EIRELI: UM INCENTIVO AO...

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Curso de Direito Artigo Original EIRELI: UM INCENTIVO AO EMPREENDEDORISMO EIRELI: AN INCENTIVE TO ENTREPRENEURSHIP Ariella Monique Toscano Guimarães 1 , Pedro Antônio Ribeiro de Andrade 2 1 Aluna do Curso de Direito 2 Professor do Curso de Direito Resumo A instituição da Lei nº 12.441, de 11 de julho de 2011 fez nascer no Direito Empresarial Brasileiro a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, figura de suma importância para a evolução do comércio, posto que, estimula a formalização de novos empreendedores e, igualmente daqueles já existentes que, outrora, sentiam-se obrigados a se esconder atrás de sociedades fictícias, constituídas na realidade por uma única pessoa, com o escopo de apoderar-se dos benefícios inerentes a limitação de responsabilidade. Palavras-Chave: Empresário; EIRELI; Empreendedorismo. Abstract The enactment of Law No. 12,441, of July 11, 2011 gave birth in Brazilian Business Law, the Limited Liability Individual Company, figure of paramount importance for the development of trade, since it stimulates the formalization of new entrepreneurs and also those already existing, which once felt obliged to hide behind shell companies, in fact constituted by a single person, with the aim of seizing the benefits about liability limitation. Keywords: entrepreneur; EIRELI; Entrepreneurship. Contato: [email protected] Introdução O presente artigo tem como tema de análise o novo modelo de empresário individual de responsabilidade limitada com o advento da Lei n° 12.441 de julho de 2011, o foco principal da referida lei é incentivar, estimulando a formalização do empresário individual por meio da divisão do patrimônio da atividade econômica do patrimônio pessoal do empresário, evitando que a totalidade dos seus bens pessoais responda por dívidas constituídas na atividade empresarial. A alteração foi realizada diante dos problemas que a legislação anterior enfrentava, pois como é percebido, antes da alteração da lei, os bens pessoais do empresário individual confundia-se com o mesmo patrimônio utilizado no empreendimento, permitindo uma futura execução sobre seus bens pessoais de dívidas decorridas da atividade desenvolvida. Essa situação era bastante desconfortável para o empreendedor que tinha que responder pessoalmente pelos riscos da atividade, ao empresário de responsabilidade ilimitada uma das alternativas era procurar um sócio, inda que sem pretensão, para instituir uma sociedade limitada, ficando na maioria das vezes um destes com 99% das cotas e o outro sócio com apenas 1% das cotas. Uma grande parte das sociedades por quotas de responsabilidade limitada, designada sociedade limitada pelo novo Código Civil, foi constituída apenas para que se pudesse limitar a responsabilidade do empresário ao valor do capital da empresa. A rigor, o que existe, nestes casos é uma “sociedade de faz de conta”. Uma firma individual disfarçada de sociedade. Basta analisar a quantidade máxima de sociedades em que um único sócio detém a quase totalidade do capital social ou que os dois sócios são marido e mulher, casados em regime de comunhão universal de bens, situação que, aliás, poderá exigir grande número de alterações contratuais já que o novo Código Civil não a admite. A personalidade jurídica é exatamente a separação entre a pessoa do empreendedor e a empresa propriamente dita. Quando a empresa adquire personalidade jurídica, significa dizer que ela se separou daqueles que a criaram, passando assim, após este momento a ter um patrimônio próprio. Ou seja, adquiriu personalidade jurídica, o patrimônio que os sócios entregaram à empresa deixa de ser deles. Em troca eles recebem cotas da empresa, participam dos lucros, e em caso de encerramento da empresa, recebem o que resta após efetuar todos os pagamentos dos credores. 1 1 SESCON-DF, Sindicato das empresas de serviços contá- beis e das empresas de assessoramento, perícias, infor-

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Curso de Direito Artigo Original EIRELI: UM INCENTIVO AO EMPREENDEDORISMO EIRELI: AN INCENTIVE TO ENTREPRENEURSHIP Ariella Monique Toscano Guimarães1, Pedro Antônio Ribeiro de Andrade 2 1 Aluna do Curso de Direito 2 Professor do Curso de Direito

Resumo A instituição da Lei nº 12.441, de 11 de julho de 2011 fez nascer no Direito Empresarial Brasileiro a Empresa Individual de

Responsabilidade Limitada, figura de suma importância para a evolução do comércio, posto que, estimula a formalização de novos

empreendedores e, igualmente daqueles já existentes que, outrora, sentiam-se obrigados a se esconder atrás de sociedades fictícias,

constituídas na realidade por uma única pessoa, com o escopo de apoderar-se dos benefícios inerentes a limitação de

responsabilidade.

Palavras-Chave: Empresário; EIRELI; Empreendedorismo.

Abstract The enactment of Law No. 12,441, of July 11, 2011 gave birth in Brazilian Business Law, the Limited Liability Individual Company, figure

of paramount importance for the development of trade, since it stimulates the formalization of new entrepreneurs and also those already

existing, which once felt obliged to hide behind shell companies, in fact constituted by a single person, with the aim of seizing the

benefits about liability limitation.

Keywords: entrepreneur; EIRELI; Entrepreneurship.

Contato: [email protected]

Introdução

O presente artigo tem como tema de análise o novo modelo de empresário individual de responsabilidade limitada com o advento da Lei n° 12.441 de julho de 2011, o foco principal da referida lei é incentivar, estimulando a formalização do empresário individual por meio da divisão do patrimônio da atividade econômica do patrimônio pessoal do empresário, evitando que a totalidade dos seus bens pessoais responda por dívidas constituídas na atividade empresarial.

A alteração foi realizada diante dos problemas que a legislação anterior enfrentava, pois como é percebido, antes da alteração da lei, os bens pessoais do empresário individual confundia-se com o mesmo patrimônio utilizado no empreendimento, permitindo uma futura execução sobre seus bens pessoais de dívidas decorridas da atividade desenvolvida.

Essa situação era bastante desconfortável para o empreendedor que tinha que responder pessoalmente pelos riscos da atividade, ao empresário de responsabilidade ilimitada uma das alternativas era procurar um sócio, inda que sem pretensão, para instituir uma sociedade limitada, ficando na maioria das vezes um destes com 99% das cotas e o outro sócio com apenas 1% das cotas.

Uma grande parte das sociedades por

quotas de responsabilidade limitada, designada sociedade limitada pelo novo Código Civil, foi constituída apenas para que se pudesse limitar a responsabilidade do empresário ao valor do capital da empresa. A rigor, o que existe, nestes casos é uma “sociedade de faz de conta”. Uma firma individual disfarçada de sociedade. Basta analisar a quantidade máxima de sociedades em que um único sócio detém a quase totalidade do capital social ou que os dois sócios são marido e mulher, casados em regime de comunhão universal de bens, situação que, aliás, poderá exigir grande número de alterações contratuais já que o novo Código Civil não a admite.

A personalidade jurídica é exatamente a separação entre a pessoa do empreendedor e a empresa propriamente dita. Quando a empresa adquire personalidade jurídica, significa dizer que ela se separou daqueles que a criaram, passando assim, após este momento a ter um patrimônio próprio. Ou seja, adquiriu personalidade jurídica, o patrimônio que os sócios entregaram à empresa deixa de ser deles. Em troca eles recebem cotas da empresa, participam dos lucros, e em caso de encerramento da empresa, recebem o que resta após efetuar todos os pagamentos dos credores.1

1 SESCON-DF, Sindicato das empresas de serviços contá-beis e das empresas de assessoramento, perícias, infor-

O empresário individual não possui personalidade jurídica, quando um determinado empreendedor se torna empresário individual, está montando uma empresa com todo seu patrimônio, permitindo-se realizar uma atividade sem sócios, sendo que em caso de dívidas seu patrimônio será usado para quitá-las uma vez que é o mesmo patrimônio, não há distinção entre patrimônio da empresa e patrimônio pessoal.2

“A razão para o empresário individual possuir um CNPJ é permitir que a Receita Federal possa regular o pagamento de impostos, bem como para facilitar a exploração das atividades empresaria, pois o CNPJ é exigido para a realização de uma série de operações, como abrir conta bancária, firmar contratos etc. Desta forma optou-se por permitir o uso do CNPJ, evitando a criação de mais um tipo de cadastro.3” O propósito da Lei n° 12.441/2011 é manter

o patrimônio pessoal, protegendo das possíveis dívidas que poderiam ser contraídas em caso de insolvência da empresa, a sociedade limitada oferece uma proteção evitando que o credor alcance bens pessoais para saldar dívidas da empresa insolvente.

Quase vinte anos de experiências em diversos países do primeiro mundo é o suficiente para ratificar a viabilidade das empresas individuais de responsabilidade limitada. Tais países como: França, Espanha, Portugal, Itália, Bélgica, Alemanha, Dinamarca, Reino Unido, sem mencionar outros continentes, como a América do Sul e o Chile que acabam de introduzir em seu ordenamento jurídico a empresa individual de responsabilidade limitada.4

A inserção da figura EIRELI no direito brasileiro pode proporcionar, seguramente, uma grande desburocratização na criação e no funcionamento das empresas. Sobretudo das micro, pequenas e médias empresas, que ficarão livres de diversos trâmites inerentes as sociedades e dos possíveis percalços provocados pela existência de um sócio com participação fictícia no capital da empresa.5

O propósito é manter o patrimônio pessoal, protegendo-se das possíveis dívidas que podem ser contraídas em caso de insolvência da

mações e pesquisa do Distrito Federal - cartilha EIRELI: principais aspectos da nova figura jurídica. Disponível em: http://www.sescapce.org.br/web/i/arquivos/ 1325864626.pdf. Acesso: 30 mai. 2012. 2 Ibidem. 3 Ibidem. 4 BRUSCATO, Wilges. Apontamentos à empresa individual de responsabilidade limitada - EIRELI: a saga continua. Disponível em: http://www.indexjur.com.br/zero/EIRELI.pdf. Acesso: 30 mai. 2012. 5 BRUSCATO, Wilges. Op. cit.

empresa. A sociedade limitada oferece uma proteção, evitando que o credor alcance os bens pessoais para saldar dívidas da empresa insolvente.

O problema parece ter amenizado, pois a nova Legislação efetuou uma das mais importantes alterações no Direito Empresarial contemporâneo, que passa a introduzir em nosso ordenamento jurídico o novo modelo de empresário individual de responsabilidade limitada, onde é possível constituir uma sociedade quando esta, efetivamente, seja de sua espontânea vontade. O empresário individual não deixará a mercê de seus credores todo seu patrimônio, tendo em vista que sua responsabilidade não é mais ilimitada. A figura do empresário é conceituada no Código Civil artigo 966, como sendo aquele que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Pode-se dizer em outras palavras, que é a pessoa pelo qual se articula os fatores de produção (capital, mão de obra, insumos e tecnologia) de forma organizada para exercer atividade que circula bens ou serviços visando obter lucro para a atividade econômica.

“O empresário pode ser pessoa física ou jurídica, no primeiro caso, denomina-se empresário individual: no segundo, sociedade empresaria. Deve-se desde logo acentuar que os sócios da sociedade empresária não são empresários. Quando pessoas (naturais) unem seus esforços para, em sociedade, ganhar dinheiro com a exploração empresarial de uma atividade econômica, elas não se tornam empresárias. A sociedade por elas constituída, uma pessoas jurídica com personalidade autônoma, é que será empresária para todos os efeitos legais. Os sócios das sociedades empresárias são empreendedores ou investidores, de acordo com a colaboração dada à sociedade.6”

Para ser empresário individual, a pessoa deve encontrar-se em pleno gozo da capacidade civil. Não tem capacidade, portanto para exercer uma empresa, os menores de 18 anos não emancipados, os ébrios habituais viciados em tóxicos, deficientes mentais, excepcionais e os pródigos, e nos termos da legislação própria, os índios.

“Empresário individual, em regra, não explora atividade econômica importante, uma vez que os negócios de vulto exigem naturalmente grandes investimentos, além disso, os riscos de insucesso, inerente a empreendimento de qualquer natureza e tamanho, é proporcional às dimensões do negócio, quanto maior e mais complexa atividade, maiores os riscos. Em consequência, as atividades de maior envergadura econômica são exploradas por sociedades empresárias anônimas ou limitadas, que são os tipos societários que melhor viabilizam a conjugação de capitais e limitação

6 ULHOA, Fábio. Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

de perdas. Aos empresários individuais sobram os negócios rudimentares e marginais, muitas vezes ambulantes dedicando-se às atividades como varejo de produtos estrangeiros adquiridos em zonas francas (sacoleiros), confecção de bijuterias, de doces para restaurantes ou bufês. Quiosques de miudezas em locais públicos, bancas de frutas ou pastelarias em feiras semanais.7”

O que se pretende nestes apontamentos é delinear, o quanto é possível, os aspectos fundamentais dessa nova figura jurídica como apreciação da opção legislativa, as questões atinentes à instituição da EIRELI, que envolvem o seu sujeito, a forma, a denominação, o capital, sua administração e extinção, a aplicação subsidiária das normas societárias, as possibilidades de negociações, bem como a aplicação dos institutos falimentares a ela. O novo dispositivo altera a Lei nº 10.406/2002 - Código Civil e, de acordo com as mudanças, o nome empresarial deverá conter a expressão EIRELI, assim como ocorre hoje com as sociedades (LTDA) e (S.A). Pela lei, o empresário poderá constituir e participar apenas de uma empresa dessa modalidade. Vale ressaltar que também é possível que a EIRELI resulte da concentração de quotas e outra modalidade societária concentradas em um único sócio, sendo que não importará os motivos que levaram a essa concentração. A formação do nome empresarial deve se dar por firma ou denominação os quais deverão constituir-se de seu próprio nome completo ou abreviado, podendo se acrescentar, ficando facultativa uma designação, mas precisa da pessoa do empreendedor ou do gênero da sua atividade acrescido da terminação EIRELI. Por exemplo: José da Silva comércio de alimentos EIRELI, João Batista lanchonete EIRELI. A utilização do nome próprio é uma das características marcantes na empresa individual. 8 Todas as empresas mercantis deverão ser registradas nas Juntas Comerciais conforme os artigos 45 e 1.150 do Código Civil. As referidas normas não foram alteradas pela lei que inseriu o ordenamento da empresa individual de responsabilidade limitada, prevendo expressamente o registro da EIRELI na Junta Comercial. Porém, numa interpretação sistêmica dos citados dispositivos, conclui-se efetivamente que, como pessoa jurídica de direito privado vinculada exclusivamente à atividade empresarial, a EIRELI adquire personalidade jurídica com seu

7 ULHOA, Fábio. Op. cit. 8 SESCON-DF, Sindicato das empresas de serviços contá-beis e das empresas de assessoramento, perícias, infor-mações e pesquisa do Distrito Federal - cartilha EIRELI: principais aspectos da nova figura jurídica. Disponível em: http://www.sescapce.org.br/web/i/arquivos/ 1325864626.pdf. Acesso: 30 mai. 2012.

devido registro na Junta Comercial competente. A distinção entre sociedade e empresa é pertinente para compreender que as sociedades de profissionais que exercem atividade científica, literária ou artística, não são, via de regra, empresas, conforme ditame contido no parágrafo único do artigo 966 do Código Civil. Portanto, não é de se admitir que o profissional assim enquadrado possa constituir uma EIRELI, salvo se o exercício da profissão constituir elemento empresa. No Brasil, a lei prevê que uma sociedade tão somente pode ficar com apenas um sócio durante um período de 180 dias, devendo ser dissolvida após este prazo caso não consiga outro sócio, previsão no artigo 1.033 do Código Civil. A nova lei alterou a redação do parágrafo único deste mesmo artigo para afirmar que a sociedade que estiver com apenas um sócio não precisará ser dissolvida se o sócio remanescente solicitar em empresário individual, ou seja, EIRELI. Para fazer tal alteração não é preciso encerrar a sociedade, basta fazer um pedido de transformação na Junta Comercial, respeitando as regras de instituição da EIRELI. Infere-se que, uma nova modalidade jurídica acaba de ser criada no Brasil para o exercício de atividade econômica com o objetivo de dispensar o empreendedor de constituir um sócio fictício, assim, pode-se verificar que a referida lei faz nascer a figura do empresário individual de responsabilidade limitada, e vem exatamente desta ideia de incentivar o desenvolvimento econômico para que pequenos empreendedores que praticam suas atribuições com informalidade possam registrar, formalizando seus negócios e ter a segurança através da normatização de uma responsabilidade limitada.

1 O EMPRESÁRIO INDIVIDUAL NO DIREITO EMPRESARIAL MODERNO

A evolução do Direito Comercial pode ser dividida em quatro fases, sendo a primeira, de caráter subjetivista, abrangida entre meados do século XII até a metade do século XVI, assinalada pelo surgimento das primeiras organizações de mercadores e artesãos, que se uniram formando as Corporações de Ofício, criadas com o intuito de, definir preços, margens de lucro e aprimoramento técnico sem nenhuma interferência do Estado. Tratava-se de um direito privativo, corporativista, restrito apenas aos comerciantes inscritos nas corporações. No entanto, seus regulamentos se tornariam o alicerce do Direito Comercial.9

9 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. O empresário de res-ponsabilidade limitada. São Paulo: Saraiva, 2012.

A segunda fase se deu durante o período da Revolução Industrial, do desenvolvimento colonialista e da intensificação do mercantilismo, entre os séculos XVII e XVIII, surge uma nova classe econômica composta por mercadores, juízes, advogados, professores, banqueiros, a alta sociedade da época, a burguesia. Esta nova camada social detinha o capital e almejava o poder político que posteriormente emanou com a Revolução Francesa e com a mediação do Estado dando origem a um regulamento único inerente a toda a população. Ainda neste período despontaram os primeiros tipos de sociedade.10

Posteriormente, já com atributos do liberalismo econômico, compreendido entre os séculos XVIII e XX origina-se a terceira fase ou Período Objetivo com o advento do Código Comercial Francês de 1808 (Code de Commerce)11 ou Código Mercantil Napoleônico, centralizado na Teoria dos Atos de comércio, abolindo-se as corporações. Nesta fase se constituiu o direito à liberdade de trabalho e de comércio que abrangia a todos, independente de classe, desde que exercessem alguns atos regulados por lei. A quarta fase ou Período Subjetivo Moderno, o Direito Empresarial propriamente dito, abarca do início do século XX até os dias atuais, tendo início com o Código Civil Italiano de 1942, embasado na Teoria da Empresa, adotada no Brasil, que ampliou a visão do direito de empresa e dos atos de comércio dando enfoque ao exercício profissional de determinada atividade econômica organizada (afora a intelectual), com a finalidade de produzir ou circular bens e serviços. O núcleo é a empresa. 1.1 DA TEORIA DOS ATOS DE COMÉRCIO O início da terceira fase da evolução do Direito Comercial deu-se com o advento, na França, do Código Comercial elaborado em 1807 que passou a vigorar no ano seguinte, eliminando as Corporações de Ofício, transformando-se no marcador temporal entre o sistema subjetivo e objetivo, espelhando o Iluminismo na Revolução Francesa e a conquista do poder pela Burguesia que, mais tarde, culminaria com a queda do Estado Monárquico para inserção da República, devido ao sobrevindo acréscimo de poder dos comerciantes e o advento da Teoria dos Atos de

10 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. O empresário de res-ponsabilidade limitada. São Paulo: Saraiva, 2012. 11 FRANÇA. Code de Commerce. Disponível em: http://www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do?cid Texte=LEGITEXT000005634379. Acesso: 18 mar. 2013.

Comércio.12 O comércio daquela época havia avançado e ganhado força suficientes para não admitir qualquer intervenção ou entrave estipulados pelo Rei ou pelas Corporações surgindo nos comerciantes a necessidade de se alterar o sistema. Algo interessante para a Burguesia, visto que, ela mesma poderia assumir o Poder, após a derrocada do Rei. Assim teve início a Revolução Francesa cujos desígnios eram: a igualdade, formal, entre todos e, a liberdade para a atividade econômica, esta última, foi a precursora da deflagração da Revolução. O historiador Leo Huberman relata com propriedade, a respeito da Revolução Francesa e do Código de Napoleão por ela inserido:

“Destinava-se evidentemente a proteger a propriedade - não a feudal, mas a burguesa. O código tem cerca de 2.000 artigos, dos quais apenas 7 tratam do trabalho e cerca de 800 da propriedade privada. Os sindicatos e as greves são proibidos, mas as associações de empregadores permitidas (...). O Código foi feito pela burguesia e para a burguesia: foi feito pelos donos da propriedade para a proteção da propriedade. Quando o fumo da batalha se dissipou, viu-se que a burguesia conquistara o direito de comprar e vender o que lhe agradasse, como, quando, e onde quisesse.13”

O Code de Commerce14 enceta o Período Objetivo, ou a Terceira fase da evolução do Direito Comercial, com um conjunto de normas revolucionário do qual sua aplicação estava sujeita a todos os cidadãos, sem qualquer distinção. Estabilizando assim, as leis como fonte principal do Direito, sobrepondo-se aos costumes. No decorrer dos séculos XIX e XX, o direito do comércio foi dito como um conjunto de normas que regiam as atividades dos comerciantes no exercício de sua profissão, bem como, os atos por lei, considerados mercantis, ainda que, praticados por não comerciantes, ou seja, o comerciante não era atrelado aos atos de comércio, sendo facultado a qualquer cidadão o exercício de um ato de comércio, desde que sujeitado às normas do Direito Comercial. No entanto há que se distinguir o comerciante, dos atos de comércio: comerciante era todo aquele, pessoa física ou jurídica, que exercia em nome próprio, habitual e profissionalmente, atos de comércio, enquanto que estes eram todos os arrolados como atividade mercantil pelo Código Napoleônico, realizados

12 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. Op.cit. 13 HUBERMAN, Léo. História da riqueza do homem. 20. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1984. p. 162-163. 14 FRANÇA. Code de Commerce. Disponível em: http://www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do?cid Texte=LEGITEXT000005634379. Acesso: 18 mar. 2013.

habitualmente, almejando lucro, com finalidade de mediar, circular, ou intermediar bens e serviços. Há uma variedade de atos de comércio que se desmembram em três grupos: os que assim são por Natureza, também chamados de Subjetivos, são aqueles exercidos profissionalmente pelos comerciantes de acordo com suas atividades econômicas, como por exemplo, as operações de câmbio; a compra e venda de bens móveis ou semoventes para revenda em atacado ou varejo, ou ainda o aluguel destes; os seguros; ou quaisquer atos relativos ao comércio marítimo. Atos por Força da Lei ou Objetivos que, como a própria classificação define, são aqueles estipulados por lei como comerciais, independente de quem os praticam ser ou não comerciante, cabem neste grupo, os inerentes às sociedades anônimas; as operações referentes a títulos da dívida pública, a letras de câmbio, cheques, notas promissórias; arrendamento mercantil; ou empresas de construção civil. Por último, os atos comerciais por Dependência, Conexão, ou Acessórios, sendo estes, aqueles desempenhados por comerciantes que, visando à melhoria e a facilidade no desenvolvimento de seu ofício comercial, como a aquisição de vitrines, balcões, etc., convertem-se em pessoa jurídica com registro e escrituração na Junta Comercial obrigatórios, tornando-se regulados por lei comercial. Os Atos de Comércio surgiram antes dos comerciantes, posto que, para ser comerciante é cogente o exercício profissional dos atos de comércio, porém estes existem independentemente do exercício daqueles. A Teoria dos Atos de Comércio somente chega ao Brasil com a vinda da família Real Portuguesa em 1808, repercutindo, mais tarde, na elaboração do Código Comercial Brasileiro de 1850. 1.2 DA TEORIA DA EMPRESA A quarta fase do Direito Comercial tem início em 1942 com a introdução, por razões políticas e devido ao estreito vínculo entre atividade mercantil e sociedades, do direito comercial no Código Civil Italiano decorrente do rápido desenvolvimento, da diversificação e sistematização das atividades econômicas, distinguindo-se pela unificação da legislação esparsa vigente a época, compilando a normatização dos atos civis relativos à atividade laboral e às empresas e inserindo a Teoria da Empresa que veio dirimir as falhas e substituir a limitada Teoria Francesa, ampliando o campo de

abrangência comercial.15 A matéria do Codice Civile inscrita no Livro V sob o título “Del Lavoro”16 trata de todas as atividades econômicas, tanto as exercidas coletivamente, em sociedade, quanto às exercidas de forma individual. Como o próprio nome já a define, a Teoria da Empresa tem como centro: a empresa. Porém é primordial conceituar a mesma. Para Carvalho de Mendonça:

“Empresa é a organização técno-econômica que se propõe a produzir mediante a combinação dos diversos elementos, natureza, trabalho e capital, bens ou serviços destinados à troca (venda), com esperança de realizar lucros, correndo os riscos por conta do empresário, isto é, daquele que reúne, coordena e dirige esses elementos sob a sua responsabilidade.17”

Miguel Reale ressalta ainda que, a palavra “empresa” foi empregada no sentido de atividade desenvolvida pelos indivíduos ou pelas sociedades a fim de promover a produção e a circulação das riquezas. Sendo esse o objetivo fundamental que rege os diversos tipos de sociedades empresariais. 18 Para a Teoria da Empresa, o fundamental é o desenvolvimento da atividade econômica por meio da constituição de capital, tecnologia, trabalho e matéria-prima. O novo sistema institui a organização e a forma específica de produção e circulação de bens ou serviços, renunciando as atividades de mercancia. “Surge então o conceito de empresa, que em momento algum se confunde com os conceitos de empresário ou estabelecimento”.19 Consta no art. 2.082 do Código Civil Italiano: “É empresário quem exerce profissionalmente uma atividade econômica organizada para fins de produção ou circulação de bens ou de serviços.”20 Essa é a definição dada pelo estatuto ao regente da empresa, surgindo, com isso, a figura do empresário. 15 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. Op.cit. 16 ITÁLIA. Codice Civile. Disponível em: http://www.rcscuola.it/disciplina/ccivile.pdf. Acesso: 19 mar. 13. 17 MENDONÇA, J. X. Carvalho de. Tratado de Direito comer-cial brasileiro. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1945. p. 492. 18 REALI, Miguel. Visão Geral do Novo Código Civil. Disponí-vel em: http://www.miguelreale.com.br /artigos/vgpcc.htm. Acesso: 29 mar. 2013. 19 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. Op.cit. 20 ITÁLIA. Codice Civile. Op.cit.

1.3 DO DIREITO COMPARADO O Direito Comparado nos concede vários exemplos de ordenamentos jurídicos onde já era aceita há décadas a limitação da responsabilidade do empresário individual, como sociedade unipessoal ou modelo não societário. O que até a implementação da Lei n° 12.441/2011 não era aceitável em nossa legislação. Wilgens Ariana Bruscato relata sobre o primeiro exemplar de patrimônio autônomo criado em 1926 no Principado de Liechtenstein

“Em matéria de liberalismo, o Principado de Liechtenstein, que saiu na frente na limitação da responsabilidade do comerciante individual, adotando o modelo de Oskar Pisko, em vigor, pelos artigos 637 a 646 do PGR, é inigualável. Além de ser possível a criação de diversos tipos de pessoas jurídicas unipessoais, para as sociedades de pessoa ou de capital, faculta-se a criação de qualquer outro modelo não previsto em lei, seguidas algumas condições básicas.21”

A Comunidade Europeia em 1989 também reconheceu a possibilidade de haver uma sociedade de responsabilidade limitada de apenas um sócio, com a edição da 12ª Diretiva do Conselho, sob as regras da Comunidade Econômica Europeia, estabelecendo a criação dessa instituição em todos os seus países membros, exceto Portugal, França e o Principado de Liechtenstein que já haviam incorporado em suas legislações a limitação da responsabilidade do empresário individual.22 Essa diretiva fazia parte de um programa de incentivo às pequenas e médias empresas, criado em 03 de novembro de 1986, com o intuito de incitar novos empreendimentos e unificar as normas aplicadas em relação às sociedades unipessoais. Esta unipessoalidade podia ser originária ou superveniente desde que, público o fato, sendo ainda, imprescindível que as decisões tomadas pelo sócio único fossem lavradas em atas ou dispostas por escrito. Em 1986, antes da instituição da 12ª Diretiva, Portugal criou o Estabelecimento Mercantil Individual de Responsabilidade Limitada (EsIRL), através do Decreto-Lei n° 248, inspirado nos modelos incorporados nos ordenamentos da França e Alemanha. O legislador à época não estava preparado para admitir a sociedade unipessoal originária optando pela modalidade não societária de proteção do comerciante individual.

21 BRUSCATO, Wilges Ariana. Empresário individual de responsabilidade limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 253. 22 BRUSCATO, Wilges Ariana. Op. cit.

As contribuições doutrinárias portuguesas sobre a regulamentação jurídica específica das sociedades de um único sócio são escassas.23 Para o legislador português a empresa individual representaria um processo mais complicado. Qualquer pessoa física que pretendesse exercer uma atividade comercial podia instituir o EsIRL através de escritura pública. Entretanto o decreto-lei restringia o capital mínimo a cinco mil euros, podendo ser constituído de dinheiro, no importe mínimo de dois terços do total, e/ou bens suscetíveis de penhora, e deveria estar plenamente disponível para o estabelecimento assim que fundado, além de ser facultada a criação de apenas um Estabelecimento por pessoa, podendo este ser alugado, penhorado, vendido, doado, ou tido como bem de usufruto, respeitado o procedimento legal e o princípio da publicidade dos atos, sob pena de nulidade. O fundador do EsIRL poderia ser responsabilizado caso não declarasse com precisão o capital que constitui seu estabelecimento, ou falisse por motivo relacionado ao exercício de sua atividade comercial desde que comprovado desrespeito ao princípio da separação patrimonial, porém seu patrimônio total respondia por todas as dívidas adquiridas antes da publicação da instituição do EsIRL. Embora tenha suscitado a inovação, na prática empresarial da sociedade portuguesa o EsIRL não obteve êxito. O que levou a concepção, em 1996, por meio do Decreto-Lei n° 257, da Sociedade Limitada Unipessoal que pode ser assim constituída de forma originária, resultar da transformação de um EsIRL, ou ainda da manifestação de um sócio com concentração superveniente de quotas que almeja a alteração de EsIRL para Sociedade. O advento da Sociedade Unipessoal através do Decreto-Lei 257/96 foi de suma importância para revigorar as atividades econômicas, a iniciativa privada, e para assegurar a estabilidade e a geração de novos empregos dentro das pequenas empresas, mesmo em períodos de crise.

“A criação do estabelecimento individual de responsabilidade limitada pelo Decreto-Lei n° 248/86, de 25 de agosto, não atingiu esses resultados. Fiel à doutrina tradicional, o legislador de então não conseguiu ultrapassar a concepção institucional. (...) Afastou-se expressamente das soluções já nessa altura adotadas pela Alemanha e pela França. (...) Teve-se como indiscutível que a sociedade unipessoal não era instrumento apropriado à realidade do nosso país e daí enveredar-se por uma pretensa e difícil inovação. Negou-se personalização a algo que reclamava. (...) Mas importa, sobretudo facultar às pessoas uma forma de limitação da sua responsabilidade que não passe pela constituição de sociedades fictícias, com “sócios de favor”, dando azo a situações pouco claras no tecido

23 COSTA, Ricardo Alberto Santos. A sociedade por quotas unipessoal no direito português. Coimbra: Almedina, 2002. p. 257-258.

empresarial.24”

A Sociedade por Quotas da legislação portuguesa é correlata à Sociedade Limitada brasileira. Assim como Portugal, a França criou em 24 de julho de 1966, com o propósito de aperfeiçoar as sociedades comerciais, a Lei nº 1.966-537, esta rejeitava a unipessoalidade originária, mas já admitia a unipessoalidade superveniente sendo, ainda assim, um avanço na legislação francesa. Após um estudo realizado pelo Projeto Champaud em 1977 com o escopo de proteger o empresário individual instituiu-se, através da Lei nº 1.985-697 de 11 de julho de 1985, a Enterprise Unipersonnelle à Responsabilité Limitée - EURL25 que era criada como Société à Responsabilité Limiteé – SARL que corresponde, no Brasil, à Sociedade Limitada.

“A admissão da EURL, na França, representou a consagração da teoria institucionalista naquele país”.26

A SARL era constituída por duas ou mais pessoas, ou por apenas uma pessoa, nos casos previstos em lei, ou seja, a Lei nº 1.966-537 modificou apenas o seu regime jurídico ao invés de adicionar mais uma categoria dentro de sociedade limitada. Não se admitia a administração de pessoa jurídica, permitia-se ser o próprio sócio único o administrador, desde que fosse pessoa física. O mesmo era adotado pela EURL em Portugal. A EURL de Portugal difere-se da SARL apenas pela exigência de ausência da pluralidade de sócios.27

24 PORTUGAL. Decreto-Lei n°257/96: Código das Sociedades Comerciais. Disponível em: http://legix.priberam.pt/docs/CSC-13_Abr_2011.pdf. Acesso: 03 abr. 2013. 25 FILHO, Calixto Salomão. A sociedade unipessoal. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 33. 26 ISFER, Edson. Sociedades unipessoais e empresas indi-viduais: responsabilidade limitada. Curitiba: Juruá, 1996. p. 128. 27 DAIGRE, Jean-Jaques. La société unipersonnelle: revue internationale de droit comparé. Paris, société de législation comparée. Paris, 1990. 42. v. Versão traduzida. Disponível em: http://www.legiscompare.fr/site-web/?-Droits-etrangers-&PHPS ESSID=66f0e9d5d04eb7aa301d0f43cf ec534b. Acesso: 03 abr. 2013.

2 RAZÕES DAS MUDANÇAS NO INSTITUTO DO EMPRESÁRIO INDIVIDUAL

Diversos Países como França e Itália, adotaram modelos de organizações empresárias conferindo-lhes limitação de responsabilidade patrimonial. O Brasil possivelmente influenciado por essa tendência mundial acerca da questão da limitação da responsabilidade patrimonial do empresário individual passou a discutir a respeito do tema, tanto em debates doutrinários quanto por legisladores que buscavam o engendramento da normatização. A priori existiam duas modalidades societárias essenciais: a sociedade anônima e a sociedade limitada, ambas além de representarem uma atividade empresarial responsável pela produção e circulação de bens, e incentivo à economia do país, ofereciam ao investidor risco patrimonial limitado ao patrimônio constituído pelo exercício de sua atividade comercial. Porém o mesmo não ocorria àqueles que preferiam desempenhar individualmente sua atividade econômica. 28 Thiago Ferreira Cardoso Neves, na Revista Emerj publicada no segundo semestre de 2011, faz uma síntese acerca da situação do empresário individual dentro do nosso ordenamento jurídico:

“O empresário individual, no exercício de sua atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços, possui responsabilidade ilimitada, ou seja, responde ele diretamente com seu patrimônio pessoal pelas obrigações contraídas no exercício da empresa. Assim, quando é exercida a atividade empresarial pela pessoa natural, não se aplica a teoria da personalidade jurídica, ou seja, a empresa, por ser uma atividade e não uma pessoa jurídica, não possui personalidade jurídica própria, distinta da pessoa do empresário, razão pela qual não existe separação patrimonial. Então, não há que se falar, na hipótese do empresário individual, na existência de dois patrimônios: um geral, da pessoa natural, e um outro separado, afetado ao exercício da atividade econômica organizada. E isso se deve ao fato de que o empresário individual exerce a empresa em seu nome próprio.29”

Logo, os empresários que optassem pela atuação individual arcavam, ilimitadamente, com os riscos do exercício de sua atividade econômica, suscetíveis não somente ao patrimônio constituído pela atividade comercial como também por seus bens particulares, ressalvados legalmente os bens

28 ULHOA, Fábio. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. 29 FILHO, Demócrito Reinaldo. et al. A nova empresa indivi-dual de responsabilidade limitada: memórias póstumas do empresário individual. Revista Emerj, out./dez. 2011. p. 220, 14. v.

impenhoráveis, como os de família.30 Ou seja, aqueles que preferem desempenhar de forma societária suas atividades comerciais têm a prerrogativa da limitação de responsabilidade, inerente as principais modalidades de sociedade, além da possibilidade de maior obtenção de investimentos e consequentemente de lucros, devido ao maior número de investidores, assim como de informações e ideias indispensáveis ao progresso da atividade. Enquanto que aqueles que elegiam a forma individual, auferiam integralmente o lucro e possuíam pleno domínio sobre o andamento de sua atividade comercial embora sucumbissem ao ônus da responsabilidade ilimitada. 2.1 DA REALIDADE SOCIAL E ECONÔMICA A sistemática acerca da responsabilidade do empresário individual incitou os negociantes a buscarem outros meios, por vezes de cunho duvidoso, para resguardar seu patrimônio pessoal dos riscos de sua atuação empresária. Tal condição não era coerente com os interesses de diversos setores da atividade econômica, como ressalta Sylvio Marcondes Machado:

“[...] o princípio da responsabilidade individual ilimitada, especialmente no caso de pessoas físicas, não se coaduna com os caracteres da atividade econômica moderna. A extensão e o complicado entrelaçamento dos negócios, a enorme dificuldade de previsão nas operações comerciais e industriais, os riscos e perigos que as circundam na interdependência, frequentemente mundial, dos fatos econômicos, impõe a limitação dos riscos patrimoniais.31”

A busca pela limitação da responsabilidade patrimonial impulsionou a formação de sociedades que permitem a preservação do patrimônio pessoal, sendo amplamente utilizadas as sociedades limitada ou anônima. A formação destas, porém, não raro se dava entre sócios sem affectio societatis, ou seja, sem reciprocidade, sem manifesto desejo de associar-se, transformando assim, uma entidade associativa em uma empresa de um só dono. 30 BRASIL. Lei Nº 8.009, de 29 de março de 1990. Art. 1º. Dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l80 09.htm. Acesso: 16 jun. 2013. 31 MACHADO, Sylvio Marcondes. Limitação de responsabili-dade do comerciante individual. São Paulo: Max Limonad, 1956. p. 11-12.

“Numerosos são, entretanto, os casos em que a pessoa natural, ou jurídica organiza uma sociedade, tendo como objeto a exploração de uma empresa de fim lucrativo ou a realização de negócios, congregando, para este fim, outras pessoas. Essas últimas concorrem para a formação da sociedade; na realidade, porém, não entram com nenhuma contribuição para o capital social. Prestam um favor ou serviço a único dono da sociedade: são os sócios aparentes.32”

Nesse viés, também se verifica ocultação do

patrimônio particular por parte de empresários que, por vezes, adquiriam bens em nome de terceiros ou ainda instituíam sociedades fictícias possuindo sócios com participação irrisória, ou ainda meros sócios “emprestadores” de nomes.

“[...] “sociedades de fachada”, nas quais um dos sócios detém 99,9% dos votos (ou outro percentual expressivo, próximo a este), enquanto o outro sócio detém a parcela ínfima restante, servindo como mero “sócio de fachada”, sócio-laranja” ou “sócio testa de ferro” [...] trata-se, na verdade, de uma sociedade unipessoal disfarçada, de um drible no atraso de nossa legislação societária.33”

Nesse contexto, verificam-se vertentes doutrinárias diversas, como por exemplo, a do professor Waldírio Bulgarelli que acreditava que a constituição dessas sociedades, ditas por ele, “etiquetas”, eram suficientes para a limitação do empresário individual, acreditava, assim como Tulio Ascarelli, que se tratavam, em relação à causa, de um negócio jurídico indireto onde não havia intenção de fraudar ou simular e não prejudicava os credores, apenas ostentava a condição de responsabilidade limitada dos sócios, que em caso de fraude, ainda haveria a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica ou a penhora das cotas para atender aos credores particulares. Sendo assim, não viam razão para extinção dessa conduta pelos empresários.34 Por outro lado, temos a visão do jurista Paulo Salvador Frontini que, vislumbrava a figura do empresário individual como titular de um patrimônio apartado, formado pelos ativos da sua atividade econômica exercida individualmente. Afirmando ser necessário reconhecer que o empresário, enquanto pessoa natural, já é detentor de dois patrimônios: o natural previsto no art. 91 do Código Civil / 2002, que se consolida em todo ser humano, como direito de personalidade, e o empresarial, separado, composto pelo ativo e

32 Estabelecimento autônomo. Revista Forense, out. 1943. p. 578. 96. v. 33 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial es-quematizado, p.167. 34 BULGARELLI, Waldírio. A teoria jurídica da empresa. p. 416.

pelo passivo, afetados à atividade econômica organizada do empresário, cuja existência e reconhecimento derivam de uma exegese fundada nos preceitos dos artigos 966, 968, III e IV e 978, do nosso Código Civil.35 Até mesmo o Código Civil Atual, desde sua vigência, diverge em artigos relacionados ao empresário individual, enquanto um começava a permitir a afetação patrimonial pelo exercício da empresa, como por exemplo, o artigo 978 que, possibilita a alienação dos imóveis ligados ao exercício da empresa, sem a necessidade de outorga conjugal, o outro, artigo 974, § 2º, sanciona a proteção dos bens que o incapaz já possuía, ao tempo da sucessão ou da interdição, desde que estranhos ou não relacionados ao exercício da empresa.36 No que tange ao artigo 978 do Código Civil, embora haja certa afetação patrimonial com intuito de promover as negociações da empresa, mesmo em detrimento da preservação da meação do cônjuge cuja autorização é dispensável para alienação de imóveis relacionados ao exercício desta, não há a limitação da responsabilidade do empresário individual. Enquanto que, no que se refere ao artigo 974, § 2º do Código Civil, excepcionalmente, após burocrática autorização judicial, que permite a continuidade da empresa, restringindo, porém, a possibilidade de que as dívidas adquiridas no exercício da atividade empresária afetem os bens de propriedade do incapaz que não fazem parte do acervo desta, visando à proteção do patrimônio do incapaz, há limitação da responsabilidade do empresário individual, por ser incapaz. O ilustre jurista Dr. J. M. Othon Sidou sintetiza, com concisão, a evolução do pensamento jurídico pertinente à limitação da responsabilidade do empresário no âmbito do Direito Empresarial:

“Em princípio, a sociedade coletiva em que todo patrimônio dos sócios é responsável ilimitada e solidariamente, com gestão pessoal dos mesmos, é o princípio escorreito da societas romana. Depois as sociedades comanditárias, sem gestão pessoal dos componentes, que por esse motivo têm limitada sua responsabilidade. Logo a seguir, a ampliação desta não responsabilidade independente do fator gestivo, por meio das sociedades anônimas em que o acionário administra não nessa qualidade, mas como mandatário. E, finalmente as sociedades por cotas de responsabilidade limitada, nas quais o cotista gerencia, já não como mandatário, mas como sócio mesmo, e sobre o qual os credores – salvantes os vícios de administração – não têm ação indefinida para recobro de credito. Necessariamente, o novo passo a dar, por dedução lógica, será a admissibilidade de restrição societária ao individuo, que pode gerir como

35 Revista do instituto dos advogados. São Paulo: RT, jul./dez. 2007. p.268. a. 10, n. 20. 36 BRASIL. Código civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002.

empresário, tendo por limite de responsabilidade o negocio erigido, como razão social, em ficção jurídico-econômica.37”

Esse panorama, inda que perfunctório, acerca dos argumentos doutrinários, favoráveis ou desfavoráveis, à limitação da responsabilidade empresarial na atuação individual põe em voga, do ponto de vista econômico, a questão do estímulo para constituição de novas empresas e negócios e, consequentemente, do surgimento de novos empresários (agentes econômicos), devido à limitação do risco que o empresário individual passa a ter. O douto professor Antônio Martins Filho argumenta, já na década de cinquenta, a respeito da inclusão da empresa individual de responsabilidade limitada em nosso ordenamento, por acreditar ser indispensável à evolução econômica do país.

“Se duas pessoas associadas podem limitar a responsabilidade, porque isoladamente lhes é vedado fazê-lo? Não é verdade que a limitação dos riscos, em matéria de direito civil constitui problema de ordem técnica e, pois, capaz de ser solucionado pelo acolhimento de novo instituto? Noutras palavras: como explicar o estacionamento do processo evolutivo da limitação da responsabilidade na empresa comercial societária, quando é evidente que a última etapa dessa evolução está na empresa individual? 38”

No entanto, tais prerrogativas podem ser percebidas também no âmbito social, posto que, a limitação do patrimônio propicia estabilidade financeira pessoal ao empresário, pois, o patrimônio apartado do acervo empresarial fica protegido da ação dos credores da empresa. De tal modo, esse patrimônio particular do empresário fica destinado apenas a assegurar a subsistência de determinados bens essenciais a ele e sua família.39 2.2 DOS ASPECTOS TRIBUTÁRIOS Por se tratar de pessoa jurídica destinada a atividade empresária, a empresa individual de responsabilidade limitada pode optar pelos seguintes regimes tributários: lucro real, lucro 37 Empresa individual de responsabilidade limitada. Revista Forense, out./dez. 1963. p. 40. a. 60. 38 FILHO, Antônio Martins. Limitação de responsabilidade do comerciante individual. Faculdade de Direito do Ceará, 1950. p. 10. p. 25. 39 LYNCH, Maria Antonieta. O patrimônio de afetação e as empresas individuais de responsabilidade limitada. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. p.100. 148. v.

presumido ou Simples Nacional de acordo com o Decreto nº 3.000/99.40 Com o advento da Lei Complementar nº 139 em novembro de 2011, foram perpetradas alterações no Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (Lei Complementar nº 123/06), com o intuito de adaptá-lo a EIRELI, passando a conter expressamente em seu art. 3º a empresa individual de responsabilidade limitada, assim como estabeleceu novos limites para a receita bruta anual.41

“Art. 3o Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, [...]42”

No entanto, não é possível o enquadramento da EIRELI como microempreendedor individual (MEI), conforme o art. 18-A, §1º, da Lei Complementar nº 123/06 e art. 91 da Resolução nº 94/11do Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN).

3 ASPECTOS RELEVANTES DA EIRELI A Lei nº 12.441, de 11 de julho de 2011, introduz ao ordenamento jurídico brasileiro, e dispõe a respeito da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI. Referida norma apresenta a possibilidade jurídica de uma pessoa natural constituir, individualmente, uma pessoa jurídica para exploração de atividade empresária. Indubitavelmente, tratou-se de um progresso na economia do país, um avanço para o Direito Empresarial, pois diminuiu de imediato a burocracia. A legislação citada entrou em vigor apenas em janeiro de 2012, depois de transcorridos 180 dias de vacatio legis, expressamente prevista no 40 BRASIL. Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999. Dispo-nível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3000.htm. Aces-so: 16. jun. 2013. 41 BRASIL. Lei Complementar nº 139, de 10 de novembro de 2011. Disponível em: http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/LeisComplementares/2011/leicp139.htm. Acesso: 26. jun. 2013. 42 BRASIL. Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm . Aces-so: 26. jun. 2013.

artigo 3º da mesma.43 O dispositivo em epígrafe altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para permitir a constituição de empresa individual de responsabilidade limitada, acrescentando o inciso VI ao art. 44, o art. 980-A ao Livro II da Parte Especial e alterando o parágrafo único do art. 1.033, de modo a instituir a empresa individual de responsabilidade limitada, nas condições que especifica.44

“Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integraliza-do, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior sa-lário-mínimo vigente no País.45”

Em análise ao disposto no artigo acima citado, observa-se que o legislador não menciona se a EIRELI poderá ser constituída por pessoa física ou jurídica, apenas generaliza: “pessoa”. No projeto base, Projeto de Lei nº 18, de 2011 (nº 4.605/09 na Câmara dos Deputados), esta premissa foi analisada pelo deputado Marcos Montes que, fez constar a descrição: “pessoa natural”, conforme quadro comparativo.46

Posteriormente à sua apresentação na Câmara dos deputados, o projeto foi modificado, conforme podemos comparar:

43 BRASIL. Lei 12.441/11 – EIRELI. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12441.htm. Acesso: 16. jun. 2013. 44 Ibidem. 45 BRASIL. Lei 12.441/11 – EIRELI. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12441.htm. Acesso: 22. jun. 2013. 46 BRASIL. Projeto de Lei nº 4.605/09. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=32EF1A6BE55E73842F6240019E2DF5B8.node1?codteor=631421&filename=PL4605/2009. Acesso: 22. jun. 2013.

Destarte, a lei deixa de mencionar que a EIRELI poderá ser constituída por único sócio, pessoa natural, passando a constar em sua redação apenas: única pessoa, sem expressamente, descrever que tipo de pessoa poderá constituir uma EIRELI, se física ou jurídica, generalizando apenas.47 No entanto, pode-se inferir do artigo 980-A, em seu parágrafo 3º, abaixo citado, que o legislador passou a admitir a constituição de uma empresa individual por pessoa jurídica ao aceitar a possibilidade de concentrar as quotas de outra modalidade societária num único sócio.

“§ 3º A empresa individual de responsabilidade limitada também poderá resultar da concentração das quotas de outra modalidade societária num único sócio, independentemente das razões que motivaram tal concentração.48”

Os ilustres colaboradores da Revista Forense, Magister de Direito Empresarial, concluem:

“Como alternativa à sistemática do empresário individual, a Lei nº 12.441/2011 autorizou a pessoa natural a constituir apenas uma única pessoa jurídica do tipo EIRELI. Entretanto, não restringiu a quantidade de pessoas jurídicas ou subsidiárias integrais que podem ser constituídas por outra pessoa jurídica. É preciso ressaltar que as pessoas jurídicas também podem constituir EIRELI, situação que corresponde à instituição de subsidiária integral, tal qual já admitido há muito tempo pelos arts. 251 e 252 da Lei nº 6.404/76.49”

Ante o exposto, inda que o legislador não tenha mencionado, fica implícito que a EIRELI poderá ser constituída tanto por pessoa física, quanto por pessoa jurídica. Quando assim for por pessoa natural, observando o disposto no art. 980-A e seu parágrafo 2º, a pessoa física, por óbvio, civilmente capaz e sem nenhum impedimento legal, estará apta a instituir uma empresa individual de responsabilidade limitada, desde que não possua outra de modalidade análoga.

“Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País. [...]

47 BRASIL. Código civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002. Art. 980-A - incluído pela Lei 12.441 de 2011. 48 Ibidem. 49 TARTUCE, Flávio, et. al. Revista magister de Direito Em-presarial. nº 41. Ano VII. out.-nov./2011. p. 77.

§ 2º A pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade.50”

Assim como é facultada a criação de uma EIRELI por pessoa jurídica, como preceitua, implicitamente, o § 3º do art. 980-A, principalmente quando esta resulta da concentração das quotas de outra modalidade societária em apenas um sócio, independente das razões que incitaram tal concentração. A inclusão da lei em contexto alterou também o disposto no art. 1.033, parágrafo único, do Código Civil, que optou pela não aplicação da dissolução da sociedade em caso de ausência da pluralidade de sócios em prazo maior que 180 (cento e oitenta) dias, caso o sócio remanescente, pessoa natural ou jurídica, requeira a transformação do registro da sociedade para empresa individual de responsabilidade limitada.

“Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer [...] IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis, a transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para empresa individual de responsabilidade limitada, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 51

3.1 DA CAPACIDADE PARA CONSTITUIÇÃO

DA EIRELI A pessoa natural, ou pessoa física, em pleno gozo da capacidade civil e que não esteja legalmente impedida, e tenha pretensão de exercer profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços, estará apta a instituir uma empresa individual de responsabilidade limitada.

“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos.52”

50 BRASIL. Código civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002. Art. 980-A - incluído pela Lei 12.441 de 2011. 51 Ibidem. 52 BRASIL. Código civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso: 22. jun. 2013.

Sendo assim, qualquer pessoa, maior de 18 (dezoito) anos ou emancipada, pode constituir uma EIRELI, desde que não esteja impedida legalmente, como por exemplo, os magistrados, ou militares da ativa, que contrário ao descrito no art. 170, parágrafo único da Constituição Federal, lhes é vetado o exercício da atividade empresarial.53 Caso o titular da empresa torne-se incapaz ou impedido legalmente, ou ainda se for incapaz, por idade ou por incapacidade superveniente, e ter auferido os direitos da EIRELI por legado ou herança, a continuidade da atividade empresarial ficará sujeita a nomeação de representante ou assistente, mediante autorização judiciária.54

“Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança. 55 § 1o Nos casos deste artigo, precederá autorização judicial, após exame das circunstâncias e dos riscos da empresa, bem como da conveniência em continuá-la, podendo a autorização ser revogada pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do menor ou do interdito, sem prejuízo dos direitos adquiridos por terceiros. Art. 975. Se o representante ou assistente do incapaz for pessoa que, por disposição de lei, não puder exercer atividade de empresário, nomeará, com a aprovação do juiz, um ou mais gerentes.56”

No que tange a capacidade das pessoas jurídicas, apenas as que exercem atividade típica do empresário é que podem instituir uma EIRELI, como as sociedades empresárias, que já possuem determinado objeto, desde que não estejam legalmente impedidas, tributária ou administrativamente.57

“Exemplo de fácil verificação é um posto de combustíveis, exercido por uma determinada sociedade empresaria, “Posto de Combustíveis Ubatuba Ltda.”, sociedade esta formada pelos sócios João Silva e Maria Silva. Esta sociedade quer montar uma pequena lanchonete no interior da loja principal e lá vender lanches e refrigerantes, mediante contabilidade e funcionários diferenciados, já que se trata de objetos

53 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso: 22. jun. 2013. 54 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. O empresário de res-ponsabilidade limitada. São Paulo: Saraiva, 2012. 55 BRASIL. Código civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso: 22 jun. 2013. 56 Ibidem. 57 Ibidem.

distintos.

Por meio da Lei nº 12.441/2011 poderá a empresa principal constituir uma menor, para exercer a atividade pretendida, denominando-a Uberaba Conveniências e Lanches EIRELI, tendo como única empreendedora a sociedade Uberaba Supermercados Ltda. Tal criação, além de facilitar a escrita contábil e regular da empresa, permite uma melhor organização dos negócios.58”

Para tanto, pessoa física ou jurídica, devem obrigatoriamente inscrever-se no Cartório de Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes de iniciar suas atividades, posto que, através deste registro nasce a personalidade e a segurança jurídica, necessárias ao exercício da atividade pretendida.59 Tal inscrição deve observar o disposto nos artigos 968 e 997 do Código Civil:

“Art. 968. A inscrição do empresário far-se-á mediante requerimento que contenha: I - o seu nome, nacionalidade, domicílio, estado civil e, se casado, o regime de bens; II - a firma, com a respectiva assinatura autógrafa; III - o capital; IV - o objeto e a sede da empresa. § 1o Com as indicações estabelecidas neste artigo, a inscrição será tomada por termo no livro próprio do Registro Público de Empresas Mercantis, e obedecerá a número de ordem contínuo para todos os empresários inscritos. § 2o À margem da inscrição, e com as mesmas formalidades, serão averbadas quaisquer modificações nela ocorrentes. § 3o Caso venha a admitir sócios, o empresário individual poderá solicitar ao Registro Público de Empresas Mercantis a transformação de seu registro de empresário para registro de sociedade empresária, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008) § 4o O processo de abertura, registro, alteração e baixa do microempreendedor individual de que trata o art. 18-A da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, bem como qualquer exigência para o início de seu funcionamento deverão ter trâmite especial e simplificado, preferentemente eletrônico, opcional para o empreendedor, na forma a ser disciplinada pelo Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios - CGSIM, de que trata o inciso III do art. 2o da mesma Lei. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011). § 5o Para fins do disposto no § 4o, poderão ser dispensados o uso da firma, com a respectiva assinatura autógrafa, o capital, requerimentos, demais assinaturas, informações relativas à nacionalidade, estado civil e regime de bens, bem como remessa de documentos, na forma estabelecida pelo CGSIM. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011).

58 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. Op. cit. p. 96 - 97. 59 BRASIL. Código civil. Op. cit.

Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la; V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato.60”

Em suma o registro da EIRELI será feito através de requerimento contendo, obrigatoriamente, o nome, nacionalidade, domicílio, estado civil se pessoa natural, e a firma ou denominação, nacionalidade e sede se jurídica; a firma ou a denominação da empresa individual de responsabilidade limitada sempre acrescida da expressão ‘EIRELI’; objeto, sede e prazo de duração; capital sócia, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária em valor não inferior a 100 (cem) vezes o maior salário mínimo vigente no País; as pessoas naturais incumbidas da administração, seus poderes e atribuições.61

Conforme art. 969 do Código Civil a empresa de responsabilidade limitada que abrir filial em local de jurisdição de outro Registro Público de Empresas Mercantis, precisará inscrevê-la também neste com a comprovação da inscrição originária, juntamente com a averbação do novo registro. O descumprimento das regras supracitadas pode implicar na irregularidade da empresa, gerando até mesmo a desconsideração da personalidade jurídica de acordo com o disposto no art. 50 do Código Civil. 60 BRASIL. Código civil. Op. cit. 61 Ibidem.

3.2 DO NOME EMPRESARIAL O Código Civil traz regras sobre o nome empresarial, a partir do artigo 1.155, que regulamenta as hipóteses da identificação dada àquele que exerce a atividade econômica. No projeto base a nomenclatura utilizada para definir a empresa individual de responsabilidade limitada era análoga à definição utilizada pelo empresário, conforme quadro comparativo.62

O projeto apresentado sofreu alteração posterior consolidando-se com a seguinte redação:63 Destarte pode-se observar que o termo EIRL foi alterado para EIRELI, admitindo assim tanto o emprego da firma quanto da denominação, segundo postulado no art. 1.158 do Código Civil.

“Art. 1.158. Pode a sociedade limitada adotar firma ou denominação, integradas pela palavra final "limitada" ou a sua abreviatura. § 1o A firma será composta com o nome de um ou mais sócios, desde que pessoas físicas, de modo indicativo da relação social. § 2o A denominação deve designar o objeto da sociedade, sendo permitido nela figurar o nome de um ou mais sócios. § 3o A omissão da palavra "limitada" determina a responsabilidade solidária e ilimitada dos administradores que assim empregarem a firma ou a denominação da sociedade.64”

Deste modo se faz mister o acréscimo do termo abalizador, não só para a sociedade limitada como também para a empresa individual de responsabilidade limitada, para definir sua natureza jurídica afim de facilitar sua distinção, e evitar que se confunda com outro tipo de empresa, além de resguardá-la em sua jurisdição concernente.

62 BRASIL. Projeto de Lei nº 4.605/09. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposiçõesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=32EF1A6BE55E73842F6240019E2DF5B8.node1?codteor=631421&filename=PL+4605/2009. Acesso: 23 jun. 2013. 63 BRASIL. Lei 12.441/11 – EIRELI. Op. cit. 64 BRASIL. Código civil. Op. cit.

3.3 DO CAPITAL DA EIRELI O ilustríssimo advogado Paulo Leonardo Vilela Cardoso define capital como os recursos suficientes para o exercício da atividade econômica, diferenciando-o do patrimônio, que oscila a partir da integralização da quantia inicial.65 Com fundamento no projeto base, este montante deverá ser prontamente integralizado em moeda corrente ou com bens suscetíveis de avaliação pecuniária, desde que pormenorizados e avaliados por especialistas na área, sendo que, dois terços desse valor (em espécie) deveriam estar disponíveis em conta corrente em nome do titular, com intuito de advir confiabilidade aos relacionamentos empresariais.66 O Deputado Marcos Montes apresentou o projeto de lei à Câmara com um parágrafo dispondo a respeito da integralização do capital análoga as regras das sociedades limitadas, redação esta que foi posteriormente modificada, como se pode comparar:67

Ou seja, tudo que a lei não dispor a respeito da EIRELI será observado o deliberado às sociedades limitadas. No entanto, o referido dispositivo demonstra claramente a obrigatoriedade de um capital mínimo, devidamente integralizado, não inferior a 100 (cem) salários mínimos vigentes para a constituição de uma empresa individual de responsabilidade limitada.68

“Diagrama-se, com isso, qualquer impossibilidade, pela vedação expressa, da integralização ser diluída ao longo do tempo, ou postergada, de tal sorte que o legislador, afeto ao assunto, proclamou a obrigatoriedade do capital mínimo constitutivo, no momento da abertura do negócio empresarial.69”

65 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. Op. cit. 66 BRASIL. Projeto de Lei nº 4.605/09. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=32EF1A6BE55E73842F6240019E2DF5B8.node1?codteor=631421&filename=PL+4605/2009. Acesso: 23 jun. 2013. 67 Ibidem. 68 BRASIL. Lei 12.441/11 – EIRELI. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/ l12441.htm. Acesso: 23 jun. 2013. 69 ABRÃO, Carlos Henrique. Empresa individual. São Paulo: Atlas, 2012. p. 18.

Tal capital foi incluso através da emenda do Deputado Marcelo Itagiba a fim de padronizar o porte da organização que pode instituir uma EIRELI, assim como para inibir a ocultação de vínculo ou outra relação, além de garantir que os recursos serão satisfatórios para a inicialização do negócio trazendo segurança jurídica a terceiros que se relacionarão com a empresa.70 Vale salientar que, este referido montante destinado ao capital mínimo não pode se confundir com o patrimônio da empresa sequer, ser usado para liquidar as obrigações corriqueiras da empresa. O empreendedor que não dispor do referido valor poderá, inscrever-se como empresário nos moldes do artigo 966 do Código Civil, podendo futuramente, caso queira, converter-se em EIRELI.71

4 DISSOLUÇÃO, RECUPERAÇÃO E FALÊN-CIA DA EIRELI

A empresa individual de responsabilidade limitada encerrará, caso queira, o seu negócio através de exclusiva vontade do titular, posto que, não existem sócios, mediante a dissolução da personalidade jurídica, observadas as regras aplicadas as sociedades limitadas e o disposto no artigo 1.087 e aos que ele remete: artigos 1.044 e 1.033, todos do Código Civil. Veja-se:

“Art. 1.087. A sociedade dissolve-se, de pleno direito, por qualquer das causas previstas no art. 1.044. Art. 1.044. A sociedade se dissolve de pleno direito por qualquer das causas enumeradas no art. 1.033 e, se empresária, também pela declaração da falência. Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: I - o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado; II - o consenso unânime dos sócios; III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis, a transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para empresa individual de responsabilidade limitada, observado, no que cou-

70 BRASIL. Projeto de Lei nº 4.605/09. Op. cit. 71 BRASIL. Código civil. Op. cit.

Art. 985-A. (...) § 2º A firma da empresa individual de responsabilidade limitada deverá ser formada pela inclusão da expressão ‘EIRL’ após a razão social da empresa.

ber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 12.441, de 2011) (Vigên-cia)72

Em análise ao que tange o artigo 1.033 em epígrafe, podemos ainda dividir suas hipóteses de dissolução em judiciais e extrajudiciais:73

A referida dissolução deverá ser feita por meio de escritura pública ou escrito particular, devidamente assinada pelo administrador, titular, procurador com poderes específicos, ou terceiro interessado de acordo com o art. 1.151 do Código Civil, ou ainda, em caso de falecimento do titular, os sucessores que tenham decidido pela liquidação da EIRELI e o inventário tiver sido feito por escritura pública, a respectiva certidão de inteiro teor deverá ser juntada ao ato de extinção, sem obrigatoriedade de visto do advogado no instrumento de desconstituição.74 No entanto, esta compreende algumas etapas, sendo estas: a liquidação, partilha dos bens e regularização perante o registro público, assim como a quitação de algum débito devido, sobretudo de ordem tributária.75 Embora a Lei nº 12.441/11 não mencione expressamente, é indubitável ser esta apta a valer-se também da recuperação judicial e da falência, atinente ao fato de ser o empresário individual dotado de personalidade jurídica e capital devidamente integralizado e, devido a cumplicidade existente entre a EIRELI e a Sociedade Limitada, analisados os termos da Lei nº 11.101/05 (Lei de Falências). Optando o empresário individual pela recuperação judicial, deverá este ter como escopo a viabilização e a superação da situação de crise econômico-financeira, a fim de manter sua fonte produtora, assim como o emprego dos seus 72 BRASIL. Código civil. Op. cit. 73 CARDOSO, Paulo Leonardo Vilela. Op.cit. p. 117. 74 BRASIL. Instrução Normativa nº 117, de 22 de novembro de 2011. Disponível em: http://www.jucer.ro.gov.br/imagens-editor/eireli117.pdf. Acesso: 26 jun. 2013. 75 Ibidem.

funcionários e os interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação de sua empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.76 Para tanto o empreendedor deverá obedecer ao disposto no art. 48 da Lei de Falências:

“Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente: I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes; II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial; III – não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo; IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei. Parágrafo único. A recuperação judicial também poderá ser requerida pelo cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante ou sócio remanescente.77”

Na hipótese do parágrafo único, exclui-se de pronto o sócio remanescente, visto que, se entende ser a EIRELI fundada na unicidade, por isto sendo admitida a instrumentalização pelo cônjuge sobrevivente, herdeiros ou pelo próprio inventariante.78 O plano de recuperação judicial da EIRELI será igual ao utilizado pelas microempresas e empresas de pequeno porte, estando assim o empresário individual apto a apresentar plano especial de recuperação, apresentando relação de credores, podendo ainda parcelar sua dívida em até 36 (trinta e seis) parcelas, com juros de 12% (doze por cento) ao ano.79 A petição inicial da recuperação judicial deverá conter segundo o artigo 51 da Lei nº 11.101/05: as causas da situação patrimonial do devedor; as razões da crise econômico-financeira, juntados os seus 03 (três) últimos demonstrativos com relatório do fluxo de caixa e balanço patrimonial; a relação dos credores quirografários; a relação dos empregados; a certidão regular do devedor no Registro Público de Empresas, a

76 BRASIL. Lei no 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm. Acesso: 26 jun. 2013. 77 Ibidem. 78 BRASIL. Projeto de Lei nº 4.605/09. Op. cit. 79 BRASIL. Lei no 11.101. Op. cit.

relação dos atuais administradores; a relação dos bens particulares dos sócios e dos administradores do devedor; os extratos bancários do devedor; e as certidões dos cartórios de protestos e relatório de ações judiciais em que figure o devedor. Enfim, toda documentação probatória da necessidade de submeter-se a recuperação.80 A submissão ao plano de recuperação abre prazo de 180 dias, de acordo com a Lei do Rito, para novação, renegociação com os credores, suspensão de ações ou execuções, caso necessárias. Após deferimento, o estado de recuperação judicial no qual a empresa se encontra deverá ser anotado na Junta Comercial, afim de que seus fornecedores, credores, ou outro interessado possa ter acesso à documentação e ciência dessa condição. 4.1 DA FALÊNCIA Porventura não se consiga conter a crise financeira da empresa, esta consequentemente poderá incorrer em insolvência, caso em que concorrerão todos os credores para habilitação de seus créditos, conforme prescrito na Lei de Falências. O devedor, na forma do disposto nos arts. 105 a 107 da Lei nº 11.101/05 poderá requerer sua própria falência, ou ainda, em caso de falecimento, o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou o inventariante, ou qualquer credor. Para que seja decretada a falência é necessário que todos os créditos dos credores somados alcancem o valor mínimo de 40 (quarenta) salários mínimos vigentes.81

“Art. 94. Será decretada a falência do devedor que: I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência; II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal; III – pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial: a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos; b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores,

80 BRASIL. Lei no 11.101. Op. cit. 81 Ibidem.

negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não; c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo; d) simula a transferência de seu principal estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor; e) dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu passivo; f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal estabelecimento; g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial. § 1o Credores podem reunir-se em litisconsórcio a fim de perfazer o limite mínimo para o pedido de falência com base no inciso I do caput deste artigo. § 2o Ainda que líquidos, não legitimam o pedido de falência os créditos que nela não se possam reclamar. § 3o Na hipótese do inciso I do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com os títulos executivos na forma do parágrafo único do art. 9o desta Lei, acompanhados, em qualquer caso, dos respectivos instrumentos de protesto para fim falimentar nos termos da legislação específica. § 4o Na hipótese do inciso II do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com certidão expedida pelo juízo em que se processa a execução.

§ 5o Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, o pedido de falência descreverá os fatos que a caracterizam, juntando-se as provas que houver e especificando-se as que serão produzidas.82”

Supondo que a empresa individual possua filial, em princípio serão atreladas, com o intuito de caracterizar um patrimônio único, e consequentemente atingir toda atividade cultivada pela EIRELI, sendo, todavia, facultado ao devedor, empresário individual, o depósito elisivo, descaracterizando assim a insolvência, e mantendo a atividade empresária até que se valide a quantia depositada.83 Segundo o desembargador, Carlos Henrique Abrão, quando o empresário diante da iminente ameaça da insolvência, não conseguir dissolver sua empresa pelas vias normais, acarretando a falência, deve estar ciente de suas vantagens e desvantagens.84

82 BRASIL. Lei no 11.101. Op. cit. 83 Ibidem. 84 ABRÃO, Carlos Henrique. Op. cit.

Destarte, o encerramento da atividade empresária, por meio do instituto da falência, pode ser considerado “não natural” na visão do ilustre desembargador, e sim, decorrente da administração e do declarado endividamento, assim como da falta de êxito ao obter dilação satisfatória para atender as obrigações relativas aos credores.85 No entanto, a possibilidade do empresário individual de responsabilidade limitada pleitear a recuperação, ou até mesmo a falência, e estar sujeito a protestos e execuções objetiva o desfazimento de seu negócio da melhor maneira possível. 86 Conclusão

Apesar do comerciante que pretendesse empreender individualmente submeter o seu patrimônio pessoal às dívidas da empresa por não ter outra opção, a não ser seguir o caminho das sociedades fictícias, embora essa opção representasse alguns riscos para os sócios de tais sociedades, este cenário só foi modificado no ano de 2011 quando o legislador ofereceu uma solução para essa situação. É fato que não existe empresa sem risco. Todavia, também pode se dizer que quanto mais à legislação diminuir os riscos de dano patrimonial daqueles que se aventuram a prática do comercio, ou seja, produzir circular bens ou serviços para o mercado, mais pessoas serão incentivadas a constituir empresa. A limitação da responsabilidade é permitida há muito tempo em relação a diversos tipos de sociedades, em especial as limitadas e anônimas. Porém somente com a vigência da Lei nº 12.441 de 2011 é que passou também a ser admitida para os que não têm interesse a se juntar a algum sócio. A EIRELI neste sentido vem suprir uma antiga e inaceitável lacuna na legislação brasileira. O novo regime jurídico da referida EIRELI, constituída pela Lei 12.441/2011, é passível de algumas críticas. Uma delas é a exigência do piso para o capital social que será instituído por uma única pessoa titular da sua totalidade devidamente integralizada que não poderá ser inferior a 100 (cem) vezes o maior salário mínimo do país. A evolução econômica de um país toma corpo com o estímulo ao empreendedorismo, a geração de empregos, arrecadamento de impostos, sob a plena e livre iniciativa do princípio constitucional e de valorizar o trabalho humano. O Brasil se consolidada com o suporte do empreendedorismo neste século, um país que

85 ABRÃO, Carlos Henrique. Op. cit. 86 Ibidem.

nasceu da exploração trazida da época colonial, para entrar na vanguarda dos países desenvolvidos. Não é difícil notar que a ordem econômica e a ordem social não são coisas díspares, há uma convergência entre estas para assegurar a ordem econômica e social, a ordem econômica visa lucro, capitalismo e a ordem social visa assegurar direito de segunda geração previsto na Constituição Federal, sendo que ambos dependem de uma demanda de recursos do Estado, daí onde cabe ressaltar a importância do empresário formal para a economia do País, posto que, toda a riqueza que se produz num determinado Estado é através da atividade econômica em sentido amplo, ou seja, o grande macro é o comércio, indústria e prestações de serviços em geral, essa é a grande visão da legislação onde trás o empresário individual de responsabilidade limitada. Espera-se que esse novo instituto posto à disposição no ramo empresarial seja vastamente utilizado e, devido à ampla utilização consequentemente, mais empresas sejam iniciadas movimentando assim a economia do nosso país de forma positiva contribuindo para o progresso social. Agradecimentos

Agradeço à Deus, a minha família e meu marido.

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a saga continua. Disponível em: http://www.indexjur.com.br/zero/EIRELI.pdf. Acesso: 30 mai. 2012. 2 BRASIL. Código civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso: 22 jun. 2013. 3 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso: 22. jun. 2013. 4 BRASIL. Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999. Disponível em:

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2014/2011/lei/l12441.htm. Acesso: 16 jun. 2013. 7 BRASIL. Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm . Acesso: 26. jun. 2013. 8 BRASIL. Lei Complementar nº 139, de 10 de novembro de 2011. Disponível em:

http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/LeisComplementares/2011/leicp139.htm. Acesso: 26. jun. 2013.

9 BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm. Acesso: 26 jun. 2013. 10 BRASIL. Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990. Art. 1º. Dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de

família. Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8009.htm. Acesso: 16 jun. 2013.

11 BRASIL. Projeto de Lei nº 4.605/09. Disponível em:

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=32EF1A6BE55E73842F6240019E2DF5B8.node1?codteor=631421&filename=PL4605/2009. Acesso: 22. jun. 2013.

12 BRUSCATO, Wilges Ariana. Empresário individual de responsabilidade limitada. São Paulo:

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2012. 15 COSTA, Ricardo Alberto Santos. A sociedade por quotas unipessoal no direito português.

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27 MACHADO, Sylvio Marcondes. Limitação de responsabilidade do comerciante individual. São

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34 TARTUCE, Flávio, et. al. Revista magister de Direito Empresarial. nº 41. Ano VII. out.-nov./2011. p.

77. 35 ULHOA, Fábio. Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.