Claude Lévi-Strauss - Tristes Trópicos

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I d u a l .: o r p o r a s ot 6 r i a d o: o m o a c r i: a d o d a v o) d e r e c e h) a s c o r r e: m i d a d e 0. n t o i n s p i, s t u m e q ui d a d e p a s . .. i s a s p e c t os o a o c i a i n s. i n s a n i d ai s d e i n s a nm e n t a c e. D e f a t o , tl e n c ; a m e n 'l e g t a n d e; : a m e n t a l ,' q u a l q u e r> e c i a l , e m. d a e m t o 's t a c o m ou l i a r a q u au a l c a n c e .'p a n a . " 1 8 I) p r o p 6 s i t wms,rdsu! OJU'J :>p'plUJ:;;IUD::> S'e( 'p (OA 'p 0p'!J:J e owo:op '!J9J"npl12 O. LEVI-STRAUSS TRISTES TR6pICOS 13granderaizedescascada por uma permanenciano fundo do mar. Pois a sua tez c5r de cera unificava 0rosto e os cabelos brancos, que ele cortava aescovinha, e abarbicha, igualmente branca e que crescia emtodos os sen-tidos.:E'::sse curioso destr()c;;o vegetal, ainda das suasradiculas, tornava-se de repente humano pelo olhar de seusolhos negros que acentuavama brancura daque continuava na camisa branca e no colarinho engomado edobrado, contrastandocom0 chapeude abas largas, a "laval-liere" eo'terno, sempre pretos.Seus eursos nao ensinavamgrande coisa; ele jamais ospreparou, seguro que estava do encanto fisieo que exerciams5bre 0 seu audit6rio 0 j5goexpressivodos seus labios defor-mados por um rieto m6vel e sobretudo a sua voz, rouea emelodiosa: verdadeira voz de sereia eujas estranhas infle.xoesDaO lembravam apenas 0 seu Languedoc natal, mas, muitomenos que particularidades regionais, mOOos muito arcaicosda musica do frances falado, de tal formaque voz e rostoevocavam, emduasordenssensiveis, urnmesmoestilosimulta-neamente rusticoe incisivo: 0 dos humanistas doseculoXVI,medicos e fil6sofos cujapelo corpo e pelo espirito, eleparecia perpetuar.Asegunda hora, e as vezes a terceira, era reservada adedoentes: assistfamos entaoa cenas estupendasentre 0 especialista astuto e sujeitos treinados por anos deasilo emtodos os exercicios desse tipo; sabendo muito bernoqueseesperavadeles, produziamperturba!:5es aosinal con-vencionado ou resistiam 0 suficiente ao domador para for-necer-Ihe a ocasiao de urn "ntimero Semser 10-grado, 0 audit6riodeixava-sedeborn gradofascinar por essas de virtuosismo. Quando se merecia a do mestre, era-se recompensado coma entrega de urn doente,comumaparticular. Nenhum contacto com in-dios selvagens me intimidou mais do que a manha passadacom uma velha senhora enrolada emblusas de malha, queparecia urn arenque podre no meio de urn blocode gelo: in-tacta na aparencia, mas de se desintegrar desdeque 0 envolt6rioprotetor derretesse.11:sse sabio urn pouco mistificador, anirnador de obras desintese cujos amplos objetivos permaneciamaode urnpositivismo critico assas decepcionante, era urn hornem degrandenobreza; devia revela-Iamaistarde, logoap6s 0 armis-ticio e pouco antes da sua morte, quando, ja quase cego eretiradona sua cidadenatal de Ledignan, fez questao de meescrever uma carta atenciosa e discreta, eujo tinieo objetivopossivel era afirmar a sua solidariedade com as primeirasvftimas dos acontecimentos.Sernpre lamentei nao have-Io conhecido emplena juven-tude, quando, moreno e queimado como urn conquistador etodo impaciente pelas novas perspectivas cientificas abertaspela psicologia do BeculoXIX, partira a conquista espiritualdoNovoMundo. Ness:a especiede arnor a primeiravistaqueseiaproduzir entreeleea sociedadebrasileira, manifestou-secertamente urn fen5meno misterioso quando dois fragmentosdumaEuropavelha de409anos - eda qual certoselementosessenciais se haviamconservado, por urn lado, numa familiapi'otestante meridional, e, por outro, numa burguesia muitorefinada e urn pouco decadente, vivendo molemente sob ostr6picos - se encontraram, se reconhecerame quase se res-soldaram. 0 errode Georges Dumas foi 0 dejamais ter tidoconsciencia do carater verdadeiramente arqueol6gico desta0 tinico Brasil que ele soube seduzir (e aoqualuma breve passagempelopoder ia dar a iIusaode ser 0 ver-dadeiro) era 0 dos proprietarios agrfcolas deslocan.do progres-sivamenteseus capitais para industriais comparti- estrangeira, e que procuravamuma cobertura ideol6-gica numparlamentarismo bern educado; os mesmos que osnossos estudantes, provindos de imigrantes recentes ou de fa-zendeiros ligadosaterrae arruinados pelas flutua!:5es do co-mercio mundial, chamavam com rancor os gran/ino8. Coisacuriosa: a fundarao da Universidade de Sao Paulo, grande\obra na vida de Georges Dumas, devia permitir a essas clas-ses modestas a sua ascensao, obtendo diplomas queIhes abriamacesso as posi!:5es administrativas, de tal formaque a nossa missaouniversitaria contribuinpara formar umanova "elite", que se ia afastar de n6s ua medida em queDumas, e 0 Quai d'Orsay atras dele, se recusavam a com-preender que era ela a nossamais preciosa, emborase entregasse a tarefa de solapar uma classe feudal que noshavia, e verdade, introduzido no Brasil, mas para servir-lheemparte de e emparte de passatempo.Porem, na noite do jantar "France-Amerique", nao nospreocupavamosainda, meuscolegase eu- enossas mulheres,que nos acompanhavam- emrnedir 0 papel involuntarioque'famosdesempenhar nadasociedadebrasileira. Estii-vamos demasiadamenteocupadosemnosfiscalizarmutuamentedU SOlUdUS 'e lEln'elS;,}1!S9dOld (81 ''eu-edI ',ou'Orenmb" '"!Inn OWO:) 'eJS.Qllll, "P"ilid 1,nbj"nb.'fBJUJW-e:'purto empOrto, para escapar, segundo parece, ada esquadra Os possuidores depassapor-tes franceses erampor vezes autorizados a descer; os outrosficavam encerrados nas poucas dezenas de centimetros qua-drados de quecada urnpodia dispor nUIDque 0 calor- crescenteIt medidaemquenosaproximavamosdostr6picose tornava intoleravel a permanencia nos poroes - transfor-mava progressivamente numa de sala de jantar,quartodedormir, bergario, Iavanderiaesolario. Mas, 0 maisdesagradavel era 0 que se chama no regimento "os cnidadosde Iimpeza". Dispostas simetricamenteaoIongodaamnrada,a bombordopara os homens e a estibordopara as mUlheres,aequipagemtinhaconstruido doisparesde barracas detabuas,semar nero luz; urn, comalguns chuveiros, quefuncionavamsomente pela manha; 0 outro, munido de uma longa vala demadeira grosseiramente forrada de zincona parte de dentroe deserobocando s6bre 0 oceano, servia para 0 usa qne seadivinha; os inimigos duma promiscuidade demasiadograndee que repugnavama pl>r-se coletivamente de c6coras, numa alias instavel pelo j{}go do navio, nao tinhamoutrorecurSo senao levantar-se muito cedo e durante t6da a tra-vessia uma sorte de corrida se organizou entre os deIicados,detal maneiraque, nofim, eraapenasas 3horas damanha,mais ou menos, que se podia esperar uma relativa solidao.Acabavamos por naomais nos deitar. Comduas horas dedi-acontecia 0 mesmo com 0 chuveiro, oude se faziasentir, se nao a mesmade pudor, pelo menos ade poder arranjar urn Iugar naquela barafunda emque umaaguainsuficienteecomo quevaporizadaaocontactodetantosSOlU;lUS 1:: J1Un1::1S:11S9dOld (s,,,'1:ued"Ju""f"n

n OWOJ 1:15:01 w"ill;) '1"E:!:);}( .'re1U;)W1::"pmlll "(U;)WE:)U;)'I 'o'"J "0 .;):) OlU;)W" OlU;)W]esu! 'pS1ep!UESU! .ep,OJ::>JdSBS!"",d'pep'nb 'lDnjS'!dsu!OlDJ 'P ,OA"P 0p'!l:>l:: owo;op .!19J"r"nprI d u a l .r 6 r i a d o: o m o a c r i: a d o d a v o) d e r e e e h) a s c a r r e, r n i d a d e c> n r o i n s p i, s r u m e q ui d a d e p a s "I S a s p e e r o~ a o c i a i n s. i n s a n i d ai s d e i n s a nm e n t a c e, D e f a r o , , ;, e n ~ m e n) e g r a n d e; a m e n t a l ,, q u a l q u e r> e c i a l , e ma d a e m t o :1; r a e o m o u !" l i a r a q u au a l c a n c e .'p a n a . " 1 8) p t o p 6 s i r ( !' s t a u r a r a sw a 9 V I A a a O N H a a V J[ i L L l I V d V U N l l D : t l S- ~-iIvOLHANDO 0 PASSADO:Minhacarreirasedecidiunumdomingodooutono de1934,as9 horasdamanhli, atravesdeurntelefonema, EraCelestinBongIe, entao diretor da Escola Normal Superior; EHe metratava desde alguns aDOS comuma urn poueDlongfnquaereticente: emprimeirolugar, porqueennaotinhaside"normalista", emseguida esobretudoporque, meSillOqueotivesse sido, naopertencia aosen grupo, pelo qual elerna-nifestava sentimentos finito exclusivos. Semduvida nao ha-via encontrado ninguemmelhor, pois me perguntou abrupta-mente: "Continuacoma deseespecializar emetno-grafia?- Certamente!- EnUlo, apresentea suacandidaturacomo professor de sociologia na Universidade de Sao Paulo.Os arrabaldes estaorepletos de indios, 0 senhor poderadedi-car-lhes osseus fins desemana. Mas eprecisodar umares-posta definitiva a Georges Dumas, antes do meio-dia".o Brasil e a America do SuI nao significavamgrandecoisapara mim. Contudo, revejoainda, coma maior nitidez,as imagens evocadas imediatamente por essa proposta impre-vista. Os paises ex6ticos meapareciamcomo 0 contrariodosnossos, 0termode"antipodas"encontravaemmeupensamentournsentido maisricoe maisingenuo que0 seu contelldo literal.Ter-me-ia grandemente espantado se me dissessemque umaespecieanimal auvegetal podia ter 0 mesmoaspectonos doislados do globo, Cada animal, cada arvore, cada fOlha de ca-piro, devia ser radicalmente diferente, exibira priroeiravistaa suanaturezatropical. 0 Brasil seemminhaima- como de palmeiras esbeltas, dissirnulandoarquiteturas estranhas, tudomergulhadonumodor depormenor olfativo introdnzido subreptlciamente, segundo pa-rece, pela horoofonia inconscientemente estabelecida entre"Bresil" e "gresiller", e que, mais do que tMa experiencia;)USOlU;}US -el'elTIt:lS:ll!S9dOld (81,,"'Eued":Ju""l"nenb" '"'I"n OUla:> "e:)s01 W, "P'W;)'P::P;)("nbj"nb.'re:lUJW-e: '(n,we:\u"I 'Ol"J'O'J:) OlU;)W;}P51"P!lleSU! .sUi"P0]15ol:J,ds" SI'sed'P'P!nb,wms,TdsUIOlUf:J 'p'P!Ul;JUO::> St: (adquirida, explica que ainda hoje en pense no Brasil antesdemaisnadacomoDumperfume queimado.Consideradas retrospectivamente, essas imagens nao. meparecemtaoarbitrarias. Aprendi queaverdadedeumasltua- DaDse encontra oa sua cotidiana, mas nessa pacientee fragmentaria que 0 equivoeodoperfumejame convidava talveza pOt empratica, soba forma de urntroeadilho espontlineo, veicnlo duma simMlica que euaindaoaoeracapazdeformular claramente. Menos.umpercurso, a euma uma cena urn cantode paisagem, uma reflexiioagarrada emplena VOO,saoosunicosmeiosdecompreenderede interpretarhorizontesque de Dutra maneira, se mostramestereis.'Naquele momento, a extravagante promessa de BougIerelativa aos indios me punha diante de outros problemas.Donde havia ele tiradoade que Silo Pauloera. umacidadeindigena, pelomenosnosseusarrabaldes? Sem de uma confusao coma capital do Mexico ou Tegu':Jgalpa.:sse f116sofo, que havia outrora escrito uma obra sobre 0Regime das Castas na fndia, semse perguntar urn s6 mo-mentose naoera melhor, antesdemais nada, ir ate laparaver ("nofluxo dos acontecimentos, saoasqueS?-brenadam", proclamavacomarrogancia. seu prefaclOde1927) niloacreditava queados llldlgenaspudesseter urn reflexo serio na pesquisa etnografica. Sabe-se, deresto, que nao eraele 0l1nico, entreos sOCi61ogos oficiais, ademonstrar essa indiferen@., cujos ex:emplos se perpetuamate hoje.Seja comofor, euproprioera ignorante .demaispara acolher ilusOes tao favoraveis aos meus proJetos; tanto fiaiSque Georges Dumas passuia sabre a questiio no(;ijes. mente imprecisas:havia conhecido 0 Brasil meridIOnalnuma epoea emque 0 exterminio das popula(;ijes indigenasainda naotinha chegadoaoseu termo; e, sobretudo, a SOCle-dade de mandoes, de senhores feudais e de mecenas queelefreqiientava quasenao Ihe havia fornecido luzes sobre 0 assunto.Fiquei, pois, muito surpreendido quando,urn Aal-mO!:aqueVictor Marguerittemehavialevado, OUVl, dadoembaixador doBrasil emParis, a"nota" oficial: "indIOS?Ai! meu caro senhor, js. desapareceramhaOh! eumapiiginaberntriste, bernvergonhosa, dahlst6nadomeu pais. Mas os colonos portugueses do seculo:ramhomens avidos e brutais. Como censurar-Ihes ter partIclpadoda rudeza geral dos costumes?:les agarravam os indios,amarravam-nos asbOcasdoscanh5esevivos,a tiros. Foi assimque os destruiram, ate ao ultimo. 0 se-nhor. como soci610go, vai descobrir coisas apaixonantes noBrasil,. mas deixede pensar emindios, pois naomais encon-trara nenhum... "Quando evoeo hoje emdia essas palavras, elas me pare-.cern incriveis, mesmo na b6ca dumgranfino de 1934 e, lem-brando-me a que ponto a alta soeiedade brasileira de entao(felizmente, mudou depois disso) tinha horror de qualqueralusao aos indigenas e mais geralmente asprimiti-vas do interior, a naoserparaadmitir - e mesmosugerir- que uma tatarav6 india se encontrava na origemdumafisionomia imperceptivelmente ex6tica, e nao algumas gotas,ou litros, de sangue negro que se tornava de born tom (aocontrario dos antepassados da epoca imperial) tentar fazeresquecer. Entretanto, a ascendencia india de Luis de SousaDantas era visivel e tHe poderia facilmente glorificar-se dela.::\fas, brasileiro de que desde a adoleseencia ado-tara aperdera ate 0 conhecimentodoestadoreal doseu pais, quese substitufra na sua mem6ria por uma especiede chapa oficial edistinta. Na medida emque certas recor- haviam permanecido, He preferia, tambem, segundosuponho, manchar os brasileiros do seculo 16, para desviara do passatempofavorito dos homens da geratao desens pais, emeSillOainda do tempoda sua juventude: istoe,recolher nos hospitais as roupas infectadas dos variolosos,para penduralas comQutros presentes aolongodos caminhosainda freqiientados pelas tribos. ao que, foi obtidoeste brilhante resultado: 0 Estado de Sao Paulo, tao grandequanto aque os mapas de 1918 ainda indicavam,emseus doiscomo urn "territ6rio desconhecido habi-tadosomentepor indios", janaocontavaurns6fndio, quandoai cheguei em1935, salvourngrupodealgumas familias loea-lizadas noHtoral, que aos domingos vinhamvender pretensascuriosidades nas praias de Santos. Felizmente, faltando nosarrabaldes de Sao PaUlo, os indios ainda eXistiam,_ a de 3.000 quilametros no interior. .E-me impossfvel passar por esse periodo semdirigir urnolhar amigo para outro mundo que devo a Victor Margne-ritte (meuintrodutor naEmbaixadadoBrasil) 0 ter-mefeitoentrever;me conservara a sua amizade, depois de umabrevepassagema seu comosecretario, nos mens l1lti-44O. LEVI-STRAUSSTBISTES TB6PXCOS 45.;}USOlU;}uS 'El'E1TI'E1S;1lS9dOld (81"-eU'Edn.nb. '"!InnOWO:)-els:01lU> .p.W;) 'l'E!:);}(,,,nbjenb.'f'E1U;}W-e:"unl"n"nb" '"!I"n OWO:) -elS:Dl w:> "p.ill;, 'Il:!:);)(J:>nb]enb.'fl:lU;'Wl:::>(U;'WE:JU;)II 'Ol"J'O";,::> Olll;,W""SU! :>pSl"prllesu! .SUi "Pol:>:>ds" sr:sl'd:>P"P!nb,wms,!dSUl Ollle:> :>P"P!UJ;;,llO::> Sl: (FTBISTES Tu6pIOOS 49VICOMO BE FAZ UMETNoGRAFOa 0 men concurso de filosofia, a que tinhaEn umaverdadeira comopelasideatirado, naOtantopor t t comoutros estudos ate en-aDSaulasdefilosofia, euestavataoexperlID.en a. . monismoracionalista que me pre- :ea tinha, pois,fei:. . ... . professor gozavada repuentrar na dlvlsao CUJO G t Rodrigueseraurnomais"avanrqueera taofacil. Uma curiosafatalidade pesa s6bre 0 ensino do Direito. Preso entre ateologia de que, naquela epoca, seu espirito0aproximava, eo jornalisrno, para 0 qual a recente reforma 0 esta empur-rando, dir-se-ia que theeimpassiveI situar-se numplano aomesmo tempo s6lido e objetivo: perde uma dessas virtudes,quando pretende conquistar ou reter a ontra. Objeto de eg-tudopara 0sAbia, 0jurista me fazia pensar emurn animalque pretendesse mostrar lanterna magica ao zoologista. Naqueletempo, felizmente, os exames de direito se preparavamemquinzedias, a apontamentos decorados. Maisaindadoqueasuaesterilidade, a clienteladaFaculdadedeDireitomerepugnava. Acontinua valida? Duvido. Mas, porvolta de 1928, os estudantes de primeiroanodas diversas or-dens sedividiamemduas especies, quasesepoderiadizer emduasseparadas: direitoemedicina, deurnlado, letraseciencias do DutrO.Por pouco sedutores que sejamos termos "extrovertido"e "introvertido", sao semduvida as mais apropriados paratraduziraDe urnlado, uma"juventude" (no sentidoemque0folcloretradicional empregaapalavraparadesignaruma dasse de idade) barulhenta, agressiva, ambiciosa de seafirmar meSillOacusta da pior vuIgaridade, pollticamenteorientada para a cxtrema-direita (da lipoca); de outro, ado-lescentes prematuramente envelhecidos, discretos, reservados,I\.;;JU SOlU;;Jtts"ElEln"E1S>lTS9dold IS1'"EU"E(',,,u'"'l" n"nb" JElltnOWOJ:Dl llI' "P'ill;) 'fB1U;;JWt::'pUOll!'wt::JU;)I '01,,! '0;):J OlU;;>lU 'pS1.SUI "P,olJxlst: S!'S"d'P"P!;mb;;>UInlS!dsUi 01m) 'P"P!UJ:;;JllO:J St: (q''''l 'p (OA"P ope!l:J t:OlUO:op "!191"Tt:npi$52TB!STESTB6PICOS 53" SfOf{:ando-sepor sefazer ad-babitualmente"da , ;0:adultos que pretendiamser.mitir desde logo no numero . .. e muitosimples. Os pnmel-Adessai' deumaprofissao, cele-ros, quesepreparampara ? escola e uma braIn, por sua.conduta, a llber:socials. Colocados nasitua-jatomadano.dasindiferenciado do ginasiano intermednlrlR0 uesedestinam, eles se senteme a atividade a"ie . os contradit6rios pr6priosmarginais e relvmdlCamOS pnvl glde uma e outra condi!:lio. ..... .as carrelrasNas letras e nas ClenCIaS: em mas profissoes impre-habituais: professorado,e t queas escolhenaocisas, saodeantes, conserva-lO. 0dizadeus aDuniversolufantll.f"d aos adultos que- e .nieo melO0 erecl 0professoradonao. 0 u I? 0 estudante de letras OUIhes permite contmuar. na esco a. peciedereeusaqueopOede secaracterlzapor uma_ eSquaseconventual 0 incitaas dogrupo.. umamaneira mais duravel,a se retirar dumpatrimoniono estudo, na . quantoaofuturosabio, seuindependente dahora que a-0douniverso. Nada eobjetos6se mede pelarque participem; mesmopois mais falsodo... que persuat" -io:c;;ao nao consiste em aceitarquando pensam faze-Io, sua par IC P d suas func;;(5es emas-urndado, emseidentificar. commas emdosumir as vantagens e fizessempartedasi-ladodefora ecomose. ee . da uma maneira particulartuac;;ao; seu "compromlsso. am uisanaoseconfundem,decontinuar livre.s. 0 ensmoe :e::'dode urn ofieio. Sua ponto decomo.emser OU urn refugio, ougrandeza e sua mlsena eonSIS ,uma missao. f" . por.' - r urn lado, 0 0ICIO, e _Nessaque POo que oseila entre a missaooutrournempreendlmentoa gude uma e de outra, sendof" do sempree 0 refugio, parIClpan t rafiaocupa certamenteurntambem?u.oue.."'ttrema que se possalugar prlVlleglado. EMesmo querendo-se humano, 0conceber do segundo termo.. ar 0 bomemdeurnpontodeetn6grafoprocuraconbecer eJulgfastado para abstrai-Io dasvistaelevadot \ a ociedade ou tal civilizaC;;ao.contingencias: :albo 0 separamflsicamenteSuasde Vlda e e rado seu grupo durante longos periodos; pela brutalidade dasmudangas a quese eXpOe, ele adquireuma de desen-raizamento cr6nico: nunea mais se sentira "em casa" emnenbumlugar, e ficara psicolbgicamente mutilado. Como asmatematicas oua musica, a etnografia e umadasraras vocac;;oes autenticas. Podemos descobrf-la dentro de n6s, meSillOque jamais no-la tenbamensinado.As particularidades individuais e as atitudes SOCIalS, devem-sejuntarmotivac;;Oes denaturezapropriamente intelectual.operiodo1920-1930foi 0 dadifusiiodasteorias psicanaliticasna Franc;;a. Por meiodelas, aprendi que as antinomias esta-ticas emt6rnodas quais nosaconselhavama construir nossasdissertac;;(5es filos6ficas e mais tardenossas lic;;Oes - racionale irracional, intelectual e afetivo, 16gico e prel6gico - naoerammais que urn jOgogratuito. Antes de mais nada, aMmdo racional existia uma categoria mais importante e maisvalida, a do"significante", que e a mais altamaneira deserdoracional, masdaqual osnossosprofess6res (maisocupados,semduvida, emmeditar 0 Ensaio B6bre os Dados I1nediat08da Consoitnoia que 0 Curso de Linguistioa Geral de F. deSaussure) naopronunciavamnemmesmo0nome. AMmdisso,a obra deFreudmerevelavaqueessas oposi('oes nao 0 eramde fato, visto seremprecisamente as condutas emaparenciamais afetivas, as opera('6es menos racionais, as manifestac;;5esdeclaradas prel6gicas, as que sao, ao mesmo tempo, as maissignificativas. Emlugar dos atos de fe ou das peti\;ijes deprincipio do bergsonismo, que reduziamos seres e as coisasaurn mingan para melhorfazerressaltar sua naturezainefavel,eu me convenci que seres e coisas podemconservar os senSvalores pr6prios sem perder a nitidez dos contornos que osdelimitamnns comrelac;;ao aos outros e daoa eada umumaestrutura intelig(vel. 0 conhecimentonao repousa sobre umarenuncia ou s6bre uma berganha, mas consiste numa selec;;aodos aspectos verdadeiros, isto e, os que coincidem com aspropriedades do men pensamento. Nao como pretendiamosneo-kantianos, por exercer este ultimo s6bre as coisas umainevitavel pressao, mas antes porque 0 meu pensamento e,ele pr6prio, urn objeto. Sendo "deste mundo", participa damesma natureza que ele.Essaevoluc;;aointelectual, quesofri juntamentecomoutroshomens da minhageraC;;ao, coloria-se, contudo, dummatizpar-ticular, emconsequencia da intensa curiosidade que, desde aI ';)U SO:lUJUS 'El'EJn'E:lSll!S9dOJd (81,,'l:UBC'"UK',' n.nb.lnrnowo:J 'E:l!:01 W, 'p' W:;I 'I'B!:J:;I(I J,nblEnb'1'E:lU:;IW 'pUEJll '(U'WEJU,I 'Ol'j'O'J:) O:}U:;IW]'ESU!:;IpSI'pruESU! .UT'p,Ol",ds.SI'SEd'P'P!nb,wms,TdsUT OlUf" 'P'P!UJ; s-e (g,",J 'P (OA'p op.T1:) E OWO'. ..5"Jowo:renpIr54O. LEVI-STRAUSSTBISTES TBOPICOS 55. . raageologia. Incluo aindainfl1ncia, me havIa encammhadomenos certaaventuraentreasminhas do que seguir aoDuma zona desconheclda do d 'anDa linha decontactolongo do planaltocalcareo ai, de urna coisaentre dUas camadas geologicas. . ou de uma simples. t de urn passelOcompletamente diferen e . coerentepara nmobser- . essaprocuraIndoIhos apropria imagem doconhevador leigo, oferece aosmeus0 -I opo"e das alegrias quepodecimento, das dificuldades 'quee e ,Proporcionar. . sa.."almente comournaunenTMapaisagemseapresedndtaIdne'C'escolher 0sentidoqueIhesdliliberae . ddesordemque no e d s especnlau""," n"nb" J"ll"n OUIO;)OJ w, "P'UI;}'I'EP;}(J,nbrenb .'reJU'W .:'PUOljj '(.U;}W'E:)U;)'1'01"1'0;);) OJU;}UI:.I'ESU! dpSl"PlUOSU! .U! "P>oJ:Jdds'EST'sod'P"P!nb,wms!dSUl OJU':> 'P"P!Ul;dllO:) S'E("T'Enpl74 O. LEVI-STRAUSS TBXSTES TROPICOS 75as atitudes mentals da epoca. Durante uma verdadelra pes-qulsa pslco-sociol6g1ca concebida segundo os principios maismodernos, submeteram-se os colonos a umquestlonario desti-nado asaber se, na sua opinHio, os indios eram on nao"capazesde viver por si mesmos, como os camponeses de Castela".TOdas as respostas foramnegativas: "Arigor, talvez, sensnetos; aindaassill, os indigenas saotaoprofundamentevieio-sos que a duvida e cabivel, els aprova: Hes fogem dos espanh6is,recusamtrabalhar sern mas levama perversi-dadeaopontodefazer presentedosseusbens; naoconcordamemexpulsar sens camaradas a quemos espanh6is cortaramas orelhas". Ecomoconclusaounanime: "Emelhor para OSindios tornarem-se homens escravos do que continuaremani-mais livres... "Umtestemunbo, posterior de alguns anos, junta 0 pontofinala requisit6rio:comerocarne humana, DaOandamnus, cornempulgas, aranhas evermes crus ...les DaOternbarbae, sepor acasoelacresce, apressam-seemdepilar-se" (Ortiz, diante doConselhodas tndias, 1525).NomeSillOmomento, deresto, enumailhavizinha (P&rto-Rico, segundo 0 testemunho de Oviedo), os indios cuidavamdecapturar os brancos e faze-los perecer por imersao, depoismontavamguarda durante semanas emtorno dos afogados,a fimdesaber seeramounaosujeltos II putrefa!:iio. Dessaentre os inqueritos, tiram-se duas conclusoes: osbrancos invocavam as sociais, enquanto os indiOStinhamantes nasnaturais; e, enquantoos Ibrancos proclamavamque os indios eramanimais, os segun-dos se contentavamcomdesconfiar que os primeiros eramdeuses. Emigualdade de ignorancla, 0 ultimo procedimentoera certamente mais digno de homens.Asprova!iles intelectuais juntamumpateticosuplementara moral. Tudo era misteriopara os nossos via-jantes; a Imagemdo Mundo, de Pierre d'Aflly, fala de umahumanidade recentemente descoberta e supremamente feliz,"gens beatissima", composta depigmeus, demacr6bios e mes-rnodeacefalos. PierreMartyr recolheadeanimaismonstruosos: serpentessemelhantesa crocodilos; animais comcorpodeboi armadode tromba comourn elefante; peixes dequatro patas e comde boi, as costas ornadas de milverrugasecoma detartaruga; "tiburoes"devorandogente. Sao apenas sucnris, tapires,peixe-bois e tnbaroes. Mas,inversamente, misterios aparentes eramadmitidos comonatn-rais. Para justiflcar a brusca de rota que 0 fezperder 0Brasil, naomencionava Colombo, emseus relat6riosoficiais, extravagantes circunstl1ncias, jamais renovadas desdeentao, sobretudo nessa zona sempre umida: calor escaldantequetornonimpassivel a visitadosporoes, detal maneiraqueos barris de agua e de vinho explodiram, 0graoqneimou, 0toucinho e a carneassaramdurantenma semana; 0 solera tao ardente que a equipagem temeu queimar-se viva!SecuJo feliz, emque tudoera ainda passivel, como hoje, tal-vez, aos discos voadores!Nas ondas emque agora vogamos, nao foi ai, ou quase,que Colombo encontrou as sereias: Na verdade, ele as vinno fimda primeira viagem, no mar das Caraibas, mas elasnao estariam deslocadas ao largo do delta amazonico. "Astres sereias, conta ele, elevavamseus corpos acima da super-ficie dooceano, e ainda que DaOfassemtaobelas quantoserepresentamna pintura, seu rostoredondo tinha nitidamentea forma humana". Os peixe-bois tern aredonda, eapresentam-se comseios no peito; como as femeas amamen-tamos filhotes apertando-os contra si, anaoetao surpreendente, numa epoca emque se preparavamparadeserever 0 algodoeiro (e mesmo a desenha-Io) sob 0 nomede "arvore de carneiros": uma arvore carregada, aguisa defrutas, de carneiros inteiros, pendurados pelas costas, e dosquais bastava tosquiar a Hi.Da mesma forma, noQuarto Livro de Pantagruel, Rabe-Iais, fundando-se, semduvida, em narrativas de navegadordesembarcadodas Americas, oferece a primeira caricatura doque os etn6logos chamamhoje urn sistema de parentesco, eborda livremente numbastidor fragU; pois ha poncos siste-mas deparentescoconcebfveisemqueurnvelhopossachamar tumamenina Il meupai". Emtodosessescasos, faltava a cons- \ciencia do seculo XVI urn elemento mais essencial que osconhecimentos: uma quaIidade indispensavel areflexao cientifiea e que the era fundamental. Os homens dessa epocanaoeramsensfveisaoestilodouniverso; comohoje, noplanodas beJas-artes, urn rustieopercebendocertos caracteres exte-riores da pintura italiana ou da escultura negra, e nao suaharmonia significativa, seria incapaz de distinguir uma falsi- de urn Botieelli autentico, ou urn objetode bazar deuma escultura Pahouin. As sereias e a arvore de carneirosconstituemcoisadiferentee mais grave doqueerrosobjetivos': \no plano intelectual, sao antes falta de g6sto; deficiencia deIf";;)U SO)u:;)uIs e l'elne)sill!S9dOld (i81" "'EuedIn

n owo'):01 w, W:;)lOnbjEnb.'['E1U;;>W'pmlll '(IU;;)W'E:)U;;)I;;>::> 01U;;)W;;)P51.sUi "p op Sl...d nb,wms!dsUi OlmJ;;)llO:JS'E(q'JOl 'p ,OA!1'J'E owo:op m 91/I76O. LEVI-STRAUSSTRISTESTB6PICOS 77espiritos que, man grado seu genio, e refinamento de quedao prova em outros dominios, eram enfermos no que serefere it0 que nao constitui uma censura, m3:santes urnsentimentode reverenciadiantedos resultados obtl-dos a despeitodessas lacunas.Melhor doqueAtenas, 0conves dumnavioa caminhodasAmericas proporciona ao homemmodernouma acr6pole paraa suaN6s te recuSaremos de agor.a.:m te essa deusa anemica, preceptora duma empare-dada! AMmdesses her6is- navegadores, exploradores econ-qUistadores do Novo Mundo - que (il espera da viagemitLua) correram a unica aventura total proposta ahumalll-dade, meu pensamentoseeleva para v6s, sobreviventes dumaretaguarda que pagou tao cruelmente a honra de asportas abertas: indios cujo exemplo, atraves d: Rousseau Voltaire, Diderot, enriqueceu a substancIa de quea oscola'me nutriu, huroes, iroqueses, caraibas, tupis, eis-meaqui! AOs primeiros claroes percebidos por Colombo e que. eletomonpela costa, provinhamdumaespede marinhade mIcro-organismos fosforescentes visiveis entre0pUr dosol e recimentodaIna, parqueaterranaopodiaaindaestar VISl v.e1.Saobernas suas luzes queagoraadivinho, duranteestanOltesemsono passada no conves, a espiar a America.Jadesdeontem0NovoMundoestapresente; nao a vista,a costa esta afastada demais maugradoa de rotado navio, obliquando progressivamente para 0 suI.' para secolocar numeixoque, desde0CabodeSantoAgOStlllh?0Rio, permaneceni paralelo as margens. Durante dOtspelomenos, talvez tres, vogaremos va...r a parac< Amenea.E nao sao tampouco os grandes pAssaros marlllho:s que nOSanunciam0 fimda viagem: rabos de palha barulhentos, pr,?-celarias tiranicas que obrigam os mergulhoes empleno vooa vomitar a sua presa; pais essas aves se arriscamlonge daterra, e Colombo 0 aprendeu asua custa, ja. qu: emplenooceanoainda, saudava-Ihes 0vOocomoa suaQuantoaos peixes voadores, propulsionados por urn monmento decauda que bate a agua e carregados adistancia 'p0r suaspr6prias barbatanas abertas, faiseas de prata emtodos os sentidos emcima do crisol azul domar, havlamco- a rarear hO. alguns dias. 0 Novo Mundo, para 0 na-vegador que dele se aproxima, impOe-se primeiramenteurn perfume, bern diferente do 'que ja emParis e sugerldopor uma assonancia verbal, e dificil dedescrever para quemjamais 0respirou.Aprincipio, parece que os odores marinhos das semanasprecedentes DaOmais circulamlivremente; batemcontra urnmuro invisivel; assim imobilizados, nao mais solicitamuma tornadadislxmiveI a cheiros deoutra natureza e quenenhuma experiencia anterior permite qualificar; brisa defloresta alternando comperfumes de estufa, quintessencia doreinovegetal cujofrescor especificofossetaoconcentradoquese traduzisse por uma embriaguez olfativa, ultima nota dumacorde poderoso, harpejado comoque para isolar e fundir aomeSillOtempoos instantes sucessivos dearomas diversamentesaborosos. Somente 0 compreenderao os que ja meteram 0nariz numa pimenta ex6tica recentemente aberta, depois deter, em qualquer botequimdo serUio brasileiro, respirado acordamelosaenegradofumodermo, falhasdetabarDfermen-tadas eenroladasemcabos demuitosmetros; eque, nauniaodesses odores primos entre si, reencontramessa America quefoi, durante milenios, a tinica a possuir 0sensegredo.Mas quando, no dia seguinte, as 4horas da manha, elaseeleva, enfim, nohorizonte, aimagemvisivel doNovoMundopareeedignadesenperfume. DurantedaisdiaseduasDoitesuma cordilheira imensa se descobre; imensa, nao certamentepela suaaltura, mas porquesereproduzidenticaa si mesma,semquesejapassivel distinguirurn ouumano encadeamento desordenado das suas cristas. A muitas cen,te-nas demetros acimadas vagas, essas montanhas erguemseusmuros de pedra polida, acavalgamentode formas provocantese doWas, como. se observampar vezes emcastelos de areiaroidos pela corrente, mas que DaOdesconfiariamos que, pelomenos no nosso planeta, existissememuma escala tao vasta.Essa impressao de enormidade e pr6pria da America;sente-separ tOdaa parte, nascidadescomonoscampos; tive-adiantedascostasenos planaltosdoBrasil Central; nos AndesbolivianosenosRochososdoColorado; nosarrabaldesdoRio,nos subl1rbios de Chicago e nas ruas de 80va Iorque. Emt6da a parte, recebe-se 0 mesmo choque; esses espetaculosevocamoutros, essas ruassaoruas, essasmontanhassaomon-\tanhas, esses riDs sao riDs: donde vern a sensa.;ao de expa-triamento? Simplesmente de que aentre 0porte dohomeme 0 das coisas se distendeu a urn ponto emque amedidacomume impossivel. Mais tarde, quandonosfamilia-rizamos com a America, operamos quase inconscientemente, ;;mSOlU;:I(S 1':It:ln1':lSll!S9dOJd I81"'1':U1':(',:>uo:>," r"nb" JOI11n OWOJ 'el':01 w, "P'jW:> 'I"!:>"1,nbrenb're1U'w"''pu01'a "U;:IW 16u;;l1'01":1 '0;:IJ 01U;:IU,;I 'J1':SU!;:IpSl"PltreSU!ut"P,01:>,dso SI'sod'P"P!mb,wmsIdSUI01UlJ 'p"plm;;:IJjO::>S1': (9':>'1 'P ,OA"P op.1l::>1':OWO. ,r"npl,"/78 C. TBISTEg TBOPICOS79umaque restabeleceuma normal entreosMrmos; 0 trabalhose tornon imperceptivel, verificamo-Ioape-nas pela domecanismomental quese produz 11 descidado avHio. Mas essa incomensurabilidade congenital dos daismundos penetra e deforma nossos julgamentos. Os que de-daramfeia NovaIorqueSaoapenasvitimasdeumailusaodeNlio tendo ainda aprendido a mudar de registro,obstinam-se emjulgar Nova Iorquecomouma cidade, e criti-caIDas avenidas, os parques, osmonumentos. E, semdl1vida,objetivamente, Nova Iorqueeuma cidade, mas 0 espetaculoque ela propOea sensibilidade europeia oj de outra ordemdegrandeza: 0 das nossas proprias paisagens; enquanto que aspaisagens americanas nos arrastariama urn sistema aiodamais vasto e para 0 qual DaO possuimos equivalente. Abe-leza de :Kova Iorque DaO decorre, pois, da sua natureza decidade, masdasuapara 0 nossoOIho, inevitavelse renunciarmos a nos obstinar, da cidade ao nivel de umapaisagemartificial em que os princfpios do urbanismo naovalemmais: os l.1nicosvaloressignifieativossendo0aveludadoda luz, a finura dos distantes, os precipicios sublimes ao pedos arranha-ceus, e dos vales sombreados semeados de autom6veis muIticoloridos como fI6res.Depois disso, sinto-me tantomaispara falardo Rio de Janeiro, que me desagrada, a despeito da suabeleza tantas vezes celebrada. Como direi? Parece-me quea paisagemdo Rio naoesta na escala das suas pr6prias di-mensoes. 0 Pao de0 Corcovado, todos esses pontostao louvados parecemaoviajante que penetra na baia comotocos de dentes perdidos nos quatrocantos de uma bOca ban-guela. Quaseconstantementesubmergidos nabrumapegajosadostr6picos, essesacidentesgeograficosnliochegamamobiliarurnhorizontelargodemais parasecontentar com Sesequiser abarcar urn espetaculo, e necessario tomar a baia aocontrario e contempla-Iadas alturas. Doladodomar e poruma ilusaoinversaa de Nova Iorque, e a natureza queaquise reveste da forma de urn predioem Assim, as dimensOes dabaia do Rio naosaoperceptiveiscom0 auxilio de referencias visuais: a lenta progressao donavio, suas manobras para evitar as ilhas, 0 frescor e osperfumes quedescembruscamentedas florestas agarradasaosmorros, estabelecemporuma espeeie de contactofisico comas flares eas rochas que ainda DaOexistemcomomas preformampara 0viajante a fisionomia de urncontmente. E oj aindaColomboqueretornaa mem6ria: "Asarvores eramtaoaltas que pareciamtocar 0ceu e se Com-preendi bern, jamais perdemas suas falhas: vi taoverdes efreseas emnovembroquantonomes demaionaEs-panha; algumas estavam, mesmo, emflor, e ontras carrega-das .de frutos... Em qualquerque me virasse, 0r?uxlll.olde milhares de aves de espe-CIBS .dlferentes. EISa AmerIca, 0continente se imp5e. 1!::leoj felto de t&las asque animamao crepusculo 0 nebulosoda baia; mas, para 0recem-chegado, essesmov1m:mtos, essasformas, essasluzes, naoindicamprovfncias e eidades; naosignificamflorestas, campos, vales palsagenS; nao traduzemos passos e os trabalhos de indivi-que se ignoram Uns aos outros, eada umfechado noh?rIzonte estreitoda sua famnia e doseu oficio. Tudo issoVlve duma existencia unica e global. 0 que por tooos osIndosmerodeiaemeesmaga, nliooj a diversidadeinesgotaveldas coisas e dos seres, mas uma 86e formidavel entidade: 0Novo Mundo.?USOJU;)US B JB1TIBJSlJ!S9dOJd (BI"BUBC'OU"O\" n"nb" J"ll'nowo::>Bl::OJ w, "P'1W ;) 'IB!:,);}1.1,nbr"nb'\"JU'W",'pu"Jll '1U;}W -e5u;}I 'Ol"J'O;/::> O:).U;;JUJ ;}pSl"PIU"SUISUI "P ;oJo,ds" SI:s"d 'P"P'mb,wmsIdsu!OJUTo'p"pIUJ:;}JlO::>S'eCg'O,J 'p IOA "p 0p"!l:)B owo:op"!J9JTRlSTES TB6PICOS 81''1'.,IIXGUANABARAoRio emordida por sua baia ate ao desem-barca-se emplena centro, como se a Dutra metade, ja tivesse sido devorada pelas audas. E emcerto sentIdoverdade, ja que a primeira cidade, simples forte, senessailhotarochosaque0 naviarot0ll ha. poucoe quea ter 0 nomedofundador: Villegaignon. PercorroaAvemdaRio-Branco oude Qutrora se elevavamas aldeias tupinamba,lllas tenho 'nob{)lsoJeande Lery, breviariodoetn61ogo.Ha 378 anos quasedia por dia, Lery chegava aquicom dez genebrinos,' protestantes enviados por' Calvino a pedldode Villegaignon, seu antigo condiscfpulo, quede seconverter, .urn ano apenas depois do seu estabeleClment? uabaia de Guanabara. Essaestranhapersonagem, que pratIcarasucessivamente todos os oficios e lidara com os prohl:-mas batera-se contra os turcos, os arabes, os itallanos, os e:s-coce'ses (raptara Maria Stuart para permitir seu casamentocomFrancisco II) e os ingleses. F6ra visto ememArgel, e nabatalha de Cerisoles. E foi quase no .fimda SUracarreira aventurosa, quando parecia haver-se ,.,dedicadoa .a-quitetura militar, que, devido a umade_carreira,deeidiu ir ao Brasil. Mas ainda ai seus pIanos estao. na me-dida do seu espirito inquieto e ambicioso. Que deseJano Brasil? Fundar uma col6nia, mas, duv:da,construir urn imperiopessoal; e comoobJetlvoi.mediato, e:sta-beleeer urn refugioparaos protestantesque jassemdeixar a metr6pole. Pessoalmente cat61:code orl.geme provavelmente livre-pensador, obtem a protes-e (g"'l 'P ,o"'P 0p'U::>-eOillO'. ,op "!l915"JodJo:v82TRISTES TR6PICOS 83,!normandos conquistados pela vida natural, tomando mulherindigena etornando-seantrop6fagos; e 0 infeliz. Hansque passonanos de angUstia, esperando eada dla sel' COllildoedeeadavezsalvopol' Reaso, procurandofazer-se passar porfrances invocandosuabarbaloiramnitopoueDiberic.a epro:vocando dorei Ounhambebeesta replica: ".Ja preadl e comlcincoetOO08 pretendiamsel'franceses;entretant?mentiam!" EqueconstanteDaOforanecessarIaparaqueem1531, afragataLaPelerinepudesselevar paraa aO mesmo tempo que 3.000 peles de .Ieopardo e 300macacos e macacas, 600 papagaios "sabendo, J3., algumas pa-lavras de frances" ...Villegaignon funda, numa ilha, emplena baia, 0 FO:t:Coligny; os indios 0 constroem, abastecemapequenaco16ma,mas, logofartos dedarsemreceber, fogem, desertam.destl.asaldeias. Afomeeas seinstalamnoforte. Vl11egalg-non come!:R a manifestar 0 sen temperamento tiriinico; se revoltam: sao massacrados. Aepidemia..aterra firme: OS rarOS indios que haviampermanecldo fU;18amissao sao contaminados. Oitocentos morremassim.Villegaignon desdenha os assuntos temporais; uma criseespiritual 0 domina. Emcontacto comos con-verte-se, apela para Calvinoa fimde obter mlsSlOnarlOs o iluminemsubre a sua nova fe. Eassimque se organlza,em1556, a viagemdequeUryfez parte.A hist6ria adquireentaoumaspectotaoestranhoquemesurpreende nenhumromancista on cenarista a tenha.aindaaproveitado. Que flta isso daria! Isolados num contmentetao desconhecido quanto outro planeta, ignorando completa-mente anaturezae os homens, incapazes de cultivarterrapara assegurar a sua subsistencia, dependendo, emtodas assuas necessidades, de urna populac;:-ao incompreensivel que, deresto,a odia-Ios, assaltados pelns molestias, esse. pu-nhadodefranceses quesehaviamexpostoa todos os perIgospara escapar as lutas metropolitanas e fundar umlaras crenc;;as pudessemcoexistir numregime de tolerftncIa eliberdade cairamna sua pr6pria armadilha. Os protestantestentam os cat6licos e aos protestantes" Emlugardetrabalharparasobreviver, passam. semanasemlo,?-casdiscussOes: comose deve interpretar aOem? Deve-se. m.lstu-rar a agua e 0vinho para a consagrac;;ao? Aaadministrac;;ao do batismo, fornecem tema para verdadelroStorneios teol6gicos, depois dos quais Viliegaignon se converteou volta atraS.Ohega-se a enviar umemissarioa EuropaparaconsultarOalvino e faze-Io decidir os pontos litigiosos. Durante essetempo, os conflitos redobram. As faculdades de Villegaignonse alteram; Leryconta que se podiampredizer seuhumor esens rigores pela cor de suas roupas. Finalmente, volta-secontra OS protestantes e decide esfaima-Ios; estes deixamdeparticipardavidacomum, passaropara 0 continente e aliam-seaosindigenas. AoidUioqueentreelesseestabelece devemOsessa obra-prima de literatura etnogr3.fica, aa Terrado Brasil, de Jean de Ury. 0 fimda aventura e triste: osgenebrinos conseguem, DaO semdificuldades, regressar numnavio frances;jaDaO se trata mais, como na ida, quando conta-yamcomaf6rf:8., de"emagrecer" - istoe, de pilhar - alegre-mente os navios encontrados narota; a fome reinaa bordo.Comem-seos macacos, e esses papagaiostaopreciososqueumaindia, amigadeLery, recusavaceder0 seu, amenos quefOssecontra uma deartilharia. Os ratos e camondoDgos dosporoes, ultlmas vltualhas, chegama valer quatroescudos cadaum. Nao hAmais agna. Em1558, a equipagemdesembarcana Bretanha, semi-morta de fome.Na iiha, a coloniasedesintegra numa atmosfera de exe-cU(;ilese deterror; detestadopor todos, considerado poralgnnscomo traidor, como renegado por outros, temfvel aos indios,apavorado pelos portugueses, Viliegaignon renuncia ao seusonho. 0 ForteColigny, comandadopor seusobrinho, Bois-le-Comte, cai as maos dos portugneses em1560.Nes8eRioquemeeagoraentregue, e 0sabordessaaven-tura que procuro primeiramente discernir. l\Ta verdade, eudeviaadivinM-loumdia, por ocasiaoduma excursaoarqueo-16gica ao fundo da baia, organizada pelo Museu Nacionalemhonra deurnsabiojapones. Dma lanchanos deixara nU-rna praia pantanosa onde enferrujava urn velho casco nau-fragado; semduvida, DaOdatava doseculoXVI; mas, assimmesmo, introduziaumadimensaohist6ricanesses espac;;os emquenadamaisilustravaapassagemdotempo. Sobasnnvensbaixas, atras dachuvafina quecaiasemparar desdea ma-drugada, a cidade longinqua havia desaparecido. Aiem doscarangneijos pululando na lama negra e dos paletlivios, dosquaisjamaissesabeseaexpansaodassuasformas e devidaao crescimentoouaoapodrecimento, a floresta destacava em

S -e U1TI-eJSll!S9dOld (81""'EU'EC'ouoo!"nonb0JOIIT: n OWQJ 'EJ!;oj w,op' J,nbjonb'reJU;)W'puEJll,Jds'E S!:s,d'P'P!nb,wmsTdsu, OlU'o'P'P!U1;g'O'l 'P ,OA 'P op'TD'EOWO'. ,op '!"91'lEnpIRio de Janeiro DaOeconstruida como uma cidade qual-quer. Estabelecida, primeiramente, na zona plana e panta-nosa que rodeia a baia, eIa se introduziu entre os morrosabruptos que a asfixiam de todos os lados, a maneira dededos numa Iuva muito estreita. TenUiculos urbanos, muitasvezes com0 comprimentode20 a 30 quiWmetros. coleiamnabase de forma!:Oes graniticas cujo declive e tao forte quenenhnma vegeta('ao ai consegue brotar; por vezes, numter-ra(.'Oisoladoounumagargantaprofunda, umailhadeflorestaconseguiu instaIar-se, tanto mais verdadeiramente virgemquanto 0 lugar e inaccessivel, mau gradoa sua proximidade:de avUio, tem-se a impressao de os galhos, nesses cor-redores frescos e graves onde se plana entre sun-tuosasantesdeaterrisara seusves. Essacidade, taoprooigaemcolinas, trata-as comurn desprezoemparteexplicadopelafalta deligna nos cimos. 0 Rioe, quantaa isso, 0 contrariodeChittagong, nogOlfodeBengala: numa planiciepantanosa.pequenas conicasdeargilaalaranjada, brilhantesoba e;rva verde, trazem, cada uma, urn bangalosolitario, forta-leza dos ricos que seprotegemdocalor pesadoe da sordidezdos miseraveis. No Rio, e0 contrario: essas calotas globu-Iosas emque 0 granitoforma urn bloco, eomofundi do, rever-beram tao violentamente 0 calor que a brisa circulando nofundo dos desfiladeiros nao consegue subir. Talvez 0 urba-nismo jdocarnaval, desceriamdas alturase invadiriamacidade com eles.Acidade semodificaemdistllnciatantoquantoemaltura.Desde que nos metamos por uma dessas pistas urbanas quemergulhamos seus meandros entre as cOlinas, 0 aspecto setorna rapidamente suburbano. Botafogo, no fim da avenidaRio-Branco, eaindaacidade deluxo, mas, depois doFlamengo,parecequeestamosemNeuilly, e. naalturadotunel deCopa-cabana seria, ha vinte anos,au 0 Bourget, comuma tonalidade campesina a mais, como poderia ser 0 nossosubUrbioantes da guerra de 1914. EmCopacabana, hoje emdia de arranhaceus, eu descobria somente uma cida-dezinhadeprovinciacom0 seucomercioeassuaslojas.. ada esquisitice. Ha secul?S'puuhaIllde ma!s_ncadavezmalsraras. SeJaqueessasocasioesse t menos se"surpreende" donaindiaounaAmerica, 0e itinerarios, atribui-que "reconhece". Escolhendo dJefer'r tal data de pene-t d a liberdade e pre 1 mo-nOS sobreU0 . _ d meciinica a tais tal rltmo de a c umenadeestadosQutros.Abuseadoexotlsmose :8 desenvolvimento familiar.antecipados ou retardados de u 'do pela falta deantiquario constraDgJ. ,o viajante tarna-se de arte negra parase re-objetos, a abandonar a sua glhUScas pechinehadas durante os. nar comas lembranc;as ve l dSlg i belchioresdaterra hablta a.sens passe os nos . fveis no centro de umaEssassaO Jaa cada umacidade. Como_ quetrazem a marca dosua sua 0sencrescimento, 0sell desen-seculos emqueseNesse canteirodeur-volvimentoe 0 senTII..l.. _ EmParis 0 "Marais"bana, bli0 corroi;' especiemaisestavaemflor nOsecu0sob 0 Segundo Im-tardia, 0 bairro da opera h' desbotadas, saOocupadas porperio, maS as suas oJecomo insetos, ai encontra urnuma fauna de gentmha. que, formas de atividade. Ternes-terreno propicio a nosenluxodefuntocomournl\'IonceaupermanececrIstallzado b nte muitoalemdosengrande crisiintemocarregan1 aindaontemerabri-termoa cabe{.'a ressecada.sufocarn numa moita deIhante; agora, suas floresa pouco comuma paisagemimoveis que 0 confundempode subUrbio. . 'dades multo distantesQuando se comparam entre Sl Cl . I "ehist6ria essas de CiC0 ::;pelae pela. desiguais. Desde que nos complicamamda com. rItmos e muitodeseculo", caI-tamos docentrodo que Ionas avenidas plantadas demos em ruas tranqullas,emtabuleiros, palmeiras, demanguelras e e d moda no meiode jardms.quais se elevamtarde' nos bairros residen-Penso (como deverIa 0 emBiarritz sob Napoleao III.ciais de Calcutli) emNIce.ou ue inatuais. Naoe a ve-Os tropicos saomenosddOqpormenores arquitetonicos- os atesta mas miUos - que 'A de vida que noS convence, naOe a SUgestao de urn gener.o comodehavermostantodetermostranspostoImensose ,recuadoimperceptlvelmentenotempo.TRISTES TB6PICOS 87s-e ll!S9dold (81" 'Eu-ec nlOllrnOIDO'J :ol w' ID;;)l,nblmb 'pmlll '(u,w du,I 'Ol"!'O .;;)::> OlU;;)W"ESUI'PSI.U! SI

nb,wms!dsUi OlUIJ;;)llO:J !re(88O. LEVI-STRAUSSultimadoRio, quedatadaminhapartidadefinitiva: umhotel emquefui visitar alguns colegas norte-americanos, nos flancos doCorcovado; subia-se por urn funicularsumariamenteestabelecidonomeiodoscortes, Dumestilomeiogarage, "meiorefugio dealtamontanha, compostosdecomandomantidos por empregadosatentos: umaespeciedeLunaPark.Tudo isso para alcan!:"r no alto da colina, e depois de nostermosaolongodeterrenosbaldios, sujos eempedrados,e que freqiientemente se aproximavamda vertical, uma pe-quena residencia doperiodoimperial, casa terrea, isto 'e, semaudares, decoradadeestuque epintadade ocre, oude sejan-tava Duma plataforma transformada emacima deuma mistura incoerente de edificios de cimento, de casebrese de conglomerados urbanos; tendo ao fundo, emIngar daschamines de fabrica que esperariamos comolimite dessa pai-sagem heter6clita, urn mar tropical, brilhante e assetinado,coroadaporurnluar monstruoso.Volto a bordo. 0 navio aparelha e dntila comtOdas assuas luzes; desfila diante do mar que se contorce e parecepassar em revista um ambulante de rua acanhada.Rouve, no fimda tarde, uma tempestade e 0mar reluz aolargo como urn ventre de animal. Entretanto, a lua estacoberta de nuvens que 0 vento deforma emzigue-zagues, emcruze emtrHingulos. Essas figurasesquisitassaoiluminadas comoquepar dentro; nofundoescurodoceu,dir-se-ia uma aurora boreal para uso dos tr6picos. De vezem quando, percebia-se, atraves dessas nebulosas,urn fragmento de Ina avermelhada que passava, repassava e.desaparecia comoumalanternaerranteeangustiada.xPASSAGEMDO TRoPICOAs costasentre0RioeSantosapresentamaindatr6picosdesonho. Aserracosteiraqueseelevaemurnpontoamaisde. 2.000desce para 0 mar e 0 recorta de i1has edebalas; praIas de areia fina, rodeadas de coqueiros ou de flo-restas umidas transbordantes de orquideas, vem chocar-secontra muralbas de gres ou de basalto que Ihes impedem0acesso, salvo por mar. Pequenos portos, distantes uns dosoutros umacentenadequil&metros, abrigamaspescadoresemcasas doseculoXVIII, agoraarruinadasequeforamoutroraconstruidas por armadores, eapitaes e vice-governadores empedrasnobrementetalhadas. Angra-dos-Reis, Parati, Ubatuba,Caraguatatuba, Sao Sebastiao, Vila-Bela, outros tantos pontosonde ouro, os diamantes, os topazios e os cris6litos, extrai-dos Minas Gerais, as "minas gerais" do reino, chegavamdepolSdesemanas de viagematraves da montanha, transpor- emlombode burro. Quandoseprocura 0dessaspistas ao longo dos espigoes, linhas de cristas mal se evocaurntaoimportantequeumaindUstria viviadadas ferraduras que os animais perdiam pelocammho.Bougainvillecontouascautelasquerodeavama e 0transJX)rte. Mal era extraido, 0Duro devia ser entregueas Casas desituadas em cada distrito: Rio dasMortes, Sabara, Serro-Frio. Ai se pagavam os direitos dacoroa e 0 que cabia aos exploradores lhes era entregue embarras marcadas quantoao p&;o, ao quilate, aomlmeroe asarmasdorei. Vmacentral, situadaameio caminho;ntre as minas e0litoral, fazia nova Urn tenente e00 homens descontavam0 direito do "quinto", e0do pedagio parde homem e de animal. 1!:sse direito era repartido entre0reI e 0 destaeamento; assim, nadahavia desurpreendenteemque as caravanas, vindo das minas e passando obrigatbria-;)USO:JU;lUS E l'elTIE1S'"!S9dOld (81ee 'EUE(""UO"I"nenb" mjrTI:oJ W'"P'jW, 'I"!"", l,nbjenb! 'fE1U;}W : 'puol'a,(! I.U;}W 1'01"] '0;)J OlU;)W ;}PSl"PTUesU!m!"p,ol",dseSI, :sed'P"P!, mb,wms!dsUJ OlUJ" 'P"P!Ul;;)llOJ(g'"'l 'p ,o,\"P op"!lJE owo;op "!"9" 90o. LEVI-STRAUSSTRISTES TRUPICOS 91mentepor registro, ai fOssem"interrompidas erevistadascommaior rigor".Os particulares levavamemseguida 0 Duro embarras aCasadaMoedadoRiodeJaneiroque0 trocavapor dinheiro,meios-dobroes valendo 8 piastras espanholas, s6bre cada urndos quais 0 rei ganhava umapiastra pela liga e 0 privilegiode emissao. E Bougainville acrescenta: "ACasa da Moedae uma das mais belas que existem; esta munidade tOdas aseomodidades necessarias para trabalhar com a maior cele-ridade. Como 0 Duro desce das minas ao mesrno tempo emque as frotas chegamde Portugal, e preciso acelerar 0 tra-balhodamoedaeelaecunhadacomumaprontidaosurpreen-dente".Quantaaoodiamantes, 0 sistema eraaindamais rigoroso.Os exploradores, conta Bougainville, "saoobrigados a prestarcantas exatas dos diamantes encontrados e a entrega-Ios aDintendente nomeado pelo rei para esse fim. intendenteimediatamente os deposita numa caixa cercada de ferro efechadaa trEischaves. UmaficacomEile, outracom0 vice-reie a terceira com0 provedor da Fazenda Real. Essa caixa efechada numa segunda, emque se colocamos selos das trEispessoas acima mencionadas, e que contemas trEis chaves daprimeira. 0 vicerei naotern 0 direitodeverificar 0 queela apenas guarda tudo num terceiro cofre-forteque remete para Lisboa, depois de ter colocado 0 seu nafeehadura. Aaberturasefazemdorei, queescolheos diamantes que deseja, pagando 0 respectivoaos ven-dedores combase emtarifas reguladas por umtratado exis-tente entre as duas partes".Dessa intensa atividade que, apenas no ano de 1762, seexercerapara 0 transporte, cunhagemede119arrobas deouro, istoe, mais de uma tonelada emeia,nada subsiste aolongo dessas costas devolvidas ao Eden, se-nao algumas fachadas majestosas e solitarias no fundo desua enseada, muralhas batidas pelas ondas, ao pe das quaisabordavamos gale5es. Essas florestasgrandiosas, essas angrasvirgens, essas rochas escarpadas, gostarfamos de crer queapenasalgunsindfgenasdescal!:OSafsetivessemdeixadoescor-regar doaltodos planaltos, enaoquetivessemfornecidolocalparaoficinasemque, haapenas 200anos, seforjava 0 destinodo mundo moderno.Depois de se haver fartado de ouro, 0 mundo teve fomedemas 0 tamMmconsumiaescravos. 0 esgo-tamentodas minas- precedido, deresto, peladevasta!%odasflorestasqueforneciamcombustivel asfornalhas- ada escravatura, enfimuma procura mundial crescente, orien-tamSaoPauloeseupi)rtode Santos, para 0 cafe. Deama-reIo, depoisbranco, 0 ouro setornanegro. Mas, apesar dessas'que fizeram de Santos urn dos centros docomerciointernacional, 0 sitioconservava umabelezasecreta;enquanto0 naviopenetralentamenteentreasilhas, sinto aqui() primeiro choque dos tropicos. Urn canal verdejante noscircunda. Esticando a mao, poder-se-ia quase agarrar essasplantas que 0 Rio ainda mantinha it distllncia, em estufasbern altas. !\"uma cena mais modesta, 0 contacto coma pai-sagemse estabelece. ...-/ointerior de Santos, planicie inundada, crivada de Iagu-nas e de pantanos, cortada de rios, de estreitos e de canais,('ujos contornos sao, perpetuamente apagados por uma neblinanacarada, parece a propria Terra emergindo do inicio da Asbananeirasqueacobremsaodoverdemaisjoveme mais delicadoquesepossaconceber; maisagudoque 0 ouroverde dos campos de juta no delta do Bramaputra, comosquais a minha lembran!:ll gosta deassocia-las; mas a pr6priafragilidade dotom, suainquietacomparada it tranqiiilasuntuosidade do outro, contribuempara criar urn ambienteprimordial. Duranteumameia hora, rodamos entreas bana-neiras, plantas mastodontes mais do que arvores nanicas,troncos sehrosos quese terrninarn Dumpululamentode f6IhaseIasticasacirnade umamaodecerndedossaindodumenormelotus marrone rosa. Depois, a estrada seelevaa 800metrosde altitude, ate aoaltoda serra. Comosempre neste litoral,declives abruptos protegerarn dos atentados do hornem umaflorestavirgemtaoricaque, paraencontrar outrasemelhante,seria necessarioir muitos quiIometros para 0 norte, pertodabacia amazonica. Enquanto 0 auto geme emcurvas que janemsequer sepodernqualificar de "emcotovelo", a tal pontosaoespiraladas, atravesdeumaneblinaqueimitaaaltamon-tanha emoutros dimas, tenho tempo de inspecionar asarvores easplantas arrumadas diantedomeuolhar' comoespecimes demuseu.Estaflorestadifereda nossapelocontrasteentrea folha-geme os troncos. Aquela e mais sombria, suas tonalidadesde verde evocam0 mineral rnais do que 0 vegetal e no pri-meiro reino, 0 jadee a turmalina, mais do que a esmeraldae 0 peridoto. Em os troncos, brancos ou acin-\;mSOJU;)US l:: Ulnl::.lS>J!S9dOJd (SI,,l::UEC""U""I"n"nb" J"'lrnowo:')'eJ!:oJ W,"P'W;) 'Il::P;)(J,nbj"nb.'!"JU'W 'puolll '(U;)WE:'U;)I 'OJ"J'O';):,) OJU;)WUESU! ;}PSl"P!UOSU! .U!"P,0J",d.. SI,..d 'P"P!nb 'WDJS!dSUl OJU'" 'P"P!UJ;;}JlO:JSE: (q,,,,J 'p (O""P OP"!1:,)E owo;op "!'9J5"Jowo:92 O. LEVI-STRAUSSTBrSTESTR6PICOS93zentados, sllhuetam-se como ossadas no fundo escuro da fo-Ihagem. Demasiadamente perta da muralha para consideraroconjunto, en examinava sobretudo os pormenores. Plantasmais copiosas que as da Europa erguemcaules e fOlhas queparecemcortadas emmetal, tanto0 senporte e firme etantoasua formaplena parece ao abrlgo das provas do tempo. Vistade fora, essa naturezaede uma ardemdiferente da nossa;elamanifestaurngransuperior de edepermanencia.Como nas paisagens ex6ticas de Henri Rousseau, esses seresa dignidade de objetos.Ja urna vez passei pol' impressao amUoga. Foi POI' oca-siaa das rninhas primeiras ferias uadepois deanos votados It Normandia e It Bretanha. Aumaque continuava para mimconfusa e seminteresse, sucediaDntra emquecada especie me oferecia uma par-ticular. Era como se en tivesse sido transportado de umavila banal para urn sitio arqueol6gieo em que eada pedranaofasse mais urn elementodeedificio, mas urn testemunho.Eupercorria, exaltado, 0 terreno, repetindo-mequeaqui eadararninhoseehamavatimo, oregilo, rosmaninho, basilisco, cisto,louro, alfaserna, medronheiro, alcaparra, lentiseo, que possuiasuas cartas de nobreza e recebera sua carga privilegiada. Eo pesado aroma resinoso era-me ao mesmo tempo prova erazao de urn universo vegetal mais valido. 0 que a floraprovenc;al me trazia entao no seu aroma, a do tr6pieo mesugeria agora por sua forma. Kao mais mundo de odores edeusos, herbariode receitas ede mas conjuntovegetal semelhante a urn corpo de grandesdasquais -cada uma houvesse imobilizado 0 seu gestona posi:> 'P'P!uJ:S'C(q':>'l 'P ,OA'p 0p'Tl:> 'C OUIO:op "!19l'T'CnpI'."'1'>,""I':198TBISTES TBOP!COS99'renpI 'pSleplUeSU! 'u! ep ,ol:J;;)ds'E S!'sed'peplnb 'UlmsIdSUT OlUto 'peplUl:;;)JJO:JS'E(, ', 'I;:1";;mSOlU;)US -e l'eJn-elS'lls9dOld (SIcc"'eu-ed',oulDlenenb e lenrnOIDO:J:G1 Ul, eptill;) '1'E!:J;;)(l,nbjenb'fE1U;)W'puelll '(.U;)ill 'EJU;;)ladoumaigrejaparoquial austera, semoutrasenaoo arco cortando 0 frontaobarroco na parte superiordafachada.l\iuitolonge, para0norte, 0Tietealongavaos seusmeandrosprateados emvarzeas - pantanos que se transformamponeoa ponco emcidades - rodeados de urn rosario irregular dearrabaldes e de loteamentos. Imediatamente atras, era 0centro comercial, fiel ao estilo e as aspira(;iies dade 1889: ada So, a meio caminho entre a e a ruina. Depois 0 famoso Triangulo, de que Sao Pauloera taovaidoso'quantoChicago doseuLoop: zona decomer-cio formada pela intersect-ao das ruas Direita, Sao Bento e15 de !\"Tovembro: vias congestionadas de placas emque seespremia uma Inultidao de comerciantes e de empregadosprocIamando, nassuasroupasescuras, afideIidadeaosvaloreseuropeus ou norte-americanos, ao mesmo temlXJ emque seuorgulhodos 800 metros de altitude qne os libertava dos lan-gores dotr6pico (0qual passa, entretanto, emplenacidade).EmSao Paulo, nomes de janeiro, a chuva nao "chega",elaseengendradaumidadeambiente, comose0vapor dagua,que embebe tUdo, se materializasse em perolas aqmlticas,caindopesadamente, masfreiadas, dir-se-ia, por suaafinidadecom tOda essa bruma atraves da qual escorregam. Nao e,comona Europa, uma chuva emriscas, mas urncintilamentopalido, feito duma mnltidao depequenas gotas dagna qnede-gringolam numa atmosfera limida: cascata de caldo clarocomtapioca. E tambemnao e quando a nuvem passa quea chuva cessa, mas quando 0ar sesuficiente-mente, pela pun!:ao pluVial, no proprio local, do seu excessodeumidade. Entao0ceuseaelara, urnazul muitopAlido entre as nuvens loiras, enquanto torrentes alpestresescorrempelas ruas.Napontanortedo gigantescasobras seiniciavam:as da avenida Sao Joao, arteria de muitos qUil6metros quesecome!:avaa tra!:ar paralelamenteaoTiete, seguindo0per-cursodavelhaestradadonorteparaHu, Sorocabaeas ricas de Campinas. Presa por seu inicioa extremidadeda eSlXJra, a AvenidaD:escia peloo escombros de velhos bair-roo. Deixava, primeiramente, adireita, a rua Florencio deAbreu, queconduzia a esta("ao, entrebazares sirios, queapro-visionavam todo 0 interior em qUinquilharia, e tranqtiilasoficinas de seleiros e tapeceiros onde se continuava - maspor quantotempo?- adas bonitasselas decourotrabalhado, dos cochonilhos para cavalos emgrossos tecidosmelha-se a de umaguase 20 anos atras asse dera oferecer urn in-fotografia fenecida. Pelo menos, felad!:de gaveta de minhateresse documental; derram? os. unmem6ria nos arquivos mUnICIpalS. .- - P I comoumacidadefem. SemDescrevia-seentaoSao au0 fora demoda;duvi'da, os im6veis d.Dcentro eeraaindaagra-a indigi!nciapretenslOsa_ S' as estatuas e gnirlandasvada pela pobreza daslambuzado de amarelonao eramde r:oora, mas emaneirageral acidade mostra,af " Or ....."O;tma Deuma ,para 1llgJ. 11portugueses se es '. . ta-..a I as vlrtudesda CIVll .os selvagens e lnlCl - os n Tamanduatei e que dominam osludes que descem para 0 da Penha subsistiarn ainda, embairros populares doBras. e ." e la;gOs' quadradas1935 algumas ruelas provlllClalS " . teto de teThas e' d d d casas balxas come ervosas, roea as e . d cal tendo de urnpequenas janelas gradeadas, pInta as a ,100O. LEVI-STRAUSSTBISTESTB6PICOS 101,I'"ide algodao, de arreios decorados de prata para dos plantadores e dos peOes do sertao tao pr6xlmo. DepOls,a Avenida passandoaope de umaranha-ceu- entao uuicoeinacabado - 0 r6seoPredio Martinelli, enfiavapelos cam!?"sEliseos Qutrararesidencia dosricas, oodepalacetesde madeIra sedesfaziamemjardins de eucaliptosmangueiras;apopularSantaIfigenia, enquadradaporumbaIrroreservado,depardieiros comporaoalto, deoodeasmulheres:hamavamosclientespelasjanelas. Enfim, nosextremosdacldade, pro-grediamos loteamentos pequeno-burgueses d: e daAgua Branca, fundindo-se a sudoeste na colma verdeJante emais aristocratica doPacaembu.Para 0 suI 0continua a seelevar; modestas ave-nidas sobemele, juntando-senocimo, oa pr6pria .espiD.hado relevo Da Avenida Paulista, envolvendo as residenclasoutrorados miliomirios doultimomeiosecnla, Dumestilo de cassino e de estac:ao de aguas. Bemno fim,leste a Avenida se inclina para a planicie, acima dobalrronovo' do Pacaembu, onde os palacetes cubicos se :ctificamatrouxe-mouxe, ao longo de avenidas sinuosas polvllhadas doazul-violeta dos jacarandas emflor, entre rampas de gramae aterros de argila ocre. Mas os milionarios deixaram aAvenida Paulista. AcompanhaQdoa expansaoda cidade, cerarn comelapara0 suI dacolina, na dos bairros deruas sinuosas. Suasde cah-forniana, de cimentornicaceo e combalaustres de ferro fun-dido, adivinham-senofundodeparques cortados em. bosquetesrusticosondeseimplantamessesloteamentospara rICOS.Pastagens estendem-se aopedeedificios emcimento, urnbairrosurgecomoumamiragem, avenidas rodeadas .delu.."{uo-sasresidenciasseinterrompemdosdoisladosderavmas; umatorrente lamacenta ai circula entre bananeiras, servindo aomesmo tempo de fonte e de esgoto para taperas de pau. apique, ondeseen-eontraamesma negraque, noRIO,acampavanoaltodosmorros. Ascabrasaolongodasencostas. Certos lugares privilegiados da cldade acumnlar tOOos os aspectos. Assim, a safda de duas dl-vergentes que conduzem ao mar, desemboca-se, a belra daravina do rio Anhangabau, atravessado por .uma ponte queeumadasprincipaisarterias dacidade. A balxadaeocupadapor urnparquenogOstoingles: canteiros ornados deestatuase quiosques enquanto na vertical dos dois taludes se elevamosprincipalsediffcios: 0 Teatro Municipal, 0 Hotel Esplanada,--oAutom6vel Clube, osescrit6riosdacompanhiacanadensequefornece a luz e os transportes. Suas massas heter6clitas seafrontamnuma desordemim6vel. 1!:sses ediffcios embatalhaevocamgrandes rebanhos de mamiferos reunidos a tarde emt6rno de umponto de agua, por alguns instantes hesitantese im6veis; condenados, por uma necessidade mais urgenteque 0a misturar temporariamente suas especies anta-gonicas. A animal se realiza segundo fases maislentas que as da vida animal;e, se eu contemplasse hoje0mesmolugar, verificaria, talvez, que 0 hibridorebanho desapareceu:esmagadopor uma mais rigorosa e maisdearranha-ceus, implantados nessas margens que uma' autoes-trada fossilizou de asfalto.Ao abrigo dessa fauna pedrenta, a elite paulista, serne-lhante as suas orquideas favoritas, formava uma flora des-preocupada e mais ex6tica doque jUlgava. Os botllnicos en-sinamque as espeeies tropicais comportamvariedades maisnumerosas queas das zonas temperadas, ainda queeada umaseja, em constitnida por urn numero As vezesmuito pequeno de indivlduos. 0 grafino local era 0 produtoextremo dessa Uma sociedade restrita tinha repartido os seus papeis.TOdas asos gostos, ascuriosidades justificaveisdaciviliza 'EOWO;op "P9'106II''I sua pr6pria exisMncia cosrnopolita, que lhes conferia umasuperioridades6bretodos OSquetinhamficadonaaldeia, masqueosdesligaradavidaedasnacionais. Tal comoeles, tambempareciamos snspeitos; mas traziamos emnossasIDaos os frutas dasabedoria, e os estudantes se afastavamenos cortejavam, alternadamente, ora seduzidos, ora rebeldes.eadaurn den6s mediaa suainfluenciapela importAnciadapequenacOrtequeseorganizava a suavolta. Essasclientelastravavamentresi umaguerradeprestigio, daqual osprofes-s6res preferidos eramos simbolos, osbeueficiiiriosouas viti-mas. IS80 se traduzia por homenagens, isto e, por manifes-ta!:iiesemhonraaomestre,oueMsoferecidos 11 custadetanto mais tocantes quanto deixavamsupor pri- reais. As pessoas e as disciplinas flutuavamduranteessas festas comovalores deMlsa, emramodoprestigio doestabelecimento, donumero de participantes, da condiW'pooJll O(!.U;)W l:::JU;)I 'Olej'O;;>:) OlU;)W opSIepm.su!SU! 'pIOlJ;}dsES!:sed'P'P!mb,wOls!dsu! OlUt" 'P'P!UJ;;)110:> SE(gO"'J 'p ,OA'p ope!l:J 'e OWO:op .!J9"TEmpI112O. LEVI-STRAUSSTBXSTES Tx6P100S 1131I,de ouropeis e prodigiosamenteembriagados, desafiavam-se, aosomde urn tambor, emduelos desatiricas. Raviatambemascrenf:3.se assuperstigOesdequeseriainteressantefazer 0 mapa: cura do pela imposi\;lio de umanel deDuro' divisao de tod08os alimentos emdais grupos incompa comida quente, comida tria. E outras associa4j)es ma-peixe ecarne, mangacombebidaalc06licaoubananacomleite.Entretanto, no interior do Estado, era ainda mais apai-xonantedeter-se, DaDnosvestigios detradi0esmediterrAneas,mas nas formas singulares favorecidas porumasociedadeem0 assunto era 0 mesma, tratava-se sempre do pas-sada e do presente, mas, ao contrario do inquerito etnogra-fico de tipo chlssico, que procura explicar este por 'aquele,era aqui 0 presente fluido que parecia reconstituir etapasmuitoantigasdaevolui;aoeuropeia. ComoaotempodaFran-merovingia, via-se naseer a vida comunal e urbana numcampodelatifl1ndios. Asaglomeral))esquesurgiamnaoeramcomo as cidades de hoje - tao gastas que se torna dificildescobrir a marea da sua hist6ria particular - confundidasDuma forma cada vez mais homogenea emque sbmente seafirmamasadministrativas. Aocontrario, podiam-se escrutar as cidades como urnbotllnicoas plantas, reconhe-eendopelonome, aspectoeestruturadeeadaumasuaprove-niencia de tal ou tal grande familia de urn reino aerescidopelohomema natureza: reino urbano.Duranteos seculosXIXeXX, alinhadafranjapioneira se deslocou lentamente de leste para oeste e dosuiI para 0 norte. Por volta de 1836, somente 0 Norte, isto e,aregiaoentre0RioeSaoPaulo, estavasolWamenteocupada,e 0 movimentoa zona central do Estado. Vinteanos roais tarde, a mordia a nordeste, comaMogiana e a Paulista; em1886, ela alcani;ava Araraquara,aAltaSorocabanaeaNoroeste. Nestasultimaszonas, em1935ainda, a eurva de crescimento daacompanhava ada de cafe, enquanto que, nas velhas terras doNorte, aderrocada de uma antecipava de meio seculo0 declinioda outra: a queda demograficaa se fazer sentir apartir de 1920, enquantoque, desde 1854, as terras esgotadascaiamno abandono.J!:sse ciclo de utiliza\;lio do correspondia a umaevolu\;lio hist6rica cuja marca era igualmente transit6ria. 11:somentenas grandes cWades da costa- Rioe SaoPaulo-quea e.'tpansaourbanapareciater umabase suficientementes6lida para parecer irreversfvel: Sao Paulo contava 240.000habitantes em1900, 580.000 em1920, passava 0 milhao em1928 e 0 dobra emnossos dias. Mas, no interior, as especiesurbanas nasciame desapareciam; ao mesmo tempo eJP" queela se povoava, 0 interior se despovoava. Deslocando-se deurnpontoparaoutro, semnuncaaumentar, os habitantes mu-davamdetiposocial, ea lado aladodecidades f6s-seise de cidadesembriomlriaspermitia, no plano humano e emlimites temporais extremamente curtos, 0 estudo de transfor-tao impressionantesquanto as do paleont610go com-parandoaolongodas camadas geol6gicas as fases, estendidasemmilh5esdeseculos, da dosseres organizados.Desde quesedeixavaa costa, erapreciso naoperder devista que, M urn seculo, 0 Brasil se transformara mais doque se desenvolvera.Naepocaimperial, aimplantai;aohumanaerafraca, masrelativamente bemdistribufda. Se as cidades litorlineas ouvizinhas permaneciampequenas, as do interior tinbamumavitalidade maior que hoje. Por urn paradoxo hist6rico quese tende, com demasiada freqiiencia, a esquecer, a insufi-geral dos meios defavorecia os piores;quandonaosetinhaoutrorecursosenao deandaracavalo,era mellor a relutAncia emprolongar tais viagells durantemeses, mais que dias ou semanas, e emseguir por lugaresemquesomente0burropodiapenetrar. 0 interior doBrasilvivia solidariamente duma Vida, lenta semdl1vida, mas con-tinua; navegava-se emdatas fixas, pelos rios, empequenasetapas que se eneompridavampor meses; e pistas completa-menteesquecidasem1935, comoadeCuiabaeGoias, serviamainda a urn trafieo intenso de caravanas contando eada uma50a 200mulas, cernanos antes.Seseexcetuamas regi5esmais afastadas, 0 abandononOqual cafra 0Brasil central nodoseculoXXnao re-fletiadeformanenhumaumasitUfti;aoprimitiva: era0 pago pela do povoamento e das trocas nas re-gi5es eosteiras, em das de vida modernaque af se instauravam; enquanto que 0 interior, onde 0 pro-gressoeradiffcil demais, regressavaemlugar deacompanharo movimento no ritmo moderado que lhe pertencia. Assim,aa vapor, que dimlnui os trajetos, matou, peloI ';;mSOlUJU1t S'E l'Eln'E1SI 11!S9dOld (1 'l'-OUo 1: OWO:op 142 C. LEVI-STRAUSSTBrSTESTB6PICOS 143!1A cada instante nos rodeiam, imploram uma ordem. Raqualquer coisa de er6tico nessa angu.stia da submissao. Ese nossa conduta nao corresponde aD que esperam, se DaOagirmos emtodas as circunstfinciasamaneira dos sellSanti-gos senhores britftnicos, seu universo desmorona; nao querpudim? Banho antes do jantar ou depois? Entao, Deus jaDaD existe... A confusao se pinta emsua fisionomia; fa!;oprecipitadamente marchaare, renuncioaos mens habHos ouas oportunidades mais raras. Comerei uma pera dura comopedra, uma tortaargilosa, jaquedevopagar com0 sacriffciode urn ananas a moral de urn ser humano.Estive hospedado durante alguns dias no Circuit HOUStde Ohittagong: palacio de madeira emestilo de chaleonde ocupava urn quarto de 9metros por 5, e 6de altura.Ravia nada menos de 12 comutadores: lil.mpadas de centro,bacias murais, luz indireta, banheiro, dressing romn, espNho,ventiladores, etc. 1l:ste lugar naoe 0 dos fogos de Bengala?Comessa eIetrica, urn maraja qualquer reser-vara-se 0 deleitedefogos deartiffciointimos ecotidianos.Urndia, nacidadebaixa, parei 0 autom6vel pOsto11 minha pelo chefe do distrito diante de uma loja de boaaparencia emque desejei entrar: Royal Hair Dresser, Highclass cutting, etc. 0 motorista me olhou horrorizado: Howcanyousit there! Quesetornaria, comefeito, 0seupr6prioprestfgio junto aos seus, se 0 Master se degradasse, e comisso 0 degradasse, sentando-se ao lado dos da sua...Desanimado, deixo-Ihe 0 cuidado de organizar pessoalmenteoritual docortedecabelos paraurnser deesse-nciasuperior.Resultado: uma hora de espera no autom6vel, ate que0barbeiroterminasse outros cHentes e reunisse 0 seu material; volta,juntos, 11 Circuit House emnosso Chevrolet. Mal chegadosem meu quarto de 12 comutadores, 0 bearer apronta urnbanhopara que ell possa, logo que 0 corte termine, lavar-meda macula dessas maos servis, que tocarammeu cabelo.Tais atitudes estiio enraizadas num pais cuja cultnratradicional inspira a todos 0 desejo de se fazeremreis comrelaC;;ao a algumoutro, por poucoque consigamdescobrir oucriar urninferior. Comogostariaqueen 0 tratasse, 0 bearertratara 0 carregador pertencente as scheduled castes, isto e,as mais baixas, "inscritas", dizia a administrac;;ao inglesa,comotendodireito 11 sua pois 0 costumequaseIhesrecusavaa quaHdadehumana; e saohomens, comefeito, essesvarredoresecarregadoresdetoneis .fecais, obrigados, por essadupla fun!f.io, a permanecer acocorados 0 dia inteiro, quercoletememsuas maos a poeira, na soleira doquarto, com0auxfHodeumavassourinha semcabo, quer solieitempor trasaos socos embaixo das portas, que 0 ocupante do gabinetesanitario termine depressa, para entregar-Ihes esse mons-truoso utensilio que os ingleses chamam"comode", como se,sempre contraidos e correndo como carangueijos atraves dopatio, eles pr6prios encontrassem, arrebatando ao senhor asua substancia, 0 meio de afirmar uma prerrogativa e deadquirir urn estatuto.SeraprecisoalgocompletamentediversodaindepenMnciae do tempo para desmanchar essa prega de servidao. Oom-preendi-ouma noite, emOalcuta, saindodoBtar Theatre emque tinha ido assistir 11 de umabenga-lense, inspirada numassunto mitol6gico e chamada Urboshi.Meio perdido nesse bairro periferico de uma cidade a quechegara na vespera, vi-me precedido, para fazer parar 0l1nicotaxi quepassava, porumafamilialocal de boa burguesia.Mas 0motoristanaoqueriasaher denada: duranteumacon-versac;;ao animada que travou com os sens clientes, e emque a palavra "Sahib" reaparecia com insistencia, pareciaacentuar a inconvenie'llciadesep5r emconcorrencia comurnbranco. Com urn mau humor discreto, a familia partiua pe, ua noite, e 0 taxi meconduziu; talvez 0 motoristacon-tasse comuma gorgeta mais substancial; mas tanto quantao meubengalense sumario me permitiu compreender, eramuitooutro0assuntoda discussao: umaordemtradicional, que de-via ser respeitada.Fiquei tao mais desconsertado quanta essa reuniao medera a ilusao de vencer algumas barreiras. Naquela vastasala deteriorada, que parecia tanto urn hangar quanta urnteatro, apesar de ser 0 unico estrangeiro, vlme misturadoitsociedadelocal. :tsseslojistas, comerciantes, empregados, fnn-cionarios, perfeitamente dignos e freqiientemente acompanha-dos de suas mulheres, cuja encantadora gravidade pareciatestemunhar a sua falta de habito de sair, manifestavamameu respeito umaque tinha algo de benfazejo,depois da experiencia do dia; par negativa que fOsse a suaatitude, e talvez par isso mesmo, ela inStaurava entre n6suma discreta fraternidade.Ade que s6 compreendi uns retalhos, era umamisturadeBroadway, deOMtelet ede"BelleRel'me". Ravia.;}US t:l'eJTIt:1SlllS9dOld (81""t:Ut:C"OliOO," n"nb" l"n'TI OliO:) l:l!:oJ W, "P'li;}'IE!:)J(l,nblenb'relU;}W 'pliOlll o(I,U;)W EJUJI I 'OlE] JO;}:) OlUJUl 0PSI: t:P!UESU!SUI"P,ol:)JdsE S!, :sed0P"Pl}nb ;}WnlS!dsUi OlUlo 0P"P!Ul:J1JO:)SE(gOOOl 0p,1 OA"P ope!J::> E OWO:op "!"9l:iI .5-eJodJo:TEmpI144 0. LEVI-STRAUSS TBISTES TB6PIOOS145cenasromleaseancllares, cenas deamorpatetico, 0 Hlmalaia,urn amantedesiIudidoque ai viviacomoeremita, e urn deuscarregando 0 trldente e de olbar fulmlnante, protegendo 0namorado contra urn general bigodudo; enfim, urn grupo de"chorus girls", metade das quais parecidas com' mulheres desoldados e a outra metade com preelosos Idolos t1betanos.entreato, servia-se cha e limonada emcopos de cerAmicaque se atiravamfora depois de usados, - como se fazia hii4.000anos emHarappa, ondealnda hoje se podemencontraros eacos - enquanto os altofalantes dlfundlamuma mlislcaordinaria e cheia dea melDcaminho entre as ariaschinesas e os "pasodobles".Contemplando as do Hmocinho", cujo leve ves-tuario permitia que se Ihe vlssemos eachos, a papada e asformas arredondadas, lembravame de uma frase !idaalgunsdias antes na pagina Iiteraria de urn jornale quetranscrevoaqui, semtraduzir, para DaOperder 0 sabor indes-critivel doanglo-hindu: '" and the younggirlsWho sighasthey gazeinto thevast bluenessof the8ky, of whot aretheythinkingt Of fat, prosperous suitor8... Essa referencla aos"gordos pretendentes" espantara-me, mas, considerando 0 he-r61 encorpado que fazia ondular no palco as dobras do seuestamago e evocando os mendigos esfomeados que iatrar 11 porta, percebl melhor esse valor pot\tico da reple!:1ioparaumasociedadequevive numaintimidade Hiolancinantecoma pem'iria. Os compreenderam, de resto, que 0meio mais segura de parecer, aqui, super-homens, era con-veneer os indigenas de que preclsavamde uma quantldadede comida muito superior aque satisfaz urn homemeomum.Viajando nas colinas de Chlttagong, na fronteira blrmii,com0 irrnilo de urn raja local, que se tornou funcionario,logome espantou a solicltndecoma qual ele me fazla abar-rotar por seus servidores: demanh1i cooo, a palancho, isto e,o"eM. na cama" (se e que se pode apliear esta palavra aoselasticos estrados debambu emque dormfamos nascabanas indigenas); duas horas mills tarde, urn s6lido bife; ao meio-dia; urn cha copioso as 5 horas; enfim, 0jantar. TUdo isso emlugarejos onde a se nutria,duas vlls9dOld (St"-eu-ec',ou""" n, ,nb'""!Ifn owo:J ,:Dl wo 'p'JWO'1:mo:>[' n! ionb "OWt jn owe::> 11:01WJ ept:.j'jW' 'jO':>'((,l,nbjonb11'r1U'W .:ii'PUOlj! 'c1!',u;;Iw"eJU;;I,IHI 'OlOJ'OIl':>OlU'W

JpSlOpTUOSUI, SUI op I ;OJ:>,d,.SII:sod'POp!,mb,wmsIdsu!OlD>:> 'pOpTU1;;;1110::> s-e (g':>'l 'p (OA op opO!l::> 'E CWO:op 0!"91'ronpl, d u a l .: o r p o r a F 't 6 r i a d o: o m o a c r ia d o d a Y O) d e r e c e b ,) a s c o r r e: m i d a d e 0 'm t o i n s p is t u m e q u ,i d a d e p a s : :i s a s p e c t o : ', a o d a i n s 'i n s a n i d al S d e i n s a r ;m e n t a c eD e f a t o , ' I 'e n c . r a m e n "' e g r a n d e : a m e n t a l ,q u a l q u e rl e c i a l , e m l, d a e m t o :; t a c o m o u, l i a r a q u a 'J a l e a n c e ' :> a n a . ' > 1 8 II p r o p 6 s i t < )s t a u r a r a s ;l e n t o s n e " :0 3 : A D G V J: I l ; L U V d V ; L N I l l bXVIIPARANACampistas, acampai no Parana. Ou, antes, nao: absten-de-vos. Reservai aos tiltimos sltios da Europa os vossos pa-peis engordurados, asvossasgarrafasinquebraveiseasvossaslatas de conserva rebentadas. Estendei af a ferrugem devossas tendas. Mas, aMm da franja pioneira e ate it expi- doprazotaocurtoque1I0S separadesuapilhagemdefi-nitiva, respeitai as torrentes espumosas que se despenhamaos saUos dos degraus escavados nos flancos violeta dos ba-saltos. Nao piseis OS musgos vulcllnicos de >lcido frescor;quevossospassos hesitemit entradados prados desabitados eda grande floresta limida de coniferas, perfurando 0 ema-ranhado dos cip6s e das samambaias a fimde elevar aocenformas inversas as dos nossos pinheiros: DaOcones afinadospararima, masaocontrario - vegetal regularqueencantariaBaudelaire - superpondo em torno do tronco as bandejashexagonais de sens ramos e alargando-as ate a ultima, quese espande como uma gigantesca umbela. Virgeme solenepaisagemque, durante milhoes de seculos, parece ter vado, intacta, a face do carbonifero e que a altitude, combinadacom0 afastamentodo tr6pico, libertadaconfusaoamazonicaparaumamajestadee urnordenamentoinexplicaveis, salvo se virmos nisso 0 efeito de umuso imemorial,por uma gentemais sabiae mais poderosadoquea nossaea cujo desaparecimentodevemos 0 ter podido penetrar nesseparque sublime, hoje entregueao e aoabandono.Nessas terras que dominam as duas margens do rioTibagi, a 1.000 metros mais ou menos sobre 0 nivel do mar,tive 0 meuprimeirocontactocomosselvagens, acompanhandoemsua viagemurn chefe de distrito dodeaosfndios.Naepoca da descoberta, tOdaa zonasui doBrasil serviade"habitat"agrupos aparentadospelalinguaepelacultura,);mSo.lU;)U:S 'E llUne:)s,hl!S9dOld (81''EU'EC n'mb ''''!ITi-n owo:> ':01 III' "pT 'IE!:);)1;l,nbrmbr'fE1UJWE:\ 'pm12'1I!W;>W'E:)UJr'Ol"J'OI! OlU;)lUI' 'p S1P"PIU"SU!':5U1 "p :lOl:JJdSES!:''''d'P"P!1mb 'IIIms'illdsUi OlUl" ." 'P"P!UJ:JJlO:::>S'E(g'"'l 'p ,OAope!J:) 'E aIDa;op "!191TEmpI! e queseclasslflcamsob 0 nomedeae. Havlamsidoprovil-velmentepor invasores recentes de lingua tupi,que ja ocupavamtodo 0 litoral, e contra os quais lutavam.Protegidos por sua retirada emregioes de acesso dificil, osdosui doBrasil sobreviveramduraute alguns seculos aostupis, logo liquidados pelos colonizadores. Nas florestas dosestados meridiouais: Paranae Santa Catarina, pequenos ban-dosselvagenssemantiveramateaoseculoXX; algunssubsis-tiam, talvez, em1935, t1\o ferozmente perseguidos durante oscern nItimos aDOS que se tornaraminvisfveis; mas a maiorparte tinha side reduzida e fixada pelo governo brasileiro,por volta de 1914, emdiversos centros. Aprincipio;ram-se por integra-los na vida moderna. ROlive, no lugarejode Sao Jer3nimo, que me servia de base, uma serralharia,uma serraria, lima escola, uma farmacia. 0 p6sto recebiainstrumentos regularmente: machados, faeas, pregos; distri-buiam-seroupasecobertas. Vinteanosdepois, essastentativasestavam abandonadas. Entregando os indios asua pr6priasorte, 0de demonstrava a indiferen(;ll deque se tornara objeto por parte dos poderes pliblicos (read-Quirin @:le, depois, uma certa autoridade); assim, via-se obri-gada, semquerer, a experimentar Dutrometodo, queincitasseos indigenas a retomarem alguma inieiativa, eareassumir a sua pr6pria De sua experlencia efemera de os indios 86guardaramasroupasbrasileiras, 0 machado, afacaeaagulhade costura. Em tudo mals, foi 0 mal6gro. Tlnham-se-lhesconstrufdo casas, e eles dormiamao relento. Procurou-se fl-xa-los nas vilas e contlnuaramn;}dSE SI,'sod 'P"P!imb,wms,I!dsu! Olm10'P"P!Ul: so ('P (OA"P op.!lJ -e owo;op "!'9ldeslocamentosde Wda a Emque abrigosvivemno fundo do mata? Emque esconderijos guardamosareas eas flechas, dos quais sbmentepor aeasase encontramexemplares esquecidos numcantode casa? Dequeritos, reatamos !iames?A. horta Deupa 0 illtimo Ingar nessa economia primiti\7a.Emplena floresta, atravessam-se por vezes derrubadas iudi-genas. Entreas altas mnralhas das arvores, uma pabre ver-duraocupaalgumasdezenas demetrosquadrados: bananeiras,batatas doces, mandioca e milho. 0 gdio eprimeiramentesecado aDfogo, depois maida no almofariz por mulheres quetrabalhamsbzinhas ou comDutra. Afarinhaecomida dire-tamente on aglomerada com banha para urn bolocompacta; 0 feijao preto se junta a esse alimento; ae 0porcosemi-domesticocontribuemcoma carne. Estaulti-ma e sempre assadalespetada numramol s6bre 0 fogo.Devem-se tambemmencionar os /coro, larvas palidas quepululamemcertos troncos dearvores apodrecidas. Os indioslofendidos pelas dos brancos, nao confessam 0 seug6sto por esses animaizinhos e negamenergicamente que oscomam. Basta percorrer a floresta paraver par terral sobre20 ou 30 metros de comprimento, 0 sinal de urn grande pi-nheiroabatidopela tempestade, reduzidoaoesta-do de fantasma de arvore. Os catadores de koro passarampar ali. E quando se penetra inesperadamente numa casaindia, pode-se vislumbrar, antes que uma maorapidaa dissi-mule, uma panela fervilhante da preciosa gUloseima.Assim, nao e coisa facil assistir it dos koro.Meditamos longamentenossoprojeto, comoconspiradores. Urnindiofebril, uniconumaaldeiaabandonadalpareceumapresaflici!. Pomos-lhe 0 maehado na mao, saeudimo-lolempurra-ma-lo. Trabalho perdido, eIe parece tudo iguorar do quequeremos dtHe. Sera uma nova derrota? Tanto pior! ,_ Lan- nosso ultimo argumento: queremos comer koro/ Con-seguimos arrastar a vitima diante de urn tronco. VIDa machadadaabre milhares decanais vazios nomais profundodamadeira.Emeada urn deles, uma grandelarva de cor creme, bastanteparecido eorn urn bicho da seda. Agoraldevemos cumprir apalavra. Sob 0 olhar impassivel do indio, decapito a minha docorpa, escorreumagorduraqueexpe-rimento naosemterna consistencia e a finura damanteiga e 0 sabor dolette de c6oo.166 C. LEVI-STRAUSSXVIIIPANTANALDepois desse batismo, eu estava pronto para as verda-deirasaventuras. Aocasiao apresentar-se-iadurante0 periododas ferias universitarias, que, no Brasil, ocorremde novern-bro a isto e, na esta!fc.io das chuvas. Apesar desseinconvenientel forrnei 0 projeto de tomar contacto comdoisgrupos indfgenasl urn, muito mal estudado e talvez extinto,empelo menos tres-quartos: os Caduveolda fronteira guaia;0 outro, melhor eonhecido,mas aindacheio de promessas:os Bororo, no Mata-Grosso ceutral. Alom disso, 0 MuseuNacionall doRio de Janeiro, sugeria-me que f6sse reconhecerurnsiUoarqueol6giconocaminhoecUjaseeternizavanos arquivos semque ninguemtivesse tidoocasiiiodeocupar-se dele.Desde entao, muitocirculeientreSao PauloeMato-Grossoora de aviao, ora de caminhao, ora, enfim, por treme navio:Sao estes ultimos os meios de transporte que utilizei em1935-36; comefeito, a jazida que arabo de mencionar encon-trava-se nasda via ferrealnao longe do pontoterminal que elaemPilrto na margemesquerda do Rio Paraguai.Ponco tenho a dizer dessa viagem cansativa; a estradadeferronoslevavaprimeiro aBanru, emplenazonapioneira;af se tomava 0"noturnolJde MatoGrosso, queatravessava 0sui doestado. Nototal, 3diasdeviagemnumtremdelenha,correndo a fraca velocidade, parando a todo instante e lon-garnente, para tomar lenha. Os vag5es eram tambern demadeira e bastante desconjuntados; pela manha, tinha-se 0rosto recoberto duma pelfcula de argila endurecida, formadapela fina poeira vermelha do sertiio, insinuando-se emcadaruga e emcada poro. 0 vagao-restanrante jii se mostravafiel aoestiloalimentar dointerior: carnefresca ousecalCOQ-formea ocasHio, arrozefeijaopreto, el paraabsorver0 caldo,renplAl168C. LEVI-STRAUSSTBISTES TB6PlOOS 169tarinha: polpa de milho ou de mandioca fresca, desidratadapelo calor e maida emp6 grosseiro, enfim, a sempiterna so-bremesa brasileira, fatia de marmelada ou de goiabada, comqueijo. Emeada as guris vendiampor alguns t08-toes abacaxis suculentos, de polpa amarela, que proporciona-vamurn refrescoprovidencial.Entra-se noEstadode MatoGrossopoucoantes da esta- de Tres Lagoas, atravessando 0 Rio Parana, tao vastoque, apesar das chuvas ja 0 fundo ainda apareceem muitos lugares. Em seguida,a paisagem quese me tornara ao mesma tempo familiar, insuportavel e io-dispensavel durante os aDOS de viagempelo interior, porqueela caracteriza 0 Brasil central desde 0 Paranli ate a baciaamazOoica: planicies 8em forma ou fracamente onduladas;horizontes longfnquoS, capoeirenta, e, de vez emquando, rebanhos de zebus que debandamapassagem. dotrern. Muitos viajantes cornetern urn contra-senso, traduZllldoMato Grosso por "grande floresta": a palavra floresta setraduz pelo ferninino mata, enquanto 0 masculino exprimeo aspecto complementar da paisagem sui-americana. MatoGrosso e, pois, exatarnente, "grande mato"; e nenhumpoderia ser mais aproprladoa essa regUloselvageme triste,mas cRiarnonotonia apresenta qualquer coisa de grandiosoede exaltante.EverdadequetamMmtraduzoBerUlopor malo. 0 tern uma conotao urn pouco diferente. Mato se refere aurn carater objetivo da paisagem, emseu contraste comafloresta; enquanto que sertao se refere a urn aspecto subje-tivo: a paisagemcom ao hornern. 0 serttio designa,pois, 0 mato, mas opondo-oas terras habitadas e cultivadas:sao as regiOes emque 0hornern naopossui dura-donra. Agfria colonial francesa fornece, talvez, urn equiva-lente exato com"bled".Por 0 pianaltoseinterrompepara dar lugar a urnvalearborizado, herboso, quaserisonhosob0ceuleve. EntreCampo Grande e Aquidauana, uma fratura mais profundamostra os penhascos reluzentes da Serra do Maracaju, cujasgargantasjli abrigamurngarimpo. Eis entaoquetudomuda.PassandoAquidauana, entra-senopantanal: maiorpantanodo mundo, que ocupaa bacia media doRioParaguai.Vista de aviilo, essa regiilo de rios serpenteandoatravesdas terrasplanasmostra 0 espetliculodearcosedemeandrosemque as liguas jazemestaguadas. 0 proprio leito do rioaparece rodeado de curvas leves, como sea natureza tivessehesitado antes de Ihe dar 0 seu atual e temporliriosolo, 0 pantanal torna-se uma paisagemonirica emqueos rebanhos de zebus se refugiamcomo emarcas flutuantesnocimodas colinas; enquanto, noscharcossubmersos, bandosde grandes passaros: flamingos, gavioes,guarazes,formamilhas compactas, brancas e r6seas, menos plumosasqueas frondes emlequedas palmeiras carandaquesecretamnas suas fOlhas umacera preciosa, e cujos bosques dispersossao os unicos a quebrar a perspectiva falsamente risonhaMsse deserto aqulitico.o lugubre POrto Esperan::>ue::>IE nenbEJeljT;0 owo::>,;oj w, eplfl W ;} 'IE!:);}I. J,nbjenbj'reJU;}WE:I'puel\! "!l.U;}WE:lUd,il '01e1'0II;;>:) 01u;n.uj"ESUl 'p51peplUESU!'SU! epl'OlJ,dSE51:sed'pep!'mb,wmsldsu!OlUlJ 'peplUl:cebidos na fazenda, onde se hospedavam famflias inteiras,em troca dos sens objetos. Ate onde foi essa intimidade?Seria bemdificil admitir que solteiros, aprendendo a conhe-pudessemresistir aosatrativos dasmocinhas indigenas,semi-nuas nos dias defesta, com0 corpopacientementedeco-radodefinas volntas negras onazuis quepareciamconfundirumabainhadefinarendacomasuapele. Dequalquermodo,foi por volta de 1944 ou 1945, creio eu, que Don Felix foiabatidopor umdos seus novOS familiares, talvez menos viti-rna dos indios que da perturba\;lioemque 0 mergulhara dezanos antes, a visita deetn6grafosestreantes.oarmazemda fazenda nos forneeia viveres: carne seea,arroz, feijao prHo, farinha de mandioca, mate, cafe' e rapa-dura. Emprestavam-nos, tambem, as montarias: cavalos paraos homens, bois paraas bagagens, pois carreg.'ivamos urnma-terial detrocaemvistadas a reunir: brinquedos, co-lares demissanga, espelhos, braceletes, aneis eperfumes; en-fim, pef;asde fazenda, cobertores, roupaseinstrumentos, Tra-balhadores da fazenda nos serviriamde guias, bern contra avontade, de resto, pois iamos arranca-Ios de suas familiasduranteas festas doNatal.Eramos esperados nas aldeias; desde a nossa chegada aFazenda, vaqueiros indios tinham partido para anunciar avisita de estrangeiros portadores de presentes. Essa perspec-tiva inspirava aos indigenas inquietudes diversas, entre asquaisdominavaadequevinhamos"tomarconta", apossar-nosde suas terras.176C. LEVI-STRAUSSII,XIXN ALIQUENalique, capital da reglaocaduveo, encontra-sea 150 qUi-lOmetros, mais ou menos, de Guaicurus, ou sejam, 3dias acavalo. Quantoaos bois decarga, VaGadiante, emrazao desua mareha mais lenta. Como primeira etapa, proplinhamo-nos subir a Serra Bodoquena e passar a noite no planalto,no liltimo p6sto da fazenda. Rapidamente metemo-nos emvales estreitos, eheios de capimalto, onde os cavalos a custoconseguemabrir passagem. Amareha se torna ainda maislaboriosa em eonseqiiencia da lama dos charcos. 0 eavaloperdepe, luta, retoma de qualquer jeitoeondepedea terrafirme, e de novo nos encontramos rodeados deeuidado, entao, paraquealgumafolha, inocentenaaparencia,nao derrame 0 ovo fervilhante formado por urn enxame decarrapatos abrigados na parteinferior; os mil biehinhos ala-ranjados se insinuamsob a roupa, cobrem0 eorpocomoqueaeumat?alha fluida eseincrustram: paraa vitima, 0 tinieoremedioevence-Ios nacorrida, saltandodocavaloesedespo-jandode tMa a roupa para baM-los vigorosamente, enquantourn eompanheiro escrutara a sua pele. Menos catastr6fieos,os grandes earrapatos solitarios, cinzentos, fixam-se semdora epiderme;descobrem-se ao taeto algumas horas ou alguns diasmais tarde, transformados em bolotas integradas ao corpoe que e necessarioarrancar a maooua faca.Enfim, a eapoeira se aelara, dando lugar a urn caminhopedrento que eonduz, emleve descWa, ate uma floresta seeaemque se misturamas iirvores e os cactus. Atempestade,que desde manha se preparava, cai no momento em quecontornamos urn pica eri!:ado de caetaeeas. Desmontamos eproeuramos urn abrigo numa fenda que e na realidade umagruta timida, mas protetora. Mal entramos, ela se enche dozumbido dos morcegos que atapetamas paredes e cujosonoviemos perturbar.:-;;'U SOlU;;'l1: 11llsodOldI.8'1" '1:UEI T[EnbElE!J1OWOJEl:Dl UT, HUT' l,nb[enb':'relU;;'wE: '1'u;;'w1::JU;},I J;}J OlU;;,W:.t1:SU! ;;,p51?EP!U1:5U!SU! ',OlJ;}dse51:,..d:mb'UTlllsil!dsUl Olm jU;;,llO:J51: (h''''l 'p (iOA ,IJlD E OliO'opI,

tI178 o. LEVI-STBAUSS TBISTES TR6PICOS 179Logoquea chuva termina, retomamos a caminhadanumafloresta esp;ssaeeseura, cheia decheiros frescos edefrutasselvagens: 0 genipapo, decarnadurarobustaedesabor acido;a guavira das clareiras, que tern ade, coma suapolpaeternamentefria, desalterar 0 viajante, OU0cajn, reve-ladoresdeantigasplanta:oJ111' "PIjl1l, 'j"D"J,nbrmb'fEJU;)W 'puBlll '(',U;)WtOU;)11'01"]'0 .1;;1:::> oJU;)W""SU!'P se'"pm"su! 1SU!"P lOJ:::&