada uma feição “preventiva” e não “consolidada” desse verbete. Assim, o TST construiu esse entendimento a partir de deliberação dos Ministros do Tribunal, sem se ater a julgados anteriores.

daquele que deverá julgar, em seu mérito, a causa em que se deu a divergência” (VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Os prejulgados, as súmulas e o TST. Revista de Informação Legislativa, v. 14, n. 55, p. 83-100, jul./set. 1977). Pela leitura do art. 902, era possível até afirmar que o prejulgado assemelhava-se a uma súmula vinculante, embora só atingisse as autoridades judiciárias que exerciam jurisdição trabalhista. Não detinha, no entanto, caráter normativo primário, pois essa característica foi-lhe negada pelo Supremo Tribunal Federal: “PREJULGADO DO TRIBUNAL DO TRABALHO. Não constituindo ato normativo - dado que o art. 902, § 1º, da CLT, que lhe atribuía tal caráter, foi revogado pela Constituição de 1946 -, não pode ser objeto de representação por inconstitucionalidade. Representação não conhecida” (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Representação por Inconstitucionalidade (RP) nº 946/DF, Relator: Ministro Xavier de Albuquerque, Órgão julgador: Tribunal Pleno, Brasília, DF, 12 de maio de 1977. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?id=263721>. Acesso em: 19 jul. 2011). O art. 902 da CLT foi integralmente revogado pela Lei nº 7.033, de 05 de outubro de 1982.

20 “Costumam os doutrinadores ensinar, ainda, que, não havendo oposição de interesses em conflito, não seria adequado falar em partes, pois essa expressão traz consigo a idéia de pessoas que se situam em posições antagônicas, cada qual na defesa de seu interesse. Além disso, pressupondo-se não se tratar de atividade jurisdicional, seria impróprio falar em ação, pois esta se conceitua como o direito (ou poder) de provocar o exercício da atividade jurisdicional, não administrativa; pela mesma razão, não há coisa julgada em decisões proferidas em feitos de jurisdição voluntária, pois tal fenômeno é típico das sentenças jurisdicionais. Fala a doutrina, por outro lado, em procedimento, e não processo, pois este seria também sempre ligado ao exercício da função jurisdicional contenciosa e da ação.” (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 169-170).

21 VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Os prejulgados, as súmulas e o TST. Revista de Informação Legislativa, v. 14, n. 55, p. 83-100, jul./set. 1977.

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43COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

Fulminados os prejulgados em 1982, com a revogação do art. 902 da CLT, muitos deles foram convertidos em Enunciados por parte do TST. E assim ocorreu também com o prejulgado 57, que manteve idêntica redação ao ser convertido em verbete sumular, passando a ser o Enunciado 176.

Em 2003, a Resolução nº 121, do Tribunal Pleno do TST, resolveu alterar a reda-ção de diversos enunciados, dentre eles o Enunciado 176, eliminando o trecho “e após o trânsito em julgado da sentença”:

Súmula 176. A Justiça do Trabalho só tem competência para autori-zar o levantamento do depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na ocorrência de dissídio entre empregado e empregador.

O texto da Súmula 176 consignava que o FGTS somente poderia ser levantado se houvesse dissídio entre empregado e empregador. Duas constatações advinham daí: a primeira, que a Caixa Econômica Federal não poderia figurar como parte na Justiça do Trabalho em causas que pleiteassem a liberação do FGTS, pois não se qualificava como empregadora do trabalhador que postulava a expedição de alvará (a não ser que a própria Caixa fosse a empregadora); e a segunda, que a liberação do FGTS por meio de alvará judicial deveria decorrer de um ilícito cometido pelo próprio empregador, e não pela Caixa (a não ser, novamente, que a própria Caixa figurasse como empregadora), pois o empregador, de alguma forma, teria frustrado esse direito obreiro (dispensando o traba-lhador indevidamente por justa causa, que seria convertida em dispensa sem justa causa na Justiça ou se recusando a fornecer as guias). Assim, a conduta da Caixa Econômica Federal, na qualidade de agente operador do FGTS (art. 7º da Lei nº 8.036/90), não seria, àquele momento, passível de controle pela Justiça do Trabalho.

Menos de dois anos depois da revisão ampla promovida pela Resolução nº 121/2003, a Resolução nº 129, de 05 de abril de 2005, alterou a denominação dos enun-ciados para “Súmulas”. E exatamente um mês depois, o Pleno do TST decidiu cancelar a Súmula 176, por meio da Resolução nº 130/2005.

3.2. Após a Emenda Constitucional nº 45/2004

Não tardou a chegar ao TST, pouco depois da promulgação da Emenda Constitu-cional nº 45/2004, o questionamento acerca da nova competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar os pedidos de alvará judicial em face da Caixa Econômica Federal.

A resposta veio ainda em 2005:INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. COMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO. FGTS. ALVARÁ. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. SÚMULA 176. CANCE-LAMENTO. 1. Inscreve-se na competência material da Justiça do Trabalho, no exercício de jurisdição voluntária, apreciar pretensão de ex-empregado de expedição de alvará judicial para fins de saque dos

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depósitos do FGTS junto à CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF, tendo em vista a vinculação do pleito a uma relação de emprego, espécie da relação de trabalho de que cogita o novel art. 114, inciso I, da Constituição Federal de 1988, com a redação da Emenda Constitucional nº 45/04. 2. O aspecto central para a determinação da nova competência material da Justiça do Trabalho, desde o advento da EC nº 45/04, repousa na circunstância de o pedido e a causa de pedir dimanarem de uma relação de trabalho, ainda que não entre os respectivos sujeitos. Superada a estreita e arraigada vinculação de tal competência meramente aos dissídios entre empregado e empregador. 3. Cancelamento da Súmula 176 do TST.22

Verifica-se, no teor do acórdão, que o Min. João Oreste Dalazen reiterou a posição já evidenciada em seu artigo, anteriormente citado neste texto. E, diante da percepção adequada acerca do novo alcance da competência da Justiça do Trabalho - em que não se perquire mais sobre a identificação entre partes da demanda e partes da relação jurídica material subjacente -, não se admite mais a diminuição indevida da competência da Justiça do Trabalho para julgar questões oriundas da relação de trabalho, independentemente de quem sejam os envolvidos na demanda levada ao Judiciário.

Basta, portanto, indagar se os títulos jurídicos questionados são oriundos (ou seja, congenitamente atrelados) à relação de trabalho ou decorrentes dela (atinentes e originados na relação de trabalho, mas não inerentes a esta). Estando configurada a primeira hipótese, independentemente de quem sejam os envolvidos na demanda e sem a necessidade de interpositio legislatoris, a Justiça do Trabalho terá competência plena para processar e julgar essa causa. Configurada a segunda situação, torna-se imprescindível a edição de lei (em sentido formal) específica, atribuindo essa competência à Justiça do Trabalho.

Desde a decisão do incidente de uniformização de jurisprudência, o Tribunal Superior do Trabalho já conta com diversos julgados reiterando esse posicionamento,23 além de, no mesmo julgamento, ter determinado o cancelamento da Súmula 176. Não há, portanto,

22 BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Incidente de Uniformização Jurisprudencial em Recurso de Revista nº TST-IUJ-RR-619872/00.2 (Recurso de Revista nº 619872-16.2000.5.12.5555), Relator: Ministro João Oreste Dalazen, Órgão julgador: Tribunal Pleno, Brasília, DF, 05 de maio de 2005. Disponível em: <http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/proc-RR%20-%20619872-16.2000.5.12.5555>. Acesso em: 19 jul. 2011.

23 Alguns deles: AIRR nº 538-52.2010.5.20.0000, julgado em 25.05.2011; AIRR nº 90440-87.2008.5.19.0008, julgado em 13.10.2010; AIRR nº 68500-76.2001.5.17.0005, julgado em 16.06.2010; RR nº 40300-62.2001.5.17.0004, julgado em 18.11.2009; AIRR nº 155340-86.2001.5.17.0006, julgado em 26.08.2009; RR nº 186100-31.2001.5.17.0131, julgado em 18.03.2009; AIRR nº 153940-80.2005.5.06.0013, julgado em 24.09.2008; RR nº 50740-67.2006.5.01.0011, julgado em 06.08.2008; RR nº 164300-14.2001.5.17.0141, julgado em 06.08.2008; RR nº 149900-42.2006.5.17.0101, julgado em 06.08.2008; RR nº 2122000-10.2002.5.03.0900, julgado em 25.06.2008; AIRR nº 940-94.2006.5.10.0019, julgado em 13.06.2007; RR nº 3433000-37.2002.5.11.0012, julgado em 17.05.2006; e RR nº 655203-59.2000.5.12.5555, julgado em 29.03.2006.

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45COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

como retroceder nessa perspectiva, pois, do contrário, haveria uma inconstitucional capitis deminutio da competência da Justiça do Trabalho estabelecida pela Emenda nº 45/2004.

Resta, no entanto, um desafio de cunho “político-processual”: como se sabe, ao Superior Tribunal de Justiça compete julgar os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, bem como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos (art. 105, I, d, da Constituição), excepcionando-se, apenas, os conflitos envolvendo os Tribunais Superiores, estes da competência do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, o, da Constituição). E o STJ, tradicionalmente restritivo quanto à competência da Justiça do Trabalho, ainda mantém em vigor as duas súmulas atinentes ao tema (Sú-mulas 82 e 161), firmando a competência ora da Justiça Estadual (no caso de sucessores do trabalhador falecido, geralmente em processos de inventário ou arrolamento), ora da Justiça Federal (se o trabalhador pleitear a liberação do FGTS em face da Caixa Econômica Federal). Não se tem qualquer perspectiva de aceitação da competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar essas questões no âmbito do Tribunal, já tendo havido julgamentos recusando a competência da Justiça do Trabalho em casos que tais.24

Assim, nos domínios processuais trabalhistas, o assunto, embora polêmico, ganhou substancial reforço no sentido da competência da Justiça do Trabalho após a consolidação do posicionamento do TST. Mas, nos conflitos de competência, que são julgados, em sua maioria, pelo STJ, há um lamentável ranço sedimentado em interpretações ultrapassa-das a respeito da competência da Justiça do Trabalho após a Emenda Constitucional nº 45/2004, situação que, enquanto não revertida, acarretará a prolação de inúmeras decisões inconstitucionais, contrárias ao ampliado alcance do art. 114, inciso I, da Constituição.

CONCLUSÕES

Em face do exposto, é possível concluir que:1) Historicamente, a competência da Justiça do Trabalho sempre foi limitada por

aspectos atinentes às pessoas das partes no processo (ratione personae), situação que, até a Constituição de 1988, manteve-se praticamente sem alterações.

2) Em face disso, somente em razão de regramento legal específico, por lei em sentido formal, seria possível alargar a competência da Justiça do Trabalho para julgar outras demandas que não fossem atinentes à relação entre trabalhador e empregador.

24 “CONFLITO DE COMPETÊNCIA. Ação ordinária movida por titular de conta de FGTS, contra a CEF, visando ao levantamento dos depósitos efetuados em razão de contrato de trabalho entre o autor e o Município de Mossoró, declarado nulo por ausência de concurso público. Inexistência de discussão sobre a relação de trabalho. Competência da justiça comum. incidência da Súmula 82 do STJ. Conflito conhecido e declarada a competência da Justiça Federal, a suscitada. Precedentes.” (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Conflito de Competência (CC) nº 97598/RN, Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, Órgão julgador: Primeira Seção, Brasília, DF, 26 de novembro de 2008. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200801611174&dt_publicacao=09/12/2008>. Acesso em: 19 jul. 2011).

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3) Com a Emenda Constitucional nº 45/2004, o aspecto subjetivo da competência da Justiça do Trabalho foi abandonado, bastando, para ensejar a sua atuação, que a demanda seja oriunda da relação de trabalho - caso em que a competência é configurada de forma plena - ou decorrente da relação de trabalho - caso em que será necessária a previsão legal expressa a respeito.

4) Embora seja tarefa complexa, a diferença entre o inciso I do atual art. 114 da Constituição (oriundas da relação de trabalho) e o inciso IX do mesmo artigo (decorrentes da relação de trabalho) reside na natureza do direito postulado. Sendo direito intrínseco à relação de trabalho, está-se diante de demanda que postula direitos oriundos dessa rela-ção, nos termos do art. 114, I. Caso se postule direito não intrínseco à relação de trabalho, mas nascido em seu âmago, a demanda versa sobre direitos decorrentes da relação de trabalho, sendo necessário, neste caso, que haja lei formal conferindo competência à Justiça do Trabalho.

5) Sendo o FGTS um direito intrínseco à relação de trabalho, as demandas a ele relacionadas, independentemente da presença do empregador no polo passivo, passam à competência da Justiça do Trabalho, com fundamento no art. 114, I, da Constituição, o que inclui o pleito de concessão de alvará judicial para o levantamento das quantias depositadas na Caixa Econômica Federal.

6) Diante da percepção de que se trata de demanda oriunda da relação de trabalho, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho sedimentou-se no sentido de que essa pretensão deve ser veiculada perante a Vara do Trabalho, entendimento que levou ao cancelamento da Súmula 176 desse Tribunal.

7) Apesar do entendimento consolidado no TST e do amplo alcance da expressão “oriundas da relação de trabalho”, o Superior Tribunal de Justiça mantém seu entendimento a respeito do assunto, ignorando as modificações advindas com a Emenda Constitucional nº 45/2004 e reafirmando sua posição no sentido de que o pleito de expedição de alvará será de competência da Justiça Federal (Súmula 82) ou da Justiça Estadual (Súmula 161), a depender da situação levada ao Judiciário.

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O FENôMENO DO SUPERENDIVIDAMENTO - INEXISTÊNCIA DE DIREITO DO CONSUMIDOR à RENEGOCIAÇÃO E

DE JUSTA CAUSA PARA INTERVENÇÃO JUDICIAL NOS CONTRATOS

DEMÓCRITO RAMOS REINALDO FILHOJuiz de Direito/PE.

SUMÁRIO: Introdução - 1. A expansão do crédito no Brasil - 2. A posição dos consumeristas em favor do direito do consumidor (super)endividado à renegociação do débito - 3. Inexistência de risco de comprometimento da subsistência material do devedor para pagamento de dívidas: a proteção patrimonial conferida pelas leis brasileiras - 4. Inexistência de previsão legal para o parcelamento de dívidas por meio da intervenção judicial nos contratos - 5. A seletividade na concessão do crédito - 6. O caráter conciliatório da renegociação de dívidas - Conclusões - Referências.

RESUMO: Neste artigo procuramos demonstrar que não existe embasamento legal para se requerer a renegociação de dívidas com fundamento no superendividamento do consumidor. Também defendemos que não existe qualquer risco de comprometimento da subsistência material das pessoas com o pagamento de dívidas, em razão da ampla proteção patrimonial que lhes é conferida pelas leis brasileiras. Por fim, apontamos que o caminho da conciliação com as instituições financeiras é a melhor solução para renego-ciação de dívidas e facilitação no pagamento de obrigações.

PALAVRAS-CHAVE: Superendividamento; renegociação de dívidas; intervenção judicial.

ABSTRACT: In this article we demonstrate that there is no legal foundation to seek renegotiation of debts on the basis of consumer’s super indebtedness. We also defend that there is no risk of compromise of the people’s material living with the payment of debts, because of huge asset protection given by the Brazilian laws. At the end, the reconciliation with financial institutions is the best solution for debt renegotiation and facilitation in the payment of obligations.

KEYWORDS: Super indebtedness; debt renegotiation; judicial intervention.

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INTRODUÇÃO

Os reflexos da concessão de crédito de forma fácil e ilimitada começaram a aparecer perante o Judiciário, ao longo deste ano, na forma de pedidos de revisão de contratos com fundamento no “superendividamento” dos consumidores. O fenômeno se instalou a partir da oferta abundante do crédito fácil no país. Empréstimos consignados, empréstimos pessoais, cartões de crédito, crédito direto ao consumidor e outros tipos formam uma extensa e variada gama de modelos contratuais que podem ser utilizados por pessoas físicas para tomar dinheiro emprestado aos bancos e financeiras. O resultado não raro é que as pessoas não usam o crédito de forma consciente e chegam à falência financeira.

Para tratar desse problema social, alguns juristas discutem a possibilidade de criar barreiras legais contra o superendividamento,1 enquanto que outros advogam o caminho imediato da via judicial para, por meio da intervenção nos contratos, propiciar reparce-lamento de dívidas, alongamento de prazos ou facilitação das condições de pagamento e diminuição de juros. O remédio judicial, para esse desiderato, aparece inclusive sob uma nova roupagem: “ação de readaptação contratual”. Em regra, argumenta-se que as empresas financeiras é que devem responder pelo endividamento do consumidor, pois a elas é que deve ser carreado o ônus de averiguar o potencial de endividamento do tomador do crédito. Outro argumento central para o pedido de intervenção contratual reside em apelar para a necessidade de proteção material do consumidor endividado, de forma a garantir-lhe condições mínimas para sobreviver.

No presente trabalho, procuramos demonstrar que não existe base legal para se requerer a renegociação de dívidas com fundamento no superendividamento do consumidor e que a intervenção judicial nos contratos pode afetar a segurança jurídica dos negócios financeiros. Também defendemos que não existe qualquer risco de comprometimento da subsistência material das pessoas com o pagamento de dívidas, em razão da ampla proteção patrimonial que lhes é conferida pelas leis brasileiras. Por fim, apontamos que o caminho da conciliação com as instituições financeiras é a melhor solução para renego-ciação de dívidas e facilitação no pagamento de obrigações.

1. A EXPANSÃO DO CRÉDITO NO BRASIL

Com o ambiente de estabilização dos preços proporcionado pelo Plano Real em 1994, as operações de crédito no Brasil passaram a funcionar como estimuladoras do crescimento econômico. Uma vez controlada a inflação, as instituições financeiras, que

1 Dentre as propostas da Comissão de juristas responsável pela atualização do CDC (Lei 8.078/90), está a proibição de utilização de expressões enganosas que levem o consumidor a crer que o financiamento é oferecido sem juros ou de forma gratuita. Outra proposta é a de impedir o fornecedor de ocultar os riscos da contratação do crédito, dificultar sua compreensão ou estimular o endividamento.

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antes extraíam sua margem de lucro essencialmente da captação de depósitos, passaram a depender das operações de crédito. A expansão do crédito foi mais acentuada nos últi-mos cinco anos, devido à descoberta de uma parcela da população - aquela considerada como de baixa renda - antes excluída do sistema formal do crédito, que se tornou alvo preferencial das financeiras.2 Se a expansão do crédito teve sua importância para o cres-cimento socioeconômico do país, já que fomentou o consumo de bens e serviços, parece que agora os efeitos da liberação desmedida se fazem sentir. A prova disso são as ações de consumidores “superendividados” que, conforme se mencionou, começam a bater às portas dos tribunais à procura de remédio para sua situação de comprometimento de renda.

2. A POSIÇÃO DOS CONSUMERISTAS EM FAVOR DO DIREITO DO CONSUMIDOR (SUPER)ENDIVIDADO à RENEGOCIAÇÃO DO DÉBITO

O consumidor superendividado, de uma maneira geral, é todo aquele que perdeu a capacidade de pagamento das dívidas contraídas.3 Sem qualquer perspectiva de adim-plemento, vem a juízo requerer uma revisão geral dos contratos de crédito para o fim de lhe ser assegurado reparcelamento, diminuição dos juros ou redução do próprio montante da dívida. Em regra, argumenta-se que a empresa financeira demandada mostrou-se negligente, assumindo um risco exagerado ao conceder crédito em valores superiores à capacidade de endividamento (do tomador). Parte-se da concepção de que o “superen-dividamento” é um fenômeno que decorre da “concessão irresponsável do crédito” pelas empresas financeiras e “não se trata de um simples incumprimento contratual ou apenas mais uma hipótese de falta de pagamento de dívidas”, mas um verdadeiro problema social que tem que ser tratado pelo Judiciário com um “olhar diferenciado”. O direito ao reparce-lamento das prestações, nessa acepção, decorre da proteção judicial que deve ser dada ao consumidor superendividado, sobretudo diante da noção de que a financeira comete abuso de direito, ao conceder crédito de maneira irresponsável, sem averiguar previamente (mediante pesquisa em cadastros de proteção ao crédito e outros meios) sua capacidade de reembolso. Defende-se que “o fornecedor que concede crédito a pessoa que não tem condições de cumprir o contrato excede manifestamente as finalidades econômicas e sociais de sua atividade”, em violação ao que estabelece o art. 187 do CC.

2 Segundo dados divulgados pelo Banco Central, em novembro de 2008 as operações de crédito do país atingiram R$ 1.187 bilhões correspondentes a 40,2% do PIB. Os saldos de créditos destinados a pessoas físicas foram de R$ 369,3 bilhões em setembro de 2008, com crescimento de 32,26% em relação a setembro de 2007.

3 O Superendividamento, segundo Claudia Lima Marques, é a condição do consumidor, pessoa física natural, que não poder saldar as dívidas que possui com os ganhos provenientes de seu labor, sem que para isso seja prejudicada a sua subsistência (Sugestões para uma Lei sobre o tratamento do superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 55, p. 11-52, jul./set. 2005).

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Em aditamento à tese da irresponsabilidade da financeira que concede crédito sem averiguar a real capacidade de endividamento do consumidor, argumenta-se que o consumidor superendividado tem direito garantido à repactuação das cláusulas, com base no dever de cooperação do outro contraente, que decorre do art. 422 do CC. Invoca-se, também, o art. 6º, V, do CDC, que estabelece como direito básico do consumidor a modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas. Invoca-se, ainda, como fundamento para a readaptação judicial do contrato, o art. 2º, § 2º, I, da Lei nº 10.820/2003, o qual limita os descontos e prestações em folha de pagamento a trinta por cento da remuneração do tomador do empréstimo.

Além de buscar fundamento no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no Código Civil, os que defendem a readaptação contratual enxergam na própria Constitui-ção Federal a regra maior consagradora do direito fundamental do consumidor superen-dividado: o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, da CF). Como se sabe, a concepção da teoria social do contrato justifica a aplicação de normas de direito público para regular as relações entre particulares. Por esse viés, os contratos sofrem a interferência de princípios e normas constitucionais, que podem se sobrepor às regras de cunho obrigacional formadas no ajuste privado, quebrando a hegemonia do princípio da autonomia da vontade. Pela via da constitucionalização do Direito Civil, incrementam-se normas de direito público, editadas em prol de interesses coletivos, no âmbito das rela-ções contratuais, permitindo que os valores relacionados à proteção da pessoa humana prevaleçam sobre interesses patrimoniais.

Essas formulações teóricas utilizadas para o pedido de “readaptação” dos contratos dos consumidores “superendividados” têm o respaldo de parte da doutrina, sobretudo entre os consumeristas, os quais sustentam a renegociação das dívidas como uma prerrogativa implícita a toda e qualquer relação contratual no ordenamento brasileiro, extraída não somente da Constituição (do princípio da dignidade da pessoa humana), como também dos deveres de cooperação, lealdade, boa-fé e solidariedade que devem ser observados pelos contratantes. Realmente, a ideia da renegociação, como um dever do fornecedor do crédito na cooperação com a outra parte, pode ser observada nos ensinamentos da grande doutrinadora Cláudia Lima Marques, que assinala:

Por fim, mencione-se que a doutrina atual germânica considera ínsito no dever de cooperar positivamente, o dever de renegociar (Neuverhandlungspflichte) as dívidas do parceiro mais fraco, por exemplo, em caso de quebra da base objetiva do negócio. Cooperar aqui é submeter-se às modificações necessárias à manutenção do vínculo (princípio da manutenção do vínculo do art. 51, § 2º do CDC) e à realização do objetivo comum e do contrato.

Acrescenta a insigne doutrinadora, expondo a noção da renegociação como dever contratual:

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Será dever contratual anexo, cumprindo na medida do exigível e do razoável para a manutenção do equilíbrio contratual, para evitar a ruína de uma das partes (exceção da ruína aceita pelo art. 51, § 2º do CDC) e para evitar a frustração do contrato: o reflexo será a adaptação bilateral e cooperativa das condições do contrato.4

Bruno Pandori Giancoli também defende a situação de superendividamento do consumidor como justificativa para a revisão dos contratos de crédito:

Com efeito a ação revisional por aplicação do superendividamento pode ser encarada como mecanismo judicial apto a tratar das dívidas do consumidor de maneira a evitar sua ruína completa e, se possível, restabelecer uma situação de consumo sustentável.5

Carolina Curi Fernandes, da mesma forma, destaca que o direito do consumidor superendividado à repactuação decorre do dever de cooperação do outro “parceiro obri-gacional” para ser alcançada a reestruturação da dívida e o equilíbrio contratual:

Os deveres de cooperação e renegociação pressupõem que, para que se possa alcançar a reestruturação financeira do superendividado, faz-se imprescindível a cooperação e compreensão do outro parceiro obrigacional envolvido no negócio, ou seja, o fornecedor do crédito. Diante da situação do consumidor superendividado, deverá o fornecedor do crédito atuar no sentido de cooperar possibilitando a renegociação do débito tendo em vista o restabelecimento financeiro do consumidor e equilíbrio contratual6 (grifo nosso).

3. INEXISTÊNCIA DE RISCO DE COMPROMETIMENTO DA SUBSISTÊNCIA MATERIAL DO DEVEDOR PARA PAGAMENTO DE DÍVIDAS: A PROTEÇÃO PATRIMONIAL CONFERIDA PELAS LEIS BRASILEIRAS

Em que pesem as manifestações doutrinárias expostas, temos que a renegociação da(s) dívida(s) do consumidor superendividado não pode ser imposta às instituições finan-ceiras e bancárias como um dever contratual implícito, por meio da intervenção judicial nas manifestações de vontade dos particulares, modificando condições de pagamento de dívidas, prazos e encargos. Eventual interferência do Poder Público nos negócios jurídicos privados, sob essa roupagem, pode trazer consequências sociais ainda mais nefastas, em termos de quebra da segurança jurídica dos negócios, violação à liberdade

4 Op. cit., p. 198.5 O superendividamento do consumidor como hipótese de revisão dos contratos de crédito. São Paulo: Verbo

Jurídico, 2008. p. 162.6 A tutela do consumidor superendividado e o princípio da dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi,

Teresina, ano 15, n. 2619, 2 set. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/17312>. Acesso em: 17 ago. 2011.

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de contratar e afronta ao princípio do ato jurídico perfeito, valores igualmente protegidos pela ordem constitucional.

O erro inicial de análise do problema, com a devida vênia, reside em buscar no princípio da dignidade da pessoa humana e na garantia de subsistência material (noção do “mínimo existencial”)7 fundamento para a intervenção judicial nos contratos com o objetivo de tratar das dívidas do consumidor. Não se nega a hierarquia da norma constitucional, dian-te da posição superior da Constituição, que pode versar sobre relações privadas. O direito constitucional é fonte suprema e deve direcionar todo o direito, seja ele público ou privado. Os princípios e valores constitucionais devem nortear as relações privadas tendo em vista a proteção e desenvolvimento da pessoa humana, acima de qualquer outro valor. Apenas ob-servamos que o endividamento do consumidor, independentemente da extensão da dívida, não pode servir como justa causa para intervenção judicial nas relações contratuais a que esteja ligado, pois a sua subsistência (e de sua família) e, portanto, a preservação da digni-dade de sua pessoa, está garantida por outras normas existentes na nossa ordem jurídica, que limitam a expropriação de bens do patrimônio do devedor para pagamento de dívidas.

É que a ordem jurídica brasileira, diferentemente de outros sistemas legais, está impregnada de regras que protegem o indivíduo contra a excussão patrimonial excessiva para a satisfação de dívidas. O legislador brasileiro sempre se preocupou em criar meca-nismos para atenuar o impacto do processo executório sobre as condições de subsistência do devedor e de sua família. Preocupou-se em preservar uma dignidade material básica do devedor, evitando que o processo de execução possa representar uma ameaça à sua subsistência. Prova disso é a existência da impenhorabilidade salarial presente no inc. IV do art. 649 do CPC,8 bem como as outras situações de imunidade executórias deline-adas nos outros incisos do mesmo artigo.9 Cite-se ainda a impenhorabilidade imobiliária disciplinada pela Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990, que cuidou do chamado “bem de

7 O mínimo existencial é um dos parâmetros de dosimetria e densificação material da pessoa humana, autorizando inclusive a intervenção judicial para sua preservação na hipótese de omissão do Poder Executivo. Também denominado de mínimo fisiológico, deve ser entendido como “as condições materiais mínimas para uma vida condigna, no sentido da proteção contra necessidades de caráter existencial básico”. Como ensina Rogério Gesta Leal, “um interesse ou uma carência é, nesse sentido, fundamental em nível de mínimo existencial quando sua violação ou não satisfação significa ou a morte, ou sofrimento grave, ou toca o núcleo essencial da autonomia” (Condições e possibilidades eficaciais dos direitos fundamentais sociais: os desafios do Poder Judiciário no Brasil. Porto Alegre. Livraria do Advogado, 2009. p. 101).

8 Embora exista uma discussão sobre se essa impenhorabilidade salarial é absoluta ou não, o fato é que há consenso de que a penhora sobre salários ou vencimentos não pode ser de forma integral, comprometendo a manutenção da subsistência do devedor. A respeito do tema, sugerimos a leitura de nosso artigo “Da possibilidade de penhora de saldos de contas bancárias de origem salarial. Interpretação do inciso IV do art. 649 do CPC em face da alteração promovida pela Lei nº 11.382/2006”, disponível no DVD Juris Plenum Ouro, seção “Doutrina”.

9 O art. 649 do CPC tem a seguinte redação:“Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;

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família”, vedando a penhora de imóvel residencial de casal ou entidade familiar por dívida de qualquer natureza (art. 1º) e estendendo a garantia da impenhorabilidade a todos os equipamentos e móveis que guarnecem a casa (art. 2º).10 Ainda quando se elimina a via executória para o pagamento da dívida, nos casos em que o tomador do crédito aceita voluntariamente, em contrato, que as mensalidades do empréstimo sejam adimplidas me-diante desconto direto em folha de pagamento (modalidade conhecida como “empréstimo consignado”), a Lei limita os descontos a trinta por cento da sua remuneração (art. 2º, § 2º, I, da Lei nº 10.820/2003).11 Se o desconto é feito em conta bancária em que o contraente recebe o seu salário (“conta salarial”), mesmo assim não há risco de que sua subsistência

II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste artigo;V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão;VI - o seguro de vida;VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança;XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político.§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem.§ 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia.§ 3º (vetado)”.

10 O STJ, interpretando esses dispositivos, tem ampliado a garantia a praticamente todos os utensílios e eletrodomésticos existentes na casa (único imóvel residencial) do devedor, a exemplo de televisão, fogão, geladeira, computador, etc. Para a Corte Superior, só são penhoráveis esses equipamentos se existentes em duplicidade. Tudo o mais que existir em forma de um único item, à exceção de obras de arte e adornos suntuosos, não pode ser penhorado.

11 A Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, dispôs sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento. Estabelece esta Lei que os empregados podem autorizar o desconto em folha de pagamento dos valores referentes a empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil (art. 1º). O desconto pode, inclusive, incidir sobre verbas rescisórias, desde que limitado a 30% (§ 1º do mesmo artigo). Os inativos (aposentados e pensionistas) que recebem benefícios pelo INSS também estão autorizados pela Lei a contratar empréstimos mediante desconto em folha (art. 6º). Já em relação aos servidores públicos civis (da União), o Decreto nº 4.961, de 20 de janeiro de 2004, que regulamenta o art. 45 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, também permite que eles autorizem consignações em suas folhas de pagamento, para cobertura de certos tipos de empréstimo (a exemplo de financiamentos para aquisição de imóveis residenciais e empréstimo concedido por entidade de previdência privada), mas desde que a soma mensal das consignações não exceda valor correspondente a 30% dos vencimentos (art. 11).

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fique comprometida, pois a jurisprudência tem entendido ser abusiva a cláusula inserida no contrato de empréstimo que versa autorização para o banco debitar ou resgatar (da conta--corrente ou de qualquer aplicação financeira) valor superior a 30% do salário creditado mensalmente. A abusividade da cláusula (por infração ao inc. IV do art. 51 c/c parágrafo 1º do mesmo artigo), nessa hipótese, reside na falta de limites para o desconto, quando absorve toda ou parte substancial da verba salarial do correntista (consumidor).12

Como se observa, o consumidor de serviços bancários e creditícios já está com-pletamente imunizado contra qualquer forma de excussão patrimonial degradante. Nós já dispomos de um processo de execução “humanizado”, resultante da imunidade patrimonial conferida a certos bens (salário e imóvel residencial único, por exemplo), bem como regras que limitam a liberdade do consumidor ao contratar o pagamento de empréstimos mediante descontos em folha salarial ou conta bancária. Portanto, a concepção de que o Estado deve intervir nas relações contratuais em que uma das partes se mostra “superendividada”, a pretexto de garantir a ela um mínimo de condições materiais para subsistência pessoal e de sua família (preservando-se assim sua dignidade como pessoa humana), compreende evidente equívoco. Em razão da ampla proteção patrimonial que o nosso sistema de leis confere ao devedor, não existe espaço para que perca as condições de subsistência e desenvolvimento material.

Diga-se mais: o nosso sistema jurídico é tão desenvolvido no que tange à proteção da pessoa do consumidor (devedor) que lhe confere garantias que vão muito além da sim-ples dignidade material, alcançando inclusive a órbita de sua proteção moral. Com efeito, o art. 42 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) impede que, na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente seja exposto a ridículo ou submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Por sua vez, o art. 71 do mesmo diploma legal, vi-sando justamente assegurar a efetividade do artigo anterior, define o tipo penal aplicável à cobrança excessiva ou constrangedora, ao estabelecer que se considera crime contra as relações de consumo “utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constran-gimento físico ou moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira no seu trabalho, descanso ou lazer”.

12 Na ausência de uma limitação ao desconto, o Judiciário pode (e deve) intervir na relação contratual, de modo a restabelecer o equilíbrio entre as partes, modificando a cláusula contratual que estabelecera a prestação desproporcional (art. 6º, V, do CDC). Por analogia às Leis que regulamentam as consignações em folha de pagamento, a autorização para desconto em conta-corrente não deve comprometer mais que 30% do salário creditado mensalmente. Para melhor compreensão desta, sugerimos a leitura de nosso artigo “Cláusula que autoriza desconto em conta-corrente para pagamento de empréstimo. Sua abusividade quando ilimitada”, publicado na revista Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 350, 22 jun. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/5384>.

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Portanto, quer se interprete o princípio em exame sob a ótica da proteção material do indivíduo, quer se observe nele uma blindagem contra práticas que interfiram na sua esfera moral, o fato é que o acúmulo de dívidas não constitui por si só causa suficiente para se considerar violada a dignidade da pessoa humana e, por conseguinte, se operar a intervenção contratual para modificar o que as partes livremente estabeleceram. O acú-mulo excessivo de dívidas, por si só, não ameaça a subsistência material do devedor e, por via de consequência, não é suficiente para afetar sua dignidade, assim considerada a preservação de um “mínimo existencial”. Só ocorre o comprometimento da subsistência do devedor (e de sua família) quando lhe são tomados efetivamente os rendimentos salariais para pagamento das obrigações contratuais. A simples existência da dívida, no entanto, não pode ser concebida como elemento gerador de afronta ao princípio da dignidade humana. Por outro lado, estando o devedor protegido contra meios excessivos ou que de qualquer forma o submetam a constrangimento, também não se pode alegar que sua moral esteja em risco por conta da situação de (super)endividamento.

4. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA O PARCELAMENTO DE DÍVIDAS POR MEIO DA INTERVENÇÃO JUDICIAL NOS CONTRATOS

Embora se saiba que a liberdade de contratar deve ser exercida em razão e nos limites da função social do contrato (art. 421 do CC), tem-se que evitar um elevado grau de ingerência do Poder Público nas manifestações de vontade dos particulares. O limite da autonomia da vontade ainda continua a ser ditado pela ordem jurídica, pelos princí-pios da ordem pública e os bons costumes (art. 122 do CC). Nesse ponto, vale trazer à consideração o ensinamento de Caio Mário Pereira, segundo o qual, “uma vez concluído o contrato, passa a constituir fonte formal de direito, autorizando qualquer das partes a mobilizar o aparelho coator do Estado para fazê-lo respeitar tal como está, e assegurar sua execução segundo a vontade que presidiu a sua constituição”.13

Em suma, o devedor não tem direito à “restruturação financeira” do contrato com base unicamente em sua situação de superendividamento, à falta de previsão legal. Não se pode extrair do inc. VIII do art. 6º do CDC (Lei 8.078/09), o qual estabelece ser um direito básico do consumidor a “facilitação da defesa dos seus direitos”, diretriz no sentido de obrigar a instituição financeira a renegociar as parcelas mensais do contrato. O STJ já teve inclusive a oportunidade de concluir pela inexistência desse dever da financeira, ao julgar um caso específico que envolvia contrato de financiamento estudantil.14 O estudante

13 Instituições de Direito civil. Rio de Janeiro: Forense, v. III, 2009. p. 22.14 O governo tem programas de financiamento para estudantes que não têm recursos para pagar um curso

superior. Um dos principais programas implementados é o Fies, criado em 1999 para financiar estudantes carentes. Outro programa é o Prouni, criado em 2004 e destinado à concessão de bolsas para alunos comprovadamente carentes, oriundos de instituições públicas e submetidos ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Apesar dos benefícios que esses programas trazem aos estudantes, é alto o índice de

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pedia que fosse renegociada a dívida, mas a 1ª Turma do STJ entendeu que a instituição financeira não é obrigada a renegociar a dívida, no caso de inadimplemento, por não haver previsão legal que ampare o pedido de renegociação.15 Para o STJ, a instituição financeira tem poder discricionário para decidir sobre a renegociação, ou seja, pode ou não aceitar a proposta oferecida pelo estudante, segundo seu juízo de conveniência e oportunidade, desde que respeitadas as condições previstas na lei.

Sem previsão legal para renegociação da dívida, o tomador de crédito inadimplente terá à sua disposição apenas a possibilidade de parcelamento prevista no art. 745-A do CPC. Todavia, a previsão legal para parcelamento da dívida só existe quando já iniciado o processo judicial de execução para cobrança da dívida, mesmo assim em bases específicas. O direito de pagamento parcelado (em 06 parcelas mensais) é condicionado ao depósito antecipado de 30% do valor da dívida, nos termos do dispositivo citado:

Art. 745-A. No prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exequente e comprovando o depósito de trinta por cento (30%) do valor em execução, inclusive custas e honorários de advogado, poderá o executado requerer seja admitido a pagar o restante em até seis (6) parcelas mensais, acrescidas de correção monetária e juros de um por cento (1%) ao mês.

Essa é a única previsão legal que confere ao devedor um tipo de benefício para o alongamento da dívida. Afora essa disposição, não existe possibilidade de se alterarem as condições de pagamento sem a aquiescência do outro contraente.

5. A SELETIVIDADE NA CONCESSÃO DO CRÉDITO

Não se diga, por fim, que o direito à reestruturação financeira ou readaptação do con-trato pode ter por fundamento a “concessão irresponsável do crédito” pelas empresas finan-ceiras, ao não investigarem adequadamente a capacidade de endividamento do consumidor.

As instituições que integram o sistema financeiro nacional, e que, portanto, são fiscalizadas pelo Banco Central, são obrigadas a operar observando princípios da sele-tividade, garantia e diversificação dos riscos, sendo-lhes vedada a concessão de crédito sem a constituição de título adequado e representativo da dívida.16 Essas diretrizes,

inadimplência e são inúmeras as causas que chegam à Justiça questionando as formas de pagamento de um curso, bem como as taxas de juros e a cobrança de mensalidades. Segundo notícia veiculada pelo jornal Folha de S. Paulo, de julho de 2010, com dados referentes a junho de 2009, mais de 50 mil estudantes, dos 250 mil contratos em fase de quitação da dívida junto à Caixa Econômica Federal, estariam inadimplentes e solicitaram a renegociação, o que representa 25% do total.

15 STJ, 1ª Turma, REsp 949.955-SC, rel. Min. José Delgado, j. 27.11.07, DJ 10.12.07.16 Resolução 3258 do Bacen:

“IX - É vedado às instituições financeiras:a) realizar operações que não atendam aos princípios de seletividade, garantia, liquidez e diversificação de riscos;b) conceder crédito ou adiantamento sem a constituição de um título adequado, representativo da dívida”.

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todavia, não foram concebidas como uma garantia para o consumidor, mas para evitar risco sistêmico, isto é, para reduzir os riscos de insolvência do sistema financeiro. Se os bancos começam a emprestar dinheiro sem as devidas garantias de recebimento futuro do capital emprestado, podem ficar com ativos de má qualidade e não ter como honrar os compromissos representados pelo seu passivo. O que se buscou, portanto, foi evitar práticas bancárias perigosas ou inadequadas, para não comprometer o sistema financeiro.

As instituições financeiras utilizam-se de bancos de dados, públicos e privados, para a avaliação do risco de crédito, ou seja, da probabilidade de recebimento do montante emprestado ao cliente (consumidor de serviços bancários). De acordo com a avaliação que é feita pelo banco, acessando esses cadastros, estabelece-se a taxa de juros a ser cobrada em um negócio bancário específico ou mesmo o banco pode deixar de conceder o empréstimo. A inadimplência é um custo implícito no preço do crédito e, quanto maior a certeza do pagamento, menor a taxa cobrada do tomador final e menor o risco para o banco. Ao conhecer melhor o potencial do tomador do crédito, mediante recurso aos registros de suas atividades bancárias prévias que integram a base de dados, os bancos diminuem os riscos das operações de crédito. As informações são obtidas junto a empresas e organizações que mantêm esses bancos de dados informacionais.

Entretanto, mesmo realizando essas consultas e investigando o perfil do consumidor ou seu histórico de pagamento, o banco não tem como evitar completamente os riscos do negócio nem tampouco avaliar completamente a capacidade de endividamento. O concedente procede a uma análise da capacidade econômica do tomador do empréstimo, mas apenas como prática administrativa para diminuir os riscos quanto ao reembolso do capital emprestado, não como obrigação legal.

6. O CARÁTER CONCILIATÓRIO DA RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDAS

Como já observado, não existe nenhuma norma jurídica nem princípio legal ou cons-titucional que imponham a uma instituição financeira o dever de renegociar as condições contratuais, sempre que o devedor pretender ou para facilitar o pagamento da dívida. A renegociação de dívidas ou alteração da forma e condições de obrigações de pagamento somente pode ser almejada por meio de composição amigável entre os contraentes, nunca como dever/direito de um deles, se não previsto expressamente no instrumento contratual. Inclusive o Estado, por intermédio do Poder Judiciário, pode desenvolver programas específicos de mediação/conciliação com a finalidade de tratamento, acompanhamento e resolução amigável de conflitos que envolvam consumidores em situação de superendi-vidamento, de forma a reinseri-los no mercado de consumo sem restrições creditícias.17

17 A título de exemplo pode ser citado o Programa de Tratamento de Consumidores Superendividados, denominado de Proendividados, instituído pelo Ato nº 75/2011-SEJU, de 11 de fevereiro de 2011, do Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, sob a coordenação e a gestão da Escola Superior da

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O que se tem observado, nesses programas de conciliação de conflitos envolvendo consumidores superendividados, é que as empresas e instituições financeiras quase sem-pre concordam em renegociar as dívidas, alongando os prazos para pagamento, diminuindo juros e os valores das mensalidades. Quando se convencem da incapacidade financeira do consumidor de pagar suas dívidas atuais e futuras nos respectivos vencimentos, e também como sabem que a tentativa de cobrança pela via judicial muitas vezes resulta infrutífera - em razão da ampla proteção dada pela lei brasileira ao patrimônio do devedor -, aceitam reduzir substancialmente o montante da dívida.18

CONCLUSÕES

1ª O consumidor, ainda que em situação de (super)endividamento, não tem direito à renegociação se esse direito não foi expressamente previsto, devendo o Judiciário evitar intervir no contrato, modificando condições de pagamento de dívidas, prazos e encargos. Eventual interferência do Poder Público nos negócios jurídicos privados, sob essa roupagem, pode trazer consequências sociais ainda mais nefastas, em termos de quebra da segurança jurídica dos negócios, violação à liberdade de contratar e afronta ao princípio do ato jurídico perfeito, valores protegidos pela ordem constitucional.

2ª A dignidade da pessoa humana, que se concretiza pela garantia de um mínimo de condições materiais, está plenamente protegida contra a cobrança de dívidas, em razão das inúmeras leis existentes na ordem jurídica brasileira que protegem o patrimônio do devedor (a exemplo da impenhorabilidade salarial presente no inc. IV do art. 649 do CPC e da impenhorabilidade imobiliária disciplinada pela Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990). O que pode ocorrer é que o consumidor, tomador do crédito, pelo volume do endividamento e comprometimento de suas finanças pessoais, perca a capacidade de pagamento e, efetivamente, deixe de cumprir com suas obrigações contratuais, mas nunca chegará a ser privado completamente de condições materiais mínimas.

3ª A responsabilidade pelo processo de (super)endividamento de parcelas substan-ciais de consumidores não pode ser atribuída com exclusividade às instituições financeiras, já que elas avaliam o risco da concessão do crédito (por meio de pesquisas em bancos

Magistratura de Pernambuco - ESMAPE. O Programa é vinculado, jurisdicionalmente, à Seção Especializada de Tratamento de Consumidores Superendividados da Central de Conciliação, Mediação e Arbitragem da Comarca da Capital (Primeiro Grau), em que os acordos obtidos são submetidos à homologação e execução judicial. O programa fornece, inclusive, caso o consumidor tenha interesse, assistência social e psicológica, além de orientação, através de cursos específicos, com o objetivo de auxiliá-lo na sua reeducação financeira, prevenindo o superendividamento.

18 No programa “Globo Repórter”, da TV Globo, veiculado no dia 26.08.11, que tratou do tema do superendividamento, foi divulgada a informação de que as instituições de crédito concordam em reduzir as dívidas dos consumidores em até 80% em alguns casos.

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de dados), o que não é suficiente para evitar completamente o inadimplemento do cliente (consumidor de serviços bancários). Se o princípio da boa-fé tivesse de ser invocado nos casos de superendividamento, seria para penalizar o tomador do crédito que, tendo conhecimento de sua limitada capacidade de endividamento, mesmo assim aceita contrair obrigação que sabe que não vai cumprir. As pessoas precisam ter responsabilidade pelo cumprimento de suas obrigações, não podendo o Judiciário quebrar a segurança jurídica dos contratos.

4ª A renegociação contratual, quando ocorre o superendividamento do consumi-dor, assim considerada a situação em que suas dívidas superam em muito sua condição de adimplemento, pode ser conseguida por meio de uma composição amigável entres as partes envolvidas no negócio (concedente e tomador do crédito). Em programas de renegociação de dívidas, patrocinados por órgãos estatais e entidades do setor privado, ficou comprovado que as instituições financeiras quase sempre concordam em reduzir o montante do débito e facilitar o pagamento, quando se convencem da incapacidade de adimplemento do consumidor superendividado.

REFERÊNCIAS

FERNANDES, Carolina Curi. A tutela do consumidor superendividado e o princípio da dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2619, 2 set. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/17312>. Acesso em: 17 ago. 2011.

GIANCOLI, Bruno Pandori. O superendividamento do consumidor como hipótese de revisão dos contratos de crédito. São Paulo: Verbo Jurídico, 2008. p. 162.

LEAL, Rogério Gesta. Condições e possibilidades eficaciais dos direitos fundamentais sociais: os desafios do Poder Judiciário no Brasil. Porto Alegre. Livraria do Advogado, 2009.

MARQUES, Claudia Lima. Sugestões para uma Lei sobre o tratamento do superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 55, p. 11-52, jul./set. 2005.

REINALDO FILHO, Demócrito Ramos. Da possibilidade de penhora de saldos de contas bancárias de origem salarial. Interpretação do inciso IV do art. 649 do CPC em face da alteração promovida pela Lei nº 11.382/2006. Juris Plenum Ouro, Caxias do Sul: Plenum, n. 22, nov./dez. 2011. 1 DVD. ISSN 1983-0297.

______. Cláusula que autoriza desconto em conta-corrente para pagamento de empréstimo. Sua abusividade quando ilimitada. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 350, 22 jun. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/5384>. Acesso em: 17 ago. 2011.

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A POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO NOS CASOS DE ANENCEFALIA: UMA ANÁLISE

DA LEGISLAÇÃO INTERNA VIGENTE COMO FONTE SUFICIENTE PARA ESSE FIM E O DIREITO COMPARADO

HELENO FLORINDO DA SILVAPós-Graduando em Direito Público pelo Centro Universitário Newton

Paiva. Colunista da Revista Eletrônica Boletim Jurídico (Conteúdo Jurídico). Advogado.

SUMÁRIO: Introdução - 1. Anencefalia: conceito e métodos de averiguação - 2. Aborto: considerações acerca da natureza do delito: 2.1. Bem jurídico tutelado; 2.2. Sujeitos: ativo e passivo; 2.3. Tipo objetivo: adequação típica; 2.4. Espécies de aborto criminoso: 2.4.1. Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento; 2.4.2. Aborto provo-cado sem consentimento da gestante; 2.4.3. Aborto provocado com consentimento da gestante - 2.5. Tipo subjetivo: análise da adequação típica; 2.6. Consumação e tentativa; 2.7. Figuras majoradas de aborto; 2.8. Aborto necessário e aborto humanitário: figuras especiais de excludentes de ilicitude; 2.9. Ação penal e sanção penal - 3. A possibilidade de antecipação terapêutica da gestação nos casos de anencefalia: uma análise da legislação interna vigente como fonte suficiente para esse fim - 4. Uma análise do problema à luz do Direito comparado: a antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia nos países do Mercosul - Conclusão - Referências.

RESUMO: Este trabalho, acerca da possibilidade de antecipação terapêutica da gestação nos casos em que se constatar a presença de anencefalia, tem por objetivo discu-tir, na esfera acadêmica, uma questão controvertida, alimentada por várias vertentes, com alto grau de divergência, cuja relevância demanda breve pacificação, a fim de se buscar a imprescindível efetividade da jurisdição, a qual será alcançada, dentre outros, com a conclusão de que, independentemente de legislação específica, o presente ordenamento vigente já possibilita essa alternativa às gestantes, sem que isso, contudo, configure a tipificação penal do crime de aborto, em quaisquer de suas espécies. Buscará, também, a análise do Direito comparado, a qual se restringiu aos países do Mercosul, tendo em vista sua proximidade territorial, cultural e comercial de muitos anos.

PALAVRAS-CHAVE: anencefalia; aborto; Código Penal; princípios; dignidade da pessoa humana; gestante.

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ABSTRACT: This work, about the possibility of early treatment of pregnancy in cases where one finds the presence of anencephaly, aims to discuss the academic sphere in a matter of controversy, fueled by several aspects, with a high degree of divergence, whose relevance will soon demand pacification, order to seek the essential effectiveness of the court, which will be achieved, among others, with the conclusion that, regardless of specific legislation, this legal ruling now allows this alternative pregnant women, without, however, set the criminal definition the crime of abortion in any of their species. Seek also the analysis of comparative law, by which, it was restricted to the Mercosur countries, given their territorial proximity, cultural and commercial many years.

KEYWORDS: anencephaly; abortion; Criminal Code; the principles of human dignity; maternity.

INTRODUÇÃO

Os problemas em torno dos casos de anencefalia no Brasil são de grande re-percussão social, seja pela natureza da deformidade do nascituro, seja pela dúvida que surge na doutrina e na jurisprudência acerca do questionamento de se haveria ou não, nestes casos, aborto, ou se há possibilidade jurídica pelo ordenamento vigente para a antecipação do parto nos casos em que detectada, efetivamente, a ausência de cérebro, ou seja, a anencefalia.

Esse problema enfrentado por várias famílias brasileiras, à luz da legislação vigen-te, enseja inúmeras discussões acerca da possibilidade, como dito acima, de antecipar o momento do parto em detrimento ao estado anencefálico do nascituro, tendo em vista as discussões acerca da configuração, ou não, do tipo penal de Aborto, descrito na Parte Especial do Código Penal (CP), no artigo 124.

Nestes termos, a análise dos tipos penais de aborto tipificados pela legislação penal atual, a conceituação de anencefalia, a verificação das hipóteses em que o aborto é permitido, a conjugação dessas hipóteses com os casos de anencefalia, a análise do tipo penal aborto e suas elementares, com o subsídio da doutrina, da jurisprudência e, principalmente, da Constituição Federal de 1988, com as Leis Ordinárias e o Direito Com-parado, são de extrema necessidade no momento em que esta discussão lança-se à baila.

Assim, em um primeiro momento busca-se conceituar anencefalia, demonstrando, também, os métodos hoje utilizados para aferição desta anomalia genética, sendo que em seguida será analisado o tipo penal aborto, bem como suas elementares, para assim, ao analisar as figuras de aborto permitidas, conjugá-las aos casos de anencefalia, concluindo pela possibilidade de antecipação terapêutica do parto, como também pela desnecessidade de legalização neste sentido, haja vista autorização pela própria legislação em vigor, como será demonstrado.

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1. ANENCEFALIA: CONCEITO E MÉTODOS DE AVERIGUAÇÃO

Para o estudo da anencefalia, seu conceito e os métodos para se aferir a existência, ou não, dessa má formação no nascituro, tem-se a necessidade de dar uma abordagem técnica ao assunto e, por isso, recorre-se, aqui, aos ensinamentos de Kaith L. Moore,1 especialista em embriologia, autoridade em se tratando de más-formações embrionárias.

Neste contexto, Kaith L. Moore, discorrendo acerca do que seria a anencefalia, aqui estudada, apresenta alguns aspectos que merecem destaque, dentro deles é certo que anencefalia é:

[...] uma anomalia grave do cérebro que resulta de uma falha no fechamento do neuroporo rostral durante a quarta semana. Como consequência, o primórdio do encéfalo anterior é anormal, e o de-senvolvimento da calvária é defeituoso. A maior parte do encéfalo do embrião fica exposta ou faz extrusão através do crânio - exencefalia. Por causa da estrutura e vascularização anormais do encéfalo exencefálico, o tecido nervoso sofre degeneração. O restante do encéfalo aparece como uma massa esponjosa vascular constituída principalmente de estruturas do encéfalo posterior. Apesar de esse DNT denominar-se anencefalia (Gr. an, sem, + enkephalos, cérebro), um troco encefálico rudimentar e um tecido nervoso funcionante sempre estão presentes em crianças vivas. [...] é uma anomalia letal comum, que ocorre em pelo menos uma vez em cada 1.000 nascimentos. Ela é duas a quatro vezes mais comum em mulheres do que em homens. Está sempre associada a acrania (ausência da calvária) e pode estar associada a raquisquise quando o defeito no fechamento do tubo neural é extenso. [...] é a mais comum das anomalias graves observadas em fetos natimortos. Recém-nascidos com essa grave DNT podem sobreviver ao parto, mas apenas por um curto período (grifos nossos).2

Nestes termos, pode-se perceber que a anencefalia é uma deformidade que ocorre com o nascituro durante a sua formação, que lhe prejudicará a vida após o parto, haja vista esta durar apenas instantes, uma vez que o cérebro, como conhecido, não está presente nestes casos, o que demonstra a impossibilidade de vida após o nascimento.

1 O citado autor é ganhador do primeiro Henry Gray/Elsevier Distinguished Educator Award, 2007 - a mais alta distinção da American Association of Anatomists, pela excelência na educação da anatomia humana para estudantes e graduados em medicina e odontologia. Ressalta-se que todos os conceitos técnicos acerca de má-formação embrionária ou sobre os métodos de aferição foram retirados da obra do citado autor. (MOORE, Keith L. Embriologia clínica. Colaboração Mark G. Torchia. Tradução Andrea Monte Alto Costa. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008).

2 MOORE, Keith L. Embriologia clínica. Colaboração Mark G. Torchia. Tradução Andrea Monte Alto Costa. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. p. 414.

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Mesmo que sobreviva ao nascimento, o feto anencéfalo está fadado à morte, pois a ausência do cérebro como conhecido vitimá-lo-á, mais cedo ou mais tarde. Comparado com aquelas pessoas que sofrem morte cerebral, e que, com ajuda de aparelhos, continuam com as demais funções vitais ativas, o anencéfalo terá, na grande maioria das vezes em que consegue nascer com vida, os órgãos funcionando, mas somente enquanto os aparelhos estiverem auxiliando-os para tanto.

Conforme visto acima, a anencefalia é a mais comum das anomalias letais obser-vadas em natimortos - nascituros que nascem mortos, ou seja, se não nascerem mortos pela anencefalia, essa deformidade levará os nascituros à morte, em todos os casos em que for diagnosticada, sendo ainda mais presente na realidade social do que se imagina, tendo em vista ocorrer em frequência de um em mil nascimentos.

Assim, visto o que a doutrina especializada entende por anencefalia, cabe agora destacar quais os métodos e a probabilidade de acerto deles, utilizados na aferição, ou seja, no diagnóstico da anencefalia.

O primeiro desses métodos é a ultrassonografia, que é a modalidade mais básica para a obtenção de imagens na avaliação do feto, tendo em vista sua ampla disponibilidade e custo baixo. Nos casos de anencefalia é possível, pela ultrassonografia, que sejam diag-nosticadas, dentre outras coisas, medidas precisas do diâmetro biparietal (DBP) do crânio do feto, o que possibilita uma estimativa bastante segura da idade e do comprimento do feto.

Diante disso, bem como pela anencefalia ser, em diversos casos, causada pela acrania, ausência da calvária, o ultrassom possibilitará, nestes casos, a aferição precisa de anencefalia provocada pela acrania.

O segundo método possível de aferição de anencefalia é a tomografia computado-rizada e imagem por ressonância magnética, que são basicamente utilizadas se houver detecção, na ultrassonografia, de alguma anomalia genética, haja vista que as imagens conseguidas, pelos aparelhos utilizados, demonstrarão, com maior precisão possível, a extensão do dano causado pela anomalia.

O terceiro método de averiguação da existência ou não de anencefalia é o deno-minado fetoscopia. Nesse procedimento há utilização de instrumentos com iluminação por fibra óptica, o que permite a observação direta das partes do corpo do feto, sendo possível realizar uma varredura em todo o corpo do feto na busca de anomalias congênitas.

Por fim, o quarto e último método utilizado na averiguação e diagnóstico de anencefalia também é o mais preciso. Trata-se do que se conhece como Dosagem de Alfafetoproteína (AFP), que consiste em:

A Alfafetoproteína (AFP) é uma glicoproteína sintetizada pelo fígado fetal, pelo saco vitelino e pelo intestino do feto. A AFP está presente em alta concentração no soro do feto, onde atinge seu máximo 14 semanas após o UPMN. Normalmente, pequenas quantidades de AFP entram no líquido amniótico. A concentração de AFP no líquido amniótico que envolve os fetos com defeitos abertos no tubo neural

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e da parede abdominal é notavelmente alta. A concentração de AFP no líquido amniótico é medida por imunodosagem, e quando asso-ciada a varredura ultrassonográfica, cerca de 99% dos fetos com esses defeitos graves podem ser diagnosticados pré-natalmente. Quando um feto tem um defeito aberto no tubo neural, também é provável que a concentração de AFP no soro materno seja mais alta do que a normal.3

Por tudo isso, percebe-se que, com os avanços tecnológicos na medicina moderna, a averiguação dos casos de anencefalia está cada dia mais precisa, de modo que existe um gama de exames possíveis neste sentido, o que afasta questionamentos acerca da probabilidade de acerto ou não, haja vista que em alguns destes exames o índice de acerto chega a 99%, ou seja, o mesmo utilizado para averiguação da paternidade, pelo exame de DNA.

2. ABORTO: CONSIDERAÇÕES ACERCA DA NATUREzA DO DELITO

A legislação brasileira nem sempre proibiu algumas condutas acerca do hoje tipifica-do crime de aborto em nosso território, haja vista o disposto no Código Criminal do Império de 1830, em que não era criminoso o aborto praticado pela própria gestante, punindo somente aquele que fosse praticado por terceiro, com ou sem o consentimento daquela.4

O Código Penal de 1890, por sua vez, criminalizou a conduta da gestante que provocasse o aborto, mas, ao contrário da legislação pretérita, já previa a possibilidade de realização do aborto nos casos em que este fosse necessário para resguardar a vida da parturiente, mas essa ressalva só havia para os casos em que já estivesse a gestante em trabalho de parto.

Neste sentido, o atual Código Penal de 1940 - Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940, tipifica três figuras de aborto, conforme determinado pelos artigos 124 (causa de aborto provocado), 125 (causa de aborto sofrido) e 126 (causa de aborto consentido), todos do Código Penal (CP), que assim determinam expressamente:

Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimentoArt. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.Aborto provocado por terceiroArt. 125. Provocar aborto, sem consentimento da gestante:Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante:

3 MOORE, op. cit., p. 109.4 BITENCOURT, César Roberto. Tratado de Direito penal: parte especial: dos crimes contra as pessoas. 9. ed.

São Paulo: Saraiva, v. 2, 2009. p. 136.

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Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

Assim, pode-se perceber que no primeiro caso é a própria gestante que realiza a interrupção da gestação pelo aborto; já no segundo, ocorre o contrário, mesmo a mulher querendo a gestação, esta é interrompida por terceiro, contra a vontade da gestante; e, por fim, na terceira hipótese, a gestante não pratica o aborto, mas dá seu consentimento para que seja realizado por terceiro.

Vendo tudo isso, chega-se à conclusão de que o crime de aborto, em quaisquer dessas hipóteses, é um delito contra a vida da pessoa humana em formação, ou seja, contra os direitos do nascituro, dentre os quais o de ser resguardado até seu nascimento com vida, por isso tais delitos estão alocados na Parte Especial do Código Penal, em seu Título I - Dos Crimes Contra a Pessoa, no Capítulo I - Dos Crimes Contra a Vida.

Desta feita, mesmo não sendo, conforme se verá abaixo, um crime propriamente contra a pessoa, pois essa ainda não existe, é um crime contra a vida, haja vista impedir que o nascituro a concretize em seu nascimento, e, por isso, guarda a competência constitucional para o seu julgamento, no Tribunal do Júri, conforme o disposto no art. 5º, XXXVIII, “d”, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), que assim dispõe:

Art. 5º [...]:XXXVIII - É reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:[...];d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Serão analisados a seguir, pormenorizadamente, os elementos do tipo penal do crime de aborto, em todas as suas espécies, começando pela análise do bem jurídico protegido pela legislação penal que proíbe expressamente essa prática, ressaltando-se, contudo, que para este trabalho adotou-se a separação de tópicos utilizada por César Roberto Bitencourt, o que facilitará o estudo do tema.

2.1. Bem Jurídico Tutelado

O bem jurídico tutelado pelo CP, no tocante ao crime de aborto, conforme disposto acima, é a vida da pessoa humana em formação, embora no caso não exista ainda uma pessoa efetivamente, mas apenas um nascituro/embrião/feto, que, mesmo nesta fase, já possui seus direitos resguardados desde sua concepção, conforme determinação do art. 2º do Código Civil brasileiro de 2002 - Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 -, que assim expressa:

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Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Neste desiderato, em uma comparação com o crime de homicídio, o aborto se diferencia por se dar frente a um ser embrionário/feto/nascituro, que ainda não goza do status de pessoa humana, bem como pelo momento em que o crime se consuma, pois, enquanto o homicídio se dá em pessoas já nascidas,5 o aborto se concentra naqueles seres que ainda estão em fase intrauterina, ou seja, não nasceram.

Portanto, o bem jurídico tutelado no crime de aborto, em quaisquer de suas espé-cies, é aquele inerente à proteção dos direitos do nascituro, que, mesmo ainda no útero da gestante, guarda para si direito que a lei assim determinar, estejam estes inseridos na órbita dos direitos das famílias ou nas sucessões, bem como proteção do Direito penal, ao criminalizar condutas que atentem contra o nascituro.

2.2. Sujeitos: Ativo e Passivo

Para a análise dos sujeitos, ativo e passivo, do crime de aborto, faz-se necessário visualizar tal distinção em cada uma das espécies de aborto, de modo a dissecar a matéria.

Desse modo, nos termos do aludido art. 124 do CP (autoaborto e aborto consentido), o sujeito ativo do delito é a gestante, tendo em vista que só ela é quem poderá praticar o autoaborto, ou consentir que alguém lho provoque, sendo que, neste sentido, tem-se a presença de um crime de mão própria.

De outro lado, no caso dos artigos 125 e 126 do CP (aborto provocado por terceiro, com ou sem consentimento da gestante), independe condição especial ao sujeito ativo, ou seja, trata-se de um crime comum, vez que poderá ser realizado por qualquer pessoa, exceto a própria gestante.

Por outro lado, o sujeito passivo se difere quanto à espécie de aborto.Assim, no tocante ao aborto provocado por terceiro sem o consentimento da ges-

tante, serão dois os sujeitos passivos, a gestante e o nascituro.Entretanto, quando se trata de autoaborto e de aborto consentido pela gestante, não

há dois sujeitos passivos, uma vez que não há no ordenamento penal brasileiro o crime de autolesão, em que a gestante seria, ao mesmo tempo, sujeito ativo e passivo do delito acima.6

5 Neste aspecto deve ser destacado que existem hipóteses em que pessoas já nascidas não sofrem homicídio, e, sim, infanticídio, conforme expressamente aludido no artigo 123 do Código Penal, que assim expõe: “Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção de 2 (dois) a 6 (seis) anos”. Assim, mesmo que nestes casos ocorra a morte de pessoa já nascida, não haverá homicídio consumado, e, sim, infanticídio.

6 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito penal: parte especial. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 1995. p. 80. Ressalta-se que neste sentido há divergência na doutrina, sendo que para este trabalho utilizou-se o entendimento, como visto, de Heleno Fragoso, por coadunar-se com o estudo em foco.

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Neste sentido, o sujeito passivo nestas hipóteses só poderá ser o nascituro ou, genericamente, o resultado da concepção, ou seja: óvulo, embrião ou feto.

Por fim, cabe aqui ainda destacar que a agravante genérica do art. 61, II, da Parte Geral do CP - crimes praticados contra gestante - não se aplica ao crime de aborto pra-ticado por terceiro, tendo em vista que a agravante já está inserida no tipo penal central do crime de aborto.

2.3. Tipo Objetivo: Adequação Típica

Para a análise do tipo objetivo, ou seja, da conduta materialmente tomada que é rechaçada pelo Código Penal, no caso do aborto, faz-se necessário tomar por base, antes de qualquer análise, a conceituação do que seja realmente aborto.

Nas lições de Aníbal Bruno, “provocar aborto é interromper o processo fisiológico da gestação, com a consequente morte do feto”.7 Percebe-se que o tipo objetivo do crime de aborto se verifica na prática de atos que levem à interrupção da gravidez antes de atingir o limite fisiológico, isto é, no decorrer do período compreendido entre a concepção e o início do parto, que é o marco final da vida intrauterina.8

Então, vê-se que a doutrina é quem se encarregou de definir o tipo objetivo do crime de aborto, porque pelo Código Penal vigente a conduta tipificada “provocar aborto” é uma fórmula neutra e indeterminada de tipificação de conduta, tendo em vista, por exemplo, que nos casos de homicídio a tipificação ocorreu de forma certa e direta, qual seja: matar alguém.

Portanto, para se chegar ao crime de aborto, pela indeterminabilidade do tipo penal em apreço, segundo a doutrina, será necessária à concorrência de alguns fatores, sem os quais a conduta não se subsumirá no tipo penal: aborto.

Assim, para que haja ocorrência do crime de aborto, será necessário que, em primeiro lugar, exista gravidez em curso, pois, se não há, o crime se torna impossível, bem como que o embrião/feto esteja vivo, haja vista a possibilidade de se incorrer na impossibilidade do delito, conforme os termos acima.

Desta feita, a morte da vida intrauterina deverá se dar em decorrência fática dos atos de aborto, pois para ser criminoso o aborto deverá ser a conduta de interromper ilicitamente o estado gravídico, com a morte do feto, tendo ou não sua expulsão do ventre materno, em qualquer fase da gestação, compreendendo, contudo, o lapso temporal da concepção ao parto, pois, após este termo final, estar-se-á diante de infanticídio ou de homicídio, conforme o caso.9

7 BRUNO, Aníbal. Crimes contra a pessoa. 5. ed. Rio de Janeiro: Rio, 1979. p. 160.8 BITENCOURT, César Roberto. Tratado de Direito penal: parte especial: dos crimes contra as pessoas.

9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 138.9 BITENCOURT, op. cit., p. 139.

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71A POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO

Desse modo, não ocorrendo determinado fatos e circunstâncias, o crime de aborto não estará configurado, de modo que estaremos diante de crimes impossíveis, ou até mesmo de outros tipos penais. A adequação típica do crime de aborto dependerá de circunstâncias próprias do tipo penal, tais como o estado de gravidez e a interrupção da vida intrauterina no decorrer da gestação.

2.4. Espécies de Aborto Criminoso

O Código Penal tipifica, conforme visto acima, em seus artigos 124, 125 e 126, as várias formas que são criminalizadas da prática do crime de aborto.

Para a análise detalhada de cada um desses crimes, a seguir, faz-se necessário verificar alguns aspectos relevantes, sem os quais pode ser prejudicado o entendimento da presente discussão.

Assim, deve-se ressaltar que o crime de aborto é um crime de forma livre, ou seja, qualquer meio capaz de provocar a conduta típica e o resultado tipificado como crime de aborto será tido como hábil à realização do tipo penal, o que afastará, para a prática do crime, as condutas como: rezas, despachos e similares, pois não são suficientes para prática do ato, nos termos do art. 17 do Código Penal.

Destaca-se, também, que só será criminoso o aborto provocado, pois a expulsão involuntária do feto, aborto espontâneo, por exemplo, não causa a tipificação da conduta, uma vez que, se não houver certeza da prática do aborto pelos peritos judiciais, crime de aborto não será, pois a dúvida acerca da autoria e da materialidade da conduta abortiva afastará a incidência do tipo penal.

Vê-se, nesse sentido, que o verbo núcleo nos diferentes tipos de aborto é um só: provocar, cujos vários significados permeiam entre causar, promover ou produzir, no caso, o aborto.

Assim, a diferença entre os tipos penais do gênero aborto será realizada pelas elementares especializantes, tais como: em si mesma, sem o consentimento da gestante, com o consentimento da gestante.

Portanto, para a ocorrência do crime de aborto, e não somente de um aborto sem os consectários legais, será necessária a existência de dolo - o aborto culposo não é crime -, a existência de gravidez, condutas abortivas hábeis a produzir o aborto e a morte daquele em estado de vida intrauterina.

2.4.1. Aborto Provocado pela Gestante ou com seu Consentimento

A primeira das espécies de aborto criminoso tipificada pelo Código Penal é aquele consentido pela gestante ou por ela mesmo praticado, de onde se extrai, como único sujeito ativo possível, a própria gestante, a única com a possibilidade de praticar o autoaborta-mento ou consentir para que outrem lhe provoque, conforme visto quando se tratou dos sujeitos ativos do delito de aborto.

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Desta feita, vê-se que se trata de duas hipóteses de crime de mão própria,10 ou seja, aquele em que em determinada pessoa reúnem-se as características e poderes necessários para a prática do delito, sendo que somente ela poderá, nestes termos, ser o agente ativo do crime.

Sendo assim, como qualquer outro crime de mão própria, a espécie de aborto tipificado no art. 124 do Código Penal, objeto da presente discussão, admite, também, a tentativa, esta ocorrendo como forma de instigação, induzimento ou auxílio, uma atividade acessória, limitada nestas condutas, tanto para a prática do autoabortamento, quanto para o aborto consentido pela gestante.11 Indo além destas condutas descritas acima, o terceiro responderá, não por coautoria no tipo penal aludido, mas por aquele descrito no art. 126 do mesmo diploma legal.

Deve-se ressaltar, também, que, mesmo que a gestante consinta para o abortamento e, no entanto, também ajude na prática deste, responderá somente pelo crime tipificado no art. 124 do Código Penal, tendo em vista que a prática do autoabortamento ou o con-sentimento para que outro lhe provoque é crime de múltiplas ações, ou seja, de conteúdo variado, aquele em que a ação se desenvolve com a prática de vários atos executórios, não bastando a realização de somente um ato.

Por fim, percebidos os pontos relevantes acima delineados acerca da prática do tipo penal do art. 124 do Código Penal, deve-se ainda destacar que o citado tipo penal não aceita a coautoria com o terceiro que porventura praticar o abortamento com o consenti-mento da gestante, haja vista que este responderá pelo tipo penal do art. 126 do Código Penal, o que demonstra uma exceção à Teoria Monista da Ação.12

2.4.2. Aborto provocado sem consentimento da gestante

A segunda espécie de aborto tipificada pela legislação penal em vigor está prevista no art. 125 do Código Penal, que diz que quem provocar aborto sem o consentimento da gestante será sancionado com pena de reclusão de três a dez anos.

10 JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte especial. 22. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 1999. p. 186.11 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Crimes contra a pessoa. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 73.12 O Código Penal de 1940 adotou como regra para a aplicação da legislação penal a Teoria Monista da Ação,

ou seja, responderá pelo crime todo aquele que concorrer para a sua prática, independentemente de ser ou não autor do fato, tendo em vista que, mesmo tendo sido cometido por diversas e variadas pessoas, o crime continua sendo único e indivisível. Neste sentido, a reforma do Código Penal de 1984 continuou adotando, como regra, a citada Teoria Monista da Ação, sendo que, em determinados casos, como exceção, a teoria adotada é a Dualista Mitigada, senão veja: “[...] adotou como regra a teoria monística, determinando que todos os participantes de uma infração penal incidem nas sanções de um único e mesmo crime e, como exceção, a concepção dualista mitigada, distinguindo a atuação de autores e partícipes, permitindo uma adequada dosagem da pena de acordo com a efetiva participação e eficácia causal da conduta de cada partícipe, na medida da culpabilidade perfeitamente individualizada” (COSTA JR., Paulo José da. Comentários ao Código Penal. São Paulo: Saraiva, v. 1, 1986. p. 232).

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73A POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO

Diferentemente do tipo penal acima analisado, neste não há consentimento da gestante, ou seja, o terceiro pratica o ato, sem que dele tome conhecimento a gestante, por isso justifica-se a pena ser maior do que a do art. 126 do mesmo diploma legal, que, como se verá a seguir, baseia-se entre o mínimo de um e o máximo de quatro anos de reclusão.

O conhecido aborto sofrido, pois não há o consentimento da gestante para tal, para que seja realmente conhecido na ação tomada pelo terceiro, necessita subsumir inteiramente ao tipo penal, ou seja, deverá ocorrer o aborto, conforme o que já foi es-tudado, sendo que, para tanto, o terceiro, agente ativo do delito, pratique o ato sem o consentimento da gestante ou de seu responsável legal, tendo em vista que a ausência de consentimento é elementar do tipo, devendo estar presente sob pena de se incorrer em diversa tipificação penal.

Assim, para que seja efetivado o tipo penal do art. 125 do Código Penal, nos dizeres de César Roberto Bitencourt:13

Para provocar aborto sem consentimento da gestante não é neces-sário que seja mediante violência, fraude ou grave ameaça; basta a simulação ou mesmo dissimulação, ardil ou qualquer outra forma de burlar a atenção ou vigilância da gestante.

Neste desiderato, estará configurado o citado tipo penal quando a gestante des-conhecer que será praticado o abortamento, ou seja, que ela não tenha a mínima noção do que será feito ou do que fora efetivamente praticado pelo terceiro.

2.4.3. Aborto provocado com consentimento da gestante

Por fim, a terceira e última espécie de aborto criminalizado pela legislação penal é aquela descrita no art. 126 do Código Penal, de onde se extrai que aquele que provocar aborto com o consentimento da gestante responderá, assim como ela - a gestante responde pelo tipo penal do art. 124 do Código Penal -, pela prática do abortamento, sofrendo sanção penal que poderá variar de um a quatro anos de reclusão.

Assim, como visto acima, o tipo penal do art. 126 do Código Penal é uma exceção à Teoria Monista da Ação, sendo que, em que pesem as disposições do art. 29 do mesmo Código Penal, aquele que praticar aborto com o consentimento da gestante não responderá pelas sanções do art. 124, e, sim, pelas do art. 126 da legislação penal aludida.

Tendo em vista a explanação acima, dos pontos mais relevantes acerca das figuras de aborto, tem-se que, ao final, deve-se destacar que o aborto consentido, qual seja, a 2ª figura descrita no art. 124 do Código Penal, e o aborto consensual, descrito no art. 126 do mesmo diploma legal, são crime de concurso necessário, ou seja, haverá, em ambos os

13 BITENCOURT, César Roberto. Tratado de Direito penal: parte especial: dos crimes contra as pessoas. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 142.

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casos em apreço, a concorrência entre duas pessoas, a gestante e um terceiro, ou seja, mesmo concorrendo para o delito, responderão por condutas diversas, quais sejam: a gestante pelo art. 124, 2ª parte, e o terceiro pelo art. 126, todos do Código Penal.

2.5. Tipo Subjetivo: Análise da Adequação Típica

Conforme visto, são várias as figuras tidas como criminosas em se tratando da análise do tipo penal aborto. Neste contexto, além das condutas típicas, analisadas sob o prisma do tipo objetivo e sua adequação ao caso concreto, faz-se necessária também a análise do tipo subjetivo, ou seja, daquilo que é essencial para que o sujeito, a partir de sua vontade, seja punido pelo crime de aborto.14

Neste sentido, verifica-se que o elemento subjetivo a ser analisado nos tipos de aborto é o dolo. O dolo no crime de aborto será verificado quando o agente realizar a conduta descrita no tipo penal com a vontade livre e consciente para tanto, ou seja, com vontade de interromper a gestação, conseguindo, com isso, eliminar a vida intrauterina ou, ao menos, assumindo o risco de fazê-lo.

Assim, o agir do sujeito será aquele conduzido pelo dolo, sendo ele direto, quando efetivamente quis o resultado ocorrido, realizando as condutas para esse fim, ou eventual, quando, mesmo não querendo o resultado ocorrido, assume o risco de produzi-lo, não medindo, assim, as consequências de seus atos.

Neste desiderato, a doutrina de César Roberto Bitencourt aponta para o caso em que o agente que desfere violenta agressão ao ventre de mulher visivelmente grávida, ou que sabe estar grávida, causando com isso a morte prematura do feto, sendo responsável criminalmente pelo delito de aborto, mesmo querendo somente a lesão, o que afastará a aplicação do art. 129, § 2º, V, do Código Penal.

Assim, não havendo a conduta de natureza dolosa, seja direta ou eventual, o crime de aborto não estará configurado, pois o aborto culposo não é punível, tendo em vista que, por força do parágrafo único do art. 18 do Código Penal, ninguém poderá ser punido por fato definido como crime, se não o praticar dolosamente, ressalvados os casos expressamente definidos em lei.

14 Nesta linha de entendimento, há que se ressaltar o posicionamento de Luiz Flávio Gomes, que sobre o tipo subjetivo no crime de aborto assim assevera: “O tipo subjetivo é constituído pelo dolo - consciência e vontade de produzir a morte do feto. Admite-se o dolo direto - quando a vontade do agente é diretamente conduzida à interrupção da gravidez e, de conseguinte, à provocação da morte do produto da concepção - e também o dolo eventual - se o sujeito ativo, embora não queira o resultado morte do feto como fim específico de sua conduta, o aceita como possível ou provável” (PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito penal brasileiro: parte especial, arts. 121 a 249. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 2, 2010. p. 89).

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2.6. Consumação e Tentativa

A verificação da consumação, ou da tentativa, nos crimes em geral é de suma importância, tendo em vista que a imputação das penas para cada um dos crimes, con-sumado ou tentado, será diferentemente analisada, conforme de depreende do art. 14 do Código Penal, senão vejamos:

Art. 14. Diz-se o crime:Crime ConsumadoI - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;TentativaII - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.Pena de TentativaParágrafo único. Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.

Desta feita, haverá consumação no crime de aborto quando, em quaisquer de suas formas, ocorrer a perda da vida intrauterina, pouco importando que ela ocorra dentro ou fora do ventre da gestante ou, ainda, se houve ou não a expulsão do feto. Resumindo, consumado estará o aborto, em qualquer de suas espécies, quando se perder o embrião ou o feto por condutas dolosamente praticadas pela própria gestante para esse fim, ou por terceiros, com ou sem o seu consentimento.

Ressalta-se que, para a verificação da consumação do crime de aborto, a análise das provas das condutas abortivas é essencial, de modo que, sendo o aborto um crime material - crime que deixa vestígios, alterando o mundo fático em sua volta -, a prova bastante para a sua comprovação é a realização do exame de corpo de delito, nos termos do art. 158 e seguintes do Código de Processo Penal.

Assim, a realização da prova testemunhal para a comprovação do crime de aborto é insuficiente para a verificação da consumação ou da tentativa deste tipo penal.

Neste ínterim, para a verificação tanto da consumação quanto da tentativa, é:[...] indispensável comprovar que o feto ou embrião, isto é, o ser em formação, estava vivo quando a ação abortiva foi praticada e que foi esta que lhe produziu a morte, ou seja, é necessária uma relação de causa e efeito entre a ação e o resultado produzido. Em outros termos, o emprego de meios abortivos, por si só, é insuficiente para concluir, com certeza, a produção do crime de aborto. É indispensável que se prove que o aborto é consequência do meio abortivo utilizado.15

15 BITENCOURT, César Roberto. Tratado de Direito penal: parte especial: dos crimes contra as pessoas. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 143.

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Diante do exposto, por ser crime material, o aborto possibilita a figura da tentativa, mesmo sendo de difícil comprovação na realidade fática. Neste contexto, deve-se desta-car que a tentativa no autoaborto será tida, por política criminal, mesmo o Código Penal assim não dizendo, como impunível, pois não se tem a previsão legal de punibilidade por autolesão.

Destaca-se, neste sentido, que a tentativa no autoaborto está mais próxima das causas de minoração da consumação, como o arrependimento eficaz ou a desistência voluntária,16 do que propriamente para o tipo penal de aborto.

Por fim, ainda no tocante à consumação e à tentativa, devem ser analisados os meios contraceptivos, ou seja, se poderiam ou não configurar consumação do crime de aborto ou, ao menos, a tentativa deste.

Nestes termos, entendido que o aborto é possível entre as fases de concepção e de parto, os meios contraceptivos ou preventivos, atuando anteriormente à concepção, ou seja, antes mesmo de existir vida intrauterina, ou melhor, evitando que esta venha a se concretizar, não são hábeis a consumar, ou tentar, o crime de aborto. Qualquer medicação, após a concepção, que venha causar a morte do embrião/feto, será entendida como aborto.

2.7. Figuras Majoradas de Aborto

As figuras de aborto, impropriamente rubricadas como “qualificadas”, presentes no art. 127 do Código Penal são, na verdade, hipóteses de causas especiais de aumento de pena, ou seja, hipóteses de majoração da pena, a serem analisadas no momento de sua fixação, com base nas disposições do art. 59 da parte geral do citado Código Penal.

Percebidas as aporias da legislação penal em vigor, necessária se faz a verificação das hipóteses que serão imputadas ao caso concreto.

Assim, vê-se que são duas as causas de majoração da pena trazidas pelo citado art. 127 do Código Penal, senão vejamos:

Forma QualificadaArt. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são au-mentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios

16 No tocante ao arrependimento eficaz e à desistência voluntária, vale ressaltar os ensinamentos de José Frederico Marques, que, frente aos citados temas, assim determina: “A desistência se distingue do arrependimento eficaz porque neste já se ultimou o processo executivo do delito, enquanto que o primeiro se verifica antes de esgotados os atos de execução. [...] A desistência e o arrependimento eficaz independem dos motivos que compeliram o agente a não consumar o crime. Qualquer desistência é boa, desde que seja voluntária. Pouco importa, assim, que a inspire o medo, ou que o agente a pratique compelido por motivos de ordem ética. [...] A desistência ou arrependimento tornam atípicos apenas os atos de execução que iriam configurar a tentativa. Mas é de meridiana compreensão que o agente deve responder criminalmente pelos atos praticados, desde que estes sejam relevantes para o Direito Penal” (MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito penal. Campinas: Bookseller, v. II, 1997. p. 386-391).

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empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

Desta feita, as hipóteses das causas de aumento de pena majorantes serão dife-renciáveis se, pelo aborto os pelos meios praticados para este fim, sofrer a gestante lesão corporal de natureza grave ou, por quaisquer deles, venha a falecer.

Na primeira hipótese acima aludida, qual seja, da lesão corporal de natureza grave em decorrência da prática do aborto ou dos meios utilizados para esse fim, a pena a ser cominada, na terceira fase de cálculo da pena, será aumentada em um terço.

Por outro lado, na segunda hipótese aventada, qual seja, aquela por meio da qual a gestante faleça pela prática dos meios utilizados para efetivar o aborto, ou por ter sido este realizado, a pena a ser cominada será dobrada.

Há que se ressaltar que as “qualificadoras” trazidas pelo tipo penal em apreço somente serão aplicadas nas espécies de aborto descritas nos artigos 125 e 126, ambos do Código Penal, ou seja, somente frente ao aborto praticado por terceiro, com ou sem o consentimento da gestante.

Destaca-se que se, por meio da prática do aborto, a gestante sofrer lesões de na-tureza leve, o terceiro responderá somente pela prática do aborto, tentado ou consumado, pois as lesões de natureza leve estão subsumidas no tipo penal do aborto, cuja verificação no mundo real dos fatos se dá por meio de lesões, aparentes ou não, de natureza leve.

Por fim, há que se destacar também que, para a configuração do crime qualificado pelo resultado, ou seja, os casos trazidos pelo art. 127 do Código Penal, é necessário que a lesão corporal de natureza grave ou a morte decorram ao menos de culpa, nos termos do art. 19 da parte geral do Código Penal, senão vejamos:

Agravação pelo ResultadoArt. 19. Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só res-ponde o agente que o houver causado ao menos culposamente.

No entanto, se a conduta do agente, decorrente de seu dolo, por si só, já abranger a lesão corporal de natureza grave, ou a morte propriamente dita, não haverá aplicação do art. 127 do Código Penal, e, sim, a tipificação específica para a lesão corporal da qual resulta o fim da gravidez, ou o homicídio, em concurso formal de crime,17 com o delito de aborto.

17 O art. 70 do Código Penal, ao tratar das hipóteses de crimes formais, assim determina: “Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior”.

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2.8. Aborto Necessário e Aborto humanitário: Figuras Especiais de Excludentes de Ilicitude

O Código Penal, em seu art. 128, I e II, ressalva duas hipóteses em que o crime de aborto não se configurará, mesmo com as condutas tipificadas como criminosas, o que não são causas especiais de excludentes de ilicitude, haja vista que, diferentemente do disposto no art. 23 da legislação penal em apreço, aqui não se fala em “não há crime”.

Essa ressalva ganha o nomem iuris pela própria legislação penal, no primeiro caso, de “aborto necessário”, e no segundo, de “aborto no caso de gravidez resultante de estupro”, sendo que, neste último, a doutrina já nomeia a conduta ressalvada no artigo citado, como “aborto humanitário ou sentimental”.

Assim, a primeira hipótese a se destacar é a referente ao aborto praticado para sal-vaguardar a vida da gestante, ou seja, é o aborto praticado nos casos em que a finalização da gestação trará a impossibilidade da continuidade da vida para a mãe, pois o aborto é o único meio de salvá-la. É conhecido também como aborto terapêutico.

Para que haja a configuração desta hipótese de aborto autorizado pela legislação penal, é necessário que concorram dois requisitos, quais sejam: o perigo de vida da ges-tante e a inexistência de outro meio de salvar a citada pessoa.

Nestes termos, não basta que a saúde ou a integridade física da gestante estejam em risco, dever-se-á configurar, na hipótese, o iminente perigo de vida, sendo a prática do aborto o único meio hábil a salvar a gestante. Esta hipótese de realização lícita do abortamento também é ressalvada em legislações estrangeiras, conforme se vislumbrará no Capítulo 4 deste trabalho.

Há que se ressaltar nesta hipótese que a concordância da gestante para a prática do abortamento é desnecessária, ou seja, o médico, ou qualquer pessoa, na falta deste, que se deparar com a situação a lume deverá praticar a conduta abortiva, pois estará amparado pelos artigos 23, I e III, 1ª parte; 24; 128, I; e 146, § 3º, todos do Código Penal vigente.18

Desse modo, em se tratando da hipótese de abortamento para fins terapêuticos, deve-se ter em mente que, se houver um autoabortamento, ou caso em que a gestante consinta que terceiro lhe provoque o aborto, não haverá também crime, por inexigibilidade de conduta diversa, haja vista a iminente necessidade do aborto para salvaguardar a vida da gestante. Neste sentido é o entendimento de César Roberto Bitencourt.19

Noutro norte, a outra causa especial de exclusão da ilicitude nos casos de aborto acontece nos casos em que a gravidez ocorre em decorrência de estupro da gestante.

Aqui, diferentemente do aborto terapêutico, pode não ocorrer perigo de vida à gestante, sendo que o autorizativo legal decorre da violação da autonomia da vontade da

18 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Crimes contra a pessoa. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 79.19 BITENCOURT, César Roberto. Tratado de Direito penal: parte especial: dos crimes contra as pessoas. 9. ed.

São Paulo: Saraiva, v. 2, 2009. p. 147.

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gestante, violada pela prática do estupro em seu desfavor, ou seja, não era da vontade da gestante estar em estado gravídico, o que ocorreu em circunstâncias aquém de seu interesse.

Desta feita, no caso trazido pelo art. 128, II, do Código Penal, o chamado aborto humanitário ou ético ou sentimental, conforme visto acima, há uma violação dos interesses pessoais da gestante, fato que, em decorrência disso, autorizará a prática do abortamento licitamente.

Nesta esteira, são requisitos para a concessão do permissivo para a realização do abortamento neste caso, que estejam cabalmente comprovados: gravidez resultante de es-tupro e o prévio consentimento da gestante ou de seu representante legal quando incapaz.

Vê-se, assim, que se diferem, tanto pelas causas objetivas para a concessão, quanto pelas duas causas especiais de exclusão da ilicitude da conduta de abortamento, pela existência prévia de consentimento da gestante, que poderá ou não ocorrer no abor-to terapêutico ou necessário, e sempre deverá ocorrer - e mais, de forma escrita, ou na presença de testemunhas idôneas - nas hipóteses de aborto humanitário ou sentimental.

Ademais, para evitar a falsa imputação da existência de estupro, deve-se observar que, havendo mentira por parte da gestante em relação àquele, e estando o médico de boa-fé, ou seja, tendo sido levado a erro, a gestante responderá pelo crime tipificado no art. 124 do Código Penal, por consentir que terceiro lhe provoque o aborto, sendo que o médico, agindo em erro de tipo, será excluído da tipificação penal, pois não agiu com o dolo necessário para o aborto, o que afastará, no caso, a tipicidade da conduta penalmente recriminada.

Há que se ressaltar ainda que no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), pela Portaria nº 1.508, de 1º de setembro de 2005, do Ministério da Saúde, ficou disciplinado todo o procedimento de justificação e autorização da interrupção da gravidez na hipótese de aborto sentimental ou humanitário.20

Por fim, deve-se destacar a prática dessas espécies de aborto licitamente aceitas pela legislação penal, quando realizadas por enfermeira, haja vista a tipificação penal ressalvar a característica de médico para a prática da conduta abortiva.

Neste contexto, na primeira hipótese, qual seja, de aborto necessário, como visto acima, por haver estado de necessidade, pois não há outro meio de salvaguardar a vida da gestante, nem a enfermeira, nem qualquer outra pessoa, responderá pela prática deste tipo de aborto, mesmo o art. 128, I, tendo tratado somente da figura do médico - ressalva-se que a enfermeira não responderá pelo aborto praticado nos termos do art. 24 do Código Penal, e não nos termos do artigo aludido acima, que ressalva somente a figura do médico.

Por outro lado, em se tratando de aborto nos casos em que a gravidez provém de estupro da gestante, a enfermeira, para Damásio de Jesus, responderá: “a enfermeira

20 MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de Direito penal: parte especial, arts. 121 a 234 do Código Penal. 25. ed. rev. e atual. até 31 de dezembro de 2006. São Paulo: Atlas, v. 2, 2008. p. 69.

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responde pelo delito, uma vez que a norma permissiva faz referência expressa à qualidade do sujeito que pode ser favorecido: deve ser médico”.21

Analisando não somente a questão da antijuridicidade da conduta e a sua tipici-dade, deve-se promover a visualização da culpabilidade, de modo que, havendo alguma questão, por exemplo, de inexigibilidade de conduta diversa ou obediência de ordem hierarquicamente superior não manifestamente ilegal, a culpabilidade, necessária para a criminalização da conduta, será prejudicada.

Dito isso, em casos em que as enfermeiras atuarem ao lado do médico, ajudando--o, auxiliando-o, ou até mesmo realizando a conduta, sob a supervisão do médico, crime não haverá.22

2.9. Ação Penal e Sanção Penal

A ação penal nos crimes de aborto, por tudo o que foi visto acima, só poderia ser, e o é, de natureza pública, pois o bem jurídico protegido é a vida, seja ela extrauterina, que não é o caso, ou uterina.

Assim, a ação penal nos crimes de aborto é uma Ação Penal Pública Incondi-cionada, ou seja, nos casos de aborto, as autoridades poderão agir ex officio, de ofício, por impulsos próprios, independentemente de representação da vítima ou requisição do Ministro da Justiça.

Com relação à sanção penal nos crimes de aborto, César Roberto Bitencourt23 assim destaca brevemente:

No auto-aborto (art. 124) a pena é de detenção, de 1 a 3 anos; no aborto provocado por terceiro, sem consentimento (art. 125), a pena é de reclusão, de 3 a 10 anos; no aborto consentido (art. 126), a pena é de reclusão, de 1 a 4 anos. Se a gestante for absolutamente incapaz, a pena do aborto consensual também será de 3 a 10 anos. Nas ditas formas “qualificadas”, as penas serão majoradas em um terço se a gestante sofrer lesão grave, e duplicadas se lhe sobrevier a morte.

21 JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte especial. 22. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 1999. p. 124.22 Neste sentido há que se destacar o entendimento de César Roberto Bitencourt, que, acerca da problemática

da realização de aborto humanitário ou ético por enfermeira, assim aduz: “Ora, se o fato praticado pelo médico, que é o autor, for lícito, não há como punir o partícipe, e o fundamento da impunibilidade da conduta da enfermeira, enquanto partícipe, respalda-se na teoria da acessoriedade limitada da participação, a qual exige que a conduta principal seja típica e antijurídica. Isso quer dizer que a participação é acessória da ação principal, de um lado, mas que também depende desta até certo ponto. Não é necessário que o autor seja culpável. É suficiente que sua ação seja antijurídica, isto é, contrária ao direito, sem necessidade de ser culpável. O fato é comum, mas a culpabilidade é individual” (BITENCOURT, César Roberto. Manual de Direito penal: parte especial, dos crimes contra as pessoas. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 149).

23 BITENCOURT, op. cit., p. 159.

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Assim, tendo sido conceituada a anencefalia, vistos os métodos de sua verificação, bem como pormenorizado o estudo acerca do tipo penal aborto, é chegada a hora de adentrar na possibilidade de a antecipação terapêutica da gestação ocorrer nos casos de anencefalia, de modo a extrair da legislação vigente substrato legal necessário e bastante para legitimar tal medida, de modo a se concluir pela desnecessidade de nova lei regulando o caso.

3. A POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO NOS CASOS DE ANENCEFALIA: UMA ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INTERNA VIGENTE COMO FONTE SUFICIENTE PARA ESSE FIM

Percebidos os pontos mais relevantes acerca da conceituação e dos métodos de ave-riguação da anencefalia fetal, bem como, em linhas gerais, os principais pontos de destaque no tocante ao crime de aborto e suas espécies criminalizadas e descriminalizadas, essas últimas, pela causa de exclusão especial de ilicitude, é necessário agora demonstrar, sob uma análise da legislação interna vigente, que há possibilidade de antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia, mesmo sem haver legislação específica para esse fim.

No entanto, ressalta-se, a priori, que o tema trazido a lume guarda consigo uma grande carga de moralidade e ética, ou seja, os mais variados sentimentos sociais.

Diante disso, ter-se-á uma análise, neste trabalho, aquém de quaisquer dessas visões citadas acima, sobre o tema em destaque, haja vista que se pautará pela leitura e discussão de artigos da Constituição federal de 1988, bem como de legislação infracons-titucional, tendo como base, para tanto, a doutrina e a jurisprudência e, mais, projetos de Lei existentes acerca do tema.

Desta feita, para uma primeira análise legal e doutrinária acerca dessa possibilida-de, tem-se que destacar o disposto na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei 4.657, de 4 de setembro de 1942, com redação dada pela Lei 12.376, de 2010) que, em seu art. 4º, ao tratar de omissões legais, ou seja, dos casos em que não houver legislação específica para solução da lide, determina que o juiz deverá aplicar, dentre outros, o instrumento da analogia,24 senão vejamos:

24 Acerca da possibilidade de utilização da analogia no Direito penal, destaca-se a possibilidade de referida situação ocorrer em benefício do réu, ou seja, analogia in bonam partem. Nestes termos, a analogia poderia ser substrato legal para permitir a antecipação terapêutica do parto, pois, ao contrário do que alguns propõem, não se trata de vilipendiar a vida do feto, haja vista que esta não existe, pois não há vida sem atividade cerebral, o que nos casos de anencéfalo fica caracterizado. De modo diverso, ressalta-se decisão do egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que em julgamento deste sentido entendeu: “ALVARÁ JUDICIAL - ANENCEFALIA - PEDIDO DE INTERRUPÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO - DIREITO A VIDA. Impossível decretar ou mesmo antecipar a morte, mesmo diante da situação apresentada nos autos, pois o feto é incontroverso pode nascer com vida, não sendo possível utilizar a analogia e/ou princípios genéricos para fundamentar suposições e ilações desprovidas de qualquer fundamento legal” (Processo nº 1998183-45.2006.8.13.0024, Des. Rel. Nilo Lacerda, j. em 08.11.2006, publicado no DJU em 29.11.2006).

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Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Assim sendo, como não há em uma primeira análise legislação que autorize a possibilidade de realização da antecipação terapêutica do parto, poderá o juiz da causa, utilizando-se dos meios destacados acima, pela legislação pátria, resolver o direito plei-teado, concedendo-o ou negando-o.

Ademais, percebida a possibilidade de utilização do art. 4º, acima visto, para a autorização terapêutica do parto, nos casos a lume, cabe agora destacar alguns pontos do direito civil da personalidade, ou seja, determinar onde começam os direitos de perso-nalidade e onde terminam, mais precisamente, onde começa e onde termina a vida para a legislação civil pátria, disciplinando a questão do nascituro.

Neste contexto, o art. 2º do Código Civil de 2002 destaca que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

Assim, vê-se que a realização efetiva da personalidade, os direitos da pessoa, só ocorre com o nascimento com vida, sendo que o nascituro, que possui uma expectativa de direito, foi protegido desde a concepção até o momento do parto.25

Neste sentido, o nascituro é um ser que guarda proteção da legislação civil, somen-te porque se tem a visão de que virá, no futuro, a nascer com vida.26 Diante disso, pela impossibilidade de vida no feto anencéfalo, pois se trata de um feto com morte cerebral, o que afasta qualquer incidência de vida, o nascituro pode sofrer restrição dessa proteção, para aplicação da antecipação terapêutica do parto, haja vista que a finalidade da proteção legal será prejudicada pela morte cerebral do anencéfalo.

Percebido, assim, o momento em que se adquire personalidade jurídica, bem como a ressalva feita ao nascituro, e, enfrentada a possibilidade de antecipação terapêutica do parto, pela perda da finalidade dessa proteção nos casos de fetos com anencefalia, faz-se necessário agora ter por base o fim da vida, haja vista que o Código Civil de 2002 desta-cou que a morte é quem põe fim à vida, mas não delimitou o que se considera por morte.

25 Neste sentido se coloca a doutrina de Silvio de Salvo Venosa, que assim expressa: “O fato de o nascituro ter proteção legal não deve levar a imaginar que tenha ele personalidade tal como a concebe o ordenamento. O fato de ter ele capacidade para alguns atos não significa que o ordenamento lhe atribua personalidade. Embora haja quem sufrague o contrário, trata-se de uma situação que somente se aproxima da personalidade. Esta só advém do nascimento com vida. Trata-se de uma expectativa de direito” (VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2003. p. 161-162).

26 Sob o aspecto do nascimento com vida do feto, devem ser destacadas as disposições da Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), que em seu art. 53, § 2º, determina: “Art. 53. No caso de ter a criança nascido morta ou no de ter morrido na ocasião do parto, será, não obstante, feito o assento com os elementos que couberem e com remissão ao do óbito.[...].§ 2º No caso de a criança morrer na ocasião do parto, tendo, entretanto, respirado, serão feitos os dois assentos, o de nascimento e o de óbito, com os elementos cabíveis e com remissões recíprocas”.

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83A POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO

Desse modo, a legislação pátria, que hoje é a responsável por determinar o que venha a ser o evento morte, bem como qual o momento em que ela estará configurada, é a Lei de Doação e Transplante de Órgãos e Tecidos - Lei 9.434/97.

Nessa legislação, responsável por regular a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento, está vislumbrado, em seu art. 3º, que:

Art. 3º A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser prece-dida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.

Assim, em se tratando de morte, a legislação em vigor determina ser aquela em que ocorrer a morte encefálica, ou seja, a morte cerebral. Alhures, a legislação responsável pelo transplante de órgãos e tecidos post mortem, ao contrário da atual, determinava que a possibilidade de retirada dos órgãos só ocorreria após a morte cardiorrespiratória, com a parada do coração, o que hoje ocorre com a morte do cérebro.

Neste sentido, havendo-se a morte cerebral como marco para reconhecimento da morte, quanto ao feto anencéfalo, que nem ao menos cérebro possui, haja vista que a parte do encéfalo que pode ainda restar ao anencéfalo não é propriamente cérebro, como impedir que sejam realizadas as antecipações terapêuticas do parto nestes casos?

Data venia, desconhecer a possibilidade aventada é deslegitimar o transplante de órgãos, tendo em vista que, ocorrido, haveria crime de homicídio. Reconhecer a morte de quem nasceu com vida pela morte cerebral, mas não reconhecê-la naquele que nem ao menos chegou a nascer, ressaltando que este último nem ao menos cérebro possui, é um contrassenso.

Diante do exposto, há que ressaltar, ainda, o entendimento do médico Marco Antônio Becker,27 à época, Secretário do Conselho Federal de Medicina, que sustenta:

Quando a mãe pede para retirar o feto e o médico pratica o ato, isso não configura propriamente aborto, com base no art. 126, do Código Penal, pois o feto, conceitualmente, não tem vida. [...] a morte não é um evento, mas sim um processo. O conceito jurídico de morte considera um determinado ponto desse processo biológico. Durante séculos adotou-se a parada cardiorrespiratória como índice demarcador da vida.

27 BECKER, Marco Antônio. Anencefalia e possibilidade de interrupção da gravidez. Revista Medicina, Conselho Federal de Medicina, n. 155, p. 10, maio/jul. 2005. In: BITENCOURT, César Roberto. Manual de Direito penal: parte especial, dos crimes contra as pessoas. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 154.

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Portanto, a morte encefálica ou cerebral é aquela que determina o termo da morte da pessoa, de modo que, no caso do anencéfalo, já vistas todas as conceituações técnicas acima acerca da anencefalia, a gestante, por autonomia da vontade, pois não estará obriga-da a realizar o procedimento, tão somente não sendo, de outro modo, obrigada a carregar um natimorto28 por todo período gestacional, poderá antecipar terapeuticamente seu parto.

De outro lado, além dos argumentos expostos para a possibilidade de antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia, deve-se, também, destacar a questão da atipicidade da conduta, haja vista que não se poderia subsumi-la ao tipo penal de aborto, pois não há condutas, no caso a lume, conforme as criminalizadas pelo crime de aborto.

Desse modo, conforme destacado acima, quando se falou do crime de aborto, os requisitos necessários para sua configuração não estão presentes no caso da interrupção terapêutica do parto na anencefalia, haja vista que não existe feto vivo legalmente, bem como sua morte não ser decorrente das manobras abortivas, pois o restante dos órgãos do feto que sobrevive à gestação - ressalta-se que a grande maioria dos anencéfalos não sobrevive, tendo em vista a incidência dos abortos espontâneos - só funcionam por estarem em contato com o corpo da mãe.29

No mais, também merece destaque o argumento a embasar a questionada possibi-lidade de antecipação terapêutica do parto, respaldado na Dignidade da Pessoa Humana da gestante, bem como pela impossibilidade de impor a ela um tratamento que no fundo acabará por afrontar o art. 5º, III, da CF/88.

Neste desiderato, vê-se que o princípio insculpido pela Carta Magna de 1988, como sendo o balizador para a solução de conflitos entre direitos constitucionais, é o princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que aparece no Texto Constitucional, nos termos do art. 1º, III, como sendo um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.

Destacou-se, assim, para o citado princípio, a base de todo ordenamento jurídico, sendo que nenhuma legislação poderá imputar aos brasileiros e estrangeiros que aqui residirem condutas ou vedações que afrontem a sua dignidade humana.

28 Sob a característica apontada ao nascituro vítima de anencefalia, qual seja, natimorto, destaca-se a Resolução nº 1.752/04, do Conselho Federal de Medicina, que afirma que o anencéfalo, “o ser proveniente desta gestação não tem como escapar de uma fatal parada cardiorrespiratória ainda durante as primeiras horas após o parto”, ou seja, o anencéfalo é um feto sem cérebro, sendo assim, com morte cerebral preexistente e que após o nascimento certamente será vitimado também por uma parada cardiorrespiratória.

29 Neste sentido, destaca-se o entendimento do médico Marco Antônio Becker, para quem “não há por que adicionar outra excludente ao art. 128 do Código Penal, pois pelas razões expostas o ordenamento jurídico já existente autoriza o médico a retirar o feto anencéfalo da gestante, a seu pedido, sem que isso incorra em infração penal ou ética, pois, repetimos: se não há vida, não há que se falar em aborto” (BECKER, Marco Antônio. Anencefalia e possibilidade de interrupção da gravidez. Revista Medicina, Conselho Federal de Medicina, n. 155, p. 10, maio/jul. 2005. In: BITENCOURT, César Roberto. Manual de Direito penal: parte especial, dos crimes contra as pessoas. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 155).

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Assim, a mera imposição para a gestante de feto anencéfalo que leve sua gestação até seu termo é clara violação da dignidade da pessoa humana, bem como restrição ao direito à saúde (arts. 6º e 196 da CF/88), fato que, por si só, já é bastante para possibilitar a interrupção terapêutica da gestação,30 pois, se não há iminente perigo de morte para a gestante, há clara afronta ao psicológico da gestante, que passará a gerar a morte, e não a vida.

De outro lado, mas ainda nos termos constitucionais, há possibilidade jurídica de antecipação do parto na gestação de feto anencéfalo, pela imposição do art. 5º, III, da CF/88, que veda a imputação às pessoas, de tratamento desumano ou degradante, senão vejamos:

Art. 5º [...]:[...];III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante.

Portanto, a discutida imposição legal da permanência da gestação mesmo nos casos de anencefalia certamente traria à gestante, bem como ao pai, um tratamento desumano ou, ao menos, degradante, o que é vedado pela Constituição da República de 1988, conforme visto acima.

Desta feita, por não serem permitidos tais tratamentos, não há que se falar em impossibilidade de antecipação terapêutica do parto na gestação de feto anencéfalo, haja vista a determinação expressa da CF/88, afastando das pessoas os tratamentos - que podem originar-se de expressa imposição de lei ou por omissão dela - desumanos e degradantes, bem como a tortura, o que ocorrerá, certamente, em impondo a conclusão da gestação nos casos de fetos anencéfalos.

Por fim, como um possível embasamento para a antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia, se tem o questionamento acerca da presença de causa exclu-dente da culpabilidade, ou seja, em reconhecendo o ato típico e ilícito, não seria culpável, por estar presente Inexigibilidade de Conduta Diversa.

Diante disso, ressalta-se o entendimento de Francisco de Assis Toledo,31 quando trata da citada causa de exclusão da culpabilidade, de modo que:

A inexigibilidade de outra conduta é, pois, a primeira e mais impor-tante causa de exclusão da culpabilidade. E constitui um verdadeiro princípio de direito penal. Quando aflora em preceitos legislados,

30 Fala-se em interrupção terapêutica da gestação, pois se acredita que, nos casos dos anencéfalos, não há subsunção ao tipo penal de aborto, o que afastaria a incidência deste, de modo que não há que se falar em aborto de anencéfalo, pois aborto não há.

31 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito penal: de acordo com a Lei nº 7.209, de 11.07.1984 e com a Constituição Federal de 1988. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1984. p. 328-329.

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é uma causa legal de exclusão. Se não, deve ser reputada causa supralegal, erigindo-se em princípio fundamental que está intima-mente ligado com o problema da responsabilidade pessoal e que, portanto, dispensa a existência de normas expressas a respeito. [...] Muito tem se discutido sobre a extensão da aplicação do princípio em foco, entendendo alguns autores que sua utilização deva ser restringida às hipóteses previstas pelo legislador para evitar-se mais uma alegação de defesa que poderia conduzir à excessiva impuni-dade dos crimes. Não vemos razão para esse temor, desde que se considere a “não exigibilidade” em seus termos, isto é, não como um juízo subjetivo do próprio agente do crime, mas, ao contrário, como um momento do juízo de reprovação da culpabilidade normativa, o qual, conforme já salientamos, compete ao juiz do processo e a mais ninguém (grifos nossos).

Assim, percebe-se que a antecipação terapêutica do parto é ato que não pode ser impedido ou criminalizado quando a gestante optar, nos casos de anencefalia, por sua realização, tendo em vista que não é exigível que atue de outra forma, ou seja, não é exi-gível que uma gestante, que almeja dar a vida a um ser tão esperado, tenha que carregar a morte por nove meses, tendo a certeza de que seu filho, se sobreviver à gestação com a ajuda de seu corpo, fora dele, não sobreviverá.

Desse modo, culpabilidade não haverá se a gestante, nos casos acima, tomar a decisão por antecipar a sua gestação, pois é inexigível que continue sofrendo essa tortura psicológica de estar gerando uma morte, e não uma vida.

Desta feita, tais pontos são aqueles que merecem destaque quando se tratar da temática da possibilidade de antecipação terapêutica do parto nos casos de fetos anencé-falos, sendo que não se afastam outros argumentos de cunho social, psicológico, filosófico e político para embasar tal possibilidade, ainda mais do que a legislação em vigor já o faz.

32 Sob a possibilidade de antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia fetal, existem inúmeros Projetos de Lei em trâmite, sendo que quase nunca são efetivamente analisados sobre o prisma legal, como deveriam sê-lo. Exemplos são os Projetos de Lei 4.360, de autoria do Deputado Federal Dr. Pinotti, e o 4.304, de autoria do Deputado Federal Eduardo Valverde, ambos para autorização “do aborto”, nos casos de anencefalia. Mesmo sendo desnecessária tal legislação nova, bem como não se tratando de aborto, por tudo o que já se viu acima, tais projetos de lei são exemplos de que o Legislativo começa a transformar seu pensamento frente ao tema em destaque.

33 Neste sentido o STF, no julgamento da ADI 4277, autorizou, recentemente, o reconhecimento de União Estável nos relacionamentos homoafetivos, o que demonstra um atraso no Legislativo brasileiro, haja vista ser o Judiciário fonte indireta de demonstração dos anseios sociais, pois esta é de pronto demonstrada pela legislação posta, a partir do trabalho dos representantes eleitos para esse fim, quem efetivou um direito a muito garantido pela Constituição, qual seja, a igualdade.

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O Brasil tem que afastar de seu Poder Legislativo32 pensamentos impregnados de religiosidades, que fazem com que nossos Tribunais Superiores,33 em muitos casos, acabem por, suprimindo a lacuna legal, ou interpretando sistematicamente o ordenamento jurídico, venham a autorizar questões que ainda não são reconhecidamente úteis aos anseios políticos dos representantes eleitos.

É certo que ainda há um grande caminho a se percorrer neste sentido, caminho este que passará pela interpretação teleológica do ordenamento jurídico, de modo que o Judiciário veja no direito posto a vontade do legislador, e não simplesmente a literalidade da lei que, no caso do Código Penal, legislação de 1940, encontra-se desatualizada, em alguns pontos, frente a nossa Constituição Federal.

Nestes termos, o legislador penal de 1940 não autorizou a antecipação terapêutica do parto, mesmo que fosse tratada como aborto de anencéfalo, à época, por não ter meios científi-cos capazes de detectar tais anomalias que impossibilitam o anencéfalo de algum dia ter vida.

Assim, destaca-se o entendimento de Carlos Artidório Allegritti, para quem há uma necessidade de reconhecimento de que a legislação deve acompanhar a transformação social, ou seja, as novas vontades do povo, bem como se atualizar frente a questões que antes não eram possíveis de serem tratadas, seja por falta de tecnologia, seja pelo pensamento social à época, senão vejamos:

É impensável que, no Brasil, em horizonte visível, se possa chegar à descriminalização do aborto. O tema está impregnado, ainda, de intolerância religiosa e moral. E, todavia, dever-se-ia pensar no assunto muito séria e racionalmente. O Brasil rural, sem espaços públicos para a discussão da autonomia e liberdades públicas, ambiente em que foi editado o Código Penal que vigorou em 1940, não existe mais. Deu lugar a um país urbano e favelizado, com imensas diferenças sociais, com enorme índice de exclusão, com absoluto desrespeito pelas minorias, mas com paradoxal consciência do coletivo, de espaços conquistados na direção da cidadania, dos direitos individuais e transindividuais e dos direitos humanos. O direito como legislação e como interpretação tem que recuperar o tempo perdido, eis que evoluiu menos do que a sociedade.

Destaque disso, ou seja, dessa falta de evolução legal, bem como da interpretação normativa meramente literal, que se utiliza de uma legislação arcaica frente à Constituição da República de 1988, que não fora inspirada em um Texto Constitucional que garanta a dignidade da pessoa humana como ápice dos princípios a serem respeitados, é o jul-gamento pelo Superior Tribunal de Justiça do Habeas Corpus 32.159, oriundo do Rio de Janeiro, de onde se extrai o seguinte:

Pedido de autorização para a prática de aborto. Nascituro acometido de anencefalia. Legislador eximiu-se de incluir no rol das hipóteses autorizadas do aborto, previstas no art. 128 do Código Penal, o caso descrito nos presentes autos. O máximo que podem fazer os defen-

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sores da conduta proposta é lamentar a omissão, mas nunca exigir do Magistrado, intérprete da Lei, que se lhe acrescente mais uma hipótese que fora excluída de forma propositada pelo Legislador. Ordem concedida para reformar a decisão proferida pelo Tribunal a quo, desautorizando o aborto (Superior Tribunal de Justiça, HC 32.159/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, j. em 17.02.2004).

Do mesmo modo, o Supremo Tribunal Federal, acerca do tema, já se posicionou também pela impossibilidade do “aborto” nos casos de anencefalia. Ressalta-se, porém, que há divergência sobre o tema, haja vista que no julgamento da matéria em destaque, erigida na ADPF - QO 54, oriunda do Distrito Federal, o Ministro Marco Aurélio tenha concedido pedido liminar, como relator da matéria, para que se possibilitasse a antecipa-ção terapêutica do parto, antes que o pleno, posteriormente, viesse a se posicionar pela negativa, senão vejamos:

ADPF - Adequação - Interrupção da Gravidez - Feto Anencéfalo - Política Judiciária - Macroprocesso. Tanto quanto possível, há de ser dada sequência a processo objetivo, chegando-se, de imediato, a pronunciamento do Supremo Tribunal Federal. Em jogo valores consagrados pela Lei Fundamental - como o são os da dignidade da pessoa humana, da saúde, da liberdade e autonomia da manifes-tação da vontade e da legalidade -, considerados a interrupção da gravidez de feto anencéfalo e os enforques diversificados sobre a configuração do crime de aborto, adequada surge a arguição de des-cumprimento de preceito fundamental. ADPF - Liminar - Anencefalia - Interrupção da Gravidez - Glosa Penal - Afastamento - Mitigação. Na dicção da ilustrada maioria, entendimento em relação ao qual guardo reserva, não prevalece em arguição de descumprimento de preceito fundamental, liminar no sentido de afastar a glosa penal relativamente àqueles que venham a participar da interrupção da gravidez no caso de anencefalia (Supremo Tribunal Federal, ADPF - QO 54-8/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 27.04.2005).

Por tudo isso, tem-se que há premente necessidade de transformação no en-tendimento de nossos Tribunais Superiores, de modo que interpretem os dispositivos de leis infraconstitucionais, à luz dos princípios e garantias insculpidos na CF/88, o que possibilitará, sem que haja inclusão dessa possibilidade na legislação penal ou alteração da legislação civil, a antecipação terapêutica do parto nos casos de fetos anencéfalos.

4. UMA ANÁLISE DO PROBLEMA à LUz DO DIREITO COMPARADO: A ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DO PARTO NOS CASOS DE ANENCEFALIA NOS PAÍSES DO MERCOSUL

A abordagem do tema em apreço frente ao Direito alienígena restringiu-se aos países do Mercosul - Mercado Comum do Sul, haja vista que, pela proximidade cultural,

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política, territorial e econômica entre o Brasil e estes países, a conotação do tema em destaque ganha força para a discussão aventada.

Desta feita, vê-se que o Mercosul teve, em linhas gerais, início com o Tratado de Assunção, em que, em princípio, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai fariam parte do Bloco Econômico criado,34 o que lhes possibilitaria uma facilidade em negociações internacionais, por onde, ao invés de se pactuar como país autônomo, utilizar-se-ia do bloco para tais fins.

Ressalta-se que, tendo em vista o tema proposto neste trabalho, recomenda-se, para aprofundar, mais precisamente, nos conceitos e bases teóricas de criação, expansão e consolidação do Mercosul como bloco econômico, a obra de Valério de Oliveira Mazzuoli,35 da qual se extrai uma noção panorâmica do Direito Internacional, bem como dos agentes internacionais, dentre os quais se destaca o Mercosul.

Visto os motivos que restringiram a análise desta abordagem internacional do tema em apreço, destacam-se, neste momento, necessariamente, os pontos de cada legislação em cada um dos integrantes do Mercosul, ou seja, já passada a análise do tema frente ao ordenamento jurídico pátrio, cabe agora sua análise em face do Direito estrangeiro.

Diante disso, com relação à legislação penal na Argentina, o Código Penal argentino prevê em seus artigos 85 e 86 que:

Art. 85. El que causare un aborto será reprimido:1. Con reclusión o prisión de tres a diez años, si obrare sin consentimiento de la mujer. Esta pena podrá elevarse hasta quince años, si el hecho fuere seguido de la muerte de la mujer;2. Con reclusión o prisión de uno a cuatro años, si obrare con consentimiento de la mujer. El máximum de la pena se elevará a seis años, si el hecho fuere seguido de la muerte de la mujer.Art. 86. Incurrirán en las penas establecidas en el artículo anterior y sufrirán, además, inhabilitación especial por doble tiempo que el de la condena, los médicos, cirujanos, parteras o farmacéuticos que abusaren de su ciencia o arte para causar el aborto o cooperaren a causarlo.El aborto practicado por un médico diplomado con el consentimiento de la mujer encinta, no es punible:1. Si se ha hecho con el fin de evitar un peligro para la vida o la salud de la madre y si este peligro no puede ser evitado por otros medios;

34 Há que ressaltar-se que em julho de 2006 a Venezuela veio a fazer parte da formação do Mercosul, que passou a contar com cinco, e não somente quatro países. Assim, além de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, hoje a Venezuela também é integrante do Mercado Comum do Sul, ainda que pese a obrigatoriedade de cumprimento de algumas exigências para adaptação total às regras do bloco.

35 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional público: parte geral. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

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2. Si el embarazo proviene de una violación o de un atentado al pudor cometido sobre una mujer idiota o demente. En este caso, el consentimiento de su representante legal deberá ser requerido para el aborto.

De modo, por tais disposições, percebe-se que a legislação penal argentina também não prevê, conforme a legislação penal brasileira, a possibilidade de realização de aborto nos casos de anencefalia, sendo que, de modo bem geral, possibilita a realização daquele somente nos casos em que resultar de perigo à vida da gestante ou se a gravidez houver sido fruto de estupro.

Tendo em vista tais disposições, há que se destacar, também nestes sentidos, a legislação penal da República Oriental do Uruguai, que assim determina em se tratando do crime de aborto:

Artículo 325. (Aborto con consentimiento de la mujer)La mujer que causare su aborto o lo consintiera será castigada con prisión, de tres a nueve meses.325 bis. (Del aborto efectuado con la colaboración de un tercero con el consentimiento de la mujer)El que colabore en el aborto de una mujer con su consentimiento con actos de participación principal o secundaria será castigado con seis a veinticuatro meses de prisión.325 ter. (Aborto sin consentimiento de la mujer)El que causare el aborto de una mujer, sin su consentimiento, será castigado con dos a ocho años de penitenciaría.326. (Lesión o muerte de la mujer)Si a consecuencia del delito previsto en el artículo 325 (bis), sobreviniera a la mujer una lesión grave o gravísima, la pena será de dos a cinco años de penitenciaría, y si ocurre la muerte, la pena será de tres a seis años de penitenciaría.Si a consecuencia del delito previsto en el artículo 325 (ter.) sobreviniere a la mujer una lesión grave o gravísima, la pena será de tres a nueve años de penitenciaría y si ocurriese la muerte, la pena será de cuatro a doce años de penitenciaría.327. (Circunstancias agravantes)Se considera agravado el delito:Cuando se cometiera con violencia o fraude.Cuando se ejercitare sobre la mujer menor de dieciocho años, o privada de razón o de sentido.Cuando se practicara por el marido o mediando alguna de las circunstancias previstas en el inciso 14 del artículo 47.328. (Causa atenuantes y eximentes)Si el delito se cometiera para salvar el propio honor, el de la esposa o un pariente próximo, la pena será disminuida de un tercio a la mitad, pudiendo el Juez, en el caso de aborto consentido, y atendidas las circunstancias del hecho, eximir totalmente de castigo. El móvil

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de honor no ampara al miembro de la familia que fuera autor del embaraza.Si el aborto se cometiere sin el consentimiento de la mujer, para eliminar el fruto de la violación, la pena será disminuida de un tercio a la mitad, y si se efectuare con su consentimiento será eximido de castigo.Si el aborto se cometiere sin consentimiento de la mujer, por causas graves de salud, la pena será disminuida de un tercio a la mitad, y si se efectuare con su consentimiento o para salvar su vida, será eximido de pena.En el caso de que el aborto se cometiere sin el consentimiento de la mujer por razones de angustia económica el Juez podrá disminuir la pena de un tercio a la mitad y si se efectuare con su consentimiento podrá llegar hasta la exención de la pena.Tanto la atenuación como la exención de pena a que se refieren los incisos anteriores regirá sólo en los casos en que el aborto fuese realizado por un médico dentro de los tres primeros meses de la concepción. El plazo de tres meses no rige para el caso previsto en el inciso 3º.

Diante do exposto pela legislação penal uruguaia, de modo geral, merece destaque a possibilidade de minoração da penal no caso dos abortos praticados para salvaguarda da honra, o que em nossa legislação já desapareceu, sendo que, no mais, a legislação uruguaia, ao criminalizar a conduta abortiva, nada fala acerca do problema envolvendo os anencéfalos, do mesmo modo que o Código Penal argentino e o Código Penal pátrio.

Nestas mesmas linhas, a legislação penal paraguaia, em seus artigos 349, 350, 351 e 352 do Código Penal paraguaio de 1998, ao tipificar a conduta do crime de aborto, faz ressalva somente à possibilidade de sua realização, sem que haja configuração de crime, para os casos em que há necessidade de salvaguardar a vida da gestante, não disciplinando os casos de anencefalia, nem os casos em que a gravidez resultar de estupro.

Por fim, quanto à legislação penal venezuelana, os artigos 430 a 434 do Código Penal da Venezuela, ao tratarem do crime de aborto, de modo geral assim asseveram:

Artículo 432 - La mujer que intencionalmente abortare, valiéndose para ello de medios empleados por ella misma, o por un tercero, con su consentimiento, será castigada con prisión de seis meses a dos años.Artículo 433 - El que hubiere provocado el aborto de una mujer, con el consentimiento de esta, será castigado con prisión de doce a treinta meses.Artículo 435 - No incurrirá en pena alguna el facultativo que provoque el aborto como medio indispensable para salvar la vida de la parturienta.

Assim, no contexto das legislações alienígenas em comento, utilizadas como parâ-metro para a visualização do tema em apreço, pode-se perceber que todas, assim como na legislação pátria, não asseguram, em seus Códigos Penais, ao disporem sobre o crime

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de aborto, a ressalva frente aos casos de anencefalia,36 relegando-se somente a ressalvar os casos em que a gravidez resultar em perigo de morte à gestante, ou for resultante de estupro, com exceção da legislação paraguaia que ressalva somente a primeira hipótese.37

Neste desiderato, em comparação com outras legislações internacionais, princi-palmente aquelas oriundas de países desenvolvidos, onde o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é maior do que nos países em apreço, a legislação penal destes últimos ainda está atrelada às vontades da Igreja.

Por serem países católicos, a influência da Igreja ainda hoje impossibilita alguns avanços legais, principalmente em criminalizar ou descriminalizar uma conduta, mesmo que não haja necessidade de nova legislação para a possibilidade de antecipação terapêutica do parto, nos casos em que se detectar anencefalia em se tratando de Brasil, conforme se demonstrou no Capítulo 3 deste trabalho.

Por fim, as legislações do Direito estrangeiro expostas, bem como a legislação penal pátria, demonstram que as questões morais e éticas, ou seja, de cunho não cientí-fico, em se tratando da ciência do Direito, ainda permeiam, e muito, os anais dos Poderes Legislativos da América Latina.

De modo que a visão das legislações penais dos países do Mercosul demonstra cabalmente tais fatos, ao passo que não reconhecem, expressamente, as situações de anencefalia como basilares para a possibilidade de realização da antecipação terapêutica do parto, escorando-se, para tanto, mais em argumentos de cunho pessoal, religioso e moral do que propriamente em argumentos jurídicos válidos.

CONCLUSÃO

Por tudo isso, se vê que a antecipação terapêutica do parto nos casos de fetos com anencefalia já se encontra respaldada pela legislação em vigor, a um pela proteção da dignidade da pessoa humana da mãe, a dois, pela inexigibilidade de outra conduta, o que afastaria a culpabilidade do ato, a três, pelo tratamento desumano, degradante e torturante que a CF/88 veda, mas que é imposto pelo não reconhecimento, nos casos de anencefalia, da possibilidade de antecipação do parto, e, a quatro, por tal possibilidade não configurar crime de aborto, pela falta de subsunção ao tipo penal, ou seja, nos casos

36 COUTINHO, Luiz Augusto. Aborto em casos de anencefalia: crime ou inexigibilidade de conduta diversa? Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 617, 17 mar. 2005. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/6423>. Acesso em: 02 maio 2011.

37 Do modo geral, percebe-se, também, que nestas legislações a possibilidade de aborto, nos casos em que é permitido, é interpretada como sendo um caso particular de estado de necessidade ou como consequência da regra geral dessa causa excludente de ilicitude. Assim destacou Edgarg Magalhães Noronha. (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2001. p. 64).

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93A POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO

descritos acima não há impedimento ao direito do nascituro de ter vida, pois esta não há, conforme de depreende da legislação acerca do transplante e doações de órgãos.

Assim, comparando-se a legislação pátria, frente à questão levantada, com a legis-lação dos países do Mercosul - escolheu-se restringir a análise aos países do Mercosul, pela proximidade territorial, comercial e cultural -, percebe-se que a questão da anencefalia não se encontra legislada em nenhum dos ordenamentos jurídicos analisados, fato que demonstra a influência que ainda têm a religião e a moral, daquilo que a igreja entende como o correto, nos países em desenvolvimento.

Por fim, o reconhecimento da possibilidade de antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia fetal é questão que vai além de nova legislação, pois o ordenamento em vigor já possibilita tal conduta, está atrelado a questões religiosas, morais, éticas, que ainda são substrato para decisões tomadas muito mais pelo que a mídia tem como correto do que pelo que a Constituição Federal de 1988 define como direitos e garantias individuais a serem resguardados a todos, sem qualquer distinção.

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DO PREQUESTIONAMENTO NOS RECURSOS EXCEPCIONAIS CÍVEIS

MÁRCIA SILVANA FELTENEspecialista em Direito Processual Civil pela Unijuí. Advogada.

Conhecer os meios que asseguram a vitória não significa obtê-la. (Sun Tzu)

SUMÁRIO: Introdução - 1. Recursos - 2. Prequestionamento: gênese - 3. Ponderações sobre as espécies de prequestionar - Considerações finais - Referências.

RESUMO: O prequestionamento é requisito de admissibilidade verificado nos recursos excepcionais cíveis brasileiros, sem, contudo, haver dispositivo legal específico elencando-o como tal. Há, assim, a necessidade de sanar a lacuna legal desta prática jurídico-doutrinária. Dessarte, hodiernamente, o prévio questionar pode ser subentendido em alguns dispositivos da legislação constitucional e processual cível vigente, reforçada por textos sumulares. Em decorrência, as incertezas e as divergências que permeiam o pressuposto desde a sua concepção redundam em posicionamentos dissonantes sobre as espécies e a sua satisfatoriedade.

PALAVRAS-CHAVE: processo civil; recurso; prequestionamento.ABSTRACT: The prequestionnament is requisite of the admissibility verified in the

brazilian civils exceptionals resources without, however, to exist legal device specific. Arise, so the necessity to remedy the legal lacuna of this juridical-doctrine practice. So, actually, the previous to question to be it can something implied in some devices of the constitutional legislation and civil processual valid, reinforced by texts summaries. In consequence, the incertitudes and divergences permeate the requisit from the her concepcion to result in positions dissonances about the species and the her satisfactority.

KEYWORDS: civil procedure; resources; prequestionnament.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho aborda o prequestionamento, requisito de admissibilidade dos recursos excepcionais cíveis brasileiros, exigido pelas Cortes superiores, objetivando veri-ficar seus aspectos essenciais e identificar, na atual legislação constitucional e processual cível, as vias existentes disponibilizadas aos profissionais do Direito para o seu suprimento, bem como a suficiência delas.

Para tanto, há uma abordagem bibliográfica, sem a pretensão de esgotar a questão proposta, para analisar alguns dos diversos entendimentos e posicionamentos das egrégias câmaras julgadoras, além dos seus pontos mais relevantes. Assim, serão perquiridos os requisitos específicos de admissibilidade dos recursos excepcionais cíveis, para somente então caracterizar o prequestionar, delimitando sua origem, conceituação e nuances relativas aos instrumentos existentes para o atendimento e satisfatoriedade funcional do requisito.

1. RECURSOS

O recurso é um socorro processual às partes quando inconformes com a decisão proferida na demanda, protestando pelo reexame da matéria da lide por outro órgão judicial, em regra hierarquicamente superior ao que prolatou a primeira decisão, permitindo uma segura e uniforme prestação jurisdicional.

Todavia, aceitar a viabilidade de rever decisões judiciais implica não só o fato de haver insatisfação do vencido ou prejudicado, também reconhece a possibilidade de erro (e até de má-fé) dos julgadores, aceitando que a função judicante não os exime da falibilidade humana. Não seria lídima a justiça que obrigasse às partes de uma relação jurídica processual a suportar passivamente os efeitos de julgados eivados de nulidades, vícios ou equívocos.

Nem sempre as resoluções judiciais - sentenças, decisões ou des-pachos - são isentas de faltas ou defeitos quanto ao fundo, ou sem infração de regras jurídicas processuais concernentes à forma, ao procedimento. Desinteressar-se-ia o Estado da realização do seu direito material e formal, se não desse ensejo à correção de tais resoluções defeituosas, ou confiaria demasiado na probabilidade de acerto do juiz singular, ou do tribunal de inferior instância.1

1 MIRANDA, Francisco C. Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 1-2.

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Tanto como o ajuizamento de uma demanda exige requisitos essenciais para o seu recebimento e julgamento, igualmente os recursos são condicionados a determinados pressupostos legais para serem conhecidos e analisados. Os pressupostos são de duas ordens distintas, admissibilidade (pressupostos intrínsecos e extrínsecos)2 e mérito, e guardam entre si uma relação de prejudicialidade, na qual a análise das matérias de fundo da ação (mérito) depende da presença de todas as condições legais prévias exigidas.

Em regra, cabe ao órgão competente em receber o recurso a primeira análise do atendimento ou não dos pressupostos. Todavia, a Corte responsável pelo diagnóstico da decisão igualmente se manifesta, pois as preliminares são de ordem pública, submetidas a reconhecimento ex officio, não se sujeitando à preclusão, inclusive autorizada a reformatio in pejus. Logo, a competência do juízo de admissibilidade revela-se dúplice na maioria das hipóteses recursais, sedimentando o princípio do duplo grau de jurisdição e majorando as possibilidades de defesa das partes litigantes insatisfeitas.

Diferente não é com os recursos excepcionais cíveis que, além dos requisitos genéricos de admissibilidade, exigem para sua admissão outros pressupostos específi-cos, sendo um deles o prequestionamento. Há maior rigidez formal de procedibilidade e fundamentação restrita para convocar a alta cúpula judiciária para reexaminar a matéria de direito da demanda.3

Embora Santos4 considere a limitação constitucional às matérias arguidas em sede de recurso especial e extraordinário pressuposto específico (“a existência de questão constitucional” e de “questão federal, de natureza infraconstitucional” respectivamente), tal reflete apenas fundamentação vinculada, exigida também em embargos de declaração e agravos regimentais, não se restringindo apenas aos recursos excepcionais, não lhes sendo condição exclusiva.

Desse modo, é pressuposto indubitavelmente específico dos recursos excepcionais cíveis aquele desdobrado da expressão “causas decididas em única ou última instância”, presente no inciso III dos artigos 102 e 105 da Magna Carta, referindo-se ao claro prévio esgotamento das instâncias preliminares e à subentendida necessidade de decisão anterior ao recurso acerca da matéria por ele atacada, o denominado prequestionamento.

2. PREQUESTIONAMENTO: GÊNESE

O prequestionamento é, em síntese, a exposição, no teor do acórdão recorrido, das matérias essenciais à fundamentação deste. Contudo, divergente é o entendimento

2 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 2004.

3 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 8. ed. São Paulo: RT, 2003.4 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de Direito processual civil. 21. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2003.

p. 163,177 - grifos do autor.

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sobre a exigência de dito requisito de admissão em virtude do silêncio constitucional e da hermenêutica atualmente aplicada aos demais textos legais e sumulares, bem como acerca dos instrumentos processuais disponíveis e das formas aceitas pelas Cortes judiciárias a sua apresentação.

A palavra “prequestionamento” também pode ser grafada como “pré-questiona-mento”, sendo a última menos utilizada, inobstante signifique, de modo etimologicamente adequado, um prévio questionar, na medida em que não aglutina o prefixo prae, originário do latim e representando antecedência, ao verbo.

A Lei Judiciária norte-americana, de 24.09.1789, prevê o recurso denominado writ of error, dos julgamentos dos tribunais dos Estados para a Corte Suprema dos Estados Unidos, o qual exige que seja questionada matéria constitucional ou validade de tratado, lei ou ato praticado por autoridade daquela União. Seguindo o modelo, a Constituição Brasileira de 1891, na alínea a, § 1º do seu artigo 59, também determinou questionar-se previamente a validade ou aplicação de tratado ou lei federal, para aquele que seria o atual recurso extraordinário.5

A palavra “questionar” permaneceu presente como requisito para interpor recurso extraordinário no texto das Constituições de 1934, 1937 e 1946. Contudo, a partir da Carta de 1967, a expressão não mais constou, incluindo a de 1988, pelo que se elevou a discussão entre os aplicadores do Direito acerca da manutenção de dito pressuposto ou não, prevalecendo, jurisprudencialmente, a continuidade da sua exigência.6

Nesse esteio, as Cortes judiciárias uniformizaram seu entendimento majoritário sumulando a necessidade do prequestionamento nos recursos excepcionais cíveis nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal,7 relativas ao Extraordinário e também adequadas ao Especial, fixando o que Rodrigues8 denomina de “óbices jurisprudenciais e regimentais” e Santos9 de “pressuposto jurisprudencial de admissibilidade”.

Inobstante exista a omissão constitucional sobre a temática, as súmulas permane-ceram vigentes e aplicadas pelas Cortes judiciárias em seus pronunciamentos, razão pela

5 Idem “3”.6 MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento e os pressupostos dos recursos extraordinário e especial.

In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Org.). Aspectos polêmicos e atuais do recurso especial e do recurso extraordinário. São Paulo: RT, 1997. p. 288.

7 282. É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada. 356. O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.

8 RODRIGUES, Fernando Anselmo. Requisitos de admissibilidade do recurso especial e do recurso extraordinário. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Org.). Aspectos polêmicos e atuais do recurso especial e do recurso extraordinário. São Paulo: RT, 1997. p. 215 - grifo do autor.

9 Idem “4”, p. 168, 180 - grifos do autor.

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99DO PREQUESTIONAMENTO NOS RECURSOS EXCEPCIONAIS CÍVEIS

qual estas tornaram sólida a necessidade de apresentar, na interposição de qualquer dos recursos excepcionais cíveis, o prequestionamento, pena de não conhecimento destes.

3. PONDERAÇÕES SOBRE AS ESPÉCIES DE PREQUESTIONAR

A par da grafia e origem, questionar preliminarmente a matéria de um recurso representa a existência de menção, no curso do processo, em fase anterior ao recurso excepcional cível, de determinado dispositivo do qual se pretende nova apreciação pelo novel órgão julgador. No entanto, há a compreensão de duas vertentes doutrinárias, sendo a primeira no sentido de ser suficiente ao recorrente suscitar a questão em fase anterior à interposição recursal, e a segunda, de que exista julgamento expresso acerca do tema que se pretende revisitar.

A primeira corrente se ajusta ao estrito sentido etimológico do termo “prequestionar”, bastando que o dispositivo sobre o qual é interposto o recurso tenha sido mencionado no curso da demanda, independentemente de recurso anterior.

Na segunda vertente, toma-se por imprescindível que, em decisão pretérita, o tri-bunal a quo tenha se pronunciado sobre o tema recorrido, sendo prévia não a pretensão do recorrente, mas também o momento processual imediatamente anterior ao do recurso excepcional. Com efeito, essa é a corrente que atualmente prevalece, sendo exigido um debate, no acórdão recorrido, daqueles dispositivos de lei que serão os futuros fundamentos do recurso excepcional.

A nascente do entendimento mais aceito está na expressão “causas decididas” da redação constitucional, equiparando-a à “questão decidida”, em instância anterior. Logo, estaria legitimada a exigência do prequestionamento nos recursos excepcionais cíveis pelas Cortes judiciárias por ser uma previsão implícita, possuindo, nesse sentido, respaldo constitucional.

De outra banda, o artigo 93, IX, da Lei Maior, com redação determinada pela EC nº 45/2004, também pode ser aplicado, pois o mesmo fixa a obrigatoriedade de fundamentação de todas as decisões proferidas pelos órgãos julgadores. Portanto, há um dever legal do tribunal a quo de pronunciar-se sobre as questões a ele suscitadas, o que supriria, em decorrência, o requisito legal em estudo.

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: [...]IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

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Ainda, há respaldo infraconstitucional na Lei nº 5.869, de 11.01.1973, o CPC, na obrigação de o julgador apreciar as questões ventiladas processualmente, fixada com clareza nos artigos 515 e 516 que, não obstante tratem especificamente sobre a apelação, via recursal por excelência, determinam aos tribunais a apreciação das questões proces-suais da lide em sentido amplo, abrangendo tanto as arguidas em recurso quanto aquelas suscitadas no curso do processo, bem como a obrigação de julgá-las.

A mesma obrigatoriedade está no artigo 128 do CPC, que determina sejam proferi-dos julgamentos nos limites da lide, ou seja, analisando os pedidos formulados e o direito material - as questões - que os embasam, compreensão estendida, por inteligência, à redação dos artigos 2º e 460 do mesmo Código.10

Nesse teor, a completa atividade jurisdicional consiste no dever legal dos órgãos judicantes não só de fundamentar seus julgamentos, mas também de apreciar todas as questões suscitadas pelas partes durante a demanda. Logo, também por esse lado nor-mativo ordinário, o prévio questionar seria elemento intrínseco à própria tarefa judicante, estando legitimada a sua exigência.

Mesmo assim, o Superior Tribunal de Justiça aderiu à uniformização de jurispru-dência, firmando consenso na edição das Súmulas 98, 211 e 320,11 orientações para a atuação harmônica dos órgãos do Poder, com finalidade de (também) cessar a multipli-cação do debate, que satura a justiça. Os assentos indicados vigentes possuem claro rigor formalista, pois pretendem suprir as sucessivas omissões constitucionais acerca da exigência do prévio questionar.

Todavia, a insegurança do tema, sob a ótica da hermenêutica aplicada aos textos legais até agora vista, obriga o recorrente a valer-se de outros argumentos para requerer ao tribunal originário a total prestação jurisdicional, quando ausente a indicação expressa do dispositivo recorrido.

Primeiro, permanecendo a omissão, pode-se sanar a falta do prequestionar com a oposição de embargos declaratórios. Com os aclaratórios, o tribunal é levado a se ma-nifestar expressa e especificamente sobre a questão legal. Constatada a omissão, será apreciada a matéria e, por conseguinte, serão providos os aclaradores, pelo que estará

10 Art. 2º Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e formas legais. Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

11 98. Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório. 211. Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo. 320. A questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento.

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101DO PREQUESTIONAMENTO NOS RECURSOS EXCEPCIONAIS CÍVEIS

suprido o prequestionamento. Contudo, não verificada a omissão, serão improvidos os embargos de declaração. Nessa hipótese, consoante a Súmula 211 do STJ, é inexistente o prequestionar, pois inexiste a prolação de assento. Assim, possível é opor novos escla-recedores e, persistindo a omissão, reiterá-los indefinidamente.

Resta ao recorrente, então, a opção de interpor recurso especial por ofensa ao próprio artigo 535, II, do CPC, ou ainda recurso extraordinário quanto à violação do artigo 93, IX, da CF, pela ausência da fundamentação, ou do artigo 5º, LIV, também da CF, que garante o devido processo legal. Caso conhecido qualquer destes recursos excepcionais cíveis, os autos serão devolvidos ao tribunal de origem para nova manifestação.

Em verdade, o não pronunciamento da Corte, a par dos equívocos e omissões afetos à falibilidade humana, pode configurar recusa injustificada à prestação jurisdicional, redundando em dispêndio de tempo, dinheiro, além do próprio saturamento do Poder Judiciário pela interposição de recursos visando sanar dita falta.

Finalmente, identificada a matéria objeto do recurso, a par da inexpressividade do respaldo legal respectivo, as Cortes judiciárias têm admitido os recursos excepcionais cíveis considerando presente o requisito em sua modalidade tácita, em nome do tempe-ramento da exigência na medida em que consta a matéria jurídica delineada no acórdão, dispensando-se referência do dispositivo legal. Ventila-se, nesse sentido, uma alternativa para o formalismo: o prévio questionar tácito.

Não se trata de dispensar o prequestionamento explícito, mas também de reconhe-cer que a matéria já está suficientemente ventilada e fundamentada no acórdão, a ponto de ser desnecessário esclarecer a norma jurídica com outros recursos. Logo, estando a questão “dentro” da decisão, está atendido o requisito. Nesse esteio, a expressão do dispositivo de lei é dispensada por consistir mero elemento ilustrativo, sem influência na compreensão da questão suscitada pelos julgadores, dispensando também a necessidade de declaratórios e recursos próprios.

Contudo, em consonância à Súmula 356 do STF, considera-se a matéria tacitamente prequestionada apenas após interpostos aclaradores, inobstante desimporte o resultado, o que é interpretado como tentativa do recorrente de vencer a resistência da Corte.

No entanto, a divergência sobre a aceitação do prequestionamento implícito é tão dúbia, pelo que, persistindo a omissão do tribunal, recomendável é, de fato, a interposição dos recursos pertinentes já analisados. Assim, apesar de a alternativa ficta revelar-se plenamente viável, por atender satisfatoriamente ao requisito de admissibilidade e evitar a interposição de sucessivos remédios processuais, a falta de consenso sobre a matéria ainda faz os operadores seguirem o caminho tradicional, mais longo, para garantir o acesso às Cortes Superiores e evitar óbice à reanálise do direito violado.

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102 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Da análise dos delineamentos históricos verificou-se que a inexistência contem-porânea de dispositivo, específico e expresso, exigindo o prévio questionar, justificando a diversidade de entendimentos entre os profissionais do Direito na construção de um conceito válido, no que a hermenêutica jurídica tornou-se útil e imprescindível ferramenta.

Assim, apesar de a legislação processual cível oferecer meios para suprir o pre-questionar, longo é o caminho das suas interposições, pois os remédios esbarram na própria estrutura judiciária, que não impede que tenham os vários julgadores da mesma lide percepções divergentes do requisito e o tratem de acordo, provendo ou improvendo recursos idênticos, tornando iníquos os tratamentos dispensados aos demandantes, pro-vocando embaraços a quem os utiliza e contribuindo ainda mais ao dissenso ora estudado.

Tantos recursos atribulam o Poder Judiciário, razão pela qual ganha adeptos o prequestionar tácito, relativização da modalidade explícita, visando reduzir o rigor das exigências técnicas dos recursos excepcionais, viável, conquanto ainda sem o sucesso esperado pela não sedimentação de consenso em torno de sua aceitação nos órgãos jurisdicionais, tornando um requisito processual ínfimo um obstáculo significativo no con-texto do escopo da justiça.

REFERÊNCIAS

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MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 2004.

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103DO PREQUESTIONAMENTO NOS RECURSOS EXCEPCIONAIS CÍVEIS

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PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MIRANDA, Francisco C. Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

RODRIGUES, Fernando Anselmo. Requisitos de admissibilidade do recurso especial e do recurso extraordinário. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Org.). Aspectos polêmicos e atuais do recurso especial e do recurso extraordinário. São Paulo: RT, 1997.

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de Direito processual civil. 21. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2003.

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A RELATIVIzAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO COMO REQUISITO PARA A CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS

PREVIDENCIÁRIOS. UMA NOVA ABORDAGEM à LUz DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CARÁTER

CONTRIBUTIVO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

RODRIGO MOREIRA SODERO VICTORIOAdvogado. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais. Pós-Graduado

em Direito Previdenciário. Pós-Graduado em Direito do Trabalho. Professor de Direito Previdenciário da Pós-Graduação do Centro

Universitário Salesiano - UNISAL/SP. Professor da Escola Superior de Advocacia da OAB/SP. Professor de Direito Previdenciário da Pós-

Graduação da Faculdade Legale. Professor de Direito Previdenciário do Legale Cursos Jurídicos.

SUMÁRIO: Qualidade de segurado versus princípio do caráter contributivo da Previdência Social - Síntese conclusiva - Referências.

RESUMO: O presente estudo trata de uma reflexão sobre a qualidade de segurado como um dos pressupostos para a percepção das prestações previdenciárias no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), trazendo uma nova visão à luz do princípio do caráter contributivo da Previdência Social.

PALAVRAS-CHAVE: Direito da seguridade social; benefícios previdenciários; qualidade de segurado; desnecessidade; princípio do caráter contributivo; hermenêutica.

ABSTRACT: This study is a reflection about the quality of insured as one of the preconditions for receiving social security benefits from General Welfare of Social Security, bringing a new perspective based of the principle of contributory character of Social Welfare.

KEYWORDS: Social security law; pension benefits; quality of insured; no need; principle of contributory character; hermeneutics.

QUALIDADE DE SEGURADO VERSUS PRINCÍPIO DO CARÁTER CONTRIBUTIVO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

A qualidade de segurado está presente como requisito para a concessão da maioria dos benefícios previdenciários oferecidos pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

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106 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

É o que ocorre, por exemplo, com a aposentadoria por invalidez, com o auxílio-doença e com a pensão por morte.

Nos dois primeiros casos, para que a Previdência Social conceda os benefícios ao seu requerente, é necessário que a incapacidade para o trabalho desta pessoa tenha surgido quando esta ainda possuía qualidade de segurada. No caso da pensão por morte, para que os dependentes façam jus ao recebimento do benefício, a regra é de que o de cujus também deveria estar na sua condição de segurado à época do óbito.

As exceções a esta regra estão estabelecidas no artigo 3º, caput e § 1º, da Lei nº 10.666/2003, que, expressamente, não mais exige a condição de segurado à época do requerimento como requisito concessório das aposentadorias por idade, tempo de contri-buição e especial, e no artigo 102, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91. O § 1º da referida norma estabelece que a perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos. Por sua vez, o § 2º do artigo 102 dispõe que não é exigida a qualidade de segurado do falecido como requisito de con-cessão da pensão por morte, caso o de cujus já tenha adquirido o direito ao recebimento de qualquer modalidade de aposentadoria antes da ocorrência do óbito.

O segurado mantém essa qualidade enquanto verter suas contribuições previden-ciárias para o sistema, podendo esta condição ser estendida sem contribuições (período de graça), se atendido o estabelecido pelos incisos e parágrafos do artigo 15 da Lei nº 8.213/91.1 Por sua vez, o artigo 102, caput, da Lei nº 8.213/91 expressa que a perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa condição. Sem divergir de qualquer outra norma, o artigo 102 da Lei nº 8.213/91, em princípio, exclui dos indivíduos que perderam a qualidade de segurado o direito à grande maioria dos be-nefícios previdenciários, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Entretanto, nosso posicionamento aponta para a necessidade de observância de outras normas que compõem nosso ordenamento jurídico para uma melhor compreensão e correta interpretação da “qualidade de segurado” como pressuposto de concessão dos benefícios previdenciários.

Inicialmente, importante se faz observar os dizeres do caput do artigo 201 da Carta Cidadã, com a redação dada pela EC nº 20, de 16.12.1998, o qual atribuiu caráter

1 Entendemos que a qualidade de segurado é adquirida e se mantém enquanto o indivíduo estiver exercendo atividade remunerada, e não com o pagamento das contribuições previdenciárias. Assim, o contribuinte individual, por exemplo, que não esteja contribuindo para o INSS, mas esteja trabalhando, mantém essa condição, muito embora, possivelmente, exista débito para com a Previdência Social. Jurisprudência: TRF da 4ª Região, 6ª Turma, AC nº 200670990009511, Relator João Batista Lazzari, 19.08.2009.

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107A RELATIVIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO

contributivo à Previdência Social.2 Nota-se que a Constituição Federal, a partir de então, passa a dar extrema importância aos recolhimentos efetuados pelos indivíduos para o sistema previdenciário. Passa-se a considerar que os segurados detêm essa qualidade, primordialmente, a partir do recolhimento de suas contribuições. Ou seja, fica evidente a ênfase dada pela Constituição Federal ao que efetivamente foi contribuído pelo segurado, deixando, infelizmente, para um segundo plano a questão referente ao aspecto previden-ciário de proteção ao trabalhador.

Por outro lado, esta conclusão deve valer também em favor do indivíduo. Ora, sendo o regime previdenciário, por disposição constitucional, de caráter contributivo, as contribuições que o segurado verteu para o sistema durante toda a sua vida devem render--lhe frutos.3 Em outros termos, deve, necessariamente, existir reciprocidade contributiva.

A importância que se deve dar às contribuições efetivamente vertidas pelo segurado ao sistema ganha ainda mais força quando analisamos o disposto no artigo 201, § 11, da Constituição Federal. Estabelece a citada norma que os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.

É de clareza solar, portanto, que, segundo o artigo 201, caput e § 11, da Constitui-ção Federal, as contribuições vertidas pelo segurado devem ser levadas em consideração para fins de concessão dos benefícios previdenciários. Afinal, o segurado contribui para um seguro social puro, devendo, necessariamente, receber uma contrapartida pelos pagamentos realizados.4

Resumindo o até aqui exposto, conclui-se que a partir da edição da EC nº 20/98, a Constituição Federal, nitidamente, aloca o caráter contributivo da Previdência Social como um de seus princípios. Vê-se também que, ato contínuo, em 08.05.2003, foi editada a Lei nº 10.666, que, em parte, regulamentou infraconstitucionalmente, em seu artigo 3º, caput e § 1º, o princípio constitucional do caráter contributivo para os benefícios de aposenta-doria por idade, por tempo de contribuição e especial, não mais se exigindo a qualidade

2 Neste sentido, vale ressaltar que os professores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari tratam o caráter contributivo como sendo um dos princípios específicos da Previdência Social, ao lado da filiação obrigatória, do equilíbrio financeiro e atuarial, da garantia ao benefício mínimo, da correção monetária dos salários de contribuição, da preservação real do valor dos benefícios, da facultatividade de previdência complementar e da indisponibilidade dos direitos dos beneficiários. (CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito previdenciário. 9. ed. Santa Catarina: Conceito Editorial, 2008. p. 103-107).

3 O Prof. Marco Aurélio Serau Júnior explora muito bem a questão do caráter contributivo quando trata das contribuições vertidas pelo aposentado após a jubilação e a necessária repercussão no valor da aposentadoria, em sua obra: Desaposentação: novas perspectivas teóricas e práticas. Santa Catarina: Conceito Editorial, 2011.

4 O § 11 foi acrescido ao artigo 201 da Constituição Federal pela mesma Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu o princípio do caráter contributivo (caput do artigo 201 da Constituição Federal).

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108 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

de segurado como um de seus requisitos quando já houver o cumprimento da carência mínima exigida pela lei.

No entanto, observa-se que não há regulamentação infraconstitucional do caráter contributivo da Previdência Social para os demais benefícios oferecidos pelo Regime Geral de Previdência Social. É o que acontece, por exemplo, com a aposentadoria por invalidez e com o auxílio-doença. Mas há soluções no nosso próprio ordenamento jurídico.

Em face dessa omissão legislativa, entende-se que a utilização da analogia (art. 4º da LICC), como forma de integração, é a saída mais viável para a solução desta inér-cia do legislador ordinário com relação aos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, sendo certo, porém, que só deverá ser utilizada quando o indivíduo houver perdido a qualidade de segurado, conforme explicitaremos com mais detalhes adiante. Explica-se: não trataremos a seguir das situações em que o segurado incapacitado para o trabalho possui ou possuía a qualidade de segurado à época do surgimento da incapaci-dade para o trabalho. Neste último caso será necessário, para a concessão do benefício, no máximo, o cumprimento de carência mínima de 12 (doze) contribuições mensais.5 Trataremos aqui daqueles que contribuíram por anos para o sistema previdenciário, mas tiveram a infelicidade de ficar incapazes quando já não detinham a qualidade de segurado da Previdência Social. Vejamos.

A analogia, como se sabe, somente pode servir para preencher uma lacuna nor-mativa (Direito - Lei = Lacuna) quando se observa uma relação de semelhança entre a situação de fato em que a norma é omissa e a situação paradigma, regulamentada pela lei. Como fatos impeditivos da integração do direito por meio da analogia, estão os casos em que a Constituição da República estabelece reserva legal.

No que diz respeito ao nosso tema, o prof. Sérgio Nascimento realiza uma aborda-gem mais do que elucidativa sobre a possibilidade de aplicação da analogia para a perda da qualidade de segurado nos casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, utilizando-se como norma paradigma o artigo 3º, caput e § 1º, da Lei nº 10.666/03, quando dispõe que: “nos casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença (incapacidade comprovada) a situação ainda não foi disciplinada pelo legislador ordinário, mas, como há relação de semelhança com a aposentadoria por idade (incapacidade presumida), pode, em tese, tal lacuna ser preenchida por analogia”.6

Com relação ao risco social acobertado pela aposentadoria por invalidez e pelo auxílio-doença, não há discussão. É evidente que o risco protegido é a incapacidade comprovada do indivíduo para o trabalho.

5 Não é necessário o cumprimento de carência mínima quando a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza, doença do trabalho ou doença profissional, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91.

6 NASCIMENTO, Sérgio. Interpretação do Direito previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 186.

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109A RELATIVIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO

Quanto ao risco social protegido pela aposentadoria por idade, o prof. Miguel Horvath Júnior leciona que os sistemas de seguridade social tratam o atingimento da idade para a concessão da aposentadoria sob dois prismas: o primeiro entende que a aposen-tadoria por idade é uma contraprestação pelos anos de atividade produtiva do segurado (ancianidade); já o segundo entende que a aposentadoria por idade protege o indivíduo de uma incapacidade presumida (senilidade), sendo essa presunção absoluta, ou seja, é dispensada a sua prova. Esse último posicionamento foi o adotado pela OIT e pelo Brasil.7

Assim sendo, é clara a semelhança entre o risco social acobertado pela aposen-tadoria por invalidez e pelo auxílio-doença, que protegem o segurado da incapacidade comprovada, e aquele coberto pela aposentadoria por idade, que, por sua vez, protege o segurado da incapacidade presumida, riscos estes que, inclusive, estão previstos no mesmo inciso I do artigo 201 da Constituição Federal. A única diferença que vemos entre esses benefícios e a aposentadoria por idade é que, naqueles casos, a incapacidade acobertada pela Previdência Social é comprovada, concreta, e no último, presumida.

Assim, aplicando analogicamente o artigo 3º, caput e § 1º, da Lei nº 10.666/03 - no que condiz à desnecessidade da condição de segurado para a concessão da aposentadoria por idade - aos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, temos que os requisitos concessórios para os casos em que o indivíduo houver perdido a qualidade de segurado serão somente: a ocorrência do fato gerador do benefício (incapacidade para o tra-balho) e o cumprimento da carência mínima exigida para uma imaginária concessão de apo-sentadoria por idade, a qual irá variar, conforme a data de inscrição do segurado no RGPS.8

Neste sentir, caso o indivíduo tenha a inscrição posterior à edição da Lei nº 8.213, de 25 de julho de 1991, o número mínimo de contribuições será aquele previsto no artigo 25, inciso I, da mesma norma, qual seja: 180 contribuições mensais. Por outro lado, caso a inscrição do indivíduo no RGPS seja anterior à edição da Lei nº 8.213/91, deve-se obser-var a data (ano) do surgimento da incapacidade, para assim se averiguar qual o número mínimo de contribuições mensais exigido, nos termos do artigo 142 da Lei nº 8.213/91.

Chega-se a esta conclusão, posto que, nos casos de aposentadoria por idade, o ano em que o segurado completou a idade necessária para a concessão do benefício é o considerado como de implementação das condições para fins de aplicação do artigo 142 da Lei nº 8.213/91.

Para o melhor entendimento sobre o posicionamento aqui defendido, vejamos a situação hipotética exposta a seguir:

7 HORVATH JÚNIOR, Miguel. Direito previdenciário. 4. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2004. p. 154.8 Inscrição é o ato pelo qual o segurado ou o dependente são cadastrados no RGPS, mediante comprovação dos

dados pessoais e de outros elementos necessários e úteis a sua caracterização (artigo 18 do Decreto 3.048/99).

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110 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012 - Doutrina

Caso 01Imaginemos que um indivíduo, inscrito após a edição da Lei nº 8.213/91, tenha

contribuído para a Previdência Social por 15 anos (180 meses) e que tenha perdido a qualidade de segurado no ano 2008. Imaginemos também que a data de início de sua incapacidade permanente tenha ocorrido no ano de 2010.

Solução: Nos moldes do artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, a carência mínima exigida, se fosse caso de requerimento de concessão de aposentadoria por idade, seria de 180 (cento e oitenta) meses.

Assim, independentemente da perda da qualidade de segurado, nos termos do artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, este indivíduo faria jus ao recebimento da aposentadoria por invalidez, pois já havia vertido 180 contribuições mensais ao Sistema. Esta conclusão decorre da aplicação analógica do art. 3º, caput e § 1º, da Lei 10.666/2003.

Caso 02Imaginemos que um indivíduo, inscrito antes da edição da Lei nº 8.213/91, tenha

contribuído para a Previdência Social por 14 anos e 06 meses (174 meses) e que tenha perdido a qualidade de segurado no ano 1995. Imaginemos também que a data de início de sua incapacidade permanente tenha ocorrido no ano de 2010.

Solução: Nos moldes do artigo 142, a carência mínima exigida, se fosse caso de requeri-mento de concessão de aposentadoria por idade, seria de 174 (cento e setenta e quatro) meses.

Assim, independentemente da perda da qualidade de segurado, nos termos da tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/91, este indivíduo faria jus ao recebimento da aposen-tadoria por invalidez, pois já havia vertido as 174 contribuições ao sistema. Esta conclusão também decorre da aplicação analógica do artigo 3º, caput e § 1º, da Lei 10.666/2003.

Salienta-se que, embora a tese aqui defendida seja inovadora e, por conseguinte, utilizada por uma corrente ainda minoritária, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, especialmente em recursos de relatoria do Desembargador e Professor Sérgio Nascimento, possui julgados que corroboram com a sua viabilidade. Senão vejamos:

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO - ART. 557, § 1º DO CPC - APO-SENTADORIA POR INVALIDEZ - INCAPACIDADE LABORAL. I - Ressaltado na decisão agravada, que a questão dos reflexos da perda da qualidade de segurado e da carência não envolve as hipóteses de reserva legal expressamente previstas na Constituição da República de 1988, bem como que são manifestas as relações de semelhança entre a situação de perda da qualidade de segurado na aposentadoria por idade (incapacidade presumida) e a situação de perda da qualidade de segurado nos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença (incapacidade comprovada), tendo em vista que ambos benefícios objetivam a proteção da incapacidade laborativa, além do que a proteção social referente à incapacidade laborativa por invalidez e doença encontra-se prevista no mesmo

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111A RELATIVIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO

dispositivo constitucional (art. 201, inciso I, da Constituição da República/88) que também se destina à proteção social do evento idade avançada. II - Nesse diapasão, considerada a quantidade de contribuições recolhidas pelo autor, quando do início de sua incapacidade, a qual superava o exigido à época, nos termos da tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91, justifica-se a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez. III - Agravo interposto pelo réu improvido (art. 557, § 1º do CPC). (TRF da 3ª Região, 10ª Turma, AC 2006.61.83.000456-0, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, 02.06.2010).9

A propósito do tema, merece destaque também o entendimento esposado em algumas oportunidades pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no sentido de que, realizando-se uma interpretação sistemática e teleológica da parte final do artigo 102, § 2º, da Lei nº 8.213/91, combinada com o art. 201, caput, da Constituição Federal, que trata do princípio do caráter contributivo, não deve ser exigida a qualidade de segurado do falecido à época do óbito como pressuposto de concessão do benefício da pensão por morte aos seus dependentes (artigo 16 da Lei nº 8.213/91), caso aquele já houvesse completado a carência mínima para se aposentar por idade antes de seu falecimento.

Destaca-se que, na prática, esta tese somente deverá ser utilizada para os casos em que não houve a concessão da pensão por morte com fundamento na falta de qualidade de segurado do de cujus e o indivíduo falecido: a) não tenha adquirido o direito à aposen-tadoria ou qualquer outro benéfico antes do óbito (artigos 15, inciso I, e 102, § 2º, da Lei nº 8.213/91) e b) não estivesse exercendo trabalho remunerado à época do óbito, posto que o exercício do labor, nessa condição, caracterizaria a sua condição de segurado.10

Vejamos a ementa de um dos julgados sobre a matéria:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLA-RAÇÃO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. PREQUESTIONAMENTO. I - Em face do caráter contributivo do regime previdenciário e, mediante a proteção social inserta no artigo 201, inciso I, da Constituição da República, não se podem ignorar as contribuições outrora vertidas pelo segurado, o qual, contando com carência mínima à época do óbito, gerará direito à pensão por morte de seus dependentes, em respeito ao princípio da solidariedade

9 No mesmo sentido, temos os seguintes julgados: TRF da 3ª Região, 10ª Turma, Proc. nº 2005.03.99.051813-5, AC 1076199, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, j. 22.05.2007, DJU: 06.06.2007 e TRF da 3ª Região, 10ª Turma, AC nº 1999.03.99.097274-9, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, v.u., participaram do julgamento os desembargadores federais Castro Guerra e Galvão Miranda, j. 17.08.2004, DJU de 13.09.2004.

10 Ver jurisprudência citada na nota de rodapé nº 2.

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da Previdência Social. II - A pretensão deduzida pelo embargante consiste em novo julgamento da ação, o que não é possível em sede de embargos de declaração. III - Os embargos de declaração inter-postos com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório (Súmula 98 do e. STJ). IV - Embargos de declaração rejeitados. (TRF3, 10ª Turma, Processo 2007.61.14.001153-1, Juiz Convocado Marcus Orione, DJF3 de 21.10.2009).

SÍNTESE CONCLUSIVA

Diante de todo o aqui exposto, concluímos que, para a interpretação dos textos normativos infraconstitucionais que tratam, especialmente, de direitos sociais - como é o caso do Direito Previdenciário -, é necessária a atenta observância da Constituição Federal, utilizando-se, nos casos de omissão, de todos os meios de integração do direito, bem como da melhor hermenêutica constitucional, para a concretização do tão almejado bem-estar social. Nota-se que, após a edição da EC nº 20/1998 e consequente adição do princípio do caráter contributivo da Previdência Social no artigo 201 da Constituição Cidadã de 1988, o pressuposto da qualidade de segurado, para fins de concessão dos benefícios previdenciários, deve ser relativizado quando o indivíduo já houver vertido um número mínimo de contribuições para o sistema.

Nos casos dos benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, já existem julgados sobre a matéria, traçando, inclusive, parâmetros quanto ao número mínimo de contribuições exigidas.

Ressalta-se, por outro lado, que esta interpretação não deve ficar adstrita aos be-nefícios em referência, sendo certo, portanto, que a qualidade de segurado como requisito concessório dos benefícios previdenciários deve ser repensada para todas as prestações oferecidas pelo Regime Geral de Previdência Social à luz do caráter contributivo que a Constituição passou a atribuir à Previdência.

Com relação aos demais benefícios previdenciários, entendemos que, para o indivíduo ter direito à concessão da prestação sem a qualidade de segurado, deverá ter vertido um número mínimo de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais para o sistema, se inscrito após a edição da Lei nº 8.213/91, ou a quantidade estipulada pelo artigo 142 da Lei nº 8.213/91, caso inscrito antes da edição desta norma (carências máximas exigidas pela Lei nº 8.213/91, para concessão de benefícios previdenciários). Na última hipótese, quantidade de contribuições necessária deverá ser verificada observando-se o ano em que ocorreu o fato gerador do benefício. Somente assim estaremos realizando a correta aplicação do princípio do caráter contributivo da Previdência Social.

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113A RELATIVIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO

REFERÊNCIAS

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ACÓRDÃOSSUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

AG. REG. NOS EMB. DIV. NO AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 725.078/DFRELATOR: MIN. CELSO DE MELLODJe 06.12.2011

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - INTERPOSIÇÃO CONTRA ACÓRDÃO EMANADO DO PLENO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - INADMISSIBILIDADE - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.- Não se revelam admissíveis embargos de divergência quando opostos a acórdãos emanados do Plenário do Supremo Tribunal Federal, pois essa modalidade recursal somente tem pertinência se utilizada contra decisão proferida por Turma desta Suprema Corte (RISTF, art. 330). Precedentes.

ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal

Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência do Ministro Cezar Peluso, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Ausentes, neste julgamento, os Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli.

Brasília, 24 de novembro de 2011.CELSO DE MELLO - RELATOR

RELATÓRIOO SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO - (Relator): Trata-se de recurso de agra-

vo, tempestivamente interposto, contra decisão que não admitiu os embargos de divergência deduzidos pela parte ora recorrente.

Eis o teor da decisão, que, por mim proferida, sofreu a interposição do presente recurso de agravo (fls. 95/97):

Trata-se de embargos de divergência opostos a decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que, proferida no julgamento do AI 725.078-AgR/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES, acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 80):“Agravo regimental em agravo de instrumento. 2. Apresentação expressa de preliminar formal e fundamentada sobre repercussão geral no recurso extraordinário. Necessidade. Art. 543-A, § 2º, do CPC. 3. Preliminar formal. Hipótese de presunção de existência da repercussão geral prevista no art. 323, § 1º, do RISTF. Necessidade. Precedente. 4. Ausência da preliminar formal. Negativa liminar pela Presidência no recurso extraordinário e no agravo de instrumento. Possibilidade. Arts. 13, V, ‘c’, e 327, caput e § 1º, do RISTF. 5. Agravo regimental a que se nega provimento”.Nos presentes embargos de divergência, invocou-se a ocorrência de dissenso que existiria entre o acórdão ora embargado e outras decisões proferidas no âmbito desta Suprema Corte.Sendo esse o quadro processual, cabe-me examinar, para os fins a que se refere o art. 335, caput, do RISTF, c/c o art. 546, parágrafo único, do CPC, na redação dada

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116 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

pela Lei nº 8.950/94, se se revelam admissíveis, ou não, os mencionados embargos de divergência.Como se sabe, os embargos de divergência somente têm pertinência, quando opostos a acórdãos proferidos pela Turma (RISTF, art. 330).É por essa razão que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente advertido que não cabem embargos de divergência, quando opostos a acórdãos emanados do Pleno desta Suprema Corte (AI 160.035-AgR-ED-ED-ED-EDv-AgR-AgR-AgR-AgR-EDv-AgR/RJ, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - RE 80.295-AgR, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE - RE 134.278-EDv/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - Rcl 556-ED-ED-EDv-QO/TO, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - Rcl 1.639-ED-AgR-EDv-ED-AgR/SP, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - Rcl 2.020-EDv-ED/PR, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, v.g.):“Embargos de divergência. Não são admissíveis a acórdão proferido pelo Tribunal Pleno [...]. Embargos não conhecidos”.(RTJ 63/450, Rel. Min. AMARAL SANTOS)“Não cabem embargos contra decisão do Plenário, proferida em recurso extraordinário [...].”(RT 521/278, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE)A inviabilidade dos presentes embargos de divergência, em decorrência da razão mencionada, impõe uma observação final: no desempenho dos poderes processuais de que dispõe, assiste, ao Ministro-Relator, competência plena para exercer, monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, legitimando-se, em consequência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar.Cumpre acentuar, neste ponto, que o Pleno do Supremo Tribunal Federal reconheceu a inteira validade constitucional da norma legal que inclui, na esfera de atribuições do Relator, a competência para negar trânsito, em decisão monocrática, a recursos, pedidos ou ações, quando incabíveis, estranhos à competência desta Corte, intempestivos, sem objeto ou que veiculem pretensão incompatível com a jurisprudência predominante do Tribunal (RTJ 139/53 - RTJ 168/174-175).Nem se alegue que esse preceito legal implicaria transgressão ao princípio da colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO).Sendo assim, pelas razões expostas, não admito os presentes embargos de divergência, por reputá-los incabíveis (CPC, art. 557, caput).Ministro CELSO DE MELLORelator.Inconformada com essa decisão, a parte ora agravante interpõe o presente recurso,

postulando o processamento dos embargos de divergência (fls. 100/111), havendo deixado de impugnar, no entanto, todos os fundamentos em que se assentou tal ato decisório.

Sendo esse o contexto, submeto à apreciação do egrégio Plenário do Supremo Tribunal Federal o presente recurso de agravo.

É o relatório.

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117JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

VOTOO SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO - (Relator): O presente recurso de

agravo é inacolhível, eis que a parte agravante, ao insurgir-se contra a decisão ora questionada, deixou de ilidir todos os fundamentos jurídicos em que se assentou o julgamento monocrático.

Ao assim proceder, deixando de impugnar o ato decisório em questão, a parte agravante descumpriu uma típica obrigação processual que lhe incumbia atender, pois, como se sabe, impõe-se ao recorrente afastar, pontualmente, cada uma das razões invocadas como suporte da decisão agravada (AI 238.454-AgR/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

O descumprimento desse dever jurídico - ausência de impugnação de cada um dos fundamentos em que se apoia a decisão agravada - conduz, nos termos da orientação jurisprudencial firmada por esta Suprema Corte, ao improvimento do agravo interposto (RTJ 126/864 - RTJ 133/485 - RTJ 146/320):

O RECURSO DE AGRAVO DEVE IMPUGNAR, ESPECIFICADAMENTE, TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA.- O recurso de agravo a que se referem os arts. 545 e 557, § 1º, ambos do CPC, na redação dada pela Lei nº 9.756/98, deve infirmar todos os fundamentos jurídicos em que se assenta a decisão agravada. O descumprimento dessa obrigação processual, por parte do recorrente, torna inviável o recurso de agravo por ele interposto. Precedentes.(AI 257.310-AgR/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

De qualquer maneira, no entanto, cabe enfatizar que os embargos de divergência opostos pela parte ora agravante mostram-se totalmente inadmissíveis, porque deduzidos contra acórdão emanado do Plenário do Supremo Tribunal Federal.

Como se sabe, os embargos de divergência somente têm pertinência quando opostos a acórdãos proferidos por Turma desta Suprema Corte (RISTF, art. 330).

É por essa razão que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reitera-damente advertido que não cabem embargos de divergência quando opostos a acórdãos emanados do Pleno desta Suprema Corte (AI 160.035-AgR-ED-ED-ED-EDv-AgR-AgR-AgR--AgR-EDv-AgR/RJ, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - RE 80.295-AgR, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE - RE 134.278-EDv/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - Rcl 556-ED-ED-EDv-QO/TO, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - Rcl 1. 639-ED-AgR-EDv-ED-AgR/SP, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - Rcl 2.020-EDv-ED/PR, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, v.g.):

Embargos de divergência. Não são admissíveis a acórdão proferido pelo Tribunal Pleno [...]. Embargos não conhecidos.(RTJ 63/450, Rel. Min. AMARAL SANTOS - grifei)Não cabem embargos contra decisão do Plenário, proferida em recurso extraordinário [...].(RT 521/278, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE - grifei)

Em suma: não se revelam admissíveis embargos de divergência quando opostos a acórdãos emanados do Plenário do Supremo Tribunal Federal, pois essa modalidade recursal

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somente tem pertinência se utilizada contra decisão proferida por Turma desta Suprema Corte (RISTF, art. 330).

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente recurso de agravo, mantendo, em consequência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora agravada.

É o meu voto.EXTRATO DE ATAAG. REG. NOS EMB. DIV. NO AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 725.078PROCED.: DISTRITO FEDERALRELATOR: MIN. CELSO DE MELLOAGTE.(S): DORALICE RODRIGUES DE OLIVEIRAADV.(A/S): CHARLES J. LOPES SANTOS E OUTRO(A/S)AGDO.(A/S): CÉSAR AFONSO CAIRES E OUTRO(A/S)ADV.(A/S): JOSÉ MENDONÇA DE ARAÚJO FILHO E OUTRO(A/S)Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, negou

provimento ao agravo regimental. Ausentes, neste julgamento, os Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Cezar Peluso. Plenário, 24.11.2011.

Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso. Presentes à sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Luiz Fux.

Vice-Procuradora-Geral da República, Drª Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira.p/ Luiz TomimatsuSecretário

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119JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.187.637 - MG (2010/0055642-0)RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUESDJe: 01.12.2011

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXCE-ÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CABIMENTO. REVISÃO DE MULTA COMINATÓRIA. QUESTÃO APRECIÁVEL DE OFÍCIO.1. Esta Corte já se pronunciou no sentido do cabimento do incidente de pré-executividade na execução fiscal para se discutirem matérias de ordem pública e que não demandem dilação probatória.2. O art. 475-I do CPC é expresso ao afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, faz-se por execução, o que não impede a oposição da exce-ção de pré-executividade para se discutirem matérias aferíveis de ofício pelo julgador.3. Assim, em se tratando de revisão de valor fixado à título de multa diária (astreintes), matéria que pode ser conhecida de ofício pelo juiz, segundo disposto no art. 461, § 6º, do CPC, não há razão para repelir o cabimento da exceção de pré-executividade.4. Recurso especial provido.

ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas,

acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: “A Turma, por unanimi-dade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque”.

Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Impedido o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.Brasília (DF), 22 de novembro de 2011.MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, Relator

RELATÓRIOO EXMº SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):Trata-se de recurso especial interposto por Telemar Norte Leste S/A, com funda-

mento nas alíneas “a” e “c” do inciso III do artigo 105 da CR/1988, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e assim ementado (e-STJ fl. 85):

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - NÃO CABIMENTO. Na fase de cumprimento de sentença, não é cabível exceção de pré--executividade, por estar prevista a possibilidade de impugnação, medida pertinente para discutir o título. V.v. É possível a defesa do executado através da exceção de pré--executividade, desde que possam ser imediatamente reconhecidas pelo Magistrado, porque sua prova é direta.Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.

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120 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

No recurso especial, a parte recorrente aponta ofensa aos arts. 359, 362, 461, § 6º, 475-J, § 1º, 535, II, do CPC, 884 do Código Civil de 2002 e 4º da LICC, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta, em síntese, o cabimento da exceção de pré-executividade na fase de cumprimento de sentença, uma vez que a matéria apresentada, qual seja, o não cabimento de multa diária em cautelar de exibição de documentos, independe de dilação probatória, podendo, inclusive, ser conhecida de ofício. Por outro lado, alega que o que se está discutindo é o valor da multa fixada e não a aplicação da referida multa.

Não foram apresentadas contrarrazões (e-STJ fl. 156).Juízo positivo de admissibilidade, subiram os autos a esta Corte.É o relatório.

VOTOO EXMº SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): A insurgência

prospera.A matéria debatida nos autos diz respeito ao cabimento da exceção de pré-

-executividade na fase de cumprimento de sentença, especificamente quanto à possibilidade de se reduzir o valor da multa diária imposta em ação cautelar de exibição de documentos.

Sobre o assunto, esta Corte já se pronunciou no sentido do cabimento do incidente de pré-executividade na execução fiscal para se discutirem matérias de ordem pública e que não demandem dilação probatória. A propósito:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXE-CUTIVIDADE. CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE EM RAZÃO DA NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. VERIFICAÇÃO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. IMPEDIMENTO PELA SÚMULA 7/STJ. REDISCUSSÃO DO ACÓRDÃO QUE JUL-GOU O RECURSO ESPECIAL. INVIABILIDADE. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE.1. Os estreitos limites dos embargos de declaração obstam a apreciação de questões que traduzem o mero inconformismo com o teor da decisão embargada e revelam o objetivo de rediscutir matérias já decidas, sem, contudo, demonstrar a existência de omissão, contradição, obscuridade ou mesmo erro material conforme preceitua o art. 535 do CPC.2. O julgador não está obrigado a rebater todos os argumentos da parte recorrente, bastando, para tanto, que prolate decisão devidamente fundamentada que aborde a questão controversa em sua inteireza, não resultando, por outro lado, negativa de prestação jurisdicional.3. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de ser cabível a exceção de pré--executividade para discutir matérias de ordem pública na execução fiscal, tais como os pressupostos processuais, as condições da ação, os vícios objetivos do título executivo, referentes à certeza, liquidez e exigibilidade, desde que verificáveis de plano pelo juiz. Todavia, não é permitida a sua interposição quando a apreciação das questões necessárias à resolução da lide demande dilação probatória. Precedente regido pela sistemática do art. 543-C do CPC (REsp 1.110.925/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,

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121JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

Primeira Seção, DJe 04.05.2009). 4. Para afastar o entendimento da Corte de origem e a conclusão fático-probatória por ela definida, faz-se mister reexaminar a prova apreciada pela instância ordinária, o que não se admite em sede de recurso especial, notadamente à luz da Súmula 7/STJ.5. Não há contradição em afastar a violação do art. 535 do CPC e, concomitantemente, em não conhecer do mérito do recurso por ausência de prequestionamento, desde que o acórdão recorrido esteja adequadamente fundamentado.6. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg no Ag 1.158.238/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 27.10.2010 - grifo não original).TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CABI-MENTO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA E AUSÊNCIA DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. BENS À PENHORA. DEBÊNTURES EMITIDAS PELA ELETROBRÁS. RECUSA. POSSIBILIDADE.1. A jurisprudência desta Corte consolidou o entendimento segundo o qual admite-se a exceção de pré-executividade como meio de defesa em execução fiscal nas situações em que não se faz necessária dilação probatória ou em que as questões possam ser conhecidas de ofício pelo magistrado.2. No caso dos autos, discute-se inclusão de ICMS na base de cálculo do ICMS - cálculo por dentro, matéria que, além de não se tratar de ordem pública, ainda demanda dilação probatória, devendo ser aduzida na via própria - por meio de embargos à execução.3. Admite-se nomeação à penhora de debêntures emitidas pela Eletrobrás, contudo, a sua recusa pela Fazenda Pública ou pelo magistrado é possível, em decorrência da sua baixa liquidez e por afronta à ordem legal disposta no art. 11 da LEF.Precedentes.Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1.199.413/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 25.10.2010 - grifo não original).

De outro lado, destaque-se que o art. 475-I do CPC é expresso ao afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, faz-se por execução, o que não impede a oposição da exceção de pré-executividade para se discutirem matérias aferíveis de ofício pelo julgador.

Assim, em se tratando de revisão de valor fixado à título de multa diária (astreintes), matéria que pode ser conhecida de ofício pelo juiz, segundo disposto no art. 461, § 6º, do CPC, não há razão para repelir o cabimento da exceção de pré-executividade.

Vejam-se estes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. AUSÊNCIA. SÚMULA 283/STF. MULTA COMINATÓ-RIA. EXCLUSÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO DA MULTA DIÁRIA. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.1. É inadmissível o recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido apto, por si só, a manter a conclusão a que chegou o Tribunal de origem (Súmula 283 do STF).2. A jurisprudência desta Corte está pacificada no sentido de que a multa diária aplicada com base no art. 461, § 4º, do CPC pode ser revista independentemente da impugnação da parte contrária. Precedentes.

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122 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

3. A análise relativa à conveniência da aplicação da multa cominatória na hipótese considerada é providência que depende de apreciação das circunstâncias fáticas e das provas produzidas nos autos, cujo exame é soberanamente realizado pelas instâncias ordinárias.4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 710.292/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 07.10.2010 - grifo não original).PROCESSUAL CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ART. 461 DO CPC. ASTREINTES. APLICAÇÃO PARA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. REVISÃO DO QUANTUM ESTIPULADO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7/STJ.1. É permitido ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, fixar multa diária cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer.2. A revisão do valor da multa demanda, como regra, o reexame de matéria fática, vedado a esta Corte nos termos da Súmula 7/STJ. Precedentes do STJ.3. Agravo Regimental provido. (AgRg no Ag 1.040.411/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 19.12.2008 - grifo não original).Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO ao recurso especial para reconhecer

o cabimento do incidente de pré-executividade na hipótese.

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123JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

RECURSO ESPECIAL Nº 1.267.402 - RS (2011/0170571-8)RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUESDJe: 01.12.2011

PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS. CONDENAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. APLICAÇÃO DO ART. 20, § 4º, DO CPC, SEM VINCULAÇÃO NECESSÁRIA AO ART. 20, § 3º, DO CPC.1. A Corte Especial do STJ firmou o entendimento no sentido de que nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, a verba honorária deve ser fixada com base no § 4º do art. 20 do CPC, não sendo obrigatória a observância dos limites previstos no § 3º. Precedentes: AgRg nos EAg nº 1.030.029-SP, Corte Especial, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 01.04.2009; EREsp nº 637.565-RS, Corte Especial, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 03.12.2008.2. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas,

acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: “A Turma, por unanimi-dade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque”.

Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 22 de novembro de 2011.MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, Relator

RELATÓRIOO EXMº SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):Trata-se de recurso especial interposto com fulcro no permissivo do art. 105, III, “a”

e “c”, da Constituição Federal de 1988, contra acórdão que fixou a verba honorária em ação movida contra a Fazenda Nacional, sendo esta vencida, em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação (e-STJ fls. 129/140).

Alega a recorrente que houve violação ao art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC. Entende que a verba honorária deve ser fixada em percentual incidente por sobre o valor da condenação e não sobre o valor da causa e que deve obedecer ao patamar mínimo de 10% (dez por cento), previsto no art. 20, § 3º, do CPC (e-STJ fls. 211/214).

Contrarrazões nas e-STJ fls. 221/224.Recurso regularmente admitido na origem (e-STJ fls. 231).É o relatório.

VOTOO EXMº SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):Devidamente prequestionados os dispositivos legais invocados, conheço do recurso

especial.Prejudicado o exame pelo dissídio.

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124 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

Quanto à verba honorária, esclareço que a Corte Especial do STJ firmou o entendi-mento no sentido de que nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, a verba honorária deve ser fixada com base no § 4º do art. 20 do CPC, não sendo obrigatória a observância dos limites previstos no § 3º. Seguem os precedentes:

PROCESSUAL CIVIL. CONDENAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. APLICAÇÃO DO ART. 20, § 4º, DO CPC, SEM VINCULAÇÃO NECESSÁRIA AO § 3º. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO EM EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE.I - Nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, a verba honorária deve ser fixada com base no § 4º do art. 20 do CPC, não sendo obrigatória a observância dos limites previstos no § 3º. Precedentes: EREsp 637.905/RS, Rel. Min. ELIANA CALMON, CORTE ESPECIAL, julgado em 21.09.2005, DJ de 21.08.2006; EREsp 491.055/SC, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, CORTE ESPECIAL, julgado em 20.10.2004, DJ de 06.12.2004; EREsp 747.013/MG, Rel. Min. CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13.02.2008, DJe de 03.03.2008; AgRg nos EREsp 644.826/CE, Rel. Min. DENISE ARRUDA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26.09.2007, DJ de 29.10.2007.II - Não são admissíveis embargos de divergência que visem majorar ou reduzir honorários de advogado. Precedentes: AgRg nos EREsp 908.498/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 19.12.2007, DJ de 21.02.2008; AgRg nos EREsp 792.313/SP, Relª Minª NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 16.05.2007, DJ de 04.06.2007; AgRg nos EREsp 413.310/RS, Relª Minª LAURITA VAZ, CORTE ESPECIAL, julgado em 23.11.2006, DJ de 12.02.2007.III - Agravo regimental improvido (AgRg nos EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO Nº 1.030.029-SP, Corte Especial, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 01.04.2009).

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. ARTIGO 20, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS.1. Embora incabíveis embargos de divergência dirigidos ao exame do valor da verba honorária, ainda quando considerado irrisório ou exorbitante, é necessário o conhecimento daqueloutros embargos de divergência que têm por objeto dissidência relativa à norma regente da sua fixação.2. Em sendo vencida a Fazenda Pública, tem aplicação o parágrafo 4º, e não o parágrafo 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil, devendo os honorários ser fixados consoante apreciação equitativa do juiz.3. Embargos de divergência acolhidos (EREsp nº 637.565-RS, Corte Especial, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 03.12.2008).

Adiro ao entendimento.Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao presente recurso especial.É como voto.

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125JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

RECURSO ESPECIAL Nº 1.276.415 - RS (2011/0213194-1)RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUESDJe: 01.12.2011

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FIXAÇÃO DE VERBA HONORÁRIA EM FAVOR DE DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL CONTRA O MUNICÍPIO. POSSIBILI-DADE. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.1. São devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública Estadual oriundos de condenação contra o Município, pois não existe confusão entre a pessoa do credor e a do devedor.2. Orientação pacificada nesta Corte Superior no REsp 1.108.013/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Primeira Seção, DJe de 22.06.2009, julgado sob o regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.3. Recurso especial provido.

ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas,

acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:

“A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque”.

Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 22 de novembro de 2011.MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, Relator

RELATÓRIOO EXMº SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):Trata-se de recurso especial interposto por José Cordeiro Gonçalves, com base

no artigo 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, em face de acórdão resumido da seguinte maneira (e-STJ fl. 269):

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. PAGAMENTO DE HONORÁ-RIOS À DEFENSORIA PÚBLICA PELO MUNICÍPIO. MATÉRIA REPETITIVA. REEXAME DO JULGADO. ART. 543-C, § 7º, II, DO CPC.Descabe condenar o Município a pagar honorários ao FADEP, já que o custeio do serviço público prestado pela Defensoria Pública é ônus do Estado.EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO, MANTIVERAM O ACÓRDÃO QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO MUNICÍPIO.Nas razões do especial, o recorrente sustenta violação do artigo 20, § 4º, do Código

de Processo Civil e da Lei 8.906/94. Alega, para tanto, que o Município deve ser condenado ao pagamento de honorários sucumbenciais em favor da Defensoria Pública Estatal, uma vez que a Administração Local ficou sucumbente na ação ordinária, em que se requer a concessão de transporte adequado para levar o filho do recorrente até a unidade de saúde para internação.

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126 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

Não houve contrarrazões.Nesta Corte Superior, o Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento

do recurso especial.É o relatório.

VOTOO EXMº SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):A pretensão recursal merece acolhimento.A questão central a ser solucionada diz respeito à existência ou não de confusão

entre credor e devedor no que se refere ao recebimento de honorários advocatícios sucum-benciais em demanda patrocinada por defensor público estadual contra Município.

A esse respeito, frisa-se que, sendo a Defensoria Pública integrante de pessoa jurídica de direito público diversa daquela contra a qual atua, não haverá coincidência das características de credor e de devedor em uma mesma pessoa. Ou seja, não há confusão, como, por exemplo, quando a Defensoria Pública Estadual atua contra Município ou a da União, contra Estado-membro e assim por diante.

Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes desta Corte:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DE-FENSORIA PÚBLICA. LITIGÂNCIA CONTRA O MUNICÍPIO. HONORÁRIOS ADVO-CATÍCIOS. CABIMENTO.1. São devidos honorários advocatícios quando restar vencedora em demanda contra o Município, e não o Estado, parte representada por defensor público, não havendo que se falar no instituto da confusão, previsto no artigo 381 do Código Civil de 2002, uma vez que é aquele e não este que figura como devedor da verba honorária.2. Recurso especial a que se dá provimento.(REsp 1.046.495/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe 30.06.2008)

PROCESSUAL CIVIL. DEFENSOR PÚBLICO. HONORÁRIOS. DEMANDA CONTRA O MUNICÍPIO. PREQUESTIONAMENTO.1. A Defensoria Pública, por ser órgão do Estado, pode recolher honorários sucum-benciais decorrentes de condenação contra a Fazenda Pública Municipal em causas patrocinadas por defensor público, uma vez que não se configura o instituto da confusão entre credor e devedor. Precedentes.2. Agravo regimental não provido.(AgRg no REsp 1.084.534/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe 12.02.2009)

Registre-se que o tema foi objeto de julgamento pela Primeira Seção deste Tribu-nal, mediante a sistemática prevista no art. 543-C do CPC e na Resolução nº 08/08 do STJ, consoante ementa abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO À SISTEMÁTICA PREVISTA NO ART. 543-C DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. CÓDIGO CIVIL, ART. 381 (CONFUSÃO). PRESSUPOSTOS.

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127JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

1. Segundo noção clássica do direito das obrigações, ocorre confusão quando uma mesma pessoa reúne as qualidades de credor e devedor.2. Em tal hipótese, por incompatibilidade lógica e expressa previsão legal extingue-se a obrigação.3. Com base nessa premissa, a jurisprudência desta Corte tem assentado o entendi-mento de que não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando atua contra a pessoa jurídica de direito público da qual é parte integrante.4. A contrario sensu, reconhece-se o direito ao recebimento dos honorários advocatícios se a atuação se dá em face de ente federativo diverso, como, por exemplo, quando a Defensoria Pública Estadual atua contra Município.5. Recurso especial provido. Acórdão sujeito à sistemática prevista no art. 543-C do CPC e à Resolução nº 8/2008-STJ.(REsp 1.108.013/RJ, 1ª Seção, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 22.06.2009)

Assim sendo, nota-se que é legítima a condenação do Município ao pagamento de honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul.

Ante o exposto, o recurso especial deve ser PROVIDO para declarar que o Município deve ser condenado ao pagamento de honorários advocatícios e para determinar a remessa dos autos à origem para que proceda ao arbitramento dos honorários advocatícios.

É o voto.

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL 2008.38.00.013639-2/MGe-DJF1: 25.11.2011RELATOR(A): DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA

ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. MANUTENÇÃO EM CATIVEIRO DE ESPÉ-CIES PASSERIFORMES DA FAUNA SILVESTRE BRASILEIRA SEM AUTORIZAÇÃO DO IBAMA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO.1. O art. 72 da Lei 9.605/98 possibilita, em seu § 4º, a conversão da multa simples em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.2. Consideradas as situações fáticas, bem como o perfil socioeconômico da autora, correta a sentença ao converter a multa em prestação de serviços, tendo em vista que este atenderá a finalidade punitivo-educativa da norma.3. Apelação improvida.

ACÓRDÃODecide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negar provimento

à apelação.Brasília-DF, 16 de novembro de 2011.SELENE MARIA DE ALMEIDADesembargadora Federal - Relatora

RELATÓRIOA Exmª Srª Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA (Relatora):VICENTE DA SILVA LEITE ajuizou ação ordinária contra o INSTITUTO BRASILEI-

RO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, com a finalidade de anular a multa aplicada no Auto de Infração nº 447685/D, ao fundamento de ser ilegal, ou, ainda, a conversão da multa em advertência ou em prestação de serviço, ou, ainda, a redução do seu valor.

O pedido foi julgado procedente:

Em face do exposto, julgo procedente o pedido, para declarar o direito do autor à con-versão da pena de multa simples em prestação de serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente, cabendo ao IBAMA a definição dos serviços e do local apropriados para cumprimento da obrigação, em que possa ele mesmo ou outro órgão de defesa ambiental supervisionar, em tempo não superior àquele fixado para cumprimento da condenação criminal.Cumprida a penalidade administrativa no prazo máximo de 06 (seis) meses, após pas-sada esta em julgado, será extinta a multa pecuniária. Seu não cumprimento no prazo, pela recusa do autor, implicará o restabelecimento da multa e direito de cobrança, pelo IBAMA, por meio de execução forçada.

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129JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

Apela o IBAMA ao fundamento de que a conversão de multa em prestação de serviço é atividade administrativa típica, sendo regra a imposição de multa. Afirma não haver obriga-toriedade quanto à conversão, tratando-se de mera faculdade da administração. Em relação à melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente, possui a natureza de transação, ato bilateral, que não pode ser imposta em juízo.

Pugna pela reforma da sentença, julgando improcedente o pedido.Contrarrazões às fls. 178/182.É o relatório.

VOTOA Exmª Srª Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA (Relatora):O autor ajuizou a presente ação visando à anulação do auto de infração lavrado

em razão de manter em cativeiro pássaros da fauna silvestre não provenientes de criadouro legalizado, sem a devida licença ou registro do órgão ambiental competente.

Os animais são dois: 8 trinca-ferros, 1 canário chapinha, 1 papa-capim.A Lei nº 9.605, de 12.02.1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas

derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, assim dispõe:

Dos Crimes contra a FaunaArt. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.§ 1º Incorre nas mesmas penas:[...]III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.[...]Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.[...]

Ainda, releva considerar o que dispõe o art. 72 e seguintes do mesmo diploma legal:Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:I - advertência;II - multa simples;III - multa diária;IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;V - destruição ou inutilização do produto;

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130 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

VI - suspensão de venda e fabricação do produto;VII - embargo de obra ou atividade;VIII - demolição de obra;IX - suspensão parcial ou total de atividades;X - (VETADO)XI - restritiva de direitos.§ 1º Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.§ 2º A advertência será aplicada pela inobservância das disposições desta Lei e da legislação em vigor, ou de preceitos regulamentares, sem prejuízo das demais sanções previstas neste artigo.§ 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;II - opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.§ 4° A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.§ 5º A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se prolongar no tempo.§ 6º A apreensão e destruição referidas nos incisos IV e V do caput obedecerão ao disposto no art. 25 desta Lei.§ 7º As sanções indicadas nos incisos VI a IX do caput serão aplicadas quando o produto, a obra, a atividade ou o estabelecimento não estiverem obedecendo às prescrições legais ou regulamentares.§ 8º As sanções restritivas de direito são:I - suspensão de registro, licença ou autorização;II - cancelamento de registro, licença ou autorização;III - perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais;IV - perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;V - proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até três anos.Art. 73. Os valores arrecadados em pagamento de multas por infração ambiental serão revertidos ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, criado pela Lei nº 7.797, de 10 de julho de 1989, Fundo Naval, criado pelo Decreto nº 20.923, de 8 de janeiro de 1932, fundos estaduais ou municipais de meio ambiente, ou correlatos, conforme dispuser o órgão arrecadador.Art. 74. A multa terá por base a unidade, hectare, metro cúbico, quilograma ou outra medida pertinente, de acordo com o objeto jurídico lesado.Art. 75. O valor da multa de que trata este Capítulo será fixado no regulamento desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 (cinquenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais).Por sua vez, vejamos o que dispunha o Decreto 3.179/99, revogado pelo Decreto

6.514/08, in verbis:

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131JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

Art. 2º As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções:I - advertência;II - multa simples;III - multa diária;IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;V - destruição ou inutilização do produto;VI - suspensão de venda e fabricação do produto;VII - embargo de obra ou atividade;VIII - demolição de obra;IX - suspensão parcial ou total das atividades;X - restritiva de direitos; eXI - reparação dos danos causados.§ 1º Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão apli-cadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.§ 2º A advertência será aplicada pela inobservância das disposições deste Decreto e da legislação em vigor, sem prejuízo das demais sanções previstas neste artigo.§ 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:I - advertido, por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA ou pela Capitania dos Portos do Comando da Marinha;II - opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos Portos do Comando da Marinha.§ 4º A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.§ 5º A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se prolongar no tempo, até a sua efetiva cessação ou regularização da situação mediante a celebração, pelo infrator, de termo de compromisso de reparação de dano.§ 6º A apreensão, destruição ou inutilização, referidas nos incisos IV e V do caput deste artigo, obedecerão ao seguinte:I - os animais, produtos, subprodutos, instrumentos, petrechos, equipamentos, veículos e embarcações de pesca, objeto de infração administrativa serão apreendidos, lavrando--se os respectivos termos;II - os animais apreendidos terão a seguinte destinação:a) libertados em seu habitat natural, após verificação da sua adaptação às condições de vida silvestre;b) entregues a jardins zoológicos, fundações ambientalistas ou entidades assemelhadas, desde que fiquem sob a responsabilidade de técnicos habilitados; ouc) na impossibilidade de atendimento imediato das condições previstas nas alíneas anteriores, o órgão ambiental autuante poderá confiar os animais a fiel depositário na forma dos arts. 1.265 a 1.282 da Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, até implemen-tação dos termos antes mencionados;[...]Art. 4º A multa terá por base a unidade, o hectare, o metro cúbico, o quilograma ou outra medida pertinente, de acordo com o objeto jurídico lesado.

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132 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

Art. 5º O valor da multa de que trata este decreto será corrigido, periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de 50,00 (cinquenta reais), e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais).Art. 6º O agente autuante, ao lavrar o auto de infração, indicará a multa prevista para a conduta, bem como, se for o caso, as demais sanções estabelecidas neste Decreto, observando:I - a gravidade dos fatos, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;II - os antecedentes do infrator, quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; eIII - a situação econômica do infrator.Art. 7º A autoridade competente deve, de ofício ou mediante provocação, independen-temente do recolhimento da multa aplicada, majorar, manter ou minorar o seu valor, respeitados os limites estabelecidos nos artigos infringidos, observando os incisos do artigo anterior.Parágrafo único. A autoridade competente, ao analisar o processo administrativo de auto de infração, observará, no que couber, o disposto nos arts. 14 e 15 da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.

Vejamos o que consta nos referidos dispositivos:Lei 9.605/98:

Art. 14. São circunstâncias que atenuam a pena:I - baixo grau de instrução ou escolaridade do agente;II - arrependimento do infrator, manifestado pela espontânea reparação do dano, ou limitação significativa da degradação ambiental causada;III - comunicação prévia pelo agente do perigo iminente de degradação ambiental;IV - colaboração com os agentes encarregados da vigilância e do controle ambiental.Art. 15. São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:I - reincidência nos crimes de natureza ambiental;II - ter o agente cometido a infração:a) para obter vantagem pecuniária;b) coagindo outrem para a execução material da infração;c) afetando ou expondo a perigo, de maneira grave, a saúde pública ou o meio ambiente;d) concorrendo para danos à propriedade alheia;e) atingindo áreas de unidades de conservação ou áreas sujeitas, por ato do Poder Público, a regime especial de uso;f) atingindo áreas urbanas ou quaisquer assentamentos humanos;g) em período de defeso à fauna;h) em domingos ou feriados;i) à noite;j) em épocas de seca ou inundações;l) no interior do espaço territorial especialmente protegido;m) com o emprego de métodos cruéis para abate ou captura de animais;n) mediante fraude ou abuso de confiança;o) mediante abuso do direito de licença, permissão ou autorização ambiental;

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133JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

p) no interesse de pessoa jurídica mantida, total ou parcialmente, por verbas públicas ou beneficiada por incentivos fiscais;q) atingindo espécies ameaçadas, listadas em relatórios oficiais das autoridades competentes;r) facilitada por funcionário público no exercício de suas funções.

Desta forma, observa-se que o art. 72 da Lei 9.605/98, embora traga um rol em que figuram sucessivamente como sanções a advertência e a multa simples, não obriga, quando da edição do decreto regulamentador, a estabelecer necessariamente uma antes da outra. Pode-se multar sem prévia advertência, a depender da gravidade da conduta, não havendo nulidade da multa lavrada. A lei também possibilita a conversão da multa em pena de prestação de serviço.

Observada a condição fática, correta a sentença ao condenar o infrator a esta pena.Neste sentido a jurisprudência desta Corte:ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA SUSPEN-DENDO A EXIGIBILIDADE DE MULTA ADMINISTRATIVA POR SUPOSTO CRIME AMBIENTAL (MANTER EM CATIVEIRO PÁSSAROS DA FAUNA SILVESTRE SEM AUTORIZAÇÃO).1 - Consoante Acordo de Cooperação Técnica firmado entre o IBAMA/MG e a Defensoria Pública da União, pode-se converter multa ambiental (por manutenção em cativeiro de 07 pássaros silvestres brasileiros) em medida de cunho educativo (prestação de serviços de preservação, melhoria e recuperação), a teor do art. 72, § 4º, da Lei nº 9.605/98, não vicejando a mera vontade do IBAMA em denunciar o aludido pacto, que, enquanto vigente, assegura à autora a conversão aludida, que, ao que consta, ostenta a necessária eficácia comum às sanções (reprimir e educar).2 - Há previsão legal para que o Juiz deixe de aplicar a pena (§ 2º do art. 29 da Lei nº 9.605/99 e art. 11, § 2º, do Decreto nº 3.179/99) e, no caso, não há notícia de que as aves, embora da fauna silvestre brasileira, estejam em risco de extinção.3 - Consideram-se, também, o perfil socioeconômico e a conduta da agravada-autuada, pessoa semianalfabeta e de poucos recursos, que, além de desconhecer a infração cometida, fato comum na realidade brasileira interiorana, demonstrou - no que mais importa - não infligir maus-tratos aos pássaros, criados em ambiente doméstico, sem qualquer exposição de risco ao meio ambiente ou à fauna silvestre; prova inconteste de tais fatos é que permaneceram em seu poder, na condição de depositária, mesmo após a autuação.4 - Presentes os requisitos do art. 273 do CPC e adotando-se o princípio da insignifi-cância, a suspensão da exigibilidade da multa é medida que se impõe.5 - Agravo não provido.6 - Peças liberadas pelo Relator, em 23.10.2007, para publicação do acórdão.(24393 MG 2007.01.00.024393-6, Relator: Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, Data de Julgamento: 23.10.2007, Sétima Turma, Data de Publicação: 09.11.2007, DJ p. 226)

Assim, correta a sentença ao possibilitar à autora a prestação de serviço.Ante ao exposto, nego provimento à apelação.É o voto.

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134 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0038787-03.2010.404.0000/RSRELATORA: Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈREDE: 29.11.2011

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÓCIOS. RESPONSABILIDADE PESSOAL. ARTIGO 135, INCISO III, DO CTN. NOME CONSTANTE DA CDA. INFRAÇÃO À LEI. NÃO REPASSE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.A inclusão dos sócios na CDA não decorreu por força do disposto no artigo 13 da Lei nº 8.620/93, mas da verificação de infração à lei, conforme previsão do artigo 135, inciso III, do CTN, consubstanciada no não repasse à Previdência Social dos valores descontados a título de contribuição previdenciária.A responsabilidade civil independe da criminal, razão pela qual a existência de decisão penal absolutória não impede o prosseguimento da cobrança, sendo de destacar que somente a decisão criminal que tenha, categoricamente, afirmado a inexistência do fato é que impede a discussão acerca da responsabilidade na esfera cível.Agravo improvido.

ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a

egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provi-mento ao agravo, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de novembro de 2011.Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRERelator

RELATÓRIOCuida-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que não acolheu as

razões expendidas em exceção de pré-executividade.Nos dizeres da peça recursal, a manutenção dos agravantes no polo passivo da

execução é completamente injusta e ilegal, já tendo este tribunal, juntamente com o Supremo Tribunal Federal, declarado a inconstitucionalidade do artigo 13 da Lei 8.620/93.

Postularam o provimento do recurso a fim de que seja reformada a decisão agra-vada. É o relatório.

VOTOA decisão agravada, no que interessa ao julgamento do presente recurso, foi pro-

ferida nos seguintes termos:Vistos. Trata-se de Exceção de Pré-Executividade oposta por Délcio Prates da Silveira e Maurício Goldemberg em Ação de Execução Fiscal promovida pela UNIÃO FEDERAL

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135JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

- INSS - em face de COOPERATIVA RURAL ALEGRETENSE e seus sócios (fls. 110/125), sob o fundamento da impossibilidade de se redirecionar a execução contra os sócios por simples inadimplência da Cooperativa. Informaram, ainda, que houve uma alienação de estabelecimento empresarial ao FRIGORÍFICO MERCOSUL S/A e que, portanto, seria esta nova pessoa jurídica responsável pelos débitos da Cooperativa Rural Alegretense. Requereu o acolhimento da presente Exceção de Pré-Executividade com a consequente extinção da ação de execução em face dos referidos sócios. Juntou documentos (fls. 126/148).A parte exequente apresentou impugnação e acostou documentos (fls. 151/155).Foi determinada a intimação do Frigorífico Mercosul S/A para se manifestar sobre o pedido de redirecionamento da ação (fls. 149), oportunidade em que se posicionou de forma contrária à sua inclusão no polo passivo (174/176). Juntou documentos (fls. 177/204).É O BREVE RELATÓRIO.DECIDOPrimeiramente, com relação ao pedido de exclusão dos sócios Délcio e do sócio Maurício, tenho que a pretensão não merece guarida.Isto porque, ainda que absolvidos na esfera criminal por ausência de provas de que agiram dolosamente ao não repassar as verbas ao INSS, os sócios agiram com infração à lei, uma vez que se apropriaram indevidamente dos valores que deveriam ter sido repassados ao INSS.Assim, em que pese a ausência de prova do dolo, necessária para uma condenação penal, a infração ao dispositivo legal é clara e, portanto, não incide o teor da Súmula 430 do STJ (O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente), sendo possível o redirecionamento da execução fiscal.Assim, deixo de acolher a exceção de pré-executividade, neste particular.[...]Diante de todo o exposto, acolho PARCIALMENTE a exceção de pré-executividade para determinar a inclusão no polo passivo do adquirente do estabelecimento empresarial, FRIGORÍFICO MERCOSUL S/A. Desacolho-a, entretanto, com relação à exclusão dos sócios coexecutados e os mantenho no polo passivo da presente execução fiscal.

Não merece reparos o decisum. Isto porque a inclusão dos sócios na CDA não decorreu do disposto no artigo 13 da Lei nº 8.620/93, mas pela constatação de infração à lei, conforme previsão do artigo 135, inciso III, do CTN, consubstanciada no não repasse à Previdência Social dos valores descontados a título de contribuição previdenciária.

Em que pese a absolvição na esfera criminal, inviável o afastamento da responsa-bilidade tributária dos sócios. Isto porque a responsabilidade civil independe da criminal, razão pela qual a existência de decisão penal absolutória não impede o prosseguimento da cobrança ora fustigada, sendo de destacar que somente a decisão criminal que tenha, categoricamen-te, afirmado a inexistência do fato é que impede a discussão acerca da responsabilidade na esfera cível.

A propósito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

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136 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO JUL-GADA PROCEDENTE. DECISÃO CRIMINAL ABSOLUTÓRIA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. ART. 384, IV, DO CPP. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO NO JUÍZO CÍVEL. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 1.525 DO CC/16 E 65 DO CPP.- Embora tanto a responsabilidade criminal quanto a civil tenham tido origem no mesmo fato, cada uma das jurisdições utiliza critérios diversos para verificação do ocorrido. A responsabilidade civil independe da criminal, sendo também de extensão diversa o grau de culpa exigido em ambas as esferas. Todo ilícito penal é também um ilícito civil, mas nem todo ilícito civil corresponde a um ilícito penal.- A existência de decisão penal absolutória que, em seu dispositivo, deixa de condenar o preposto do recorrente por ausência de prova de ter o réu concorrido para a infração penal (art. 386, IV, do CPP) não impede o prosseguimento da ação civil de indenização.- A decisão criminal que não declara a inexistência material do fato permite o pros-seguimento da execução do julgado proferido na ação cível ajuizada por familiar da vítima do ato ilícito.Recurso Especial não provido.(REsp 1117131/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 01.06.2010, DJe 22.06.2010)

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo.Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRERelator

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137JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - ACÓRDÃOS

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7311/RN 2004.84.00.010041-5RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ MARIA LUCENADJe: 17.11.2011

PENAL. PROCESSUAL PENAL. CARCINICULTURA. DEVASTAÇÃO DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - MANGUE. ART. 60 DA LEI Nº 9.605/98. PERMA-NÊNCIA DO CRIME. NÃO DEMONSTRADA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA.1 - Em que pese as ponderáveis razões veiculadas pelo Ministério Público Federal, em seu recurso de apelação, quanto ao caráter permanente do delito ambiental praticado pelo apelado, especificamente, a suposta prática da carcinicultura à custa da degra-dação de área de preservação permanente - mangue -, deve se manter o tópico da sentença que reconhece a extinção da punibilidade quanto ao referido crime, previsto no art. 60 da Lei 9.605/98.2 - Apesar da respeitável argumentação sobre a permanência da atividade ilícita do apelado, sem a devida licença do IBAMA, demonstrada por meio dos indícios coligidos às fls. 208/209, tal não se afigura suficiente para um juízo conclusivo da existência de crime permanente.3 - Considerando que a pena privativa de liberdade máxima prevista para o crime é de 06 (seis) meses de detenção, o prazo prescricional é de 02 (dois) anos, como prevê o art. 109, V, do CP.4 - Transcorridos mais de 03 (três) anos entre a data da consumação do crime, em 22.05.2001 (fl. 08, Apenso 1), e a do recebimento da denúncia, em 26.11.2004 (fl. 14), operou-se o fenômeno da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, devendo-se confirmar a extinção da punibilidade do acusado.Apelação criminal improvida.

ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a

Primeira Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação criminal, nos termos do relatório e voto constantes dos autos, que integram o presente julgado.

Recife, 27 de outubro de 2011 (data do julgamento).JOSÉ MARIA LUCENA,Relator.

RELATÓRIOO Desembargador Federal JOSÉ MARIA LUCENA (Relator):Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal, subscrita

pelo Procurador da República Dr. JOSÉ SOARES, em face de sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte Dr. MÁRIO AZEVEDO

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JAMBO, às fls. 197/202, que julgou improcedente a denúncia absolvendo o acusado PAUL LIZIERI DO NASCIMENTO, nos termos do art. 386, III, do Código de Processo Penal, da prática do delito previsto pelo art. 20 da Lei nº 4.947/96,1 e declarou extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição em relação às imputações dos crimes previstos nos arts. 48, 50 e 60 da Lei nº 9.605/98,2 com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal.3

O édito absolutório foi assim ementado (fls. 197):EMENTA: PENAL. CRIMES AMBIENTAIS. LEI Nº 9.605/98. DESTRUIÇÃO DE MANGUE (ART. 50), ÓBICES À REGENERAÇÃO NATURAL DA VEGETAÇÃO (ART. 48) E FUN-CIONAMENTO DE VIVEIROS DE CAMARÃO SEM LICENÇA (ART. 60). PRESCRIÇÃO. INVASÃO DE TERRAS DA UNIÃO (ART. 20 DA LEI Nº 4.947/1966). ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO.Decorrido o prazo prescricional entre as datas de consumação do delito (art. 60 da Lei nº 9.605/1998) e do recebimento da denúncia, mostra-se imperiosa a extinção da punibilidade do agente.Incidência da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade virtual, em relação aos delitos capitulados nos arts. 48 e 50 da Lei dos Crimes Ambientais.A Lei nº 4.947/1966, que traça normas de Direito Agrário e dispõe sobre a Organização e Funcionamento do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, presta-se a reger a conduta daquele que ocupa terras da União para fins de reforma agrária. Isso implica dizer que o terreno ocupado pelo acusado, por sua localização e extensão, não guarda adequação típica com a elementar “terras da União”, prevista no art. 20 de citada lei, razão pela qual a conduta do agente configura-se atípica.Improcedência do pedido.Narra a denúncia que o acusado invadiu, com o escopo de ocupar, terrenos de marinha

e acrescidos localizados no Sítio Umbuzeiros, Zona Rural do Município de Arês/RN, promovendo desmatamento e instalação de viveiros de camarão em área de mangue, considerada de preserva-ção permanente, e propriedade da União, impedindo a regeneração da vegetação natural da área.

1 Art. 20. Invadir, com intenção de ocupá-las, terras da União, dos Estados e dos Municípios:Pena: Detenção de 6 meses a 3 anos.

2 Art. 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação:Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.[...]Art. 50. Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação:Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.[...]Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes:Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

3 Art. 107. Extingue-se a punibilidade: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984)[...]IV - pela prescrição, decadência ou perempção;

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Demais disso, desenvolveu a atividade de carcinocultura - atividade potencialmente poluidora -, sem as licenças de instalação e operação do IDEMA, sem registro no Cadastro de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais do IBAMA, e sem inscrição de ocupação da Gerência Regional da Secretaria do Patrimônio da União - GRPU.

Ainda dos autos, há notícia que fiscalização do IBAMA/RN autuando o acusado por desmatar, em 22.05.01, 2.500 m² de mangue e, mesmo tendo sido proibido de exercer qual-quer atividade na área, em 10.02.04, em depoimento perante a autoridade policial, confessou continuar exercendo o cultivo de camarões.

Alega o apelante, às fls. 205/210, em síntese:a) a necessidade de condenação do apelado pelo crime previsto no art. 60 da Lei

nº 9.605/98, haja vista que, mesmo depois de autuado pelo órgão ambiental, sendo proibido de operar os viveiros de camarão, persistiu e ainda persiste na atividade sem a devida licença;

b) em vista de a atividade continuar a ser praticada, não ocorre a prescrição em relação ao referido artigo, que sequer começou a ocorrer, pois o crime é permanente quanto ao verbo “fazer funcionar” diante da incidência da norma do art. 111, III, do CP.4

Contrarrazões foram apresentadas, subscritas pelo advogado Dr. FÁBIO CARLOS DE MEDEIROS (fls. 213/216).

O Ministério Público Federal, às fls. 222/226, apresentou parecer da lavra do Pro-curador Regional da República Dr. WELLINGTON CABRAL SARAIVA, nos mesmos moldes da apelação criminal pela condenação do apelado nas penas do art. 60 da Lei nº 9.605/98.

Dispensada a revisão nos termos do art. 197, parágrafo único, segunda parte do RITRF5.

RELATEI.VOTO

O Desembargador Federal JOSÉ MARIA LUCENA (Relator):Em que pese as ponderáveis razões veiculadas pelo Ministério Público Federal,

em seu recurso de apelação, quanto ao caráter permanente do delito ambiental praticado pelo apelado, especificamente, a suposta prática da carcinicultura à custa da degradação de área de preservação permanente - mangue -, tenho por me inclinar a manter o tópico da sentença que reconhece a extinção da punibilidade quanto ao referido crime, previsto no art. 60 da Lei 9.605/985 (fl. 199):

4 Art. 111. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984)[...]III - nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984)

5 Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes:Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

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Preliminarmente, imperioso registrar a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva em relação aos delitos plasmados na Lei dos Crimes Ambientais.A punição de quem comete um ilícito penal só tem sua razão de ser caso seja aplicada com imediatidade, razão pela qual, dependendo da pena máxima em abstrato prevista para o crime, a punibilidade pode estar extinta pela prescrição, seja em um lapso de tempo maior ou menor, na conformidade do art. 109 do Código Penal.In casu, a pena privativa de liberdade máxima prevista para o delito do art. 60 é de 06 (seis) meses de detenção, sendo o prazo prescricional, portanto, de 02 (dois) anos, à luz do art. 109, inciso V, do Código Penal.Levando-se em conta que decorreram mais de 03 (três) anos entre as datas de consumação do delito (22 de maio de 2001) e do recebimento da denúncia (26 de novembro de 2004), deve-se reconhecer a prescrição da pretensão punitiva do Estado e decretar a extinção da punibilidade do acusado em relação ao crime descrito no art. 60 da Lei nº 9.605/98.

Com efeito, apesar da respeitável argumentação sobre a permanência da atividade ilícita do apelado, sem a devida licença do IBAMA, demonstrada por meio dos indícios coligidos às fls. 208/209, tal não me afigura suficiente para um juízo conclusivo da existência de crime permanente.

Portanto, considerando que a pena privativa de liberdade máxima prevista para o crime é de 06 (seis) meses de detenção, o prazo prescricional é de 02 (dois) anos, como prevê o art. 109, V, do CP.6

Transcorridos mais de 03 (três) anos entre a data da consumação do crime, em 22.05.2001 (fl. 08, Apenso 1), e a do recebimento da denúncia, em 26.11.2004 (fl. 14), operou-se o fenômeno da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, devendo-se con-firmar a extinção da punibilidade do acusado.

Forte nessas razões, nego provimento à apelação criminal.ASSIM VOTO.

6 Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984)VI - em dois anos, se o máximo da pena é inferior a um ano. (Redação anterior ao advento da Lei nº 12.234, de 2010).

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EMENTÁRIO CÍVEL

ABANDONO DA CAUSA

43/4601 - MONOCRÁTICA. PROCESSO CIVIL. ABANDONO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. INTELIGÊNCIA DO ART. 267, § 1º DO CPC. IM-PRESCINDIBILIDADE DA PRÉVIA INTIMAÇÃO PESSOAL DO AUTOR. O art. 267, § 1º do CPC exige a intimação pessoal da parte, cientificando-a da ordem da lei adjetiva civil, para efeito de configuração do abandono da causa. In casu, não houve a intimação pessoal exigida por lei a fim de autorizar a extinção sem julgamento de mérito, não restando atendido o requisito legal. Sentença cassada. Provimento do recurso na forma do art. 557, § 1º-A do CPC. RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0056267-53.2001.8.19.0001. 6. Câmara Cível. Relator: Teresa Castro Neves. Rio de Janeiro, 13 de outubro de 2011.

AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO

43/4602 - AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. DEVEDOR QUE NÃO FOI REGULARMENTE NOTIFICADO DA DÍVIDA. MORA. INEXISTÊNCIA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO. 1. O Tribunal de origem decidiu que o devedor não se encontra em mora, pois ele não foi regularmente notificado da dívida. Dessa forma, os argumentos utilizados para fundamentar a pretensa violação legal somente pode-riam ter sua procedência verificada mediante reexame das circunstâncias fáticas, providência que encontra óbice na Súmula 7 deste Tribunal. 2. O agravante não trouxe qualquer elemento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. 3. Agravo Regimental improvido. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 43942 (2011/0149673-6), do Estado do Paraná. 3. Turma. Relator: Sidnei Beneti. Decisão unânime. Brasília, DF, 17 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

43/4603 - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. BUSCA E APREEN-SÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. MORA. NÃO COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE. EXTINÇÃO DA AÇÃO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que, em caso de alienação fidu-ciária, a mora deve ser comprovada por meio de notificação extrajudicial realizada por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos a ser entregue no domicílio do devedor, sendo dispensada a notificação pessoal. 2. Na hipótese, o eg. Tribunal de origem consigna que não há comprovação de que a notificação foi recebida no endereço do domicílio do devedor em razão da mudança de endereço, não ficando, portanto, comprovado o atendimento do requisito da constituição deste em mora para prosseguimento da ação de busca e apreensão. 3. Embora desnecessário o recebimento da notificação pelo próprio devedor, exige-se, pelo menos, a comprovação de que efetivamente houve o recebimento no endereço do seu domicílio. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 23432 (2011/0084324-2), do Estado de São Paulo. 4. Turma. Relator: Raul Araújo. Decisão unânime. Brasília, DF, 20 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

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43/4604 - CIVIL - APELAÇÃO - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO - CONSTITUIÇÃO DO DEVEDOR EM MORA - AUSÊNCIA DE CUMPRIMENTO DA DE-TERMINAÇÃO CONTIDA NO ART. 2º, § 2º DO DECRETO-LEI Nº 911/79. 1 - A concessão de medida liminar em ação de busca e apreensão decorrente do inadimplemento de contrato com garantia de alienação fiduciária está condicionada tão só à mora do devedor, que deverá ser comprovada por carta registrada expedida por intermédio de cartório de títulos e documentos ou pelo protesto do título. 2 - Não tendo sido a notificação realizada nos estritos termos do Decreto-Lei nº 911/79, não se considera comprovada a mora, verificando-se, desta forma a ausência de condição específica para a instauração da ação de busca e apreensão. 3 - Precedentes: AgRg no REsp 1213926/RS, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 14.04.2011, DJe 03.05.2011; AgRg no REsp 1190827/AM, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 01.03.2011, DJe 21.03.2011. 4 - Apelação desprovida. Sentença mantida. BRASIL. Tribunal Regional Federal (2. Região). Apelação Cível nº 2010.51.01.015603-6. 6. Turma Especializada. Relator: Frederico Gueiros. Decisão unânime. Rio de Janeiro, 21 de novembro de 2011. Diário Eletrônico da Justiça Federal da 2ª Região de 28 de novembro de 2011.

43/4605 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. BUSCA E APRE-ENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. MORA CARACTERIZADA. NOTIFICAÇÃO. VALIDADE. LIMI-NAR. CONCESSÃO. REQUISITOS. RECURSO IMPROVIDO. Precedente deste Órgão Fracionado Cível: “1. Na alienação fiduciária, regulada pelo Decreto-Lei nº 911/69, comprova-se a constituição do devedor em mora: a) pela notificação extrajudicial, feita pelo Cartório de Títulos e Documentos, através de carta registrada, que deve ser entregue no domicílio contratual do devedor, ainda que não seja recebida pessoalmente por ele; ou, a critério do credor, b) pelo instrumento de protesto lavrado no Cartório competente (isto é, do domicílio contratual do devedor), cuja intimação pode ser feita por edital, se o devedor, apesar das tentativas do cartório, não for localizado no endereço constante do contrato ou tiver localização incerta ou ignorada ou, ainda, se ninguém se dispuser a receber a notificação no seu endereço. (TJAC. Câmara Cível - Acórdão 4570 - Agravo de Instrumento 2007.001637-2 - Relª Desª Miracele Lopes - j: 31.07.2010)” 2. Recurso improvido. ACRE. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0001639-69.2011.8.01.0000 (11.534). Câmara Cível. Relator: Eva Evangelista de Araújo Souza. Decisão unânime. Rio Branco, 20 de setembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 22 de novembro de 2011.

43/4606 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILI-DADE DE DISCUSSÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS EM PROCESSO DE BUSCA E APRE-ENSÃO. DESCABIMENTO. Possibilidade prevista na nova redação dada ao Decreto-Lei 911/69 pela Lei 10.931/04. Precedentes. Recurso desprovido. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0803625-5. 18. Câmara Cível. Relator: Roberto de Vicente. Decisão unânime. Curitiba, 16 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 30 de novembro de 2011.

43/4607 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL REALIZADA POR CARTÓRIO LOCALIZADO EM COMARCA DIVERSA DO DOMICÍLIO DO DEVE-DOR. NOTIFICAÇÃO VÁLIDA POSTO QUE ENTREGUE NO ENDEREÇO CORRETO. FINALIDADE ATINGIDA. Inteligência do art. 2º do Dec.-Lei nº 911/69. Não comprovação de realização de acordo antes da busca e apreensão do veículo. Fato constitutivo do direito da apelada. Dicção do art. 333, I do CPC. Anulação da sentença a quo. Recurso conhecido e provido. SERGIPE. Tribunal de Justiça.

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143JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Cível

Apelação Cível nº 2011217515 (15418/2011). 1. Câmara Cível. Relator: Maria Aparecida Santos Gama da Silva. Decisão por maioria. Diário da Justiça de 11 de novembro de 2011.

AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE

43/4608 - AGRAVO INTERNO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. POSTERIOR APRECIAÇÃO DE LIMINAR. NECESSIDADE DA PEÇA DE DEFESA. Hipótese na qual a decisão de 1º grau postergou a apreciação da liminar de reintegração de posse para após a apresentação da peça de defesa, tendo em conta as particularidades do sistema de arrendamento residencial, ligadas à possibilidade de purgação da mora. Nesse contexto, não se autoriza modificar o decidido, pois se trata de aferição provisória, sujeita ao reexame pelo próprio Juiz. O objetivo do legislador é restringir o agravo de instrumento, e não há motivos que levem este Tribunal a provê-lo, quando tudo ainda será revisto, em 1º grau. Agravo interno não provido. BRASIL. Tribunal Regional Federal (2. Região). Agravo de Instrumento nº 205621-RJ (2011.02.01.014381-0). 6. Turma Especializada. Relator: Guilherme Couto de Castro. Decisão unânime. Rio de Janeiro, 21 de novembro de 2011. Diário Eletrônico da Justiça Federal da 2ª Região de 28 de novembro de 2011.

43/4609 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. LIMITAÇÃO DE ANIMAIS. NATUREZA CAUTELAR. QUANTIDADE. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. DECISÃO CUMPRIDA. RECURSO DESPROVIDO. A limitação do número de animais em imóvel litigioso não conflita com o direito possessório. A quantificação de animais cabe ao r. Juízo singular, pois depende de análise de provas. MATO GROSSO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 114138/2009. 5. Câmara Cível. Relator: Marcos Machado. Decisão unânime. Cuiabá, 19 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 23 de novembro de 2011.

43/4610 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. LIMINAR CONCEDIDA. CONTAGEM DO PRAZO INICIAL A PARTIR DA JUNTADA DO ÚLTIMO MANDADO CITATÓRIO CUMPRIDO. ART. 241, III DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. Em se tratando de ação de reintegração de posse, com diversos corréus impõe-se a aplicação do previsto no art. 241, III, do CPC, quanto ao termo dies a quo do prazo para cumprimento de liminar. 2. Tendo em vista que muitos objetos que devem ser retirados da propriedade não pertencem a agravante, mas sim a Petrobras Distribuidora S/A, é razoável esperar que o mandado citatório desta seja cumprido e juntado aos autos para que só então se dê início da contagem do prazo de cumprimento da decisão. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0820277-3. 5. Câmara Cível. Relator: Luiz Mateus de Lima. Relator convocado: Edison de Oliveira Macedo Filho. Decisão unânime. Curitiba, 22 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 30 de novembro de 2011.

AÇÃO MONITÓRIA

43/4611 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. DUPLICATA MERCANTIL. PROTESTO POR FALTA DE ACEITE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ENTREGA DAS MERCADORIAS CON-TRATADAS. INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO CAMBIAL. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMEN-TO. 1) A duplicata mercantil necessita, no caso de protesto por falta de aceite, da comprovação de entrega das mercadorias contratadas, para que se possa autorizar o pagamento de tal título

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cambial, que deve manter consonância com a situação de fato efetivamente ocorrida. 2) No caso, a apelante, então sacadora, não logrou êxito em comprovar a efetiva entrega das mercadorias, de forma que não se desincumbiu da comprovação da existência de seu direito, nos termos do art. 333, I do CPC. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0789378-7. 13. Câmara Cível. Relator: Luís Carlos Xavier. Decisão unânime. Curitiba, 16 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

43/4612 - EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPE-CIFICADO. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUES PRESCRITOS. DESNECESSIDADE DA COMPRO-VAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO SUBJACENTE. PARTE SEM AJG. AUSÊNCIA DE PREPARO. DESERÇÃO. RECURSO NÃO CONHECIDO. Não possuindo a parte recorrente o benefício da AJG e ausente a realização do devido preparo, como determina o artigo 511 do CPC, o caso é de não conhecimento do recurso pela deserção, prejudicado o exame do seu mérito. Embargos infringentes não conhecidos. Unânime. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Embargos Infringentes nº 70039992268. 5. Grupo de Câmaras Cíveis. Relator: Leonel Pires Ohlweiler. Porto Alegre, 18 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 25 de novembro de 2011.

43/4613 - AÇÃO MONITÓRIA. INDEFERIMENTO DE PETIÇÃO INICIAL. CHEQUE. PRESCRIÇÃO. 1 - Decorrido o prazo para a ação executiva de cheque, necessário o ajuizamento de monitória para a cobrança do débito, dentro do prazo quinquenal estipulado no art. 206, § 5º, I do CC, e na Súmula nº 18 do TJSP. Prescrição do direito material não caracterizada. 2. Os juros de mora contam-se, a partir da citação. Precedentes do STJ. Recurso provido nessa parte 3. Recurso parcialmente provido. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0010223-75.2010.8.26.0482. 18. Câmara de Direito Privado. Relator: Alexandre Lazzarini. São Paulo, 19 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 16 de novembro de 2011.

43/4614 - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO MONITÓRIA - ALEGAÇÃO DE DÍVIDA DECORRENTE DE FORNECIMENTO DE MERCADORIA PARA ENTE MUNICIPAL - APRESENTAÇÃO DE DO-CUMENTAÇÃO REFERENTE AO FORNECIMENTO DE MERCADORIA, NA QUAL CONSTA A ASSINATURA DA SECRETÁRIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. É devido o pagamento dos valores constantes da documentação precedida das respectivas assinaturas, sob pena de enriquecimento ilícito. A Fazenda Pública municipal não se desincumbiu do ônus imposto pelo art. 333, inciso II, do Código de Processo Civil, in casu, demonstrar que houve o pagamento da mercadoria recebida. Manutenção do decisum. Recurso que se conhece para lhe negar provimento. Decisão unânime. SERGIPE. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2011214972 (16045/2011). 2. Câmara Cível. Relator: Cezário Siqueira Neto. Diário da Justiça de 25 de novembro de 2011.

AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS

43/4615 - CIVIL. FAMÍLIA. AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS. FILHO MENOR. PRETENSA MAJORAÇÃO DO PERCENTUAL FIXADO A TÍTULO DE OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA. NECESSI-DADE DO INFANTE PRESUMIDA EM RAZÃO DE DOENÇA CARDÍACA CONGÊNITA. Ausência de comprovação da incapacidade de pagamento do alimentante. Observância pelo juízo a quo do binômio possibilidade/necessidade. Inteligência do § 1º do art. 1.694 do CC. Manutenção da sentença. Recurso conhecido e improvido. Precedentes. RIO GRANDE DO NORTE. Tribunal de

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145JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Cível

Justiça. Apelação Cível nº 2011.008478-7. 2. Câmara Cível. Relator: João Rebouças. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 22 de novembro de 2011.

APOSENTADORIA POR INVALIDEz

43/4616 - REEXAME DE SENTENÇA - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ ACIDENTÁRIA - EM-PREGADO DOMÉSTICO - PRESTAÇÕES ACIDENTÁRIAS INDEVIDAS - SENTENÇA REFORMA-DA. Somente o empregado, o trabalhador temporário, o trabalhador avulso, o segurado especial e o médico residente têm direito às prestações acidentárias, tendo sido o empregado doméstico excluído pela legislação que rege a matéria. O empregador doméstico não paga contribuição de custeio de acidente de trabalho. Inexistindo fonte de custeio, inviável a concessão do benefício previdenciário pretendido pela autora, o que leva à improcedência do pedido. MATO GROSSO DO SUL. Tribunal de Justiça. Reexame de Sentença nº 2011.030189-6/0000-00. 3. Turma Cível. Relator: Fernando Mauro Moreira Marinho. Decisão unânime. Diário da Justiça de 22 de novembro de 2011.

ARROLAMENTO SUMÁRIO

43/4617 - APELAÇÃO CÍVEL - ARROLAMENTO SUMÁRIO - HOMOLOGAÇÃO, POR SENTENÇA, DO PLANO DE PARTILHA - PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA ANALISADA EM CON-JUNTO COM O MÉRITO - AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA - DESNECESSIDA-DE - COBRANÇA DE TRIBUTOS (ITCD) INCIDENTES SOBRE OS BENS DO ESPÓLIO - QUES-TIONAMENTO RESERVADO PARA A VIA ADMINISTRATIVA OU PARA AÇÃO APROPRIADA - ART. 1.034 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Em nome da economia e da celeridade processuais, é prescindível a intimação da Fazenda Pública para o procedimento do arrolamento sumário, sobretudo se o legislador lhe reservou valer-se da via administrativa ou de ação adequada para realizar a cobrança de eventuais impostos de sua competência, razão pela qual não se acolhe a alegação de nulidade da sentença que a dispensou, a teor do artigo 1.034 do Código de Processo Civil. MATO GROSSO DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível - Proc. Especiais nº 2011.029956-0/0000-00. 4. Turma Cível. Relator: Josué de Oliveira. Decisão unânime. Diário da Justiça de 17 de novembro de 2011.

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA

43/4618 - PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. RECOLHIMEN-TO DAS CUSTAS PROCESSUAIS INICIAIS AO FINAL DA DEMANDA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1 - É plenamente possível o deferimento de Assistência Judiciária Gratuita à pessoa jurídica. Contudo, a concessão da AJG está condicionada da demonstração da vulnerabilidade econômica da pessoa jurídica. 2. O Código de Processo Civil é claro ao estatuir que as custas para a realização dos atos processuais serão adiantadas pelas partes. Destarte, não há possibilidade de se deferir o pagamento das custas iniciais da demanda somente ao final do processo. 3. Recurso conhecido, mas, no mérito, não provido. ACRE. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0002056-22.2011.8.01.0000 (11.454). Câmara Cível. Relator: Anastácio Lima de Menezes Filho. Decisão unânime. Rio Branco, 1º de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 11 de novembro de 2011.

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COMODATO

43/4619 - APELAÇÃO CÍVEL. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO REIVINDICATÓRIA. COMODATO. ACESSÃO. BOA-FÉ. INDENIZAÇÃO. ART. 1.255 DO CÓDIGO CIVIL. Incontroversa a existência de comodato, torna-se injusta a posse dos réus após a denúncia do contrato por meio de notificação. Voluntariamente desocupado o imóvel no curso do processo, com o reconhecimento tácito do pe-dido quanto à posse, possível discutir pleito de indenização por acessão. Tratando-se de acessão necessária, de acordo com a regra inserta na parte final do art. 1.255 do CC/02, indispensável a prova da boa-fé de quem edificou em terreno alheio, além da demonstração dos gastos reali-zados. Hipótese em que restaram adequadamente comprovadas as despesas suportadas pelos comodatários através da prova documental e de perícia. E a vigência, por mais de vinte anos, de contrato de comodato de terreno entre pai e filho expressa a boa-fé do comodatário, cuja posse foi justa até a notificação. Presumível, de outro lado, a autorização para construção da acessão, já que transcorridos vários anos desde o início do comodato até sua denúncia, sem que tenha o comodante adotado qualquer medida visando obstar a edificação realizada. Recurso desprovido. Unânime. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70046009197. 18. Câmara Cível. Relator: Pedro Celso Dal Pra. Porto Alegre, 24 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 28 de novembro de 2011.

CONTRATO DE EMPRÉSTIMO

43/4620 - APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DO DEVEDOR. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. INCI-DÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA Nº 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO DE TAXA MENSAL E EFETIVA ANUAL QUE CARACTERIZA O FENÔMENO DA CAPITALIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AFASTAMENTO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. Validade do contrato celebrado. Reanálise judicial para equilibrar a relação de consumo entre as partes. Suspensão da execução ante a abertura de falência da empresa executada. Continuidade da execução com relação aos coobrigados. Sentença reformada. Recurso conhecido e parcialmente provido. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0771911-7. 16. Câmara Cível. Relator: Maria Mercis Gomes Aniceto. Decisão unânime. Curitiba, 16 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 25 de novembro de 2011.

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

43/4621 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CUMPRIMENTO DE SENTEN-ÇA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. Tratando-se de execução individual, não obstante o título seja proveniente de sentença coletiva, o prazo prescricional é o de direito pessoal. Coisa julgada. Eficácia preclusiva da coisa julgada e Súmula 150 do STF. Ilegitimidade ativa. Eficácia da sentença que atinge todos os poupadores do Estado do Paraná titulares de conta à época junto à instituição financeira ré. Desnecessidade de comprovação de vínculo com a associação autora da ação co-letiva. Incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC. Cabimento. Inocorrência de pagamento voluntário, tendo a execução se iniciado após a vigência da Lei 1.123/05. Juros remuneratórios incidentes até o efetivo pagamento. Instituição financeira que indica à penhora cotas de fundo de investimento. Recusa do credor. Oferecimento indeferido pelo juízo de origem. Títulos previstos no art. 655, X, do CPC que não se confundem com dinheiro em espécie ou em depósito ou aplicação

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em instituição financeira. Inobservância à ordem legal. Matérias pacificadas nesta Corte de Justiça. Julgamento pelo art. 557 do CPC. Recurso com seguimento negado pelo colegiado. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0844918-1. 14. Câmara Cível. Relator: Celso Jair Mainardi. Decisão por maioria. Curitiba, 16 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 29 de novembro de 2011.

43/4622 - CUMPRIMENTO DA SENTENÇA - PRAZO DE 15 (QUINZE) DIAS PARA PAGAMENTO - MEMÓRIA DE CÁLCULO - INTIMAÇÃO DO DEVEDOR NA PESSOA DO ADVOGADO - NECES-SIDADE - AGRAVO PROVIDO. O cumprimento da sentença depende de provocação do credor que deverá apresentar ao juízo memória de cálculo atualizada, procedendo-se à intimação do devedor na pessoa de seu advogado constituído, cientificando-o do montante que deve pagar em 15 (quinze) dias. A intimação se faz pela imprensa oficial, ou pessoalmente no caso de o advogado ser dativo ou haver patrocínio pela Procuradoria da Assistência Judiciária. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0236416-03.2011.8.26.0000. 26. Câmara de Direito Privado. Relator: Renato Sartorelli. São Paulo, 26 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 16 de novembro de 2011.

DANOS MORAIS

43/4623 - INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. DUAS CIRURGIAS DE LAQUEADU-RA. DUAS GESTAÇÕES POSTERIORES. AUSÊNCIA DE ESCLARECIMENTOS À GESTANTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONA-LIDADE. QUANTUM MINORADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Submetida a autora a duas cirurgias de laqueadura de trompas e não sendo informada pelo médico da possibilidade de novamente engravidar, responde o Estado pela má prestação do serviço. 2. O valor da indenização, a título de danos morais, deve observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como as peculiaridades das partes envolvidas. 3. Recurso parcialmente provido para diminuir o valor da indenização a título de danos morais. RORAIMA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0010.10.902765-5. Câmara Única da Turma Cível. Relator convocado: Elaine Bianchi. Decisão por maioria. Diário da Justiça Eletrônico de 5 de novembro de 2011.

DESAPROPRIAÇÃO

43/4624 - PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. INTER-POSIÇÃO DE AGRAVO CONTRA ATO JUDICIAL DE CARÁTER TERMINATIVO. APRESENTAÇÃO DE APELO COM MESMO OBJETO. DESNECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. AGRAVO NÃO CONHECIDO. 1. A leitura da decisão agravada revela, inequivoca-mente, o seu caráter terminativo, circunstância essa que a torna passível de impugnação mediante recurso de apelação, e não de agravo de instrumento. 2. Verificando-se que houve apresentação do recurso adequado, apelação, versando sobre o mesmo objeto, desnecessária a discussão sobre a aplicação do princípio da fungibilidade, ensejando, por conseguinte, o não conhecimento do presente agravo. 3. Agravo não conhecido. BRASIL. Tribunal Regional Federal (1. Região). Agravo de Instrumento nº 0023489-86.2009.4.01.0000-AM. 4. Turma. Relator: I’talo Fioravanti Sabo Mendes. Relator convocado: Clemência Maria Almada Lima de Ângelo. Decisão unânime. Brasília, 2 de agosto de 2011. Diário da Justiça de 18 de novembro de 2011.

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DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

43/4625 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. DESCONSIDERAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA. CDC. TEORIA DA MENOR DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIZAÇÃO DOS SÓCIOS. RESSARCIMENTO DE PREJUÍZO. RECURSO PROVIDO. A desconsideração da personalidade jurídica está regulamentada no art. 50 do CC e no art. 28 do CDC. Na relação de consumo é aplicável a Teoria da Menor Desconsideração da Personalidade Jurídica, segundo a qual é desnecessária a demonstração do desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. MATO GROSSO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 116283/2010. 5. Câ-mara Cível. Relator: Marcos Machado. Decisão unânime. Cuiabá, 26 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 23 de novembro de 2011.

43/4626 - MONITÓRIA - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA - ALTERAÇÕES NO QUADRO SOCIETÁRIO - Decisão saneadora que, ao apreciar preliminar de ilegitimidade excluiu ex-sócio e sua mulher do polo passivo - Alteração societária ocorrida mais de dois anos antes da realização do negócio jurídico que originou a ação - Responsabilidade que não restou demonstrada - Cônjuge do sócio incluído por cautela ou equívoco do juiz singular, sem oposição da credora - Irrelevância para efeito de encargos de sucumbência, que decorre do resultado do processo - Redução da verba honorária - Recurso provido em parte. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0217046-38.2011.8.26.0000. 12. Câmara de Direito Privado. Relator: Cerqueira Leite. São Paulo, 26 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 17 de novembro de 2011.

DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS

43/4627 - AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. OFENSA AO ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 115 DA LEI 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ EM RAZÃO DE REVOGAÇÃO DE TUTELA ANTECIPADA. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. A instância judicante de origem não declarou inconstitucional ou afastou, por julgar inconstitucional, o art. 115 da Lei 8.213/1991, ape-nas entendeu que a norma não se aplica ao caso em exame. Precedentes. 2. De mais a mais, ao analisar o AI 841.473, da relatoria do ministro Cezar Peluso, o Supremo Tribunal Federal assentou a ausência de repercussão geral do tema versado nestes autos. 3. Agravo regimental desprovido. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 824.618, do Estado do Paraná. 2. Turma. Relator: Ayres Britto. Decisão unânime. Brasília, DF, 4 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 2 de dezembro de 2011.

DIREITO INTRANSMISSÍVEL

43/4628 - PROCESSUAL CIVIL. MORTE DA PARTE. ART. 265, I, CPC. DIREITO INTRANSMISSÍ-VEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO. ART. 267, IX, CPC. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. DESCABIMENTO. Falecendo a parte, regra é suspender-se o processo, na forma do art. 265, I, CPC. Entretanto, em se tratando de direito intransmissível, tais quais aqueles personalíssimos, solução está na extinção do processo, ut art. 267, IX, CPC. Não havendo habilitação de herdeiros, descabe fixar-se honorários de advogado em prol do extinto.

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RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70045758331. 21. Câmara Cível. Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa. Porto Alegre, 23 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 30 de novembro de 2011.

DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE MERCANTIL

43/4629 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE MERCANTIL INAUDITA ALTERA PARTE COM APURAÇÃO DE HAVERES E PARTILHA DE BENS. JULGAMENTO PROCE-DENTE DO PEDIDO, DECRETADA A DISSOLUÇÃO. O juízo “a quo”, na audiência de conciliação, rejeitou as preliminares arguidas na contestação, entre elas, a litigância de má-fé articulada pelo réu ora recorrente, sob a argumentação justamente de que o apelado nunca participou diretamente da administração, inexistindo relação entre as partes. Os argumentos articulados no apelo questionam tão somente a participação do recorrido na sociedade, tais irresignações não merecem prosperar diante da ocorrência da preclusão. Além do mais, ainda que assim não fosse, consta dos autos instrumento particular de constituição da sociedade, no qual se observa que apelado, possui 50% do capital integralizado, e estipulado que caberá aos sócios componentes da sociedade (autor e réu) a administração financeira da sociedade, e o bem desenvolvimento da empresa. Recurso co-nhecido e improvido, à unanimidade. PARÁ. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 20113000953-8 (102252). 4. Câmara Cível Isolada. Relator: Ricardo Ferreira Nunes. Belém, 21 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 25 de novembro de 2011.

DIVÓRCIO

43/4630 - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIVÓRCIO. PARTILHA DE BENS. REVELIA. EFEITOS. APRECIAÇÃO DAS PROVAS. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. INSUFICIÊNCIA DE ELE-MENTOS PARA DEMONSTRAR A POSSE OU A PROPRIEDADE DE BEM IMÓVEL. SENTENÇA MANTIDA. 1 - É cabível a aplicação da revelia e de seus efeitos na ação de divórcio quanto ao pedido cumulado de partilha de bens, porquanto este é direito de natureza patrimonial e disponível. 2 - A aplicação dos efeitos da revelia não conduz, por si só, à procedência do pedido deduzido na inicial, pois, o sistema pátrio adotou o princípio do livre convencimento motivado para a apreciação de provas (art. 131 do CPC). 3 - Inexistindo prova suficiente para demonstrar a aquisição da propriedade ou o exercício da posse sobre bem imóvel durante a vigência do regime de casamento entre os cônjuges, impõe-se a improcedência do pedido de partilha. Apelação Cível desprovida. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. Processo nº 2010.07.1.017997-7 (550743). 5. Turma Cível. Relator: Ângelo Passareli. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 30 de novembro de 2011.

EMBARGOS à ARREMATAÇÃO

43/4631 - PROCESSO CIVIL - EMBARGOS À ARREMATAÇÃO - ILEGITIMIDADE ATIVA DE TERCEIRO INTERESSADO - ARTIGO 746 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - VERBA HONO-RÁRIA MAJORADA - RECURSO ADESIVO PROVIDO E APELAÇÃO DA PARTE EMBARGANTE PREJUDICADO. 1. Os embargos à arrematação tem seu cabimento restrito, nos termos do art. 746 do Código de Processo Civil, só se reconhecendo a legitimidade, em regra, ao próprio devedor, que segundo a redação atual do dispositivo legal restringe ao “executado”. 2. Não são admissíveis embargos à arrematação opostos por terceiros, tal como o embargante, que é credor da empresa

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executada e do sócio em virtude de rescisão de contrato de prestação de serviços advocatícios 3. Majoração dos honorários advocatícios para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em favor dos requeri-dos, nos termos do preconizado pelo art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, tendo em vista que foi atribuído à causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), que deverão ser corrigidos monetariamente a partir desta data conforme os critérios da Resolução 134/CJF de 21.12.2010. 4. Recurso adesivo provido para extinguir o feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil e apelo da parte embargante prejudicado. BRASIL. Tribunal Re-gional Federal (3. Região). Apelação Cível nº 0001125-94.2008.4.03.6113-SP. 1. Turma. Relator: Johonsom Di Salvo. Decisão unânime. São Paulo, 8 de novembro de 2011. Diário Eletrônico de 18 de novembro de 2011.

EXECUÇÃO DE ALIMENTOS

43/4632 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. LEI Nº 11.232/05. APLICAÇÃO DO RITO PREVISTO NO ART. 733 DO CPC. I - Tratando-se a execução de créditos advindos do inadimplemento da pensão alimentícia e, tendo o credor optado pelo rito coercitivo (pena de prisão), processa-se a execução observando-se o disposto no art. 733 do Código de Processo Civil, e não no art. 475-J do referido Código, que trata do cumprimento de sentença. II - A execução de sentença que condena ao pagamento de prestação alimentícia não foi alterada pela Lei nº 11.232/2005, de modo que o procedimento a ser observado é aquele previsto no Livro II, Título II, Capítulo IV, do CPC (arts. 732 ou 733), que deve se dar por meio de processo autônomo, tendo em vista a necessidade de citação do devedor, inclusive com oposição de eventuais embargos. Tal execução de alimentos continua submetida ao regime antigo, inalterado pela sistemática atual. Agravo conhecido e provido parcialmente. GOIÁS. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 288860-84.2011.8.09.0000 (201192888600). 1. Câmara Cível. Relator: Luiz Eduardo de Sousa. Decisão unânime. Goiânia, 4 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 25 de novembro de 2011.

EXECUÇÃO FISCAL

43/4633 - EXECUÇÃO FISCAL. REMISSÃO DE DÉBITO EXEQUENDO. ART. 14 DA LEI Nº 11.941/2009. DÉBITOS DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. INAPLICABILI-DADE. 1. Hipótese em que o MM. Juiz Singular, em face da remissão prevista no art. 14, da Lei nº 11.941/2009, extinguiu o presente feito, com fundamento nos artigos 269, V, 598, 794, II e 795, todos do CPC. 2. Contudo, os débitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) não se subsumem ao disposto no art. 14 da Medida Provisória nº 449/09, convertida na Lei nº 11.941/2009, por não se tratar de débitos com a Fazenda Nacional. 3. Precedente desta egrégia Primeira Turma. 4. Apelação provida. BRASIL. Tribunal Regional Federal (5. Região). Apelação Cível nº 530325-CE (0002188-23.1989.4.05.8100). 1. Turma. Relator: Francisco Cavalcanti. Decisão unânime. Recife, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 18 de novembro de 2011.

43/4634 - APELAÇÃO CÍVEL - EXECUÇÃO FISCAL - REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO PARA SÓCIO-GERENTE - PRESCRIÇÃO CONFIGURADA - RECURSO IMPROVIDO. I - O redi-recionamento da execução contra o sócio deve ocorrer no prazo de 05 (cinco) anos da citação da pessoa jurídica, de modo a não tornar imprescritível a dívida fiscal. Precedentes do STJ; II - No

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caso em comento, resta patente a prescrição do crédito, uma vez que da data da citação da pessoa jurídica (11.06.2002) e o pedido de redirecionamento para o sócio-gerente (19.10.2009) transcorreu lapso temporal superior a 7 (sete) anos. III - Recurso improvido. SERGIPE. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2011215712 (15938/2011). 2. Câmara Cível. Relator: Cezário Siqueira Neto. Decisão unânime. Diário da Justiça de 24 de novembro de 2011.

EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS

43/4635 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DECISÃO AGRAVADA QUE REDUZIU O VALOR DA MULTA POR DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO PARA O PATAMAR DE R$ 1.000,00 (UM MIL REAIS). PRETENSÃO DE RESTABE-LECIMENTO DO VALOR ORIGINAL DA MULTA OU DE MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO NA DECISÃO AGRAVADA PARA PATAMAR MAIS RAZOÁVEL. IMPOSSIBILIDADE. Entendimento do STJ e desta egrégia corte de justiça no sentido da não admissão da cobrança de astreintes em ações de exibição de documento. Exclusão total do valor das astreintes que não se opera em virtude da impossibilidade de reformatio in pejus. Conhecimento e improvimento do recurso. Manutenção da decisão recorrida. RIO GRANDE DO NORTE. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento com Suspensividade nº 2011.014107-0. 3. Câmara Cível. Relator: Vivaldo Pinheiro. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

43/4636 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. EXTINÇÃO DO FEITO. Ausente nos autos a comprovação de que tenha a parte autora requerido, administrativamente, os documentos pretendidos. Não tendo o autor com-provado a recusa extrajudicial da ré na exibição do documento pleiteado, a hipótese é de extinção do feito por falta de interesse processual. Ausência de pretensão resistida. Carência de ação, por ilegitimidade ativa, em face da falta de interesse de agir. Sentença de extinção do feito mantida. Apelo desprovido, por maioria. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70044700250. 17. Câmara Cível. Relator: Liege Puricelli Pires. Porto Alegre, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 24 de novembro de 2011.

EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO

43/4637 - APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. PRETEN-SÃO DE MANUTENÇÃO DO CONDOMÍNIO COM RELAÇÃO A ALGUNS DOS COPROPRIETÁRIOS E EXCLUSÃO DE OUTROS. INADEQUAÇÃO DO PROCEDIMENTO. CARÊNCIA DE AÇÃO. A ação de extinção de condomínio tem como objetivo a alienação do bem em condomínio, quando houver desavenças entre os coproprietários, com divisão do produto da venda, autorizado o exer-cício do direito de preferência por um dos condôminos. Não é possível, contudo, através deste procedimento, obrigar um ou alguns dos condôminos a vender sua cota a outro, sem a extinção integral do condomínio. As confusas razões da inicial e do recurso revelam ser esta a pretensão do autor, motivo pelo qual vai confirmada a sentença de extinção do processo. Negaram provimento. Unânime. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70037654084. 18. Câmara Cível. Relator: Nelson José Gonzaga. Porto Alegre, 24 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 29 de novembro de 2011.

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152 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

hIBRIDISMO

43/4638 - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADO-RIA. RMI. HIBRIDISMO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVI-MENTO. 1. Este sodalício pacificou entendimento no sentido de vedar a ocorrência de hibridismo, caracterizado pela utilização de regras do regime previdenciário anterior com as normas do vigente. 2. Mantida a sucumbência recíproca. 3. Agravo regimental ao qual se nega provimento. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1183622 (2010/0039100-8), do Estado do Paraná. 6. Turma. Relator: Maria Thereza de Assis Moura. Decisão unânime. Brasília, DF, 22 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 30 de novembro de 2011.

hONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS

43/4639 - PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. RATEIO ENTRE ADVOGADOS QUE ATUARAM NO PROCESSO. 1. Pretensão dos advogados ora agravantes de redução, de 25% para 5%, do percentual de honorários sucumbenciais destinado na decisão a quo ao causídico ora agravado, por entenderem que o trabalho desenvolvido por este “foi por demais singelo”, apenas representando “algumas pessoas com a pretensão de habilitá-las na lide após tramitada toda a matéria”. 2. Considerando que os três advogados ora agravantes pertencem ao mesmo escritório e sempre agiram conjuntamente no feito, é razoável o percentual de 75% da verba sucumbencial que lhes foi destinado no decisum, cabendo ao causídico ora agravado os 25% restantes, em função, justamente, de sua menor participação no processo. Observe-se que, nos termos em que distribuído o rateio, ao escritório coube uma parte três vezes maior do que a destinada ao outro advogado, aquinhoando proporcionalmente os trabalhos realizados pela sociedade e pelo causídico constituí-do no final da demanda. 3. Agravo de instrumento ao qual se nega provimento. BRASIL. Tribunal Regional Federal (5. Região). Agravo de Instrumento nº 105664-RN (0004420-23.2010.4.05.0000). 1. Turma. Relator: Francisco Cavalcanti. Decisão unânime. Recife, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 18 de novembro de 2011.

hONORÁRIOS PERICIAIS

43/4640 - PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS PERICIAIS. AJG. Sendo a parte autora do processo originário beneficiária da gratuidade de justiça, a fixação dos honorários periciais deve observar a Resolução nº 541, de 18.01.2007, do Conselho da Justiça Federal (Dispõe sobre os procedi-mentos relativos aos pagamentos de honorários de advogados dativos e de peritos, em casos de Assistência Judiciária Gratuita, no âmbito da jurisdição delegada, e dá outras providências), que estabeleceu na Tabela II do Anexo II, os valores mínimo e máximo: outras áreas, mínimo de R$ 50,00 e máximo de R$ 200,00. BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Apelação Cível nº 0014919-35.2011.404.9999-SC. 5. Turma. Relator: Cláudia Cristina Cristofani. Decisão unânime. Porto Alegre, 8 de novembro de 2011. Diário Eletrônico de 24 de novembro de 2011.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

43/4641 - PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IM-PROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. DISPENSA IRREGULAR DE LICITAÇÃO E NÃO

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153JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Cível

REALIZAÇÃO DE OBRAS OBJETO DE CONVÊNIO FEDERAL. CONDENAÇÃO. MULTA CIVIL. MAJORAÇÃO. DESCABIMENTO. BENEFICIÁRIA. UNIÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MA-NUTENÇÃO. 1. Razoável a multa civil fixada pela juíza a quo, que levou em conta a extensão do dano causado, bem como o proveito patrimonial obtido pelo agente. 2. É a União a beneficiária do valor a ser pago a título de multa civil, posto que o recurso irregularmente aplicado era de origem federal. 3. Honorários advocatícios corretamente fixados, observando a magistrada os parâme-tros fixados pelo art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil. BRASIL. Tribunal Regional Federal (1. Região). Apelação Cível nº 0000939-09.2001.4.01.4000-PI. 3. Turma. Relator: Tourinho Neto. Decisão unânime. Brasília, 7 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 18 de novembro de 2011.

43/4642 - PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPRO-BIDADE ADMINISTRATIVA. INDÍCIOS DE PRÁTICA DE ATOS DANOSOS. INDISPONIBILIDADE DE BENS MÓVEIS E IMÓVEIS. BLOQUEIO PELO SISTEMA BACEN JUD. POSSIBILIDADE. Desbloqueio de valores que ultrapassem o montante devido por cada requerido. Precedentes. Agravo a que se dá parcial provimento. BRASIL. Tribunal Regional Federal (3. Região). Agravo de Instrumento nº 0027824-94.2009.4.03.0000-SP. 4. Turma. Relator: Salette Nascimento. Decisão unânime. São Paulo, 3 de novembro de 2011. Diário Eletrônico de 17 de novembro de 2011.

INTERDITO PROIBITÓRIO

43/4643 - INTERDITO PROIBITÓRIO. OCUPAÇÃO IRREGULAR. ÁREA PÚBLICA. PROTEÇÃO POSSESSÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DEMOLITÓRIA. PODER DE POLÍCIA. I - Inadmis-sível o pedido de proteção possessória formulado por quem simplesmente usa área pública em circunstâncias de mera ocupação desautorizada. II - Nos termos do art. 1.208 do CC, não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância. III - Demonstrada a manifesta impossibilidade jurí-dica do pedido, é correta a extinção do processo sem resolução de mérito. IV - Apelação improvida. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. Processo nº 2011.01.1.117717-7 (551288). 6. Turma Cível. Relator: Vera Andrighi. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

INVENTÁRIO

43/4644 - INVENTÁRIO. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. INÉRCIA DO INVENTARIANTE. ABANDONO DA CAUSA. EXTINÇÃO DO FEITO. META II. INTIMAÇÃO PESSOAL DO INVENTARIANTE E DA DEFENSORIA PÚBLICA. NECESSIDADE. INTERESSE PÚBLICO. Processo de inventário julgado extinto com fulcro no art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil e também no programa deno-minado “Meta 2”, em razão de paralisação por inércia da inventariante. Descabimento. Trata-se de questão que já foi amplamente superada pelo entendimento prevalecente neste Tribunal de Justiça, segundo o qual é descabida a extinção de feitos quando se trate de inventários ou de arrolamentos, procedimentos esses de jurisdição voluntária que, ademais, envolvem interesse público, cumprindo destacar que, no caso concreto, restou constatada a presença de bens a partilhar e a existência de companheira do de cujus e de herdeiros, sendo ainda patente, em qualquer caso, o interesse público na ultimação do feito, em especial no que respeitante ao recolhimento dos impostos devidos. Inobservância dos arts. 267, inciso III e § 1º e 995, inciso II, ambos do Código de Processo Civil. Interesse evidente dos herdeiros e da própria Fazenda Pública. A extinção não pode ser considerada aplicável, sequer adequada a casos como o de que ora se cuida. Com efeito, eventual inércia da

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inventariante no cumprimento dos deveres que lhe são inerentes, bem como no atendimento das determinações do Juízo, caracteriza má gestão, o que de fato possibilita sua remoção nos termos do art. 995, inciso II, do Código de Processo Civil, não ensejando, porém, a extinção do feito. Por fim, consigne-se que a inventariante é patrocinada pela Defensoria Pública, o que atrai as normas processuais contidas nos arts. 5º, § 5º, da Lei 1.060/50 e 128, inciso I, da Lei Complementar 80/94, com a redação dada pela Lei Complementar 132/09, eis que aquela instituição goza de prerrogativa de intimação pessoal de todos os atos processuais. Precedentes do STJ e do TJERJ. Sentença anulada. Prosseguimento do feito. Recurso a que se dá provimento. RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0002815-61.2000.8.19.0067. 3. Câmara Cível. Relator: Mário Assis Gonçalves. Rio de Janeiro, 13 de outubro de 2011.

LEILÃO

43/4645 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. LEILÃO. SOBRESTAMENTO. INDEFERIMENTO. Não sendo recente a constrição, não se justifica o adiamento do leilão ou a postergação do ato de depósito, já tendo a parte agravada tempo suficiente para adequar-se à restrição judicial imposta. Agravo improvido. BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Agravo de Instrumento nº 0029703-75.2010.404.0000-RS. 1. Turma. Relator: Maria de Fátima Freitas Labarrère. Decisão unânime. Porto Alegre, 23 de novembro de 2011. Diário Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

MORTE PRESUMIDA

43/4646 - PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE MORTE PRESUMIDA DE AUSEN-TE - AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL - SENTENÇA MANTIDA. Cumprido o requisito temporal do art. 37 do CC/02, e desde que haja provocação da manifestação judicial por qualquer interessado, a sucessão provisória será convertida em sucessão definitiva por meio de sentença, oportunidade na qual o juiz também declarará a morte presumida do ausente, conforme o art. 6º do CC/02, e ordenará o respectivo registro público. Por conseguinte, após o trânsito em julgado da sentença que autoriza a abertura da sucessão definitiva, o ausente é considerado morto para todos os fins legais, resultando, por conseguinte, na inutilidade e inadequação da ação ora proposta. Recurso não provido. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. Processo nº 2011.01.1.103799-4 (551143). 3. Turma Cível. Relator: Humberto Adjuto Ulhôa. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 29 de novembro de 2011.

PENhORA

43/4647 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA - REGISTRO JUNTO À MATRÍCULA - DILIGÊNCIA DO OFICIAL DE JUSTIÇA. Na execução fiscal, o registro da penhora de imóvel no Cartório próprio deve ser providenciado pelo próprio Oficial de Justiça, que, no cumpri-mento do mandado, realiza a constrição, visto que o despacho que determina a citação do devedor implica ordem automática do respectivo registro. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento Cível nº 0652757-02.2011.8.13.0000. 7. Câmara Cível. Relator: Wander Marotta. De-cisão unânime. Belo Horizonte, 8 de novembro de 2011. Publicado em 25 de novembro de 2011.

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PENhORA ON-LINE

43/4648 - AÇÃO DE EXECUÇÃO. PENHORA ON-LINE. PEDIDO DE AVALIAÇÃO DE BEM PE-NHORADO. INAPLICABILIDADE DO ART. 659 DO CPC. FALTA DE REQUERIMENTO EXPRES-SO. CARÁTER RELATIVO DE PREFERÊNCIA. SÚMULA 417 DO STJ. DESCONSIDERAÇÃO DE PERSONALIDADE JURÍDICA. MEDIDA EXCEPCIONAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO CABAL DE CONFUSÃO PATRIMONIAL. 1. A constrição de ativos financeiros da executada por meio do Sistema Bacen Jud depende de requerimento expresso da exequente, não podendo ser determinada ex officio pelo magistrado. Inteligência do artigo 655-A do Código de Processo Civil 2. A preferência dos valores depositados em instituição financeira não significa caráter absoluto de ordem de nomeação, como já pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça através da edição da Súmula 417. 3. A desconsideração medida excepcional e não pode ser embasada em mera presunção de abuso da personalidade jurídica. PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Agravo Regimental nº 0001058-10.2011.8.17.0000. 4. Câmara Cível. Relator: Francisco Manoel Tenório dos Santos. Decisão unânime. Recife, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 22 de novembro de 2011.

PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL

43/4649 - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - ESPÓLIO - AUSÊNCIA DE ABERTURA INVENTÁRIO - ILEGITIMIDADE PASSIVA - PROSSEGUIMENTO QUANTO AOS DEMAIS RÉUS - DECISÃO INTERLOCUTÓRIA - RECURSO CABÍVEL - AGRAVO - INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO - ERRO GROSSEIRO - NÃO CONHECIMENTO. A decisão que reconhece a ilegitimidade de um dos litisconsortes passivos, extinguindo o feito com relação a este, mas determina o prosseguimento do processo com relação aos demais réus, possui natureza de decisão interlocutória, uma vez que não põe fim, por completo, à relação processual. Tratando-se de erro grosseiro a interposição de apelação no caso em comento, segundo o entendimento predominante no Superior Tribunal de Justiça, incabível se mostra a aplicação do princípio da fungibilidade. Recurso não conhecido. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 1385092-98.2007.8.13.0056. 14. Câmara Cível. Relator: Estevão Lucchesi. Decisão unânime. Belo Horizonte, 10 de novembro de 2011. Publicado em 29 de novembro de 2011.

PROMESSA DE COMPRA E VENDA

43/4650 - AGRAVO LEGAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL. GARANTIA HIPOTECÁRIA. INEFICÁCIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 308 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. LIBERAÇÃO DO GRAVAME. RECURSO IMPROVIDO. 1. Ineficaz perante os adquirentes do imóvel a garantia hipotecária que se deu em data posterior a conclusão da obra e à celebração do compromisso de compra e venda. 2. Nesse sentido enuncia a Súmula 308 do Superior Tribunal: “A hipoteca firmada entre construtora e agente financeiro anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”. 3. Manutenção da decisão. Recurso Improvido. PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Agravo nº 0018819-54.2011.8.17.0000. 4. Câmara Cível. Relator: Jones Figueirêdo. Decisão unâ-nime. Recife, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 23 de novembro de 2011.

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RECLAMAÇÃO NOS JUIzADOS ESPECIAIS

43/4651 - RECLAMAÇÃO. RESOLUÇÃO/STJ Nº 12/2009. JUIZADOS ESPECIAIS. REQUISITOS. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA. DEFINIÇÃO. 1. Para que seja admissível o manejo da Re-clamação disciplinada pela Res./STJ nº 12/2009 é necessário que se demonstre a contrariedade à jurisprudência consolidada desta Corte quanto à matéria, entendendo-se por jurisprudência consolidada: (I) precedentes exarados no julgamento de Recursos Especiais em Controvérsias Repetitivas (art. 543-C do CPC); ou (II) enunciados de Súmula da jurisprudência desta Corte. 2. Não se admite, com isso, a propositura de reclamações com base apenas em precedentes exarados no julgamento de recursos especiais. 3. Para que seja admissível a reclamação é necessário também que a divergência se dê quanto a regras de direito material, não se admitindo a reclamação que discuta regras de processo civil, à medida que o processo, nos Juizados Especiais, orienta-se pelos peculiares critérios da Lei 9.099/95. 4. As hipóteses de teratologia deverão ser apreciadas em cada situação concreta. 5. Reclamação não conhecida. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Reclamação nº 4858 (2010/0180698-3), do Estado do Rio Grande do Sul. 2. Seção. Relator: Paulo de Tarso Sanseverino. Decisão unânime. Brasília, DF, 23 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 30 de novembro de 2011.

REMOÇÃO DE SERVIDOR

43/4652 - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SER-VIDOR PÚBLICO. REMOÇÃO. DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO. Ausência de ilegalidade ou abuso. Precedentes. Recurso ordinário em mandado de segurança ao qual se nega provimento. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 27.167, do Distrito Federal. 1. Turma. Relator: Cármen Lúcia. Decisão unânime. Brasília, DF, 25 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

43/4653 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. REMOÇÃO DE SERVIDOR. MOTIVAÇÃO DO ATO. NECESSIDADE. RECURSO IMPROVIDO. I - Os servidores municipais não possuem o atributo da inamovibilidade em seu cargo. Todavia, ainda que a remoção do servidor esteja sujeita ao poder discricionário da Administração Pública, é necessário que o Administrador dê motivação ao seu ato. II - Recurso conhecido e improvido. PARÁ. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 20093014355-4 (102291). 1. Câmara Cível Isolada. Relator: Gleide Pereira de Moura. Belém, 21 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL

43/4654 - REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. REGULARIDADE. DOCUMENTOS JUNTADOS AOS AUTOS QUE SÃO SUFICIENTES PARA ATESTAR O VÍNCULO DE REPRESENTAÇÃO AFIRMADO NA PETIÇÃO INICIAL. Caso, ademais, em que todos os termos de responsabilidade foram dirigidos à representante da autora. Cobrança Sobre-estadia de contêiner. Devolução dos contêineres fora do prazo estipulado. Responsabilidade da ré pela sobre-estadia dos contêineres evidenciada. Demonstração do atraso na devolução do contêiner que é suficiente para a cobrança da “demurrage”. Prova da culpa do devedor que é desnecessária. Fato de se tratar de contrato de adesão que, por si só, não tem o condão de ocasionar a abusividade das cláusulas contratadas.

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157JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Cível

Caso em que se cuida de contrato comercial, não de relação de consumo. Cobrança Sobre-estadia de contêiner. Pagamento que deve ser efetuado em moeda nacional. Conversão da obrigação para moeda nacional que deve ser feita pela cotação do dólar no dia do efetivo pagamento, não no dia do vencimento da obrigação, como pretendido pela ré. Precedentes do STJ. Inexistência, porém, de recurso da autora. Prevalência da data do ajuizamento da ação, como estabelecido na senten-ça. Apelo desprovido. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 9053771-27.2006.8.26.0000. 23. Câmara de Direito Privado. Relator: José Marcos Marrone. São Paulo, 26 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 17 de novembro de 2011.

RESPONSABILIDADE CIVIL

43/4655 - ADMINISTRATIVO - MORTE DE PRESO SOB A CUSTÓDIA DO ESTADO - CONDUTA OMISSIVA - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - PRECEDENTES DO EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - COMPROVAÇÃO DO FATO ADMINISTRATIVO (ASFIXIA MECÂNICA/ENFORCAMENTO) DO DANO (MORTE DA VÍTIMA) E DO NEXO CAUSAL (LIAME QUE UNE A MORTE DA VÍTIMA À FALTA DE SEGURANÇA NO PRESÍDIO) - DANO MORAL ARBITRADO EM VALOR EXCESSIVO - MINORAÇÃO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 - A obrigação de indenizar imputada à entidade estatal, por força do art. 5º, XLIX, da Constituição Federal, assegura ao preso a sua integridade física. A desatenção em dar cumprimento ao preceito constitucional su-pracitado, que se identifica através de uma conduta negligente e omissiva do Estado na prestação do serviço de segurança dentro do estabelecimento prisional, acarreta, comprovado o dano, na responsabilidade do ente estatal; Sendo irrelevante se a morte do preso se deu por suicídio ou não, posto que configurada a culpa in vigilando. Ainda mais se o estado mental do preso inspirava cuidados de assistência médico-hospitalar psicológico. 2 - No que se refere à morte de preso sob custódia do Estado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a responsabilidade civil do ente público é objetiva. 3 - Precedentes jurisprudenciais do STJ prestigiando a fixação da responsabilidade civil quando presente o panorama fático e jurídico acima descrito. 4 - Minoração do valor arbitrado em consonância com a jurisprudência dominante. 5 - Recurso parcialmente provido. RORAIMA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0010.08.911852-4. Câmara Única da Turma Cível. Relator convocado: Elaine Bianchi. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 11 de novembro de 2011.

RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL

43/4656 - PROCESSUAL CIVIL - APELAÇÃO - AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO PÚBLI-CO - PRETENSÃO DE MODIFICAÇÃO DO NOME DA GENITORA - Circunstância superveniente - Casamento - Impossibilidade - Inteligência do art. 54, da Lei 6.015/73 - Princípio da verdade real - Recurso não provido - Sentença confirmada. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0013664-93.2011.8.13.0287. 5. Câmara Cível. Relator: Barros Levenhagen. Decisão unânime. Belo Horizonte, 3 de novembro de 2011. Publicado em 24 de novembro de 2011.

SEGURO OBRIGATÓRIO

43/4657 - PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA C/C REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. SEGURO OBRIGATÓRIO DE DANOS PESSOAIS CAUSADOS

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POR VEÍCULOS AUTOMOTORES (DPVAT). Invalidez permanente. Acidente ocorrido sob a vigência da Lei 11.482/07. Pagamento devido em seu valor máximo. Precedentes da corte. Sentença man-tida. Conhecimento e desprovimento do recurso. RIO GRANDE DO NORTE. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2011.011253-6. 3. Câmara Cível. Relator: Saraiva Sobrinho. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

SEGURO RESIDENCIAL

43/4658 - PRETENSÃO DE COBRANÇA - SEGURO RESIDENCIAL - OCORRÊNCIA DO SINISTRO - VAZAMENTO DE ÁGUA - INDENIZAÇÃO - PREVISÃO EXPRESSA NA APÓLICE - RECURSO ADESIVO - MATÉRIA NÃO CONTRAPOSTA - NÃO CONHECIMENTO. O contrato eleito entre as partes confere contorno à apólice, ficando a seguradora obrigada a arcar com os prejuízos experimentados pelo segurado em virtude da ocorrência do sinistro previsto no contrato firmado entre as partes. Não cabe recurso adesivo quando não se tratar de matéria contraposta ao recurso principal. Confirmar a decisão. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 7110001-09.2009.8.13.0024. 11. Câmara Cível. Relator: Fernando Caldeira Brant. Decisão unânime. Belo Horizonte, 16 de novembro de 2011. Publicado em 30 de novembro de 2011.

SFh

43/4659 - AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO DE MÚTUO VINCULADO AO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. Decisão monocrática provendo em parte o recurso especial do mutuário. Insurgência da instituição financeira. Incidência do Código de Defesa do Con-sumidor aos contratos regidos pelo SFH. Reconhecimento da abusividade decorrente da cobrança indevida de encargos contratuais. Compensação de valores e repetição do indébito. Cabimento. Desnecessidade de prova do erro no pagamento. Princípio da vedação ao enriquecimento ilícito (art. 42 do CDC). Agravo desprovido. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1021350 (2008/0002651-1), do Estado do Rio Grande do Sul. 4. Turma. Relator: Marco Buzzi. Decisão unânime. Brasília, DF, 22 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 29 de novembro de 2011.

SUCESSÃO

43/4660 - CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. BEM DEIXADO EM HERANÇA. PARTILHA AINDA NÃO REALIZADA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA. REJEITADA À UNANIMIDADE. MÉRITO. REIVINDICATÓRIA DE COERDEIRO CONTRA COERDEIRO. IMPOS-SIBILIDADE. Aberta a sucessão, instaura-se condomínio pro indiviso. Não se pode imitir na posse um condômino em desfavor de outro condômino. Recursos de apelação parcialmente providos. Sentença reformada para julgar improcedente a demanda reivindicatória. Decisão unânime. PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0001093-14.2007.8.17.1130. 6. Câmara Cível. Relator: Eduardo Augusto Paurá Peres. Decisão unânime. Recife, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 18 de novembro de 2011.

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159JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Cível

TETO DE BENEFÍCIOS DO RGPS

43/4661 - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ALTERAÇÃO NO TETO DE BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA E REFLEXOS NAQUELES CONCEDIDOS ANTERIORMENTE À EDIÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/1998. 1. A matéria em discus-são nestes autos teve a repercussão geral reconhecida por esta Suprema Corte, a qual, ao apreciar o mérito da questão, entendeu inexistir a apontada violação das normas constitucionais na aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional nº 20/98 a benefícios previdenciários limitados ao teto do regime geral de previdência estabelecido antes da sua vigência. 2. Orientação, destarte, que deve ser seguida em todos os processos que tratam do mesmo tema. 3. Agravo regimental não provido. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 499.103, do Estado de Santa Catarina. 1. Turma. Relator: Dias Toffoli. Decisão unânime. Brasília, DF, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

UNIÃO ESTÁVEL

43/4662 - AÇÃO DECLARATÓRIA - RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL - INTERESSE DE AGIR - EXISTÊNCIA - INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO - APRECIAÇÃO DO MÉRITO - IMPOS-SIBILIDADE - SENTENÇA CASSADA. 1 - Reconhece-se o interesse de agir, em ação declaratória que visa o reconhecimento da união estável, se um dos companheiros é estrangeiro e necessita de visto permanência no país para residir e trabalhar no território nacional, sendo a decisão judicial que reconhece a referida relação jurídica, um dos meios para concessão da referida licença, a teor do artigo 1º, inciso II da Resolução Administrativa 05/2003 do Conselho Nacional de Imigração. 2 - O artigo 1.725 do Código Civil prevê a possibilidade de regulamentação da união estável entre um casal através de contrato ou escritura pública, mas não a sua obrigatoriedade. 3 - Deve o Judiciário apreciar o pedido da parte, comprovada a sua necessidade da tutela jurisdicional buscada, sob pena de infringir o princípio de inafastabilidade da jurisdição. 4 - O reconhecimento da união estável exige comprovação de requisitos legais, que não completamente delineados no feito, impede que se aplique o art. 515, § 3º do CPC. 5 - Recurso conhecido e parcialmente provido. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. Processo nº 2011.01.1.124934-7 (550908). 5. Turma Cível. Relator: Luciano Moreira Vasconcellos. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

43/4663 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. BLOQUEIO DE BENS. INTERESSE DE TERCEIROS. LEGITIMIDADE. ALIMENTOS. BINÔMIO NECESSIDADE-POSSIBILIDADE. REDUÇÃO. I - Falece legitimidade ao agravante para defender bens os quais se encontram em nome de terceiros, uma vez que o ordenamento jurídico, através do art. 6º do CPC, só permite a substituição processual nos casos expressamente previstos em lei. II - A fixação dos alimentos deve atender ao binômio necessidade-possibilidade, de modo que a alimentanda não receba mais do que necessite e o alimentante não preste mais do que possui capacidade, de maneira que se afigurando desproporcional, em virtude de gastos pessoais, por parte do recorrente, enquanto que a agravada possui aptidão para laborar em prol de si mesma, razoável se mostra a diminuição do percentual inicialmente fixado. Agravo parcialmente conhecido e, nesta parte, parcialmente provido. GOIÁS. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 327509-21.2011.8.09.0000 (201193275091). 1. Câmara Cível. Relator: Leobino Valente Chaves. Decisão unânime. Goiânia, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 21 de novembro de 2011.

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160 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

43/4664 - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁ-VEL C/C PARTILHA DE BENS - COMUNICABILIDADE DE DÍVIDAS CONTRAÍDAS - POSSIBILIDA-DE - DOCUMENTOS JUNTADOS NA VIA RECURSAL - NÃO ANALISADOS - BEM PARTICULAR - NÃO OCORRÊNCIA - VENDA DO PATRIMÔNIO DURANTE A UNIÃO - NÃO COMPROVADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. As dívidas só se comunicam quando adquiridas na constância da união estável e se contraídas para serem utilizadas em favor do interesse do casal. Os documentos juntados em sede de apelação não devem ser analisados, salvo se “novos” ou se a parte provar que deixou de juntá-los por motivo de força maior, o que não é o caso dos autos. Não se considera como bem particular aquele cujas parcelas do financiamento foram pagas com a contribuição da convivente e durante a união estável. MATO GROSSO DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível - Ordinário nº 2011.024557-4/0000-00. 3. Turma Cível. Relator: Fernando Mauro Moreira Marinho. Decisão por maioria. Diário da Justiça de 22 de novembro de 2011.

43/4665 - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DIREITO DE FAMÍLIA - DIREITO PREVIDENCIÁRIO - APELAÇÃO - REEXAME NECESSÁRIO - CONHECIMENTO DE OFÍCIO - PEDIDO DE RECO-NHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL, CUMULADO COM PEDIDO DE BENEFÍCIOS PREVIDEN-CIÁRIOS - INVIABILIDADE DA CUMULAÇÃO - ARTIGO 292 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. Não cabe cumulação de pedidos dirigidos contra réus diferentes, em relação aos quais o juízo para deles conhecer não é o mesmo, nos termos do artigo 292 do Código de Processo Civil. A Vara especializada de Família não tem competência para conhecer do pedido de reconhecimento de direito a benefício previdenciário, baseado em alegada união estável mantida com um segurado do IPSM. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 7463400-74.2009.8.13.0024. 4. Câmara Cível. Relator: Moreira Diniz. Decisão unânime. Belo Horizonte, 17 de novembro de 2011. Publicado em 28 de novembro de 2011.

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EMENTÁRIO PENAL

CERTIDÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS

43/4666 - CONSTITUCIONAL. PROCESSO PENAL. CERTIDÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS. POSSIBILIDADE DE REQUISIÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEI COMPLE-MENTAR Nº 75/93. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA NO MS 102622. SEGURANÇA DENEGADA. 1. Mandado de segurança contra decisão em que o magistrado de origem, ao receber a denúncia ofertada contra acusados incursos nas penas dos crimes tipificados nos artigos 89 e 90 da Lei 8.666/1993, restou por indeferir a realização das diligências requeridas, dentre as quais, as de expedição de ofícios aos órgãos públicos competentes a fornecer certidões de folhas de antecedentes criminais dos denunciados, bem como de outras certidões correlatas. 2. A Lei Complementar 75/93 resguarda a prerrogativa ao representante do Ministério Público, no pleno exercício de suas atribuições constitucionais, de requisitar informações e documentos, bem como o acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público. 3. A intervenção judicial se mostra necessária apenas no caso de negativa no fornecimento das certidões pelas autoridades administrativas. 4. Não configurada a ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição (Consti-tuição Federal, artigo 5º, inciso XXXV). 5. Precedentes. Entendimento consagrado em Incidente de Uniformização de Jurisprudência. (MS 102622/RN - Pleno do TRF da 5ª Região, Data: 28.04.2011). 6. Ordem de segurança denegada. BRASIL. Tribunal Regional Federal (5. Região). Mandado de Segurança nº 102554-RN (0004280-86.2010.4.05.0000). 2. Turma. Relator: Paulo Gadelha. Decisão unânime. Recife, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 18 de novembro de 2011.

COMPETÊNCIA EXTRATERRITORIAL

43/4667 - PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA. CRIME COMETIDO POR BRASILEIRO FORA DO BRASIL. APLICAÇÃO DO ART. 88 DO CPP. Se o crime foi praticado por brasileiro no estrangeiro e, posteriormente, o agente ingressou em território nacional, nos termos do art. 88 do CPP, a compe-tência é do juízo da capital do Estado. Ainda que se trate de crime não federal, da competência da Justiça Estadual, assim, também, se procede. Não é, pois, pelo fato de hoje termos a interiorização da Justiça Federal que a competência será da Vara Federal que abranja a cidade onde o réu por último tinha residência. BRASIL. Tribunal Regional Federal (1. Região). Conflito de Competência nº 0055758-13.2011.4.01.0000-MG. 2. Seção. Relator: Tourinho Neto. Decisão unânime. Brasília, 9 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 18 de novembro de 2011.

COMUTAÇÃO DE PENA

43/4668 - RECURSO DE AGRAVO. COMUTAÇÃO DE PENA. REQUISITO OBJETIVO. PREEN-CHIMENTO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 2º E 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, OS DOIS DO DECRE-TO PRESIDENCIAL Nº 7.420/2010. FALTA GRAVE COMETIDA PELO SENTENCIADO APÓS A PUBLICAÇÃO DO REFERIDO DECRETO. IRRELEVÂNCIA. REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO PROVIDO.

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a) Estabelece o parágrafo único do art. 7º, do Decreto Presidencial, que quando houver concurso com infração impeditiva, como é o caso do tráfico de entorpecentes, a pessoa condenada, para ter direito à comutação da pena do crime não impeditivo (art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/03), deverá cumprir no mínimo 2/3 da pena correspondente ao crime impeditivo do benefício. E, mais 1/3 da pena do crime não impeditivo, se reincidente. É o que se verifica no caso. b) Apenas as faltas graves praticadas pelo sentenciado nos últimos doze meses que antecederam a publicação do decreto impossibilitam a concessão da comutação da pena, sendo irrelevante a falta grave cometida em período diverso do estabelecido no decreto concessivo. Precedentes. c) Em se tratando de comutação da pena, não se pode acrescentar requisitos aos Decretos Presidenciais, sob pena de usurpação da competência atribuída ao Presidente da República (art. 84, XII, CF). PARANÁ. Tribunal de Justiça. Recurso de Agravo nº 0817301-9. 3. Câmara Criminal. Relator: Rogério Kanayama. Decisão unânime. Curitiba, 24 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

43/4669 - AGRAVO EM EXECUÇÃO - COMUTAÇÃO DE PENA - DECRETO Nº 7.420/2010 - FALTA DISCIPLINAR GRAVE COMETIDA ANTERIOR AO PERÍODO DO REFERIDO DECRETO - Falta que não interrompe o lapso temporal de 1/3 da pena para reeducando reincidente - Requisito temporal atendido - Agravo do reeducando provido. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Agravo de Execução Penal nº 0177580-37.2011.8.26.0000. 16. Câmara de Direito Criminal. Relator: Pedro Menin. São Paulo, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 17 de novembro de 2011.

CRIME AMBIENTAL

43/4670 - PROCESSO PENAL. CRIME AMBIENTAL. CONFLITO APARENTE DE NORMAS. CON-SUNÇÃO. ABSORVIDO O CRIME MEIO DE DESTRUIR FLORESTA E O PÓS-FATO IMPUNÍVEL DE IMPEDIR SUA REGENERAÇÃO. CRIME ÚNICO DE CONSTRUIR EM LOCAL NÃO EDIFICÁVEL. 1. Ocorre o conflito aparente de normas quando há a incidência de mais de uma norma repressiva numa única conduta delituosa, sendo que tais normas possuem entre si relação de hierarquia ou dependência, de forma que somente uma é aplicável. 2. O crime de destruir floresta nativa e vegeta-ção protetora de mangues dá-se como meio necessário da realização do único intento de construir casa em solo não edificável, em razão do que incide a absorção do crime-meio de destruição de vegetação pelo crime-fim de edificação proibida. 3. Dá-se tipo penal único de incidência final (art. 64 da Lei nº 9.605/98), já em tese crime uno, diferenciando-se do concurso formal, onde o crime em tese é duplo, mas ocasionalmente praticado por ação e desígnio únicos. BRASIL. Tribunal Regio-nal Federal (4. Região). Embargos Infringentes e de Nulidade nº 0010181-30.2009.404.7200-SC. 4. Seção. Relator: Néfi Cordeiro. Decisão por maioria. Porto Alegre, 10 de novembro de 2011. Diário Eletrônico de 25 de novembro de 2011.

43/4671 - PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME AMBIEN-TAL (ART. 54, § 2º, V, ART. 54, § 3º E ART. 60, AMBOS DA LEI Nº 9.605/98). SUSPENSÃO CONDI-CIONAL DO PROCESSO. REPARAÇÃO DE DANO AMBIENTAL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO. Ausência de fundamentação. Inocorrência. Preliminar de nulidade de perícia. Ausência de intimação. Acompanhamento da perícia comprovada. Nulidade relativa. Ausência de prejuízo. Não acolhimento. Extinção da punibilidade. Impossibilidade. Ausência de laudo de constatação de reparação total do dano. Conhecimento e desprovimento do recurso. RIO GRANDE DO NORTE.

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163JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Penal

Tribunal de Justiça. Recurso em Sentido Estrito nº 2011.009743-0. Câmara Criminal. Relator: Amaria Zeneide Bezerra. Diário da Justiça Eletrônico de 24 de novembro de 2011.

CRIME CONTRA A hONRA

43/4672 - PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA A HONRA. QUEIXA-CRIME. REJEIÇÃO. AUSÊNCIA DA DESCRIÇÃO DO FATO E DO DOLO ESPECÍFICO DE OFENDER A HONRA ALHEIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO: PRELIMINAR DE NULIDADE DO PRO-CESSO SUSCITADA PELA RECORRENTE. NÃO COMPARECIMENTO DO QUERELADO PARA A AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. REJEIÇÃO. REPRESENTAÇÃO POR ADVOGADO MUNIDO DE PROCURAÇÃO COM PODERES ESPECIAIS. Mérito: inexistência do mínimo de elemento pro-batório para o exercício da persecução penal. Ausência da descrição específica do fato delituoso e do dolo específico de macular honra alheia. Convocação de assembleia para comunicar aos sócios, possíveis irregularidades. Animus narrandi. Decisão mantida. Recurso desprovido. RIO GRANDE DO NORTE. Tribunal de Justiça. Recurso em Sentido Estrito nº 2011.009958-2. Câmara Criminal. Relator: Amaria Zeneide Bezerra. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 14 de novembro de 2011.

CRIME PRATICADO POR ÍNDIO

43/4673 - MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO. AÇÃO PENAL. INDÍGENA. ASSISTÊNCIA DA FUNAI. I. Índio denunciado por crime de tóxico que pede assistência da FUNAI, todavia recusada pelo Juiz ao entendimento de que por possuir documentos e viver na cidade o indígena está integrado. II. Habeas corpus, Mandado de Segurança e Apelação, concomitantes, para reformar o indeferimento de assistência e liberdade provisória, e contra a condenação respectivamente. III. Mandado de Segurança que se conhece, pois o indeferimento da assistência pleiteada pela FUNAI constitui ato administrativo para quem não é parte, dispensando a exigência de inexistência de recurso com efeito suspensivo. IV. Apuração da condição de indígena que deve observar a inteligência constitucional (art. 231, CF) e que não cabe à jurisdição criminal. V. Aferição do direito à assistência legal (art. 11-B, § 6º da Lei 9.028/95) pela autarquia fundacional que compete à Justiça Federal. VI. Recurso em mandado de segurança provido para anular o processo da ação penal desde a denúncia, bem como da sentença e do acórdão, pondo-se o réu em liberdade e remetendo-se os autos à Justiça Federal. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Mandado de Segurança nº 30675 (2009/0200796-2), do Estado do Amazonas. 5. Turma. Relator: Gilson Dipp. Decisão unânime. Brasília, DF, 22 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

DESAFORAMENTO

43/4674 - CRIMINAL. JÚRI POPULAR. PEDIDO DE DESAFORAMENTO. REQUERIMENTO DO RÉU. PARCIALIDADE DOS JURADOS. JULGAMENTO PERANTE O TRIBUNAL DO JÚRI ANTES DA APRECIAÇÃO DO PRESENTE PLEITO. PERDA DO OBJETO. DESAFORAMENTO PREJUDI-CADO. Uma vez realizado o julgamento perante o Tribunal do Júri, resta prejudicado o pedido de desaforamento em virtude da perda de seu objeto. Precedentes jurisprudenciais. PARÁ. Tribunal de Justiça. Pedido de Desaforamento nº 20113010343-9 (102048). Câmaras Criminais Reunidas. Relator: Ronaldo Marques Valle. Belém, 21 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 23 de novembro de 2011.

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164 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

DESPRONÚNCIA

43/4675 - PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PEDIDO DE DESPRONÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE COM-PROVADA E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA DEMONSTRADOS. CONFIGURAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO DE FORMA UNÍSSONA. 1. O réu somente será impronunciado quando evidente a inexistência de crime ou a ausência de indícios de autoria, em decorrência de circunstâncias demonstradas de plano e estreme de dúvidas. Estando tais requi-sitos demonstrados pelos depoimentos colhidos nos autos, qualquer incerteza resolve-se em prol da sociedade, cabendo ao corpo de jurados a solução final da polêmica acerca da tese defensiva do acusado. 2. Não provimento à unanimidade. PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Recurso em Sentido Estrito nº 0017698-88.2011.8.17.0000. 3. Câmara Criminal. Relator: Cláudio Jean Nogueira Virgínio. Recife, 17 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 25 de novembro de 2011.

DISPOSIÇÃO DE COISA ALhEIA COMO PRÓPRIA

43/4676 - PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO. DISPOSIÇÃO DE COISA ALHEIA COMO PRÓPRIA. USURA PECUNIÁRIA OU REAL. APELO DA DEFESA. ABSOLVIÇÃO INSUFICIÊNCIA DE PROVAS A EMBASAR A CONDENAÇÃO. INOCORRÊNCIA. APELO DAS ASSISTENTES DE ACUSAÇÃO. REFORMA DA PENA APLICADA. MAJORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA PENA-BASE EM OBSERVÂNCIA ÀS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS ESTABELECIDAS NO ART. 59, DO CÓDIGO PENAL. APELOS IMPROVIDOS. DE-CISÃO UNÂNIME. I - Não merece reforma, e consequente absolvição dos réus, a sentença cuja condenação guarda harmonia com as provas carreadas aos autos. II - Descabe reforma da decisão que estabelece o quantum da pena-base acima do mínimo legal devidamente fundamentada, em observância aos critérios previstos no art. 59, do Código Penal. III - Apelos a que se nega provimento. Decisão unânime. PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0000889-86.2004.8.17.0220. 3. Câmara Criminal. Relator: Alderita Ramos de Oliveira. Recife, 22 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 29 de novembro de 2011.

ESTUPRO DE VULNERÁVEL

43/4677 - APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEIS. CONDENAÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS SOMENTE EM RELAÇÃO A UMA DAS VÍTIMAS. AUSÊNCIA DE PROVAS EM RELAÇÃO ÀS DEMAIS VÍTIMAS. ABSOLVIÇÃO. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA INICIALMENTE FECHADO. LEI Nº 11.464/2007. 1. Nos crimes contra a liberdade sexual a palavra da vítima, desde que em consonância com as demais provas dos autos, possui alto valor probante, sendo suficiente para embasar a condenação. 2. Comprovado que o acusado praticou ato libidinoso com apenas uma das menores impõe-se a absolvição em relação às outras vítimas. 3. Tratando-se de crime previsto no art. 217-A do Código Penal o regime de cumprimento de pena deve ser o inicialmente fechado, nos termos do art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.072/90. 4. Apelo parcialmente provido. ACRE. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0500756-50.2010.8.01.0081 (12.098). Câmara Criminal. Relator: Pedro Ranzi. Decisão por maioria. Rio Branco, 20 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 17 de novembro de 2011.

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165JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Penal

43/4678 - PENAL. ARTIGO 214 DO CP. ATUAL ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A DO CP). DEPOIMENTOS DOS PAIS. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO. As declarações do menor, com 5 anos de idade, feitas apenas aos pais, sem que esteja corroborada por outra prova, ainda que indiciária, são insuficientes para a condenação. Assim, dá-se provimento ao recurso da defesa para absolver o réu, com fulcro no artigo 386, VII, do CPP. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. Processo nº 2008.01.1.001336-4 (549788). 1. Turma Criminal. Relator: César Loyola. Decisão por maioria. Diário da Justiça Eletrônico de 28 de novembro de 2011.

43/4679 - DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA (ART. 217-A, C/C ART. 71, AMBOS DO CP) - VÍTIMAS COM IDADE INFERIOR A 14 ANOS - IRRELEVÂNCIA DA EXISTÊNCIA OU NÃO DO CONSEN-TIMENTO DA VÍTIMA - Princípio da proteção integral da criança e do adolescente - Art. 227 da CF/88 e art. 3º da Lei nº 8.069/90 - Comprovação da materialidade delitiva e da autoria - Dosimetria da pena modificada - Majorante aplicada de forma exacerbada - Violência presumida que não se justifica a incidência do quantum disposto no parágrafo único do art. 71, do CP, mas apenas do caput do referido dispositivo legal - Apelação criminal conhecida e parcialmente provida - Unânime. SERGIPE. Tribunal de Justiça. Apelação Criminal nº 2011315748 (15852/2011). Câmara Criminal. Relator: Edson Ulisses de Melo. Diário da Justiça de 23 de novembro de 2011.

FURTO

43/4680 - APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 155, § 1º DO CÓDIGO PENAL. FURTO PRATICADO DU-RANTE O REPOUSO NOTURNO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGAÇÃO DE CONDUTA ATÍPICA DIANTE DO VALOR ÍNFIMO DA RES FURTIVA. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCABIMENTO. PROVA PLENA E INDUVIDOSA DA AUTORIA E MATERIALI-DADE DELITIVAS. CONJUNTO PROBATÓRIO BASTANTE A REFERENDAR O ENTENDIMENTO PERFILHADO PELO MAGISTRADO A QUO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. Com efeito, não merece guarida o pleito em debate, eis que o bem furtado não era de valor ínfimo, considerando--se sobretudo a importância da res furtiva para a vítima, um trabalhador rural. Ademais, o fato de a conduta delitógena ter sido perpetrada durante o repouso noturno, torna ausente o requisito outrora mencionado do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, necessário à aplicação do princípio da insignificância. Precedentes do STJ. SERGIPE. Tribunal de Justiça. Apelação Criminal nº 2011318592 (16046/2011). Câmara Criminal. Relator: Luiz Antônio Araújo Mendonça. Diário da Justiça de 25 de novembro de 2011.

INDULTO

43/4681 - AGRAVO EM EXECUÇÃO - INDULTO - DECRETO 6.706/2008 - REQUISITOS OBJETIVO E SUBJETIVO - PREENCHIMENTO - RÉU FORAGIDO - PERÍODO POSTERIOR À OBTENÇÃO DO DIREITO AO BENEFÍCIO - IRRELEVÂNCIA - CUMPRIMENTO DE METADE DA PENA - INE-XISTÊNCIA DE FALTA GRAVE - BENEFÍCIO CONCEDIDO - INDULTO - DECISÃO REFORMADA - EXTINTA A PUNIBILIDADE - AGRAVO PROVIDO. 1. Preenchidos os requisitos necessários para a obtenção do indulto referente ao Decreto nº 6.706/2008, a concessão deve ser deferida. 2. Já tendo direito ao benefício do indulto é irrelevante o fato do réu encontrar-se foragido, depois da aquisição de tal direito, uma vez que a demora em se decidir tal questão não pode prejudicar o

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direito de liberdade do réu. 3. Agravo provido. RORAIMA. Tribunal de Justiça. Agravo em Execução Penal nº 0010.10.010108-7. Câmara Única da Turma Criminal. Relator: Mauro Campello. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 19 de novembro de 2011.

LIBERDADE PROVISÓRIA

43/4682 - HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO CAUTELAR. LIBERDADE PROVISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO LEGAL DO ART. 44 DA LEI Nº 11.343/2006. DES-NECESSIDADE DA MEDIDA EXTREMA NÃO EVIDENCIADA NO CASO CONCRETO. GRAVIDADE DA CONDUTA. MODUS OPERANDI. ORDEM DENEGADA. 1. A concessão de liberdade provisória nos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes encontra óbice no art. 44 da Lei nº 11.343/06, de forma que não há falar em constrangimento ilegal na manutenção da custódia nesses casos. 2. A Lei nº 11.464/2007, que alterou o art. 2º da Lei nº 8.072/1990, não derrogou o obstáculo ao deferi-mento do benefício ora em análise, pois a Lei nº 11.343/06, legislação especial, possui dispositivo expresso no sentido da vedação da liberdade provisória aos delitos de tráfico de drogas. 3. Em síntese, tratando-se de crime hediondo, previsto na Lei nº 11.343/06, a prisão cautelar é a regra, sem qualquer nuance de ilegalidade, regra que pode ser afastada excepcionalmente pelo julgador, no caso concreto, se evidenciada situação de desnecessidade da medida extrema. 4. Na hipótese dos autos, o Juízo de primeiro grau indeferiu o pleito de liberdade não só com base na vedação prevista no art. 44 da Lei nº 11.343/06, como também na gravidade concreta da conduta praticada pelo paciente, preso cautelarmente, após cumprimento de busca e apreensão em sua residência, onde foram encontradas diversas armas, e, principalmente, drogas e produtos que são ministrados na produção de entorpecentes, evidenciado, assim, o risco à ordem pública. 5. Habeas corpus denegado. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 210907 (2011/0146061-0), do Estado do Rio Grande do Sul. 5. Turma. Relator: Marco Aurélio Bellizze. Decisão unânime. Brasília, DF, 18 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 30 de novembro de 2011.

MOEDA FALSA

43/4683 - CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. MOEDA FALSA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO. I. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da inaplicabilidade do princípio da insignificância ao delito de moeda falsa, uma vez que se trata de crime contra a fé pública. Precedentes. II. Independentemente do fato de o paciente ter sido apre-endido com apenas uma nota supostamente falsa - e sendo falsa, o valor impresso tem importância reduzida - o delito é relevante devido à natureza do bem jurídico tutelado. III. Irresignação que deve ser acolhida para determinar o recebimento da denúncia oferecida contra o recorrido, bem como o prosseguimento da ação penal. IV. Recurso provido, nos termos do voto do relator. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1251681 (2011/0098281-0), do Estado de Minas Gerais. 5. Turma. Relator: Gilson Dipp. Decisão unânime. Brasília, DF, 22 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

PORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO

43/4684 - PORTE DE MUNIÇÃO. PEQUENA QUANTIDADE DE MUNIÇÃO. IRRELEVÂNCIA JU-RÍDICA DO FATO. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.

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167JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Penal

DESACATO. PROVA SEGURA À CONDENAÇÃO. INTENÇÃO DELIBERADA DE OFENDER A DIG-NIDADE DO POLICIAL. AUSÊNCIA DE CAUSAS EXCLUDENTES. Reincidência que impede a subs-tituição por restritiva de direitos e suspensão condicional da pena. Alteração do regime inicial para o aberto. Exegese do art. 33, § 3º c/c art. 59, do CP. Recurso parcialmente provido. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0009777-65.2008.8.26.0022. 16. Câmara de Direito Criminal. Relator: Newton Neves. São Paulo, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 17 de novembro de 2011.

POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO

43/4685 - APELAÇÃO CRIMINAL. POSSE DE ARMA DE FOGO. ABOLITIO CRIMINIS. Dadas as disposições da Lei nº 10.826/03, com a alteração subsequente pelo Decreto nº 7.473, de 05.05.2011, ocorreu um vácuo legislativo em relação à posse de arma de fogo por prazo indeterminado, já que “presumir-se-á a boa-fé dos possuidores e proprietários de armas de fogo que espontaneamente entregá-las na Polícia Federal ou nos postos de recolhimento credenciados, nos termos do art. 32 da Lei nº 10.826, de 2003”. Assim, atualmente ocorre atipicidade das condutas previstas nos arts. 12 e 16 (quanto à posse) do Estatuto do Desarmamento, inexistindo punição cabível, já que se presume a boa-fé de que o agente entregaria a arma. Aplica-se, no caso, o parágrafo único do art. 2º do Código Penal. Apelo provido. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70044175719. 1. Câmara Criminal. Relator: Manuel José Martinez Lucas. Porto Alegre, 9 de novembro de 2011. Diário da Justiça de 29 de novembro de 2011.

PRESCRIÇÃO RETROATIVA

43/4686 - APELAÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. PRELIMINAR ARGUIDA PELA PROCURADORA DE JUSTIÇA. FENÔMENO TEMPORAL EVIDEN-TE. ACOLHIMENTO DO INCIDENTE. EXTINÇÃO DA AÇÃO PENAL. Se entre o recebimento da denúncia e a prolação da sentença decorreu prazo superior àquele estipulado para a prescrição penal verificado em contagem retroativa, sem causa de interrupção, deve ser julgada extinta a punibilidade propiciando ao réu a baixa de todos os registros dela decorrente, por ter ocorrido o lapso prescricional da ação. MATO GROSSO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 17018/2011. 11. Câmara Criminal. Relator: Manoel Ornellas de Almeida. Decisão unânime. Cuiabá, 8 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 23 de novembro de 2011.

PRESCRIÇÃO VIRTUAL

43/4687 - PRESCRIÇÃO VIRTUAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 438 STJ. Inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética. Conheci-do. Provido. Unanimidade. PARÁ. Tribunal de Justiça. Recurso em Sentido Estrito nº 20113020338-8 (102236). 1. Câmara Criminal Isolada. Relator: Maria Edwiges de Miranda Lobato. Belém, 24 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 25 de novembro de 2011.

PRINCÍPIO DA VOLUNTARIEDADE

43/4688 - APELAÇÃO CRIMINAL. PEDIDO DE DESISTÊNCIA. PRINCÍPIO DA VOLUNTARIEDA-DE. HOMOLOGAÇÃO. Protocolizado pedido de desistência do recurso apelatório, formalizado por

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168 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

advogado, ratificado pela processada, demonstrando, de forma inequívoca, a falta de interesse no julgamento da insurreição da sentença condenatória, a solução reclamada está na homologação, entendimento compatibilizado com o art. 574, do Código de Processo Penal, pela característica da voluntariedade, e art. 175, inciso XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. Desistência homologada. GOIÁS. Tribunal de Justiça. Apelação Criminal nº 44510-63.2009.8.09.0000 (200900445100). 2. Câmara Criminal. Relator: Luiz Cláudio Veiga Braga. Decisão unânime. Goiânia, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 24 de novembro de 2011.

PRISÃO DOMICILIAR

43/4689 - AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO. PRISÃO DOMI-CILIAR. APENADO EM REGIME SEMIABERTO. IMPOSSIBILIDADE. A prisão domiciliar, como espécie do regime aberto, não se mostra possível aos segregados que cumprem pena em outro regime, sendo que se mostra necessária, ainda, a verificação de enquadramento em circunstâncias especiais, elencadas no art. 117 da LEP. Hipótese na qual, além de o apenado estar no regime semiaberto, não preenche quaisquer dos requisitos autorizadores - art. 117 da LEP. Superlotação e precárias condições físicas das penitenciárias que são questões atinentes à Administração Pública, não podendo legitimar decisões judiciais contrárias à própria lei. No cotejo entre o direito dos presos a cumprir a pena em local adequado e o direito à segurança dos demais cidadãos, deve prevalecer este último, sob pena de instalar-se a insegurança social. Agravo improvido. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo nº 70044798312. 8. Câmara Criminal. Relator: Fabianne Breton Baisch. Porto Alegre, 19 de outubro de 2011. Diário da Justiça de 30 de novembro de 2011.

PROGRESSÃO DE REGIME

43/4690 - HABEAS CORPUS. COMETIMENTO DE FALTA GRAVE PELO APENADO. NECESSI-DADE DE REINÍCIO DA CONTAGEM DO PRAZO DE 1/6 (UM SEXTO) PARA OBTENÇÃO DA PROGRESSÃO NO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. PRECEDENTES. 1. O julgado ora questionado está em perfeita consonância com a jurisprudência desta Suprema Corte, preconizada no sentido de que “em caso de falta grave, impõem-se a regressão de regime e a alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios” (HC nº 97.659/SP, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 20.11.09). 2. Ordem denegada. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 110.638, do Estado de São Paulo. 1. Turma. Relator: Dias Toffoli. Decisão unânime. Brasília, DF, 25 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 29 de novembro de 2011.

43/4691 - EMBARGOS INFRINGENTES EM AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL - COMETIMENTO DE FALTA GRAVE - POSSE DE APARELHO CELULAR E DROGA - REINÍCIO DA CONTAGEM DO PRAZO PARA PROGRESSÃO DE REGIME - PRINCÍPIO DA ISONOMIA - EMBARGOS NÃO PROVIDOS. Correta a determinação de fixação de nova data-base para benefícios futuros de progressão de regime ao apenado que cometeu falta grave. Medida adequada, em consonância com o princípio da isonomia. Entendimento já consolidado na jurisprudência. MATO GROSSO DO SUL. Tribunal de Justiça. Embargos Infringentes em Agravo Criminal nº 2011.015778-1/0001-00. Seção Criminal. Relator: Dorival Moreira dos Santos. Decisão por maioria. Diário da Justiça de 23 de novembro de 2011.

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169JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Penal

43/4692 - RECURSO DE AGRAVO - PROGRESSÃO DE REGIME - CONCESSÃO RETROATIVA À DATA EM QUE O SENTENCIADO FAZIA JUS AO BENEFÍCIO - POSSIBILIDADE - MOROSIDADE DO FEITO QUE NÃO DEVE PREJUDICAR O SENTENCIADO. A concessão da progressão de regime deve retroagir à data em que o sentenciado cumpriu os requisitos necessários à obtenção do benefício, pois ele não pode ser prejudicado pela demora para a qual não contribuiu. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Agravo de Execução Penal nº 0568611-28.2011.8.13.0000. 2. Câmara Criminal. Relator: Beatriz Pinheiro Caires. Decisão unânime. Belo Horizonte, 3 de novembro de 2011. Publicado em 30 de novembro de 2011.

43/4693 - RECURSO DE AGRAVO EM EXECUÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRETENSÃO DE PROGRESSÃO DO REGIME FECHADO AO SEMIABERTO. PEDIDO INDEFERIDO, COM BASE EM EXAME CRIMINOLÓGICO, POR O SENTENCIADO NÃO PREENCHER O REQUISITO SUBJETIVO PARA OBTER O BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE DE O MAGISTRADO DETERMINAR, EM DECISÃO MOTIVADA, A REALIZAÇÃO DO EXAME. SÚMULA VINCULANTE Nº 26, DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS QUE INDICAM A NECESSIDADE DA REALIZAÇÃO DO EXAME CRIMINOLÓGICO. RECURSO DESPROVIDO. Sentenciado que não preenche o requisito subjetivo, pois além de o informe psiquiátrico desaconselhar o deferimento da progressão o sentenciado, em 18.03.2008, praticou falta grave, demonstrando que não preenche o mérito para obter o benefício da progressão. Recurso desprovido. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Recurso de Agravo nº 0830503-1. 1. Câmara Criminal. Relator: Jesus Sarrão. Relator convocado: Naor R. de Macedo Neto. Decisão unânime. Curitiba, 17 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 1º de dezembro de 2011.

43/4694 - HABEAS CORPUS - EXECUÇÃO CRIMINAL - PACIENTE COM PROGRESSÃO AO REGIME SEMIABERTO ENCONTRA-SE EM REGIME FECHADO - CONSTRANGIMENTO ILEGAL - INOCORRÊNCIA. A transferência de condenado a descontar pena em regime semiaberto, não se faz da noite para o dia, do estabelecimento onde se encontra, para presídio adequado ao seu regime prisional, pois existem e são absolutamente normais entraves administrativos e burocráticos que im-pedem a concretização imediata de tal providência - Ordem denegada. SÃO PAULO. Tribunal de Jus-tiça. Habeas Corpus nº 0184846-75.2011.8.26.0000. 5. Câmara de Direito Criminal. Relator: Sérgio Ribas. São Paulo, 27 de outubro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 16 de novembro de 2011.

REGRESSÃO DE REGIME

43/4695 - AGRAVO EM EXECUÇÃO. CONCESSÃO DE SAÍDA TEMPORÁRIA. AUSÊNCIA DE RETORNO DO CONDENADO. RECAPTURA SOMENTE APÓS O PERÍODO DE 09 MESES. Apresentação de justificativa frágil. Fuga configurada. Falta grave. Regressão de regime prisional do semiaberto para o fechado. Cabimento. Recurso provido. PARANÁ. Tribunal de Justiça. Recurso de Agravo nº 0823827-5. 1. Câmara Criminal. Relator: Macedo Pacheco. Decisão unânime. Curitiba, 10 de novembro de 2011. Diário da Justiça Eletrônico de 24 de novembro de 2011.

TORTURA

43/4696 - REVISÃO CRIMINAL. TORTURA. PROVA NOVA. DECLARAÇÕES DA VÍTIMA PRESTA-DAS AO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONDENAÇÃO ALICERÇADA POR OUTROS ELEMENTOS DE

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170 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

PROVA. AUSÊNCIA DE ERRO JUDICIÁRIO. CONDENAÇÃO MANTIDA. PEDIDO REVISIONAL CONHECIDO E JULGADO IMPROCEDENTE. 1. Não é suficiente para provocar a procedência da ação revisional, as novas declarações prestadas pela vítima no Ministério Público, após o trânsito em julgado da condenação, afirmando que o fato não ocorreu, quando em descompasso com todos os demais elementos de prova colhidos na fase inquisitorial e durante a instrução processual. 2. Por outro lado, a versão anterior da vítima, de que foi vítima de tortura, apresenta-se harmônica com as provas carreadas aos autos, não logrando êxito os requerentes em comprovar a existência de erro judiciário. Com efeito, as testemunhas que estiveram com a vítima logo após o fato, narraram que ela estava psicologicamente abalada, tremendo e lesionada, estado incompatível com uma simples queda de bicicleta. Além disso, os colegas de trabalho que pediram demissão dias após o ocorrido ouviram de um dos requerentes que não era para acontecer o que aconteceu, que era apenas para dar um “arrocho” ou uma “prensa” no ofendido. 3. Revisão criminal admitida, mas julgada improcedente. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. Processo nº 2011.00.2.015331-7 (551337). Câmara Criminal. Relator: Roberval Casemiro Belinati. Decisão unânime. Diário da Justiça Eletrônico de 29 de novembro de 2011.

TRÁFICO DE ENTORPECENTES

43/4697 - EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO - TRÁFICO PRIVILEGIADO - CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO - REGIME INICIAL FECHADO - IMPOSIÇÃO - INTELIGÊNCIA DO ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90 - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - IMPOSSIBILIDADE - VEDAÇÃO CONTIDA NO ART. 44, DA LEI Nº 11.343/06 - EMBARGOS REJEITADOS. A incidência da causa redutora prevista no § 4º, do art. 33, da Lei 11.343/06 (tráfico privilegiado), não afasta a infração praticada pelo agente e sua natureza de delito equiparado a hediondo, motivo pelo qual a modificação do regime inicial de cumprimento de pena do apelado, para o fechado, é medida que se impõe. O crime de tráfico privilegiado, por constituir, tão somente, uma causa especial de diminuição de pena, sujeita-se às vedações cons-tantes do art. 44, da Lei de Drogas. Embargos rejeitados. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Embargos Infringentes e de Nulidade nº 0124711-28.2010.8.13.0701. 7. Câmara Criminal. Relator: Agostinho Gomes de Azevedo. Decisão por maioria. Belo Horizonte, 17 de novembro de 2011. Publicado em 29 de novembro de 2011.

TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOA

43/4698 - DIREITO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOA. CONSUMAÇÃO. PROVAS DA AUTORIA E DA EXISTÊNCIA DA INFRAÇÃO PENAL. PARTICIPAÇÃO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. 1. Denúncia na qual noticiada a existência de organização criminosa especializada no aliciamento e tráfico de mulheres brasileiras para o exterior, onde seriam “contratadas” por proprie-tários de casas noturnas para se prostituírem. 2. Sentença de acolhimento da pretensão punitiva para condenar a agente pelos crimes dos artigos 231 e 288, ambos do Código Penal. Declaração de extinção da punibilidade quanto ao delito de quadrilha, ante a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. 3. Provas da autoria e da existência da infração penal, consoante elementos de convicção carreados aos autos. 4. O delito de tráfico internacional de mulheres constitui crime formal, sendo certo que sua consumação se dá com a simples facilitação ou promoção da saída de nacionais para o exterior, independentemente de ter havido o efetivo exercício da prostituição ou

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171JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA - Ementário Penal

mesmo da saída do território nacional. 5. A atuação da ré não se resumiu a participação de menor importância, em que teria concorrido, de qualquer forma, para a realização do crime, com a inci-dência da causa de diminuição do artigo 29, § 1º, do Código Penal, mas traduziu-se em verdadeira prática de ato executório, a revelar a coautoria. A realização, em grau menor, das características do tipo, foi considerada por ocasião da fixação da pena. 6. Deferimento da gratuidade de justiça à ré, nos termos da Lei 1.060/50, por estar representada pela Defensoria Pública da União, donde se deduz ser hipossuficiente. 7. Recurso de apelação parcialmente provido. BRASIL. Tribunal Regional Federal (2. Região). Apelação Criminal nº 2004.51.01.537009-7. 2. Turma Especializada. Relator convocado: Marcello Ferreira de Souza Granado. Decisão unânime. Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2011. Diário Eletrônico da Justiça Federal da 2ª Região de 22 de novembro de 2011.

USO DE DOCUMENTO FALSO

43/4699 - PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MPF. USO DE DOCUMENTO FALSO. PASSAPORTE BRASILEIRO AUTÊNTICO. VISTO CONSULAR CONTRAFEITO. CONDUTA TÍPICA. CONDE-NAÇÃO. RECURSO PROVIDO. 1. É de rigor a condenação do réu pelo crime descrito nos artigos 297 c/c 304 do Código Penal, por restar provado que o mesmo utilizou um passaporte brasileiro autêntico, emitido em seu nome, contendo visto consular americano falso, para viajar para os Estados Unidos da América, pelo Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos. Precedente do STJ. 2. O réu é primário, não possui antecedentes e nem qualquer outra circunstância judicial que justifique a majoração da pena-base fixada no mínimo legal, 2 anos de reclusão e 10 dias-multa, e tornada definitiva ante a falta de agravantes e atenuantes, e de causas de aumento e de dimi-nuição. Estabelecido o regime prisional inicial aberto e o dia-multa no valor unitário mínimo legal. No mais, substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. 3. Recurso ministerial provido. BRASIL. Tribunal Regional Federal (3. Região). Apelação Criminal nº 0004589-55.2001.4.03.6119-SP. 1. Turma. Relator: Johonsom Di Salvo. Decisão unânime. São Paulo, 8 de novembro de 2011. Diário Eletrônico de 18 de novembro de 2011.

43/4700 - APELAÇÃO CRIMINAL - USO DE DOCUMENTO FALSO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSI-BILIDADE - CONSUMAÇÃO COM O SIMPLES ATO DE PORTAR - EXIBIÇÃO ESPONTÂNEA - IRRELEVÂNCIA - CRIME IMPOSSÍVEL - FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA - ATIPICIDADE - INOCOR-RÊNCIA. O delito previsto no artigo 304 do Código Penal consuma-se com o simples ato de portar documento falso, pouco importando que a exibição tenha ou não se dado de forma espontânea, mediante a solicitação da autoridade. Para a imitação ser considerada grosseira, autorizando a absolvição, deve ser percebida de plano pelo homem médio, dispensando-se a análise técnica para a confirmação da não autenticidade, e não por pessoas capacitadas e treinadas para tanto, como é o caso do Policial Militar que detectou a contrafação. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Criminal nº 0284858-84.2009.8.13.0144. 5. Câmara Criminal. Relator: Eduardo Machado. Decisão unânime. Belo Horizonte, 8 de novembro de 2011. Publicado em 28 de novembro de 2011.

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LEGISLAÇÃO

Normas relevantes promulgadas no período de 14.10.2011 até 02.12.2011

LEI COMPLEMENTAR Nº 139 DE 10.11.2011 - DOU 11.11.2011EMENTA: Altera dispositivos da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, e dá outras providências.

LEI Nº 12.528 DE 18.11.2011 - DOU 18.11.2011EMENTA: Cria a Comissão Nacional da Verdade no âmbito da Casa Civil da Presidência da República.

LEI Nº 12.527 DE 18.11.2001 - DOU 18.11.2011EMENTA: Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências.

DECRETO Nº 7.627 DE 24.11.2011 - DOU 25.11.2011EMENTA: Regulamenta a monitoração eletrônica de pessoas prevista no Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e na Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal.

DECRETO Nº 7.617 DE 17.11.2011 - DOU 18.11.2011EMENTA: Altera o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.

DECRETO Nº 7.614 DE 17.11.2011 - DOU 18.11.2011EMENTA: Reduz a zero as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI incidente sobre produtos utilizados por pessoas com deficiência.

DECRETO Nº 7.602 DE 07.11.2011 - DOU 08.11.2011EMENTA: Dispõe sobre a Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho - PNSST.

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ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO CÍVEL

AABANDONO DA CAUSA• Extinção do processo sem julgamento de mérito.

Inteligência do art. 267, § 1º do CPC. Imprescindi-bilidade da prévia intimação pessoal do autor. (Em. 43/4601) ..........................................................141

• Inventário. Jurisdição voluntária. Inércia do inven-tariante. Extinção do feito. Intimação pessoal do inventariante e da defensoria pública. Necessidade. Interesse público. (Em. 43/4644) ....................153

AÇÃO CIVIL PÚBLICA• Cumprimento de sentença. Prescrição. Inocorrên-

cia. (Em. 43/4621) ..........................................146• Improbidade administrativa. Ex-prefeito. Dispensa

irregular de licitação e não realização de obras objeto de convênio federal. Condenação. Multa civil. Majoração. Descabimento. Beneficiária. União. (Em. 43/4641) ..........................................................152

• Improbidade administrativa. Indícios de prática de atos danosos. Indisponibilidade de bens móveis e imóveis. Bloqueio pelo sistema Bacen Jud. Possi-bilidade. (Em. 43/4642) ...................................153

AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO• Alegação de impossibilidade de discussão de

cláusulas contratuais em processo de busca e apreensão. Descabimento. (Em. 43/4606) .....142

• Alienação fiduciária. Mora caracterizada. Notifica-ção. Validade. Liminar. Concessão. Requisitos. (Em. 43/4605) ..........................................................142

• Alienação fiduciária. Mora. Não comprovação. Notificação. Necessidade. Extinção da ação. (Em. 43/4603) ..........................................................141

• Alienação fiduciária. Veículo. Constituição do devedor em mora. Ausência de cumprimento da determinação contida no art. 2º, § 2º do Decreto-Lei 911/79. (Em. 43/4604) ....................................142

• Devedor que não foi regularmente notificado da dívida. Mora. Inexistência. (Em. 43/4602) ......141

• Notificação extrajudicial realizada por cartório loca-lizado em comarca diversa do domicílio do devedor. Notificação válida posto que entregue no endereço correto. Finalidade atingida. (Em. 43/4607) ....142

AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE• Liminar concedida. Contagem do prazo inicial a par-

tir da juntada do último mandado citatório cumprido. (Em. 43/4610) .................................................143

• Limitação de animais. Natureza cautelar. Quantida-de. (Em. 43/4609) ...........................................143

• Posterior apreciação de liminar. Necessidade da peça de defesa. (Em. 43/4608) ......................143

AÇÃO MONITÓRIA• Alegação de dívida decorrente de fornecimento de

mercadoria para ente municipal. Apresentação de documentação referente ao fornecimento de mer-cadoria, na qual consta a assinatura da secretária municipal de educação. (Em. 43/4614) ..........144

• Cheques prescritos. Desnecessidade da com-provação do negócio jurídico subjacente. (Em. 43/4612) ..........................................................144

• Desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. Alterações no quadro societário. (Em. 43/4626) ..........................................................148

• Duplicata mercantil. Protesto por falta de aceite. Au-sência de comprovação da entrega das mercadorias contratadas. Inexigibilidade do título cambial. (Em. 43/4611) ..........................................................143

• Indeferimento de petição inicial. Cheque. Prescri-ção. (Em. 43/4613) .........................................144

AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS• Filho menor. Pretensa majoração do percentual fi-

xado a título de obrigação alimentícia. Necessidade do infante presumida em razão de doença cardíaca congênita. (Em. 43/4615) ...............................144

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA• Ação de busca e apreensão de veículo. Constituição

do devedor em mora. Ausência de cumprimento da determinação contida no art. 2º, § 2º do Decreto-Lei 911/79. (Em. 43/4604) ....................................142

• Busca e apreensão. Mora caracterizada. Notifica-ção. Validade. Liminar. Concessão. Requisitos. (Em. 43/4605) ..........................................................142

• Busca e apreensão. Mora. Não comprovação. Notificação. Necessidade. Extinção da ação. (Em. 43/4603) ..........................................................141

APOSENTADORIA POR INVALIDEz• Acidentária. Empregado doméstico. Prestações

acidentárias indevidas. (Em. 43/4616) ...........145ARROLAMENTO SUMÁRIO• Homologação, por sentença, do plano de partilha.

Preliminar de nulidade da sentença analisada em conjunto com o mérito. Ausência de intimação da fazenda pública. Desnecessidade. Cobrança de

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ITCD incidente sobre os bens do espólio. (Em. 43/4617) ..........................................................145

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA• Cheques prescritos. Desnecessidade da compro-

vação do negócio jurídico subjacente. Ausência de preparo. Deserção. (Em. 43/4612) .................144

• Honorários periciais. Resolução 541, de 18.01.2007, do Conselho da Justiça Federal. Valores mínimo e máximo. (Em. 43/4640) ..................................152

• Pessoa jurídica. Necessidade de comprovação da hipossuficiência financeira. Recolhimento das custas processuais iniciais ao final da demanda. Impossibilidade. (Em. 43/4618) ......................145

BBENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS• Reconhecimento de união estável, cumulado com

pedido de benefícios previdenciários. Inviabilidade. Artigo 292 do CPC. Extinção do processo, sem resolução do mérito. (Em. 43/4665) ...............160

• Ver artigo “A Relativização da Qualidade de Segu-rado como Requisito para a Concessão dos Bene-fícios Previdenciários. Uma Nova Abordagem à Luz do Princípio Constitucional do Caráter Contributivo da Previdência Social” - Rodrigo Moreira Sodero Victorio ............................................................105

BUSCA E APREENSÃO• Ver “Ação de busca e apreensão”

CCOMODATO• Posse (bens imóveis). Ação reivindicatória. Como-

dato. Acessão. Boa-fé. Indenização. Art. 1.255 do Código Civil. (Em. 43/4619) ............................146

CONTRATO DE EMPRÉSTIMO• Incidência do CDC. Súmula 297 do STJ. Capitali-

zação de juros. Previsão de taxa mensal e efetiva anual que caracteriza o fenômeno da capitalização. Impossibilidade. (Em. 43/4620) ......................146

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA• Ação civil pública. Prescrição. Inocorrência. (Em.

43/4621) ..........................................................146• Exceção de pré-executividade. Cabimento. Revisão

de multa cominatória. Questão apreciável de ofício. (Acórdão do STJ) ............................................ 119

• Execução de alimentos. Lei 11.232/05. Aplicação do rito previsto no artigo 733 do Código de Processo Civil. (Em. 43/4632) ........................................150

• Prazo de 15 dias para pagamento. Memória de cál-culo. Intimação do devedor na pessoa do advogado. Necessidade. (Em. 43/4622) ..........................147

DDANOS MORAIS• Duas cirurgias de laqueadura. Duas gestações

posteriores. Ausência de esclarecimentos à ges-tante. Indenização. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (Em. 43/4623) .............147

• Morte de preso sob a custódia do Estado. Conduta omissiva. Responsabilidade civil objetiva. Dano moral arbitrado em valor excessivo. Minoração. (Em. 43/4655) .................................................157

DESAPROPRIAÇÃO• Execução de título judicial. Interposição de agravo

contra ato judicial de caráter terminativo. Apresen-tação de apelo com mesmo objeto. Desnecessidade de aplicação do princípio da fungibilidade. (Em. 43/4624) ..........................................................147

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA• Ação de execução. Teoria da menor desconsidera-

ção. Responsabilização dos sócios. Ressarcimento de prejuízo. (Em. 43/4625) .............................148

• Medida excepcional. Ausência de comprovação cabal de confusão patrimonial. Penhora on-line. Pedido de avaliação de bem penhorado. Inaplica-bilidade do art. 659 do CPC. Falta de requerimento expresso. Caráter relativo de preferência. Súmula 417 do STJ. (Em. 43/4648) .............................155

• Monitória. Alterações no quadro societário. (Em. 43/4626) ..........................................................148

DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS• Revogação de tutela antecipada. Valores recebidos

de boa-fé. (Em. 43/4627) ................................148DIREITO INTRANSMISSÍVEL• Morte da parte. Art. 265, I, CPC. Extinção do pro-

cesso. Art. 267, IX, CPC. Fixação de honorários. Ausência de habilitação de herdeiros. Descabimen-to. (Em. 43/4628) ............................................148

DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE MERCANTIL• Ação inaudita altera parte com apuração de haveres

e partilha de bens. Julgamento procedente, decre-tada a dissolução. (Em. 43/4629) ...................149

DIVÓRCIO• Partilha de bens. Revelia. Efeitos. Apreciação das

provas. Livre convencimento motivado. Insuficiên-cia de elementos para demonstrar a posse ou a propriedade de bem imóvel. (Em. 43/4630) ...149

EEMBARGOS à ARREMATAÇÃO• Ilegitimidade ativa de terceiro interessado. Artigo

746 do CPC. (Em. 43/4631) ...........................149

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177ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO CÍVEL

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA• Interposição contra acórdão emanado do pleno do

STF. Inadmissibilidade. Recurso de agravo impro-vido. (Acórdão do STF) ................................... 115

EMPRÉSTIMO• Ver “Contrato de empréstimo”EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE• Cumprimento de sentença. Cabimento. Revisão de

multa cominatória. Questão apreciável de ofício. (Acórdão do STJ) ............................................ 119

EXECUÇÃO DE ALIMENTOS• Cumprimento de sentença. Lei 11.232/05. Apli-

cação do rito previsto no art. 733 do CPC. (Em. 43/4632) ..........................................................150

EXECUÇÃO FISCAL• Penhora. Registro junto à matrícula. Diligência do

oficial de justiça. (Em. 43/4647) ......................154• Redirecionamento da execução para sócio-gerente.

Prescrição configurada. (Em. 43/4634) ..........150• Remissão de débito exequendo. Art. 14 da Lei

11.941/2009. Débitos do FGTS. Inaplicabilidade. (Em. 43/4633) .................................................150

EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS• Decisão agravada que reduziu o valor da multa por

descumprimento. Pretensão de restabelecimento do valor original da multa ou de majoração do valor fixado na decisão agravada para patamar mais razoável. Impossibilidade. (Em. 43/4635) .......151

• Não comprovada a recusa extrajudicial da ré na exibição do documento pleiteado. Falta de interesse de agir. Extinção do feito. (Em. 43/4636) ........151

EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO• Pretensão de manutenção do condomínio com

relação a alguns dos coproprietários e exclusão de outros. Inadequação do procedimento. (Em. 43/4637) ..........................................................151

FFGTS• Ver artigo “Competência da Justiça do Trabalho

para Expedir Alvará Judicial Destinado à Liberação do FGTS Independentemente do Ajuizamento de Reclamação Trabalhista” - Cláudio Dias Lima Filho ..........................................................................25

hhIBRIDISMO• Aposentadoria. Utilização de regras do regime

previdenciário anterior com as normas do vigente. Vedação. (Em. 43/4638) .................................152

hONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS• Ação civil pública. Ex-prefeito. Dispensa irregular de

licitação e não realização de obras objeto de convê-nio federal. Multa civil. Majoração. Descabimento. Beneficiária. União. (Em. 43/4641) .................152

• Condenação da Fazenda Pública. Aplicação do art. 20, § 4º, do CPC, sem vinculação necessária ao art. 20, § 3º, do CPC. (Acórdão do STJ) ...............123

• Fixação de verba honorária em favor de defensoria pública estadual contra o município. Possibilidade. (Acórdão do STJ) ............................................125

• Morte da parte. Art. 265, I, CPC. Extinção do pro-cesso. Art. 267, IX, CPC. Fixação de honorários. Ausência de habilitação de herdeiros. Descabimen-to. (Em. 43/4628) ............................................148

hONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS• Rateio entre advogados que atuaram no processo.

(Em. 43/4639) .................................................152hONORÁRIOS PERICIAIS• AJG. Resolução 541, de 18.01.2007, do Conselho

da Justiça Federal. Valores mínimo e máximo. (Em. 43/4640) ..........................................................152

IIMPROBIDADE ADMINISTRATIVA• Ação civil pública. Ex-prefeito. Dispensa irregular de

licitação e não realização de obras objeto de convê-nio federal. Multa civil. Majoração. Descabimento. Beneficiária. União. (Em. 43/4641) .................152

• Ação civil pública. Indícios de prática de atos da-nosos. Indisponibilidade de bens móveis e imóveis. Bloqueio pelo sistema Bacen Jud. Possibilidade. (Em. 43/4642) .................................................153

INFRAÇÃO AMBIENTAL• Manutenção em cativeiro de espécies passerifor-

mes da fauna silvestre brasileira sem autorização do IBAMA. Processo administrativo. Prestação de serviço. (Acórdão do TRF da 1ª Região) ........128

INTERDITO PROIBITÓRIO• Ocupação irregular. Área pública. Proteção posses-

sória. Impossibilidade. Ordem demolitória. Poder de polícia. (Em. 43/4643) .....................................153

INVENTÁRIO• Ação de cobrança. Espólio. Ausência de abertura

inventário. Ilegitimidade passiva. Prosseguimento quanto aos demais réus. Decisão interlocutória. Recurso cabível. Agravo. Interposição de apelação. Erro grosseiro. (Em. 43/4649) ........................155

• Jurisdição voluntária. Inércia do inventariante. Abandono da causa. Extinção do feito. Intimação

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178 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

pessoal do inventariante e da defensoria pública. Interesse público. (Em. 43/4644) ....................153

LLEILÃO• Sobrestamento. Indeferimento. Adequação à restri-

ção judicial imposta. (Em. 43/4645) ................154M

MORTE PRESUMIDA• Ação de declaração de morte presumida de

ausente. Ausência de interesse processual. Inuti-lidade e inadequação da ação ora proposta. (Em. 43/4646) ..........................................................154

MÚTUO• Ação revisional. Contrato de mútuo vinculado ao

SFH. (Em. 43/4659) ........................................158P

PARTILhA DE BENS• Ação inaudita altera parte com apuração de haveres

e partilha de bens. Julgamento procedente, decre-tada a dissolução. (Em. 43/4629) ...................149

• Divórcio. Revelia. Efeitos. Apreciação das provas. Livre convencimento motivado. Insuficiência de ele-mentos para demonstrar a posse ou a propriedade de bem imóvel. (Em. 43/4630) ........................149

• Reconhecimento e dissolução de união estável c/c partilha de bens. Comunicabilidade de dívidas contraídas. Possibilidade. (Em. 43/4664) .......160

PENhORA• Execução fiscal. Registro junto à matrícula. Diligên-

cia do oficial de justiça. (Em. 43/4647) ...........154PENhORA ON-LINE• Pedido de avaliação de bem penhorado. Inaplica-

bilidade do art. 659 do CPC. Falta de requerimento expresso. Caráter relativo de preferência. Súmula 417 do STJ. (Em. 43/4648) .............................155

PREQUESTIONAMENTO• Ver artigo “Do Prequestionamento nos Recursos

Excepcionais Cíveis” - Márcia Silvana Felten ...95PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL• Ação de cobrança. Espólio. Ausência de abertura

inventário. Ilegitimidade passiva. Prosseguimento quanto aos demais réus. Decisão interlocutória. Recurso cabível. Agravo. Interposição de apelação. Erro grosseiro. (Em. 43/4649) ........................155

• Execução de título judicial. Interposição de agravo contra ato judicial de caráter terminativo. Apresen-tação de apelo com mesmo objeto. Desnecessidade de aplicação do princípio da fungibilidade. (Em. 43/4624) ..........................................................147

PROMESSA DE COMPRA E VENDA• Imóvel. Garantia hipotecária. Ineficácia. Aplicação

da súmula 308 do STJ. Liberação do gravame. (Em. 43/4650) ..........................................................155

RRECLAMAÇÃO NOS JUIzADOS ESPECIAIS• Resolução/STJ nº 12/2009. Requisitos. Necessário

que se demonstre a contrariedade à jurisprudên-cia consolidada do STJ quanto à matéria. (Em. 43/4651) ..........................................................156

REINTEGRAÇÃO DE POSSE• Ver “Ação de reintegração de posse”REMOÇÃO DE SERVIDOR• Discricionariedade da administração. Ausência de

ilegalidade ou abuso. (Em. 43/4652) ..............156• Motivação do ato pela administração. Necessidade.

(Em. 43/4653) .................................................156REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL• Regularidade. Documentos juntados aos autos que

são suficientes para atestar o vínculo de represen-tação afirmado na inicial. (Em. 43/4654) ........156

RESPONSABILIDADE CIVIL• Morte de preso sob a custódia do Estado. Conduta

omissiva. Dano moral arbitrado em valor excessivo. Minoração. (Em. 43/4655) ..............................157

RESPONSABILIDADE PESSOAL DOS SÓCIOS• Ação de execução. CDC. Teoria da menor des-

consideração. Responsabilização dos sócios. Ressarcimento de prejuízo. (Em. 43/4625) ....148

• Artigo 135, III, do CTN. Nome constante da CDA. Infração à lei. Não repasse de contribuições previ-denciárias. (Acórdão do TRF da 4ª Região) ...134

RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL• Pretensão de modificação do nome da genitora.

Circunstância superveniente. Casamento. Impos-sibilidade. (Em. 43/4656) ................................157

REVISIONAL DE ALIMENTOS• Ver “Ação revisional de alimentos”

SSEGURO OBRIGATÓRIO• Ação de cobrança c/c reparação de danos materiais.

Acidente automobilístico. (Em. 43/4657) ........157SEGURO RESIDENCIAL• Pretensão de cobrança. Ocorrência do sinistro. Va-

zamento de água. Indenização. Previsão expressa na apólice. (Em. 43/4658) ...............................158

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179 ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO CÍVEL

SFh• Ação revisional. Contrato de mútuo vinculado ao

SFH. (Em. 43/4659) ........................................158SUCESSÃO• Bem deixado em herança. Partilha ainda não reali-

zada. Reivindicatória de coerdeiro contra coerdeiro. Impossibilidade. (Em. 43/4660) ......................158

SUPERENDIVIDAMENTO• Ver artigo “O Fenômeno do Superendividamento

- Inexistência de Direito do Consumidor à Renego-ciação e de Justa Causa para Intervenção Judicial nos Contratos” - Demócrito Ramos Reinaldo Filho ..........................................................................49

TTETO DE BENEFÍCIOS DO RGPS• Reflexos naqueles concedidos anteriormente à

edição da EC 20/1998. (Em. 43/4661) ...........159

UUNIÃO ESTÁVEL• Dissolução. Bloqueio de bens. Interesse de tercei-

ros. Legitimidade. Alimentos. Binômio necessidade--possibilidade. Redução. (Em. 43/4663) .........159

• Reconhecimento e dissolução de união estável c/c partilha de bens. Comunicabilidade de dívidas contraídas. Possibilidade. (Em. 43/4664) .......160

• Reconhecimento cumulado com pedido de bene-fícios previdenciários. Inviabilidade da cumulação. Artigo 292 do CPC. Extinção do processo, sem resolução do mérito. (Em. 43/4665) ...............160

• Reconhecimento. Interesse de agir. Existência. Inafastabilidade da jurisdição. Apreciação do mérito. Impossibilidade. (Em. 43/4662) ......................159

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AABORTO• Ver artigo “A Possibilidade de Antecipação Terapêu-

tica da Gestação nos Casos de Anencefalia: Uma Análise da Legislação Interna Vigente como Fonte Suficiente para esse Fim e o Direito Comparado” - Heleno Florindo da Silva ...................................63

ANTECEDENTES CRIMINAIS• Ver “Certidão de antecedentes criminais”ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE• Devastação. Carcinicultura. Mangue. Art. 60 da Lei

9.605/98. Permanência do crime. Não demonstrada. Extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. (Acórdão do TRF da 5ª Região) .....................137

CCERTIDÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS• Possibilidade de requisição pelo MP federal. Lei

Complementar 75/93. (Em. 43/4666) .............161COMPETÊNCIA EXTRATERRITORIAL• Crime cometido por brasileiro fora do brasil. Aplica-

ção do art. 88 do CPP. (Em. 43/4667) ............161COMUTAÇÃO DE PENA• Falta disciplinar grave cometida anterior ao período

do referido decreto. (Em. 43/4669) .................162• Requisito objetivo. Preenchimento. Inteligência

dos arts. 2º e 7º, parágrafo único, do Decreto 7.420/2010. Falta grave cometida pelo sentenciado após a publicação do referido decreto. Irrelevância. (Em. 43/4668) .................................................161

CRIME AMBIENTAL• Art. 54, § 2º, V, art. 54, § 3º e art. 60, da Lei 9.605/98.

Suspensão condicional do processo. Reparação de dano ambiental. (Em. 43/4671) ......................162

• Consunção. Absorvido o crime meio de destruir floresta e o pós-fato impunível de impedir sua re-generação. Crime único de construir em local não edificável. (Em. 43/4670) ................................162

• Devastação. Carcinicultura. Mangue. Art. 60 da Lei 9.605/98. Permanência do crime. Não demonstrada. Extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. (Acórdão do TRF da 5ª Região) .....................137

CRIME CONTRA A hONRA• Queixa-crime. Rejeição. Ausência da descrição do

fato e do dolo específico de ofender a honra alheia. (Em. 43/4672) .................................................163

CRIME PRATICADO POR ÍNDIO• Índio denunciado por crime de tóxico que pede

assistência da FUNAI, todavia recusada pelo Juiz ao entendimento de que por possuir documentos e viver na cidade o indígena está integrado. (Em. 43/4673) ..........................................................163

DDESAFORAMENTO• Requerimento do réu. Parcialidade dos jurados.

Julgamento perante o tribunal do júri antes da apreciação do presente pleito. Perda do objeto. (Em. 43/4674) .................................................163

DESPRONÚNCIA• Homicídio qualificado. Pedido de despronúncia. Im-

possibilidade. Materialidade comprovada e indícios suficientes de autoria demonstrados. Configuração. (Em. 43/4675) .................................................164

DISPOSIÇÃO DE COISA ALhEIA COMO PRÓPRIA• Estelionato. Usura pecuniária ou real. Apelo da de-

fesa. Absolvição insuficiência de provas a embasar a condenação. (Em. 43/4676) ........................164

EESTELIONATO• Ver “Disposição de coisa alheia como própria”ESTUPRO DE VULNERÁVEL• Autoria e materialidade comprovadas somente em

relação a uma das vítimas. Ausência de provas em relação às demais vítimas. Absolvição. Regime de cumprimento de pena inicialmente fechado. (Em. 43/4677) ..........................................................164

• Continuidade delitiva. Art. 217-A, c/c art. 71, ambos do CP. Vítimas com idade inferior a 14 anos. Irrele-vância da existência ou não do consentimento da vítima. (Em. 43/4679) .....................................165

• Depoimentos dos pais. Insuficiência de provas. Absolvição. (Em. 43/4678) ..............................165

FFURTO• Praticado durante o repouso noturno. Pleito ab-

solutório. Alegação de conduta atípica diante do valor ínfimo da res furtiva. Pedido de aplicação do princípio da insignificância. Incabimento. (Em. 43/4680) ..........................................................165

ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO PENAL

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182 JURIS PLENUM - Ano VIII - número 43 - janeiro de 2012

hhABEAS CORPUS• Cometimento de falta grave pelo apenado. Necessi-

dade de reinício da contagem do prazo de 1/6 (um sexto) para obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena. (Em. 43/4690) ............168

• Execução criminal. Paciente com progressão ao regime semiaberto encontra-se em regime fecha-do. Constrangimento ilegal. Inocorrência. (Em. 43/4694) ..........................................................169

• Tráfico de entorpecentes. Prisão cautelar. Liberdade provisória. Impossibilidade. Vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/2006. Desnecessidade da medida extrema não evidenciada no caso concreto. (Em. 43/4682) ..........................................................166

hOMICÍDIO QUALIFICADO• Pedido de despronúncia. Impossibilidade. Materia-

lidade comprovada e indícios suficientes de autoria demonstrados. (Em. 43/4675) ........................164

• Pretensão de progressão do regime fechado ao se-miaberto. Pedido indeferido. Exame criminológico. Sentenciado não preenche o requisito subjetivo para obter o benefício. Possibilidade de o magistrado determinar, em decisão motivada, a realização do exame. (Em. 43/4693) ....................................169

IINDULTO• Requisitos objetivo e subjetivo. Preenchimento. Réu

foragido. Período posterior à obtenção do direito ao benefício. Irrelevância. Cumprimento de metade da pena. Inexistência de falta grave. Benefício concedido. (Em. 43/4681) ...............................165

JJUIzADO ESPECIAL CRIMINAL• Ver artigo “Infração de Menor Potencial Ofensivo -

Quando a Ingenuidade dá Lugar à Desconfiança” - Bernardo Montalvão Varjão de Azevedo ..........7

LLIBERDADE PROVISÓRIA• Tráfico de entorpecentes. Prisão cautelar. Liberdade

provisória. Impossibilidade. Vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/2006. Desnecessidade da medida ex-trema não evidenciada no caso concreto. Gravidade da conduta. (Em. 43/4682) .............................166

MMOEDA FALSA• Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. (Em.

43/4683) ..........................................................166

PPORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO• Pequena quantidade de munição. Irrelevância

jurídica do fato. Ausência de potencialidade lesiva. Absolvição que se impõe. (Em. 43/4684) .......166

POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO• Lei 10.826/03, alterada pelo Decreto 7.473/11. Vá-

cuo legislativo em relação à posse de arma de fogo por prazo indeterminado. Atipicidade das condutas previstas nos arts. 12 e 16 (quanto à posse) do Estatuto do Desarmamento, inexistindo punição cabível. (Em. 43/4685) ....................................167

PRESCRIÇÃO RETROATIVA• Preliminar arguida pela procuradora de justiça. Fe-

nômeno temporal evidente. Acolhimento. Extinção da ação penal. (Em. 43/4686) ........................167

PRESCRIÇÃO VIRTUAL• Impossibilidade. Súmula 438 do Superior Tribunal

de Justiça. (Em. 43/4687) ...............................167PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA• Furto praticado durante o repouso noturno. Pleito

absolutório. Alegação de conduta atípica diante do valor ínfimo da res furtiva. (Em. 43/4680) .......165

• Moeda falsa. Inaplicabilidade. Crime contra a fé pública. (Em. 43/4683) ....................................166

PRINCÍPIO DA VOLUNTARIEDADE• Pedido de desistência. Homologação. Art. 574 do

CPP. (Em. 43/4688) ........................................167PRISÃO DOMICILIAR• Superlotação. Apenado em regime semiaberto.

Impossibilidade. (Em. 43/4689) ......................168PROGRESSÃO DE REGIME• Cometimento de falta grave pelo apenado. Necessi-

dade de reinício da contagem do prazo de 1/6 para obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena. (Em. 43/4690) ..................................168

• Cometimento de falta grave. Posse de aparelho celular e droga. Reinício da contagem do prazo para progressão de regime. Princípio da isonomia. (Em. 43/4691) .................................................168

• Concessão retroativa à data em que o sentenciado fazia jus ao benefício. Possibilidade. Morosidade do feito que não deve prejudicar o sentenciado. (Em. 43/4692) ..........................................................169

• Execução criminal. Paciente com progressão ao regime semiaberto encontra-se em regime fecha-do. Constrangimento ilegal. Inocorrência. (Em. 43/4694) ..........................................................169

Page 183: Juris PLENUM 23

• Homicídio qualificado. Pretensão de progressão do regime fechado ao semiaberto. Pedido indeferido, com base em exame criminológico, por o sentencia-do não preencher o requisito subjetivo para obter o benefício. Possibilidade de o magistrado determinar, em decisão motivada, a realização do exame. (Em. 43/4693) ..........................................................169

RREGRESSÃO DE REGIME• Concessão de saída temporária. Ausência de

retorno do condenado. Recaptura somente após o período de 09 meses. (Em. 43/4695) .............169

TTORTURA• Revisão criminal. Prova nova. Declarações da

vítima prestadas ao ministério público. Condenação alicerçada por outros elementos de prova. Ausência de erro judiciário. (Em. 43/4696) ....................169

TRÁFICO DE ENTORPECENTES• Prisão cautelar. Liberdade provisória. Impossibili-

dade. Vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/2006.

Desnecessidade da medida extrema não evidencia-da no caso concreto. Gravidade da conduta. (Em. 43/4682) ..........................................................166

• Tráfico privilegiado. Crime equiparado a hediondo. Regime inicial fechado. Imposição. Art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90. (Em. 43/4697) ...........................170

TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOA• Existência de organização criminosa especializada

no aliciamento e tráfico de mulheres brasileiras para o exterior, onde seriam contratadas por proprietá-rios de casas noturnas para se prostituírem. (Em. 43/4698) ..........................................................170

UUSO DE DOCUMENTO FALSO• Absolvição. Impossibilidade. Consumação com o

simples ato de portar. Exibição espontânea. Irre-levância. Crime impossível. Falsificação grosseira. Atipicidade. Inocorrência. (Em. 43/4700) ........171

• Passaporte brasileiro autêntico. Visto consular contrafeito. Conduta típica. Condenação. (Em. 43/4699) ..........................................................171

183 ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO PENAL

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