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    Caderno deReferncia de

    Contedo

    1. INTRODUO

    Como voc poder observar, nesta parte, denominada Ca-derno de Referncia de Contedo, encontraremos o referencial te-rico das quatro unidades em que se divide a presente disciplina.

    Com o estudo deste componente curricular, voc ter opor-tunidade e instrumental terico para analisar por que o conheci-

    mento cientfico, muitas vezes em detrimento de outras formas deconhecimento, to valorizado na civilizao ocidental.

    Para tanto, analisaremos os conceitos de indutivismo, falsifica-cionismo e relativismo. Filsofos como David Hume, Rudolf Carnap eKarl Popper nos ajudaro a compreender esses conceitos, bem comoa expandir nosso horizonte de investigao, com novos questiona-

    mentos que certamente contribuiro para uma boa formao filos-fica.

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    Abordaremos as diferenas e semelhanas entre as formasde se pensar a cincia, alm dos pressupostos de cada uma dessasteorias.

    Finalmente, discutiremos as relaes entre tica, cincia e

    ideologia, para discutirmos de forma crtica a suposta neutralidadedo conhecimento cientfico.

    Esperamos que este programa possa atender s suas expec-tativas em conhecer e aprofundar os estudos sobre a aplicao dosconhecimentos provindos desta disciplina.

    Bom estudo!

    2. ORIENTAES PARA O ESTUDO DA DISCIPLINA

    Abordagem Geral da Disciplina

    Neste tpico, apresenta-se uma viso geral do que ser es-tudado nesta disciplina. Aqui, voc entrar em contato com osassuntos principais deste contedo de forma breve e geral e ter

    a oportunidade de aprofundar essas questes no estudo de cadaunidade. Desse modo, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe oconhecimento bsico necessrio a partir do qual voc possa cons-truir um referencial terico com base slida cientfica e cultural

    para que, no futuro exerccio de sua profisso, voc a exera comcompetncia cognitiva, tica e responsabilidade social. Vamos co-mear nossa aventura pela apresentao das ideias e dos princ-

    pios bsicos que fundamentam esta disciplina.

    Desde o advento da modernidade o conhecimento cientfi-co adquiriu uma importncia fundamental nas sociedades ociden-tais. Esta modalidade de conhecimento, desde ento, se apresentacomo superior s demais formas de conhecimento produzidas pelohomem. A cincia parece ser de um tipo superior ao conhecimen-

    to religioso, artstico, mtico de senso comum, filosfico. Podemosconstatar esse fato a partir de alguns exemplos corriqueiros.

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    Quando se discute determinada questo comum invocara cincia como suporte para os argumentos apresentados. Dizer,em meio a um debate, isto est provado cientificamente, de ummodo geral, acaba com qualquer discusso. Tende-se a no discu-tir com a Cincia. Podemos perceber, tambm, que muitas reasde estudo so descritas como cincias por seus defensores, o quesugere um esforo para demonstrar que os mtodos usados so

    to firmemente embasados e to potencialmente frutferos quan-to os de uma cincia tradicional como a fsica. Segundo Chalmers(1993, p. 18), falar de Cincia Poltica e Cincias Sociais so agoralugares comuns.

    So verdadeiras as afirmaes Todo ser humano um cien-tista por natureza e Cincia a base do futuro? As outras for-mas de conhecimento no dispem de um ministrio. To pouco comum ver incentivos dessa natureza aquisio de conhecimen-tos mitolgicos, religiosos ou filosficos.

    Outros exemplos poderiam ser aduzidos. No entanto, pare-ce que poucos discordariam de que h uma crena generalizada

    na sociedade de que o mtodo cientfico nos garante um conheci-mento seguro e confivel.

    A filosofia, como um pensar crtico e radical sobre as ques-tes fundamentais do ser humano, no poderia deixar de refletirsobre esse tema. preciso buscar respostas a respeito do porquo conhecimento cientfico ser to valorizado, se essa valorizaotem sua razo de ser, bem como o seu papel na sociedade. Vere-

    mos que ao longo da histria algumas tentativas foram feitas paracaracterizar esse intrigante mtodo. Acompanhando a classifica-o de Chalmers (1993) podemos dizer que as explicaes tradicio-nais do que seja a cincia so de cunho indutivista, falsificacionistae relativista. Comearemos nossa exposio sobre o mtodo cien-tfico com a explicao indutivista da cincia.

    Uma viso comum que temos da cincia pode ser descrita daseguinte forma:

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    Conhecimento cientfico conhecimento provado. As teo-rias cientficas so derivadas de maneira rigorosa da obteno dosdados da experincia adquiridos por observao e experimento. Acincia baseada no que podemos ver, ouvir, tocar. Opinies oupreferncias pessoais e suposies especulativas no tm lugar nacincia. A cincia objetiva. O conhecimento cientfico conheci-mento confivel porque provado objetivamente. Podemos dizer

    que o indutivismo uma explicao do conhecimento cientficoque procura oferecer um maior rigor a essa concepo comum decincia. uma explicao que enfatiza o papel do raciocnio indu-tivo na obteno do conhecimento cientfico.

    A induo o raciocnio que nos permite partir de obser-vaes particulares para afirmaes gerais por meio de um pro-cesso conhecido por generalizao. Por exemplo: da observaofrequente de que a gua ferve a 100C, podemos generalizar afir-mando que toda vez que aquecermos a gua com a mesma tem-

    peratura ela ferver. Ou, o fato de o sol nascer todos os dias, gene-ralizamos dizendo que o sol nascer todos os dias.

    Esse tipo de explicao da cincia parece ser bem objeti-vo, visto que procura limitar as opinies e preferncias do sujeitoatendo-se somente aos fatos e experincias. Isto talvez explique,em parte, porque este conhecimento to valorizado.

    A cincia o conhecimento que procura obter leis gerais.Assim, podemos resumir as teses indutivistas da seguinte maneira:

    A cincia comea com a observao; A observao fornece uma base segura para a cincia.

    Voc, como estudante atento, j deve ter antevisto a seguintequesto: Se a cincia comea com a observao e as observaesgeram apenas proposies particulares, de que forma podemosobter as proposies universais que so o objetivo da cincia?.

    O indutivista responder que essa passagem garantidapelo processo de induo.

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    Obviamente, existem algumas regras que procuram garantirque essa passagem seja segura. Todos devem concordar que nopodemos dizer que todos os polticos so honestos tomando comobase apenas um nico poltico honesto.

    Para escapar dessa dificuldade, os indutivistas, de acordocom Chalmers (1993), propem trs condies como necessriaspara que a induo seja legitimada:

    1) o nmero de proposies de observao que forma abase da generalizao deve ser grande;

    2) as observaes devem ser repetidas sob uma ampla va-riedade de condies;

    3) nenhuma proposio de observao deve conflitar coma lei universal derivada.

    A primeira condio importante, pois, do contrrio, po-deramos sustentar que todos os livros so grandes com base emapenas um livro observado, ou, como no exemplo citado, concluir

    que todos os polticos so honestos.

    Para demonstrar como a segunda condio tambm fun-

    damental, observe o exemplo: suponha que estejamos testandouma vacina para curar uma determinada doena. Alm de testar-mos em uma grande quantidade de pessoas devemos verificar seo resultado o mesmo em homens e mulheres, negros e brancos,altos e baixos, diabticos e no diabticos, hipertensos e no hi-pertensos. Observando esse procedimento, existem mais garan-tias de que a generalizao seja segura.

    J a terceira condio impede que o cientista efetue a gene-ralizao se existe uma proposio de observao que contraditaa lei.

    Com as condies anteriormente satisfeitas os cientistas po-dem aplicar com segurana o mtodo indutivo que a generalizaoser segura. Aparentemente a descrio que oferecemos do indu-

    tivismo parece ser a descrio adequada do mtodo cientfico. Noentanto, nem todos os filsofos e cientistas compartilham dessa

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    caracterizao. Antes de apresentarmos as vises falsificacionistase relativistas da cincia, que so crticas dessa viso, vejamos umacrtica severa ao mtodo indutivo que a tradio filosfica batizoude problema da induo.

    Como dissemos anteriormente, para o indutivista o racioc-nio indutivo fundamental para adquirimos conhecimento cien-tfico. Esse mtodo, porm, foi duramente atacado no sculo 17

    pelo filsofo David Hume.

    Hume defendia que a fonte de todo conhecimento a expe-rincia e demonstrou de forma categrica que a induo no podeser justificada com apelo experincia. O argumento comumente

    utilizado para validar a induo mostra-se circular, pois, em linhasgerais, sustenta que, como a induo se revelou bem sucedida emnumerosos casos, pode-se concluir que ela sempre funcionar.Mas isso no nada mais do que usar a induo para justificar ainduo. Essa dificuldade de justificar o raciocnio indutivo ao

    longo da histria ficou conhecida como problema da induo.

    Do ponto de vista lgico, sabemos que a induo no podeser justificada. Isso porque no h contradio envolvida se a pre-missa de um argumento indutivo ser verdadeira e a concluso fal-sa. Tomemos como exemplo o seguinte argumento:

    No dia anterior a eleio, uma pesquisa mostrou que acandidata Maria Margarete tinha 80% das intenes devoto.

    Portanto, no dia da eleio, 80% dos eleitores votaram emMaria Margarete.

    Mesmo que a premissa do argumento seja verdadeira, no hnada que garanta a verdade da concluso. No existe nenhuma con-tradio em assumir a verdade da premissa e a falsidade da conclu-so. Como voc j estudou em Lgica I, argumentos indutivos noso vlidos ou invlidos como os dedutivos. Eles somente podemser fortes ou fracos. Ter uma maior ou menor probabilidade.

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    Essa crtica coloca uma dificuldade sria para o programa in-dutivista, porm no o refuta completamente.

    Antes de finalizar a primeira parte dessa exposio, impor-tante mencionar alguns dos indutivistas de quem temos falado.

    Esses so os positivistas lgicos que ganharam fora em Viena emmeados da dcada de 20 e 30 do sculo passado e que so her-deiros da filosofia empirista que floresceu no sculo 17. A filosofia

    empirista, como j observamos, tem como tese central que a nicafonte de conhecimento a experincia.

    Os principais representantes, embora com diferenas, soAlfred Ayer, Rudolf Carnap, Otto Neurath e Moritz Schilick. Os

    positivistas lgicos sustentam que a metafsica e a religio nomerecem ser chamados de conhecimento, pois no podem serverificados pela experincia ao contrrio da cincia. So, no dizerdeles, pseudoconhecimentos. A superioridade da cincia sobreas outras formas de conhecimento o corolrio desse tipo de con-

    cepo. O que nos faz retornar ao comeo dessa apresentao.

    Com essa breve exposio do tema, terminamos a primeiraparte da apresentao da disciplina. A seguir, faremos uma refle-xo sobre as teses falsificacionistas e relativistas e da cincia.

    Falsificacionismo e Indutivismo

    Vimos que o conhecimento cientfico muito valorizado emnossa sociedade e as teses indutivistas a respeito da cincia. Para

    dar continuidade nossa reflexo, veremos a descrio falsifica-cionista e, em seguida, as teses relativistas.

    O programa falsificacionista tem como principal represen-tante o filsofo Karl Popper. Em sua obra A Lgica da PesquisaCientfica, Popper expe com clareza sua metodologia.

    Popper no est satisfeito com o relato indutivista da cin-cia. Alis, o filsofo sustenta que a cincia no precisa de induo.

    Para ele, a cincia um conjunto de hipteses que procuram expli-car de forma satisfatria algum comportamento do mundo ou do

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    universo. Porm, esse conjunto de hipteses - para ser considera-do cientfico - deve ser falsificvel.

    O que, no entanto, Popper quer dizer ao sustentar que umsistema cientfico de ser falsificvel? Quer dizer que as proposies

    que compem o corpo da teoria devem ser passveis de testes, ouseja, devem poder ser falsificadas pela experincia. Por exemplo, aproposio ou est calor ou no est calor no pode ser falsifica-da, visto que verdadeira independente de como esteja o tempo,e como tal no tipo de proposio que deve ser admitida pelacincia. A proposio todos os corpos so extensos tambm nopode ser falsificada visto que a extenso faz parte da definiode corpo. Ao passo que a proposio hoje est chovendo umaproposio emprica, visto que pode ser falseada se no estiverchovendo bem como a proposio todos os planetas se movemem elipses em torno do sol. Basta que exista um planeta que nose mova em elipse em torno do sol para que a lei seja falseada.

    Popper sustenta que as teorias cientficas, para merecer essenome, devem resistir aos testes da experincia. Quanto mais a te-

    oria for falsificvel melhor ela ser, visto que, de acordo com os fal-sificacionistas, as teorias falsificveis apresentam maior contedoinformativo sobre o mundo.

    Para Popper, a cincia progride por tentativa e erro. No pode-mos dizer que o conhecimento cientfico de que dispomos segura-mente verdadeiro. Podemos dizer que nossas leis e teorias cientfi-cas so as que descrevem melhor o universo at o momento em que

    sejam falsificadas e substitudas por outra teoria mais satisfatria.Nesse sentido, as teorias so provavelmente verdadeiras.

    O programa falsificacionista de Popper oferece uma solu-o para o problema da induo visto que nessa metodologia ainduo no tem lugar. O programa tambm parece satisfatriono que tange a definio de cincia. Entretanto, como no poderiadeixar de ser, essa metodologia tambm foi alvo de crticas. Para

    apresentar essas crticas, vejamos a posio relativista no que dizrespeito cincia.

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    De forma sinttica, podemos dizer que o relativismo uma

    posio terica que nega a existncia de um padro de racionali-

    dade universal e a-histrico segundo o qual seja possvel avaliar se

    uma teoria melhor que a outra.

    O principal representante da posio relativista ThomasKuhn. Em sua obraA Estrutura das Revolues Cientficas, oferece

    uma descrio da cincia alternativa ao relato indutivista e falsifi-

    cacionista.

    Kuhn crtico do indutivismo e do falsificacionismo, porque,

    em sua viso, esses relatos no esto de acordo com a histria da

    cincia. O relato que prope procura levar em considerao essa

    histria.

    Kuhn sustenta que a atividade cientfica orientada sempre

    pelo que ele chama de paradigma. Um paradigma formado por

    suposies de ordem geral e leis que uma determinada comunida-

    de cientfica aplica. o quadro terico de referncia dos cientistas.

    Um paradigma que suporta a tradio da cincia normal a carac-

    terstica que distingue a cincia da pseudocincia. Se determinadoramo de conhecimento no possuir um paradigma no pode ser

    classificado como cincia. Os cientistas que trabalham de acordo

    com um determinado paradigma praticam o que Kuhn chama de

    cincia normal.

    A cincia normal tende atrair a maior parcela dos cientistas.

    Isso no quer dizer, entretanto, que no existam dificuldades nos

    programas cientficos. Existem, de um modo geral, muitos proble-

    mas em aberto. Compete comunidade cientfica que adere ao

    paradigma, resolver essas dificuldades. Quando os problemas co-

    meam a fugir do controle, ou seja, o paradigma no consegue

    oferecer solues para as anomalias, temos o que Kuhn chama de

    crise. A crise s resolvida quando um paradigma inteiramente

    novo surge e atrai um nmero considervel de cientistas at o pon-to de o paradigma anterior ser abandonado.

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    Esse processo de mudana Kuhn chama de revoluo cien-tfica. O novo paradigma torna-se ento cincia normal e de novoser acometido por dificuldades insuperveis e, assim, o processosegue indefinidamente garantindo o progresso da cincia. Nisso,consiste o relativismo de Kuhn e sua principal crtica ao falsificacio-nismo e ao indutivismo. Essas metodologias, na viso de Kuhn, noresistem ao teste da histria da cincia por tentar oferecer uma

    descrio universal e a histrica, ou seja, uma definio de cinciaque seja vlida em todos os tempos e lugares.

    A caracterizao da atividade cientfica descrita por Kuhnprocura respeitar a histria da cincia, porm no se limita apenas

    a uma mera descrio do que os cientistas fazem.Alm da posio relativista de Thomas Kuhn importante

    conhecermos o relativismo de Paul Feyerabend, que foi um dosfilsofos da cincia mais intrigantes do sculo 20. Insatisfeito comos relatos tradicionais da cincia, bem como da pretenso desses

    relatos de fazer do conhecimento cientfico um conhecimento su-perior s demais formas de conhecimento, Feyerabend sustenta

    uma teoria que batizou de anarquismo epistemolgico em suaprincipal obra Contra o Mtodo: Esboo de uma Teoria Anrquicado Conhecimento.

    Feyerabend considera que as metodologias tradicionais dacincia procuram explicar a cincia por meio de regras fixas e imu-tveis, o que no seu entender, e no de Thomas Kuhn como vimos, uma pretenso v.

    Como as metodologias tradicionais falharam em forneceruma descrio adequada da cincia, Feyerabend proclama que anica regra que deve orientar a atividade dos cientistas o valetudo. Obviamente Feyerabend no est dizendo que qualquercoisa pode ser feita pelos cientistas. Ele sustenta que as metodo-logias tradicionais no podem fornecer regras que orientam as es-

    colhas dos programas cientficos pelos cientistas. nesse sentidoque o seu vale tudo deve ser interpretado.

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    Ele tambm crtica as metodologias tradicionais da cinciapor pressuporem sem nenhuma argumentao que a cincia uma forma de conhecimento superior aos outros tipos de conhe-cimento. Vejamos uma passagem de Contra o mtodopara ilustraresse ponto:

    Tendo terminado sua reconstruo da cincia moderna, ele(Lakatos) a dirige contra outros campos como j houvesse sido es-tabelecidoque a cincia moderna superior mgica ou cinciaaristotlica e que no possui resultados ilusrios. No h contudo,sequer uma sobra deste tipo de argumento. Reconstrues racio-nais tomam como dado a sabedoria cientfica bsica, elas nodemonstramque isto melhor que a sabedoria bsica dos bruxose das feiticeiras (CHALMERS, 1993, p. 167).

    Imre Lakatos, a quem Feyerabend se refere, um adepto dofalsificacionismo popperiano, embora com algumas modificaes.

    Podemos depreender que de modo algum, para Feyerabend,a superioridade do conhecimento cientfico est estabelecida.Para tanto, devem ser apresentados argumentos que sustentem

    essa pressuposio. Tal empreitada, entretanto, no aparece nasmetodologias tradicionais da cincia e nem de longe uma tarefasimples. Feyerabend argumenta que para comparar formas de co-nhecimento diferentes preciso investigar essas formas em seusprprios termos. Dizer, por exemplo, que conhecimento religioso inferior ao conhecimento cientfico porque no segue as regrasda cincia no passa de puro preconceito. Faz-se necessrio inves-tigar a natureza, o mtodo e o objetivo do conhecimento religiosopara, ento, se for necessrio comparar com o conhecimento cien-

    tfico.

    Mesmo que uma comparao como essa seja levado a cabono teremos condies de decidir sem apelo subjetividade deacordo com Feyerabend qual forma de conhecimento melhor.Isso porque esses conhecimentos so incomensurveis, ou seja,possuem mtodos e objetivos diferentes, e, dessa forma, no po-

    dem ser avaliados sob a perspectiva do conhecimento rival. Porexemplo, no podemos avaliar o conhecimento cientfico tendo

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    como base a perspectiva metafsica e vice-versa. Assim, em ltimaanlise, a escolha entre as diferentes metodologias cientficas noescapa do elemento subjetivo.

    Como voc j deve esperar, a viso relativista da cincia tam-

    bm sofreu crticas. A crtica mais frequente ao relativismo seno dispusermos de uma caracterizao e um critrio de demarca-o seguro no seremos capazes de distinguir cincia da pseudoci-

    ncia ou do charlatanismo.

    Popper, um dos crticos mais severos do relativismo de Tho-mas Kuhn, sustenta que os relativistas confundem a noo de in-comensurabilidade com a impossibilidade de comparao entre

    teorias. Esse equvoco, segundo Popper, causado pelo mito docontexto.Esse mito pode ser enunciado da seguinte maneira:

    Uma discusso racional e frutuosa impossvel a menosque os participantes partilhem um quadro de referncia

    comum de afirmaes de base ou, no mnimo, se tenhamposto de acordo sobre tal quadro de referncia para per-mitir a discusso.

    No entendimento de Popper, essa posio coloca em chequeno somente a cincia mais a racionalidade do Ocidente, visto quese esse mito for verdadeiro a verdade varia de cultura para cul-tura e de perodo histrico para perodo histrico, pois, como vi-mos no enunciado, os relativistas sustentam a impossibilidade decomparao e de comunicao entre grupos que no partilham os

    mesmos pressupostos. Essa tese inaceitvel para Popper, pois oconhecimento cientfico na verso relativista no vai gradualmen-te se aproximando da mais fiel representao da natureza.

    Essas breves reflexes sobre a definio do conceito de cin-cia cobrem, de um modo geral, as respostas que a tradio filos-fica ofereceu durante a modernidade. importante ressaltar que,embora os programas da cincia aqui expostos tenham seguido

    uma ordem cronolgica, eles no garantem a superioridade de umprograma sobre o outro. No se pode pensar, tambm, que com o

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    advento do falsificacionismo, o indutivismo tenha acabado e queo surgimento do relativismo tenha substitudo o falsificacionismo.Os paradigmas, para usar o termo de Kuhn, convivem. O que po-demos dizer que esses modelos tm maior ou menor apoio dacomunidade cientfica.

    Esperamos que, com esta viso geral da disciplina, voc te-nha conseguido assimilar os conceitos necessrios para o desen-

    volvimento de suas atividades acadmicas e que, ao final destaabordagem, voc esteja olhando para a disciplina de forma maistranquila. Desejamos bons estudos!

    Glossrio de ConceitosO Glossrio de Conceitos permite a voc uma consulta rpi-

    da e precisa das definies conceituais, possibilitando-lhe um bomdomnio dos termos tcnico-cientficos utilizados na rea de co-nhecimento dos temas tratados na disciplina Filosofia da Cincia.Veja, a seguir, a definio dos principais conceitos desta disciplina:

    1) Crise: conceito utilizado por Thomas Kuhn para caracte-

    rizar as graves anomalias que colocam em risco o para-digma no qual trabalham a maioria dos cientistas.

    2) Deduo: argumentos que preservam a verdade. Nessamodalidade de argumento, pretende-se que a verdadedas premissas seja transferida para a concluso.

    3) Empirismo: filosofia que sustenta que a fonte principalde nosso conhecimento a experincia. Desenvolvidanos sculos 17 e 18 por pensadores como John Locke,George Berkeley e David Hume.

    4) Falsificacionismo: teoria desenvolvida por Karl Popperpara explicar a maneira pela qual o conhecimento cien-tfico se desenvolve. Insatisfeito com o relato indutivistada cincia que sustenta a verificabilidade como critriode demarcao entre a cincia e a pseudocincia, Popperafirma que, para as teorias serem consideradas cientfi-

    cas, devem poder ser falsificadas.

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    5) Indutivismo: metodologia que sustenta que o conheci-mento cientfico obtido fundamentalmente por meiodo raciocnio indutivo. Dito de outra maneira, no h co-nhecimento cientfico sem induo.

    6) Neutralidade Cientfica: ideologia que sustenta que o

    conhecimento cientfico est preocupado somente coma verdade e o bem estar da sociedade sem depender ouse preocupar com interesses sociais, polticos e econ-micos.

    7) Paradigma: conceito elaborado por Thomas Kuhn paranomear o conjunto de pressupostos que uma determi-nada comunidade cientfica compartilha orientando,desse modo, o seu trabalho.

    8) Relativismo: posio terica que nega a existncia deum padro de racionalidade universal e a-histrico se-gundo o qual seja possvel avaliar se uma teoria cientifi-ca melhor que a outra.

    Esquema dos Conceitos-chave

    Para que voc tenha uma viso geral dos conceitos mais im-

    portantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um Es-quema dos Conceitos-chave da disciplina. O mais aconselhvel que voc mesmo faa o seu esquema de conceitos-chave ou atmesmo o seu mapa mental. Esse exerccio uma forma de vocconstruir o seu conhecimento, ressignificando as informaes apartir de suas prprias percepes.

    importante ressaltar que o propsito desse Esquema dos

    Conceitos-chave representar, de maneira grfica, as relaes entreos conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais com-plexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar voc na or-denao e na sequenciao hierarquizada dos contedos de ensino.

    Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-seque, por meio da organizao das ideias e dos princpios em esque-mas e mapas mentais, o indivduo pode construir o seu conhecimen-

    to de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedaggicossignificativos no seu processo de ensino e aprendizagem.

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    Aplicado a diversas reas do ensino e da aprendizagem es-colar (tais como planejamentos de currculo, sistemas e pesquisasem Educao), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda,na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es-tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilao de novosconceitos e de proposies na estrutura cognitiva do aluno. Assim,novas ideias e informaes so aprendidas, uma vez que existem

    pontos de ancoragem.

    Tem-se de destacar que aprendizagem no significa, ape-nas, realizar acrscimos na estrutura cognitiva do aluno; preci-so, sobretudo, estabelecer modificaes para que ela se configure

    como uma aprendizagem significativa. Para isso, importante con-siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiaisde aprendizagem. Alm disso, as novas ideias e os novos concei-tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vezque, ao fixar esses conceitos nas suas j existentes estruturas cog-

    nitivas, outros sero tambm relembrados.

    Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que

    voc o principal agente da construo do prprio conhecimen-to, por meio de sua predisposio afetiva e de suas motivaesinternas e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem porobjetivo tornar significativa a sua aprendizagem, transformandoo seu conhecimento sistematizado em contedo curricular, ouseja, estabelecendo uma relao entre aquilo que voc acaboude conhecer com o que j fazia parte do seu conhecimento de

    mundo (adaptado do site disponvel em: .Acesso em: 11 mar. 2010).

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    Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave da disciplina Filosofia da Cincia.

    Como pode observar, esse Esquema oferece a voc, como

    dissemos anteriormente, uma viso geral dos conceitos mais im-

    portantes deste estudo. Ao segui-lo, ser possvel transitar entreum e outro conceito desta disciplina e descobrir o caminho para

    construir o seu processo de ensino-aprendizagem. Por exemplo,

    para entender o conceito de falsificacionismo preciso entender

    o indutivismo e o conceito de induo; sem o domnio conceitual

    desse processo explicitado pelo Esquema, pode-se ter uma viso

    confusa do tratamento da temtica do ensino de Filosofia propos-

    to neste CRC.

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    O Esquema dos Conceitos-chave mais um dos recursos de

    aprendizagem que vem se somar queles disponveis no ambien-

    te virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como

    queles relacionados s atividades didtico-pedaggicas realiza-

    das presencialmente no polo. Lembre-se de que voc, aluno EaD,deve valer-se da sua autonomia na construo de seu prprio co-

    nhecimento.

    Questes Autoavaliativas

    No final de cada unidade, voc encontrar algumas questes

    autoavaliativas sobre os contedos ali tratados, as quais podem ser

    de mltipla escolha, abertas objetivasou abertas dissertativas.

    Responder, discutir e comentar essas questes, bem como re-

    lacion-las com a prtica do ensino de Filosofia pode ser uma forma

    de voc avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a resoluo de

    questes pertinentes ao assunto tratado, voc estar se preparando

    para a avaliao final, que ser dissertativa. Alm disso, essa uma

    maneira privilegiada de voc testar seus conhecimentos e adquiriruma formao slida para a sua prtica profissional.

    Voc encontrar, ainda, no final de cada unidade, um gabari-

    to, que lhe permitir conferir as suas respostas sobre as questes

    autoavaliativas de mltipla escolha.

    As questes de mltipla escolhaso as que tm como respos-ta apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se porquestes abertas objetivas as que se referem aos contedosmatemticos ou queles que exigem uma resposta determinada,inalterada. J as questes abertas dissertativasobtm por res-posta uma interpretao pessoal sobre o tema tratado; por isso,normalmente, no h nada relacionado a elas no item Gabarito.Voc pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seuscolegas de turma.

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    Bibliografia Bsica

    fundamental que voc use a Bibliografia Bsica em seus es-tudos, mas no se prenda s a ela. Consulte, tambm, as bibliogra-fias apresentadas no Plano de Ensinoe no item Orientaes para o

    estudo da unidade.

    Figuras (ilustraes,quadros...)

    Neste material instrucional, as ilustraes fazem parte inte-grante dos contedos, ou seja, elas no so meramente ilustra-

    tivas, pois esquematizam e resumem contedos explicitados notexto. No deixe de observar a relao dessas figuras com os con-

    tedos da disciplina, pois relacionar aquilo que est no campo vi-sual com o conceitual faz parte de uma boa formao intelectual.

    Dicas (motivacionais)

    O estudo desta disciplina convida voc a olhar, de formamais apurada, a Educao como processo de emancipao do ser

    humano. importante que voc se atente s explicaes tericas,prticas e cientficas que esto presentes nos meios de comunica-o, bem como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois,

    ao compartilhar com outras pessoas aquilo que voc observa, per-mite-se descobrir algo que ainda no se conhece, aprendendo aver e a notar o que no havia sido percebido antes. Observar ,portanto, uma capacidade que nos impele maturidade.

    Voc, como aluno do curso de Licenciatura em Filosofianamodalidade EaD, necessita de uma formao conceitual slida econsistente. Para isso, voc contar com a ajuda do tutor a dis-tncia, do tutor presencial e, sobretudo, da interao com seuscolegas. Sugerimos, pois, que organize bem o seu tempo e realize

    as atividades nas datas estipuladas.

    importante, ainda, que voc anote as suas reflexes em seu

    caderno ou no Bloco de Anotaes, pois, no futuro, elas podero serutilizadas na elaborao de sua monografia ou de produes cientficas.

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    29 Caderno de Referncia de Contedo

    Leia os livros da bibliografia indicada, para que voc amplieseus horizontes tericos. Coteje-os com o material didtico, discutaa unidade com seus colegas e com o tutor e assista s videoaulas.

    No final de cada unidade, voc encontrar algumas questes

    autoavaliativas, que so importantes para a sua anlise sobre oscontedos desenvolvidos e para saber se estes foram significativospara sua formao. Indague, reflita, conteste e construa resenhas,

    pois esses procedimentos sero importantes para o seu amadure-cimento intelectual.

    Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso namodalidade a distncia participar, ou seja, interagir, procurando

    sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores.

    Caso precise de auxlio sobre algum assunto relacionado aesta disciplina, entre em contato com seu tutor. Ele estar prontopara ajudar voc.

    3. REFERNCIA BIBLIOGRFICA

    CHALMERS, A. O que cincia afinal? So Paulo: Brasiliense, 1993.

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    EAD

    O Programa Indutivista

    da Cincia

    1. OBJETIVOS

    Conhecer o programa indutivista da cincia.

    Tomar contato com as crticas ao indutivismo.

    2. CONTEDOS

    Mtodo indutivo.

    Empirismo. Positivismo Lgico.

    Problema da induo.

    3. ORIENTAES PARA O ESTUDO DA UNIDADE

    Antes de iniciar o estudo desta unidade, importante que

    voc leia as orientaes a seguir:

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    1) Nesta unidade, estudaremos sobre o programa induti-vista da cincia, e para saber mais sobre o conceito dededuo sugerimos que consulte sua disciplina de Lgi-ca Iou leia a obra Introduo Lgicade Irving Copi.

    2) Para expandir mais seus conhecimentos, sugerimos que

    leia a Seo IV da obra Investigaes acerca do entendi-mento humano, de David Hume, na coleo Os Pensadores.

    3) Sugerimos, ainda, que leia os captulos 2 e 3 do livroO que cincia afinal?, de Chalmers, que o auxiliaronuma melhor compreenso do tema.

    4) Antes de iniciar os estudos desta unidade, pode ser inte-ressante conhecer um pouco da biografia dos pensado-res, cujas ideias norteiam o estudo desta disciplina. Parasaber mais, acesse os sitesindicados:

    Sir Alfred Jules Ayer (1910 - 1989)A perspectiva da inuente escola fundada no incio dosculo XX, conhecida como Crculo de Viena, foi a dopositivismo lgico. Seu expositor mais entusistico foi olsofo de Oxford, Alfred J. Ayer (nascido em 1910), par-ticularmente em sua obra popular Language, Thrut, andLgic(1936, rev. 1946).

    Ayer mantinha que qualquer declarao signicativa efactual deveria passar pelo critrio de vericao. Ayernunca formulou com sucesso o princpio, mas ele era algo

    que queria dizer que qualquer declarao signicativa em teoria vericvelpelaobservao, quer direta ou indiretamente. Com esta arma o lsofo poderia ago-ra puricar a discusso intelectual da metafsica e tica absurda (BAHNSEN,2011, p. 1). (Imagem disponvel em: http://www.hajosalfred.hu/data/alfred_ayer.JPG.

    Acesso em: 25 fev. 2012. Texto disponvel em: . Acesso em: 25 fev. 2012).

    Rudolf Carnap (1891 - 1970)Filsofo positivista alemo nascido em Wuppertal, con-siderado um dos expoentes do positivismo lgico. Alunode Gottlob Frege, um dos maiores lgicos de seu tem-po, com quem estudou matemtica, lgica e cincias f-sicas. Em 1926 juntou-se ao Crculo de Viena, grupo delsofos, matemticos e outros especialistas que se reu-nia para discutir temas ligados losoa e construiu suateoria do positivismo lgico (Imagem e texto disponveisem: . Acesso em: 25 fev. 2012).

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    33 O Programa Indutivista da Cincia

    Otto Neurath (1882 - 1945)No comeo do Sculo XX, o cientista social Otto Neurath(1882-1945) desenvolveu, com sua equipe, um tipo de sis-tema de linguagem pictrica chamada ISOTYPE (Interna-tional System of TYpographic Picture Education) que tevegrande inuncia sobre a forma como se projeta informa-

    o visualmente nos dias de hoje.Nos anos de 1920, Jan Tschichold e a Nova Tipograarevolucionaram o moderno design grco, criando novospadres de diagramao para indstria grca. Na mesmapoca, Otto Neurath iniciou suas experincias no mbitoda linguagem pictrica. Segundo Michael Twyman, emThe Signicance of ISOTYPE(1980), Otto Neurath umdos pioneiros do moderno design grco, pois o ISOTYPE

    fez para a linguagem pictrica o que a Nova Tipograafez para a linguagem verbal.Ou seja, Tschichold atualizou a tipograa para as necessidades do mundo moderno,enquanto Otto Neurath, e sua equipe, modernizaram a representao pictrica.

    O ISOTYPE teve grande repercusso em sua poca e inuenciou a linguagempictrica das geraes seguintes. No entanto, Neurath deixa claro em seus escri-tos que no pretendeu criar uma linguagem pictrica universal que substitusse arepresentao tipogrca da linguagem falada. Neurath considerava o ISOTYPEuma linguagem adicional. Para ele certas coisas no poderiam ser ditas apenascom palavras, com o auxlio da linguagem pictrica essas preposies poderiamser conguradas com mais clareza (TWYMAN, 1980) . (Imagem disponvel em:. Acesso em: 9 set. 2009. Texto disponvelem: . Acesso em: 25 fev. 2012).

    Moritz Schlick (1882-1936)Filsofo contemporneo, considerado o fundador, bemcomo um dos principais integrantes do Crculo de Viena.Nasceu em Berlim Doutorou-se em fsica na Universidadede Berlim, em 1904. Interessando-se por losoa, passoua investigar as bases do conhecimento cientco (Imagemdisponvel em: . Acesso em: 25 fev.2012. Texto disponvel em: . Acesso em: 25 fev. 2012).

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    4. INTRODUO UNIDADE

    Desde o advento da modernidade o conhecimento cientficoadquiriu uma importncia fundamental nas sociedades ocidentais.

    Essa forma de conhecimento, desde ento, apresenta-se comosuperior s demais formas de conhecimento produzidas pelo ho-

    mem.

    Quando se discute determinada questo comum invocara cincia como suporte para os argumentos apresentados. Dizer,em meio a um debate, "isso est provado cientificamente", de ummodo geral, acaba com qualquer discusso.

    Parece haver uma crena generalizada na sociedade de queo mtodo cientfico nos garante um conhecimento seguro e con-fivel. Alan Chalmers, em seu livro O que cincia afinal?, aborda

    essa questo da seguinte maneira:

    A alta estima pela cincia no est restrita vida cotidiana e m-dia popular. evidente no mundo escolar e acadmico e em todasas partes da indstria do conhecimento. Muitas reas de estudo

    so descritas como cincias por seus defensores, presumivelmen-te num esforo para demonstrar que os mtodos usados so tofirmemente embasados e to potencialmente frutferos quanto osde uma cincia tradicional como a fsica. Cincia Poltica e CinciasSociais so agora lugares comuns (1993, p. 18).

    Se Chalmers est correto em suas observaes e tudo indi-

    ca que est podemos tranquilamente indagar: qual a base paraessa crena no mtodo cientfico? O que esse mtodo tem de toespecial? Por que o conhecimento cientfico goza de tanto prest-gio em nossa sociedade?

    As questes anteriores so algumas das que investigaremosno decorrer dos estudos desta disciplina. A Filosofia, como umpensar crtico sobre as questes fundamentais do ser humano,no poderia deixar de refletir sobre o que caracteriza o conheci-

    mento cientfico, bem como o seu papel na sociedade. Veremosque, ao longo da histria, algumas tentativas foram feitas para ca-

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    racterizar o intrigante mtodo cientfico. Portanto, estudaremos,nesta unidade, o programa indutivista da cincia.

    Desse modo, convidamos voc, leitor, para iniciarmos nossajornada.

    5. INDUTIVISMO

    A explicao indutivista da cincia enfatiza o papel do racio-cnio indutivo na obteno do conhecimento cientfico. Para umaprimeira abordagem do indutivismo, recorremos novamente a

    Alan Chalmers:

    Conhecimento cientfico conhecimento provado. As teorias cien-tficas so derivadas de maneira rigorosa da obteno dos dados daexperincia adquiridos por observao e experimento. A cincia baseada no que podemos ver, ouvir, tocar etc. Opinies ou prefe-rncias pessoais e suposies especulativas no tm lugar na cin-cia. A cincia objetiva. O conhecimento cientfico conhecimentoconfivel porque provado objetivamente (1993, p.23).

    A viso exposta anteriormente representa uma concepo

    de cincia bem difundida em nossa sociedade. Podemos dizer quea explicao indutivista da cincia procura dar maior rigor a essaconcepo, valorizando a observao, o experimento e a objetivi-dade.

    Dizamos que, para o indutivista, o raciocnio indutivo temum papel fundamental para determinar o mtodo da cincia. Esseraciocnio permite-nos partir de observaes particulares para afir-

    maes gerais por meio da generalizao. Por exemplo: da obser-vao frequente de que a gua ferve a 1000C, podemos generalizarque toda vez que aquecermos a gua com a mesma temperaturaela ferver.

    As nossas observaes sempre nos geram proposies par-ticulares e, como vimos, para o indutivista, a cincia comea com

    a observao. As proposies de observao como: "est choven-do, Paulo tomou choque, "Neusa uma boa me" podem ser

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    facilmente verificadas por meio de observaes. Porm, a cinciano trabalha com afirmaes particulares, mas afirmaes univer-sais. A cincia trabalha com leis, que por definio so gerais. Porexemplo: os corpos esto sujeitos ao da gravidade. Como po-demos observar essa lei diz respeito a todos os corpos, e no a umcorpo particular.

    Voc, como estudante atento, j deve ter antevisto a questoa ser colocada: se a cincia comea com a observao, como sus-tentam os indutivistas, e as observaes nos geram apenas propo-sies particulares, de que forma podemos obter as proposiesuniversais que so o objetivo da cincia? Se voc est acompa-nhando bem o raciocnio do indutivista perceber que essa passa-gem garantida pelo processo de induo.

    A induo o raciocnio que permite passar de afirmaesparticulares para afirmaes gerais. Obviamente, existem algu-mas regras que procuram garantir que essa passagem seja segu-ra. Todos devem concordar que no podemos dizer que todos oshomens so violentos tomando como base apenas um nico ho-

    mem violento.De acordo com Chalmers (1993), so trs as condies ne-

    cessrias para que a induo seja legitimada pelos indutivistas:

    O nmero de proposies de observao que forma abase da generalizao deve ser grande.

    As observaes devem ser repetidas sob uma ampla va-riedade de condies.

    Nenhuma proposio de observao deve conflitar com alei universal derivada.

    A primeira condio importante, pois, do contrrio, poder-amos sustentar que todos os livros so grandes com base em ape-nas um livro observado, ou, como no exemplo citado, concluir quetodos os homens so violentos.

    A segunda condio visa a dar uma maior garantia ao pro-cesso de induo. Suponha que estejamos testando uma vacina

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    para curar uma determinada doena. Alm de testarmos em uma

    grande quantidade de pessoas, devemos verificar se o resultado

    o mesmo em homens e mulheres, negros e brancos, altos e bai-

    xos, diabticos e no diabticos, hipertensos e no hipertensos

    etc. Observando esse procedimento, h mais garantias de que ageneralizao seja segura.

    A terceira condio, por sua vez, impede que o cientista efe-

    tue a generalizao se existe uma proposio de observao que

    contradita a lei.

    Com essas condies satisfeitas os cientistas podem aplicar

    com segurana o mtodo indutivo, de acordo com os indutivistas,

    que a generalizao ser segura. Obtidas as leis universais os cien-

    tistas devem ser capazes de fazer previses. Para tanto, de posse

    das leis, as previses so feitas por meio de deduo. Mediante a

    deduo, os cientistas podem prever um eclipse solar, diagnosticar

    uma nova doena, descobrir a existncia de um novo planeta. Ve-

    jamos um exemplo de deduo para exemplificar esse ponto:

    Exemplo 1 Todos os planetas se movem em elipses em torno de seus sis.

    Beta se move em elipse em torno de seu sol.

    Portanto, Beta um planeta.

    Com esse exemplo, finalizamos a apresentao da viso in-

    dutivista da cincia. No prximo tpico, apresentaremos crticas a

    essa forma de conceber a cincia.

    6. CRTICAS AO INDUTIVISMO

    Como dissemos anteriormente, para o indutivista o racioc-

    nio indutivo fundamental para o mtodo cientfico. Esse mtodo,

    porm, foi severamente atacado no sculo 17 pelo filsofo David

    Hume.

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    Hume demonstrou de forma categrica que a induo nopode ser justificada com apelo experincia. O argumento paravalidar a induo, de acordo com esse filsofo, mostra-se circu-lar, pois, em linhas gerais, sustenta que, como a induo se re-velou bem-sucedida em numerosos casos, se pode concluir queela sempre funcionar. Mas isso no nada mais do que usar ainduo para justificar a induo. Essa dificuldade ao longo da

    histria ficou conhecida como "problema da induo.

    Do ponto de vista lgico, sabemos que a induo no podeser justificada. Isso porque no h contradio envolvida se a pre-missa de um argumento indutivo verdadeira e a concluso falsa.

    Tomemos como exemplo o seguinte argumento:

    Exemplo 2 No dia anterior eleio uma pesquisa mostrou que o candidato X teria 80% dosvotos.

    Portanto, no dia da eleio 80% dos eleitores votaram no candidato X.

    Mesmo que a premissa do argumento seja verdadeira no h

    como garantir a verdade da concluso. No h nenhuma contradi-o em assumir a verdade da premissa e a falsidade da concluso.Argumentos indutivos no so vlidos ou invlidos como os dedu-tivos. Eles somente podem ser fortes ou fracos, ter uma maior oumenor probabilidade.

    H outra crtica que pode ser feita ao relato indutivista da ci-

    ncia. No tpico anterior, vimos algumas condies impostas pelos

    indutivistas para que a induo seja aplicada de forma segura. To-memos a primeira condio em que "o nmero de proposies deobservao que forma a base da generalizao deve ser grande.Essa exigncia no parece muito plausvel para descobrir que aocolocarmos uma faca na tomada tomaremos choque. S mesmouma pessoa bem extravagante precisaria de um grande nmerode tentativas para se convencer de que toda vez que executar esse

    procedimento tomar choque.

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    Outro exemplo fornecido por Chalmers (1993). Ele relembraa grande reao que houve contra os testes nucleares logo aps olanamento da bomba atmica em Hiroshima. As pessoas compre-enderam com base apenas em um trgico exemplo que as bom-bas atmicas causam muito sofrimento humano. Aqui, novamente, a

    exigncia de um grande nmero de observaes parece inadequada.

    Por fim h, tambm, outra crtica que pode ser feita ao rela-to indutivista da cincia, que ataca a premissa indutivista de quea cincia comea com a observao e que essa fornece uma basesegura para a cincia. Por trs dessa premissa h a suposio deque temos acesso direto ao mundo externo por meio das nossasobservaes e que, de um modo geral, todos temos acesso s

    mesmas coisas, ou seja, temos a mesma percepo do objeto. No difcil verificar que nem sempre o caso. Um exemplo comumso as imagens em 3D. Antes de "descobrirmos" o que o objetoem 3D a viso que temos da imagem completamente diferente.Isso significa que o mesmo objeto pode ser visto de forma dife-rente por diferentes pessoas, contrariando, assim, a suposio doindutivista. Para melhor compreenso, observe a figura a seguir e

    veja a representao do planeta Saturno:

    Figura 1 Saturno.

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    Mais um exemplo pode ser adicionado. Imagine um mdicoque precisa curar uma nova modalidade de gripe. Como ele sabeo que deve observar? Deve ele verificar o lbulo da orelha, o dedodo p, os fios de cabelo, o tamanho do brao? Como saber o que relevante nesse caso?

    Se afirmarmos que podemos descartar a orelha, o p e o ca-belo, porque so irrelevantes no caso da gripe estaremos admitin-

    do algo alm da experincia e isso contradiz a tese indutivista est orientando a observao. Esse exemplo nos mostra que asnossas observaes pressupem alguma teoria e dependem, decerto modo, do nosso conhecimento prvio e de nossas expectati-

    vas. Pois, para curar essa nova modalidade de gripe, o mdico nofar experimentaes a esmo. Ele, de certa forma, sabe de quemaneira deve proceder.

    Essas crticas colocam algumas dificuldades para o programaindutivista, porm, no refutam completamente seu programa.

    Como mencionamos bastante sobre o indutivismo neste t-pico, interessante mencionar alguns defensores desse programa.Esses so os positivistas lgicos que ganharam fora em Vienaem meados de 1920 e 1930 herdeiros da filosofia empirista, quefloresceu no sculo 17. A filosofia empirista tem como tese centralque a nica fonte de conhecimento a experincia. Os principaisrepresentantes do positivismo lgico, embora com diferenas, soAlfred Ayer, Rudolf Carnap, Otto Neurathe Moritz Schlick.

    O Crculo de Viena outro nome pelo qual ficou conhecido omovimento liderado pelos positivistas lgicos surgiu por uma ne-cessidade de fundamentar a cincia a partir das concepes que aFilosofia da Cincia ganhou no sculo 19. At ento, a filosofia eravinculada Teoria do Conhecimento, mas, a partir de Hegel, essevnculo se desfez.

    Dessa maneira, esses pensadores tentaram elaborar um cri-

    trio de cientificidade que pudesse ou que tivesse uma correspon-dncia com a Natureza. Por isso, o Crculo de Viena adotou uma

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    forma de empirismo indutivista que se utiliza de instrumentosanalticos como a lgica e a matemtica para auxiliar na formaodos enunciados cientficos.

    Tal critrio seria, ento, o de verificabilidade. Para os pesqui-

    sadores do Crculo de Viena,os enunciados cientficos deveriamter uma comprovao ou verificao baseada na observao ouexperimentao. Isso era feito indutivamente, ou seja, estabele-

    ciam-se enunciados universais (pois a cincia tem pretenso deuniversalidade) a partir da observao de casos particulares.

    Os positivistas lgicos sustentam que a metafsica e a religiono merecem ser chamadas de conhecimento, pois no podem

    ser verificadas pela experincia, ao contrrio da cincia.

    A religio e a metafsica so no dizer desses autores pseu-doconhecimentos. A superioridade da cincia sobre as outras for-mas de conhecimento o corolrio desse tipo de concepo.

    7. TEXTOS COMPLEMENTARES

    Dvidas cticas sobre as operaes do entendimentohumano Parte II

    Ainda no chegamos, porm, a nenhum resultado satisfatrio com respeito questo inicialmente proposta. Cada soluo faz surgir uma nova questo, todifcil quanto a anterior, e nos conduz a novas pesquisas.

    Quando se nos pergunta: Qual a natureza de todos os nossos raciocnios so -bre questes de fato? A resposta apropriada parece ser que eles se baseiam narelao de causa e efeito. Mas, se tornarem a perguntar: Qual o fundamento detodos os nossos raciocnios e concluses a respeito dessa relao? Poderemos

    responder com uma simples palavra: a Experincia. Mas, se quisermos esmiuarainda mais e indagarmos: qual o fundamento de todas as concluses tiradas daexperincia? Isso implica uma nova questo que pode ser mais difcil de resolvere explicar.

    Os lsofos que se do ares de superior sabedoria e sucincia veem-se emgrandes apuros quando encontram pessoas de ndole inquisitiva que os desa-lojam de todos os cantos onde se vo refugiar e acabam infalivelmente por en-curral-los em algum dilema perigoso. O melhor meio de prevenir essa confuso sermos mais modestos em nossas pretenses; e mesmo descobrir por nsprprios a diculdade antes que ela nos seja lanada em rosto. Por esse meio,

    podemos converter numa espcie de mrito a nossa prpria ignorncia.Nesse tpico, a tarefa foi fcil simulando dar uma resposta negativa questo

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    proposta. Mesmo depois de termos experincia das operaes de causa e efeito,as concluses que tiramos dessa experincia no so fundadas no raciocnioou em qualquer processo do entendimento. Devemos agora nos esforar paraexplicar e defender essa resposta.

    Leia o texto a seguir que foi extrado da obra Investigaes acerca do entendi-mento humano,de David Hume:

    preciso admitir, por certo, que a natureza nos tem ocultado muito bemtodos os seus segredos, concedendo-nos apenas o conhecimento de al-gumas qualidades superciais dos objetos, enquanto nos nega a viso dospoderes e princpios de que dependem inteiramente esses objetos. Nossossentidos nos informam da cor, peso, consistncia do po, mas nem os sen-tidos nem a razo podero jamais dizer-nos quais so as qualidades que otornam adequado alimentao e sustento de um corpo humano. A visoou o tato nos do uma idia do movimento efetivo dos corpos; mas, quantoa essa maravilhosa fora ou poder capaz de manter um corpo mvel parasempre numa constante mudana de lugar, e que os corpos nunca per-dem seno quando a comunicam a outros, dessa no podemos fazer nem

    sequer a mais longnqua concepo. Mas, apesar dessa ignorncia dospoderes e princpios naturais, ao ver qualidades sensveis semelhantessempre presumimos que elas possuem poderes secretos semelhantes eesperamos que da decorram efeitos anlogos aos que j experimenta-mos. Se nos for apresentado um corpo de cor e consistncia parecidass do po, que j comemos, no temos receio de repetir a experincia,certos de que ele nos proporcionar o mesmo alimento e sustento. Ora,esse um processo do intelecto ou do pensamento que eu gostaria muitode saber em que se funda. Todos admitem que no h conexo conhecidaentre as qualidades sensveis e os poderes secretos; e por conseguinte,

    que o intelecto no levado a formular tais concluses a respeito de suaconjuno constante e regular por qualquer coisa que se saiba sobre anatureza dos corpos. Quanto experincia passada, pode-se admitir quefornece informaes diretas e certas apenas sobre aqueles objetos preci-sos e aquele perodo preciso de tempo de que teve conhecimento: mas porque estender essa experincia aos tempos futuros e a outros objetos que,tanto quanto nos dado saber, podem ser semelhantes apenas na apa-rncia? Esta a questo fundamental em que desejo insistir. O po queanteriormente comi alimentou-me, em outras palavras, um corpo dotado detais e tais qualidades sensveis possua, naquela ocasio, tais e tais pode-res secretos; mas segue-se da que um outro po deva tambm alimentar-

    -me noutra ocasio e que qualidades sensveis semelhantes sejam sempreacompanhadas de poderes secretos semelhantes? A conseqncia noparece ser em absoluto necessria. Pelo menos, deve-se reconhecer quese trata aqui de uma conseqncia deduzida pela mente; que h uma certadeciso tomada, um processo do pensamento, uma inferncia que exigeexplicao . Estas duas proposies esto longe de serem a mesma: Te-nho vericado que tal objeto sempre acompanhado de tal efeito e Prevejoque outros objetos, que em aparncia so semelhantes, sero acompa-nhados de efeitos semelhantes. Admitirei, se assim quiserdes, que umaproposio pode justamente ser inferida da outra; e sei, de resto, que essainferncia feita de qualquer maneira. Mas, se insistis em que ela feitamediante uma seqncia de raciocnios, peo que esses raciocnios mesejam apresentados. A conexo entre as duas proposies no intuitiva.

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    Faz-se necessrio aqui uma premissa menor que capacite o intelecto a ti-rar uma tal concluso, se ela realmente tirada pelo raciocnio e pela argu-mentao. Quanto a mim confesso que no consigo entender qual possaser essa premissa menor; e a quem cabe apresent-la seno queles quearmam sua existncia real, apontando-a como a origem de todas as nos-sas concluses a respeito de questes de fato? (HUME, 1973. p. 140-141).

    Induo e flosofa da cincia Stephen Law

    A losoa da cincia uma das mais velhas subdivises da losoa, remontan-do pelo menos a Aristteles. Est hoje em rpido crescimento, uma vez que osgrandes avanos cientcos do ltimo sculo tm levado os lsofos a pensarmais cuidadosamente sobre a cincia. Estes lsofos podero vir a inuenciar ofuturo da cincia.

    A losoa da cincia implica reexo losca sobre a cincia. Os lsofos dacincia no colocam questes cientcas essa a tarefa dos cientistas. Emvez disso, os lsofos da cincia enfrentam questes sobre a cincia. Por exem-plo: o que a cincia? O que distingue a cincia da no cincia? Qual o papelda observao na cincia? Como progride a cincia? Outras questes focam-senos conceitos que a cincia aplica. Por exemplo, o que uma lei da natureza?Outra preocupao losca a de se saber at que ponto temos justicaopara acreditar que as entidades inobservadas so reais. Devemos supor que oseltrons existem realmente, ou so apenas ces teis?

    O equilbrio dos indcios

    Algumas das questes mais centrais e importantes colocadas por lsofos dacincia dizem respeito ao problema da conrmao. Os cientistas constroem te-orias que pensar ser conrmadas pelo que observam. Essa conrmao, no en-tanto, faz-se por graus. Uma teoria pode ser ligeiramente conrmada por algumaevidncia ou pode ser conrmada mais fortemente. Supomos que quanto maisfortemente uma teoria cientca for conrmada pela evidncia disponvel, maisracional se torna nela acreditar. Uma pergunta relativa conrmao em que po-demos pensar a seguinte: o que faz uma teoria ser mais fortemente conrmadado que outra? Outra pergunta, mais fundamental, a de saber se as nossasteorias cientcas podem ser alguma vez conrmadas. O lsofo do sculo XVIIIDavid Hume argumentou que apesar de supormos que aquilo que observamosat hoje conrma as nossas teorias cientcas, tais observaes no fornecemde fato qualquer conrmao. Se Hume tiver razo, todas as teorias, quer a teo-ria de que a Terra gira em torno do Sol, quer a teoria de que o ncleo da Terra feito de queijo, so igualmente racionais. O problema que Hume levanta conhe-cido como o problema da induo. Trata-se de um problema que numerosospensadores na losoa tentaram enfrentar.

    O problema da induo

    Todos nos baseamos enormemente no raciocnio indutivo. Supomos que em vir-tude de o Sol ter nascido todos os dias no passado, temos boas razes parasupor que nascer amanh. Porm, se o lsofo David Hume tiver razo, o pas-sado no fornece qualquer espcie de pista para o que acontecer no futuro.

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    Grandes esperanas

    A forma de argumento mais vel a deduo. Num argumento dedutivo vlido,as premissas implicam logicamente a concluso. Tomando um exemplo simples:

    Scrates homem.

    Todos os homens so mortais.

    Logo, Scrates mortal.

    Se dizemos que as premissas so verdadeiras e a concluso falsa porque nosenvolvemos numa contradio.

    Num argumento indutivo, por contraste, as premissas no fornecem suposta-mente uma garantia de que a concluso verdadeira. Em vez disso, espera-seque as premissas forneam apenas indcios de que a concluso verdadeira.Eis um exemplo:

    O ganso 1 branco.O ganso 2 branco.

    O ganso 3 branco.

    O ganso 1000 branco.

    Portanto, todos os gansos so brancos.

    Se observamos mil gansos e se todos eles so brancos, conclumos que todosos gansos so brancos. Supomos que as premissas do nosso argumento tornam

    razovel aceitar a concluso. Porm, claro que no h contradio lgica emsupor que apesar de os primeiros mil gansos observados serem brancos, o pr-ximo possa no s-lo.

    Baseamo-nos a toda a hora em argumentos indutivos. Quando fazemos umapreviso do que acontecer no futuro ou acerca do que est a acontecer, ouaconteceu, em zonas do universo que no observamos, baseamo-nos no racio-cnio indutivo para justicar as nossas posies.

    Por exemplo, suponho que a cadeira onde estou sentado aguentar o meu peso.Que justicao tenho para acreditar nisso? Bem, a cadeira sempre aguentou omeu peso no passado. Portanto, concluo que aguentar tambm desta vez.

    evidente que o fato de a cadeira ter aguentado comigo no passado no me dgarantia lgica de que agora aguentar. possvel que a cadeira se desmorone.Ainda assim, supomos que o fato de a cadeira ter sempre aguentado comigome d razes para acreditar que continuar a faz-lo. Os cientistas tambm sebaseiam enormemente no raciocnio indutivo. Constroem teorias que valem su-postamente em toda a parte e em qualquer poca, incluindo o futuro. Justicamas teorias apresentando as suas observaes. Contudo, as armaes acercado que foi observado no implicam logicamente as armaes acerca do queacontecer no futuro. Assim, se os cientistas querem justicar estas teorias, noo podem fazer atravs de argumentao dedutiva. Em vez disso, tm de basear--se no raciocnio indutivo.

    No , portanto, a razo o guia da vida, mas o hbito que por si s determina emtodos os casos a mente a supor o futuro conforme ao passado.

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    David Hume, Tratado Sobre A Natureza Humana

    a natureza uniforme?

    O lsofo David Hume coloca a questo de saber se podemos ou no justicar al-guma vez este tipo de concluses acerca do que no observamos. Hume armaque quando raciocinamos indutivamente fazemos um pressuposto: pressupomosque a natureza uniforme, pressupomos que existem os mesmos padres gerais

    subjacentes natureza. O que aconteceria se no partssemos deste pressu-posto? Nesse caso, no poderamos tirar as concluses que tiramos. Eu noconcluiria que a cadeira onde me sento agora aguentar comigo, em virtude deela ter sempre aguentado comigo no passado. porque acredito que as mesmasregularidades gerais subjazem natureza, incluindo no futuro, que suponho quea cadeira aguentar comigo da prxima vez que nela me sentar. Mas a queHume detecta um problema. Sempre que raciocinamos indutivamente pressupo-mos que a natureza uniforme. Porm, se queremos justicar a nossa crena deque a induo um mtodo dedigno para chegar a crenas verdadeiras, temosde justicar este pressuposto.

    Justifcar as nossas crenas

    Hume indica que h duas possibilidades. Podemos tentar justicar a ideia de quea natureza uniforme recorrendo experincia ou podemos justic-la indepen-dentemente da experincia, armando porventura que se trata de uma verdadelgica. O problema com esta segunda sugesto bastante bvio. A ideia de quea natureza uniforme no claramente uma verdade lgica. No h contradiolgica em supor que, embora a natureza tenha sido uniforme at agora, possatornar-se de repente uma confuso catica e desarrumada, onde as coisas secomportam ao acaso e de forma imprevisvel.

    No resta seno uma possibilidade para justicar o pressuposto de que a natu-reza uniforme. Temos de faz-lo apelando experincia. Uma forma de levarisso a cabo seria observar diretamente tudo o que se passa na natureza. Dessemodo poderamos simplesmente observar que ela uniforme em todas as suaspartes. Mas claro que no podemos fazer isto. Podemos observar diretamenteapenas uma pequena poro do universo. E certo que no podemos observardiretamente o futuro.

    Portanto, a nossa justicao ter de recorrer a uma inferncia baseada no quepode ser observado diretamente. E por que no podemos testemunhar que anatureza aqui e agora uniforme e, depois, concluir que a natureza provavel-mente uniforme em todas as outras circunstncias?

    O problema , obviamente, que este raciocnio ele prprio indutivo. Teramosde nos basear num raciocnio indutivo para tentar mostrar que o raciocnio indu-tivo dedigno. Mas isto certamente uma justicao circular inaceitvel. Seriacomo conar nas armaes de um doente mental quando este assevera serdigno de conana. No de modo algum uma justicao.

    Hume conclui que embora raciocinemos indutivamente, no temos realmentequalquer justicao para supor que o raciocnio indutivo conduz provavelmentea concluses verdadeiras. No temos fundamentos para supor que as coisascontinuaro a comportar-se como no passado. Sim, acredito que esta cadeiraaguentar comigo da prxima vez que nela me sentar, que esta caneta cair

    quando a largar e que o Sol nascer amanh, como sempre aconteceu. Mas,espantosamente, a verdade que tenho tanta razo para supor que a cadeira se

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    desmoronar, como para acreditar que a caneta se erguer vagarosamente ouque amanh de manh um panda luminoso insuvel com milhes de quilme-tros de largura se erguer no horizonte.

    A concluso de Hume parece louca. Em condies normais, consideraramoslouca uma pessoa que acredita que um panda com milhes de quilmetros delargura tomar o lugar do Sol. Mas se Hume tiver razo, esta crena louca no menos razovel do que a nossa prpria crena de que ser o Sol a erguer-see no o panda. As previses de um louco no so mais nem menos razoveis doque as dos maiores cientistas.

    Porm, funciona

    Pode ser tentador responder ao problema da induo de Hume notando que o ra-ciocnio indutivo tem tido um grande sucesso at agora. Baseando-se no racioc-nio indutivo os cientistas alcanaram coisas extraordinrias, desde as lmpadaseltricas e computadores, s viagens espaciais e manipulao gentica. Todosestes feitos grandiosos da cincia e da engenharia dependem do raciocnio in -dutivo. No isto fundamento para supor que o raciocnio indutivo um mtododedigno para alcanarmos crenas verdadeiras?

    A diculdade com esta justicao da induo uma vez mais que ela prpria um raciocnio indutivo. Refere que o raciocnio indutivo tem sido extremamentebem-sucedido at hoje e conclui que continuar provavelmente a ser bem-su-cedido no futuro. Estamos outra vez a cair no problema da circularidade: usar ainduo para justicar a induo como conar no que diz um anncio porque oprprio anncio garante ser de conana.

    Baseando-se em raciocnios indutivos os cientistas alcanaram resultados estu-pendos. O Homem caminhou na Lua. No mostra isto que a induo dedigna?

    Apelo racionalidadeDado que acreditamos que temos justicao para tirar concluses acerca dofuturo e que as previses dos grandes cientistas esto mais provavelmente pr-ximas da verdade do que as de um louco, espantoso que Hume tenha aparen-temente mostrado que tais crenas so irracionais.

    Os lsofos continuam de volta deste problema espinhoso. Alguns sugeriramo seguinte. Como a palavra racional signica raciocinar dedutiva ou indutiva-mente, no precisamos justicar a convico a induo racional, tal comono precisamos de o fazer em relao crena de que nenhum solteiro casadoou de que todas as mes so mulheres. Estas proposies so, se quisermos,

    analticas ou verdadeiras por denio.Uma diculdade com esta manobra que, ao aceitarmos que a induo ra -cional verdadeira por denio, estamos apenas a adiar o problema. Humepergunta-nos como podemos saber que a induo nos pode conduzir dedigna-mente a crenas verdadeiras acerca do futuro. Insistir na ideia de que a induo racional porque verdadeira por denio apenas faz levantar a questo: eque fundamento temos para supor que ser racional conduzir dedignamente acrenas verdadeiras acerca do futuro? Porqu supor que racionalidade ser umguia mais dedigno para o futuro do que as suposies de um louco?

    O problema da induo levou alguns pensadores a procurarem formas alternati-

    vas de estabelecer verdades cientcas.A teoria de Hume assim to radical?

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    Para aqueles que s h pouco tiveram contacto com a losoa no fcil perce-ber quo radical realmente a posio de Hume sobre a induo. A concluso aque ele chega no , como pode parecer primeira vista, que no podemos estarcompletamente certos quanto ao que ir acontecer no futuro. Todos podemos verque h pelo menos alguma margem de erro nas nossas previses. A conclusode Hume que no temos fundamento para supor que as coisas continuem acomportar-se como at agora se comportaram. Se Hume tiver razo, a cincia

    no seu todo uma actividade irracional e as previses feitas pelos cientistas noso mais racionais do que as de um louco.

    Os cientistas loucos s existem na co, mas de acordo com Hume, o racioc-nio indutivo usado por todos os cientistas de certa maneira louco, visto que notem uma base racional (LAW, 2012).

    8. QUESTES AUTOAVALIATIVAS

    Sugerimos que voc procure responder, discutir e comentaras questes a seguir que tratam da temtica desenvolvida nestaunidade.

    A autoavaliao pode ser uma ferramenta importante paravoc testar o seu desempenho. Se voc encontrar dificuldades emresponder a essas questes, procure revisar os contedos estuda-

    dos para sanar as suas dvidas. Esse o momento ideal para quevoc faa uma reviso desta unidade. Lembre-se de que, na Edu-cao a Distncia, a construo do conhecimento ocorre de forma

    cooperativa e colaborativa; compartilhe, portanto, as suas desco-bertas com os seus colegas.

    Confira, a seguir, as questes propostas para verificar o seudesempenho no estudo desta unidade:

    1) Sobre o indutivismo, podemos afirmar que:

    a) depende fundamentalmente do mtodo dedutivo.b) uma metodologia alternativa ao falsificacionismo.c) no tem relao com o positivismo lgico.d) depende fundamentalmente do mtodo indutivo.e) todas as alternativas esto erradas.

    2) A metodologia indutivista pode ser criticada:

    a) porque a induo no pode ser justificada logicamente.b) por minimizar o papel da experincia no conhecimento cientfico.c) por valorizar o papel da experincia no conhecimento cientfico.

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    d) por mostrar que a induo pode ser justificada logicamente.e) todas as alternativas esto corretas.

    3) Como exerccio prtico, construa argumentos indutivos.

    4) Em que se fundamentam as crticas ao indutivismo? Quais os pontos mais

    criticados dessa forma de argumento?5) O que o problema da induo?

    6) Sobre o problema da induo, podemos afirmar que:

    a) uma tese forte do programa indutivista da cincia.b) uma questo que os indutivistas podem ignorar tranquilamente.c) problematiza a suposio de que a natureza uniforme.d) foi formulado pelo filsofo ingls John Locke.e) foi duramente criticado por David Hume, pois ele discordava das ideias

    de Locke.

    Gabarito

    Confira, a seguir, as respostas corretas para as questes au-

    toavaliativas propostas:

    1) d.

    2) a.3) Concluso pessoal.

    4) Concluso pessoal.

    5) Concluso pessoal.

    6) c.

    9. CONSIDERAES

    Nesta unidade, estudamos o indutivismo, que a concepo

    mais prxima da viso comum que temos do que seja o conheci-

    mento cientfico.

    Na prxima unidade, estudaremos o falsificacionismo, que

    uma metodologia alternativa indutivista e aparentemente contra

    intuitiva.

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    10. E- REfERncia

    LAW, S. Induo e filosofia da Cincia. Disponvel em: . Acesso em: 26 fev. 2012.

    Lista de figuraFigura 1 Saturno. Disponvel em: . Acesso em: 25 fev. 2012.

    11. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    CARNAP, R. Empirismo, Semntica e Ontologia. So Paulo: Abril Cultural, 1975. (ColeoOs Pensadores).

    CHALMERS, A. O que cincia afinal? So Paulo: Brasiliense, 1993.

    ______.A Fabricao da Cincia. So Paulo: Unesp, 1994.

    COPI, I. M. Introduo Lgica. So Paulo: Mestre Jou, 1981.

    FEYERABEND, P. K. Contra o mtodo. So Paulo: Unesp, 2007.

    ______. Dilogos sobre o conhecimento. So Paulo: Perspectiva, 1991.

    HUME, D. Investigao sobre o entendimento humano. So Paulo: Abril Cultural, 1973.(Coleo Os Pensadores).

    LAKATOS, I; MUSGRAVE, A. A crtica e o desenvolvimento do conhecimento. So Paulo:

    Cultrix, 1979.

    OLIVA, A. Filosofia da cincia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

    POPPER, K. R.A Lgica da pesquisa cientfica. So Paulo: Cultrix, 1975.

    ______. Conjecturas e refutaes. Coimbra: Almedina, 2003.

    SCHILICK, M. Sentido e verificao. So Paulo: Abril Cultural, 1975. (Coleo OsPensadores).

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