Felinos Retrovirus

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Retroviroses felinas i AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. Carlos Viegas e ao Prof. Dr. Nuno Alegria por terem aceitado orientar esta tese, pela inteira disposição e apoio. Ao Dr. Luís Montenegro e a toda a equipa do Hospital Veterinário Montenegro  pelo profissionalismo, d edicação, paciência em responder a todas as dúvidas e me terem incutido uma grande vontade de aprender e de progredir nesta área. Por todos os momentos de boa disposição, companheirismo, simpatia e confiança, têm o meu respeito e agradecimen tos sinceros. Ao Dr. Roberto Sargo, ao Luís, e à Susana, do CRATAS, um muito obrigada  pelo apoio, simpatia, e por me terem despertado um interesse crescente e um gosto especial pela medicina de animais exóticos e silvestres. Ao Dr. Hélder Almeida, à Dr. Cláudia, à Dr. Joana e à Vera do Hospital Veterinário Tuttinatura, um profundo agradecimento por me terem auxiliado durante o estágio. Por me terem motivado a fazer cada vez melhor e a não desistir, além de me inspirarem na escolha do tema da tese. À minha amiga, Carla Morgado, por me ter ajudado no tratamento dos dados com o programa estatístico XLSTAT, um profundo agradecimento. Pela enorme amizade, pelo companheirismo nos momentos difíceis, pela alegria demonstrada, e por tudo, muito obrigada. À minha família por apoiarem as minhas escolhas e acreditarem em mim, porque embora, estejam longe, são eles que definem a pessoa que sou. A todas as pessoas, que apesar de não terem sido referidas directamente, contribuíram de igual, ou maior modo para o término desta etapa e que, continuarão sempre a fazer parte da minha vida, o meu muito obrigada.

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    Retroviroses felinas

    i

    AGRADECIMENTOS

    Ao Prof. Dr. Carlos Viegas e ao Prof. Dr. Nuno Alegria por terem aceitado

    orientar esta tese, pela inteira disposio e apoio.

    Ao Dr. Lus Montenegro e a toda a equipa do Hospital Veterinrio Montenegro

    pelo profissionalismo, dedicao, pacincia em responder a todas as dvidas e me terem

    incutido uma grande vontade de aprender e de progredir nesta rea. Por todos os

    momentos de boa disposio, companheirismo, simpatia e confiana, tm o meu

    respeito e agradecimentos sinceros.

    Ao Dr. Roberto Sargo, ao Lus, e Susana, do CRATAS, um muito obrigada

    pelo apoio, simpatia, e por me terem despertado um interesse crescente e um gosto

    especial pela medicina de animais exticos e silvestres.

    Ao Dr. Hlder Almeida, Dr. Cludia, Dr. Joana e Vera do Hospital

    Veterinrio Tuttinatura, um profundo agradecimento por me terem auxiliado durante o

    estgio. Por me terem motivado a fazer cada vez melhor e a no desistir, alm de me

    inspirarem na escolha do tema da tese.

    minha amiga, Carla Morgado, por me ter ajudado no tratamento dos dados

    com o programa estatstico XLSTAT, um profundo agradecimento. Pela enorme

    amizade, pelo companheirismo nos momentos difceis, pela alegria demonstrada, e por

    tudo, muito obrigada.

    minha famlia por apoiarem as minhas escolhas e acreditarem em mim, porque

    embora, estejam longe, so eles que definem a pessoa que sou.

    A todas as pessoas, que apesar de no terem sido referidas directamente,

    contriburam de igual, ou maior modo para o trmino desta etapa e que, continuaro

    sempre a fazer parte da minha vida, o meu muito obrigada.

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    Retroviroses felinas

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    NDICE GERAL

    Resumo v

    Abstract vii

    Lista de Siglas e Abreviaturas ix

    ndice de Figuras x

    ndice de Grficos x

    PARTE IREVISO BIBLIOGRFICA .............................................................................. 1

    1. Introduo...................................................................................................................... 2

    2. Leucemia Vrica Felina ................................................................................................. 3

    2.1Etiologia .................................................................................................................... 3

    2.2Epidemiologia ........................................................................................................... 6

    2.3Patogenia ................................................................................................................... 8

    2.3.1 Infeco em regresso e sua posterior extino ................................................ 9

    2.3.2 Infeco e viremia persistente ......................................................................... 10

    2.3.3 Infeco latente ............................................................................................... 11

    2.3.4 Forma atpica .................................................................................................. 12

    2.4Sinais clnicos .......................................................................................................... 122.4.1 Infeces Secundrias .............................................................................. 13

    2.4.2 Sndrome de supresso da medula ssea ................................................. 15

    2.4.3 Neoplasias ................................................................................................ 16

    3. Imunodeficincia Vrica Felina .................................................................................. 18

    3.1Etiologia ................................................................................................................... 18

    3.2Epidemiologia .......................................................................................................... 20

    3.3Patogenia .................................................................................................................. 22

    3.4Sinais clnicos .......................................................................................................... 253.4.1 Fase aguda ....................................................................................................... 26

    3.4.2 Estdio latente ................................................................................................. 26

    3.4.3 Linfadenomegalia generalizada ...................................................................... 27

    3.4.4 Fase terminal ................................................................................................... 27

    4. Abordagem diagnstica s retroviroses felinas......................................................... 31

    4.1Leucemia Vrica Felina ............................................................................................ 32

    4.1.1 Mtodos de deteco directa ........................................................................... 32

    4.1.1.1 ELISA e IFA ......................................................................................... 324.1.1.2 PCR ....................................................................................................... 34

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    iii

    4.1.1.3 Isolamento do vrus ............................................................................... 36

    4.1.2 Interpretao dos resultados ............................................................................. 36

    4.1.3 Mtodos de deteco indirecta ......................................................................... 38

    4.2 Imunodeficincia Vrica Felina ............................................................................... 38

    4.2.1 Mtodos de deteco indirecta ......................................................................... 38

    4.2.1.1 ELISA ................................................................................................... 39

    4.2.1.2 Western blot ........................................................................................... 40

    4.2.2 Mtodos de deteco directa ............................................................................ 41

    4.2.2.1 Isolamento do vrus ............................................................................... 41

    4.2.2.2 PCR ........................................................................................................ 41

    5. Prognstico ................................................................................................................... 42

    6. Medidas de Preveno, Controlo e Maneio ............................................................... 43

    Como evitar a transmisso nos consultrios, clnicas e hospitais .....45

    Como evitar a transmisso em casa, no ambiente familiar? .......................................... 46

    Como evitar a transmisso e infeco em centros de criao e reproduo? ................ 46

    Como evitar a transmisso e infeco nos gatis e centros de abrigo? ........................... 47

    7. Vacinao ..................................................................................................................... 49

    7.1Leucemia Vrica Felina ............................................................................................ 49

    7.2Imunodeficincia Vrica Felina ................................................................................ 51

    8. Tratamento................................................................................................................... 52

    8.1 Tratamento de suporte .............................................................................................. 53

    8.2 Tratamento especfico .............................................................................................. 55

    8.2.1 Frmacos Imunomoduladores .......................................................................... 55

    8.2.1.1 Interferes .............................................................................................. 56

    8.2.1.1.1 Interfero alfa recombinante humano .................................... 56

    8.2.1.1.2 Interfero mega recombinante felino ................................... 57

    8.2.1.2 Protena A do Staphylococcus.............................................................. 58

    8.2.1.3 Acemannan ........................................................................................... 598.2.1.4Propionibacterium acnes .................................................................. 59

    8.2.1.5 PIND-ORF ............................................................................................. 59

    8.2.2 Frmacos anti-virais ......................................................................................... 60

    8.2.2.1 Azidotimidina ........................................................................................ 60

    9. Perspectivas Futuras ................................................................................................... 61

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    iv

    PARTE IITRABALHO EXPERIMENTAL ...................................................................... 63

    1. Objectivos..................................................................................................................... 64

    2. Material e Mtodos ..................................................................................................... 64

    2.1Definio da amostra populacional ............................................................. 64

    2.2 Colheita de dados......................................................................................... 64

    2.3 Testes Serolgicos ....................................................................................... 65

    2.4 Anlise de dados .......................................................................................... 66

    3. Resultados .................................................................................................................... 67

    4. Discusso dos resultados............................................................................................. 72

    4.1.Estado de sade .......................................................................................... 73

    4.2.Sexo e Estado Reprodutor ........................................................................... 74

    4.3.Raa ............................................................................................................ 75

    4.4.Idade ........................................................................................................... 75

    4.5.Acesso ao exterior ...................................................................................... 76

    4.6.Contacto com outros gatos ......................................................................... 76

    4.7.Sinais clnicos ............................................................................................ 77

    4.8.Relao da infeco retroviral com a PIF e com o linfoma ....................... 80

    4.9.Alteraes hematolgicas .......................................................................... 80

    4.10.Tipo de tratamento etiolgico utilizado ..................................................... 83

    4.11. Tempo de vida aps o diagnstico ........................................................... 84

    5. Concluso ..................................................................................................................... 85

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................................................... 87

    ANEXOS ................................................................................................................................... 94

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    v

    RESUMO

    Os retrovrus, constituintes da famlia de vrus ARN inclum vrios agentes

    infecciosos de importncia na Medicina Veterinria. O vrus da imunodeficincia felina,

    um lentivrus e o vrus da leucemia felina, um oncovrus causam nos gatos uma

    sndrome de imunodeficincia grave e esto associados a doenas neoplsicas,

    hematolgicas e imunosupressoras distintas. A preveno efectiva com a identificao e

    a segregao dos indivduos afectados alm da profilaxia atravs da vacinao so o

    melhor modo de combate infeco por estas doenas crnicas, j que no existe cura

    definitiva, apenas medicamentos que ajudam a melhorar a qualidade de vida do animal,

    a taxa de sobrevivncia e a evitar o aparecimento de doenas oportunistas.

    Neste trabalho analisou-se a frequncia de casos clnicos de gatosdiagnosticados a uma ou a ambas as retroviroses e a sua possvel relao com algumas

    variveis epidemiolgicas, no Hospital Veterinrio Montenegro do concelho do Porto

    no perodo de 1 de Janeiro de 2006 a 15 de Maio de 2009. O diagnstico da infeco

    baseia-se na deteco de antignios do VLF e de anticorpos contra o VIF em amostras

    de sangue submetidas a um kit comercial de ensaio imunoenzimtico (ELISA). Os

    resultados revelaram que durante o perodo de tempo definido foram diagnosticados

    16,49% dos 2129 gatos apresentados no Hospital, estando a infeco pelo VIF, peloVLF e a coinfeco pelos dois retrovrus presente respectivamente em 21,66%, 8,26% e

    em 4,27% dos casos diagnosticados. Verificou-se que dos 351 gatos diagnosticados

    54,4% eram do sexo masculino, 55% eram inteiros e que a raa predominante a

    europeia. A infeco pelo VIF atinge preferencialmente os gatos com mais de 6 anos

    enquanto que na infeco pelo VLF e na coinfeco pelos dois retrovrus os gatos com

    menos de 4 anos so os mais afectados. Dos casos diagnosticados positivos 75,8%

    tinham acesso ao exterior, 55,8% contactavam com outros gatos e, que 44,2%

    conviviam com gatos tambm diagnosticados.

    Os principais sinais clnicos apresentados pelos 109 gatos diagnosticados

    positivos doentes foram a prostrao (52,3%), a anorexia (49,5%), os sinais

    respiratrios (22,02%), e as feridas de pele (17,4%); j em relao s alteraes

    hematolgicas encontrou-se anemia em 42,5%, a leucopenia em 27,9% e a leucocitose

    em 32,35% dos casos positivos que tm estes dados. Relativamente possibilidade de

    encontrar-se uma associao entre a infeco retroviral e a presena de PIF ou linfoma,

    no se encontrou uma ligao com a peritonite infecciosa felina j em relao ao

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    linfoma, este estava presente em 8,3% dos gatos positivos doentes, mais na infeco

    pelo VLF e sob a forma mediastnica. Todos os gatos positivos doentes obtiveram

    tratamento de suporte contudo apenas 8,33% dos positivos receberam tratamento

    etiolgico especfico. Apesar de muitos proprietrios optarem por eutanasiar o seu

    animal logo aps um resultado positivo ao diagnstico, 60% dos gatos diagnosticados

    encontro-se vivos pelo menos at actualidade. A deciso para o tratamento ou para a

    eutansia no deve basear-se exclusivamente na presena duma infeco retroviral j

    que, com o cuidado apropriado muitos gatos infectados podem viver durante anos com

    uma boa qualidade de vida.

    importante cada vez mais obter um conhecimento mais aprofundado sobre

    estas doenas debilitantes, que no caso da imunodeficincia vrica felina afecta o animal

    para toda a sua vida, de modo a fornecer uma melhor qualidade de vida e uma maior

    esperana de vida aos nossos animais de estimao.

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    ABSTRACT

    Retrovirus, constituent of the family of RNA virus, includes some infectious

    agents with great importance in the Veterinary Medicine. The FelineImmunodeficiency Virus (FIV), a lentivirus and the Feline Leukaemia Virus (FeLV), an

    oncornavirus causes in cats a serious immunodeficiency syndrome and are associates to

    distinct neoplastical, haematological and immunosuppressive illness. The effective

    prevention with identification and segregation of the infected individuals, beyond the

    prophylaxis through the vaccination are the best strategies to control an infection for

    these chronicle diseases. There isa definitive cure, only drugs that help to improve

    the quality of life, the survive rate and to prevent the appearance of opportunist diseases.In this study it was analysed the clinical cases frequency of retroviral diagnostic

    cats and its possible relationship with some epidemiological variables, in the

    up to May, 15 of 2009. The infection diagnosis is based on the detection of FeLV

    antigen and FIV antibodies in submitted samples of blood to a commercially test-kit

    enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA). The results showed that during the

    defined period of time, has been diagnosised 16.49% of the 2129 cats presented in the

    Hospital; being present the infection for the FIV, FeLV and the coinfection for the two

    retrovirus respectively in 21.66%, 8.26% and in 4.27% of the diagnosised cases. It was

    verificated that of 351 diagnosised cats, 54.4% were male, 55% were entire and the

    European is the predominant race. The FIV infection preferential reaches the cats with

    more than 6 years while in the FeLV infection and the coinfection for the two retrovirus

    are infected the cats with less than 4 years. Of positives diagnosis cases, 75.8% had

    outside access, 55.8% contacted with other cats, and that 44.2% sociabilited also with

    diagnosis cats.

    The main clinical signs presented by the 109 sick positive diagnosis cats had

    been the depression (52.3%), the anorexia (49.5%), the respiratory signs (22.02%) and

    the skin wounds (17.4%), already in relation to the haematological abnormalities, one

    met anaemia in 42.5%, the leucopenia in 27.95% and leucocytosis in 32,35% of positive

    cases that have this values. We did not found a linking between the retroviral infection

    and presence of feline infectious peritonitis. Already in relation to lymphoma, it was

    present in 8.3% of the sick positive cats, more in the FeLV infection and in the

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    mediastinal form. All sick positive cats had gotten symptomatic treatment however only

    8.33% of positive received antiretroviral therapy. Although many owners have adopted

    euthanasia after a positive result in diagnosis, 60% of the diagnosised cats presents alive

    at least actuality. A decision for treatment or for euthanasia should never be based

    solely on the presence of a retrovirus infection, with proper care many retrovirus-

    infected cats may live for several years with good quality of live.

    Each more time it is important to get a further deepened knowledge on these

    debilitating illnesses that, in case of the feline immunodeficiency affect the animal for

    all its life, in order to supply one better quality of life and to prolongs the life

    expectation of ours pets.

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    LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

    gmicrograma

    ADN - cido desoxirribonucleco

    ALTAlanina aminotransferaseARNcido ribonucleco

    ARNmcido ribonucleco mensageiro

    AZT-zido--

    BIDDuas vezes por dia

    CrFK - Clulas do Rim Felino de Crandell

    ELISA Enzyme-linked immunosorbent

    assay (Ensaio Imunoenzimtico)

    EUAEstados Unidos da Amrica

    FOCMA Antignio da Membrana Celular

    Oncornavrus Felino

    FHVFeline Herpesvirus

    GABA -aminobutyric acid (cido gama-

    aminobutrico)

    GB - Glbulos Brancos

    GIGastrointestinal

    ID - Intestino Delgado

    IFA Immunofluorescent antibody (Ensaio

    de Imunofluorescncia de anticorpos)

    IgImunoglobulina

    IL - Interleucina

    IM- Intramuscular

    IPIntraperitoneal

    ITUI

    Infeco do Tracto Urinrio InferiorIVIntravenoso

    LESLpus Eritematoso Sistmico

    KgQuilograma

    MCAAnlise de Correspondncia Mltipla

    MEMicroscopia electrnica

    MOMedula ssea

    Pg.Pgina

    PCRPolymerase chain reaction (Reacoem cadeia da polimerase)

    PIFPeritonite Infecciosa Felina

    POper os (oral)

    rFeG-CSFRecombinant feline granulocyte

    colony-stimulating factor (Factor estimulador

    da granulopoiese recombinante felino)

    rhG-CSFRecombinant human granulocyte

    colony-stimulating factor (Factor estimulador

    da granulopoiese recombinante humano)

    SCSubcutneo

    SIDUma vez por dia

    SIDA Sndrome de Imunodeficincia

    Adquirida

    SNCSistema Nervoso Central

    TNF Tumor necrosis factor (Factor de

    necrose tumoral)

    UIUnidade Internacional

    VIF - Vrus de Imunodeficincia Felina

    VIH- Vrus da Imunodeficincia Humana

    VLFVrus da Leucemia Felina

    VLF-A Subgrupo A do Vrus da Leucemia

    felina

    VLF-AIDS Sndrome da Imunodeficincia

    Adquirida Felina associada ao Vrus da

    Leucemia Felina

    VSFVrus do Sarcoma Felino

    WB

    Western-blothing

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    NDICE DE FIGURAS

    Figura 1. Micrografias electrnicas de viries do VLF a ligarem-se membrana celular da

    clula infectada e de partculas vricas maduras do VLF tipo C, no meio extracelular

    Figura 2.Intestino delgado dum gatinho VLF negativo com linfoma alimentar

    Figura 3. Micrografias electrnicas de viries do VIF a ligarem-se membrana celular da

    clula infectada e das partculas vricas maturas extracelulares

    Figura 4.Distribuio global dos subtipos do Vrus da Imunodeficincia felina

    Figura 5.Gengivite e estomatite grave no arco glossopalatino em gato com imunodeficincia

    vrica felina

    Figura 6.Infeco do aparelho respiratrio superior num gato com imunodeficincia vrica29

    Figura 7.Gengivite linfoplasmocitria num gato com

    Figura 8.Anemia grave e prostrao num gato com leucemia vrica felinaFigura 9. Prostrao e anemia grave num gato co-infec 83

    NDICE DE GRFICOS

    Grfico 1.Distribuio dos gatos analisados conforme o resultado do teste de 67

    Grfico 2. Distribuio dos gatos diagnosticados positivos quanto ao

    Grfico 3. Distribuio dos gatos diagnosticados quanto ao sexo 8

    Grfico 4.Distribuio dos gatos diagnosticados quanto ao sexo e estado reprodutivo

    Grfico 5. Distrib Grfico 6.Distribuio 69

    Grfico 7. Distribuio dos gatos diagnosticados quanto 9

    Grfico 8.Distribuio dos gatos diagnosticados positivos quanto ao acesso ao

    Grfico 9.Distribuio dos gatos diagnosticados positivamente quanto ao contacto com outros

    gatos e/ou acesso ao exter 70

    Grfico 10. Distribuio dos gatos com diagnstico positivo quanto ao contacto com outros

    Grfico 11.Percentagens dos sinais clnicos apresentados pelos gatos VLF positivos doentes.70

    Grfico 12. Percentagens dos sinais clnicos apresentados pelos gatos VIF positivos doentes. 71

    Grfico 13. Percentagens dos sinais clnicos apresentados pelos gatos VIF/VLF positivos

    doentes

    Grfico 14. Distribuio dos gatos diagnosticados com PIF em relao ao diagnstico do estado

    ..71

    Grfico 15.Distribuio dos gatos positivos em relao presena ou ausncia de

    Grfico 16.Distribuio dos gatos positivos em relao a alteraes no nmero de leuccitos

    em circulao .72

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    PARTE IREVISO BIBLIOGRFICA

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    1. INTRODUO

    As doenas retrovirais como a leucemia vrica felina, causada pelo vrus da

    leucemia felina (VLF) e a imunodeficincia vrica felina, causada pelo vrus da

    imunodeficincia felina (VIF) representam uma importante causa de morbilidade e

    mortalidade nos gatos domsticos9,87,100,103. Na prtica clnica felina cada vez mais

    frequente encontrar gatos com diagnstico positivo a estas doenas18,100, no entanto,

    apenas so testados menos de um quarto dos animais18.

    Disseminados pelo mundo inteiro20 afectando at 44% dos gatos17 dependendo

    da regio geogrfica, da densidade felina local e do estilo de vida24,102,103, os retrovrus

    felinos aps um longo perodo de incubao estabelecem infeces persistentes nos

    hospedeiros. Conduzem frequentemente a doenas graves na maioria das vezes fatais77,sendo responsveis por uma srie de condies como anemia, linfoma, inflamaes

    crnicas, e pelo aumento da susceptibilidade a infeces oportunistas18,20.

    A descoberta do vrus da leucemia felina foi determinante para o avano da

    oncologia viral e os estudos acerca da sua infeco influenciam directamente os

    trabalhos que conduzem ao desenvolvimento dos retrovrus humanos24. O VIF

    biologicamente semelhante ao vrus da imunodeficincia humana (VIH) 48,53,55,83e por

    isso conhecido como causa da Sndrome de Imunodeficincia (SIDA) felina, no entantoantigenicamente so distintos106. A sua infeco causa uma sndrome de

    imunodeficincia6,19 e providencia um modelo animal precioso para o estudo da

    patogenia do VIH4,9,13,54,55,60,61,77,81,83 e dos mecanismos de supresso da medula ssea

    associados SIDA humana59,87. Os gatos tm um baixo custo de manuteno, so fceis

    de manipular e existem muitos infectados naturalmente com o VIF24, pelo que podem

    ser utilizados em ensaios teraputicos sobre a infeco pelo VIH65,83.

    O vrus da leucemia e o vrus da imunodeficincia felina pertencem famliaRetroviridaepois tm a capacidade de usar a enzima transcriptase reversa, que permite

    criar a partir do ARN viral no citoplasma celular uma cpia de ADN complementar que

    se integra, atravs da enzima integrase, no genoma da clula hospedeira, como

    provrus17,20,24,77,101,102. Este processo essencial ao ciclo de vida de todos os retrovrus

    e constitui a base da persistncia viral que caracteriza a infeco 77. Existem vrias sub-

    famlias de retrovrus, designadas de Oncovirinae, Lentivirinae e Spumavirinae

    respectivamente por provocar neoplasias, por desencadear infeces lentas, e por

    conferir s clulas infectadas um aspecto espumoso45,77.

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    A estrutura genmica dos retrovrus bastante similar entre eles possuindo

    todos, os genes: gag, pole envque codificam respectivamente as protenas estruturais

    do core do ncleo do virio, as enzimas responsveis pela replicao e integrao do

    vrus (a transcriptase reversa e a integrase) e as protenas do envelope (as glicoprotenas

    de superfcie e as protenas transmembranrias) 77. O vrus da leucemia felina possui

    uma estrutura genmica simples e sobrevive no hospedeiro graas supresso do

    sistema imunitrio que desencadeia, levando os antignios virais a um estado de anergia

    ou imunotolerncia, sendo por isso um vrus antigenicamente bem conservado77. Alm

    disso, uma das maiores caractersticas que distingue o VLF dos outros retrovrus, que

    os gatos expostos ao vrus podem recuperar e tornarem-se no virmicos77. O VIF

    apresenta uma estrutura genmica mais complexa incluindo alm desses 3 genes

    principais, genes responsveis por manter o vrus num estado latente evitando a sua

    eliminao face a uma resposta imunitria77. Existem tambm retrovrus menos

    patognicos que so os vrios elementos retrovirais endgenos, transmitidos

    geneticamente de uma forma silenciosa nas clulas da linha germinativa em todos os

    gatos77.

    Os retrovrus so um tipo de vrus bastante peculiar; so poucos resistentes

    sobrevivendo apenas minutos fora do hospedeiro, susceptveis a todos os desinfectantes,

    de cultura difcil95,100e no entanto extremamente bem sucedidos77.

    2. LEUCEMIA VRICA FELINA

    2.1. ETIOLOGIA

    O vrus da leucemia felina, mais precisamente o subtipo C101, foi descoberto por

    William Jarret em 1964, quando investigava casos de linfoma em gatos 17,24,87,100. Em

    estudos posteriores, demonstrou que se transmite entre os gatos e induz o aparecimentode linfomas e de uma srie de doenas degenerativas tais como a anemia e a atrofia

    tmica101. Este vrus pertence famlia Retroviridae, sub-familia Oncovirinae e ao

    gnero Gammaretrovirus94. do tipo ARN, mede cerca de 110 nm de dimetro e tem o

    genoma diplide encapsulado por um core icosadrico que est envolvido pelo envelope

    derivado da clula hospedeira24,101(Figura 1). A ligao da glicoprotena de superfcie

    gp70 (indutora da formao de anticorpos neutralizantes) 106 membrana celular da

    clula do hospedeiro realizada pela protena transmembranar p15E que desempenha

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    Figura 1: Micrografias electrnicas de viries do VLF a ligarem-se membrana celular da clula infectada ( esquerda) e departculas vricas maduras do VLF tipo C, no meio extracelular (direita). Os viries maduros medem cerca de 110-120 nm dedimetro e contm as tpicas nucleocpsides redondas (Adaptadode: LINENBERGER, M.L., & ABKOWITZ, J.L. 1995).

    uma importante funo como mediadora da imunodepresso e da anemia no

    regenerativa principalmente em gatos com infeco persistente24,102.

    Dentro da clula

    hospedeira, a transcriptase

    reversa permite a transcrio do

    ARN viral em ADN

    complementar, originando-se o

    provrus; em seguida, este

    integra-se no genoma celular para

    servir depois como molde para a

    formao de novas partculas

    virais. A diviso da clula conduz

    transcrio dos genes provirais com a produo de protenas e ARN virais.

    Posteriormente, ocorre a libertao do vrus por extruso dos cores da membrana celula,

    sem ocorrer necessariamente a destruio da clula hospedeira24,94,101. Tal como as

    protenas vricas codificadas pelo gene env(gp70 e p15E), uma das protenas estruturais

    do ncleo viral codificadas pelo genegag, a p27, tem uma grande importncia pois o

    antignio pesquisado nos testes serolgicos e existe com abundncia no plasma e

    citoplasma das clulas infectadas24,101,106. Tambm codificadas pelo genegag, existem a

    protena p10 da nucleocpside e a protena p15 da matriz do core viral87,101. Codificadas

    pelo genepolso a transcriptase reversa (p70), a protease (p13) e a integrase (p47) 87,101

    (Figura 1 dos Anexos, pgina 95).

    Os retrovrus podem-se denominar de ex ou

    . Alm disso, os retrovrus exgenos tambm se

    classificam conforme a habilidade do provrus em replicar e formar viries infecciosos

    (replicao-competente) como o VLF, ou em requerer algo como mutaes ou

    deleces para se tornarem infecciosos87.

    Os retrovrus endgenos, de transmisso vertical e identificados no genoma de

    gatos no infectados77,87,94, incluem sequncias homlogas ao VLF (como o envVLF) e

    regies geneticamente no relacionadas ao VLF (como o vrus RD-114) 77. O envVLF,

    fraco endgena de ADN prviral de origem murina94no se replica logo no participa

    na produo de novas partculas virais infecciosas, devendo-se a sua importncia ao

    facto de poder recombinar-se com o ADN do VLF-A100

    . Os genes envVLF expressam-se tanto em indivduos com linfoma VLF negativos como nos VLF positivos e podem

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    estar relacionados com a formao de anticorpos anti-FOCMA87. O FOCMA (Antignio

    da Membrana Celular Oncornavrus Felino) um antignio tumoral especfico induzido

    tanto pelo VLF como pelo Vrus do Sarcoma Felino (VSF) e est presente na membrana

    das clulas neoplsicas24. A presena deste antignio torna o animal sensvel ao

    desenvolvimento de neoplasias, e o gato que produz anticorpos anti-FOCMA est

    protegido em certa medida do desenvolvimento de neoplasias mas no de doenas no

    neoplsicas causadas pelo vrus24. O vrus RD-114 de origem primata replicao-

    competente94no entanto, as clulas felinas no so susceptveis a este vrus, logo no

    patognico para os gatos94. Alm disso, no h evidncias da ligao de sequncias

    deste vrus ao VLF87.

    O VLF classifica-se em trs subgrupos de transcendncia clnica103, designados

    de A, B e C de acordo com o polimorfismo dos receptores da glicoprotena gp70 do

    envelope viral24,87. Estes trs subgrupos variam morfologicamente mas, apresentam

    semelhanas antignicas e esto imunologicamente relacionados94podendo detectarem-

    se mas no distinguirem-se mediante testes de diagnstico103. O VLF-A a forma

    infecciosa e predominante estando presente em todos os gatos com infeco natural94,

    porm o menos patognico24,100,101. um agente ubiquitrio e pode estar associado aos

    subgrupos B, C ou a ambos, em que sem a sua presena no possvel a formao

    desses subgrupos. A criao dos subgrupos B e C ocorre respectivamente, por

    recombinao do provrus do VLF-A integrado com sequncias gnicas de retrovrus

    endgenos como o envVLF e por mutaes do gene envdo VLF-A24,77,94,100,101.

    O subgrupo A geralmente restringe-se espcie felina, enquanto nos subgrupos

    B e C h uma grande variedade de hospedeiros1infectando gatos, seres humanos e ces,

    e ainda no caso do subgrupo C, os porquinhos-da-ndia101. O subgrupo B presente

    aproximadamente em metade dos gatos com infeco natural103, pode causar doena

    mieloproliferativa (principalmente associado leucemia e ao linfoma tmico) 1 ou

    mielosupressora como a anemia no regenerativa1, estando normalmente ligado a

    malignidade100. Os gatos infectados simultaneamente pelos subgrupos A e B tm um

    maior risco de desenvolver linfoma do que os gatos infectados somente com o subgrupo

    A24,77,103. O subgrupo C que est presente apenas em 1 a 2% dos animais com infeco

    natural103 est associado ao desenvolvimento de anemia no regenerativa

    grave24,87,77,100,101. Alm destes trs subgrupos, existe um quarto subgrupo denominado

    de subgrupo T que responsvel por depleo linfide e imunodeficincia devido aotropismo por linfcitos T24,94. O mecanismo pelo qual diferenas no envelope viral

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    determinam diferentes patogenicidades entre os subgrupos permanece actualmente

    desconhecido100. Uma estirpe viral variante do subgrupo A responsvel pela sndrome

    de imunodeficincia adquirida felina associada ao VLF (VLF-FAIDS) tem sido isolada

    em gatos com linfoma e imunodeficincia grave e, conduz morte a quase a todos os

    animais infectados24.

    2.2. EPIDEMIOLOGIA

    uma doena de distribuio mundial nos gatos domsticos e ocorre

    esporadicamente em algumas espcies de felinos selvagens70,94,100,101 no sendo no

    entanto, enzotica nestes excepto no Felis sylvestris94na Europa100. Foram encontradas

    algumas sequncias de retrovrus endgenos intimamente relacionadas ao VLF em

    gatos no domsticos, por exemplo noF. margaritae noF. chaus. No sendo uma fonte

    directa de doena, estas sequncias endgenas podem participar na recombinao com o

    VLF exgeno para a criao de novas variantes101.

    H pouca informao fivel acerca da prevalncia actual da doena nos vrios

    pases94. A prevalncia nos gatos saudveis similar por todo o planeta variando entre

    177a 8 %106, diferenciando-se da Imunodeficincia Vrica Felina em que a prevalncia

    varia significativamente com a regio geogrfica102. Nos EUA, Canad e em alguns

    pases da Europa a prevalncia do VLF nos gatos solitrios inferior a 1% enquanto,

    nos gatos que convivem em grupo sem a implementao de medidas de preveno

    maior que 20%94. No entanto, numa populao em que o vrus enzotico a prevalncia

    maior, cerca de 30 a 40%77. Ao longo dos ltimos vinte e cinco anos felizmente tm-

    se assistido a uma diminuio da prevalncia da infeco a nvel mundial 37, em parte

    devido prtica corrente de execuo de testes fiveis de diagnstico, de programas de

    remoo dos infectados, melhor compreenso dos mecanismos de patognese e

    introduo da vacinao18,31,94,100.

    A transmisso horizontal do vrus ocorre de forma directa pelo contacto ntimo

    entre gatos, nas lambidelas e durante o acasalamento, ou indirecta atravs de fmites,

    partilha de comedouros, bebedouros e liteiras infectadas24,102,106. As mordidelas tambm

    podem ser uma fonte de contgio, mas infrequente103, sendo necessrio um contacto

    ntimo prolongado para ocorrer a transmisso101,103. A saliva a principal forma de

    eliminao e de transmisso77,24e a via oronasal a porta de entrada mais comum24,100.

    Alm da saliva, soro, plasma, secrees nasais e leite o vrus tambm encontrado emmenores quantidades, nas lgrimas, urina e fezes de gatos infectados24,94,102. A carga

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    viral na saliva maior que no plasma e a concentrao do vrus no sangue e saliva de

    gatos virmicos saudveis to alta como nos gatos virmicos doentes100. Os gatos com

    infeco persistente e em bom estado de sade so os maiores reservatrios do vrus

    eliminando grandes quantidades na saliva103. Como o vrus no sobrevive muito tempo

    fora do hospedeiro a transmisso atravs das fezes, urina, fmites e aerossol pouco

    provvel de ocorrer102, no entanto, sobrevive se mantido em locais hmidos a 37C.

    Alm disso, existe o potencial risco de transmisso iatrognica como o uso de agulhas e

    instrumentos cirrgicos contaminados e a transfuso de sangue infeccioso em gatos no

    infectados94,100.

    As fmeas virmicas podem transmitir o vrus verticalmente aos filhotes atravs

    da placenta, in utero, resultando em reabsoro fetal, aborto ou morte neonatal24,94,100.

    Os gatinhos que sobrevivem ao perodo neonatal, cerca de 20%, tornam-se

    persistentemente virmicos100. Nas gatas com infeco latente (no h viremia) no

    ocorre a transmisso in utero durante a gravidez, no entanto em casos raros alguns

    gatinhos, filhos dessas gatas, tornam-se virmicos aps o nascimento94. Nesta situao,

    a transmisso toma lugar na glndula mamria onde o vrus permanece latente at ser

    reactivado com a gravidez94, o que explica estarem descritos casos de infeco isolada

    na mama em gatas serologicamente negativas100. Outros modos de transmisso vertical

    so atravs do colostro e do leite durante a amamentao, ou atravs da saliva durante

    os cuidados de higiene e limpeza24,100.

    O vrus da leucemia felina pode infectar o gato em qualquer perodo da sua vida

    mas geralmente so os jovens os mais susceptveis principalmente entre as 16 semanas e

    os 6 anos de idade17,24,31,32,44,94. Aps a inoculao experimental do vrus a infeco

    atinge 70 a 80% dos gatinhos neonatos de forma persistente, 30 a 50% dos gatos que

    tm idades entre as 8 a as 12 semanas e 10 a 20% dos gatos jovens e adultos106. Com o

    avanar da idade a imunidade mediada por clulas e a resposta humoral declinam 44, o

    sistema imunitrio torna-se mais maduro e ocorre uma resistncia adquirida ao

    vrus32,94,106que pode ser inibida com a administrao de corticoesterides106. Muitos

    casos so diagnosticados em gatos com menos de 4 anos de idade106 e se a primeira

    exposio ao vrus ocorre depois do primeiro ano de idade, h uma menor tendncia

    para a infeco44. A exposio acumula-se com a idade mas a susceptibilidade

    infeco e a severidade dos sinais clnicos diminui106. Alm disso, estes animais

    morrem mais jovens o que leva a que se encontre poucos animais infectados com idadesavanadas24.

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    Em relao predisposio sexual dos gatos infectados, h autores que referem

    que os machos so mais susceptveis enquanto, que outros afirmam no haver

    predisposio relacionada com o sexo e que a transmisso facilitada pelo

    comportamento social dos animais24. Num estudo realizado nos Estados Unidos em

    gatos de risco e clinicamente doentes demonstrou-se que os machos (15%) so mais

    infectados que as fmeas (11%), que os gatos de raa cruzada (13%) correm maior risco

    de infeco que os de raa pura (10%)

    relao aos 106. Alm da idade jovem, as fracas condies de higiene94e

    as reas de elevada densidade populacional como os abrigos e os centros de criao, so

    os principais factores de risco de infeco, assim como os gatos com acesso livre ao

    , em relao queles que vivem isolados ou sob condies de

    confinamento 31,32,98,102,106.

    Os gatos infectados tm maior tendncia sobre os no infectados para transmitir

    agentes zoonticos como o Cryptosporidium parvume a Salmonella spp. no ambiente

    humano102. Algumas estirpes do VLF podem desenvolver-se em culturas de tecidos

    humanos, o que coloca em hiptese uma possvel transmisso da infeco ao Homem.

    No entanto vrios estudos tm tratado deste tema, e nenhum at ao momento evidenciou

    a existncia desse risco103.

    2.3. PATOGENIA

    A patogenia depende de vrios factores relacionados com o vrus e com o

    hospedeiro como a dose infectante, o grau de virulncia, o tempo de exposio, as

    condies ambientais, as doenas concorrentes, a idade e a resposta imunitria

    individual24,100. As clulas-alvo de infeco so os linfcitos B e T, os macrfagos, os

    moncitos, os precursores dos eritrcitos e os megacaricitos87.

    Existem dois tipos de classificao da infeco; o primeiro divide-a em 6

    estdios e o segundo em quatro categorias de acordo com a resposta do sistema

    imunitrio: eliminao da infeco, infeco em progresso, infeco em regresso e

    infeco na forma atpica24.

    No primeiro estdio aps a inoculao oronasal, o vrus replica-se no tecido

    linfide local da orofaringe, nas clulas mononucleares das amgdalas e nos linfonodos

    regionais da cabea e pescoo24,94,100,103. A partir da, a infeco prolonga-se para os

    linfcitos e moncitos circulantes constituindo a viremia primria (segundo estdio), emque os antignios virais so detectados na circulao sangunea24. Isto resulta em

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    resultados discordantes: testes imunocromticos positivos e IFA negativos, explicando

    assim a maior sensibilidade dos primeiros testes na deteco da infeco106(Quadro 1

    dos Anexos, pg. 95). O tempo entre a infeco e a presena de antignios detectveis

    varia mas, provvel que sejam 28 dias103.

    2.3.1. Infeco em regresso e sua posterior extino

    Depois da primeira viremia nas clulas mononucleares, antes da medula ssea

    ficar infectada, alguns gatos eliminam totalmente o vrus do organismo100. Essa viremia

    torna-se transitria, na maioria dos casos dura 4 a 8 semanas, podendo ir at aos 3

    meses e caracterizada inicialmente por febre e linfadenopatia24,100,101. Durante esse

    tempo os gatos so infecciosos, e os testes de deteco de antignios originam

    resultados positivos100,101

    (Quadro 2 dos Anexos, pg. 95).Posteriormente, estes gatos regressores e imunocompetentes tm uma efectiva

    resposta imunitria parcialmente humoral e celular e exibem ttulos elevados de

    anticorpos neutralizantes detectveis, no havendo o risco futuro de desenvolverem a

    doena94. Praticamente toda a actividade dos anticorpos desloca-se para as protenas do

    envelope viral (gp70) no havendo resposta s protenas codificadas pelo gene gag,o

    que parece contraditrio, j que os gatos recuperados produzem anticorpos ao maior

    produto derivado de gag, a p27, o que conclui que os animais so apenastransitoriamente anrgicos s protenas derivadas de gag77. No entanto, a produo de

    anticorpos nem sempre requisito para proteco imunitria; cerca de 2% dos gatos

    esto protegidos eficazmente sem anticorpos100, devendo-se a proteco aco dos

    linfcitos T citotxicos94. Foi demonstrado que os linfcitos T aparecem antes dos

    anticorpos neutralizantes e, a seguir transferncia adoptiva destas clulas a gatos

    virmicos a carga viral diminuiu, constatando-se que a resposta imunitria activa celular

    importante no combate infeco94. A presena de anticorpos neutralizantes est

    correlacionada com a resistncia a infeces subsequentes100 e a sua transferncia

    passiva pode proteger os gatinhos da infeco94,97,102. A infeco inicial torna-se ento

    indetectvel, j que os gatos no apresentam uma resposta positiva nos mtodos de

    diagnstico de deteco de antignios100. Os animais recuperados apresentam a mesma

    esperana de vida que aqueles que nuca tiveram expostos ao vrus94.

    A disseminao viral continua para as clulas mononucleares da medula ssea,

    do timo, bao, tecido linfide do tracto gastrointestinal, clulas epiteliais da bexiga e

    para os linfonodos distantes (terceiro estdio) 24,103. Aps 3 semanas de viremia as

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    clulas da medula ssea so infectadas, depois de isso acontecer o animal no consegue

    eliminar completamente o vrus do organismo, podendo ficar persistentemente virmico

    ou com a infeco em estado latente100.

    O quarto estdio que ocorre 2 a 6 semanas ps-exposio corresponde infeco

    aguda87,103. O vrus replica-se nos leuccitos e plaquetas da medula ssea e nas clulas

    do epitlio intestinal que esto em actividade mittica24. Na saliva iro ser secretadas a

    maioria das partculas virais que so responsveis pela transmisso horizontal106. O

    vrus detectado no plasma (antigenemia), nos leuccitos circulantes e desenvolve-se a

    imunidade humoral e mediada por clulas87. Esta fase detectada com pouca frequncia

    e caracterizada por febre leve, prostrao, linfadenopatia e citopenias sanguneas103. A

    evoluo da infeco a partir desta fase depende da competio entre a capacidade de

    amplificao do vrus no hospedeiro e a habilidade do sistema imunitrio em debelar a

    progresso da doena. O resultado desta competio influencia directamente os testes de

    diagnstico de deteco de antignios virais24.

    Quando ocorre a passagem para o quinto estdio que dura 4 a 6 semanas, as

    clulas infectadas da medula ssea podem produzir 105-107 partculas virais, tendo

    ento uma grande capacidade de disseminao que caracteriza a fase de viremia

    persistente24. Finalmente, no sexto estdio com durao tambm de 4 a 6 semanas, o

    vrus dissemina-se para todos os tecidos epiteliais do intestino e da bexiga, glndulas

    salivares e lacrimais e eliminado nas secrees, saliva, urina e fezes24,94.

    2.3.2. Infeco e viremia persistente

    No caso de a infeco progredir por mais de 16 semanas muito provvel que o

    gato se torne virmico persistente e infeccioso para os outros gatos durante toda a

    vida106. Aproximadamente 50% dos gatos urbanos e suburbanos com acesso livre ao

    exterior tm evidncias serolgicas de exposio ao vrus, desses, 1 a 5% esto

    activamente infectados e uma proporo ainda menor apresenta sinais de doena101.

    Enquanto a viremia transitria e a infeco latente esto associadas a recuperao, os

    gatos virmicos persistentes desenvolvem doenas degenerativas e, tumores linfides e

    hematopoticos77o que predispe morte entre dois a cinco anos (na mdia trs anos)

    aps a infeco24,31,101,102. Um estudo analisou a taxa de mortalidade de gatos virmicos

    persistentes que habitam reas de grande densidade populacional felina, concluindo que,

    aproximadamente 50% morre em dois anos e 80% em 3 anos mais por causas

    degenerativas associadas a imunosupresso, do que por causas tumorais87,100,101. Pelo

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    contrrio, os gatos virmicos persistentes que no convivem com outros gatos e esto

    restritos em termos de locais de acesso, conseguem ter taxas de sobrevivncia

    elevadas100.

    A habilidade do VLF em se integrar no genoma da clula hospedeira um dos

    factores mais importantes para a ocorrncia de viremia persistente106, estando o risco de

    a desenvolver principalmente dependente da presso da infeco e do estado imunitrio,

    mas tambm da idade do gato77,100. Os gatos infectados jovens comparativamente com

    os adultos, so mais susceptveis viremia do que recuperao77; sendo as infeces

    em gatos adultos resultantes em viremia transitria, seguida ou no por um perodo de

    latncia. Adicionalmente, a viremia persistente mais comum em gatos de raa pura e

    nos que vivem em grupos24,31.

    Estudos recentes no Reino Unido mostraram que a taxa de prevalncia de

    infeco activa em gatos doentes de 18% e, nos indivduos saudveis de 6%101.Alm

    disso, a exposio ao vrus repetida e a altas doses muito provvel de causar viremia

    persistente100. Nos gatos virmicos h supresso da formao de anticorpos

    neutralizantes, o que se pressupe ser a razo para no haver uma presso imune

    selectiva ao vrus nem para o aparecimento de variantes antignicas77.

    2.3.3. Infeco latenteA infeco em regresso com perodo de latncia, correspondendo a um estado

    intermdio entre a viremia persistente e a recuperao77, ocorre quando o animal

    infectado capaz de inactivar o vrus mas no de promover a sua eliminao contendo o

    vrus latente na medula ssea24,77,101. O VLF sequestrado na forma de provrus

    integrado no genoma das clulas germinativas da medula ssea, bao, intestino e

    linfonodos durante semanas, meses a anos24,102. As gatas prenhes com infeco latente

    podem transmitir o vrus sua descendncia, atravs do leite. A grande maioria dos

    gatos no desenvolve doenas relacionadas com o vrus101 e consegue debelar a

    infeco, raramente revertendo para infeco produtiva24. Nesta fase no ocorre

    transmisso do vrus a outros gatos, no h viremia17 e os resultados dos testes de

    diagnsticos de deteco de antignios so negativos at ocorrer a reactivao100. A

    presena do vrus em latncia pode ser demonstrada por PCR na medula ssea100e pela

    identificao de ADN prviral no sangue18(Quadro 2 dos Anexos, pg. 95). Apesar de

    estes gatos no transmitirem o vrus pela saliva, o ADN prviral pode ser infeccioso

    numa situao de transfuso de sangue18. Pode-se encontrar ADN prviral em tumores

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    de gatos aparentemente livres de infeco, sugerindo que o VLF possa estar envolvido

    em eventos iniciais da patognese do tumor94.

    Quando h reactivao, os gatos tornam-se virmicos e positivos aos testes de

    diagnstico de deteco de antignios100,102. A reactivao espontnea ou natural no

    um evento frequente, mas na presena de imunosupresso iatrognica (por exemplo,

    quando h administrao de glucocorticides) e em situaes de stresse crnico pode

    acontecer87,94,101. Mesmo com a administrao de altas doses de corticoesterides,

    medida que o tempo passa, a infeco latente torna-se mais difcil de reactivar e passado

    1 ano aps a infeco improvvel de ocorrer106.

    No passado, acreditava-se que aproximadamente um tero dos gatos ficava

    persistentemente virmico87 e cerca de dois teros eventualmente vencia a infeco.

    Actualmente, investigaes recentes referem que em 60% dos gatos expostos, os

    anticorpos neutralizantes e a resposta imunitria celular erradicam o vrus detectvel do

    organismo (infeco em regresso) mas que um tero a metade dos gatos regressores

    transporta em estado latente o vrus nas clulas da medula ssea87,24 e que, 30 a 40%

    desenvolve viremia persistente70,102. Visto de outro modo, nenhum gato consegue estar

    completamente livre da infeco em todas as clulas94. Isto pode explicar porque nos

    gatos recuperados os anticorpos neutralizantes persistem durante muitos anos, na

    ausncia de infeco evidente ou de exposio a gatos virmicos94.

    2.3.4. Forma atpica

    Neste tipo de infeco que ocorre em 5 a 10% dos gatos com infeco natural e

    em 25 % dos gatos infectados experimentalmente, os animais so portadores do VLF

    mas parcialmente imunes24,100. No manifestam nem transmitem a doena mas tm um

    local de replicao vrica latente como o olho, o epitlio das glndulas salivares, da

    glndula mamria ou da bexiga

    100,101

    . Nestes gatos h uma produo de antignio p27intermitente ou baixa e como tal reagem com resultados fraco positivos, alternados de

    positivo ou negativo ou com resultados discordantes nos testes de diagnstico100 sem

    para isso serem virmicos94(Quadro 2 dos Anexos, pg. 95).

    2.4. SINAIS CLNICOS

    Os proprietrios dos gatos infectados geralmente conduzem o seu animal ao

    veterinrio por este manifestar na maioria, sintomas inespecficos ou sinais clnicosassociados a alteraes em certos rgos102. Muitos animais infectados so

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    assintomticos106 e, as principais e mais graves manifestaes de doena s ocorrem

    meses ou at anos mais tarde94,100. Um resultado positivo aos testes de diagnstico no

    prova a existncia da doena e quando o mdico veterinrio diagnostica uma patologia

    num animal seropositivo, a abordagem seguinte a seguir a realizao de testes

    diagnsticos para descartar outros potenciais causas de doena102.

    O vrus da leucemia felina causa uma grande diversidade e multiplicidade de

    sinais clnicos e a explicao para esta variedade nos gatos virmicos persistentes,

    continua uma incgnita100. O curso da doena determinado pela combinao de

    factores relacionados com o vrus e com o hospedeiro94, alm de que determinadas

    diferenas no quadro clnico de gatos infectados depende do subgrupo do vrus17. O

    subgrupo C est associado a anemia no regenerativa, enquanto o subgrupo B

    presena de tumores100.

    Os sinais clnicos podem dever-se aos efeitos directos do vrus ou a infeces

    secundrias oportunistas despoletadas pela imunosupresso17,24,100,102. Alguns dos

    efeitos directamente relacionados com o vrus so problemas reprodutivos em gatas

    infectadas como a infertilidade, o aborto, a reabsoro fetal e o nascimento de nado-

    mortos, por causa da infeco atravs dos leuccitos maternos na placenta e da

    endometrite. Os gatinhos que sobrevivem ao parto rapidamente desenvolvem doenas

    associadas infeco102,106. Em gatas positivas ao vrus da leucemia felina esto

    descritos 68-73% casos de infertilidade e 60% casos de aborto103. Felizmente hoje em

    dia, os problemas reprodutivos so raros devido prtica de testes diagnsticos de

    rotina nas gatas reprodutoras, o que conduz a uma baixa prevalncia da infeco nestes

    animais94.

    2.4.1. Infeces Secundrias

    A imunodepresso provocada pelo vrus da leucemia felina muito similar causada pelo vrus da imunodeficincia felina103, podendo os animais imunodeprimidos

    estar infectados com qualquer um dos vrus ou mesmo com ambos 24,70.

    Consequentemente, necessrio ter em conta que nem sempre a infeco pelo VLF o

    nico factor responsvel pelo surgimento das infeces secundrias106. O aparecimento

    da imunodepresso exacerbada ainda mais pela neutropenia e linfopenia presentes 106, a

    perda da actividade T- supressora, e a deposio de imunocomplexos por produo

    abundante de antignios virais e escassa de anticorpos Ig G, levam ao desenvolvimento

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    de doenas imunomediadas como a anemia hemoltica, a glomerulonefrite, a vasculite

    sistmica e a poliartrite103.

    A supresso imunitria pode conduzir a infeces causadas por agentes

    primrios como a Salmonella spp., em que normalmente os gatos no infectados

    apresentam resistncia, exacerbao de doena causada pelo Mycoplasma haemofelis

    ou pelo Cryptococcuse a infeces por Toxoplasma gondii94.Alm disso, predispe ao

    aparecimento da peritonite infecciosa felina, de resistncia ao tratamento da

    dermatofitose100,106, de doenas refractrias crnicas como a estomatite, a doena

    periodontal, a rinite e, que algumas entidades clnicas como os abcessos cutneos

    tenham recorrncias inesperadas e que demorem mais tempo a ser debelados94,106. A

    estomatite linfoplasmocitria muito comum nos gatos infectados com o VIF surge

    tambm com grande frequncia, em gatos com leucemia vrica106.

    So comuns as infeces secundrias da pele, como os abcessos e as piodermas

    recorrentes; no entanto, rara uma infeco viral primria dos queratincitos108.

    Algumas situaes descritas so a dermatite ulcerativa com formao de sinccios92e os

    cornos cutneos mltiplos nas almofadas palmares108. A rinite e a pneumonia so

    devidas a infeces secundrias, j a dispneia pode estar associada ao linfoma

    mediastnico em gatos infectados, com menos de 3 anos de idade102. O vmito e a

    diarreia podem resultar de enterite semelhante panleucopenia felina, ao linfoma

    alimentar ou a infeces secundrias102, enquanto a enterite crnica pode surgir por

    aco directa do vrus nas clulas das criptas intestinais94. Alm do mais, a infeco pela

    leucemia vrica aumenta a susceptibilidade dos gatos adultos enterite por

    parvovirus106.

    A insuficincia renal nos gatos infectados pode ser devida a linfoma renal ou a

    glomerulonefrite. Eles apresentam-se geralmente consulta no estdio final da doena,

    com sinais de poliria, polidipsia, perda de peso e inaptncia102. A presena de doenas

    inflamatrias e degenerativas no fgado tambm tem sido reportada94. A ictercia

    presente nos gatos infectados pode ser pr-heptica por causa da destruio

    imunomediada dos glbulos vermelhos induzida pelo vrus, ou ser secundria infeco

    por Mycoplasma haemofelis e Mycoplasma haemominutum;heptica devido a linfoma

    heptico, lipidose heptica ou necrose focal heptica; ou ps-heptica devido a linfoma

    alimentar102. Alm disso, esses animais podem estar concomitantemente infectados com

    o vrus da peritonite felina ou com o Toxoplasma gondii102

    . No exame fsico habitualencontrar massas abdominais palpveis, organomegalia (bao, fgado, rim) e evidncias

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    de derrame pleural24; podendo a esplenomegalia e a hepatomegalia ser devidas

    hematopoiese extramedular87.

    As alteraes neurolgicas no associadas a linfoma do SNC ou a infeces

    oportunistas mas infeco pelo vrus da leucemia felina, so principalmente

    neuropatias perifricas e incluem anisocoria, midrase, ataxia, sndrome de Horner,

    fraqueza, tetraparesia, paraparesia, hiperestesia, alteraes comportamentais

    (vocalizaes anormais) e incontinncia urinria94. As alteraes oculares como os

    tumores uveais nodulares com uvete secundria, a displasia da retina, as hemorragias

    retinianas e as alteraes pupilares esto relacionadas com a capacidade do vrus em

    induzir imunosupresso, alteraes hematolgicas e, a formao de tumores90.

    2.4.2. Sndrome de Supresso da Medula sseaA supresso da medula ssea a sndrome clnica mais frequentemente

    associada leucemia vrica felina, mais complexa e grave que a associada infeco

    pelo VIF, e resulta da infeco viral primria nas clulas hematopoiticas ou nas clulas

    do estroma que as suportam106.

    A anemia associada infeco pode ter distintas origens e tanto pode ser

    regenerativa como no regenerativa, sendo com frequncia do tipo no regenerativa e

    normocrmica ou por vezes, acompanhada de macrocitose17,94

    .

    A aplasia pura dosglbulos vermelhos, as doenas mieloproliferativas, assim como os estados

    inflamatrios crnicos contribuem para o surgimento da anemia no regenerativa94. A

    aplasia pura dos glbulos vermelhos associada infeco pelo subgrupo C28,94 que

    ocorre em menos de 1% dos gatos virmicos, um tipo de anemia grave e fatal em que

    os valores de hematcrito rondam os 4 a 15%87 e, a principal causa da anemia no

    regenerativa dos gatos infectados87,106. Alm disso, comum encontrar nveis de

    eritropoeitina sricos aumentados e poucos gatos que respondem terapia comeritropoeitina exgena106. A terapia imunosupressora com prednisona, ciclosporina ou

    ciclofosfamida tambm no resulta em indivduos com aplasia pura dos eritrcitos87.

    Adicionalmente, uma minoria dos gatos infectados (15-20%) sofre de anemia

    hiperproliferativa caracterizada por uma elevada contagem de reticulcitos, diminuio

    do rcio mielide/eritride e de uma hematopoiese extramedular esplnica87. As

    anemias hiperproliferativas (regenerativas) podem ser devidas a perda de sangue, a

    hemlise secundria co-infeco com Mycoplasma haemofelisou com o Mycoplasma

    haemominutum35 ou ento mais raro, a anticorpos anti-eritrcitrios com subsequente

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    destruio imunomediada87,94. Aproximadamente um tero dos animais com anemia

    hemoltica imunomediada positivo infeco pelo VLF106. Outra situao induzida

    pela leucemia vrica, a anemia crnica, est associada a nveis normais de ferro, ao

    aumento do rcio mielide/eritride da medula ssea e a melhorias depois do tratamento

    das infeces co-existentes87. A sndrome hipereosinoflica, a policitmia vera e o

    mieloma mltiplo so doenas hematolgicas proliferativas que no esto associadas

    infeco pelo vrus da leucemia felina106.

    Outras anomalias associadas infeco pelo VLF como a perda de clulas CD4,

    a hiperplasia linfide, a atrofia tmica nos gatinhos, a linfopenia e as alteraes na

    funo dos neutrfilos foram reportadas em alguns estudos94. A actividade das clulas B

    normal tanto nos gatos com esta doena como nos com imunodeficincia vrica, por

    isso a vacinao recomendada44. O VLF tambm uma importante causa de

    trombocitopenia e neutropenia cclica ou persistente94,106. A neutropenia isolada muito

    menos habitual que a anemia, em gatos com infeco persistente87. Tambm muito

    comum o surgimento de concentraes baixas de complemento, o que contribui para a

    imunodeficincia e para a oncogenecidade induzidas pelo vrus, j que essencial em

    certos tipos de lise de clulas tumorais103. A mielodisplasia tambm pode ocorrer em

    gatos infectados; um estudo recente demonstrou que 36% dos gatos com esta doena

    so positivos presena do vrus da leucemia felina28. Como o VLF infecta as clulas

    precursoras dos fibroblastos, a proliferao anormal de clulas mesenquimatosas na

    medula ssea de gatos infectados, pode resultar em mielofibrose ou osteoesclerose

    medular87.

    2.4.3. Neoplasias

    A infeco pelo VLF est associada tanto a doenas neoplsicas ou proliferativas

    como a doenas no neoplsicas ou degenerativas24,70

    . As doenas neoplsicas maiscorrentemente associadas infeco so principalmente o linfoma (tmico, intestinal,

    multicntrico) e a leucemia24,94,100,102; sendo menos comuns os fibrosarcomas, os

    osteocondromas, e o neuroblastoma100. Num estudo feito em gatos infectados, 23%

    tinham evidncia de neoplasias, e destas 96% eram a leucemia e o linfoma 102. As

    neoplasias normalmente desenvolvem-se 1 a 3 anos aps a infeco, e os primeiros

    sinais clnicos so a anemia e a debilidade crnica101. Os recentes avanos na biologia e

    na gentica molecular como a descoberta da tcnica de PCR, da hibridao in situfluorescente e da mutagnese insercional adquirida so essenciais para descobrir a causa

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    Figura 2: Intestino delgado dum gatinho VLFnegativo com linfoma alimentar (Fotografia

    tirada no Hospital Veterinrio Montenegro).

    da ligao das neoplasias infeco retroviral1. O aparecimento do linfoma pode dever-

    se activao de oncogenes por aco directa do vrus ou por insero do provrus no

    genoma das clulas precursoras da linha linfide102.

    O linfoma o tipo de neoplasia mais comum nos gatos40, representando 80 a

    90% dos tumores hematopoiticos38. Estudos feitos entre as dcadas 70 e 80

    demonstraram que aproximadamente 70% dos gatos com linfoma eram VLF

    positivos42; no entanto, um outro estudo verificou que a antigenemia persistente do VLF

    rara e que h uma maior prevalncia de gatos com linfoma infectados com o VIF do

    que com o VLF40. Muitos animais com neoplasias linfides ou hematopoiticas so

    negativos presena de antignios ao VLF, contudo, pode-se identificar a integrao de

    clones do provrus no genoma das clulas tumorais66. Alm disso, alguns estudos

    sugerem que a infeco concomitante do linfoma com a leucemia vrica est associada a

    diminuio da durao da taxa de remisso em gatos sujeitos a quimioterapia para o

    tratamento do linfoma33,106. Como a prevalncia da infeco tem diminudo desde a sua

    descoberta, o mesmo se passa com a sua associao ao linfoma102.

    Os gatos com leucemia vrica felina apresentam um risco sessenta vezes maior

    de desenvolver linfoma que os gatos no infectados106, e os no infectados que residem

    com gatos infectados tm quarenta vezes maior risco de desenvolver linfoma que

    aqueles que no residem com outros infectados106. O linfoma alimentar na maioria,

    afecta os gatos adultos e idosos e VLF negativos33,38,106(Figura 2); estando a infeco

    por este vrus presente em apenas 35% dos casos de linfoma alimentar, e principalmente

    nos que tm origem nos linfcitos B101. Pelo contrrio, o linfoma mediastnico afecta

    principalmente gatos jovens e VLF positivos33, levando ao aparecimento de dispneia e

    derrame pleural102. A linfadenomegalia benigna perifrica generalizada observada em

    gatinhos no deve ser confundida com o linfoma multicntrico33,94,106. O linfoma nasal

    quando limitado cavidade nasal, afecta mais

    os gatos VLF negativos, enquanto a

    disseminao sistmica est mais associada a

    positividade ao VLF e a mau prognstico39,94.

    Alm das neoplasias hematolgicas, como o

    linfoma e a leucemia94, podem surgir menos

    frequentemente tumores noutros rgos. A

    osteocondromatose e o neuroblastoma

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    Figura 3: Micrografias electrnicas de viries do VIF aligarem-se membrana celular da clula infectada (esquerda) e das partculas vricas maturas extracelulares (direita). Os viries maduros tm cerca de 120-150 nm detamanho e contm a forma de nucleocpside tpica doslentivrus (Adaptado de: LINENBERGER, M.L., &ABKOWITZ, J.L. 1995).

    olfactrio apesar de serem condies raras, so possveis de serem observados em gatos

    infectados103,106.

    Uma grande variedade de alteraes hematolgicas, bioqumicas, na anlise de

    urina e radiogrficas no especficas ocorre em gatos infectados102. Os dados

    laboratoriais mais frequentes incluem: a anemia no regenerativa, a azotemia, a

    elevao dos valores sricos das enzimas hepticas, a hiperbilirrubinemia, a

    bilirrubinria, a neutropenia, a trombocitopenia, e o aumento ou a diminuio do

    nmero de leuccitos circulantes24,102. A proteinria pode ocorrer em alguns gatos

    infectados com o VLF com glomerulonefrite102.

    3. IMUNODEFICINCIA VRICA FELINA

    3.1. ETIOLOGIA

    Um vrus T-linfotrpico foi isolado pela primeira vez, em 19869,95 por Niels

    Pedersen58quando investigava gatos domsticos com sinais de imunodeficincia livres

    da infeco pelo vrus da leucemia felina24,77,100,106. Em 1989 a anlise da sequncia

    genmica confirmou que este vrus advm da linhagem lentivrica; tendo-se mudado o

    nome para o de vrus da imunodeficincia felina104.

    membro da famlia Retroviridae, da sub-familia Lentivirinae e do gnero

    Lentivirus, tem aproximadamente 105-125 nm de dimetro, nucleocpside icosadrica

    (Figura 3) e no envelope esfrico a elipsoidal esto inseridas as glicoprotenas gp41 e

    gp120, codificadas pelo gene env95, que permitem a ligao do vrus clula

    hospedeira24. Tal como no VLF, as protenas expressadas pelo gene gag como a p24

    (Figura 2 dos Anexos, pgina 96), so

    produzidas em maior quantidade que

    os produtos dos outros genes87.Recentemente comprovou-se que a

    ligao da glicoprotena de superfcie

    gp120 no a um receptor CD414

    como ocorre na infeco pelo VIH,

    mas a outro receptor da superfcie

    celular, como por exemplo s

    molculas: CD134 (receptor primrio),

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    Figura 4: Distribuio global dos subtipos do Vrusda Imunodeficincia felina (Adaptado de:HORZINEK, M., et al. 2008).

    CCR5 e CXCR4 (co-receptores) 7,9,55. O VIF tem uma elevada taxa de mutao e

    diversidade antignica9,95; estudos da frequncia de mutao dos genes env e gag

    demonstraram uma forte presso selectiva para mutaes do geneenv, consistentes com

    estudos similares no VIH que afirmam haver uma maior taxa de mutao neste gene em

    comparao com os genes gag e pol81,104 que so relativamente conservados entre

    estirpes95.

    Actualmente o VIF classificado em cinco subtipos principais: A, B, C, D e E

    com base na diversidade das sequncias nucleotdicas da regio V3-V5 do gene

    env21,24,50,60,100, podendo ir at 26-30% de diferenas entre subtipos9,95. Alm disso,

    estudos mostraram ser possvel a mesma classificao gentica, utilizando sequncias

    de nucletidos da regio p17-p24 do genegag, j que este tem uma taxa de conservao

    maior que o gene env, sendo um candidato adequado para estudos filogenticos21,81.

    A distribuio dos vrios subtipos varia geograficamente (Figura 4), sendo os

    subtipos A e B os mais comuns9,95. Nos EUA predominam os subtipos A e B104, mas o

    subtipo C tambm reportado100. No

    Canad predomina o subtipo C, apesar de

    terem sido identificadas algumas

    infeces pelo subtipo B100. Existe uma

    grande prevalncia do subtipo D no

    Japo, mas os subtipos A, B, e C tambm

    esto presentes60. Na Austrlia e frica

    foi descrito o subtipo A, na frica do Sul

    o subtipo B e recentemente o subtipo

    E100. O subtipo E predomina na

    Argentina e no Brasil95,104, sendo tambm

    encontrado recentemente neste ltimo, o subtipo B21. Os gatos europeus so infectados

    pelos subtipos A, B, C e D, sendo o A predominante na regio norte e o B na regio

    sul9,95,100. Em Portugal isolou-se o subtipo B99 e posteriormente, num outro estudo

    identificou-se tambm a presena do subtipo A e de um possvel novo subtipo,

    denominado de F21. A classificao em subtipos baseada no gentipo, e pouco se sabe

    acerca da correlao entre o gentipo e a proteco cruzada por anticorpos entre estirpes

    do mesmo ou de diferentes subtipos104. Os anticorpos neutralizantes reconhecem os

    outros subtipos9

    , sendo capazes de neutralizar apenas as estirpes com relao prxima eno as divergentes104. Experimentalmente assim como na infeco natural, foi

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    observada a super-infeco com mltiplos subtipos81,100. As recombinaes entre os

    subtipos so possveis mas difceis de detectar, e ainda mais quando so entre duas

    sequncias muito similares entre si50,81. A diversidade dentro de subtipos frequente, e

    o seu estudo pode auxiliar o aumento do conhecimento acerca da patogenia e

    epidemiologia da doena21,81. As maiores implicaes da existncia de vrios subgrupos

    dentro de um subtipo consistem na dificuldade de utilizarem-se os testes de diagnsticos

    e, na utilizao de vacinas cujas estirpes presentes podem no proteger os animais para

    subtipos heterlogos21.

    O significado clnico dos vrios subtipos actualmente desconhecido19.No

    Japo no foi observada uma correlao significativa entre os diferentes subtipos e os

    sinais clnicos, no entanto observou-se em gatos com o subtipo A, doena fatal e

    sndrome de imunodeficincia e, em gatos com o subtipo B, a ausncia de sinais ou a

    existncia de sinais clnicos mais brandos. Alm disso, em gatos infectados com o

    subtipo C observa-se frequentemente diarreia24,60.

    3.2. EPIDEMIOLOGIA

    O VIF um vrus espcie-especfico,com distribuio mundial e endmica nos

    gatos domsticos (Felis catus) 95. Nos felinos silvestres pelo menos em 27 espcies100,

    foram detectadas estirpes de lentivrus, intimamente relacionadas com oVIF48,81,95.

    A prevalncia global da infeco aproximadamente 11%50 variando de 2,5 a

    44%21dependendo do autor, da regio geogrfica, do estado de sade e do estilo de vida

    da populao felina estudada86,100,106. Observam-se ainda variaes quando a populao

    dividida em doentes e saudveis24. A nvel mundial, a prevalncia nos gatos

    sintomticos varia de 3 at mais de 44%, enquanto nos assintomticos desde 1 a

    14%95,104. Uma vez introduzido numa populao o VIF mantm-se num equilbrio

    estvel entre o nmero de indivduos susceptveis e infectados, ou seja, a frequncia de

    transmisso baixa e o impacto do vrus na reduo do tamanho da populao no

    significativo48,68. Ao contrrio do que acontece com o VLF, a prevalncia do VIF no

    tem alterado muito desde a sua descoberta18.

    O vrus encontra-se presente na saliva, no sangue, no soro, no plasma, no lquido

    cefaloraquidiano82e em menores quantidades no smen e no leite24,65,86. A saliva o

    veculo da maior parte da quantidade de vrus excretada65,86, sendo a sua inoculao

    atravs das mordeduras durante as lutas entre os gatos machos adultos inteiros, aprincipal forma de transmisso horizontal e directa da infeco natural20,24,65,95,100. As

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    outras vias de transmisso que no a mordedura so pouco provveis de ocorrer102, no

    entanto a ingesto do vrus nas lambidelas mtuas e na limpeza de feridas infectadas

    no podem ser excludas, assim como a administrao oral de sangue infectado resulta

    em infeco experimental104.

    Experimentalmente, as vias de transmisso intraperitoneal, intramuscular ou

    intravenosa9, assim como atravs das mucosas como a cavidade oral, nariz12, recto ou

    vagina12,54 conduzem infeco48,65,95,104. No entanto, estas ltimas vias no so

    consideradas vias de transmisso naturais importantes, e a dose de vrus requerida

    muito mais alta que a requerida pelas vias parenterais para produzir infeco9.

    A transmisso da infeco durante o acasalamento no est completamente

    esclarecida porque os machos costumam morder as fmeas a nvel cervical transmitindo

    assim o vrus95, o que impede o conhecimento acerca do smen como potencial via de

    infeco24,65. Portanto, a importncia da transmisso venrea no meio natural no

    conhecida, mas o VIF pode ser transmitido sexualmente s fmeas por inseminao

    artificial com smen fresco de dadores machos infectados24,45,65,95, sendo j isolado em

    esfregaos vaginais de fmeas infectadas experimentalmente e no smen de gatos aps

    infeco natural e experimental65,104. Se usar smen congelado no ocorre a transmisso

    da infeco, o que sugere a crioconservao como potencial meio para diminuir a

    infecciosidade do vrus65.

    Existe a possibilidade de transmisso vertical uterina: antes e durante o parto, e

    atravs da ingesto do colostro e leite de fmeas infectadas24,45. A infeco natural

    segundo estas ltimas vias de transmisso desconhecida, mas apesar de raras e no

    serem epidemiologicamente importantes, podem ocorrer50,86,104. Apenas uma pequena

    parte da descendncia de gatas infectadas fica com infeco persistente95, sendo muito

    pouco comum encontrar gatinhos com menos de 1 ano de idade infectados104. A

    transmisso vertical no parece ocorrer em gatas assintomticas na fase crnica da

    infeco86,87,95 no entanto, um estudo verificou que o VIF se transmite a 22% da

    descendncia de gatas cronicamente infectadas86. Entretanto, nas gatas com infeco

    aguda, mais de 70% dos seus filhos nascem infectados95.

    A transmisso iatrognica pode ocorrer via agulhas e outros instrumentos

    contaminados, assim como nas transfuses de sangue de animais infectados100.Outras

    formas de transmisso indirectas, menos usuais como a partilha de bebedouros,

    comedouros e o uso de reas comuns para dormir, no conduzem transmisso dainfecoper se48.

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    No entanto, apesar duma multiplicidade de vias de transmisso importante

    notar que a infeco tipicamente est associada ao comportamento social de lutas

    observado entre os gatos machos inteiros adultos e vadios17,95, constituindo assim estes

    os principais grupos de risco para a infeco9,17,18,58.

    Os machos so mais afectados duas a quatro vezes que as fmeas 17,24,58,61,86,106,

    estando este maior risco relacionado com o comportamento territorial24,48. Um estudo

    do Norte da Amrica constatou que dos gatos analisados 80% eram machos e 78%

    tinham pelo menos 2 anos de idade106. O VIF frequentemente observado em gatos

    com mais de cinco anos inclusive, sendo a mdia entre os 5 e os 6 anos70. Esta tendncia

    provavelmente deve-se ao facto da infeco se desenvolver muito lentamente, existindo

    portanto um perodo longo entre a infeco e a manifestao de sinais clnicos24. Vrios

    estudos no encontraram associao entre a seropositividade ao VIF e a antigenemia ao

    VLF o que justificvel, pelo pico da incidncia da infeco pelo VIF ocorrer em gatos

    com idades entre 5 a 10 anos, e o pico de incidncia da leucemia vrica acontecer entre

    os 1 e os 5 anos de idade87.

    Alm da possibilidade de infeco ser influenciada pelo sexo e idade, tambm

    depende do estado de sade sendo mais comum nos indivduos doentes, e do

    comportamento de vadiagem dos gatos50,95. Os gatos mantidos em condies de acesso

    restritas raramente so infectados ao contrrio dos gatos vadios, errantes e com acesso

    livre ao exterior48,98. Alm disso, a prevalncia maior em populaes com elevada

    densidade de gatos, e/ou com sinais clnicos sugestivos de doena crnica, do que nas

    que tm poucos animais e em que eles so rastreados para evidncia de infeco antes

    da vacinao ou na introduo a um lar48,58,100.

    No h evidncias experimentais de deteco de anticorpos em pessoas que

    foram mordidas por gatos infectados, ou que inadvertidamente, foram injectadas com

    material contendo o VIF48,84,100,106. No h qualquer ligao entre a infeco a qualquer

    doena humana, incluindo a SIDA48, logo, no havendo evidncias de transmisso

    zoontica95,104, toma-se em considerao a hiptese do VIF ser um vector til para a

    terapia gentica humana contra a infeco pelo VIH84.

    3.3. PATOGENIA

    A patogenia do VIF ainda no est de todo esclarecida, mas centra-se numa

    disfuno progressiva da funo imunitria muito semelhante ao que ocorre na infecopelo VIH77,100,106. O curso da doena depende de vrios factores incluindo a idade, o

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    estado imunitrio, a exposio a infeces secundrias, o subtipo do vrus, a dose

    inoculante, e a via de entrada100,106.

    O vrus apresenta elevado tropismo pelos linfcitos TCD4+56,77,95, no entanto

    capaz de utilizar outros receptores infectando outros tipos celulares24,104 que no

    expressam o CD4100 como os linfcitos TCD8+, os linfcitos B, os moncitos, os

    macrfagos14,52, os astrcitos56,82 e as clulas da microglia48,55. Alm disso, ocorre a

    replicao in vitro, nos fibroblastos e nas clulas do rim felino de Crandell (CrFK)48.

    Tal como no VIH, algumas estirpes do VIF replicam-se preferencialmente nos linfcitos

    e minimamente nos macrfagos, enquanto outras so capazes de replicar igualmente

    ambas as clulas48,59,100. A replicao viral em diferentes tipos celulares responsvel

    pela presena de diferentes manifestaes clnicas48,100 por exemplo: a replicao do

    vrus nas clulas da linhagem monoctico-macrofgico resulta em manifestaes de

    doena no sistema nervoso central48. O modo como funciona este tropismo viral

    continua a ser uma matria de discusso para os investigadores100.

    Inicialmente, aps a infeco, o vrus replica-se nas clulas do tecido linfide

    principalmente no timo e nas glndulas salivares17, conduzindo diminuio dos

    linfcitos T CD4+ helper e dos CD8+24,100. Surge uma viremia 10 a 14 dias ps-

    infeco, que rapidamente aumenta at ao dia 2148,100,106. Nas primeiras trs semanas

    ps-infeco h uma pronunciada hiperplasia folicular e para-cortical no timo, nos

    linfonodos perifricos e mesentricos, nas amgdalas, no bao e no tecido linfide do

    aparelho gastrointestinal60. Pouco depois surge a hiperplasia mielide na medula ssea e

    involuo cortical, timite e hiperplasia medular no timo. As clulas T, moncitos e

    macrfagos infectam-se antes dos linfcitos B60,104. Experimentalmente, foi

    demonstrado que a activao dos linfcitos, responsveis pela linfadenomegalia,

    devido ao aumento da expresso do CD30 (marcador da actividade dos linfcitos B) nos

    centros germinativos dos linfonodos46. Esta activao dos linfcitos pode ser

    responsvel pela consequente expanso dos clones infectados, e disseminao viral46a

    outros locais no linfides como nos macrfagos e linfcitos dos pulmes, tracto

    gastrointestinal, rins e figado24,104.A reduo nos linfcitos TCD4+, que pode levar um

    ano ou mais ps-infeco a observar-se83depende duma srie de mecanismos, tais como

    a citlise resultante da infeco viral e a apoptose das clulas T no infectadas60,106.

    A linfopenia inicial seguida por uma forte resposta imunitria que

    caracterizada pela produo de anticorpos anti-VIF, aumento dos linfcitos TCD8+circulantes e uma inverso persistente da razo CD4/CD8, que total na fase

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    aguda18,106. Nesta fase a viremia atinge um pico entre a stima e a oitava semana ps-

    infeco48,100,106. A infeco crnica nos indivduos assintomticos, normalmente est

    associada a ttulos reduzidos de vrus no organismo104 e a um nmero muito baixo de

    clulas mononucleares infectadas87.

    Geralmente, a perda dos linfcitos TCD4+ que origina a inverso da razo

    CD4/CD8 na maior parte das estirpes, mas nalgumas, o aumento das clulas TCD8+

    tambm tem o seu papel83,104. A durao desta inverso depende do tipo de estirpe e da

    carga viral, sendo mais rpida nas estirpes mais virulentas e quando a carga viral

    elevada104. possvel que o declnio da razo CD4/CD8 seja um sinal de mau

    prognstico, tendo esta hiptese sido investigada pelos cientistas105. parte da

    diminuio quantitativa das clulas CD4+, h alteraes funcionais nos macrfagos, nos

    neutrfilos e nas clulasnatural killers104. Adicionalmente, h uma activao policlonal

    sustentada das clulas B, com a produo de anticorpos a uma variedade de antignios

    no virais alm de que h uma significativa desregulao na produo de citocinas87,100.

    As clulas mononucleares sanguneas dos gatos infectados sintomticos exibem uma

    diminuio da produo das IL-2, IL-10 e um aumento da produo das IL-1, IL-6 e do

    48,104. Contudo, os gatos assintomticos com infeco experimental tm nveis

    104. O papel dos mediadores inflamatrios na fisiopatologia da

    infeco aguda desconhecido87.

    A imunidade mediada por clulas mais profundamente afectada que a

    imunidade humoral18,100. A resposta imunitria celular destes animais inclui a produo

    de linfcitos T citotxicos e a produo de citocinas pelos linfcitos T helper104. As

    clulas B apesar de serem alvos da infeco, no costumam sofrer muitas alteraes 106.

    Portanto, os estados inflamatrios crnicos, as neoplasias e as infeces por organismos

    intracelulares so os tipos de doena mais comum na infeco pelo VIF, do que aquelas

    controladas por anticorpos18,106. Os animais afectados aparentam responder

    adequadamente vacinao e frequentemente desenvolvem uma

    hipergamaglobulinemia policlonal caracterstica duma estimulao no especfica da

    imunidade humoral18,100,106. Mesmo com a produo de anticorpos neutralizantes e com

    a resposta imunitria celular, a infeco pode-se estabelecer24,48.

    Os anticorpos contra o VIF so normalmente detectveis 2 a 4 semanas ps-

    infeco24 (em 95% dos animais na 4 semana)87, apesar de haver animais a

    seroconverterem mais tarde, quando expostos a doses baixas de vrus95

    . Alguns autoresreferem em 8 semanas ps-infeco70, outros em 60 dias103, havendo at, uma pequena

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    percentagem de gatos que no apresenta anticorpos detectveis por mais de 6 meses a

    um ano aps infeco experimental, mesmo que tenha resultados positivos ao

    isolamento viral nos linfcitos48,70. Nos gatos com infeco natural a extenso deste

    problema indefinida70. Alguns animais podem manifestar sintomas antes da

    seroconverso e, outros infectados podem nunca seroconverter, originando resultados

    falso negativos nos testes de deteco de anticorpos102. Mesmo nos gatos que seguem o

    padro de seroconverso, h uma janela de quatro a oito semanas em que o animal est

    infectado ( infeccioso) mas os resultados ao teste de diagnstico so negativos 70. Os

    anticorpos contra as protenas transmembranrias do envelope aparecem em primeiro

    lugar, seguidos por anticorpos contra as protenas do core p24 e semanas mais tarde por

    anticorpos contra as glicoprotenas de superfcie gp12020,48,49,95. Alm disso, nem

    sempre surgem anticorpos contra as protenas do core76.

    A imunidade desenvolvida nos gatos infectados no suficiente para prevenir a

    superinfeco com outros subtipos. Gatos infectados h mais de um ano aparentam

    resistir superinfeco mais do que os gatos com menos tempo de infeco. A presena

    de vrus recombinantes na natureza (recombinaes entre subtipos) suporta ainda mais o

    facto de que, a imunidade criada durante a infeco primria no suficiente para evitar

    a superinfeco104.

    3.4. SINAIS CLNICOS

    A infeco segue o animal para toda a vida50, contudo, alguns gatos infectados

    podem viver sem sinais mnimos de doena48. O VIF raramente causa doena por si s,

    na maioria das vezes so as infeces secundrias oportunistas que causam os sinais

    clnicos100, tendo um papel fundamental na progresso da infeco100. Portanto,

    importante a identificao da causa subjacente e a instaurao dum tratamento o mais

    precocemente possvel95. O relacionamento da infeco a outras doenas tem sido

    frequentemente estudado pelos investigadores48.

    Adicionalmente, h co-factores que suprimem consideravelmente o sistema

    imunitrio e que aceleram o curso da infeco, tal o exemplo da administrao de

    corticoesterides83e da co-infeco com o VLF. Alm disso, os gatos infectados com o

    VIF esto 1,5 a 4 vezes mais predispostos a serem infectados pelo VLF do que os no

    infectados. Investigaes sero-epidemiolgicas demonstraram que os gatos infectados

    com ambos os vrus tendem a ter doena mais severa, uma probabilidade elevada deinfeces fatais, e a morrer mais cedo48.

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    A infeco progride em quatro diferentes estdios clnicos, importantes do ponto

    de vista