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    COMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE - CMF

    CORRESPONDÊNCIACOMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE

    Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho

    Rua do Giz (28 de Julho), 205/221 – Praia Grande CEP 65.075–680 – São Luís – Maranhão

    Fone: : (0xx98) 3218-9924

    As opiniões publicadas em artigosassinados são de inteira

    responsabilidade de seus autores,não comprometendo a CMF.

    BOLETIM DA CMF Nº 38

    DIRETORIA

    Presidente: Maria Michol P. de Carvalho

    Vice-presidente: Roza Maria SantosSecretária: Nizeth Aranha Medeiros

    Tesoureira: Lenir Pereira dos S. Oliveira

    CONSELHO EDITORIAL:

    Carlos Orlando de Lima

    Maria Michol Pinho de Carvalho

    Mundicarmo Maria Rocha FerrettiRoza Maria Santos

    Sérgio Figueiredo Ferretti

    Zelinda de Castro de Lima

       S   U

       M   Á   R   I   O

    EDIÇÃO:Maria Michol P. de CarvalhoMundicarmo M. R. FerrettiRoza Maria Santos

    REVISÃO DE TEXTO:Antonio Regino de Carvalho Neto

    VERSÃO PARA A INTERNET:www.cmfolclore.ufma.br 

    ISSN: 1516-1781 AGOSTO 2007

    CNPJ 00.140.658/0001-07

    EDITORIAL .............................................................................................................................................................................. 2

    Semana de cultura popular 2007................................................................................................................................................ 2O cuxá ......................................................................................................................................................................................... 3Zelinda Machado de Castro e Lima

    O Cuxá na cultura maranhense e seu registro como patrimônio cultural brasileiro ............................................................... 6Mundicarmo Ferretti 

    A cultura local através do artesanato. Cultura popular ou folclore: arte ou artesanato? ......................................................... 8Francisca Ester de Sá Marques 

    Turismo Cultural: ecos da memória e do patrimônio ................................................................................................................ 9Karoliny Diniz Carvalho 

    O Folclore arrozeiro .................................................................................................................................................................. 11

    Maria de Fátima Sopas RochaMigração religiosa do pentecostalismo para a umbanda ......................................................................................................... 15Paulo Jeferson Pilar Araujo 

    Vamos brincar de boneca ou dançar tambor de crioula? ......................................................................................................... 17Maria do Socorro S. Aires 

    JANELA DO TEMPO: Festa de São João .............................................................................................................................. 19FulgencioPinto 

    Culinária Maranhense: receitas tradicionais .......................................................................................................................... 21Mundicarmo Ferretti 

    NOTÍCIAS ............................................................................................................................................................................... 22

    Roza Maria dos Santos PERFIL POPULARRaimunda Menezes de Aguiar - Diquinha .............................................................................................................................. 24 Josimar M. Silva

    ENCARTE – Doçaria e culinária maranhense: receitas (reprodução)

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    Boletim 38 / agosto 200722

    EditorialO número 38 do Boletim de Folclore  traz o sabor da culiná-maranhense e, como não poderia deixar de ser, do cuxá .

    sa ênfase foi desencadeada pela tramitação do pedido degistro do cuxá como patrimônio cultural nacional, encami-ado ao IPHAN pela CMF, em 2005. Mas tem muito a verm a temática central da Semana do Folclore 2007 , promovi-pela Superintendência de Cultura Popular da Secretaria detado da Cultura, cuja programação foi aqui apresentada.

    m decorrência disso, o trabalho de Josimar Silva sobre Diqui-a, uma das grandes especialistas em comida típica do Mara-ão, publicado em Perfil Cultural, e 50% dos artigos e notíci-incluídos nesse número giram direta ou indiretamente em

    rno daquele “carro chefe” da culinária maranhense que àszes aparece também como “arroz de cuxá”, tanto em relatosdocumentos de tempos que já se foram como nos atuais,mpre como um pirão  de farinha de mandioca com camarão,nagreira e gergelim, servido com arroz branco e peixe frito ee, portanto, não pode ser confundido com o “arroz de batipu-” ou “arroz de vinagreira” - risoto encontrado em alguns res-urantes típicos de São Luís com a denominação “arroz dexá”.

    O artigo de Fulgencio Pinto sobre Festa de São João, publi-do na seção “Janela do Tempo”, faz a ligação com o númeroterior. Os trabalhos de Ester Marques, sobre artesanato, e de

    aroline Carvalho, sobre turismo cultural, nos convidam a umaflexão sobre o lugar e a importância da cultura popular.

    Zelinda Lima e Mundicarmo Ferretti tratam especificamen-sobre o cuxá: o que é, quais os seus ingredientes, como seepara, qual o seu contexto antropológico e como ele é conhe-do por pessoas de diversas faixas etárias, níveis de renda e deferentes regiões do estado.

    Fátima Sopas discorre em seu artigo sobre um produto deande importância na alimentação do maranhense e extrema-

    ente associado ao cuxá, o arroz, daí porque aquele pratoico, feito basicamente com vinagreira, gergelim, camarão erinha de mandioca, é também conhecido por “arroz de cuxá”,

    m alusão ao seu acompanhamento indispensável, o arroz bran-.

    Nesse número do Boletim foram fornecidas receitas de cuxá,arroz de batipuru e de algumas bebidas tradicionais na culi-ria maranhense, inclusive a do mocororó, que já foi muitondida em São Luís e que parece ter desaparecido. Essa bebi-, no entanto, levada no passado para o Amazonas, por mães--santo, é hoje tomada ritualmente em terreiros de mina ama-nenses ligados à tradição do Maranhão. Nessa edição estando também distribuído um encarte com receitas fornecidasExposição sobre Doçaria e Culinária Maranhense , organiza-

    em São Luís, pela Fundação Cultural, hoje Secretaria detado da Cultura, com apoio de várias instituições, no período20 a 30 de agosto, de 1976.Várias notícias transmitidas por Roza dos Santos mostram a

    uação de técnicos, instituições e “mestres de cultura” do Mara-ão e de outros estados em prol do reconhecimento da culturapular, e algumas delas atestam o apoio da comunidade mara-ense ao pedido de registro do cuxá como patrimônio culturalcional.

    Saindo um pouco da culinária, o Boletim nº 38 da CMF trazis artigos sobre as relações entre religiões afro-brasileiras etras religiões no Maranhão: o de Paulo Jéferson Araújo, quersa sobre pentecostalismo e religião afro-brasileira (“duplo per-ncimento” e mudança de uma dessas religiões para a outra); e

    de Socorro Aires, que trata sobre rituais de cura/ pajelança eas relações com o tambor de mina no Terreiro Fé em Deus, emo Luís.

    ERRAMOS

    Boletim 37 – Janela do Tempo, p. 14, nota 25. Após a pala-a original deveria ter sido acrescentado: publicado em Sema-ário Maranhense, São Luís, 05/07/1868, Ano I, nº 45, p. 7-8.

    20 de agosto (segunda-feira)Dia do Visitante

    09:00 às 19:00 h -Abertura excepcionalpara visitação da Casa da FÉsta, Casade Nhozinho e Casa do Maranhão

    Casa da FÉsta/Centro de CulturaPopular Domingos Vieira FilhoAbertura da Semana da Cultura Popu-lar 200718:00 h - Abertura da Exposição Foto-gráfica  “Pra comer com os olhos: ocofo e o cuxá” (com fotografias deMargareth Figueiredo e cofos do acer-vo da Casa de Nhozinho)Demonstração do processo de confec-ção do cofo Paracafu, por Arlindo Sou-za (de Santo Amaro do Maranhão)19:00 h – Mercado do Giz (com exposi-ção e venda de comida, bebida e arte-sanato)Participação da Associação de Feiran-tes da Praia Grande19:30 h  – Apresentação dos repentis-tas Antonio Joaquim dos Santos (deCaxias), Antonio Raimundo da Silva (deTimon) e Tibúrcio Bezerra (de São Luís)20:00 h – Show “Sotaque Maranhensena Arte de Cozinhar”, com WellingtonReis e José Ignacio

    Galeria Zelinda Lima e Pátio ValdelinoCécio

    21 de agosto (terça-feira)Casa do Maranhão14:00 às 17:00 h – Oficina de Paracafu:um cofo especial com o artesão ArlindoSouza (de Santo Amaro do Maranhão)

    Casa da FÉsta/Centro de CulturaPopular Domingos Vieira Filho17:00 h – Exibição de documentáriossobre o Cuxá, da CMF e do SESC/MARoda de Conversa “Folclore no prato”,com participação de Maria RaimundaAraújo (coordenadora), José Inácio Mo-raes Rego, Zelinda Lima, Fátima So-pas e Elir Jesus Gomes (expositores) eAdmée Duailibe e Nizeth Aranha (de-batedoras)19:00 h – Dança do Lili e outras danças(de Caxias)Auditório Rosa Mochel e Pátio Valdeli-no Cécio

    22 de agosto (quarta-feira) – Dia In-ternacional do FolcloreCasa do Maranhão

    17:00 h – Roda de Conversa “A Lei dosMestres e o Projeto Tesouro Vivo”, comparticipação de Ester Marques (coor-denadora), prefeito de São Luís TadeuPalácio, Clay Lago, Joãozinho Ribeiro,Adirson Veloso, vereador Joberval Ber-toldo e deputada Helena HeluyHomenagem aos “Mestres do Ano” comentrega de placa e de prêmios a doismestres pelo Serviço Social do Comér-

    SEMANA DA CULTURA POPULAR 2007 TEMA: “DO COFO AO

    PRATO: COMIDA MARANHENSE QUE DÁ ÁGUA NA BOCA”PROGRAMAÇÃO

    20 a 24 de agosto de 2007

    cio-MA e pela Fundação Municipal deCultura

    Lançamento de Concurso de Redaçãosobre os ofícios dos mestres homena-geados18:30 h – Comédia e Serê (de CentroGrande/Axixá)20:00 h - Show musical com o GrupoUrubu MalandroLançamento da edição nº 03, do Jornal“Na Ponta do Giz”, da Superintendên-cia de Cultura Popular / SECMA - Sa-lão de Eventos

    23 de agosto (quinta-feira)Casa da FÉsta/Centro de CulturaPopular Domingos Vieira Filho17:00 h – Roda de Conversa “Palha &Cia”, com participação de Sonia Espín-dola (coordenadora), Graça Maria Oli-veira, João Carlos Pimentel Cantanhe-de, Marcelo Costa Medeiros e artesãoAntonio Carlos de CarvalhoLançamento do projeto “Nordeste Cri-ativo – I Mostra de Artesanato do Nor-deste” - Auditório Rosa Mochel

    Casa de Nhozinho (entrada pela Ruade Nazaré)

    18:00 h – Espetáculo “Borboletando”,com Carina Nascimento19:00 h – Baião Cruzado, de DonaMaria da Paes (da Vila Ivar Saldanha)20:00 h – Dança do Coco (de RiachoSeco/Rosário) - Área de Convivência

    24 de agosto (sexta-feira)Casa do Maranhão14:00 às 17:00 h – Laboratório de Culi-nária Maranhense, com a Cooperativade Serviços de Gastronomia Típica doBairro do Desterro

    18:00 h – Tambor de Crioula (de SantaRita do Vale/Santa Rita)20:00 h – Conjunto Pau Furado (de Pi-nheiro)Lançamento do Boletim nº 38, da Co-missão Maranhense de FolcloreSalão de Eventos

    De 21 a 24 de agosto (terça a sexta-feira)Casa da FÉsta/Centro de CulturaPopular Domingos Vieira Filho10:00 e 15:00 h – Cine Popular, comdocumentários de Cultura Popular

    Auditório Rosa Mochel

    Projeto Sabença: museu-escolaTema: Bumba-meu-boi13 a 16 de agosto: Unidade Integra-da Alberto Pinheiro – Turno Vesper-tino27, 28 e 30 de agosto: Unidade Integra-da Miguel Lins – Turno Vespertino

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    O CUXÁ1

    Dentre os muitos pratos da variadacozinha do Maranhão, avulta com me-

    recido relevo, o cuxá, tornado já um sím-bolo da hospitalidade maranhense.

    O QUE É:Uma espécie de bobó (esparregado)3

    de folhas de vinagreira, engrossado comFarinha de Mandioca, Gergelim e Ca-marão Seco.

    Vinagreira: Arbusto da família dasMalváceas, originário da África Orien-tal Tropical (Hibiscus Sabdariffa L.) qua-se sempre com cerca de 2 m, folhas den-tadas, flores sésseis, axilares, róseas oupúrpuras, bastante disseminado nos pa-íses tropicais e subtropicais. Tambémconhecido como caruru-azedo , em ou-tros países seus frutos são empregadosno fabrico de geléias e doces.

    Quanto à sua origem, há dúvida so-bre se a vinagreira veio da África ou separa lá foi levada pelos portugueses,“agentes distribuidores de espécies ali-

    mentares com surpreendente eficiência”, como os classifica Câmara Cascudo,acrescentando: “Na proporção que oportuguês familiariza-se com a flora bra-sileira, tenta aclimatar raiz ou frutonuma paragem distante onde tambémestivesse servindo a El-Rei. E conduziaos sabores estrangeiros para a ementa ha-bitual.”

    A intensificação do tráfico de escra-vos naturalmente favoreceu e incentivoua troca de plantas alimentares da Áfricapara o Brasil e daqui para a África, no-tadamente as do gênero Hibiscus , a vi-nagreira (Hibiscus sabdariffa), o quiabode Angola, caruru da Guiné (Hibiscus 

    Zelinda Machado de Castro e Lima2 

    1  Texto encaminhado pela CMF ao IPHAN, em 03/06/05, com pedido de registro do cuxá como patrimônio cultural imaterial brasileiro. Fotos de Margareth Figueiredo.2 Zelinda Machado de Castro e Lima é pesquisadora e estudiosa da Cultura Popular, e autora de “Pecados da Gula, comeres e beberes da gente do Maranhão”.3 Esparregado. Esparregar: Guisar ervas, cozendo-as bem, e depois de picadas, e espremidas, se tempera com molhos etc.4 Araticum.5 Idem.

    esculentos L.). Estudo do Sr. FranciscoTenreiro, citado por Cascudo, informa

    que da América, e principalmente viaBrasil, recebeu a ilha de São Tomé, nogolfo da Guiné, a pimenta malagueta(Capsicum frutescens ), mandioca (Ma- nihot esculenta), abacate (Persea ame- ricana), ananás (Anona muricata), pa-paia (Carica papaya), anona4   (AnonaGlabra), sape-sape5   (Anona muricata),cacau (Theobroma cacao ), cajueiro(Anacardium occidentalis ), tomates ebatata andina. Daí ser difícil estabele-cer com certeza a origem da vinagreira.

    Mesmo porque a África conhecia obobó, o esparregado de folhas diversas.

    Na África Oriental faz-se o esparregadocom folhas de abóbora, mandioca, feijão,batata, gimboa (uma espécie de bredo,Amaranthus Linn.,) mulembo ou kixara-nana (Curchorus olitorius Linn) e naGuiné usam folhas de cito, boabá (Adau- sionia digitata), e os fulas do Gabu utili-zam as ervas bagitx , denominando-o fole- rê . Comumente não fervem as folhas esim esmagam-nas no pilão, obtendo uma

    massa verde, como mingau espesso. Quan-do há sal, temperam com sal, pimenta,esta preparada e posta quando o esparre-gado está quase pronto.

    O chikwangue   sudanês, a essuangabanto, são herdeiros legítimos da mani- oca, com folhas tenras da mandioca. Nosdialetos ganguelas é motombo   e tcha- muanga, que vale dizer “bom”, ensinaLuís Figueira, em Raças e Tribos de An- gola. Como se vê destas descrições, serátemerário dizer se a vinagreira é brasi-leira ou africana.

    Nunes Pereira, sobre os costumes epráticas da Casa das Minas , o mais anti-

    go culto afro-brasileiro de São Luis, ex-plica:

    A vinagreira, conhecida noutras áreas peladenominação popular de azedinha, é bas-tante apreciada e consumida, quer – apóscozimento – misturada ao arroz, quer iso-ladamente; sua determinação científica éHibiscus sardarifera L., pertencendo àfamília das Malváceas. Paul Lê Cointeaponta essa planta com o nome de azeda- da-Guiné . No entanto, tão apreciada comoé, não pode ser consumida em certa fase

    do ano. E, note-se, ela entra no preparodo famoso prato chamado ARROZ-DE-CUXÁ, orgulho da culinária maranhense(PEREIRA, 1979, p. 153)

    Gergelim: Planta anual, o gergelimou zerzelim é uma planta anual da fa-mília das Pedaliáceas, cientificamentechamada Sesamo indicum  L., segundoos botânicos. Tem raízes em forma denabo, caule ereto, cilíndrico, de mais de1 m de altura.

    Das suas sementes, torradas e piladas, desabor apreciadíssimo, é que o referido pra-to maranhense ganha justo renome, pro-veniente do seu já salientado sabor e ines-quecível aroma.Porções de sementes dessa planta, isola-damente ou associadas a camarões secose farinha, dita suruí , são levadas a cozi-nhar, com boa porção de folhas de vina-greira, cozidas à parte, antecipadamente.Também é justo reconhecer-se que, des-sa combinação requintadíssima, resultou

    o mérito do aludido prato regional, sem-pre acrescido se o consomem com a car-ne do peixe-pedra, peixe da família He- mulidae , estudado pelo ictiólogo brasilei-

     Verduras à venda noMercado Central de São Luís

     Verduras à venda noMercado Central de São Luís

    Gergelim à venda na feira

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    CONTINUAÇÃO

    cebola, cheiro verde, pimenta de cheiro,sal a gosto.Torra-se o gergelim e soca-se no pilão, jun-tamente com o camarão, a farinha (se forgrossa deve ser peneirada), a cebola, ocheiro verde, a pimenta e o alho.

    Cozinha-se a vinagreira (sem os talos) se-paradamente e bate-se bem, depois deescorrer a água.Com a mistura pilada faz-se um angu, nofogo, e junta-se, por último, a vinagreira.Servir com arroz branco à maranhense,peixe-frito, torta (fritada) de camarão...

    Do arroz à maranhense , DomingosPerdigão dá a receita:

    Estando a água a ferver, limpa-se o arrozpilado, tirando-lhe todas as impurezas;

    lava-se bem em água limpa e deita-se napanela a ferver, onde se conserva ferven-do por mais cinco minutos, depois do quese escoa a água; deixando uma pequenaquantidade dela, põe-se novamente aolume brando, cobrindo bem a panela edeixa-se cozer até ficar seco e próprio paraservir. Este arroz, também conhecido comoarroz branco , serve para se comer com qual-quer outro alimento, para se temperar comcaldo de legumes cozidos, ou com mantei-ga, constituindo os saborosos pratos – ar- roz de legumes  e arroz de manteiga. No

    Maranhão, o arroz usa-se em todas as re-feições. É o pão do maranhense .

    Este cuxá, prato típico do Maranhãopara o qual pleiteamos o registro comobem cultural imaterial, porque não setrata tão somente de um acepipe comumda culinária maranhense, é nosso retra-to, nossa cara, nossa identidade, resultantedo caldeamento indígena, português eafricano nesta parte do Brasil, entre aAmazônia e o Nordeste, participante de

    ambos e deles tão diferente, “um corposocial e etnicamente à parte”, circunstân-cia que se reflete em sua cozinha, nemnordestina, nem amazônica, o cuxá –único no Brasil - carro-chefe de sua opu-lenta culinária, e que já figurava, em 1889,no Dicionário de Vocábulos Brasileiros do

    Visconde de Beaupaire Rohan, com mi-nuciosa descrição.

    Alvo de pesquisas de antropólogos esociólogos, a exemplo de Câmara Cas-cudo, Nunes Pereira, Mathias RöhrigAssunção e muitos outros; o cuxá  carre-

    ga uma tradição secular afro-brasileira,e tem sido louvado em prosa e verso, hajavista o extenso e apaixonado poema quelhe dedicou Arthur Azevedo, e no qual,do Rio de Janeiro, reivindicava, há maisde século, a naturalidade   maranhensedo cuxá, e do qual transcrevemos o se-guinte trecho6 :

    (...)Porque –deixa que t’o diga –Esse prato maranhenseAo Maranhão só pertence

    E n’outra parte não há.Aqui fazem-no bem feito(Negá-lo não há quem ouse);Mas... falta-lhe “quelque chose”;Não é arroz de cuxá.

    Pois aqui há bom quiaboE bem bom camarão seco;Há vinagreira sem peco;Bom gergelim também há!E o prato aqui preparado,Do nosso mal se aproxima!Acaso também o clima

    Influi no arroz de cuxá?

    Ora, qual clima! qual nada!É o mesmo quitute, creio;Falta-lhe apenas o meio;Nos seus domínios não está.No Maranhão preparado

    Naturalmente aconteceQue sendo o mesmo, pareceSer outro arroz de cuxá.

    Eu, quando o como, revejoEntre a cheirosa fumaça,Passado que outra vez passaCom que eu não contava já;Portanto não me perguntes...Não me perguntes, amigo,Se eu quero amanhã, contigo,Comer arroz de cuxá.(...)

    Portanto, o cuxá não é apenas umprato exótico da cozinha do Maranhão,mas tem um significado que extrapolasua importância culinária para tornar-se quase um estado de espírito, um bra-são de cidadania da gente do Maranhão.

    E por estar, no presente, sofrendocrescente descaracterização, mesmo porparte dos restaurantes que se dizem tí-picos, urge a providência do registro queora pleiteamos. Prato trabalhoso, requer,

    dos que se propõem a confeccioná-lo,cuidado e paciência, amor e dedicação,para fazê-lo nos moldes tradicionais aque deve obedecer. É preciso usar os in-gredientes com maestria, pois o menordeslize pode por a perder o prato.“Quando dá certo, é de se comer de joe-lhos”, diz o Dr. Fernando Mascarenhas,médico, em seu site  na Internet .

    Confiantes, pois amparados em todasas razões expostas, esperamos o atendi-

    mento deste nosso empenho.

    Refeição de peixe frito com cuxá

    Detalhe do prato de cuxá

    6 Arthur Azevedo apud  ORICO, Osvaldo. Cozinha amazônica . Belém: Universidade do Pará, 1972, p. 163-165.

    BIBLIOGRAFIA

    ASSUNÇÃO, Matthias Röring. Maranhão, terra de mandinga. In: AZEVEDO, Izaurina (Org.).Olhar, memória e reflexões sobre a gente do Maranhão . São Luís: CMF, 2003.CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro . Rio de Janeiro: Edições de Ouro,1949.————. História da alimentação no Brasil . Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1983.DUAILIBE, Admée. A história da arte culinária. São Luís: s/e, 2004.————. Receitas deliciosas . São Luís: s/e e s/d.INSTITUTO HOUAISS. Dicionário houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,2001.ENCICLOPÉDIA BRASILEIRA MÉRITO. São Paulo: Rio de Janeiro: Ed.Mérito, 1958.

    LIMA, Zelinda Machado de Castro e. Pecados da gula: comeres e beberes das gentes do Maranhão . São Luís: SBPC, 1998.ORICO, Osvaldo. Cozinha amazônica. Belém: Universidade do Pará, 1972.PEREIRA, Manoel Nunes. A Casa das Minas: culto dos voduns jeje no Maranhão . 2. ed.Petrópolis: Vozes, 1979.SOUTO MAIOR. Alimentação e folclore . Rio de Janeiro: FUNARTE/ Instituto do Folclore,1988.

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    CONTINUAÇÃO

    daquele estado. O cuxá foi e continua sen-do uma prática cultural enraizada no cotidi-ano maranhense, uma forma de sociabilida-de reiterada em festas e celebrações (Sema-na Santa, temporada junina), e uma práticacoletiva enraizada no cotidiano de grupos

    sociais, especialmente da população negra,construída nos processos de sobrevivência,através de apropriação e transformação dosrecursos naturais e de criação e adaptaçãode tradições culturais.

    Por reconhecê-lo como um saber herda-do de antepassados que marca a identidadecultural dos maranhenses, que deve ser pre-servado e que merece ser reconhecido comoelemento formador da diversidade culturalbrasileira, a Comissão Maranhense de Fol-clore considera importante o seu registropelo IPHAN como bem cultural imaterial.

    REFERÊNCIAS

    ASSUNÇÃO, Matthias Rohrig. Mara-nhão, terra de mandinga. In: NUNES,Izaurina de A. Olhar, memória e refle- xões sobre a gente do Maranhão . SãoLuís: CMF, 2003, p. 57-63.CUXÁ – prato típico tradicional doMaranhão. Vídeo Documentário. Dire-ção Cícero Silva. São Luís: CMF, 2006.16´.

    O CUXÁ. Vídeo Documentário. SãoLuís: SESC-MA, 2007. Play-Video Pro-duções.LIMA, Zelinda M. de Castro e. Pecados da gula: comeres e beberes das gentes do Maranhão . 2 v., SÃO Luís: CBPC, 1998.MEDEIROS, Augusto Aranha. Depoi-mento. In: Memória de Velhos , V. 2. De-poimentos – uma contribuição à memó-ria oral da cultura popular maranhense.São Luís: SECMA, 1997 (p. 177-178).OLIVEIRA, Maria Lúcia de. Depoi-mento. In: Memória de Velhos , V. 1. De-poimentos – uma contribuição à memó-ria oral da cultura popular maranhense.São Luís: SECMA, 1997 (p. 165).LISBOA, Frei Cristóvão de. Históriados animais e árvores do Maranhão . 3ªed., São Luís: ALUMAR, 1998. (Docu-mentos maranhenses-2).NUNES PEREIRA, Manoel. A Casa das Minas : contribuição ao estudo das so-brevivências do culto dos voduns doPanteão daomeano no estado do Mara-nhão. 2ª ed., Petrópolis: Vozes, 1979.

    PESSOA DE CASTRO, Yeda. Falares africanos na Bahia: um vocabulárioafro-brasileiro. Rio de Janeiro: AcademiaBrasileira de Letras/ TOPBOOKS,2001.SERRA, Astolfo. Guia Histórico e Sen- timental de São Luís do Maranhão . Riode Janeiro: Civilizações Brasileiras, 1965.

    Vendido na porta toda noiteNa minha casa, que me criei se vendia (...)

    A velha fazia pra vender o peixe frito com,arroz de cuxá na panela de barro. Botava naporta, tinha um cofo, fazia assim como umninho, sentava a panela ali dentro (...) Cadaqual fazia seu ponto. Ainda faziam isso: agar-rava um pau, fazia um quadrado e botava umpapel encarnado e colocava na porta. Aí jásabia que ali tinha arroz de cuxá com peixefrito (...) todas as noites (...). E tinham váriamulheres que vendiam peixe (...) alí na Praiado Caju (...) quem eu encontrei aqui no Mara-nhão vendendo peixe era mulher, não era ho-mem. Os pescadores traziam e as mulheresvendiam... (Lúcia Oliveira/C. Nagô, 102 anos- São Luís; Memória de velhos, v. I, p.174)

    Vendido na rua por pretas velhas

    Tinha as velhas doceiras, eram umas pre-tas que vendiam doces nas esquinas, a noite(...). Tinha as vendedeiras de mocororó (...) asde peixe (...). Teve também a época que ven-dia peixe frito e arroz de cuxá nas portas emuitas famílias deixavam de fazer o jantar paramandar comprar (...). O peixe frito, o que indi-cava, era uma lanterna com um papel verme-lho, era uma lanterna vermelha, aí sabiam, alitem peixe frito. Agora o arroz de cuxá, entãoera gritado. O grito era esse, eu gritei muitasvezes: "Arroz de cuxá! Chega freguês, ta quen-tinho!" Aí vinham, traziam os pratos e a gentebotava (Augusto Aranha, nasc. 1907 - São

    Luís; Memória de velhos, v. II, p.177-178).Vinagreira também é cuxáCuxá em algumas regiões do Maranhão é

    a erva (vinagreira); cuxá é também o batidodas folhas junto com quiabo ou jongome. Cuxáem São Luís é um prato, uma espécie de angue que tem (...) farinha de mandioca, camarão,gergelim torrado e socado (...). A minha avó, queera filha de escrava, já fazia. (...) Nós quandonascemos já encontramos a tradição de se co-mer cuxá na nossa família. (...). Se fazia durantea Semana Santa pra comer com peixe frito e aminha mãe (de 1920) conta que passava à noiteum senhor chamado Dijalma Grande - era um

    negro alto - com taboleiro, vendendo, e ele grita-va "tem arroz de cuxá". (..) Nesse taboleiro traziaum caldeirão com arroz, um caldeirão com cuxá,e tainha frita. E ele, pra chamar os fregueses,apregoava: "tem arroz de cuxá e tainha frita".(Mundinha Araújo - São Luís - Vídeo CMF:Cuxá, prato típico tradicional do Maranhão).

    Cuxá na Madre DeusDona Maria (de 1927) conta que perdeu o

    pai aos 10 anos e a mãe dela, que cozinhavamuito bem e que era acostumada a comer cuxáem Guimarães, onde nasceu, como alternativade sobrevivência, passou um tempo fazendo

    cuxá para vender na Madre Deus (1937?), eque ela (dona Maria), como já era alfabetizada,tomava conta do dinheiro. Conta também queem Codó, onde morou depois de casada, cuxáera o que ela conhecia como bobó - batido devinagreira, jongomo etc. (Jacira - São Luís).

    Cuxá para criançaMinha mãe só ia pra roça levando todas as

    crianças e, às vezes, quando voltava, dizia "es-

    ANEXO: Cuxá - depoimentospera ai criança que eu vou fazer depressinhaum cuxázinho pra nós". Pegava no quintalumas folhas de vinagreira, torrava o gergelim,socava no pilão com farinha e camarão, tudojunto. Depois botava no fogo com água atéficar como um angú... Ficava muito gostoso.Não botava pimenta porque era para criança.(Domingas, nasc. em 1958 - Bequimão).

    Arroz de cuxá - cuxá com arrozO arroz de cuxá que era vendido por ne-

    gros na porta de casas e pelas ruas de SãoLuís, nas primeiras décadas do século XX,não era um risoto, como o que é servido atual-mente em alguns restaurantes, mas uma co-mida servida com arroz e comida com tainhafrita. Nos anos 70, o restaurante "Frango deOuro" fazia um arroz de vinagreira com cama-rão muito gostoso, denominado "arroz de bati-

    puru". Não sei se já era conhecido em algumaregião do estado. Era um acompanhamento,como o "arroz de cuxá" que é servido hoje emvários restaurantes (Mundicarmo - São Luís).

    Farinha de cuxáEu e minha mãe tivemos a idéia de fazer

    farinha de cuxá para vender já na década de1990, para facilitar a preparação e perpetuaresse prato da culinária maranhense, porqueno cuxá é o mais difícil e trabalhoso. Botamosuma placa na porta, copiamos a receita paradistribuir aos interessados e as pessoas come-çaram a comprar os pacotes de 250gr, 500gr...Tinha gente que comprava sempre para man-dar para maranhenses que moravam fora doestado, como Sonia Duailibe, em Brasília... NaQuaresma a procura aumentava muito. Nun-ca vendemos para restaurante. A nossa fari-nha de Cuxá é feita no pilão com: farinha secamimosa, camarão seco, gergelim torrado. De-pois é só juntar um batido de folhas de vina-greira do talo roxo com parte da água em quefoi cozida, e levar ao fogo para engrossar. Nãoprecisava botar essa farinha no freezer, eladeve durar pelo menos um mês. Nunca fiqueimuito tempo com ela porque sai muito. Umavez fizemos um panelão e saiu tudo... EmBacabal cuxá é o nome da vinagreira. As fo-

    lhas mais tenras são as melhores. (NizethMedeiros - São Luís, 2007).

    Comida de todo diaQuando cheguei aqui em São Luís ate

    estranhei. Em Codó todo quintal tem vina-greira e cuxá é comida de todo dia... (PauloJeferson - Codó, 2007).

    Pedido de registro do CuxáEm São Luís não existe um maranhese

    que não conheça ou que não tenha apreciadoum cuxá. Nesse sentido, a Comissão mara-nhense de Folclore fez um pedido de registro(do cuxá) como patrimônio imaterial nacional

    principalmente objetivando dois motivos: pri-meiro para que o cuxá, que é a cara do mara-nhense, seja conhecido nacionalmente comouma identidade do nosso estado; o segundomotivo é o processo de descaracterização quealguns restaurantes típicos da cidade tem fei-to na manipulação da confecção desse alimen-to tão maranhense (Margateth Figueiredo -São Luís; Vídeo SESC-MA: O Cuxá,2007).

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    A CULTURA LOCAL ATRAVÉS DO ARTESANATOCULTURA POPULAR OU FOLCLORE: ARTE OU ARTESANATO?

    Francisca Ester de Sá Marques 10 

    ARTE OU ARTESANATO?

    Pensar o artesanato como uma produção ar-tica significa pensá-lo a partir de matrizes te-icas diferentes das tradicionais que, ao longos séculos, separaram a arte do artesanatomo dois campos diferentes do saber: um for-al e outro informal. Deste modo, a ultrapassa-m teórica que proponho permite repor o diá-go a partir de critérios mínimos que possamsponder ao questionamento principal destebate e que interessa a todos os presentes: otesanato é arte? Se é arte, de que ela é com-sta? Como se caracteriza? O que a diferencia

    s outras artes?Podemos inicialmente começar por dizere o artesanato é uma arte utilitária, com umráter funcional ritualístico ou não, um saber- zer  que, através da elaboração meticulosa-ente repetida, pretende chegar à perfeiçãotética manual da forma e do conteúdo. Poro, o artesão é um criador coletivo que somaseu processo de criação, tanto a sua inspira-o artística, fonte de sua capacidade de per-pção do mundo, quanto à experiência cotidi-a adquirida através da tradição, isto é, do sa-r passado através dos tempos e sempre (re)

    ualizado pela prática do fazer repetido.Sendo assim, o artesão vale pela sua eficá-a no trabalho, vale pela dedicação com queabora sempre e sempre a sua obra, numa re-tição metódica cuja criação permite não so-ente o aprofundamento da técnica, mas o seurimoramento até chegar ao que chamamossavoir-faire  específico, distinto. Por sua vez,

    artista vale pelo seu poder de renovação evenção, já que trabalha o tempo todo sob aessão da genialidade e da criatividade, emnção da exigência de uma estética simbólicanovo, do inédito, do autêntico, do único e

    divisível capaz de ultrapassar tempos, espa-s, escolas, tendências e modelos.Neste caso, o artesão tem mais liberdade no

    u processo de criação porque trabalha ao mes-o tempo com a experimentação e com a expe-ncia, isto é, com o mesmo e com o diferente,paz de suportar portanto todas as possibili-des criativas, enquanto o artista trabalha com

    bom senso, o racional a partir de uma linha deciocínio que pressupõe uma leitura das con-ções de produção e do mercado. Nesta mes-a lógica, o artesão trabalha com as regras donso comum, com o que é plausível, verossí-

    l, ou seja, com uma espécie de virtude co-um que junta a todos no mesmo gosto e naesma estética para além e para aquém do mer-do. Ao contrário, o artista elabora a sua obra artir de uma estética própria e de um gostodividual que leva em consideração o merca-

    do cultural e a leitura que o autor quer passarde sua obra.

    Diferentemente da produção industrial ca-racterizada pela estandardização, serialização,desidentificação e desumanização, a produçãoartesanal é ainda hoje uma criação pessoal, ca-racterizada pela repetição elaborada do mesmoproduto que funciona como fonte de inspira-ção contínua e incessante. Deste ponto de vis-ta, enquanto a reprodução industrial desclassi-fica o produto por retirar-lhe a aura que o confi-gura como único e específico dentro de umuniverso maior de objetos tornando-o sem me-mória, a reprodução artesanal garante a auten-

    ticidade do objeto desde que a cópia seja umareelaboração permanente do original com vistaà sua perfeição.

    Isto significa que a criação artesanal envol-ve integralmente as duas dimensões da cultura(a material e a simbólica) porque a sua estéticafuncionalista reflete de algum modo o processoartístico que a gerou e o caráter devocional quea sustentou como fonte de inspiração. Assim,por exemplo, uma imagem de São Francisco deAssis ou um pandeirão do boi de zabumba jun-tam, no mesmo olhar, o uso e a devoção, isto é,a função e a fruição. Nestes dois objetos, o sa- 

    ber  do artista se confunde com o fazer  do arte-são e, deste modo, por mais que o pandeirãoseja semelhante a tantos outros modelos quecirculam na cultura, sempre há algum vestígioda criação única e específica que o gerou, sejapela curtição diferenciada do couro, seja pelaemoção do artesão no momento da produção,seja pelo processo com que esse objeto chegaao público.

    O artesão vale pela sua capacidade de pro-duzir não somente o objeto, mas as técnicasque permitem a produção, num processo per-manente de superação de dificuldades. A cada

    vez que um objeto é reproduzido artesanalmen-te todo o processo de criação recomeça numciclo interminável de vida e de morte que exigeum permanente esquecimento/naturalizaçãodosaber-fazer , mas, ao mesmo tempo, uma aten-ção constante para que a técnica e os proble-mas que a envolvem sejam solucionados paramelhorar as condições de trabalho (produção,comercialização e circulação).

    Isto quer dizer que o processo de criação étambém um processo de aperfeiçoamento, cujoplanejamento depende das circunstâncias domomento que podem ser sazonais ou não, dos

    custos de produção, da sua função ritualística,dos materiais utilizados, da capacidade de re-cepção dos objetos na cultura e também da ma-leabilidade com que esses objetos são refuncio-nalizados na vida cotidiana. Portanto, por maisque o processo de criação artesanal seja indivi-

    dual, ele é sempre tomado pelo coletivo em fun-ção das significações e ressignificações que sãoestabelecidas pela dinâmica da cultura.

    Nesta transmutação produtiva, o que eraautêntico – inspiração, duração material e tes-temunho histórico do objeto-, esforço concen-trado de um momento único e intransferível,torna-se vulgar pela funcionalização e pelo ano-nimato, torna-se mais um no consumo da expe-riência genérica da vida. É isso que torna a re-petição meticulosa do artesanato, ao mesmotempo, a sua morte momentânea e a sua vidarecomeçada pelo esforço renovado de recupe-ração da aura perdida ou mesmo do afeto des-

    prendido, já que segundo a artesã Marliete Ro-drigues da Silva do Alto do Mouro (PE), área deprodução do Mestre Vitalino:

    “No começo, inclusive, quando eu fazia umacena, eu não conseguia vender, porque ficavacom pena. Não queria entregar para as pesso-as que compravam, porque eu tenho muitocarinho pelas coisas que faço e fico com penade ver meu trabalho indo embora. Mas istotambém tem um lado bom, que é ver nossapeça sendo levada e guardada por pessoas quetambém gostam das coisas que a gente faz.Por isto, também não tenho interesse em fa-zer as peças em grande quantidade para as

    lojas, porque minha produção é toda feita comamor para ser conservada”.

    É nesta busca incessante entre o mesmo e odiferente que o artesanato mantém-se no mun-do criativo do folclore de onde retira a sua pere-nidade, credibilidade e sustentação e onde senutre de inspiração sagrada e, no mundo dacultura popular, por onde circula como parte deum processo mais amplo de trocas simbólicascom as outras áreas artísticas, com outros obje-tos que fazem parte do mundo da cultura. Como folclore, o artesanato sustenta uma relação de

    continuidade da tradição no tempo pretérito/presente, gerando através da transmissão doconhecimento artesanal uma memória lúdica,permanente, uma espécie de fio de Ariadne quemantém viva a história dos seus produtores edos seus objetos. Com a cultura popular, o arte-sanato legitima o seu papel de produtor, a partirda lógica de consumo e de circulação de obje-tos no mundo globalizado.

    Com o folclore, o artesanato pereniza-secomo fonte permanente de conhecimento e ins-piração. Com a cultura popular, amplia-se para

    fazer-se visível, volúvel, mutável e circunstan-cial. Sendo arte e técnica ao mesmo tempo, ul-trapassa antigas rivalidades com outros conhe-cimentos e mantêm-se vivo e cada dia mais di-nâmico como parte do patrimônio material dahumanidade.

    Professora da UFMA: Graduada e pós-graduada em Comunicação; diretora do SESC-MA; membro da CMF.

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    A terminologia patrimônio, derivada

    do latim patrimonium, esteve asso-ciada primordialmente à herança familiar,ao colecionamento e à propriedade de bensmateriais. Decorre dessa concepção a deno-minação de patrimônio histórico que englo-bava prédios, museus, centros culturais, edemais artefatos materiais depositários daancestralidade e da essencialidade dos gru-pos sociais e, portanto, suscetíveis de salva-guarda. Conforme Camargo (2002, p. 95),patrimônio no conceito clássico designa“bens culturais ou monumentos de excepci-

    onal valor histórico e artístico nacional (...)traçado urbano, Centros Históricos, cida-des Históricas e monumentos isolados”.

    Durante o processo de formação dos Es-tados Nacionais, essa denominação confun-diu-se com a própria noção de identidadenacional, sendo o patrimônio histórico oreferencial para a compreensão dos fatoshistóricos e sociais, e considerado portadorde uma memória e de uma identidade cole-tivas, adquirindo, por conseguinte, uma in-tensa conotação política.

    Entretanto, as asseverações relativas aopatrimônio histórico edificado foram revi-sitadas em meados dos séculos XIX e XX,sendo substituídas por uma noção maisabrangente – a de Patrimônio Cultural. Estapassa a contemplar, além dos artefatos mate-riais, o meio ambiental e os elementos origi-nários da cultura intangível ou imaterial quecompunham e particularizam as diferentessociedades. Nesse contexto, torna-se interes-sante explicitar a noção contemporânea dePatrimônio Cultural, dada por Pelegrini Fi-

    lho (1997, p.94).Modernamente se compreende por patrimô-nio cultural todo e qualquer artefato humanoque, tendo um forte componente simbólico,seja de algum modo representativo da coleti-vidade, da região, da época específica, permi-tindo melhor compreender-se o processo his-tórico.

    Originário das construções sociais e sím-bolo da historicidade construída permanen-temente pelos diferentes grupos sociais, opatrimônio arquitetônico e urbanístico

    constitui-se testemunho ou indício das ex-periências coletivas, portanto, evocativo dasmemórias individual e coletiva; no que tan-ge a construção de elementos identitáriosentre os membros de uma determinada rea-lidade social, os artefatos materiais aludemàs reminiscências que conferem aos grupos

    Karoliny Diniz Carvalho 11

    sociais o sentimento de pertença a uma so-

    ciedade, por conseguinte, de territorializa-ção.Remata-se que o Patrimônio Cultural,

    evocativo das memórias coletivas, constitui-se ainda símbolo da historicidade constituí-da e reconstruída permanentemente pelosgrupos sociais - face à aceleração do tempohistórico e às vicissitudes humanas - e daidentidade coletivas, posto que memória eidentidade são esferas que se co-determiname se engendram reciprocamente. Nas pala-vras de Le Goff (1996, p. 476, grifo do au-tor).

    a memória é um elemento essencial do que secostuma chamar identidade, individual oucoletiva, cuja busca é uma das atividades fun-damentais dos indivíduos e das sociedades dehoje, na febre e na angústia.

    Pode-se constatar a busca pelo restabele-cimento do equilíbrio identitário, por exem-plo, nas estratégias de restauração e revitali-zação de acervos arquitetônicos - presentesnos núcleos urbanos iniciais de diversas ci-dades históricas. Seu objetivo consiste no

    resgate e na salvaguarda de um passado his-tórico instituído e impresso sob o signo daautenticidade. Para Baudrillard (1993), oobjeto antigo reveste-se de uma aura queremete aos indivíduos o valor da transcen-dência, nesse caso, os monumentos são apre-endidos como portadores de uma ancestra-lidade, e das origens míticas dos preceden-tes. Daí advém o apelo adjunto que o Patri-mônio Cultural exerce, enquanto esfera to-talizadora e reveladora deste passado.

    As cidades cuja evolução social urbana e

    cultural apresentam-se materializadas em ar-tefatos possuem um grau elevado de recep-tividade para o Turismo, especificamente odestinado à esfera cultural. O Turismo Cul-tural, ou no dizer de alguns autores, Turis-mo Urbano ou Turismo Histórico, pode serdefinido como sendo a prática de turismocondicionada aos atrativos originários dacultura material - museus, conjuntos arqui-tetônicos, igrejas e demais edificações, eimaterial, resultante das singularidades co-tidianas e dos modos de vida de um povo - asdanças e folguedos populares, os rituais depassagem, as festas sagradas e profanas, a gas-tronomia, dentre outros. O objetivo funda-mental desse Turismo consiste em permitirum intercâmbio cultural e, conseqüente-mente, acrescer o nível de compreensão en-tre membros de diferentes culturas.

    TURISMO E PATRIMÔNIO CULTURAL

    O arrolamento evidenciado entre Turis-mo e Patrimônio Cultural é por vezes carac-terizado por sua complexidade e ambigüida-de, no que concerne aos efeitos benéficos enefastos decorrentes do processo de visita-ção. As relações decorrentes entre Patrimô-nio Cultural e Turismo podem ser elucidati-vas em termos de resgate da memória coleti-va, de contribuições para a emergência depráticas de restauração e preservação namedida em que, resgatando a memória e iden-

    tidade coletivas por meio da visitação, essaatividade contribui para o ingresso de par-celas significativas da população local e dosórgãos públicos e privados em iniciativas ca-pazes de garantir a salvaguarda e a integrali-dade dos bens culturais, bem como de suaintegração à vida contemporânea.

    Por outro lado, a excessiva comercializa-ção da memória e do patrimônio em prol dacaptação de fluxos turísticos, pode impedirque a comunidade receptora o percebacomo parte integrante do seu convívio soci-

    al, atribuindo-lhe um caráter eminentemen-te econômico. Nesse caso,

    os monumentos e o patrimônio histórico ad-quirem dupla função - obras que propiciamsaber e prazer, postas à disposição de todos;mas também produtos culturais, fabricados,empacotados e distribuídos para serem con-sumidos (CHOAY, 2001, p.211).

    Nesse sentido, perde-se a noção de con-tinuidade sócio-cultural dos bens culturais,uma vez que estes são vistos como necessá-rios exclusivamente para a fruição turística

    de uma localidade.Torna-se compreensível que a herança so-cialmente arregimentada serve, em algunscasos, para fins de significação local, e emoutros, consubstancia-se numa estratégia dehomogeneização cultural, no intuito de ga-rantir o revide financeiro e econômico de-correntes da especulação imobiliária, e dagentrificação ou nobilitação dos sítios ur-banos através de sua inclusão no TurismoCultural.

    Dessa forma, como símbolo, o patrimônio

    permite várias leituras de seu significado: parao poder oficial, representa a história e a me-mória da nação [...] acrescentando-lhe o valorde capital [...] e, para os moradores, significauma memória construída para ser agenciadapara o turismo – eles reconhecem a práticapreservacionista, mas não se julgam alvo dela.(LÓPES, 2001, p.80).

    11 Professora da UFMA: Graduada e pós-graduada em Comunicação; diretora do SESC-MA; membro da CMF.

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    CONTINUAÇÃO

    O resultado desses artifícios consiste naópria transgressão aos bens patrimoniais,m a substituição de seu significado histó-

    co e cultural, e de um crescente processocenarização do Patrimônio Cultural. Tra-se, na visão de Motta (2000), de um mode-

    globalizado de intervenção e tratamentoo patrimônio urbano, no qual os projetosbanísticos seguem a perspectiva de mer-do de consumo serializado, como nos exem-ificam a ressemantização empreendida nosirros Pelourinho e Recife Antigo nos es-dos de Bahia e Pernambuco,spectivamente.(BARBOSA, 2001).

    O processo de revitalização desses sítiosbanos para o Turismo ocasionou uma per-dos laços afetivos e dos referenciais sim-

    ólicos entre a comunidade local e os ambi-

    ntes requalificados. No que concerne aomperativo de inserir a comunidade nos me-

    nismos de gerenciamento dos bens patri-oniais, a desterritorialização cultural inci--se nas práticas de preservação impetra-s ao patrimônio edificado pelos residen-s. O convívio com as novas paisagens ur-nas provoca um estranhamento e o nãoconhecimento destes espaços enquantoferenciais de memória e identidade paramunidade local

    INTERPRETANDO MEMÓRIAS NACONSTRUÇÃO DOS ATRATIVOS TURÍSTICOS

    A partir disso, as ações direcionadas paraviabilização técnica e financeira do Patri-ônio Cultural, notadamente o que corres-

    onde aos monumentos arquitetônicos ouificados, devem abranger uma nova con-ptualização dos bens culturais, a qual sefere à necessidade de inseri-los dentro danâmica própria de uma sociedade. Paraarreto (2000), o processo de ressemantiza-

    o, atrelado à mecanismos de conservaçãoevitalização, surge como alternativa viá-l, pois permite que a comunidade local re-nheça a importância do Patrimônio His-rico no qual está inserida, e ainda, possibi-a o seu reaproveitamento para finalidadesrísticas e recreacionais.Exemplos significativos podem ser elen-

    dos de regiões que por meio da revitaliza-o, tornaram-se importantes centros cul-rais, de lazer e entretenimento, reabilita-s tanto por parte da população local, quan-

    por parte da demanda turística. Porém,ra que a revitalização de áreas urbanas eaturais se traduza em benefícios para asmunidades residentes e flutuantes, faz-seister a existência de planos e programasltados para a valorização da memória e daentidade locais, situando-os dentro de umarspectiva que promova uma nova concep-o dos bens culturais para a sociedade, além

    de propor um crescente interacionismo en-tre estes e os turistas que visitam a região.

    Para as cidades preservadas, faz-se necessárioque a comunidade se (re) aproprie de seus va-lores culturais, preparando-os para conforma-rem à oferta turística. O conhecimento da

    história, o entendimento do significado doslugares e a sua correta interpretação contribu-em para a garantia da preservação do lugar (...)Se o turismo sobrepuser-se à cultura local efizer com que esta cultura se descaracterize,ele fará por extinguir a própria razão de sernaquele lugar. (SIMÃO, 2006.p.97).

    Partindo-se desse princípio, Murta (1995)salienta que a emergência de um novo dire-cionamento para o uso racional do Patrimô-nio resulta de um processo de interpreta-ção, o qual consiste em “adicionar valor à

    experiência de um lugar por meio da provi-são de informações e representações querealcem sua história e suas característicasculturais e ambientais”, ou seja, maximizaras potencialidades do meio-ambiente natu-ral e cultural, através de uma metodologiaque identifique os atrativos e sua importân-cia, estabeleça relações entre os fatos histó-ricos que os circunscrevem e a sociedadeatual, bem como forneça aos visitantes umaexperiência particular, agregando valor às ca-racterísticas e peculiaridades da cultura, me-

    diante uma proposta didático-pedagógicaque permita o estabelecimento de um vín-culo estreito entre o Patrimônio e os mora-dores, e conseqüentemente entre este e osturistas.

    Isso pode se exeqüível através de técnicasdiversificadas, tais como trilhas interpretati-vas naturais e ambientais, site museus, ence-nações com guias locais, e outras tecnologias,na busca pela valorização e diferenciação dosrecursos que compõem a oferta turística lo-cal. Embora recebendo críticas de diversos

    setores da sociedade civil, no que se refere aocaráter de mercantilização dos fatos históri-cos em prol do Turismo, fenômeno denomi-nado de “industrialização do passado” (URRY,1996), essa iniciativas podem contribuir oresgate da identidade sócio-cultural por par-te da população. Nesse sentido, Barreto (2000,p. 47) nos assegura que:

    A recuperação da memória coletiva, mesmoque seja para reproduzir a cultura local para osturistas, leva, numa etapa posterior, inexora-velmente, à recuperação da cor local, e numciclo de retroalimentação, a uma procura porrecuperar cada vez mais esse passado.

    Além de proporcionar a valorização dosatrativos naturais e culturais pelos membrosde uma coletividade, a interpretação ambi-ental propicia a sustentabilidade financei-ro-econômica das populações locais, decor-rente do processo de visitação, além de inse-rir as reminiscências dos grupos sociais, pos-

    sibilitando a emergência de memórias diver-sificadas, nas quais se possam arrolar varia-das leituras e interpretações dos bens cultu-rais, passíveis de serem amalgamadas à ativi-dade turística.

    Entendemos que a comunidade local deve

    participar do processo de amalgamação dosrecursos culturais para o turismo, contribuirpara a disseminação de sua memória e para arevitalização dos espaços urbanos testemu-nhos de sua história. Nesse âmbito a cidadeserá vista “como construção histórico-cultu-ral, como patrimônio de seus moradores,como espaço de memória” (MENESES, 2004,p.86), e, por conseguinte, de identidade.

    REFERÊNCIAS

    BARBOSA, Yacrim. O despertar do Tu- rismo : um olhar crítico sobre os não-luga-res. São Paulo: Aleph, 2001.BARRETO, Margarita. Turismo e legado cultural : as possibilidades do planejamen-to. São Paulo: Papirus, 2000.BAUDRILLARD, Jean A sociedade de consumo . Rio de Janeiro: ed. Elfos, 1995.

    CAMARGO, Haroldo Leitão. Patrimônio Histórico e Cultural . São Paulo: Aleph,2002.CHOAY, Françoise. Alegoria do Patrimô- nio . São Paulo: UNESP, 2001.FREIRE, Doia; PEREIRA, Lígia Leite.História Oral, Memória e Turismo Cul-tural. In: MURTA, Stela Maris. Interpre- tação do Patrimônio para um turismo sus- tentado : um guia. Belo Horizonte: Terri-tório Brasilis, 1995.LE GOFF, Jacques. História e Memória.Campinas: Unicamp, 1996.LOPES, Tânia. Fragmentando os rotei-ros turísticos sobre Ouro Preto. In: JÚ-NIOR, Álvaro Banducci; BARRETO,

    Margarita (orgs). Turismo e Identidade Local: uma visão antropológica. São Pau-lo: papirus, 2001.MENESES, José Newton Coelho. His- tória e Turismo Cultural . Belo Horizon-te: Autêntica, 2004.MOTTA, Lia. A apropriação do patrimô-nio urbano: do estético estilístico nacio-nal ao consumo visual global. In:ARANTES, Antônio A. (Org). O Espaço da diferença. São Paulo: Papirus, 2000.p.256-287.PELEGRINNI FILHO, Américo (org).Ecologia Cultura e Turismo . São Paulo:Papirus, 1997.SIMÃO, Maria Cristina Rocha. Preser- vação do Patrimônio Cultural em cida- des . Belo Horizonte: Autêntica, 2006.URRY, John. O olhar do turista: lazer eviagens nas sociedades contemporâneas.São Paulo: EDUSC, 1996.

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    O arroz, alimento de ricos e pobres,esteve desde cedo presente na mesa bra-sileira, sob diversas formas. É o que re-gistra Carlos de Lima, afirmando que oque se fala de Recife, aplica-se ao Ma-ranhão e ao Brasil:

    Com respeito à alimentação, podemos dizerque os ricos comiam perus, galinhas, frutas, ofamoso queijo-do-reino, passas, biscoitos, sal,manteiga, bacalhau, presunto e carnes impor-tadas, bebiam vinhos, café, chá, licores, etc.;os pobres farinha de mandioca, fubá de arroze de milho, feijão preto, toucinho, carne sal-gada; cachaça e chibé, além de largo uso debatatas-doces, goiabas, ananases, melancias,laranjas (FREYRE apud  LIMA, C de, 1998,

    p.340).

    Na culinária não há como deixar dereferir o arroz de cuxá, que mereceupoesia e é razão de manifestação de sau-dade de todo o legítimo maranhense re-sidente longe do estado natal. ZelindaLima (1998, v.1, p.22) afirma que o ar-roz de cuxá é um prato que tem mais de

    100 anos, pois já “figurava, em 1889, noDicionário de Vocábulos brasileiros, dovisconde de Beaurepaire Rohan, com mi-nuciosa descrição”. Artur Azevedo (apud LIMA, Z, v.2, 1998, p. 78) dedica ao ar-roz de cuxá um longo poema, enviado

    O FOLCLORE ARROZEIROMaria de Fátima Sopas Rocha12 

    12 Especialista em Lingüística, professora do Departamento de Letras da UFMA e pesquisadora do Atlas Lingüístico do Maranhão - ALIMA.

    ao seu amigo Jovino Costa, que o convi-dara a ir saboreá-lo em sua casa (verANEXO). Mais recentemente, Zeca Ba-leiro e Chico César, na música Pedra de Responsa, referem-se a ele: “Quando fuina ilha maravilha / fui tratado como umpaxá / me deram arroz de cuxá / águagelada da bilha / cozido de jurará / ala-vantu na quadrilha” (cf. NAVARRO,2004, p.41).

    Mota (1991, p. 393) registra a seguin-te estrofe, que data dos primórdios daRepública, em que enunciam-se as es-pecialidades dos Estados da Federação

    brasileira;S.Paulo para café,

    Ceará pra valentãoPiauí pra vaca brava,Pernambuco pra baião,Rio Grande pra cavalo,Paraná pra chimarrão.Em Minas carne de porco,Rio de Janeiro eleição,Alagoas povo macho,

    Mato Grosso pra brigão,Amazonas pra borracha,Paraíba pra algodão,Pra castanha o Pará,Para arroz o Maranhão,Bahia para mulata,Sergipe cana e feijão,

    No Rio Grande do NorteJerimum e violão,Em Goiás moça bonita

    E rapaz sem coração.Não são apenas os autores de reno-

    me que falam do arroz. Ele está nasquadrinhas como a que segue:

    Preto que vendes aí?É arroz do Maranhão,Que Sinhá mandou venderNa casa do Salomão. ( LIMA, Z, v.2, 1998, p.76)

    Câmara Cascudo (2004, p. 858) re-gistra:

    O sr. Assis Iglesias ouviu em Caxias, Mara-nhão, fevereiro de 1919, o cego RaimundoLeão de Sales entoando a cantiga original, epara mim única na espécie, o traje feito dealimentos, aprendida com um cearense tam-bém cego.Mandei fazê um liformeBem feito com perfeição,Mó de botá na cidade,No dia de uma enleição,E o qual admirôA toda população.O chapéu de arroz-doce,Forrado de tapioca,As fitas de alfinimE as fivelas de paçocaE a camisa de nataE os botões de pipoca.A ceroula de sôroE a calça de coalhada,O cinturão de mantêgaE o broche de carne assada,O sapato de pirãoE a biqueira de cocada.As meias de mingauE os véus de gergelim,E as aspas de pão-de-lóE o anelão de bulim,As fitas de gordura

    E as luvas de toicim.O colete de banana,O fraque de carne frita,O lenço de marmêE o lecre de cambica,O colarim de bolachaE a gravata de tripa.O relógio de queijo,A chave de rapadura,A caçuleta de doceE o trancelim de gordura.Quem tem um liforme destePode julgar-se enfartura.

    O sr. Iglesias explica que bulim é bolinho, toi- 

    cim, toicinho, marmê , farinha puba, farinhafermentada,cambica é vinho da palmeira bu-riti, Mauritia vinifera. Uniforme, roupa exte-rior masculina, é o liforme . A Antigüidadedos versos denuncia-se no relógio de algibeirater ainda chave para dar corda. E o uso dotrancelim. E a caçoleta, pendente do trance-lim ornamental.

       R  e

      p  r  o   d  u  ç   ã  o   d  e   P  e  c  a   d  o  s   d  a  g  u   l   h  a ,

       d  e   Z  e   l   i  n   d  a   L   i  m  a .

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    CONTINUAÇÃO

    Alguns pratos de arroz têm designa-es curiosas, como é o caso do “maria-bé” ou “maria-isabel”, prato de carnezida com arroz; do “arroz –de-puta”,

    u “arroz-de-puta-pobre”, uma espéciee arroz de carreteiro feito com lingüi-

    no lugar do charque tradicional (cf.SCHER, 2000, p. 36); do “arroz –de-úva – prato da culinária baiana, à basee arroz com sal e leite de coco. O Dici-nário Aurélio traz esta citação: ‘Após oício, voltava a imagem em procissão

    ara a nossa casa, onde era servida lau-mesa de doces, cuscuz, arroz-doce,

    roz-de-viúva, aipim com manteiga,olos , queijos e café com leite’ Itagipe ,ermano Requião” (apud  NAVARRO,

    04, p.41). Em outros estados é conhe-do como arroz-de-leite.

    São freqüentes os pratos e bebidasm nomes cuja sonoridade denunciaa origem africana, como é o caso de.;

    Afurá – bolo de arroz fermentado. Ser-ve-se com água açucarada, na qual se dis-solve, formando uma bebida refrescan-te, apreciada na África e, igualmente,pela população baiana de outrora.Aluá – ou aruá é uma bebida fermentada

    da casca do abacaxi ou do milho cozido eaçúcar. Pode ser preparado com arroz eadoçado, também, com rapadura.Maniquera – aguardente extraída damandioca chamada maniocaba, cujo cal-do, tirado da massa, é cozido com arroz.Mocororó – bebida do sumo do caju comquatro dias de fermentação ao ar livre,no Ceará. No Maranhão, é bebida feitacom mandioca ou arroz.Acaçá – prato da cozinha afro-brasileira,é um bolo de massa fina de milho ou fubáde arroz. Depois de pronto, enrola-se, emporções, em folhas de bananeira.Xiró – caldo de arroz temperado com sal.Cuscuz – prato de mouros e árabes, tam-bém preparado com outros cereais (cf.LIMA, C., 1999).Mungunzá – milho cozido com leite devaca ou de coco. Com fubá de arroz, cra-vo, canela, açúcar, sal, manteiga, engros-sado, faz-se o mungunzá  de colher e tor-nando-o ainda mais denso, mungunzá  de cortar (cf. CÂMARA CASCUDO, 2004,p.843).A respeito do Mocororó, Câmara Cas-

    udo (2004, p.832), comentando o aluá u aruá  afirma: “Jacques Raimundo citamocororó  do Maranhão como equiva-nte mas Domingos Vieira Filho diz serma espécie de mingau feito à base deroz’”.

    Outros pratos são servidos com acom-panhamento à base de arroz, como é ocaso do Amalá – comida feita com quia-bos (caruru), carne de peito de boi ourabada, com pirão de farinha de arrozou de mandioca; do Anguzô – esparre-

    gado de ervas, semelhante ao caruru, quese come com angu de arroz; do Badofe– prato da cozinha afro-brasileira, umaespécie de massa comestível à base detaioba que se come com arroz dehaussá;do Mindim – prato regional doPiauí, que consta de arroz com costelasde porco (cf. LIMA, C., 1999).

    Muitos outros pratos regionais e tra-dicionais são compostos com a lexia ar- roz . Entre eles, destaca-se: o arroz cai- 

     pira – prato da região sudeste, de arroz

    e frango; o arroz com banana – prato daregião do Rio de Janeiro que consiste embanana-da-terra cozida na panela dearroz; o arroz com suã  – encontrado emSão Paulo, Mato Grosso e Goiás, consis-te em arroz com uma parte específicado porco; o arroz de haussá  – arroz cozi-do com água e sal, como um purê; o ar- roz de piqui  – tradicional em Goiás; oarroz-de-carreteiro  – típico da região sul,com carne-de-sol ou carne-seca; o arroz em panela de pedra – de Minas Gerais

    que, depois de cozido, como o nome in-dica, em panela de pedra, leva cubos dequeijo fresco; o baião-de-dois  – tradicio-nal no Ceará e que consiste em arroz efeijão cozidos juntos.

      Também são designadas como espé-cies de arroz outras plantas como o “ar-roz-bravo”, uma gramínea de folhas pla-nas e ásperas e “arroz –do-mato” tambémconhecido como capim rabo de macaco(cf. SERAINE, 1959, p. 25).

    São freqüentes os registros do apeli-do de papa-arroz, designando os mara-nhenses. Os maranhenses dão esse nomea um passarinho, comum nas regiões ar-rozeiras. Em Sertão alegre , LeonardoMota (MOTA, 2002, p. 172) afirma: “Opiauiense chama o maranhense de papa-arroz . Este, em represália, chama o piau-iense de capa-garrote  e, sobretudo deespiga”. Outro registro interessante, domesmo livro, pode explicar a designa-ção de arroz  escoteiro , muito comum noMaranhão, para o arroz simples, comi-do sem acompanhamento. No capítuloLinguagem popular, Mota (2002, p.227)registra: “Na água e no sal – escoteiro;exclusivamente. Exs.: Os soldados sequeixam de que só comem feijão na águae no sal. Trabalhei e no fim do mês eleme deu cinco mil réis na água e no salpor todo o meu serviço.”

    O uso medicinal do arroz não é mui-to corrente no Maranhão, entretanto,Zelinda Lima (1998, p.115) registra:

    Dieta de criança enferma: água-de-arroz.Para hemorragia: água-de-arroz adoçada.É boa também para os intestinos.

    Para a pele: pó da última lavagem do arroz.Para engasgo; comer arroz ‘pegado’ (quei-mado).

    Obrigatório na mesa do brasileiro,deixou marcas, também, no folclore, enão apenas no Brasil, manifestando-se,sobretudo, no uso de frases feitas e ex-pressões populares, nas crendices e su-perstições.

    Muito conhecido é o hábito de lan-çar arroz sobre os noivos, na saída da igre-ja. Representa esse gesto um voto de pro-digalidade e fartura para a vida a dois,sem problemas financeiros, mas tambémpara a fertilidade do casal, a ser aben-çoado com muitos filhos. É também emrazão da associação com a riqueza e afertilidade que “ao dinheiro se chama porvezes, na gíria bem imaginosa, arroz (gri-fo da autora), arame, tinta, massa, ca-bedal, milho, painço, bago, metal, etc.”(AMARAL, 1950, p. 91)

    As expressões mais freqüentes com-

    postas com a palavra arroz são utiliza-das em relação direta com a sua presen-ça à mesa de todos, em todos os momen-tos. Assim, levantou-se o seu registro emdiversos dicionários regionais:

    - Arroz de casca – diz-se de uma pes-soa que se susceptibiliza por qualquercoisa. Abon. ‘Não compre um substi-tuto. Cá não sou arroz de casca’. Ar-thur Azevedo, ‘Carapuças’, 17. (VI-EIRA FILHO, 1958, p. 13)

    - Arroz doce de pagode – indivíduo quenão perde festa. (MOTA, 1991, p.349)- Acabar-se como arroz doce em pago-de (adverte-se a quem se mete em em-presas arriscadas. (MOTA, 1991, p. 431)- Arroz-de-festa – a sobremesa conhe-cida por nós como arroz-doce era cha-mada de ‘arroz-de-festa’ em Portugal,onde nas famílias ricas o doce era pre-sença obrigatória em dias de festa.Depois a expressão passou a ser usa-da para definir uma pessoa que não

    falta em nenhum evento social. (DU-ARTE, 2003, p.169)- Arroz-doce-de-pagode – pessoa in-falível nas festas. Sempre visível emqualquer solenidade, havendo dançae comidas. ‘Foi arroz-doce de quan-to pagode de truz se fez pelo sertãodo Tietê’ Valdomiro Silveira, Os Ca- 

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    CONTINUAÇÃO

    boclos , 133, S.Paulo, 1920). Gulodi-ce indispensável e preferida ao pala-dar português, fidalgo e plebeu, ebrasileiro desde o séc. XVI. O Vea-dor de dona Luísa de Gusmão, Rai-nha de Portugal, esposa d´El-Rei

    D.João IV, na sua folha de pagamen-to tinha: ‘e de arros doce que tempor dia a rasão de duzentos reis’. O Prato de Arroz-Doce é o romancehistórico de A. A. Teixeira de Vascon-celos, referente à revolução do Por-to, 1846, publicado em 1862. Na His- tória da Alimentação no Brasil  (2.ed.Itatiaia—Edusp, 1983), registei a bi-ografia do Arroz-Doce, e como se di-vulgou em Portugal, trazido para oBrasil na época do povoamento, e ain-

    da constituindo a sobremesa famili-ar. ‘Cheiroso como um tabuleiro dearroz-doce!’ Pagode é reunião jubilo-sa. O ‘arroz-Doce-de-Pagode’ seráuma ‘permanente’ nessas ocasiões, ca-racterizando o indivíduo de teimosafreqüência (- “Nem arroz! – Nenhu-ma resposta. Ouvir sem redargüir.Não dar importância. ‘Sô coroneleCanaro ralhô cô ieu, mas porém ieunem arroiz’ , diz em Canudos, 1950,o matuto Lalau ao pintor Funchal

    Garcia ( Do Litoral ao Sertão , Bibli-oteca do Exército editora, Rio de Ja-neiro, 1965.) Não será arroz, que nãodá sentido, mas arriós , bolinha, pe-lourinho de pedra usado no jogo qui-nhentista do alguergue, para pontono tabuleiro marcado. ‘Nem arriós’,sem reação `a jogada do adversário,ausência de parada, sem retorquir,indiferença, abandono, pouco-caso.Calado por resposta. (CÂMARACASCUDO, 1986, p.200)

    - Dar o arroz – Dar o correctivo (SI-MÕES, 1993, p. 213).- Arroz – homem que anda com mui-tas mulheres mas não namora nenhu-ma. ‘Igual a arroz, só serve praacompanhar’.(GADELHA, 2000, p. 21)- Arroz doce – pessoa que está emtoda festa ou em todo lugar, que estáem todas. (LARIÚ, 1991, s/p.)- Arroz-doce – vulgar, presente emtodas as festas: prato de arroz-doce.(LIMA, Z, v.2, 1998, p.54)- Papa-arroz – o natural do Maranhão.(CÂMARA CASCUDO, 2004, p.867)- arroz com pernas - piolho- arrroz – pancada; piolho; dinheiro- arroz fingido – acção sexual não con-sumada- arroz queimado – aquilo que suce-de muitas vezes

    - dar o arroz – dar o correctivo- cantigas de arroz pardo – Oraadeus!; mentiras. ( SIMÕES, 1993,p.86; 155; 213)- Prato de arroz-doce – Ostentação.Ser prato de arroz-doce – chamar

    atenção, querer sobressair-se. ( LIMA,1998, p. 62)- arrozais de Pendotiba – coisa ine-xistente, imaginária ou falsa. Quan-do Nilo Peçanha, que foi Presidenteda República, como sucessor deAfonso Pena, voltou a governar, apósa passagem pelo Catete, a arruinadaterra fluminense, procurou fazer umempréstimo externo, dando comogarantia a produção agrícola do Es-tado do Rio. Viriato Corrêa, num jor-nal carioca, atribuiu-lhe um expedi-ente, para enganar os representantesdos banqueiros da City, vindos da In-glaterra. Numa viagem de trem, NiloPeçanha lhes teria mostrado o capin-zal bravio de Pendotiba, dizendo:‘Vêem os senhores? Só a produçãodestes arrozais daria para garantir oempréstimo...’ A maliciosa anedotaperseguiu aquele político até o fimda vida e foi acolhida por seu recen-

    te biógrafo, Brígido Tinoco, em ‘ Avida de Nilo Peçanha’, onde se lê, àpágina 86: ‘Pelo bem do Brasil não tre- 

     pidava em mentir. Diante de comissão estrangeira, em visita à baixada flumi- nense, transformou subitamente, en- vergonhado com a pergunta indiscre- ta, os extensos campos de capim-jara- guá, de Pendotiba, em luxuriantes plan- tações de arroz [...]’   (MAGALHÃESJÚNIOR, 1974, p. 32)- ARROZ

    [...] de festa. Pessoa que está presen-te a todas comemorações ou eventosimportantes; pessoa que comparecea qualquer tipo de recepção seja ounão convidada.[...] doce de função. Pessoa que com-parece a todas as festas. (PUGLIE-SI, 1981, p.11)

    No âmbito das crendices populares,diz-se que “arroz quente posto na nucada criança gaga, num instante solta a

    língua” (Jangada Brasil, 2005, p.2)E ainda: “Durante a gravidez mulher

    não deve comer resto de arroz que ficougrudado na panela – o pegado – senão aplacenta fica presa no útero, sem sair,após o parto.

    Arroz jogado no chão é sinal de far-tura!” (LIMA, Z, v.2, 1998, p.29).

    Acredita-se ainda que “faz mal comerarroz com casca, cria pedra na vesícula”(LIMA, C., 1999, p.173), que “não se batecom a colher na panela de arroz ou decanjica, porque queimará inevitavelmen-te”, que “inchar as bochechas, quando o

    arroz estiver fervendo, fa-lo-á crescer” eque “a grávida ajuda a crescer a massade bolos, arroz, cozidos com verduras,mas não deve assar coisa nenhuma, res-seca ou incha sem tomar tempero”(LIMA, C., 1999, p.182).

    Na literatura popular, registra-se apresença do arroz em duas parlendas quetêm como objetivo a memorização dosnúmeros:

    Um, dois: camarão com arroz;

    Três, quatro: feijão no prato;Cinco, seis; olha o freguês;Sete, oito: olha o biscoito;Nove, dez; traz os pastéisou:Um, dois – feijão com arroz,Três, quatro – arroz no prato,Cinco, seis – o ovo indez,Sete, oito – café com biscoito,Nove, dez – lave seus pés. (LIMA, Z, v.2, 1998,p. 84)

    Também se registra uma quadrinha,

    quando se faz, à mesa, o ‘capitão’ de arroz, ou

    pirão, isto é, a porção amassada com os dedospara ser levada à boca, recita-se:Rei, capitão,soldado, ladrão,menino, menina,macaco Simão” (LIMA, Z, v.2, 1998, p.87).

    A riqueza do folclore arrozeiro estápresente também em cantigas, de quese tem notícia por terem sido referidaspor algumas das pessoas entrevistadasnos municípios maranhenses em que oAtlas Lingüístico do Maranhão – Proje-to ALiMA realiza pesquisas sobre a lín-gua falada no Maranhão, e ainda por pes-quisadores, mas das quais ainda não foipossível obter nenhum registro.

    REFERÊNCIAS

    AMARAL, Vasco Botelho do. Mistérios e maravilhas da língua portuguesa. Porto:Livraria Simões Lopes, 1950.CÂMARA CASCUDO, Luís da. Locu- ções tradicionais do Brasil : coisas que opovo diz. Belo Horizonte: Itatiaia; SãoPaulo: Edusp, 1986._________. História da alimentação no Brasil . São Paulo: Global, 2004.DUARTE, Marcelo. O guia dos curiosos .São Paulo: Panda, 2003.FERREIRA, Aurélio Buarque de Holan-da. Novo dicionário da língua portugue- sa. Rio de Janeiro: Nova fronteira, 1975.

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    CONTINUAÇÃO

    FISCHER, Luís Augusto. Dicionário de porto-alegrês . Porto Alegre: Artes eOfícios, 2000.GADELHA, Marcus. Dicionário de ce- arês . Fortaleza: Multigraf, 2000.

    JANGADA Brasil: superstições e cren-dices. Disponível em: Acesso em:5 out 2005.LARIÚ, Nivaldo. Dicionário de baianês .Salvador: Empresa Gráfica da Bahia,1991.LIMA, Carlos de. Vida, paixão e morte da cidade de Alcântara - Maranhão. São

    Luís: SECMA, 1998.LIMA, Cláudia. Tachos e panelas : his-toriografia da alimentação brasileira. Re-cife: Brasil, 500 anos, 1999.LIMA, Zelinda Machado de Castro e.Pecados da gula:  comeres e beberes dasgentes do Maranhão. São Luís: CBPC,1998. 2 v.MAGALHÃES JÚNIOR, R. Dicioná- rio brasileiro de provérbios, locuções e 

    ditos curiosos, bem como de curiosida- des verbais, frases feitas, ditos históri- 

    cos e citações literárias, de curso corren- 

    te na língua falada e escrita. Rio de Ja-neiro: Documentário, 1974.MOTA, Leonardo: Sertão alegre:  poesiae linguagem do sertão nordestino. 3. ed.Rio de Janeiro; São Paulo; Fortaleza:ABC Editora, 2002._________. Adagiário brasileiro . Forta-leza: BNB, 1991.

    NAVARRO, Fred. Dicionário do Nor- deste : 5.000 palavras e expressões. SãoPaulo: Estação Liberdade, 2004.PUGLIESI, Márcio. Dicionário de ex- pressões idiomáticas : locuções usuais dalíngua portuguesa. São Paulo: Parma,1981.SERAINE, Florival. Dicionário de ter- mos populares : registrados no Ceará.Rio de Janeiro: Simões Editora, 1959.

    SIMÕES, Guilherme Augusto. Dicio- nário de expressões populares portugue- sas. Lisboa: Publicações Dom Quixote,1993.VIEIRA FILHO, Domingos. A lingua- 

    gem popular do Maranhão . São Luís do

    Maranhão: Tipogravura Teixeira, 1958.

    Como o nosso Manoel CostaMandou pelo Macieira

    Um molho de vinagreiraLá de Jacarepaguá,Num delicado bilheteMe perguntas, caro amigo,Se quero, amanhã, contigo,Comer arroz de cuxá.

    Que pergunta! Pois ignorasQue sou, por este petisco,Homem de andar ao lambisco,Ora aqui, ora acolá?Pois não sabes que, apenasEu me apanhei desmamado,

    Me atirei como um danadoAo belo arroz de cuxá?

    Gosto do peru de fornoGosto de bofes de grelha,E tenho uma paixão velhaPor torradinhas com chá;Mas nos pitéus e pitançasQue custam tanto e mais quanto,Nunca achei o mesmo encantoQue achei no arroz de cuxá.

    Visitei o velho mundoE, nos restaurantes caros,Os acepipes mais rarosComi que nem um paxá;Mas, quer creias, quer não creias,Nenhum achei mais gostoso,Mais fino, mais saborosoQue o nosso arroz de cuxá!

    A tua “Mulata Velha”É com razão orgulhosaDa moqueca apetitosa,Do doirado vatapá;

    Mas, baiano, tem paciência;Forçoso é que te executes!Nada valem tais quitutesAo pé do arroz de cuxá.

    Eu tenho muitas saudadesDa minha terra querida...Onde atravessei a vidaO melhor tempo foi lá.Choro os folguedos da infânciaE os sonhos da adolescência;Mas... choro com mais freqüênciaO meu arroz de cuxá.

    Porque – deixa que t´o diga –Esse prato maranhenseAo Maranhão só pertenceE n´outra parte não há.

    Aqui fazem-no bem feito(Negá-lo não há quem ouse);

    mas... falta-lhe “quelque chose”;não é o arroz de cuxá.

    Pois aqui há bom quiaboE bem bom camarão seco;Há vinagreira sem peco;Bom gergelim também há!E o prato, aqui preparado,Do nosso mal se aproxima!Acaso também o climaInflui no arroz de cuxá?

    Ora, qual clima! qual nada!

    É o mesmo quitute, creio;Falta-lhe apenas o meio;Nos seus domínios não está.No Maranhão preparadoNaturalmente aconteceQue sendo o mesmo, pareceSer outro arroz de cuxá.

    Eu, quando o como, revejoEntre a cheirosa fumaça,Passado que outra vez passa,Com que eu não contava já;

    Portanto, não me perguntes...Não me perguntes, amigo,Se eu quero amanhã, contigo,Comer arroz de cuxá.

    Pergunta se quer o espaçoO passarinho que adeja;Pergunta se a flor desejaO sol que a vida lhe dá;Pergunta aos lábios se um beijoAceitam, quente e sincero;Mas não perguntes se eu queroComer arroz de cuxá.

    Como a criança quer leite,Jóias a dona faceira,Fitas a velha gaiteira,E um maridinho a sinhá;Como o defunto quer cova,Quer o macaco pacova,Eu quero arroz de cuxá.

    Febricitante, impaciente,Cá fico as horas contando!Do bolso de vez em quando

    O meu relógio sairá,E amanhã, às seis em ponto,Irei, com toda a presteza,A tua pródiga mesaComer arroz de cuxá.

     Poema de Artur Azevedo13

    13 Artur Azevedo apud  ORICO, Osvaldo. Cozinha amazônica. Belém: Universidade do Pará,1972 apud  LIMA, Zelinda. Pecados da gula. V. 1. São Luís: CBPC, 1998. p. 78-82.

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    INTRODUÇÃO

    Neste trabalho nos ocupamos da passagemde ex-evangélicos para as religiões afro-brasilei-ras, especificamente das igrejas pentecostais eneopentecostais para a umbanda, buscando en-tender os motivos da mudança de religião e oposicionamento do indivíduo diante de sua atualsituação religiosa e da antiga. Tal fenômeno noschama a atenção por serem as igrejas evangéli-cas as grandes opositoras das manifestaçõesafro-brasileiras e por ser crença geral de queapenas praticantes de religiões afro-brasileirasse convertem ao pentecostalismo, daí uma das

    expressões muito comuns em terreiros de minae umbanda quando algum filho-de-santo deixao terreiro: “virou crente”. Procuramos entender,ainda, o fator mais comum ou justificável para ainiciação de ex-evangélicos como pais e mães efilhos-de-santo.

    Achamos necessário fazer uma pequenadistinção na terminologia utilizada: transição,migração e mudança religiosas. Após algumasconsiderações, concluímos ser mais adequadousar o termo trânsito religioso quando há a par-ticipação, ou seja, a “transitação” de indivíduosentre duas ou mais denominações religiosas di-ferentes, sendo que ele se autodenomina de

    uma só, o que não o impede de participar deoutra também. Talvez este termo seja o maisapropriado para o caso dos evangélicos que fre-qüentam várias denominações, os transeuntesque não se fixam por muito tempo numa deter-minada denominação religiosa. Prandi16  citadopor Karla Santos (2002), afirma não ser precisosair da religião de origem para provar da mu-dança religiosa. Já o termo migração seria quan-do os indivíduos abandonam a sua última de-nominação devido a algum desconforto ou embusca de melhoras não encontradas na primei-ra, fixando-se na segunda alternativa. Mudan-ça é um termo mais ambíguo, podendo ser en-

    tendido como a mudança da religião em si, nasua dinâmica social ou a mudança de adeptosde uma para a outra.

    Tal análise visa contemplar um fenômenodifícil de ocorrer ou detectar, mas não inexis-tente entre os praticantes de duas das princi-pais religiões populares no Brasil (FRY &HOWE, 1975), servindo de subsídio para umaanálise posterior mais detalhada.

    A partir da história de vida do Sr. FranciscoSousa ou seu Francisco como é mais conheci-do, da cidade de Codó (cerca de 300km de SãoLuís), nos propomos a analisar tal fenômeno.Como apoio, utilizaremos também outras en-trevistas com pais e mães-de-santo sobre o as-sunto.

    Boa parte das informações a que tivemosacesso foi adquirida em conversas informais,

    MIGRAÇÃO RELIGIOSA DOPENTECOSTALISMO PARA A UMBANDA14

    Paulo Sérgio Pilar Araújo 15 

    14 Retoma trabalho apresentado no 10º Congresso Brasileiro de Folclore (São Luís-MA, 2002) e relatório de pesquisa apoiada pelo PIBIC-FAPEMA e orientada pela professoraMundicarmo Ferretti.

    15 Licenciado em Letras; aluno do Mestrado em Linguística da USP.16 PRANDI, Reginaldo. Religião, Biografia e Conversão :escolhas religiosas e mudanças de religião. Rio de Janeiro:1999.

    em visitas e participações de trabalhos de mesa(similares às sessões de mesa branca do karde-cismo, mas nas quais se manifestam além dosdesencarnados, entidades caboclas, índios, pre-to-velhos etc.) e com entrevistas formais do pe-ríodo de 06 a 12 de fevereiro de 2002.

    Como pré-requisitos para a escolha das pes-soas entrevistadas utilizamos alguns pontos domesmo roteiro que os alunos dos cursos de Ge-ografia e História da UEMA usaram para umtrabalho de campo da disciplina de Antropolo-gia, coordenados pela então professora Mundi-carmo Ferretti: o tempo de permanência na igre-ja evangélica (se a pessoa teve tempo suficiente

    para se “edificar” nas doutrinas da igreja), bemcomo o papel desempenhado por ela na antigadenominação (se chegou a ser dirigente, diáco-no, líder de mocidade etc.); o período de transi-ção da igreja para o terreiro; e a permanênciapor parte do indivíduo na nova fé.

    CONSIDERAÇÕES SOBRE A PASSAGEMDE PENTECOSTAIS PARA A UMBANDA

    O caso do seu Francisco é um dos mais ob-servados na história da maioria dos pais-de-san-to que já foram evangélicos. Descobrindo-semédiuns, a primeira reação é a não aceitação,depois a tentativa de fuga, e como vimos, asigrejas pentecostais ou evangélicas surgemcomo a melhor saída para essa situação.

    De início o seu Francisco nos contou quedesde os primeiros sinais de sua mediunidade,

    com visões e outros fenômenos, ele e sua famí-lia buscaram de pronto a igreja. Provavelmenteele teve que se afastar da família quando saiude casa, convidado para ser cantador, tendotalvez que se afastar também da congregaçãona qual participava como membro. Seu Fran-cisco não especificou como foi a sua vivênciadurante esse período, disse-nos, entretanto, quejá aos vinte anos era dirigente de uma congre-gação da Igreja Cristã Evangélica na cidade deRosário/MA. Assim ele relata como foi a suasaída da igreja:

    “Depois de ter apanhado que nem cachorro,os irmãos (os encantados) me mostraram que

    não ia adiantar continuar no meio daquelebando de hipócritas, que andam com a Bíbliadebaixo do braço e não seguem nada do que taali. Eles sabiam que eu trabalhava (na magia) econtinuava indo pra igreja, até que eu vi: oueram um ou outro”. (Entrevista – 06/02/2002?).

    Seu Francisco afirma que a sua saída daigreja não foi brusca, passou um tempo se con-gregando e trabalhando com os encantadosmeio às escondidas antes de decidir-se definiti-vamente.

    Esse momento de transição acontece como

    um reconhecimento de terreno ou uma manei-ra de não ser desprezado ou discriminado pelosantigos “irmãos” de congregação, o que aconte-ce cedo ou tarde. Sabemos que deve ser muitodifícil para um ex-pentecostal, mesmo estandomuito tempo fora da igreja, aceitar de imediatotudo aquilo que durante o seu tempo de igrejaera condenado euforicamente como coisa dodemônio. Já na conversão de umbandistas aopentecostalismo existe uma espontaneidademaior, o indivíduo diz aceitar a Jesus como seusalvador, a igreja ora por ele e com a sua confis-são pública passa a ser um novo membro da co-munidade (geralmente, na maioria das igrejasevangélicas, o batismo em água é a “oficializa-ção” da pessoa como membro, tendo um peque-no período de acompanhamento no qual é cha-mado de novo convertido). Nas religiões afro-bra-sileiras, a pessoa após identificada como médiumdeve passar por um longo período de iniciação,dependendo do grau de mediunidade.

    O motivo apontado por Fry e Howe (1975,p. 75) para a conversão de uma pessoa ao pen-tecostalismo ou à umbanda seria a aflição:

    Enquanto as agências seculares (médico, advo-gados etc.) tratam de sintomas específicos, asreligiosas pretendem oferecer soluções paratodas as aflições em geral. Entre as respostasreligiosas, a umbanda e o pentecostalismo seopõem às demais no seu modo de recrutamen-to, que é feito geralmente através da aflição.

    Entrevista com Seu Francisco

       F  o   t  o  a  c  e  r  v  o   d  e   M

      u  n   d   i  c  a  r  m  o   F  e  r  r  e   t   t   i

  • 8/18/2019 Boletim Da CMF - e56879d03c365b0948a2a15e3b1fb3df

    16/24

    Boletim 38 / agosto 20071616

    CONTINUAÇÃO

    Para nossos entrevistados, ums motivos para que houvesse audança entre essas duas religiões,ntre outros, seria a insatisfaçãom a atual religião. No caso dentecostais aderirem à umbanda,

    ma das respostas apontadas pelos

    e passaram por essa experiência mesma dada por dona Socorro,

    ãe-de-santo de Codó da Tendapírita de Umbanda São Jorge:

    Crente vira macumbeiro por-que o lugar dele é aqui, podeandar por onde quiser, mas sefor médium de verdade, o lugardele é trabalhando com os en-cantados dele.

    Como vemos, além da insatis-ção com a religião, a mediunida-aparece como determinante dassagem de pentecostais para a

    mbanda. Isso é como se a pessoaentrasse sabendo-se portadoraum dom, a capacidade de co-

    unicar-se com os espíritos, e por-dora de uma entidade que lheotege. Diferentemente, no pen-costalismo, no qual o dom do Es-rito Santo é recebido após a con-rsão em um longo e difícil cami-o de santificação.

    AS RELIGIÕES ANTIGA

    E ATUALPara o seu Francisco, os seus

    nte anos na igreja foram uma pro-à qual ele teve que passar, feitar seus guias:

    Agora tô satisfeito e enquantovida Deus me der eu vou conti-nuar trabalhando com os irmãos(os encantados). (Entrevista em06/02/2002).

    Quase todos os umbandistas

    e passaram por igrejas evangéli-s vêem de forma semelhante ou tempo de igreja. Porém para oseres pentecostais essas pessoaso “nasceram de novo” ou não “re-tiram ao diabo”, entre outras ex-cações do “fracasso” dos seus ex-eptos.

    Existem outros casos difíceis detectar de umbandistas converti-s, mas que continuam pratican-suas obrigações às escondidas,

    mo já visto no caso de seu Fran-co. Muitos deles tem medo de

    ostrarem-se fracassados paraus “irmãos” de igreja e temem serscobertos e sofrer discrimina-es. Num artigo ainda inédito deundicarmo Ferretti, ela nos falamo os encantados de filhos-de-nto que ficam entre o templo e orreiro encaram essa situação aozerem: “ele (o filho-de-santo) ée é crente, não sou eu”.

    Geralmente os umbandistasex-pentecostais não gostam de fa-lar da igreja. Sempre falam quesofreram algum tipo de discrimina-ção por parte dos antigos irmãos.Isso é devido à organização pente-costal ser mais policiada, cadaadepto exercendo o papel de vigiado seu irmão (ROLIM, 1987), sen-do que o desviar-se da fé é quaseque uma traição. Já na umbanda,

    constituída principalmente por gru-pos pequenos, a repercussão nãoé tão grande ou escandalosa se umfilhos-de-santo se converte ao pen-tecostalismo, pois todos sabem quemais cedo ou mais tarde ele vai terque voltar para os seus guias.

    CONCLUSÃO

    A mediunidade foi o fator maiscomum indicado pelos umbandis-tas ex-pentecostais como a causade aderirem à umbanda, e há

    particularidades, por exemplo,nem todos os médiuns terão quefazer cabeça (serem iniciados), de-pendendo do grau de mediunida-de da pessoa, de acordo com seuFrancisco, seguindo claramente adoutrina kardecista encontrada noLivro dos Espíritos   (KARDEC,Alan, 2001). A mediunidade assimé vista como um sinal de Deus, de

    REFERÊNCIAS

    FRY, Peter Henry; HOWE, GaryNigel. Duas Respostas à Afli-ção: Umbanda e Pentecostalis-mo. Debate e Crítica. N. 06, jul.1975. p. 75-94.KARDEC, Allan. O livro dos Espíritos . (trad. Guillon Ri