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DIDÁTICA E PRÁTICA 24 UNIMES VIRTUAL Aula: 06 Temática: As Interfaces da Didática com a Sociologia da Educação: as teorias não críticas Nas aulas anteriores apontamos as interfaces da Didática com a Filosofia, que oferece o modelo de sujeito que se pre- tende educar, e com a Psicologia da Educação, que indica como o sujeito pode aprender. Nesta aula vamos estudar as relações da Didática com a Sociologia da Educação, pois os conteúdos a serem apren- didos nas situações didáticas são dados pela Sociedade, pela Cultura. No campo da Sociologia da Educação, alguns autores, como SAVIANI (1994), identificam uma polarização dos modelos explicativos sobre a or- ganização escolar e o trabalho que nela se realiza, entre as teorias não críticas e as teorias críticas. As teorias não críticas identificam a organi- zação escolar e o seu trabalho como a agência que difunde a instrução, transmite os conhecimentos acumulados pela humanidade sistematizados logicamente e assegura a manutenção dos valores universais. As teorias não críticas não focalizam o conflito existente na sociedade e, conseqüen- temente, na escola. FULLAT (1994) adverte que a educação em geral, especialmente a institu- cionalizada na forma de escola, sempre foi conflitiva, pois pretende trans- mitir noções muito discutíveis como “verdade”, “bondade” ou “beleza”. A escola propõe esses valores em função das lutas existentes entre os diversos grupos sociais, logo ela é estrutural e dinamicamente conflitiva, pois o projeto de sociedade não é único e vários projetos são propostos simultaneamente, mesmo que um possa se sobrepor aos demais. A partir dos diversos projetos de sociedade, são propostos diferentes tipos de “escola”, como a única, a pluralista e a plural. FULLAT (1994) define a “escola única” como a que não admite uma concepção de existência que seja diferente da proposta pelo poder hegemônico. A “escola pluralista” permite diferentes códigos morais no seu interior, enquanto a “escola plu- ral” entende que cada centro escolar possa se organizar independente- mente no que concerne à transmissão de saberes e valores. As teorias não críticas concebem a escola como única, sem conflitos, tal como se houvesse um único projeto de sociedade, isto é, o projeto social do poder hegemônico. Essa concepção identifica-se com a própria consti- tuição dos sistemas nacionais de ensino europeus que datam do início do século XIX. Nessa época, a consolidação da sociedade industrial exigiu a

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Aula: 06

Temática: As Interfaces da Didática com a Sociologia da Educação: as teorias não críticas

Nas aulas anteriores apontamos as interfaces da Didática com a Filosofia, que oferece o modelo de sujeito que se pre-tende educar, e com a Psicologia da Educação, que indica

como o sujeito pode aprender. Nesta aula vamos estudar as relações da Didática com a Sociologia da Educação, pois os conteúdos a serem apren-didos nas situações didáticas são dados pela Sociedade, pela Cultura.

No campo da Sociologia da Educação, alguns autores, como SAVIANI (1994), identificam uma polarização dos modelos explicativos sobre a or-ganização escolar e o trabalho que nela se realiza, entre as teorias não críticas e as teorias críticas. As teorias não críticas identificam a organi-zação escolar e o seu trabalho como a agência que difunde a instrução, transmite os conhecimentos acumulados pela humanidade sistematizados logicamente e assegura a manutenção dos valores universais. As teorias não críticas não focalizam o conflito existente na sociedade e, conseqüen-temente, na escola.

FULLAT (1994) adverte que a educação em geral, especialmente a institu-cionalizada na forma de escola, sempre foi conflitiva, pois pretende trans-mitir noções muito discutíveis como “verdade”, “bondade” ou “beleza”. A escola propõe esses valores em função das lutas existentes entre os diversos grupos sociais, logo ela é estrutural e dinamicamente conflitiva, pois o projeto de sociedade não é único e vários projetos são propostos simultaneamente, mesmo que um possa se sobrepor aos demais.

A partir dos diversos projetos de sociedade, são propostos diferentes tipos de “escola”, como a única, a pluralista e a plural. FULLAT (1994) define a “escola única” como a que não admite uma concepção de existência que seja diferente da proposta pelo poder hegemônico. A “escola pluralista” permite diferentes códigos morais no seu interior, enquanto a “escola plu-ral” entende que cada centro escolar possa se organizar independente-mente no que concerne à transmissão de saberes e valores.

As teorias não críticas concebem a escola como única, sem conflitos, tal como se houvesse um único projeto de sociedade, isto é, o projeto social do poder hegemônico. Essa concepção identifica-se com a própria consti-tuição dos sistemas nacionais de ensino europeus que datam do início do século XIX. Nessa época, a consolidação da sociedade industrial exigiu a

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qualificação da mão de obra e a manutenção dos interesses da burguesia, classe que ascendia ao poder com a reestruturação política gerada pela nova ordem econômica. A organização dos sistemas nacionais de ensino na Europa inspirou-se no princípio de que

A educação é direito de todos e dever do Estado. O direito de todos à Educação decorria do tipo de socie-dade correspondente aos interesses da nova classe que se consolidara no poder: a burguesia. Tratava-se de construir uma sociedade democrática, de conso-lidar a democracia burguesa, neste quadro, a causa da marginalidade é identificada com a ignorância. A escola surge como um antídoto a ignorância, logo um instrumento para equacionar o problema da margina-lidade. Seu papel é difundir a instrução, transmitir os conhecimentos acumulados pela humanidade e sis-tematizados logicamente. A escola se organiza como uma agencia centrada no professor, o qual transmite segundo uma gradação lógica, o acervo cultural dos alunos, A estes cabe assimilar os conhecimentos que lhe são transmitidos (SAVIANI: 1994:17).

A organização escolar do século XIX respondeu às neces-sidades do sistema capitalista de produção. Fazemos refe-rência ao sistema capitalista como um sistema econômico

baseado na propriedade privada dos meios de produção e na propriedade intelectual, na obtenção do lucro como decorrência do investimento de ca-pital e do risco assumido pela iniciativa privada e na regulamentação dos mercados pelas leis da oferta e da procura.. Essa concepção de capitalis-mo se apóia nas teses do liberalismo econômico, configuradas no século XVIII e consolidadas no século XIX. Nos finais do século XX, essas teses foram atualizadas sob a denominação de Neoliberalismo.