Boletim do Kaos #1

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Pág.05 Distribuição Gratuita Distribuição Gratuita Distribuição Gratuita Distribuição Gratuita Distribuição Gratuita ABRIL/2009 SUA DOSE MENSAL DE (R) EVOLUÇÃO Lourenço Mutarelli Pág.10 ...até ler o livro “Capão Pecado” do Ferréz e me deu muita vontade de escrever” A PRODUÇÃO CULTURAL DAS RUAS! GR GR GR GR GRANDES H ANDES H ANDES H ANDES H ANDES HOMENS OMENS OMENS OMENS OMENS A HISTÓRIA MARGINAL! PÁG.09 SPOKEN SPOKEN SPOKEN SPOKEN SPOKEN WORD - SL ORD - SL ORD - SL ORD - SL ORD - SLAM AM AM AM AM O MOVIMENTO MUNDIAL DOS SARAUS ONG QUE REPRESEN ONG QUE REPRESEN ONG QUE REPRESEN ONG QUE REPRESEN ONG QUE REPRESENTA PR PR PR PR PROTES TES TES TES TESTO! O! O! O! O! Por uma editora pública! PLÍNIO MARCOS à SACOLINHA Pág.04 Pág.06 tudo de interresante antes que o mundo acabe! ÚLTIMAS PALAVRAS LANÇAMENTOS LITERATURA CINEMA MÚSICA PÁG.09 ESCRITOR MARTINHO DA VILA PÁG. 11 EVENTOS TEXTOS PÁG. 12 RAPPIN HOOD TATA AMARAL PÁG. 13 CARLOOS MOORE PÁG. 14 PÁG.14 PÁG.10 PÁG.08 PÁG.15 cult cult cult cult cultur ur ur ur urahiphop ahiphop ahiphop ahiphop ahiphop.uol.c .uol.c .uol.c .uol.c .uol.com.br/bolet om.br/bolet om.br/bolet om.br/bolet om.br/boletimdok imdok imdok imdok imdokaos aos aos aos aos

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Literatura, cinema, quadrinhos e música

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Distribuição GratuitaDistribuição GratuitaDistribuição GratuitaDistribuição GratuitaDistribuição GratuitaABRIL/2009SUA DOSE MENSAL DE (R) EVOLUÇÃO

LourençoMutarelliPág.10

“...até ler o livro “Capão Pecado” do Ferréze me deu muita vontade de escrever”

A PRODUÇÃO CULTURAL DAS RUAS!

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PLÍNIO MARCOS

à SACOLINHA

Pág.04

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tudo de interresante antes que o mundo acabe!

ÚLTIMAS

PALAVRAS

LANÇAMENTOS

LITERATURACINEMAMÚSICAPÁG.09ESCRITORMARTINHODA VILAPÁG. 11EVENTOSTEXTOSPÁG. 12RAPPIN HOODTATA AMARALPÁG. 13CARLOOSMOOREPÁG. 14

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Colecionador de PedrasSérgio Vaz“No meio de uma terra devastadapela canalhice plantada a tantosanos, alguém quer semear apoesia e certamente colheráincompreensão. Se outros poetaspedem silêncio, ele pede maisbarulho. Se outros escritorespedem paz, ele quer é guerra”.Ferréz

Guerreira

Alessandro Buzo“Guerreira é acima de tudo a literaturafeita por Alessandro Buzo. E por umaturma inteira que tomou as letrasbrasileiras. De assalto não. Epa!Tomou de direito. No parágrafo e na raça.Bem-vindos sejam todos a esteBrasil profundo e teimoso queAlessandro Buzo vem nos apresentar”.Marcelino Freire

85 Letras e Um Disparo

Sacolinha“Estamos diante de um talento nato.A linguagem ficcional brota delenaturalmente, sem frescuras (...).Sacolinha ainda é jovem, tem um longocaminho pela frente. Pois eu digo:acompanhem-no neste caminho.Ele levará vocês ao encontro do Brasilverdadeiro”Moacyr Scliar

De PassagemMas não a passeio

Dinha“Essa autora é radical no sentidomais criativo que essa palavrapossa ter quando o assunto é acirculação de seu “bebê”. Pois antes deser papel, de ser fanzine, antes de serum livro, esse discurso circulouoralmente pela comunidade poriniciativa dela e por isso o públicocomeçou a pedir o escrito.Isso foi livro vivido antes, compartilhado.Era um escrito que falava por mais gente,talvez por quase toda gente”.Elisa Lucinda

Da Cabula

Allan da Rosa“O texto de Allan da Rosa quere consegue dinamitar e implodiras torres desta sociedadeexcludente.E o faz com as flores vermelhasde seus versos, frases, diálogose cenas. E é assim que suafervorosa e vigorosa arte caminhapara transcender a periferia echegar aos grandes palcos”.Nei Lopes

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Salve amigos (as), mais uma vitória da Litera-Rua.

Agora teremos mensalmente um jornal de conteúdoliterário, e o melhor, distribuído do centro à periferia,gratuitamente. O espaço vai mostrar a produção daLiteratura Marginal, guia de eventos e saraus, textosinéditos, dicas de livros; só nessa edição são mais de36 indicações literárias.

Além de circular em São Paulo, temos parceria emdiversos estados do Brasil, Brasília (GOG), Rio de Janeiro(Afroreggae, Enraizados e CUFA), Maranhão (ClãNordestino), Minas Gerais (NPN), Salvador (Blackitude) emuitos outros que formam essa corrente que veio paramudar a cara da produção cultural do país.

“A evolução é uma coisa!”, dizia o poeta Helião (RZO).Depois de mais de 150 números do fanzine, o Boletim doKaos muda de cara e se transforma num jornal com umanova concepção gráfica e editorial tratando de maneiraatual, e crítica, assuntos relativos à literatura, cinema ecultura em geral.

Com o intuito de ser uma ponte entre o público, osescritores e produtores culturais, o Boletim do Kaostem tiragem inicial de 10.000 exemplares, mostrandoas novas propostas de quem está ®evolucionando aprodução cultural brasileira onde a responsabilidadesocial tem papel fundamental.

Colocando mais tempero no circuito cultural, o jornalnas ruas e com sua versão on-line vai divulgar aprodução Literária levando as idéias, os projetos, ossaraus, os eventos, os livros, os filmes, os quadrinhos,as emoções, e os sonhos de quem produz cultura eacredita numa mudança.

Alessandro Buzo e Alexandre de Maio

EditoresAgradecimentos: Itaú Cultural, 1 Da Sul, Ação Educativa,DGT, Cooperifa, Marques Rebelo, UOL, Site Catraca, SiteCultura Hip-Hop, Revista Cultura Hip-Hop, Revista RAPNEWS eRevista Graffiti, Sérgio Vaz, Gag, Tony, Falcão, Cabelo, Falco,Nelson Maca, Eliane Brum, Ferréz, Sérgio Vaz, Allan Da Rosa,Sacolinha, Wesley Noóg, Eleilson, Jairo (Periafricania).

Alexandre De Maio é editor de publicações de Hip-Hop pela editora Escala e Minuano, colunista da RevistaRaça além de fazer história em quadrinhos - [email protected]

Alessandro Buzo, é autor de vários livros, blogueiro nato e apresenatdor do quadro “Buzão - CircularPeriférico” na TV Cultura - [email protected]

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érgio Vaz, o poeta da periferia, tem mais de 20 anosde poesia. O mentor da Cooperifa atingiu o auge dasua carreira literária com seu 5º livro “Colecionadorde Pedras” que primeiro saiu de forma independente,mas no ano passado, foi relançado pela GlobalEditora, com distribuição nacional, na coleção“Literatura Periférica”. O lançamento coroou suacarreira na literatura, mas Sérgio Vaz, 42 anos, queé casado com D. Sonia, pai de Mariana, revolucionoua zona sul de São Paulo, mais precisamente no bar

do Zé Batidão, e transformou o lugar num dos pontos culturaismais interessantes de São Paulo.

O morador de Taboão da Serra, grande São Paulo, fez dosseus saraus momentos inesquecíveis, e ponto de encontro depessoas interresadas em cultura e idéias inovadoras. No espaço,circula escritores, empresários, apresentadores de TV, poetas, rap-pers, donas de casa, e além ouvir grandes poetas, com toda essadiversidade, lá você sempre se sente em casa.

Muito do sucesso se deve a Sérgio, um sujeito que gostade gente, rua, abraço, sorriso, cerveja, futebol de várzea, deperiferia, do dia a dia. Vendeu muitos livros de mão em mão, afinalsão 20 anos e 5 obras publicadas. Viu, anos depois de lançar seuprimeiro trabalho, o surgimento de uma nova cena literária naperiferia, não podia, claro, ficar a margem disso e com os sarausvirou um caça-talentos, deu palco para quem não tinha. SérgioVaz também ministra palestras, participa de debates, organizouuma coletânea intitulado “Rastilho da Pólvora” (2005) uma antologiapoética do seu sarau que vamos falar mais a frente. Em 2007, aobra terá uma nova versão, com alguns autores do primeiro livroe outros novos.

Além de seus livros, lançou o CD da Cooperifa, poesia emCD, assim como o primeiro “Rastilho de Pólvora”, contou com apoiodo Itaú Cultural: “Muito bom tirar dinheiro de um banco sem usaruma arma”. Diz Vaz, um homem que acredita em coisas que muitosnão acreditariam, por isso, realiza.

Saúda os frequentadores do sarau com um forte: - Povo lindo,povo inteligente, é tudo nosso, tudo nosso !!!! O povo segue em coro.

Começou a escrever porque não tinha muito, ou nenhum,talento para música, colava nos anos 80 com um grupo de MPBque se chamava “Clube da Esquina”, como ele não sabia tocarnada o pessoal dizia: “Escreve alguma coisa”. Ele escreveu e nãoparou mais, muita água passou por debaixo da ponte até o sucessoda Cooperativa Cultural da Periferia, a Cooperifa.

Vaz tem um blog onde ele divide com a galera suas poesiase informações: www.colecionadordepedras.blogspot.com

O SARAU E SEU SURGIMENTONo ano de 2000, Sérgio Vaz “invadiu” uma fábrica abandonada e montou a

Cooperifa, um lugar para os talentos “sem palco”.A Fábrica despejou a Cooperativa, depois tentaram um bar chamado Garajão, que

acabou vendido, foi quando Cooperifa arranjou sua casa definitiva. Sérgio Vaz e o tambémpoeta Marco Pezão, procuraram um novo lugar, o Bar do Zé Batidão, na zona sul de SãoPaulo, um local que no passado havia sido um bar e mercearia do pai de Sérgio Vaz, lá ofamoso Sarau da Cooperifa cresceu, cresceu muito mesmo, chegou a vôos não antessonhados.

Virou um local frequentado por cerca de 300 pessoas por semana, toda quarta-feira à partir das 20:00h o Batidão ferve, os talentos são muitos e para todos os gostos, umafebre cultural, centenas de pessoas na periferia que não passam a noite de quarta nafrente da TV vendo novela, vão ver, declamar e ouvir poesias.

Desde de dezembro de 2005, o Prêmio Cooperifa, premia 100 nomes, gente quedireta ou indiretamente fazem algo pela periferia, “Aqui tiramos o R da palavra R-evolução”fala o poeta Vaz durante os Saraus. A noite é memorável e a cada quarta-feira na periferia

da zona sul de São Paulo, os grandes poetas da atualidadedividem um pouco do seu talento.

E um dia ficou pouco agora no Bar do Zé batidão temossala de cinema ao ar livre. Os eventos ocorrem nas primeirase terceiras segundas-feiras de cada mês, o "Cinema nalaje” já é um sucesso.

PIONEIROPIONEIROPIONEIROPIONEIROPIONEIROSérgio Vaz é um dos pioneiros a lançar livros de

forma independente, no distante ano de 1986 elelançava sua primeira obra “Subindo a Ladeira Mora aNoite”, em 1991 seu segundo livro “A Margem do Vento”.

Nessa época Vaz não conseguia atrair a mesmamidia que consegue hoje, mas isso o ajudou a ter ospés no chão e não se deslumbrar, três anos depois,em 94, veio “Pensamentos Vadios”.

Só 10 anos depois, em 2004, já na fase daCooperifa, seu 4º livro veio para as ruas, intitulado“Poesia dos Deuses Inferiores”, e em 2006, paracomemorar 20 anos de poesias, fez um apanhado dosquatro primeiros trabalhos e lançou “Colecionador dePedras”. Vaz é um sonhador, mas sonha com os pésno chão.

omo citou recentemente, um dos grandes filósofos europeus, o crítico George Steiner,

“Hoje Shakespeare seria um roteirista” ele ainda afirma que o futuro não será da cultura de elite

e fala do valor das novas formas de expressão, como a TV e os quadrinhos. Tudo isso mostra que

os novos rumos da Literarua estão certos.

O poeta Sérgio Vaz com seus saraus e eventos, o escritor Ferréz, além da carreira literária

internacional é roterista da FOX e lança quadrinhos; Buzo, apresenta programa de TV, tem um Blog e todos

têm em comum o talento, a ousadia e o compromisso social.

Um novo espaço para uma nova cena. Conheça três dos principais nomes da Litera-rua,

os alicerces da nova e efervercente cena cultural literária da periferia.

Fotos: Marques Rebelo

Bem vindos à Litera-Rua.

Texto: Alexandre De Maio

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eus livros o fizeram famoso, agora com programa deTV, em todo o brasil, ele é reconhecido. Mas AlessandroBuzo, conhecido pelos parceiros como Alemão, é amesma pessoa.Alto astral, e amigo de todo mundo, o escritor que selançou na cena literária em 2000, com o livro “O Trem -Baseado em Fatos Reais” onde denuncia as condiçõese estórias dos trens da periferia em São Paulo. Em 2001,seu fanzine “Boletim do Kaos” que originou esse jornalpassou a ser seu cartão de vista, principalmente dentro

do hip hop. Na base xerox, Buzo já divulgava, grupos, textos e artigossobre a cena cultural da periferia.

No mesmo ano se destacou participando do especialCAROS AMIGOS/LITERATURA MARGINAL - Ato I, coletânea detextos de literatura marginal organizada por Ferréz. Muito maisque escritor Buzo sempre foi um agitador cultural, um livro e umfanzine era pouco pra ele. Em 2002, ele começou a escrever emdiversos sites voltados à cultura hip hop, e começa a fazer palestrasem diferentes bairros da periferia de São Paulo, além de concluirseu 2º livro, “Suburbano Convicto - O Cotidiano do Itaim Paulista”,que só veio a ser lançado dois anos depois.

Mesmo com toda essa correria, Buzo estava prestes a sertornar uma referência no mundo dos blogs e em 2003 iniciou apublicação do blog www.suburbanoconvicto.blogger.com.br, empouco tempo ele se destacou pelo número de atualizações diáriase no mesmo período ocupou as páginas do especial CAROS AMIGOS/ LITERATURA MARGINAL - Ato III.

Em 2004, depois de algumas dificuldades, enfim, lançou olivro “Suburbano Convicto - O Cotidiano do Itaim Paulista”, quenarrou o dia-a-dia de um grupo de adolescentes durante a décadade 1980, no extremo da zona leste de São Paulo. Mas o agitadorcultural não parava por aí, e mostrando seu compromisso socialele promoveu as três primeiras edições do evento “Favela TomaConta”, para levar cultura e lazer ao seu bairro, Itaim Paulista, quetem mais 300 mil habitantes. Mais tarde, o evento se tornoureferência no terceiro setor atraindo o patrocínio de uma grandeempresa telefônica.

A cada ano seus trabalhos vão se somando e em 2005, Buzorelançou “O Trem - Contestando a Versão Oficial”, participou do livro“Literatura Marginal - Talentos da Escrita da Escrita Periférica”, daEditora Agir, entrou no livro “Rastilho da PólvorA” e fundou a“Biblioteca Comunitária Suburbano Convicto”. Promoveu maisquatro edições do evento “Favela Toma Conta” e começou e escrevermatérias para a Revista Rap Brasil, no mesmo ano ganhou o prêmioCOOPERIFA pelo livro “Suburbano Convicto” e foi indicado nacategoria hip hop “Ciência e Conhecimento”.

Em 2006, retomou sua carreira e publicou o romance“Guerreira”, seu quarto livro, também começou a participar comoarte-educador do programa “Fábricas de Cultura”, do Governo doEstado de São Paulo, levando oficinas de leitura às crianças desete à dez anos, no Itaim Paulista, nesse período intensificou suasatividades sociais. Buzo iniciou oficina de leitura semanal, voluntária,com internos da FEBEM - Encosta Norte e participou da 19ª BienalInternacional do Livro, no estande da FEBEM, em conjunto comos internos. Seguindo o projeto promove e organiza o 1º Con-curso de Literatura da FEBEM.

Seguindo com seu blog e seu evento “Favela”, Buzo nãoparou, e fez mais três eventos nesse mesmo ano e inauguroumais um blog na net (www.buzoentrevista.blogger.com.br), ondefaz entrevistas exclusivas com músicos, escritores e poetas.

Em parceria com a produtora DGT, inaugurou um espaço no sitecom entrevistas filmadas, com personalidades do universo hip hop. Aindano final do ano ganhou o prêmio COOPERIFA 2006, pelo livro GUERREIRA, eé indicado ao Prêmio Hutúz 2006, na categoria “Hip Hop Ciência eConhecimento”.

Em 2007, com seu sucesso na internet, e sua grande produção cul-tural, o escritor lançou um novo blog (www.literaturaperiferi-ca.blogger.com.br)voltado para a literatura e continua escrevendo regularmente em cinco sitesde hip hop, sendo quatro no Brasil e um em Portugal. Além da revista CulturaHip Hop . O ano ainda não terminou sem que o agitador cultural assinassecontrato para o relançamento do seu livro “Guerreira”, com a Global Editora, epromoveu outras edições do evento “Favela Toma Conta”, 11ª em abril e 12ªem junho.

Em parceria com sua patrocinadora, a marca Conduta, apresentadordo evento “2º Conduta na Rua”, no Largo do Paissandú, Centro de São Paulo,e como repórter cobriu o “1º Encontro Norte de Hip Hop”, em Rio Branco, noAcre. Com tantas atividades é finalista do Prêmio Toddy de músicaindependente, na categoria “Personalidade”. Ainda no mesmo ano, Buzoinaugurou no Itaim Paulista, a loja “Suburbano Convicto”, primeira no Brasilespecializada em Literatura Marginal, fortificando cada vez mais o sonho delevar cultura para periferia. Para fechar o ano fez 13ª edição do evento “FavelaToma Conta”.

Em 2008, Buzo já é uma referência da produção cultural periférica eganha um grande espaço na TV Cultura, com seu Quadro “Buzão CircularPeriférico” dentro do programa Manos e Minas, no quadro a cada programaele visita um bairro da periferia e mostra as atividades culturais da região,esquecidas por 99% da mídia televisiva.

Ainda no ano passado, lançou as coletâneas “Pelas Periferias do BrasilVol 2”, que traz autores de diversas parte do Brasil, e ganhou com o livro oprêmio Hutúz na categoria “Ciência e conhecimento”.

Para 2009, Buzo promete muito mais e a versão on line do livro jáestá na net , inovando, como sempre, sendo um dos primeiros escritores daLitera-rua a disponibilizar sua obra on line.

Se você quer saber tudo que acontece na vida desse inquietoagitador cultural, Buzo facilitou e centralizou suas atividades no sitewww.buzo.com.br.

Lá você encontra muitas informações como o making of do filme“Profissão MC” ainda em produção, com Tony Nogueira. No papel principal orapper Criolo Doido mostra as opções de quem vive na periferia.

Buzo, um guerreiro linha defrente na nossa luta pelademocratização da literatura.

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le tinha tudo para ser mais um, mais umassalariado, mais um escravo moderno, masno meio do nada ele encontrou os livros eeles o salvaram.

Ferréz, que não gosta de divulgar seuverdadeiro nome, nascido e criado no Jd.Comercial no bairro do Capão Redondo, emSão Paulo, já foi chapeiro de fast food,

atendente de padaria, dentre outras atividades querealizou para sobreviver, e apesar de tudo isso, virouum dos maiores nomes da Literatura Marginal, então,Reginaldo virou Ferréz.

Tirado de louco na adolescência por lermuito, ele escreveu um livro, mas uma chuva levou otelhado de sua casa e com isso seu livro veioliteralmente por água a baixo, mas ele não desistiu,reescreveu o livro ainda mais nervoso, talvez por issotenha ficado tão bom.

E lançou seu primeiro livro de poesiaspouco conhecido por seus fãs de hoje, o “Fortalezada Desilusão”, mas em 2000, Ferréz lançava o livro“Capão Pecado”. Que foi um marco na literatura emostrou a cara da periferia paulista provando quehá grandes escritores, para se ter idéia seus livrosforam lançados em vários países da Europa.

Ainda em 1999 criou uma a grife daperiferia, chamada “1 da Sul”, passou a fazer roupaspara vender em sua pequena loja e ao mesmo tempodivulgar frases dos seu livros.

Quem via aquela lojinha na garagem dasua casa não acreditava que um dia seu livros seriamlançados na longíqua Avenida Paulista ou aé mesmona Europa, e que ele se tornaria um intelectual desua geração, com o respeito e admiração depolíticos e empresários de diferentes camadassociedade.

Ferréz sempre faz questão de lembrar desuas referências, “Sou admirador de autores comoJoão Antônio e Plínio Marcos, além de ser fã deHermann Hesse e Gustave Flaubert”, diz ele.

Atualmente, na editora Objetiva, o escritorfoi um divisor de águas. A literatura feita nogueto não nasceu com o Ferréz, mas pode-se separar em antes e depois dele, porquecom seus livros sendo distribuídos naslivrarias e alcançando vendas expressivas,mostrou que o sonho era possível. A eliteperdia o privilégio de produzir culturaliterária.

Nesse meio tempo Ferréz casou-se com a Elaine e tiveram sua primeira filha,Dana Ferréz. Além de sua carreira comoescritor, ele passou a ser colunista de umadas mais importantes revistas do Brasil, aCaros Amigos e foi em parceria com elesque lançou mais um projeto ousado, o es-pecial Caros Amigos / Literatura Marginal,uma revista com textos e ilustrações feitossó por talentos da periferia. A primeiraedição “Ato I” contou com 10 autores, naépoca, ninguém famoso, dentre eles nomescomo Alessando Buzo e o até então pouco

conhecio o Paulo Lins, autor do livro Cidade de Deus,a revista virou referência, e até hoje é usada emfaculdades, depois veio o “Ato II” e “III”, totalizando 48autores. Podemos dizer que Ferréz com sua revistafoi o grande impulso para que cena literária daperiferia saísse dos guetos e ganhasse o Brasil.

Sempre inovando, Ferréz abriu a literaturamarginal para o mundo das HQ em 2006, lançando“Os Inimigos Não Mandam Flores” pela Pixel comroteiro dele e arte de Alexandre de Maio, só maisuma desse mano que vê possibilidades ondeninguém acredita.

CARREIRA INTERNACIONALSe conquistar o Brasil era um sonho que

parecia impossível para quem estudou em escolapública, num dos bairros mais violentos do país,Ferréz foi muito além e seus livros foram lançadosna Itália, Portugal e Alemanha.

CARREIRA MUSICALComo uma usina de idéias e talentos, Ferréz

além de toda sua trajetória literária ainda tem umacarreira como rapper. Seu primerio disco“Determinação” foi lançado com distribuição daSony, e teve participações de nomes como ChicoCésar e Arnaldo Antunes. O clipe da música “Judas”ainda concorreu na categoria de melhor videclipede rap na MTV, em 2006. Em 2007, lançou a coletânea“1 Da Sul” e gravou o DVD “100% Favela” ao ladonomes como GOG. Em 2007, retomou sua carreirano rap e lançou seu grupo “TR3F” e com a música“Mil Fita” teve boa aceitação nas rádios de São Paulo.

No ano passado, gravou o DVD “100% Favela2” com particpações de peso como Facção Centrale Seu Jorge.

ÚLTIMOS LANÇAMENTOSSeu último lançamento é seu primeiro livro

de contos “Ninguém é Inocente em São Paulo”, onderetrata de forma ácida a realidade da megametrópole, enquanto seus contos são roteirizadospara cinema ele prepara seu próximo romance. Eele não para por aí, afinal a família cresceu e aresponsa também, no final de 2008 fechou contratocom FOX e passou a ser roteirista da série 9MM etambém estreiou na TV com quadro “Interferência”no Programa “Manos e Minas”, da TV Cultura. Agoraem 2009, Ferréz lança a Editora Literatura Marginale segundo o vice-presidente J.R. Martillo, "a propostainicial é lançar dois selos um de Livros de Bolso eoutro de quadrinhos com o diferencial de preçosacessíveis”. Para esse ano está planejado olançamento pelo Selo SP o livro de bolso “Cronistade um Tempo Ruim” e pelo Selo Mutato a HQ “MilFitas” e o DVD “Literatura e Resistência”.

No cinema Ferréz é uma das vozes nodocumentário "A Ponte", de João Wainer e Roberto T.Oliveira e também empresta suas idéias no “Palavra(en) Cantada”, o filme de Helena Solberg e MarcioDebellian premiado documentário que discute arelação entre poesia e música e conta com AdrianaCalcanhotto, Caetano Veloso, Chico Buarque, Lenine,Maria Bethânia, Tom Zé entre outros.

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Com uma poesia atual, com muito sentimento e ironia. O grande poeta da Litera-Rua teve suas últimas publicações como “Poesia dos Deus Inferiores”(Independente), depois comemorando 20 anos de carreira lançou “Colecionadorde Pedras” que acabou sendo relançado pela Global Editora, na ColeçãoLiteratura Periférica, por último lançou pela Coleção Tramas Urbanas, daAeroplano Editora o livro “Cooperifa – Antropologia Periférica”, saiba mais no blog:www.colecionadordepedras.blogspot.com

O grande romacista periférico, Ferréz lançou um livro de poesia concreta chamado“Fortaleza da Disilusão”, mas a fama veio com seu primeiro romance “Capão Pecado”e posteriormente “Manual Pratico do Ódio”, além do infantil “Amanhecer Esmeralda” epor fim o livro de contos “Ninguém é Inocente em São Paulo”, e a história emquadrinhos “Os inimigos não mandam flores”.Acompanhe no www.ferrez.blogspot.com “Onde o escrito brinda os internautascom pensamentos, agenda e textos inéditos”

Alessandro Buzo protestando e relatando o Itaim Paulista lançou em 2000“O Trem – Baseado em Fatos Reais”, depois veio “Suburbano Convicto – OCotidiano do Itaim Paulista”, “O Trem – Contestando a Versão Oficial” e “Guerreira”que saiu independente em 2006 e foi relançado pela Global Editora, em 2007.No ano passado, lançou seu último livro até aqui, “Favela Toma Conta”, pelaAeroplano Editora. Organizou ainda as coletâneas “Pelas Periferias do Brasil” VOLI em 2007 e VOL II em 2008. Saiba mais: www.buzo.com.br

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le criou o que parecia impossível,um selo independente que lança

vários autores, mesmo com poucoapoio Allan da Rosa fez acontecercom o selo Edições Toró, pareadopor Mateus Subverso, Silvio

Diogo e um time fera de poetas, contistas,diagramadores, ilustradores e teimosos.

Sempre com material diferencia-do,desde da concepção até o acabamento doslivros, Allan da Rosa tem sido um grandefomentador da cena cultural litero-periférica.

Mas deixemos o próprio Allan daRosa falar como surgiu sua editora, “A Torósurgiu com “Vão”, um livro de poesias... hojesão 16 os títulos de seu catálogo, mais umasérie de 24 programas de rádio sobreliteraturas de resistência, vídeos como"Vaguei os livros, me sujei com a merdatoda", de Akins Kinte . Tudo foi surgindoespontaneamente, ganhando sustança pelanecessidade de expressão e de impressão.A Toró também foi brotando ginga eesperança de acordo com o prazer quecada visita, cada mão de cada pessoa, quepegava um livro nosso demonstrava, atraídapelas ilustrações, pelos panos, pelas letrasde mão. E que são danças, brincadeiras,porradas gráficas que só demonstrampotência porque os textos são fera. A gentequer passar uma rasteira nessa nossahistória de mais de 500 anos de roubo e deexploração, de estupros físicos e mentais,de escolas que estão mais pra delegaciascapengas, regadas a medo, mediocridadee multiplicação de ideais da ricaiada graúdaque sofre de paranóia com seus aramesfarpados no cérebro e ganância de abismo.”assim fala um do mentores da Litera-Ruaque recentemente estava no programaLíngua Portuguesa, do Profº Pasquale.

Mesmo sendo um sucesso deforma independente em 2006, Allan da Rosasaiu pela Global Editora, “Penso eu quepublicar numa editora estruturada, grande,é jóia, se a gente imaginar que o livro vaiter uma boa divulgação e circulação,possibilidade real de chegar em escolas ebibliotecas púbicas, em cidades de várioscantos do país, mas também sei que nasladeiras e nos mocós que a gente chega

Nessa sessão, iremos mensalmenteentrar na briga por uma editora pública, paraque a demanda periférica tenha onde e comopublicar seus livros.

Lançamos aqui a luta e à partir deagora buscaremos parceiros para sairmos dautopia e assim possamos fazer dessa idéiauma realidade.

Mês que vem nos aprofundaremos noassunto e entrevistaremos o DeputadoEstadual prof. Carlos Gianazzi que já teveaprovado na Assembléia Legislativa um Projetode Lei 484/07, que autoriza o Poder Executivoa criar a editora pública estadual para publicare divulgar a obra literária e poética deescritores e poetas que não têm condiçõesfinanceiras. O projeto foi inspirado à partir dotrabalho realizado pelo Sarau da Cooperifa. "Hágrandes talentos produzindo obrasmaravilhosas, principalmente nascamadas populares. Por isso,propus a criação de uma editorapública sem fins lucrativos quetenha como principal objetivoestimular a criação literária epoética através de publicação edivulgação", disse o parlamentar.

O deputado e todos os artistaspopulares da periferia esperam que ogoverno sancione o projeto de lei

transformando em realidade “Muitagente tem textos, contos epoesias engavetados, sem amínima idéia de como publi-car, quando chega nas livra-rias independentes, o custoé alto e fora dos padrões dequem sobrevive de salário”,afirma o escritor Alessandro Buzo.

Entre com a gente nessa luta e mandesuas opiniões para o email:[email protected]

com nossas atividades, lançamentos e livros, aseditoras graúdas não chegam, ou porque nãoquerem ou porque não conseguem”, alfineta Allan.

Sobre seu interesse pela literatura elerelembra, “A poesia eu penso que surge na nossavida já quando o gameta do pai encontra oacolhimento fértil da mãe. E respirar, falar, lutar,andar nesse planeta, nas periferias já é poesiatambém, é magia e simplicidade, eterna.” filosofa.

Um dos grande nomes da cena mostracomo se aprende ensinando, “A poesia ainda estásurgindo na minha vida, estou engatinhando noberço dela, seja abastecido por palavras e livros,ou cantando, ou em silêncio no ônibus lotado, ouaguando as plantas do quintal. Destacando a minade poesia que pra mim é a capoeira: Cultivo osversos da Capoeira Angola, que ardem e adoçamas rodas de toda sexta-feira aqui em Taboão, nasenzalinha de Mestre Marrom, improvisados nodendê de uma situação repentina ou trazendomotes milenares. Curto literatura angolana emoçambicana, autores como Luandino Vieira,Ungulani B.B. Khosa, Noêmia de Souza, Ana PaulaTavares, Mia Couto, Jofre Rocha. Literatura latino-americana: Alejo Carpentier, Eduardo Galeano,Mário Benedetti, Gioconda Belli. Piro em HildaHilst, Solano Trindade, Cúti, Sérgio Vaz, Dinha, PauloColina, Graciliano Ramos, Plínio Marcos, Luiz Vilela,Vânder Pirolli, Manoel de Barros. Dos de fora,Chester Himes, Patrick Chamoiseau, Henry Miller,Toni Morrison. Não tem como a periferia melhorarse a gente não se adaptar e aprender a jogar nessesistema que ta aí, onde dominam os letrados.”

Allan trabalha há anos em salas de aula deeducação de jovens e adultos levando conhe-cimento sobre africanidades, sobre as relaçõesentre a palavra falada e a palavra escrita. O manoque além de tudo isso defende nesse mês seumestrado na USP. Recentemente teve publicadoo livro infanto-juvenil "Zagaia", pela Editora DCL,que traz além da estória principal do livro (um ro-mance versado em estilo cordel) um estudo sobreas matrizes africanas na língua e no cordelbrasileiro. O livro já foi adquirido pela Secretariada Cultura de Minas Gerais para seus municípios.

Allan da Rosa um cara que um dia estevea margem da sociedade, mas que rompeu ascatracas da vida e mostrou que tem muito paraensinar aos intelectuais de plantão.

Atitude em prosa e verso.

CarlosGianazzi

naCooperifa

Allan da Rosa eseu livros eabaixo ao lado deSacolinha eChico Pinheiro

Por Alessandro Buzo

Por Alexandre De Maio

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400

Todo mês iremos destacar livros, cd´s e filmes que interressam.Leia o livro, ouça o CD e veja o filme, para começar tem o novolivro da jornalista e escritora Eliane Brum, “O Olho da Rua”, daEditora Globo, a publicação traz 10 reportagens feitas pela autorana revista Época e seus bastidores, vale muito a pena conferir.Outro livro recém lançado é “Mulher Moderna Tem Cúmplice”,terceira obra da escritora Cláudia Canto, da cidade Tiradentes naZona Leste de São Paulo. Mais um lançamento da Edicon onde aautora traz o pensamento feminino moderno.Já “A Sociedade do Código de Barras” é o livro póstumo do escritor,rapper e ativista Preto Ghóez, falecido num fatídico acidenteautomobilístico em 2004 e saiu pela Editora Estação Hip Hop, umlivro imprescindível.Por último, mas não menos importante é o recém lançamento daEdições Toró, “Lágrimas Terra” de André Luiz Pereira e DanielFagundes, mais um fruto dessa editora da periferia para periferia.

Garapa é o primeiro longa-metragem de José Padilha após o fenômeno"Tropa de elite", o diretor retrata o dia-a-dia de luta contra a fome detrês famílias no Nordeste. Tem previsão de lançamento para o começodo ano. Outra pedida do cinema nacional é “Mulher Invisível”, de CláudioTorres. O cineasta de "Redentor" faz agora uma comédia românticacheia de fantasia, protagonizada por Luana Piovani e Selton Mello. Porfim o documentário “Alô alô Teresinha”, de Nelson Hoineff, mostra atrajetória de Abelardo Barbosa, o Chacrinha, um dos maioresfenômenos da televisão brasileira com previsão de estréia para agosto.

Na música temos o lançamento do rapper Sombra que subverte todasnormas do rap brasileiro e com um levada inconfundível traz seuprimeiro disco solo depois do sucesso com o SNJ, o álbum “SemSombra de Dúvidas” revela que o rap pode surpreender.Outra dica é o relançamento do Maestro do Cannão, o inesquecívelSabotage morto há 6 anos, mas seu disco “Rap é Compromisso” virouhino e mostra que o rapper vai ser eternamente atual.E por fim o disco de um grande artista que além da sua músicarepresenta muito bem a Litera-rua, Wesley Nógg traz um disco quemistura rap, samba-rock e MPB tudo na suave medida certa no ótimodisco “Mameluco”. Para comprar o disco acesse www.mubi.com.br.

Salve lokos da Litera-Rua essa mesa foi ocupada durante anos pelo maior

Edward Bunker presopor porte ilegal de juventude,escreveu seus maioressucessos na cadeia, morreusabendo que virou um dos

Edward Bunker,

Dostoiévski, autor deCrime e castigo, o maior roman-cista que o mundo conheceu.Influencia tanta gente e tantasobras, que continua mudandopensamentos até hoje.

Dostoievski

LourençoMutarelli,mente criativacasando, todospassamos porisso um dia,autor de Jesus

LourençoMutarelli

Flaubert

Flaubert, o primeiro que li na vida, só de ter escrito Madame Bovary(que virou filme e eu nunca acho) já teria deixado sua marca nessemundo, mas o homem continuou e fez uma obra inigualável.

Hermann Hesse, de quem sou fãincodicional, o maior pensador pós-guerra, estouterminando seu diário e logo vou entrar em Knulp.Não fico 3 dias sem tocar em algo que ele escreveu,o único autor que conheço que consegue escreveduas páginas sobre um lírio no campo. Sensacional!Você sabia que ele recebeu o prêmio Nobel e nemfoi buscar? Ficou em casa pintando seus quadros.Hermann HesseHermann HesseHermann HesseHermann HesseHermann Hesse

Gorki, um dos poucos escritores que trabalharam muito na vida,proletariado fudido, passa tudo que viveu pro papel, é conhecido pelo livro 'A mãe'que virou filme e foi adaptado para o teatro uma centena de vezes, mas, "ABatalha da vida" é o livro que considero seu melhor.O primeiro da Literatura Marginal, ele foi o primeiro grande escritor proletário daliteratura universal. Seus livros são baseados em experiências vividas. Órfão aosdez anos, deixou a casa do avô, homem duro e cruel, e levou durante muitos anosuma vida nômade. Sempre dizia: “A vida desenrola-se à minha frente como umacorrente sem fim de hostilidade e crueldade, como uma luta ininterrupta pelaposse de coisas sem valor, tudo que eu observava não tinha quase nada em

comum com a compaixão pelos homens”. Ele viajava muito portoda a Rússia, colhendo diretamente da fonte da vida o que estánarrado nos seus livros. A temática da ressurreição das almas eo motivo da destruição da personalidade perpassam de pontaa ponta a obra dele, pois o homem perde a sua dimensãoquando se fecha sobre si mesmo, restando-lhe apenas umsentido de alienação. Para vocês terem uma idéia, MáximoGorki nasceu em 28 de março de 1868 em NijniNovgorodque hoje se chama Gorki. Quem quiser conhecer a obradesse grande escritor que ao contrário da maioria dosescritores de sua geração não nasceu montado naprata, pode começar pelo livro “A batalha da vida”.Abraços e boa leitura.

FERREZ.BLOGSPOT.COM

autor que esse pais já conheceu, João Antônio, enquanto as faculdadesensinam um monte de bunda mole, seus livros e sua história resistem, longa vida

aos verdadeiros revolucio-literários.

maiores autores americanos. Foram feitos mas de cincofilmes com seus roteiros, todos grandes sucessos depúblico e crítica, a autobiografia dele foi a melhor coisaque li em 2007.

Kid, Cheiro do Ralo e Natimorto, sevocê não leu o cara, não sabenada dessa vida meu rapaz.

Page 10: Boletim do Kaos #1

epois que seu livro, “O Cheiro do Ralo”, virou filmeele entrou em evidência, como o Paulo Lins

com “Cidade de Deus”.Mas Lourenço Mutarelli, assim comooutros escritores tem uma vasta carreira

que o fez chegar a isso, são várias décadaspublicando trabalhos autorais de quadrinhos

e depois uma carreira recente, mas promissorana literatura. E atualmente está no papel princi-

pal do seu último livro que virou filme, “O Natimorto”.Sempre ácido, em uma palestra no SESC ele disse

“Meus livros não servem para escola, neles tempalavrão, drogas e sexo, e nada disso tem nas escolas.”Ironiza. Fiquei surpreso que com seu jeito “Anti-sitema”

acabou sendo um dos grandes autores dessa geração.Fui ao Cine Belas Artes assistir “O Cheiro do Ralo”,

que foi adaptado do seu livro, uma boa produção com oator Selton Mello no papel principal e ele próprio comosegurança no filme.

Gostei muito do filme, divertido, interessante,intrigante. “Eu vivia de quadrinhos, mau e porcamente

produzi vários álbuns, até ler o livro “Capão Pecado”, do Ferréz, eme deu muita vontade de escrever, pela forma como ele escreveu,na época não o conhecia, sabia que ele conhecia meu trabalho,mas por ele ler também muitos quadrinhos, ter essa influência,tem uma linguagem, muito fluída, muito legal, despretenciosa. Entãome deu muita vontade, tanto que no livro “O Cheiro do Ralo” euescrevo lá, devolvo ao Ferréz, porque foi isso, de repente eucomecei a escrever “O Cheiro do Ralo”, movido inconscientementea isso.” revela sua inspiração. Agora outro livro seu “O Natimorto”acaba de virar filme. A seguir um entrevista exclusiva com o autor.

Como o desenho e os quadrinhos surgiram em sua vida?LM: Eu comecei a desenhar muito cedo, sempre fui uma criançainexpressiva e vi que quando eu desenhava, chamava a atençãoda família, então eu acho que me dediquei ao desenho por isso,porque de certa forma isso me tornava um pouco melhor.

Qual foi sua formação escolar?LM: Isso foi péssimo pra mim, porque sempre estudei em escolaparticular, mas não tinha condições, minha vó que pagava, ai eusofria muito preconceito, porque a gente ia de roupa remendada,meu pai tinha um carro muito velho, eu não tinha condições deestar lá, foi colégio de padre, depois de freira e foi uma experiênciamuito ruim, eu tinha dificuldade de aprender, sempre fui um alunomedíocre, péssimo. Eu era muito distraído.

Quando você lançou seu primeiro álbum em 1991 “Transubstanciação”,foi ai que viu que o desenho podia ser uma carreira ?L.M: Foi antes, em 1983, eu tinha trabalhado com outras coisas e umamigo meu ia procurar emprego na Mauricio de Sousa Produções,nos estúdios de animação e eu fui com ele tentar e acabei pegandoum trabalho de intercalador, depois eu virei cenarista de desenhoanimado lá do Mauricio, na época que ele produziu os longas. Eufiquei 3 anos lá, nesse tempo eu estava fazendo também faculdade,fiz Belas Artes quando era lá na Luz, fiz 2 anos, eu tinha uma bolsa.Foi ai que eu comecei a pensar em viver do desenho. Lá na Mauriciode Sousa Produções tem uma biblioteca só de quadrinhos, que éaberta aos funcionários e foi onde comecei a conhecer muitas coisas,já conhecia muito por causa do meu pai, ele gostava de quadrinhose foi aí que eu comecei a ficar com vontade de fazer quadrinhos,então eu pedi demissão da produtora, fui tentar publicar, foi muitodifícil, eu não consegui, acabei voltando a trabalhar numa farmácia,fui arrumando outros trabalhos e depois comecei a publicar, masem 1990 eu fiquei doente, xarope, ruim da cabeça, fiquei muito mal eaí veio o lado bom disso, como eu fiquei doente mesmo, eu emagrecidemais e não podia fazer nada, fiquei em casa sem tanta pressãodos meus pais para arrumar trabalho e nessa época quando eumelhorava ia fazendo o “Transubstanciação”, então eu aproveitei esseepisódio para fazer esse álbum, quando ele estava pronto, ia publicarde forma independente, mas apareceu uma editora que seinteressou, que era a Diller.

Você morou no Itaim Paulista (extremo da zona leste de SP), falede como era morar lá e porque fez uma álbum com o nome da ruaque morou?L.M: Eu queria entender o nome dessa rua, era a “Confluência daforquilha” de alguma estrada, algum rio, alguma coisa, eu achavaesse nome bem intrigante e resolvi fazer a história de uma sociedadesecreta que tinha esse nome, uma brincadeira em cima dessenome complicado, o tempo que morei no Itaim Paulista foi muitobom, muito bom mesmo, é uma vida meio interior de São Paulo, oproblema é que é longe de tudo, é difícil ter acesso, não tinha nemcinema.

E o “Cheiro do Ralo”, foi seu primeiro romance, que virou o filme,você estava no meio da produção da “Soma de Tudo” que teveparte I e II e você começou a escrever ? Como foi isso ?L.M: Foi uma coisa bem impressionante, eu falo que se eu fosseespiritualista eu teria psicografado esse livro,porque foi um carnaval, que minha mulher e meufilho viajaram e eu estava sozinho e tinha muitotrabalho ainda, além da “Soma de Tudo” tinha unsfree lances de desenho e eu liguei o computador

Nessa seção estaremos divulgando o trabalho de Ong´s que realmente fazem pela periferiae nada melhor para começar do que a “Casa do Zezinho” no Capão Redondo, que éadministrada pela Tia Dag.Conheci a casa numa visita com o meu amigo e também escritor Ferréz e sai de lá coma certeza que se querendo e correndo atrás é possível mudar as coisas, a Casa atendecentenas de crianças e jovens da região e tudo é muito bem feito e sério.Você percebe o carinho e a responsabilidade em cada sala ou espaço que você entra, aTia Dag é uma pessoa fantástica e tem uma equipe muito boa, quando você vai conhecer,é um ex-zezinho, hoje monitor que te apresenta a casa e não existe pessoa que saia delá a mesma. Não acredita, vá conferir você mesmo.Saiba mais: www.casadozezinho.org.br

LOURENÇO MUTARELLIDesenhista, escritor, ator, um cara em transformação. Texto Alessandro Buzo

Por Alessandro Buzo

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para escanear um dessesdesenhos e aí me veio a idéiade escrever, eu não podiafazer isso em quadrinhos, seeu mostrasse alguns doselementos da história eumatava ela, por exemplo abunda, que é um dospersonagens, tudo bem,virou filme, mas é outrahistória, em livro achei quecada leitor tinha que criarsua bunda perfeita (risos),essa foi a idéia de fazer emlivro e comecei a escrever,fiquei 5 dias direto escreven-do, eu fiz “O Cheiro do Ralo” em 5 dias e depois eu parei e levei mais uns10 dias para enxugar alguma coisa, ai minha mulher deu uma lida, paraajustar coisas levei mais uns 10 dias.

Sua idéia é continuar só na literatura ?L.M: Só na literatura e trabalhar com textos, e mesmo ilustrações quandotem me ligado, estou dizendo que não sou mais desenhista.

Como que você se viu contracenando com o Selton Mello que é umator consagrado, como foi fazer o segurança dele no filme ?L.M: - Divertido, o convite surgiu porque o Selton Mello estava fazendoteste de elenco e quando ele não podia fazer os testes, o Heitor, que éo diretor, pediu para eu fazer os testes com os atores quando o Seltonestava no Rio, aí eles gostaram e acabaram me convidando pra fazer, foimuito bom, é um personagem engraçado, me convidaram para ser osegurança, justamente pelos meus dotes físicos, né?

Hoje está surgindo uma cena literária na periferia, 15 anos atrás não seimaginava, como você vê a periferia escrevendo? Ao contrário do quese esperava dela?L.M: Eu acho isso incrível, porque é uma matéria prima muito fascinante.Eu só tenho um medo de uma coisa que falei pro Ferréz, que de repenteisso quase virou um modismo, o que não é mau porque abre espaços,mas, modismo é uma coisa passageira, a gente tem que escrever nossarealidade, mas tem que sair das fórmulas, se todo mundo começar aescrever parecido, acho uma coisa perigosa, não estou falando que é oque acontece, mas num primeiro momento surgiu muita coisa parecida.Na literatura as primeiras coisas que me impressionaram muito foramde fora, era Kafka, depois Dostoyévisk, mas aí cheguei em Augusto dosAnjos, Machado de Assis e no meio fui conhecendo Ferréz que é umcara que admiro a pessoa e o trabalho, Valêncio Xavier que eu adoro.

Para encerrar, quem é Lourenço Mutarelli ?L.M: Poxa vida, eu sei quem eu sou, eu sei quem eu sou de verdade hámuito tempo, eu nunca tive essa dúvida, tive quando era muito novo,Lourenço Mutarelli é um cara que como eu disse em outra entrevista, éum cara que foi muito mau tratado e aprendeu a ser mau tratado e agoraestá sendo bem tratado e está aprendendo a ser bem tratado, eu souum cara que vive experiências e tudo que eu faço é para experimentar.

o ano passado assistia um show de Marti-nho da Vila na Mar-gem Sul de Lisboa e

ouvi portugueses, africa-nos e brasileiros cantan-do suas músicas numasó voz. Foi assim quedescobri o intercâmbioque ele faz, desde sua

primeira apresentação internacional, em Angola, noano de 1972.

Com esse país o cantor tem uma relação bempróxima, sendo nomeado oficialmente embaixadorcultural pelo governo angolano através da realizaçãode trabalhos musicais, unindo músicos brasileiros eangolanos. Chegou até Portugal via África e aqui éum dos artistas brasileiros de maior sucesso. Osucesso do sambista brasileiro na música é deconhecimento geral.

Mas é pouco divulgada sua trajetória literária.Martinho da Vila já lançou sete livros, entre eles “Joanae Joanes - Um Romance Fluminense” (1999), com umaedição portuguesa pela Eurobrape e pelo InstitutoCamões e “Os Lusófonos” (2005), um romance quefaz a ligação entre os países da CPLP (Comunidadedos países de língua portuguesa - Angola, Brasil, Cabo-Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, SãoTomé e Princípe e Timor-Leste). Esse livro é oresultado das viagens e pesquisas que Martinho fezao continente africano e conta a história de um autorficcionado pela lusofonia.

Nesse livro Martinho da Vila mostra a“proximidade de países com culturas tão diferentesna origem e tão aproximadas pelo calor do idioma,tornando-se irmãos de nacionalidades diferentes”. Nodisco “Lusofonia” lançado em 2000, o cantor apresentaao Brasil músicos de todos os países que falamportuguês. Em 2006, foi nomeado Embaixador da BoaVontade pelo conselho de Ministros da CPLP.

Uma coluna é pouco pra falar sobre os maisde quarenta anos de carreira de Martinho da Vila,músico, compositor, autor, pesquisador e militante,que aos 71 anos esbanja energia nos palcos da vida.

Mais info: www.martinhodavila.com.brwww.cplp.org

Juliana Penha vive em Portugal há quase dois anos.É estudante e repórter [email protected]

O cidadão do mundoMartinho da Vila

Fazer a ponte é fazer a ligação entre diferentes culturasFazer a ponte é fazer a ligação entre diferentes culturasFazer a ponte é fazer a ligação entre diferentes culturasFazer a ponte é fazer a ligação entre diferentes culturasFazer a ponte é fazer a ligação entre diferentes culturas

“...ATÉ LERO LIVRO

“CAPÃO PECADO” DO FERRÉZ

E ME DEU MUITA VONTADE DE ESCREVER”

blogdolourencomutarelli.blogspot.comblogdolourencomutarelli.blogspot.comblogdolourencomutarelli.blogspot.comblogdolourencomutarelli.blogspot.comblogdolourencomutarelli.blogspot.com

Foto do site sensivelldesafio.zip.net

Page 12: Boletim do Kaos #1

Assistindo e sendo humilhado.

Nessa perimeria edição vamos dar algumas dicas dealguns Saraus e eventos que acontecem em abril.SARAU DO BINHOO sarau acontece todas as segundas-feiras no Bar doBinho, região do Campo Limpo. Espaço aberto parapoesia e para outras linguagens artísticas comomúsica, teatro e a cada quinze dias exibição de vídeose curtas metragens. Todas as segundas-feiras, 21h. RuaAvelino Lemos Jr., 60 (em frente à Uniban) - CampoLimpo. Zona Sul. Entrada franca. (11) 5844-65215844-4532 / 3535-6463 com Suzi.SARAU ELO DA CORRENTEFamília Alerta ao Sistema e a Rádio ComunitáriaUrbanos FM convida nas quintas-feiras (exceto aúltima do mês), a comunidade para se reunir, recitarsuas poesias, pensamentos e músicas. O alicerce doencontro é incentivar a leitura, a criatividade e avalorização da cena artística local. 20h. Bar do ClaudioSantista - Rua Jurubim, 788 -A – Pirituba. Zona Oeste.Entrada franca. (11) 3906- 0348 c/ Cláudio Santista.www.elo-dacorrente.blogspot.comSARAU COOPERIFAMovimento literário que acontece há sete anos, todasas quartas-feiras, com recital de poesias no Bar do ZéBatidão na periferia da Zona Sul de São Paulo. A buscapor um novo artista, o artista cidadão que contribuipara melhorar a comunidade no qual estão inseridos.

Na verdade eu já pensava em escreve esse texto há uns quatroanos, desde que fui ao cinema com dois amigos, um deles era oAlex, assistir ao filme “Um dia de treinamento”, com Denzel Wash-ington.

Quando acabou o filme, eu tava tão nervoso, tão irritado, que nahora que o Alex elogiou o filme eu simplesmente sai andando.

Os caras já sabem como sou e foram perguntar o que tinhaacontecido, disse que como o Alex sendo um cara negro não tavarevoltado vendo um filme, onde o único cara bom é o branco de

olho azul, que passa um dia inteiro, com outro policial negro que o ensinaa bater em latinos e em outros negros.

Mas na verdade ele tinha gostado tanto do filme, que junto como outro parceiro nem ligaram pro que eu tava falando.

Depois disso, foram inúmeras vezes que abandonei sessõespela metade, filmes que me davam nojo, vontade de pegar meu dinheirode volta no cinema ou na locadora, assim como alguns filmes feitos comatores negros que passam na TV, estereotipando o povo negro como setodos bebessem e fumassem maconha, além de incentivar a violência edesvalorizar as mulheres. Oh! Malcolm X ainda bem que você não estávendo isso.

O seriado que passa no SBT, a família tem 7 jovens Estadunidenses,(todos loiros) um olha pro outro e fala como o irmão é burro e completa.

- Desse jeito você não passa de ser presidente do México.Já no filme O “Exorcismo de Emily Rose”, o ajudante da advogada

de defesa fala em certa parte do filme:- A maioria dos casos de exorcismo é no terceiro mundo, claro,

gente primitiva e supersticiosa!E não para por aí, até em desenhos a gente é contaminado, no

desenho Super Amigos, os maiores heróis da terra (todos elesEstadunidenses) enfrentam a grande Rainha Negra Vudu, com todo tipo decolar, magia e tudo que tem direito.

Agora, um dos filmes campeões em preconceito e no mal gosto é“Um gigolô por acidente na Europa”.

Quando o personagem principal (Estadunidense) amarra outropersonagem (Europeu) num poste com a frase: “Viva a América, a Europafede a bosta”.

Em seguida os europeus passam e jogam coisas nele, o chamandode porco.

E o filme segue pregando a guerra étnica.No mesmo filme, num ônibus, quando o personagem principal vê

um senhor tocando acordeom, sai tocando o nariz e com a outra mãocoçando a cabeça, e diz.

- É a dança dos negros sujos.Já no filme “Dois é bom, Três é demais”, o personagem Dupret,

interpretado por Owen Wilson, quando vai dar uma palestra na escola, notrecho que fala das profissões, toda vez que cita uma profissão a câmeramostra uma criança branca, quando fala na parte do esporte, a câmerafocaliza um menino negro.

Mas o pior ainda vem quando ao se referir em não gostar detrabalhar ele cita a Europa e América do Sul dizendo que “nós entendemos

bem isso”, depois ainda diz que conheceu uma minaargentina e lá todo mundo fica à toa na vida.

De volta aos desenhos animados, a Dreamworksé campeã no preconceito, vou pegar só um exemplo que jábasta, o desenho “Por Água Abaixo” que traz a história de umratinho rico que morava sozinho e descobre um mundomuito mais divertido no esgoto (alusão a solitária elite e atão super lotada favela?). A história se passa, até que apareceum assassino, que é um sapo francês. Quando o grandevilão, que também é um sapo conta sua história triste, sobre como ele era um sapomuito querido do príncipe Charles e acaba sendo jogado na privada, antes de terminarde contar a história ele nota o rosto de chacota do assassino francês e pergunta. –Você está zombando do meu sofrimento? No qual o francês do mal responde: - Claro,desde que não seja o meu sofrimento, afinal sou francês.

Em seguida o francês toma um gole de vinho francês e cospe no chão,desdenhando do vinho. O desenho segue com dezenas de tiradas aos europeus.

Depois, seguindo a trilha de desgosto, ainda posso citar a série The Shield,sobre o cotidiano de policias americanos, que passa no canal AXN, numa das cenas,o policial entra na casa de um latino e vê que todos os mantimentos estão podres, elogo diz; - Vocês do terceiro mundo não têm geladeira em seu país, não? Que nojo!Ou o trecho do seriado recém lançado, “Jericho” que trata de uma explosão nuclearem alguns estados americanos, e de alguns sobreviventes numa pequena cidade.

Em um capítulo recente o ex-prefeito aparta uma briga de dois moradorese grita algo como: - Nós não nos tornaremos selvagens como os animais de terceiromundo em suas vilas.

Será que além de não poder escolher o que assistir, em nenhuma grade deprogramação, em nenhum canal, pago ou não, apesar de todos os canais seremsomente “concessões”, não poderemos sequer deixar de ser humilhados todo o tempo?

Isso sem mencionar o tanto de bandeira estadunidense que agente jáengoliu nos filmes, toda hora tem que ter algo para nos lembrar, que eles são“superiores”. Com uma verdade absoluta, a gente via engolindo legenda atrasada,legenda errada, falta de legenda e por aí vai, que numa eterna tradução a gentevai aprendendo na marra que ou a gente fala e lê em inglês, ou não sabemos quallanche pedir, em que loja está em Sale, ou em promoção, ou como vamos arrumarum Work, ou trabalho, e parece mesmo que deixamos de ser colônia de um, paraser do outro.

Esse texto na verdade é infindável, porque sempre que estou assistindoalgum filme ou seriado eu identifico o preconceito nele e corro para somar maisno texto, mas como todo filme, tudo tem um fim.

Espero mais filmes nacionais, mais seriados, mais produções honestas,que ao contrário da produção deles, somente traga histórias para entreter, semmaldade, sem querer fazer ninguém de fantoche, nem magoar nenhuma etnia.Só espero que os bilhões gastos nas produções hollywoodianas sirvam para algoalém de tentar provar que eles são superiores a nós o tempo todo.

Toda quarta à partir das 20h. Bar do Zé BatidãoRua Bartolomeu dos Santos, 797 - Chácara Santana.Zona Sul. Entrada franca - (11) 5891-7403.SARAU DE POESIA NA BRASARealizado na comunidade da Zona Norte, um espaço de expressão,discussão e reflexão, aberto a todos que queiram comungar dapalavra. Bar do Cardoso – Rua Parapuã, 1.692 (em frente ao bancoBradesco) – Brasilândia. Zona Norte. Entrada franca.(11) 3922-8593 - brasasarau.blogspot.comSUBURBANO NO CENTRO9ª edição - 24 de abril (19 H)Apresentação: Alessandro Buzo .ATRAÇÕES: Criolo Doido, Periafricania, DCM, Mentes Criativas eGatto Ninja * Pocket Show c/ 3 musicas.Ação Educativa - Rua General Jardim, 660 (Metrô Sta Cecilia)Inf: (11) 2569-9151 - Entrada franca

Maiores informações e muito mais opções acesse nossos parceirose informe-se no site da Ação Educativa que tem um agenda sobreos vários eventos no mêswww.acaoeducativa.org.br/agendadaperiferiaNo site Catraca Livre você tem uma agenda que tem eventos,cursos, cinema, teatro, exposições, palestras e encontroswww.catracalivre.uol.com.br/editoria/agenda

Para quem quiser divulgar seu evento na próxima edição entre emcontato pelo email [email protected]

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O Homem que Virou Suco, um clássico do cinema brasileiro,Medalha de Ouro no Festival de Moscou, premiado no Festival deNevers (França), e no Festival de Huelva (Espanha). No filme algumascenas eram provocadas pelos atores em praça pública. Tiago MataMachado definiu o filme na Folha de São Paulo, como "uma espécie decomédia de costumes, aprofunda-se na realidade nacional semabandonar a crítica social". Poeta é confundido com operário demultinacional que mata o patrão, é perseguido pela polícia e perde suaidentidade e condição de cidadão. Esse poeta é a história de Deraldo,nordestino recém chegado a São Paulo, tentando sobreviver de suapoesia. O trabalhador migrante em uma cidade grande: a construçãocivil, os serviços domésticos e subempregos sujeitos à violência e àhumilhação. Entretanto o poeta luta para reconquistar sua liberdade epreservar sua identidade. Imperdível para os amantes da Litera-Rua.

ata Amaral passou a ser maisconhecida depois que seu filme “Antônia”virou série na gigantesca TV Globo elevou para as pessoas a trajetória deum grupo de rap feminino, formadopelas cantoras e atrizes, Negra Li,

Leilah Moreno, Quelynah e Cindy.Confessa que não conhecia muito de rap

antes do filme, mas já tinha ouvido falar entreoutros de Racionais MC's, Rappin Hood, Thaíde

O rO rO rO rO rap na ap na ap na ap na ap na TTTTTVVVVV e na lite na lite na lite na lite na literererereratatatataturururururaaaaa

Rappin Hood a cada ano vemabrindo novos espaços para culturahip-hop, desde maio de 2008, eleapresenta na TV Cultura o Programa“Manos e Minas” e incentivado porAlessandro Buzo realizou seu sonhode ingressar na literatura.

O rapper, que no seu discorima ao lado dos grandes nomes damúsica como Caetano Veloso, GilbertoGil, Zélia Ducan e Leci Brandão, é umdos autores da coletânea literária“Pelas Periferias do Brasil – VOL II”, olivro ganhou o Prêmio Hutúz no anopassado na categoria “Ciência eConhecimento”.

O rapper também é capa daedição de janeiro darevista Cultura Hip-Hoponde fala sobre seusprojetos, o programa, suaidéias e seu novo disco.Além de lançar dois discopelos seu selo Raízesainda em 2009.A Litera-rua e seu vários

braços levando cultura einfomação para os 4 cantos

do Brasil.

“...quandoconheci a cena

hip-hop e fiqueimuito

sensibilizadacom a atitude

dos jovens,preocupados em

reconstruir aimagem do

preto, pobre daperiferia. Achei

que poderiaajudar fazendo

um filme quereposicionasse

essa imagem deuma maneira

mais humana epositiva.”

Foto:Divulgação

Foto:Divulgação

& DJ Hum, inclusive, Thaíde é um dos atores do filme e depois da série.Mas esse não foi seu primeiro filme, antes fez “Um Céu de Estrelas”, “Através

da Janela” e vários curtas-metragens e vídeos.“Sempre adorei ir ao cinema. Daí pra fazer filmes eu mesma, foi um pulo.

Quer dizer, um pulo para ter o desejo e muito trabalho para realizá-lo”, fala Tata.Voltamos a falar de Antônia, periferia e de cinema, quando questionada se

gostou da série baseada em seu filme desabafa: “Amei. O filme Antônia começouquando realizei, com Francisco Cesar Filho, um documentário intitulado Vinte Dez.Foi quando conheci a cena Hip-Hop e fiquei muito sensibilizada com a atitude dosjovens, preocupados em reconstruir a imagem do preto, pobre da periferia . Acheique poderia ajudar fazendo um filme que reposicionasse essa imagem de umamaneira mais humana e positiva.”

Mudamos o assunto de Brasil para Estados Unidos, a maior potência emcinema do mundo, Tata cita suas referências, inclusive as européias “Muitasreferências. Cinema dos anos 50, Martin Scorseese, Tarantino, Hal hartley, JonathanDeeme dentre outros.”

Antônia não foi nenhum grande sucesso de público, mas segundo ela “Opúblico não foi tão baixo assim, 80 mil pessoas assistiram Antônia. Mas, de fato,esperávamos três vezes mais que isso, devido ao sucesso da série. Acho quemuita coisa contribuiu para que não cumpríssemos nossas expectativas: a data(Oscar & Rocky Balboa), mas também o fato de que teríamos que deixar mais claroao grande público, a diferença entre o filme e a série. Mas isso eu só percebidepois. Uma pena”. Vivendo e aprendendo a jogar.

Tata Amaral é sem dúvida um dos nomes mais importantes dessa novageração de cinema brasileiro. Com seu filme com certeza contribuiu para a periferia

Por Alexandre De Maio

Por Alexandre De Maio

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e mostrou para as mulheres que cantam rap que elaspodem chegar muito longe.

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movimento dos saraus, tão famosos atualmente nasperiferias, remete ao movimento mundial chamadoSlam ou Spoken Word.

Nos Estados Unidos surgiu em Chicago, porvolta da década de 80, por iniciativa dos escritos deMarc Smith. Mas além do EUA os saraus feitos por poetasdas ruas ganharam o mundo e principalmente a europa.

Nessa nova cena poética os MC´s levam rimaspara saraus e ganham adeptos em todo velhocontinente, mas precisamente na França a cena é muitoforte, os saraus reúnem mais de 3 mil pessoas.

O poeta, MC e ator Saul Williams é um dosgrande nomes dessa cena mundial, ele atuou no filme“SLAM”, é autor de livros sobre Hip-Hop e prepara seunovo CD, Saul tem 34 anos é norte-americano, em 1998protagonizou o filme “SLAM”, de Ray Joshua, que fez ofez conhecido internacionalmente. O poeta moderno,além de filmes sobre o tema, fez pontas em episódiospopulares com “Sex And The City” e “The Chris RockShow”, lançou os álbuns “Amethyst Rock Star” em 2001,e “Saul Williams” em 2004, e elevou a cena poética parao mundo.

Aqui no BrasilNos últimos 5 anos, cresceu o número de

saraus na periferia de São Paulo, principalmente depoisdo surgimento e do sucesso do “Sarau da COOPERIFA”,apesar dele ser frequentado por alguns rappers comoG.O.G., Gaspar, Cocão, e até Mano Brown (Racionais)os Saraus no Brasil cresceram sem nenhuma relaçãocom o Spoken Word, por aqui os saraus surgiram paraser o palco dos sem palco.

Hoje além da COOPERIFA, vários outros sarausestão espalhados pela cidade, tem o “Sarau do Binho”,também na Zona Sul de SP, o Elo da Corrente, emPirituba, Griots, no Itaim Paulista e muitos deles nãotem essa ligação com os MC´s.

Mas, Sérgio Vaz, que no começo daCOOPERIFA ia aos shows de rap e no meio daapresentaçãoes recitava seu poemas, faz desde abrilde 2007, numa parceria da Ong Ação Educativa nocentro de SP, realiza o “Sarau Rap” toda última quinta-feira do mês, dando espaço e revelando novos talentosda poesia e do rap.

MOVIMENTO PELO MUNDOAlém disso, tem a Internet onde você pode saber muitomais do que rola no Spoken Word, acesse(www.poetryslam.com), site da Nacional Poetry Slam,com tudo sobre os campeonatos de “Slam” norte-americanos, principais informações e datas.

Temos ainda o site do escritor e MC CongolêsAbd Al Malik, que traz vídeos, músicas, fotos e links.Acesse www2.abdalmalik.fr.E o Grand Corps Malade que traz performances, áudioe links, principalmente da cena na França.www.grandcorpsmalade.com.

OUTROS VEÍCULOSTem ainda o filme “Slam”, ganhador do prêmio

do júri, no Sundance Festival, é estrelado por Saul Will-iams, ganhou ainda a Câmera de Ouro em Cannes, épossível assistir os trailers no YouTube.

arlos Moore nasceu ecresceu em Cuba.Doutor em CiênciasHumanas e em Etnolo-gia da Universidade de

Paris, ele é atualmenteChefe de Pesquisa (Sênior ResearchFellow) na Escola para Estudos dePós Graduação e Pesquisa da Uni-versity of the West Indies (UWI),Kingston, Jamaica. Com muitosanos de militância na causa danegritude o exilado cubano, já foiconsultor pessoal para assuntoslatino-americanos do SecretárioGeral da Organização da UnidadeAfricana e muitas outras atividadesem todos esses anos de luta pelaconscientização da causa negra

Autor de cinqüenta e cincoartigos publicados sobre questõesinternacionais, seus livros são:Pichón: Race and Revolution inCastro´s Cuba (Chicago: LawrenceHill Books, 2008); A África queIncomoda (Belo Horizonte:Nandyala Editora, 2008); Racismo &Sociedade (Belo Horizonte: MazzaEdições, 2007); AfricanPresence in the Americas(Trenton NJ: Africa WorldPress, 1995), redator princi-pal; Castro, the Blacks, andAfrica (Los Angeles, CA:CAAS/UCLA, 1989); ThisBitch of a Life (London:Allison e Busby); CettePutain de Vie (Paris:Karthala, 1982).

Em entrevista ao nossoparceiro Nelson Maca doBlackitude, na Bahia, o grandeativista revela “Por isso, eu me auto-defino, fundamentalmente, comoum crítico social, como um militantedas causas sociais. Me sinto muitoprivilegiado, como militante, porquetive a honra de ter militado ao ladode homens e mulheres hojeconsiderados como ilustres:Malcolm X, Cheikh Anta Diop, AiméCésaire, Maya Angelou, StokelyCarmichael, Lelia Gonzalez, WalterioCarbonell, Abdias Nascimento,Harold Cruse, Alex Haley, e tantosoutros e outras.”

Em outro ponto desseentrevista imperdível Nelson Macapergunta sobre sua relação com osativistas marxistas do movimentosocial negro que admiram

profundamente agrande revolução

cubana?

“Teria que escrever todo um livropara responder a isso, o que já fizem Pichón: Race and Revolution inCastros’s Cuba (Raça e Revoluçãona Cuba castrista), que acaba de serpublicado nos Estados Unidos. Aminha disputa com o regimeCubano foi violenta porque esse re-gime decidiu que ele não tinha porque discutir com um “bando deneguinhos equivocados”, como aliderança castrista nos qualificou.”Revela Carlos Moore.

A entrevista na integravocê confere na versão on-line (((((ververververver

editorialeditorialeditorialeditorialeditorial))))), com certeza aqui não teriao espaço necessário para as idéiastão profundas desse grandepensador negro que atualmentevive em Salvador, “No Brasil mesinto perfeitamente em casa e emfamília. É uma questão de sen-timento, o que é algo em inen-temente subjetivo. Não estamosfalando do terrível drama queconstituem as abissais desigual-dades sociorraciais existen-tes no

Brasil.”Sobre seu atual livro

“Pichón” ele falou “É umanarrativa na primeira pessoa,sobre a vida em Cuba, antese depois da Revolução de1959. É uma narrativa queconta o que era a Cuba deantes de 1959 – uma Cubahorrorosa, onde a populaçãonegra vivia sob uma espéciede regime neofascista, e

onde o racismo funcionava domesmo jeito em que funcionaatualmente no Brasil.” alfineta

Recentemente seu livrofoi publicado em português o“Racismo e Sociedade: novasbases epistemológicas paraentender o racismo (MazzaEditora)” “ Acho que os militantes,particularmente, deveriam reser-var um pouco do seu tempo parase documentar sobre algo tãoimportante como o surgimento eevolução do racismo na história. Édisso que trata Racismo &Sociedade.”

Outro lançamento recen-te em Português é “A África queincomoda: sobre a problematiza-ção do legado africano nocotidiano brasileiro” (Ed. Nandyala).

“NESSA NOVA CENA POÉTICA OS MC´S LEVAMRIMAS PARA SARAUS E GANHAM ADEPTOS EM

TODO VELHO CONTINENTE, ... NA FRANÇA ACENA É MUITO FORTE, OS SARAUS REÚNEM

MAIS DE 3 MIL PESSOAS.”

Da Bahia pro mundo: BlackitudeDa Bahia pro mundo: BlackitudeDa Bahia pro mundo: BlackitudeDa Bahia pro mundo: BlackitudeDa Bahia pro mundo: Blackitude

Ativista e escritor Carlos MooreAtivista e escritor Carlos MooreAtivista e escritor Carlos MooreAtivista e escritor Carlos MooreAtivista e escritor Carlos Moore lança o livro Pichon, lança o livro Pichon, lança o livro Pichon, lança o livro Pichon, lança o livro Pichon,na sua luta, esteve até ao lado da na sua luta, esteve até ao lado da na sua luta, esteve até ao lado da na sua luta, esteve até ao lado da na sua luta, esteve até ao lado da Malcolm X

Sérgio Vaz, Nelson Maca e rapper GOGFoto: Marilda Borges

A cenaamericana feitopor RusselSimons e MosDef e o livro deSaul Willians

Sarau na França

Na europa, nos EUA, ou no Brasil acena dos saraus cresce cada vez mais

O famoso bar doSpoken Word

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essa sessão vamos mostrar o antes e o depois da LiteraturaMarginal. E vamos de Plínio Marcos à Sacolinha.Plínios Marcos “Origens”Plínio Marcos de Barros nasceu em Santos, em 29 deSetembro de 1935, e faleceu em São Paulo, em 19 de Novembro

de 1999. Filho de um bancário (Armando) e de uma dona-de-casa(Hermínia), tinha 4 irmãos e uma irmã.“A gente veio de origem mais ou menos humilde, mas minha infânciafoi muito feliz, pelo menos foi muito despreocupada. Morava numavila de pequenos bancários – na Rua das Antigas Laranjeiras - e foinessa vila que me criei. A única dificuldade que eu tinha eraexatamente o colégio. Eu não suportava a escola. Grupo EscolarDona Lourdes Ortiz.Levei quase dez anos para sair do primário. E quando saí já nãodava mais para continuar estudando. Meu pai tentou me enfiar emtodas as profissões possíveis. Ele dizia que, se eu tivesse umaprofissão, sempre iria sobreviver”.Começo em São Paulo“Vim pra São Paulo de vez em 1960. Aqui, a primeira viração foivender coisas de contrabando. Eu ia buscar em Santos e vendiaaqui: cigarros americanos, rádio de pilha, esses troços. Fiquei umtempão trabalhando de camelô. Pegava no Largo do Café e vendiana esquina. Álbum de figurinha também. Depois, vi o pessoal doTeatro de Arena, porque eu parava no Bar Redondo. Entrei naCompanhia da Jane Hegenberg, no lugar do Milton Bacarelli,montamos um espetáculo que foi um desastre, “O Fim daHumanidade”.DOIS PERDIDOS NUMA NOITE SUJA“Então, escrevi “Dois Perdidos numa Noite Suja” para eu mesmorepresentar. Ator pequeno, sem nome, sem carreira, sem nada,trabalhando de técnico na Televisão Tupi, ninguém convidava pranada. Ninguém se lembrava que eu era também ator. Então, escreviuma peça com papel pra mim. Uma peça de dois personagens,inspirada num conto do Moravia, “O Terror de Roma”. E, como nãotínhamos local, fomos estrear no “Ponto de Encontro”, um bar naGaleria Metrópole, que o Emílio Fontana conseguiu pra nós”.LITERATURA“Eu fui escrever literatura porque a censura não estava liberandonenhuma peça minha. O “Querô” ia ser mais uma peça de teatro.“Uma Reportagem Maldita – Querô”, publicado em 1976, ganhou oPrêmio APCA de melhor romance desse ano. Só escrevi em formade romance porque não achei que iria passar na censura. Tanto éque ele está adaptado para teatro.Escrevia contos, reportagens, entrevistas sobre vários assuntos.Plínio Marcos, um dos maiores autores marginais, foiincompreendido na sua época e é aclamado hoje em dia.

eu nome é Ademiro Alves, morador do município deSuzano, na região do Alto Tietê. Hoje é conhecido porSacolinha, destaque em programas de TV como o“Programa do Jô” e “Provocações”.Antes de virar escritor e agitador cultural, ele era

cobrador de lotação no metrô Itaquera, madrugava todo diapara chegar muito cedo no ponto, ia de Suzano para Itaquerade trem, esse tempo, enquanto a maioria dormia, afinal o dialá fora nem tinha amanhecido ainda, ele lia.

Acabou se apaixonando pela Literatura e seu livrode cabeceira é “Diário de uma favelada”, de Maria Carolinade Jesus.

Esse amor pela leitura e a falta de interesse de seusamigos pelo tema, o fez fundar um projeto para ajudar eestimular a leitura na sua cidade, nascia sem pretensões o"Literatura no Brasil”.

Assim foi plantando, assim começou a escrever seunome no mundo da literatura.

O tempo passou e Sacolinha cresceu, não detamanho, mas sim de projetos e atitudes, em 2005 lançou deforma independente o livro "Graduado em Marginalidade",que falava das dificuldades de crescer no Alto Tietê, regiãopobre da cidade que tem além de Suzano, cidades comoItaquaquecetuba, um dos maiores índices de criminalidadena Grande São Paulo.

Nesse processo, ele deixou de ser cobrador de lotação,vagou por algumas ocupações até ser chamado pela Prefeiturado Município de Suzano para trabalhar na "Secretaria deCultura" onde coordenaria a pasta de literatura. Sacolinha hoje,promove vários eventos ligados à literatura na sua cidade, comosaraus, palestras, oficinas, incentivo e montagem de bibliotecascomunitárias e muito mais.

Sacolinha não parou e em 2006 lançou em parceriada Editora Ilustra seu segundo livro, "85 Letras e um Disparo",dessa vez de contos, e de novo viveu as dificuldades devender na raça a sua literatura.

E não é que de tanto correr atrás ele vemconquistando seu espaço, escrevendo seu nome na históriae mudando a cena cultural de uma cidade?

Seu segundo livro teve edição revista e ampliada,lançado pela Global Editora, com distribuição nacional.

Para 2009, o escritor prepara o lançamento do seu3º livro que já está pronto e deve vir no segundo semestre

E NÃO É QUE DETANTO CORRERATRÁS ELE VEMCONQUISTANDO

SEU ESPAÇO,ESCREVENDOSEU NOME NA

HISTÓRIA EMUDANDO A

CENA CULTURALDE UMA

CIDADE?

SEU SEGUNDOLIVRO TEVE

EDIÇÃO REVISTAE AMPLIADA,

LANÇADO PELAGLOBAL

EDITORA, COMDISTRIBUIÇÃO

NACIONAL.

Catraca LivreCatraca LivreCatraca LivreCatraca LivreCatraca LivreO site Catraca Livre é uma experiência de jornalismo comunitário para transformar a cidade numa

constante experiência de aprendizado - e não só para uma elite, mas para todos.Nosso foco é a cidade de São Paulo, onde diariamente fazemos um levantamento das possibilidades

de diversão e aprendizado gratuitos ou a preços populares, sempre investigando sua qualidade.Tirando proveito dos recursos digitais, damos dicas de leitura ou apresentamos textos

complementares a partir dos eventos, para que os leitores ampliem o conhecimento. Educação e cultura, emnossa visão, não se separam. Cultura é capaz de seduzir e levar os indivíduos para os mais diversos camposde conhecimento, que, muitas vezes, não faz sentido numa sala de aula.

Paraentender

Plínio Marcos

Allan da Rosa, Sacolinha,Chico Pinheiro,

Sérgio Vaz eAlessandro Buzo

com título "Peripécias de minhainfância", um romance infanto-juvenil.

www.sacolagraduado.blogspot.com

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Gramática da Ira tem o prazer de receber aqui, para uma conversa francae contundente, o Mestre Carlos Moore. Esperamos, com isso, aprofundaralgumas discussões que temos levantado. Há um grande interesse denossa parte em compreender e divulgar a questão da negritude em Cuba,na diáspora e continente africano. Para tanto são muito esclarecedores osrelatos de experiências vividas e as análises sócio-políticas que o mestrefaz, não só do regime revolucionário cubano, no que toca maisdiretamente a causa negra, mas de muitas questões que extrapolam asbarreiras nacionais.

Nosso mestre fala um pouco de sua trajetória de exílios até suapermanência em Salvador, na Bahia, sua morada atual. A partir daí, segueuma conversa inspiradora sobre grandes questões como literatura,música e muito mais. Com emoção, Carlos Moore destaca companheirosde trajetória que se tornaram célebres.

Dedica profundas palavras a dois dos homens que tanto colaboraram paraa formatação do ativismo negro contemporâneo no mundo inteiro. Trata-sedos fenomenais Aimè Césaire e Fela Anikulapo Kuti. O primeiro fundadorda Negritude, movimento que revolucionou as relações raciais no séculoXX. O segundo um músico extraordinário que desenvolveu o incrível afro-beat. Ambos, além da reviravolta que causaram com sua arte, tiveram umaatuação política vigorosa contra os opressores do continente africano e dadiáspora negra. Carlos Moore explica a importância dos dois para as lutasnegras atuais.

Carlos Moore nasceu e cresceu em Cuba. Doutor em Ciências Humanas eDoutor em Etnologia da Universidade de Paris-7 na França, ele éatualmente Chefe de Pesquisa (Sênior Research Fellow) na Escola paraEstudos de Pós Graduação e Pesquisa da University of the West Indies(UWI), Kingston, Jamaica.

Ele foi consultor pessoal para assuntos latino-americanos do SecretárioGeral da Organização da Unidade Africana (atualmente União Africana), Dr.Edem Kodjo, de 1982 a 1983, e consultor pessoal do Secretario Geral daOrganização da Comunidade do Caribe (CARICOM), Dr. Edwin Carrington,de 1966 a 2000. Foi assistente pessoal do professor Cheikh Anta Diop,diretor do Laboratório de Radiocarbono do Instituto Fundamental da ÁfricaNegra, de 1975 a 1980, em Dakar, Senegal.

Autor de cinqüenta e cinco artigos publicados sobre questõesinternacionais, seus livros são: Pichón: Race and Revolution in Castro´sCuba (Chicago: Lawrence Hill Books, 2008); A África que Incomoda (BeloHorizonte: Nandyala Editora, 2008); Racismo & Sociedade (Belo Horizonte:Mazza Edições, 2007); African Presence in the Americas (Trenton NJ: AfricaWorld Press, 1995), redator principal; Castro, the Blacks, and Africa (LosAngeles, CA: CAAS/UCLA, 1989); This Bitch of a Life (London: Allison eBusby); Cette Putain de Vie (Paris: Karthala, 1982).

Agradecemos, novamente, ao Mestre Carlos Moore, pelas respostasdesdobradas respeitosa e cuidadosamente ao Gramática da Ira.

Nelson MacaBlackitude.Ba.

Gramática da Ira (GI) - ProfessorCarlos Moore, antes de tudo, é umahonra para nós entrevistar umhomem de sua envergadurahistórica e importância política.Um negro que, apesar de uma vidatão aguerrida, soube permanecerlúcido e incorruptível. Além domais, simples e acessível aos quechegam. Professor, diz pra gentecomo o Senhor gosta de serapresentado na intimidade e nosespaços das várias lutas que temsido sua vida.

Carlos Moore (CM) - Obrigadopelas considerações singelas. Aauto-definição é sempreproblemática, porque os humanostêm uma marcada tendência a seprojetar de maneiraexclusivamente positiva. Ora, arealidade não é sempre essa. Eutenho cometido tantos erros naminha vida política e na minha vidapessoal, que para me definircompletamente, implicaria aadmissão desses erros. Eu me vejocomo uma pessoa que teve delutar muito para adquirir aidentidade racial, a serenidadehumana, que possuo hoje. Por isso,eu me auto-defino,fundamentalmente, como umcrítico social, como um militantedas causas sociais. Me sinto muitoprivilegiado, como militante,porque tive a honra de ter militadoao lado de homens e mulhereshoje considerados como ilustres:Malcolm X, Cheikh Anta Diop, AiméCésaire, Maya Angelou, StokelyCarmichael, Lelia Gonzalez,Walterio Carbonell, AbdiasNascimento, Harold Cruse, AlexHaley, e tantos outros e outras.Todas essas figuras ocuparam umlugar importante no combate que,ao meu ver, constitui a maior dascausas sociais que a humanidadetem sido obrigada a sustentar: ocombate contra o ódio racial,contra a opressão racial, e contraas discriminações e vexames detodo tipo que são inerentes a essefenômeno criado pela história dasrelações dos humanos entre si.Sinto orgulho de tê-losacompanhado nessa trajetória decombate por um mundo melhorpara todos nós.

ENTREVISTA /

CARLOS

MOOREPALAVRAS

ESSENCIAIS!

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www.gramaticadaira.blogspot.com

GI- Por que o Senhor escolheu o Brasilpara viver atualmente, e, maisespecificamente, por que Salvador?CM- Porque no Brasil me sintoperfeitamente em casa e em família. Éuma questão de sentimento, o que é algoeminentemente subjetivo. Não estamosfalando do terrível drama que constituemas abissais desigualdades sociorraciaisexistentes no Brasil. Há poucos países nosquais eu me sinto realmente em casa: oSenegal, o Haiti, a Trinidad e, naturalmente,a Cuba. O Brasil é um desses países ondeeu não me sinto como um estrangeiro,mas como se tivesse nascido nele.Salvador é, para mim, como a terra queme viu nascer. Amo muito essa cidade, opovo, o jeito, as ruas, os prédios, o mar.Porém, tenho decidido morar no Brasil atéo momento do meu retorno a Cuba. Equando esse dia chegar, sei que ireiembora com muita tristeza no meucoração, pois o Brasil tem se convertido,também, no meu país.

GI- O Senhor é conhecido,internacionalmente, como um dissidentedo regime cubano de Fidel Castro,principalmente por questões queenvolvem os conflitos raciais. O Senhorpode nos falar um pouco sobre suapercepção histórica desses conflitos, ecomo tem sido sua relação com osativistas marxistas do movimento socialnegro que admiram profundamente arevolução cubana?CM- Teria que escrever todo um livro pararesponder a isso, o que já fiz em Pichón:Race and Revolution in Castros’s Cuba(Raça e Revolução na Cuba castrista), queacaba de ser publicado nos EstadosUnidos. A minha disputa com o regimeCubano foi violenta porque esse regimedecidiu que ele não tinha por que discutircom um “bando de neguinhosequivocados”, como a liderança castristanos qualificou. Eles pensaram que, comoeles eram brancos, inteligentes, marxistase antiimperialistas, nós, negros, sótínhamos que nos alinhar sob comandodeles, e seguir as instruções políticas queeles nos davam. Ou seja, que deveríamos

Porque noBrasil me sintoperfeitamente emcasa e em família.É uma questão desentimento,o que é algoeminentementesubjetivo.

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arriscar as nossas vidas no combate contra o inimigoimperialista, e, claro, trabalhar para edificar a novasociedade socialista. Mas, como bons soldadosnegros marxistas, devíamos nos calar no que dizrespeito aos problemas da sociedade cubana, sobreas grandes decisões políticas, e seguir as instruçõesdos nossos dirigentes super-inteligentes. Mas, nós quetínhamos outra idéia da Revolução, achamos quehavia algo de errado nessa relação que nos propunhaa liderança castrista – composta em mais de 95% porbrancos provindos da alta burguesia e da classemedia cubana. Pensávamos que havia que encarar asituação racial em Cuba como primeiro passo naconstrução do socialismo e da igualdade, mas essaliderança respondeu que em Cuba não havia racismo;que vivíamos numa “sociedade mestiça” onde todosos cubanos eram “mulatos”; que o socialismo estava“além da raça”, e que a única cor na Cubarevolucionaria era a “Cor Cubana”. Claro,compreendemos que se tratava da demagogia desempre, a mesma que tinha sido usada durante todo operíodo republicano anterior, e que a liderançarevolucionária tinha recuperado, para elaborar umanova ideologia mentirosa baseada numa suposta“pós-racialidade socialista”. É por isso que omovimento negro Cubano daquele momento, ou seja,o período de 1959 até 1965, chocou-se, quase deimediato, com a nossa liderança revolucionária. Estaúltima estava composta por homens e mulheres queusufruíam de grande prestígio, dentro e fora do país, eque estava liderada por um dos grandes gêniospolíticos do século XX: o Fidel Castro Ruz. Sabíamosdisso, mas também sabíamos que Fidel Castro Ruznão era Deus, e que mesmo se ele o fosse, ele estavacometendo uma barbaridade em relação à questãoracial. Assim, todos aqueles que levantaram as suasvozes para alertar o regime revolucionário que eleestava levando Cuba por um caminho errado no quediz respeito à questão racial, fomos catalogadoscomo “negros ingratos” e, finalmente, como “racistasnegros” e “negros contra-revolucionários”. A partir daí,a impossibilidade de diálogo com o regime se tornoupatente, e terminou em confronto. Como as forças empresença eram desiguais, pois eles tinham o poder doEstado e nós somente o poder das nossas idéias, nósfomos impiedosamente esmagados. Em resumo, issofoi o que aconteceu. Fidel Castro, Che Guevara e RaúlCastro tinham sido elevados ao estatuto de Deusesgregos. Ninguém que tivesse idéias diferentes aosdeles tiveram o direito de ser ouvidos. Nós, dissidentesrevolucionários negros, devíamos nos prostrar diantedeles de maneira obsequiosa, submissa e covarde, ouser esmagados. Então, fomos detidos, enviados paraas cárceres abomináveis que o regime já tinha aberto,ou para os diferentes campos de trabalho forçadoque já existiam no país, ou enviados para a destruiçãomental nos hospitais psiquiátricos. O mais célebredesses casos foi o do grande pensador WalterioCarbonell, demolido num manicômio. Cinqüenta anostiveram de transcorrer para que o mundo começassea se perguntar o que é que estava ocorrendo emCuba com a população negra majoritária? Foramcinqüenta anos de defesa do “paraíso pós-racial”cubano pela esquerda toda, branca ou negra. Inclu-sive, essa novela continua sendo de atualidade empraticamente toda a chamada América Latina -principalmente em países como o Brasil - onde aesquerda é de um infantilismo racista digno de estudopelos psicanalistas. Eles pensam que os Cubanosnegros não tem o direito de se opor a um regime queos oprime de um jeito similar à maneira em que osmilitares oprimiram aos brasileiros durante duasdécadas. Não tão somente em América “Latina” mas

no mundo inteiro, essa esquerda marxista tem problemas sérios quanto àanalisar a questão racial, ou quanto a se relacionar com os negros,individualmente, ou como coletividade racial que tem um percurso históricosingular.

GI- Pichón é o primeiro volume de uma trilogia sobre seus 50 anos de vidapolítica ativa, não é? Por que esse título? O Senhor poderia nos detalhar umpouco mais a questão? Há alguma possibilidade em vista dele ser traduzidopara o Português? (Disponível no http://www.amazon.com/).CM- Pichón é uma narrativa na primeira pessoa, sobre a vida em Cuba,antes e depois da Revolução de 1959. É uma narrativa que conta o que era aCuba de antes de 1959 – uma Cuba horrorosa, onde a população negra viviasob uma espécie de regime neofascista, e onde o racismo funcionava domesmo jeito em que funciona atualmente no Brasil. Ou seja, um racismosurreptício, sempre insidioso, hipócrita e covarde, que se escondeconvenientemente sob uma máscara de “democracia racial” e de“cordialidade racial”, mas que exerce uma violência sistemática contra osnegros em todos os âmbitosda vida quotidiana. Na Cubaantes da Revolução, seeliminava os jovens negrosdo mesmo jeito que elesainda são eliminados ereprimidos na Colômbia, noBrasil, no Peru e no resto dachamada “América Latina”. ACuba pré-castrista foi uminferno, em todos ossentidos, e Pichóndemonstra isso. E logo veio aRevolução, com dirigentesnacionalistas e imbuídos deum sentido de justiça social,mas também imbuídos dosentimento que eles eramracialmente superiores àpopulação NEGRA cubanaque nesse momentoconstituía ao redor de 45%do total. Ora, aconteceu algoque Fidel Castro e seuscompanheiros não tinhamesperado, nem muito menosplanejado: a defecçãomassiva e fuga para osEstados Unidos de entre15% e 20% da populaçãobranca da ilha, maiormentea burguesia e uma parteenorme da classe mediacubana. Assim Fidel Castrocomeçou a mexer naestrutura agrária de Cuba,ou a falar da necessidade de redistribuir a renda nacional de uma maneiramais equitativa, aqueles que o levaram ao poder – ou seja, a burguesiabranca Cubana da qual ele era parte – se virou contra ele e se colocou aoserviço dos americanos. Foi isso o que aconteceu. Assim, a fuga para oexterior de entre 15% e 20% da população branca, entre 1959 e 1962, produzuma extraordinária revolução demográfica em Cuba, e deixou a Fidel umamaioria negra nas mãos. O país passou, em quatro anos, de uma maioriabranca para uma maioria negra que, a partir daí continuou a crescer. Ouseja, que Fidel Castro nunca tinha sonhado, ao iniciar a Revolução, que eleterminaria estando à frente de uma nação negra! Aqueles que conhecem ahistória de Cuba sabem que esse tem sido o pavor da população branca emCuba ao longo dos séculos, e que ele tem sido rotulado como “Peligro Negro.”Ora, no meio de todas essas transformações, o movimento negro pré-existente à Revolução, começou a exigir a sua inclusão na direção política.Mas o medo aos negros como tal foi mais forte entre a direção castrista queseu ânimo de mudar a sociedade. Muitos revolucionários Marxistas ficaramtraumatizados diante da nova situação e reagiram com inusitada vigorcontra qualquer manifestação de Negritude por parte dos revolucionáriosnegros. A repressão se abateu sobre o que havia em Cuba como MovimentoNegro, e seus lideres foram forçados ao exílio, ou internados nos campos de

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trabalho forçado, ou destruídos nos hospitaispsiquiátricos onde lhes foram administradassubstâncias químicas que destruíam seuraciocínio. Tal foi o caso horrível do maiorideólogo negro cubano: Walterio Carbonell. ODr Juán René Betancourt Bencomo, dirigentenacional de todos os grêmios negros(Sociedades de Cor), salvou a vida, fugindopara o exterior, onde morreu pouco depois.Na realidade, poucos foram os intelectuais,artistas ou acadêmicos dissidentes negros –como Manolo Granados, Enrique Patterson,ou Reinaldo Barroso – que puderam fugirCuba. No que se refere a mim, após ter sidodetido, e, logo depois de ter sido internadonum campo de “reabilitação” (eu não conhecia experiência dos terríveis campos UMAPque conheceram os outros), logrei fugir paradentro da embaixada da Guiné, e, sob aproteção diplomática de quatro embaixadasda África, fui tirado de Cuba, em novembrode 1963. A partir daí, começa uma luta dura,de fora, contra o Estado cubano que durou

Fidel Castro, CheGuevara e Raúl Castrotinham sido elevados aoestatuto de Deusesgregos. Ninguém quetivesse idéias diferentesaos deles tiveram odireito de ser ouvidos.Nós, dissidentesrevolucionários negros,devíamos nos prostrardiante deles de maneiraobsequiosa, submissa ecovarde, ou seresmagados. Então,fomos detidos, enviadospara as cárceresabomináveis que o re-gime já tinha aberto, oupara os diferentes cam-pos de trabalho forçadoque já existiam no país,ou enviados para adestruição mental noshospitais psiquiátricos.

trinta e quatro anos, e nela quase perdi avida. Nem sei como foi que escapei àdestruição. E, no final dos anos noventa,quando o regime castrista já tinhaperdido o apoio do império soviético, eque a situação interna tinha-se voltadobastante convulsa por causa da criseeconômica, o regime cubano deu umameia-volta e me autorizou a voltar. Oregime me restituiu o passaporte e meautorizou a visitar o país, mas não morarnele. Eu, até hoje, não tenho o direito demorar no meu próprio país. E continuosob alta vigilância dos serviços secretosde Cuba, mesmo no Brasil. Mas, mesmoassim, não calei, nem calarei a boca. Éessa, em resumo, a história que eu contoem Pichón.

GI- Que outros textos e livros o Senhor jálançou no mercado internacional quepodem nos auxiliar na compreensão dodilema racial brasileiro?CM- Todos os meus trabalhos tratam dealgum aspecto da questão racial, ou daluta emancipadora dos povos africanosou da origem africana de todos os povosdo planeta. O meu primeiro trabalho nãofoi propriamente um livro, mas um longoensaio sobre a questão racial e aRevolução cubana. Ele foi publicado, emParis, em 1965, pela revista PrésenceAfricaine, sob o titulo: “Les Noirs-ont-ilsleur place dans La Révolution Cubaine?”(Qual o lugar dos Negros na RevoluçãoCubana?). Foi esse documento quedeflagrou a guerra aberta com o regime eque me valeu às acusações, pelo regimecubano e seus seguidores, de ser um“agente do imperialismo” e um “agente daCIA”. Ora, o meu primeiro livro sobre essesproblemas só foi publicado em 1970: WereMarx and Engels Racists? (Marx e Engelseram racistas?). Foi a minha primeiraanálise teórica da questão racial sob aótica do que os fundadores do marxismotinham dito sobre a questão racial. Claro,esse trabalho foi condenadomassivamente pelos marxistas e osesquerdistas porque a tese quesustentava essa obra se resumia àconclusão de que o marxismo carecia debases teóricas para compreender oracismo e muito mais para resolvê-lo. Osegundo livro, This Bitch of a Life (EstaPuta Vida), publicado em 1982, foi abiografia de Fela Kuti, o grande líderpanafricanista e compositor nigeriano. Euqueria que a mensagem desseextraordinário líder e artista atingisse oresto do mundo. O terceiro livro, Castro,the Blacks and Africa (Castro, os Negros ea África), publicado em 1989, é a primeiraanálise profunda da questão racial emCuba sob a Revolução. Nele, analiseiimpacto da situação racial interna sobrea política internacional de Cuba,especificamente voltada para ocontinente africano. O quarto livro, African

E continuo sob altavigilância dos serviçossecretos de Cuba, mesmono Brasil. Mas, mesmoassim, não calei, nemcalarei a boca. É essa, emresumo, a história que euconto em Pichón.Presence in the Americas (A PresençaAfricana nas Américas), publicado em 1995, euma coletânea de textos, sendo um dofundador do movimento da Negritude, AiméCésaire, falecido na Martinica em 2008. Oquinto livro, From Comecon to Caricom (DoComecom ao Caricom), é também umacoletânea de textos, publicado em 1999,analisando a situação de Cuba após a quedado mundo Comunista. O sexto e sétimo livros,Racismo & Sociedade e A África queIncomoda, foram publicados respectivamenteem 2007 e 2008, no Brasil. Essas duas obrassão as únicas que se encontram disponíveisem Português. O oitavo livro é Pichón; Raceand Revolution in Castro’s Cuba (Pichón: Raçae Revolução na Cuba castrista), lançado nosEstados Unidos em novembro de 2008. Ele éparte de uma trilogia que narra osacontecimentos no mundo dos últimos 50anos, na perspectiva de um militante negro. E,nestes momentos, estou terminando A últimaFronteira do Ódio, que é uma análise históricado racismo que prolonga e expande asreflexões iniciadas em Racismo & Sociedade.Acho que uma vez terminada essa últimaobra, mas aquelas duas outras que pertencemà trilogia iniciada com Pichón, vou dar umaparadinha. Ou seja, resumindo: ainda tenhotrês obras a terminar. Acho que após terterminado essas três últimas obras, tereicumprido com a minha “missão” no sentidopolítico e humano.

GI- O Senhor foi publicado em livro,recentemente, em português. Um dos desseslivros é Racismo e Sociedade: novas basesepistemológicas para entender o racismo(Mazza Editora). O Senhor aborda o Racismo ea Escravidão como elementos que não tem amesma origem histórica. Fica evidente seuobjetivo de rediscutir esses conceitos a partirde novos paradigmas. O senhor poderia nosresponder duas questões: a) qual o objetivo ecomo nasceu o projeto deste livro no Brasil; b)como o Senhor coloca, categoricamente, osconceitos acima destacados?CM- Acho que os militantes, particularmente,deveriam reservar um pouco do seu tempopara se documentar sobre algo tãoimportante como o surgimento e evolução doracismo na história. É disso que trata Racismo& Sociedade. A idéia do livro surgiu de umpedido por parte de Eliane Cavalleiro e de

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Luiza Bairros, ambas militantes de primeiralinha do movimento negro brasileiro. Eu vinhadiscutindo dessas questões com a Luiza, como Silvio Humberto dos Passos Cunha, com oDurval Azevedo, e outros, desde a minhachegada no Brasil. Luiza pensou que eranecessário que eu entregasse à sociedade oresultado das minhas pesquisas de váriasdécadas na Ásia, no Pacífico e na Europa, eassim discutiu com a Eliane Cavalleiro sobreisso. Nesses momentos, Eliane estava nafrente da SECAD, o órgão do Ministério deEducação encarregado de fazer cumprir a Lei10.639/03. E o livro se fez graças aofinanciamento desse órgão e da Casa dasÁfricas, dirigida pela professora DanielaMoreau. O Instituto Steve Biko, sob a direçãodo professor Silvio Humberto, acolheu oprojeto, e negociou diretamente com a SECADpara levá-lo à materialização. Mas, para se euresumir as conclusões que eu proponho nessaobra, o faria da maneira seguinte: a) o racismoé uma secreção histórica, portanto um dadopermanente da sociedade, e não umaconstrução ideológica facilmente reversível,nem muito menos uma aberração psicológica;trata-se de uma forma de consciênciahistoricamente conformada que, ao longo dosséculos, se tornou num sistema perfeitamenteracional, baseado na procura, detenção edistribuição monopolística dos recursos dasociedade e na sua repartição seletiva edesigual segundo o pertencimento a um ououtro “segmento fenotípico” (raça); b) oracismo é um sistema de poder total, que seexerce por meio do controle, tambémmonopolístico, das instâncias políticas dasociedade, o qual permite à raça dominanteditar as regras de como deve funcionar aeconomia, e por tanto, de como devem serdistribuídos os recursos: para o beneficioexclusivo ou preponderante do segmentofenotípico que usufrui do poder, e para odetrimento total daqueles segmentosfenotípicos que são excluídos dele; c) oracismo, portanto, não é unicamente umproblema de relações interpessoais, nem devalores morais ou religiosos, e muito menos desimples preconceitos, mas um sistemacoerente de dominação, com uma enormelongevidade que lhe permite ser elástico,totalmente transversal e abrangente; elefunciona maravilhosamente bem para a raçaque o desenhou, e só é negativo para a raçaque sofre seu impacto pulverizador eesmagador; d) o racismo se baseia numarealidade concreta e real, não imaginada: ofenótipo dos humanos; portanto raça existe ese define concretamente, mas não no sentidoda biologia genética, e sim no sentido dainterpretação política e social que se faz dofenótipo de certas populações humanas emrelação às outras, e cuja interpretação seencontra fixada no imaginário por via deprocessos complexos de simbologização.Desse modo, chegamos à conclusão que,contrariamente ao que temos por costume depensar, a escravidão racial que foi imposta nasAméricas, os tráficos negreiros, o aviltamentoda raça negra, não produz o racismo, senãoque, pelo contrário, foi a preexistência doracismo - surgido em várias regiõesgeográficas, sem conexão uma com as outras,ou seja, em várias civilizações diferentes do

mundo - que deu como resultado o surgimento daescravidão racial, fenômeno singular na históriana medida que só foi conhecida pelas pessoas deraça negra. Há que entender bem que nãoestamos falando somente da escravidão comocategoria econômica, generalizada ou parcial, eque a conhecera praticamente todas associedades produtoras de excedente naantiguidade, mas daquela escravidão impostaexclusivamente aos povos de raça negra,precisamente por serem negros, e por causa doseu pertencimento a um segmento dahumanidade facilmente reconhecível pelos seustraços fenotípicos. A raça é questão de fenótipo, eo racismo também. Como argumentar, então, quea escravidão imposta aos africanos, pelos árabes,a partir do século VIII, e pelos europeus, à partirdo séculos XVI, fora racialmente neutra? Apesquisa histórica derruba essa visãoreconfortante, mas simplista demais. Essas sãoalgumas das conclusões apresentadas emRacismo e Sociedade.

GI- Outro lançamento recente emPortuguês é A África que incomoda:sobre a problematização do legadoafricano no quotidiano brasileiro (Ed.Nandyala). Qual o objetivo destetrabalho? Com que platéia este livropretende dialogar?CM- O objetivo desse livro é chamara atenção da população negrabrasileira, especialmente seusquadros intelectuais e políticos,sobre a necessidade urgente decomeçar a se familiarizar com aÁfrica concreta, pois é essa a Áfricaque está na mira das multinacionaischinesas, americanas, japonesas,européias, indianas e brasileiras. Háque compreender a posição daÁfrica no mundo, e compreender opapel crescente do Brasil nessemundo, para não acordar um diacom uma grande surpresa:descobrir que estamos dentro derelações perfeitamente neo-colonialistas com o nosso própriocontinente ancestral, e que nósmesmos somos os instrumentos deum novo imperialismo que não seria desta vez oimperialismo norteamericano. O Brasil estáemergendo como grande potência no mundo, aolado da China, da India, do Irã, da Turquia e doPaquistão e devemos começar desde já a tornaros olhos para todas implicações, internas eexternas, dessa expansão brasileira. E o outrolado da moeda é a análise que devemos fazer noque diz respeito às elites oligárquicas quedominam a vida dos povos africanos de maneiratão desastrosa e prejudicial para todo ocontinente. Há que estar cientes dessasrealidades todas e não se deixar arrastar nempela ingenuidade, nem pela emoção, nem pelochauvinismo nacionalista. Há que olhar para ofuturo, interrogar o passado, e delinear o contornodo nosso presente, tudo ao mesmo tempo. Achoque os intelectuais e investigadores estão lá paraalertar à sociedade sobre os perigos que elacorre. Os intelectuais não devem se deixarintimidar pelos governos, nem pelas instituiçõesoficiais, e devem, sim, em todas as circunstâncias,exercer uma função crítica.

GI- Em todo o Brasil, o Senhor tem feito palestras,

conferências e cursos que envolvemquestões ligadas ao panafricanismo eà história do movimento social negrono mundo. Que conteúdos são maissolicitados ao Senhor pelos produtorese expectadores nesses eventos? Comoo Senhor avalia essas necessidadesintelectuais, principalmente dosativistas do movimento social negro?GM- A meu ver, o problema fundamen-tal aqui, no Brasil, como em todas asAméricas, especialmente em Cuba, é oproblema da convivência entre asraças, a existência da opressão racial,das discriminações em base à raça.Enfim, toda a problemática essa quegira em torno da pretensão de umgrupo de humanos a monopolizar osrecursos em detrimento de todos osoutros, sob o argumento que elerepresenta um segmento superior daespécie humana, e que todos nós não

somos senão subespécies destinadasa servir de escravos, babás, serventes,seguranças, e todo o resto quesabemos. É disso que se trata nasminhas palestras, nas quais trato deexplicar a questão racial a partir deuma perspectiva histórica, e nãosomente como uma questão deconjuntura. Acho que as mentes estãose abrindo, no Brasil, comoconseqüência de dois fatores: a açãoque vem desenvolvendo o MovimentoNegro desde há varias décadas, e asmedidas positivas que tomou ogoverno Lula desde que tomou opoder. Sabemos que são medidastímidas, considerando a dimensãogigantesca do problema a serresolvido, mas são passos na boadireção que um regime revolucionáriocomo o de Cuba não se atreve ainda adar.GI- Professor Carlos Moore, o Senhorconviveu, irmanadamente, com um dos

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artistas populares mais criativo e polêmico de toda ahistória: o nigeriano Fela Anikulapo Kuti. Destaconvivência surgiu um livro de sua autoria chamado ThisBith of Life (algo como Esta Puta Vida). Onze anos apóssua morte, Fela Kuti vem sendo redescoberto em todos oscontinentes. É considerado, hoje, uma espécie de "BobMarley" do Continente Negro. Na França e Inglaterra, estáem alta, com direito, inclusive, a grandes exposiçõestemáticas. Nos EUA, entre tantas ações, teve, no últimodia 04 de setembro, a estréia de uma peça baseada noperfil do artista no Off Broadway Theater, a ante-sala daBroadway, para onde a peça seguirá com certeza. Sabe-se que, no mundo, apenas a partir da biografia de suaautoria, entre 15 e 20 trabalhos, principalmente em áudio-visual, vem representando a trajetória de Fela. De minhaparte, penso que o seu livro, dentre outros, é vital paraoxigenar a arte e o ativismo negro no Brasil,principalmente na cultura que participo maispontualmente: o hip hop. Qual a real importância dahistória musical e política de Fela, o que significa para oBrasil conhecer mais a fundo sua experiência radical?CM-Em uma palavra: não se pode realmente pretenderser culto, e muito menos culto nas questões do MundoNegro, sem conhecer a obra e o pensamento de Fela Kuti.Fela foi um dos grandes ativistas e pensadores dopanafricanismo no século XX. O que o distingue dosoutros pensadores panafricanistas é que ele desenvolveua luta panafricanista não no contexto da luta peladescolonização, mas dentro da problemática complexa eterrível que representa a sociedade africana pós-colonial;ou seja, uma sociedade controlada, oprimida e esmagadanão diretamente pelas potências européias ou porregimes minoritários brancos, como na África do Sul ouna Rhodesia (atualmente o Zimbábue). O Fela teve dedesenvolver o panafricanismo no contexto da opressãodos africanos pelas oligarquias e as elites africanassurgidas da independência do continente. Ninguémestava preparado para o que aconteceu após aindependência: a chegada ao poder de oligarquiastraidoras e assassinas que espertamente confiscaram opanafricanismo e o transformaram em uma ideologia deEstado, para servir os interesses bastardos das novaselites opressoras africanas. O Fela teve de repensar opanafricanismo tradicional e reformular as bases de umnovo panafricanismo de luta pelos interesses dos povosafricanos esmagados do continente e nas diásporasafricanas. Ele foi um gigante e usou seu poder criativo,como músico, para propagar essa nova orientaçãoideológica do panafricanismo. É por isso que me juntei aele e que estimei que havia que escrever um livro sobresua vida. Eu queria que o mundo inteiro ouvisse amensagem que carregava na sua musica maravilhosa enos seus pronunciamentos. Esta Puta Vida irá sertraduzida e publicada, também no Brasil, o ano que vem. Apartir daí, as pessoas se darão conta da grandeza dopersonagem, e de sua imensa contribuição ao MundoNegro, ao mundo das artes e à musica em geral. Parapaíses como o Brasil, com sua maioria negra, conhecer aobra de Fela é indispensável para o fortalecimento daconsciência cultural. Além disso, a música de Fela é umadas coisas mais belas do mundo. É por isso que soliciteiao Gilberto Gil de se incumbir do prefácio de This Bitch ofa Life, que será publicada nos Estados Unidos em abril de2009. O Gil fez um lindo, profundo e comovedor prefácio -realmente. E, dentro de alguns meses, essa biografia deFela Kuti, com o prefácio de Gil, também será publicadono Brasil, em português, pela editora Nandyala, de MinasGerais.

GI- Como o senhor recebeu a notícia do falecimento de

AleAleAleAleAlex Hx Hx Hx Hx Halealealealealeyyyyy & C & C & C & C & Carararararlos Mlos Mlos Mlos Mlos Moorooroorooroore & e & e & e & e & Aimè CésairAimè CésairAimè CésairAimè CésairAimè Césaireeeee

Em umapalavra: não se

pode realmentepretender serculto, e muito

menos cultonas questões

do MundoNegro, sem

conhecer a obrae o pensamento

de Fela Kuti.

Fela Kuti.

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seu amigo e parceiro, o poeta e ativista Aimé Cesáire,fundador do Movimento da Negritude? Recentemente,foi publicado o Discurso sobre a Negritude a partir doregistro de um colóquio que o Senhor organizou. Apesardo termo Negritude ser um estandarte entre osmilitantes do movimento social negro no Brasil, poucosconhecem a obra poética e filosófica de Césaire . Hoje,no Brasil, cresce de maneira vertiginosa um movimentoliterário que tenho chamado Literatura Divergente, masque também tem recebido os rótulos de LiteraturaMarginal, Periférica, Maloqueirista, etc. O Senhor podenos instruir um pouco sobre o poeta Césaire? Como oSenhor avalia a importância que teve a literatura noprocesso da Negritude e qual pode ser o potencialpoético e político dos escritores que fazem estemovimento que citei, oriundo dos bolsões de misérias eracismo do Brasil?CM- Claro, foi um momento de tristeza para mim, comomilitante, mas também como alguém para quem oCésaire sempre foi como um pai. Césaire me ajudou navida, ao longo de mais de quatro décadas e, junto com oAbdias Nascimento, foi um dos meus maiores amigospessoais e aliados políticos. A obra de Aimé Césaire,como a obra de Cheikh Anta Diop, é fundamental paratodos, brancos e negros, que se interessam realmentepela problemática racial. A Negritude foi o movimentomais revolucionário que tivemos até agora, na definiçãodos parâmetros da luta contra o racismo. Cada qual,nas condições que são as suas, tem adaptado aNegritude de Césaire às condições específicas do seucontexto. Por exemplo, a Negritude foi trazida paradentro do Brasil pelo Abdias Nascimento e outros que,nos anos trinta e quarenta, militavam com ele. Na Áfricado Sul, foi Steve Biko quem adaptou a Negritude deCésaire às condições de lá, chamando-a “ConsciênciaNegra”. E nos Estados Unidos foram os intelectuais daHarlem Rennaissance (Countee Cullen, LangstonHughes, Claude McCay), e, muito mais tarde, osmilitantes do Black Power (Poder Negro), queassumiram a bandeira da Negritude e que osintetizaram nas palavras: Black is Beautiful! Naatualidade, a Negritude de Césaire está sendoreelaborada pelo movimento Hip-Hop mundial, e estáatingindo os jovens do mundo inteiro, sejam negros ounão: todos aqueles que desejam uma mudança funda-mental da sociedade na direção da cooperaçãosolidária e o fim do racismo. O grande sucesso daNegritude de Aimé Césaire se encontra, justamente,nesse fato: se trata de uma visão que já alcançou todo oplaneta, implicando-nos todos. A Negritude é de todos,para evolucionar como seres humanos, e paraestabelecer sociedades justas. Mas o fato de Césaire tersido um dos maiores poetas do século XX nos conduz aoutra dimensão do problema do mundo negro, universodominado de maneira marcante pela oralidade. Omundo da oralidade tem sido reduzido pelo Ocidente aum mundo de inferioridade, pois só a expressão escritateria valor. As elites negras que assumiram o poder nosdiferentes países africanos acreditaram nessapostulação racista e, conseguintemente, abandonaramas línguas africanas e as tradições de oralidade dasnossas civilizações; eles privilegiaram as línguaseuropéias estrangeiras e as tradições da escrita,elevando estes a uma posição de hegemonia total.Césaire compreendeu que se tratava de uma decisãotrágica que condenava os povos africanos a umasituação de inferioridade de fato diante do mundoocidental dominante. Ele reagiu, e inventou a Negritude,que nasceu de um gesto poético. A poesia é o modofundamental por meio do qual uma sociedade queprivilegia a comunicação oral para transmitir seusfundamentos éticos, filosóficos e morais, se perpetua

organicamente. É isso que o Césaire tinha compreendido, bem antes quequalquer outro: que a nossa tradição de oralidade, desde os tempos do Egitofaraônico até os dias de hoje, não deveria ser desestimada nem abandonada.Césaire viu que a poesia desempenha, nas nossas sociedades, um papelorgânico fundamental, na medida em que ela nos permite fundir as diferentesdimensões e aspectos da verdade social: a informação, a formação, atransmissão dos valores morais, e a expressão dos sentimentos: de amor, deamizade, de revolta, de ira, de generosidade, de perdão, de solidariedade.Devemos aproveitar as vantagens da escrita, pois ela ajuda a preservar amemória histórica e é um instrumento maravilhoso para a transmissão doconhecimento tecnológico, mas sem abandonar a oralidade, pois esta é, emultima instância, o modo de comunicação entre humanos que nos obriga aentrar em contato com o nosso próximo da maneira mais imediata que seja: afala. A poesia nos permite nos enraizar no humano através de uma capacidadeque nenhum outro animal tem: a capacidade de falar. Ou seja, que, para associedades e civilizações africanas – o chamado Mundo Negro - a poesia é ummodo orgânico de comunicação privilegiado para reinventar a sociedade. Achoque é por isso que a tradição Hip-Hop/Rap tem tido um impacto tãorevolucionário no mundo, pois ele chega ao povo diretamente, de boca a orelha,através da expressão poética ligada à música.

GI- Professor Carlos Moore, como o Senhor avalia a abrangência política de suarecente Carta Aberta ao Presidente de Cuba? Como estão os desdobramentosda questão?CM- Em primeiro lugar, a Carta Aberta ao presidente-General Raúl Castro Ruztinha vários objetivos, todos os quais foram atingidos. O primeiro era darpublicidade a algumas das demandas específicas que estão surgindo dedistintos setores da população negra. O segundo era testar as intençõesverdadeiras do governo raulista; veremos isso nos meses que vem. Porenquanto, este último fala de “reformas”, mas cada vez que anunciam novasmedidas, essas são puramente cosméticas. Nada tem sido feito pelos raulistasque signifique uma verdadeira mudança de rumo na direção dodesmantelamento das estruturas totalitárias, racistas e oligárquicas quealicerçam o regime. Absolutamente nada! O outro objetivo era impedir que ogoverno cubano continuasse desenvolvendo a farsa demagógica que consisteem insistir no fim do embargo/bloqueio americano, mas sem contemplar o fimdo embargo/bloqueio instituído pelo regime, desde 1959, sobre a populaçãomajoritária do país. E, por último, pensei que era o momento de oferecer idéiasnovas susceptíveis de contribuir a iniciar um processo de mudançasverdadeiras, caso a equipe raulista quisesse encontrar uma saída consensual ásituação cada vez mais bloqueada que conhece Cuba. A situação racial emCuba é o problema fundamental da nação, e essa situação está se agravando.Como sempre, as ditaduras estimam que elas podem conter eternamente opovo que dominam por meio do terror. Mas a história nos ensina que o terrorfunciona até certo ponto, e logo, um dia, o povo não teme mais asconseqüências. Essas são as razões que me moveram a dirigir essa CartaAberta ao presidente cubano. Não há outras razões, pois eu não tenho nenhuminteresse político, nem agora nem para o futuro, que não seja ser um merocrítico social. Não tenho nenhuma agenda secreta. Quero, sim, voltar para meupaís, e poder viver lá livremente e contribuir, como um intelectual crítico, àreconstrução de Cuba segundo um modelo democrático que preserve asconquistas sociais do povo cubano. É isso que eu quero; não a volta do passadohorroroso, mesmo que seja sob um capitalismo ao estilo da China, nem acontinuação do presente infernal, sob um comunismo bastardo e ineficiente,que tolera a proliferação das desigualdades sócio-raciais e mantém asestruturas racistas em pé.

GI- Professor Carlos Moore, muito obrigado pela entrevista!

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Ou seja, que, para associedades ecivilizações africanas– o chamado MundoNegro - a poesia é ummodo orgânico decomunicaçãoprivilegiado parareinventar asociedade. Acho que épor isso que a tradiçãoHip-Hop/Rap tem tidoum impacto tãorevolucionário nomundo, pois ele chegaao povo diretamente,de boca a orelha,através da expressãopoética ligada àmúsica.

Malcolm X & Carlos Moore

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