Eleanor & Park

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Eleanor & Park é engraçado, triste, sarcástico, sincero e, acima de tudo, geek. Os personagens que dão título ao livro são dois jovens vizinhos de dezesseis anos. Park, descendente de coreanos e apaixonado por música e quadrinhos, não chega exatamente a ser popular, mas consegue não ser incomodado pelos colegas de escola. Eleanor, ruiva, sempre vestida com roupas estranhas e “grande” (ela pensa em si própria como gorda), é a filha mais velha de uma problemática família. Os dois se encontram no ônibus escolar todos os dias. Apesar de uma certa relutância no início, começam a conversar, enquanto dividem os quadrinhos de X-Men e Watchmen. E nem a tiração de sarro dos amigos e a desaprovação da família impede que Eleanor e Park se apaixonem, ao som de The Cure e Smiths. Esta é uma história sobre o primeiro amor, sobre como ele é invariavelmente intenso e quase sempre fadado a quebrar corações. Um amor que faz você se sentir desesperado e esperançoso ao mesmo tempo.

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Rainbow Rowell

eleanor & park

Sã o Pa u l o 2014

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Editor assistente Daniel Lameira

Coordenação Editorial Mateus Duque Erthal

Tradução Caio Pereira

Preparação Equipe Novo Século

Diagramação Project Nine

Revisão Tássia Carvalho

Rhennan Santos

2014Proibida a reprodução total ou parcial.

Os infratores serão processados na forma da lei.Direitos exclusivos para a língua portuguesa cedidos à

Novo Século Editora Ltda.Alameda Araguaia, 2190 — 11º andar

Alphaville Industrial, Barueri — SP — CEP 06455-000 Tel. (11) 2321-5080

[email protected]

Eleanor & ParkCopyright © 2013 by Rainbow Rowell

Copyright © 2014 by Novo Século Editora Ltda.All rights reserved.

Published by agreement with the Author c/o The Lotts Agency, Ltd.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995)

Índices para catálogo sistemático:

1. Ficção : Literatura norte-americana 813

Rowell, RainbowEleanor & Park / Rainbow Rowell ; [tradução Caio Pereira]. -- Barueri, SP : Novo Século Editora, 2013.

Título original: Eleanor & Park.1. Ficção norte-americana I. Título.

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Ele parou de tentar trazê-la de volta.

Ela só voltava quando bem entendia, em sonhos e mentiras e déjà-vus

partidos.

Por exemplo, quando ele estava dirigindo para o trabalho e viu uma

garota com os cabelos vermelhos, em pé na esquina. E ele podia jurar, pelo

menos por um momento, ser ela.

Então, ele via que aquele cabelo era, na verdade, mais loiro do que ruivo.

E que ela estava com um cigarro na mão... E vestindo uma camiseta do

Sex Pistols.

Eleanor odiava o Sex Pistols.

Eleanor...

Em pé, às suas costas, até que ele virasse para trás. Deitada ao seu lado

segundos antes de ele acordar. Fazendo que todo o resto do mundo parecesse

mais sombrio, mais superficial, e nunca bom o bastante.

Eleanor, acabando com tudo.

Eleanor, indo embora.

Ele parou de tentar trazê-la de volta.

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Apertando os fones contra as orelhas, Park admitiu que o XTC não conseguia abafar o barulho do ônibus. No dia seguinte, ouviria Skinny Puppy ou Misfits. Ou talvez gravasse uma fita para o ônibus com o máximo de gritaria possível.

Park poderia voltar a ouvir pós-punk dentro de dois meses, depois que tirasse a carteira de motorista. Sua mãe lhe daria o Impala, e ele já tinha economizado dinheiro suficiente para um toca-fitas. Além disso, depois que começasse a ir de carro para a escola, poderia dormir vinte minutos a mais.

– Isso não existe – alguém gritou, lá no fundo do ônibus, por cima das risadas.

– Existe sim, porra – disse Steve. – Estilo do macaco bêbado, cara, essa porra existe mesmo. Dá pra matar uma pessoa com esse estilo...

– Tá de gozação.– Você tá de gozação – retrucou Steve. – Park! Ei, Park!Park ouviu, mas não respondeu. Às vezes, se você ignorasse o Steve

por um minuto, ele procurava outra pessoa. Saber disso já garantia 80%

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de chance de sobrevivência tendo o Steve como vizinho. Os outros 20% eram ficar de cabeça baixa.

Algo de que Park se esquecera por um momento. Uma bola de papel o atingiu bem na nuca.

– Você acaba de amassar minhas anotações de Crescimento e Desenvolvimento Humano, seu mala sem alça – Tina falou.

– Desculpa, gatinha – respondeu Steve. – Eu te ensino tudo sobre crescimento e desenvolvimento humano; o que você precisa saber?

– Ensine o estilo do macaco bêbado – alguém afirmou.– PARK! – Steve gritou.Park virou-se para o fundo do ônibus. Steve concentrava todas as

atenções para si, lá na frente. Mesmo sentado, sua cabeça praticamente encostava no teto. Sempre parecia que tudo que o cercava era feito em miniatura. Desde a sétima série, ele já tinha cara de adulto, e isso foi antes de a barba cheia crescer. Bem antes.

Às vezes, Park se perguntava se Steve começara a perseguir a Tina porque ela o fazia parecer ainda mais monstruoso. A maioria das meninas das Colinas era baixa, mas Tina não tinha mais do que um metro e meio. Contando o cabelão.

Uma vez, no ano passado, alguém estava zoando o Steve, dizendo que era melhor ele não engravidar a Tina, ou seus bebês gigantes pode-riam matá-la.

– Vão sair rasgando a barriga dela feito aliens – o cara falou. Steve quebrou o dedinho na cara do sujeito.

– Alguém tem que ensinar a esse brutamontes como se dá um soco – disse o pai de Park quando ouviu a história, mas Park torcia para que ninguém o fizesse. O garoto que Steve socou ficou sem abrir o olho por uma semana.

Park virou-se em seu assento e jogou para Tina a sua bola de lição de casa. Ela a pegou.

– Park – disse Steve –, conte pro Mikey sobre o estilo do macaco bêbado.

– Não sei nada disso – Park deu de ombros.– Mas existe, né?– Acho que já ouvi falar.

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– Aí – Steve procurou algo para arremessar em Mikey, mas não achou nada. Em vez disso, só apontou para ele. – Eu não disse, cacete?

– Mas o que o Sheridan sabe sobre kung fu? – Mikey perguntou.– Você é retardado? – Steve disse. – A mãe dele é chinesa.Mikey olhou para Park com atenção. Park sorriu e seus olhos quase

se fecharam.– Ah, tô vendo mesmo – Mikey. – Sempre pensei que você fosse

mexicano.– Caramba, Mikey – disse Steve –, você é um puta dum racista.– Ela não é chinesa – Tina interpelou. – É coreana.– Quem? – Steve perguntou.– A mãe do Park.A mãe do Park cortava o cabelo da Tina desde o Ensino Fundamental.

As duas usavam o mesmo estilo: permanente com espirais compridas e franja repicada.

– Ela é muito gostosa, isso sim – disse Steve, rolando de rir. – Sem ofensa, Park.

Park esforçou-se para sorrir mais uma vez e se esparramou no banco, colocando os fones nos ouvidos e aumentando o volume. Ainda dava para ouvir Steve e Mikey, quatro bancos atrás.

– Mas do que se trata, afinal? – Mikey perguntou.– Velho, você ia querer lutar com um macaco bêbado? Eles são imen-

sos, grandes pra cacete. É tipo aquele filme Doido para brigar... Louco para amar, mano. Imagina um cara descendo o cacete em você.

Park notou a aluna nova quase ao mesmo tempo que o resto da turma. Ela estava em pé na entrada do ônibus, ao lado do primeiro lugar vago.

Havia um menino sentado ali sozinho, um calouro. Ele colocou a mochila no assento ao lado, depois virou a cara. Ao longo de todo o corredor, ninguém sentado sozinho abriu espaço para que ela se sen-tasse. Park ouviu Tina abafar um risinho; ela vivia para tirar sarro dos outros.

A garota, a aluna nova, respirou fundo e foi seguindo pelo corredor. Ninguém nem a olhava. Park tentou fazer o mesmo, mas era uma situação do tipo desastre de trem, ou eclipse: você simplesmente tem de olhar.

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A menina tinha a aparência exata do tipo de pessoa com o qual isso costuma acontecer. Não só por ser uma pessoa nova ali, mas por ser grande e esquisita. Com cabelo bagunçado, bem ruivo, além de cacheado. E se vestia como se... como se quisesse que as pessoas ficassem olhando. Como se não sacasse que estava um desastre completo. Usava camisa xadrez masculina, meia dúzia de colares estranhos pendurados em volta do pescoço e lenços amarrados nos pulsos. Fez Park pensar num espan-talho ou nas bonequinhas das preocupações que ficavam na cômoda da mãe. Enfim, do tipo que não conseguiria sobreviver no colegial.

O ônibus parou novamente, e mais um grupo de crianças entrou. Passaram pela menina, empurrando-a, trombando nela, e cada um des-pencou no seu lugar.

O fato era que todo mundo que andava no ônibus já tinha seu lugar definido, escolhido no primeiro dia de aula. Quem teve a sorte de ficar com um banco inteiro só para si – caso do Park – não ia querer perdê-lo. Principalmente por causa de uma pessoa dessas.

Park olhou mais uma vez para a menina. Ela estava ali, em pé, parada.– Ei, você – gritou a motorista –, vá se sentar.– Ei, você – Steve brincou, fazendo voz de homem das cavernas.

Todos concordavam que a motorista tinha inteligência suficiente apenas para levá-los ao colégio. Sempre que ela abria a boca, Steve tirava sarro. – Em pé, errado – ele grunhiu de novo. – Sentado, certo. – Tina soltou um risinho.

A garota foi para o fundo do ônibus. Direto para a boca do tubarão. Não, pensou Park, pare. Volte para trás. Dava para imaginar Steve e Mickey lambendo os beiços conforme a menina se aproximava. Ele ten-tou desviar o olhar mais uma vez.

Então, a garota avistou o banco vazio oposto ao de Park. O rosto dela se iluminou, aliviado, e ela correu para se sentar.

– Ei – Tina disse, ardida. – A menina continuou andando. – Ei – Tina provocou. – Bozo.

Steve desatou a rir. Os amigos caíram no riso alguns segundos depois.– Não pode se sentar aí – disse Tina. – É o lugar da Mikayla.A menina parou e olhou para Tina, depois de volta para o banco vazio.– Sente-se – gritou a motorista, lá da frente.

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– Tenho que me sentar em algum lugar – a garota falou, num tom calmo e firme.

– Não diga que não avisei – Tina devolveu. O ônibus partiu, e a menina deu um passo para a frente, a fim de não cair. Park tentou aumentar o volume do walkman, mas já estava no máximo. Olhou de novo para a menina; parecia que ela ia começar a chorar.

Antes mesmo de decidir fazê-lo, Park deslizou para perto da janela.– Sente-se aí – disse, num tom agressivo. A menina ficou parada,

olhando, como se não soubesse se era outra gozação ou algo assim. – Caramba – Park continuou, baixinho, acenando com a cabeça para o espaço ao lado dele –, é só sentar.

A menina obedeceu. Não falou nada – felizmente, ela não agradeceu – e deixou quinze centímetros de espaço entre os dois.

Park virou-se para o vidro da janela e esperou que o mundo desabasse sobre sua cabeça.

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eleanor

Eleanor ponderou sobre suas opções:1. Podia voltar da escola a pé. Prós: exercício, blush natural, tempo

para si mesma. Contras: ainda não sabia seu novo endereço, nem mesmo em que direção começar a andar.

2. Podia ligar para a mãe e pedir carona. Prós: vários. Contras: sua mãe não tinha telefone. Nem carro.

3. Podia ligar para o pai. Há.4. Podia ligar para a avó. Só pra dar um oi.Sentada nos degraus de concreto da entrada da escola, observava a

fileira de ônibus amarelos. O seu estava logo ali. Número 666.Ainda que Eleanor conseguisse evitar o ônibus naquele dia, ainda que

sua fada madrinha aparecesse com uma carruagem de abóbora, ainda assim teria que arranjar um jeito de voltar para a escola na manhã seguinte.

E não ia acontecer de aqueles garotos demoníacos acordarem com seu lado angelical aflorado no dia seguinte. Na boa. Não seria surpresa alguma se eles escancarassem a boca feito uma sucuri da próxima vez em que a vissem. Aquela menina do fundão de cabelo loiro e jaqueta desbo-

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tada? Dava quase para ver os chifres por baixo da franja. E o namorado dela devia ser um membro dos Nefilins.

A menina e todos os outros odiaram Eleanor antes mesmo de botar os olhos nela. Como se tivessem sido contratados para matá-la numa vida passada.

Eleanor não sabia ao certo se o mestiço que a deixara se sentar final-mente era outro inimigo, ou se resolvera dar uma de idiota mesmo. (Mas não idiota-idiota... Ele cursava, assim como ela, duas das matérias mais difíceis que ela fazia.)

A mãe de Eleanor insistira que a nova escola a colocasse Eleanor em matérias avançadas. Havia ficado louca quando vira as notas da filha na nona série.

– Isso não pode ser uma surpresa para você, Sra. Douglas – disse o orientador. Ah, pensou Eleanor, você ficaria surpreso com o que pode ser surpreendente a essa altura.

Não importa. Eleanor permaneceu olhando para as nuvens com a facilidade de sempre nas matérias avançadas. Havia o mesmo número de janelas nessas salas de aula.

Isso se algum dia ela voltasse a essa escola.Se algum dia ela conseguisse chegar em casa.Não dava para contar à mãe a situação do ônibus, de qualquer modo,

porque a mãe já havia dito que ela não precisava ir de ônibus. Na noite anterior, enquanto Eleanor desfazia as malas...

– Richie disse que vai levar você – falou a mãe –; fica no caminho dele pro trabalho.

– Ele vai me colocar na caçamba do caminhão?– Ele está tentando fazer as pazes, Eleanor. Você prometeu que tam-

bém ia tentar.– Acho mais fácil fazer as pazes bem de longe.– Eu disse a ele que você está pronta para fazer parte desta família.– Eu já sou parte dela. Sou tipo uma fundadora.– Eleanor – afirmou a mãe. – Por favor.– Eu vou de ônibus – Eleanor disse. – Não tem problema. Vou fazer

amizades.Ah, pensou Eleanor, sentada na escadaria. Um ah imenso e dramático.

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Seu ônibus estava para sair. Alguns já estavam partindo. Alguém pas-sou correndo pelos degraus ao lado de Eleanor e chutou sua mochila, por acidente. Ela tirou a mochila do caminho e começou a pedir desculpas, mas era aquele menino mestiço idiota, e ele fez uma careta quando viu que era ela. Ela devolveu-lhe a careta, e ele saiu correndo.

Ah, que ótimo, pensou Eleanor. Os filhos do mal não vão passar fome no meu turno.

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