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Conferência Internacional sobre Reabilitação de Estruturas Antigas de Alvenaria 63 AS OBRAS DE ARTE CLASSIFICADAS SOB JURISDIÇÃO DA EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A. - METODOLOGIAS DE MANUTENÇÃO E REABILITAÇÃO Neuza Rodrigues Engenheira Civil EP - Estradas de Portugal, S.A. Almada - Portugal António Pinho Ramos Professor Auxiliar DEC FCT UNL Caparica - Portugal SUMÁRIO O Sistema de Gestão de Obras de Arte (SGOA) implementado na EP Estradas de Portugal, S.A. (adiante designada de EP) veio permitir um registo actualizado do universo das obras de arte que se encontram sob a sua jurisdição, constituindo uma importante e indispensável ferramenta de gestão. No universo aproximado de 5029 obras de arte actualmente inventariadas, cerca de 1099 são pontes totalmente construídas em alvenaria, traduzindo-se numa percentagem de cerca de 22% do total de obras inventariadas. Dessas obras de arte em alvenaria, apenas 11 são classificadas ou em vias de classificação e encontram-se sob gestão directa da EP. Pela sua especificidade, as obras de arte em alvenaria têm sido alvo de uma crescente preocupação por parte da EP, não só em termos de comportamento estrutural, mas também no que respeita ao seu diagnóstico e à metodologia de intervenção. São, no entanto, as obras que constituem o património histórico que, pela sua natureza intrínseca, têm apresentado os maiores desafios em termos de diagnóstico e reabilitação. Neste contexto a EP, em sintonia com as entidades que detêm competências neste domínio, tem particularizado o estudo e a intervenção em cada uma destas obras de arte, encontrando-se a desenvolver procedimentos específicos para a sua manutenção, não se tratassem essas pontes de estruturas únicas, de características e épocas diferentes entre si. 1. INTRODUÇÃO O acréscimo de obras de arte na Rede Rodoviária Nacional, em virtude da concretização do Plano Rodoviário Nacional nestas últimas décadas, obrigou a que a EP tivesse uma gestão diferenciada no que respeita às estruturas de alvenaria. Também a vulgarização a partir da segunda metade do século XX da utilização de betão armado na construção de obras de arte levou a que as técnicas de construção em alvenaria caíssem em desuso com o desaparecimento de mão-de-obra especializada e ao acréscimo de dificuldade na sua manutenção e reabilitação, tendo-se vindo a assistir recentemente à recuperação destas tecnologias. São, no entanto, as obras que constituem o património classificado que pela sua natureza intrínseca, apresentam os maiores desafios em termos de diagnóstico e reabilitação, e por essa razão têm sido alvo de uma maior preocupação e interesse por parte da EP. O prévio e aprofundado conhecimento da evolução histórica destas obras de arte e as principais anomalias que as podem afectar pode ser a primeira etapa para o desenvolvimento de um adequado projecto de intervenção. O respeito pelos materiais originais, pela história da ponte e pela sua localização e dignidade, são os princípios base de um bom projecto de intervenção em obras de valor patrimonial.

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AS OBRAS DE ARTE CLASSIFICADAS SOB JURISDIÇÃO DA EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A.

- METODOLOGIAS DE MANUTENÇÃO E REABILITAÇÃO

Neuza Rodrigues Engenheira Civil

EP - Estradas de Portugal, S.A. Almada - Portugal

António Pinho Ramos Professor Auxiliar DEC FCT UNL

Caparica - Portugal SUMÁRIO O Sistema de Gestão de Obras de Arte (SGOA) implementado na EP – Estradas de Portugal, S.A. (adiante designada de EP) veio permitir um registo actualizado do universo das obras de arte que se encontram sob a sua jurisdição, constituindo uma importante e indispensável ferramenta de gestão. No universo aproximado de 5029 obras de arte actualmente inventariadas, cerca de 1099 são pontes totalmente construídas em alvenaria, traduzindo-se numa percentagem de cerca de 22% do total de obras inventariadas. Dessas obras de arte em alvenaria, apenas 11 são classificadas ou em vias de classificação e encontram-se sob gestão directa da EP. Pela sua especificidade, as obras de arte em alvenaria têm sido alvo de uma crescente preocupação por parte da EP, não só em termos de comportamento estrutural, mas também no que respeita ao seu diagnóstico e à metodologia de intervenção. São, no entanto, as obras que constituem o património histórico que, pela sua natureza intrínseca, têm apresentado os maiores desafios em termos de diagnóstico e reabilitação. Neste contexto a EP, em sintonia com as entidades que detêm competências neste domínio, tem particularizado o estudo e a intervenção em cada uma destas obras de arte, encontrando-se a desenvolver procedimentos específicos para a sua manutenção, não se tratassem essas pontes de estruturas únicas, de características e épocas diferentes entre si. 1. INTRODUÇÃO O acréscimo de obras de arte na Rede Rodoviária Nacional, em virtude da concretização do Plano Rodoviário Nacional nestas últimas décadas, obrigou a que a EP tivesse uma gestão diferenciada no que respeita às estruturas de alvenaria. Também a vulgarização a partir da segunda metade do século XX da utilização de betão armado na construção de obras de arte levou a que as técnicas de construção em alvenaria caíssem em desuso com o desaparecimento de mão-de-obra especializada e ao acréscimo de dificuldade na sua manutenção e reabilitação, tendo-se vindo a assistir recentemente à recuperação destas tecnologias. São, no entanto, as obras que constituem o património classificado que pela sua natureza intrínseca, apresentam os maiores desafios em termos de diagnóstico e reabilitação, e por essa razão têm sido alvo de uma maior preocupação e interesse por parte da EP. O prévio e aprofundado conhecimento da evolução histórica destas obras de arte e as principais anomalias que as podem afectar pode ser a primeira etapa para o desenvolvimento de um adequado projecto de intervenção. O respeito pelos materiais originais, pela história da ponte e pela sua localização e dignidade, são os princípios base de um bom projecto de intervenção em obras de valor patrimonial.

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Assim, e atendendo ao vasto património de obras de arte de alvenaria sob a jurisdição da EP, a quem cabe a responsabilidade da sua conservação, é seu dever e obrigação garantir a sua boa preservação no património nacional. Neste sentido, a EP tem desenvolvido estratégias e filosofias de projecto de intervenção para estas obras de arte, particularizando os seus estudos e desenvolvendo procedimentos específicos para a sua manutenção, em sintonia com as entidades que detêm competências neste domínio. 2. PONTES DE ALVENARIA - ENQUADRAMENTO 2.1. Resenha histórica Apesar de as primeiras estruturas em arco terem surgido inicialmente na Mesopotâmia e no Egipto entre os anos de 4.000 a.C. e 3.000 a.C., é com os romanos que nascem os primeiros verdadeiros engenheiros da nossa civilização. Tendo por base os conhecimentos adquiridos do contacto com as culturas etrusca e grega e partindo da aplicação do arco, do ponto de vista pragmático e através de experiências em série, os romanos deduziram os princípios teóricos da construção de pontes. As pontes romanas eram pesadas e construídas dentro da lógica global do grande sistema de vias imperiais. Da sua observação pode-se denotar uma preocupação pela simetria e por uma certa unidade no conjunto. Entre as principais características destas obras podem-se considerar os arcos iguais entre si, normalmente de volta inteira e com aduelas largas, tabuleiros de perfil horizontal, alvenaria de pedra almofadada e as marcas de fórfex.

Figura 1: Ponte de Trajano (Chaves, Portugal) e Ponte Romana de Vila Formosa (Portalegre, Portugal) Com a queda do império romano no século V d.C., iniciou-se um período de estagnação na construção de pontes. É só no início da Idade Média que se volta a verificar a preocupação pela (re)construção de estradas, pontes e outras edificações. Tratando-se de uma época caracterizada pelo grande incremento das trocas comerciais entre povoados, a construção de pontes medievais dependia das condições económicas e políticas existentes. Assim, surgiram as pontes fortificadas, que albergavam, muitas vezes, lojas, capelas e oficinas. A despreocupação pela simetria e unidade na construção de pontes, bem como a facilidade e rapidez de construção, leva a que os seus arcos sejam geralmente assimétricos, diminuindo-se o números de pilares no leito dos rios, passando os tabuleiros a ter um perfil em cavalete.

Figura 2: Ponte da Lagoncinha (Vila Nova de Famalicão, Braga) e Ponte Vecchio (Florença, Itália)

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O período renascentista trouxe os primeiros avanços na construção de pontes desde o período romano à medida que os arquitectos e artistas testavam novas maneiras de alongar os arcos e evitar a implantação de um elevado número pilares no leito dos rios, aumentando assim a secção de vazão das pontes. Os arcos tornam-se cada vez mais refinados e cada vez mais arrojados na proporção. É nesta época que é formada, em França, a primeira escola de pontes e estradas “École des ponts et Chaussées”, fundada por Jean-Rodolphe Perronet. Assim, é neste período que a forma dos arcos e dos pilares se alterou no sentido de aumentar os vãos bem como transmitir uma sensação de leveza e estética.

Figura 3: Ponte da Barca s/ Rio Lima (Ponte da Barca, Portugal) e Ponte Santa Trinita (Florença, Itália) Desde o Renascimento, período de grandes avanços e descobertas científicas nomeadamente das teorias da resistência dos materiais, até aos nossos dias, muitos foram os avanços feitos nas técnicas de cálculo e construção de pontes de alvenaria. Não só os métodos, as ferramentas e as exigências regulamentares de cálculo evoluíram, como também os processos construtivos, nomeadamente no que se refere aos cimbres, que se tornam cada vez mais, eles próprios, estruturas de grande complexidade. Com o advento da Revolução Industrial no século XIX e o aparecimento da rede ferroviária como via de comunicação, os produtos siderúrgicos como o ferro e o aço tornam-se mais competitivos, passando a ser amplamente utilizados na construção de pontes. Já no final desse século aparece um novo material, o betão, que permitiu também avultados avanços na construção de pontes. No entanto, o uso de alvenaria de pedra e tijolo na construção de pontes prolongou-se até meados do século XX. Com a evolução dos viadutos ferroviários, os engenheiros começam a projectar pontes de forma mais audaz, nomeadamente no que se refere aos seus pilares, que se começam a tornar cada vez mais esbeltos.

Figura 4: Ponte Duarte Pacheco (Porto, Portugal) e Ponte da Régua (Régua, Portugal) 2.2. Principais anomalias comuns As pontes de alvenaria apresentam, normalmente, um conjunto de anomalias comuns a elas, em cuja origem se podem encontrar factores associados, não só à ausência ou inadequada manutenção e utilização das obras, como também à sua má concepção em termos de materiais e processos construtivos utilizados, conduzindo por isso ao seu acentuado processo de degradação. Com base na importância na estabilidade, durabilidade e funcionalidade, podemos considerar três grupos de anomalias:

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a) Anomalias de índole não estrutural ou de durabilidade – As anomalias não estruturais manifestam-se essencialmente pela degradação da aparência dos elementos constituintes das pontes, tendo influência directa na sua durabilidade e correspondendo geralmente a situação que podem ser facilmente tratadas. Embora este tipo de anomalias não interfira no comportamento estrutural da ponte a curto prazo, pode no entanto causar danos graves na estrutura a longo prazo, nomeadamente na diminuição da capacidade resistente dos componentes estruturais da ponte, sendo por isso aconselhável a realização periódica de trabalhos de manutenção. Entre as principais anomalias não estruturais podem-se enumerar as seguintes:

· Presença de vegetação infestante e poluição biológica. · Presença de água no material de enchimento da ponte e de escorrimentos e manchas de humidade. · Perda e/ou degradação das argamassas nas juntas das alvenarias. · Degradação/erosão do material pétreo das alvenarias.

Figura 5: Exemplos de anomalias de índole não estrutural ou de durabilidade b) Anomalias de índole estrutural – As anomalias estruturais são aquelas que, como o próprio nome indica, podem colocar em causa a segurança estrutural das pontes e a sua perda de funcionalidade. Este tipo de anomalias pode-se encontrar associado a vários factores, nomeadamente, à evolução das anomalias não estruturais quando estas não são colmatadas em tempo útil, ao acréscimo de cargas para as quais não foram originalmente construídas, a deficiências construtivas, a situações climatéricas adversas, a situações acidentais, etc., sendo aconselhável a intervenção atempada e mediante a elaboração de projecto de reabilitação e/ou reforço. Entre as principais anomalias estruturais podem-se enumerar as seguintes:

· Abertura de juntas e/ou fendas longitudinais e transversais. · Infra-escavações e erosão de fundações. · Danos nos tímpanos (inclinação, empolamento, deslocamento, escorregamento, destacamento, etc.). · Movimentos nos apoios das pontes. · Deslocamento, destacamento e ruína de elementos.

Figura 6: Exemplos de anomalias de índole estrutural c) Anomalias funcionais – Classificam-se como anomalias funcionais aquelas que embora não coloquem em risco o comportamento estrutural da ponte, podem no entanto contribuir para a ocorrência de outros tipos de anomalias. Este tipo de anomalias pode afectar essencialmente a utilização e funcionalidade da obra. Entre as principais anomalias funcionais podem-se enumerar as seguintes:

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· Deformação, fissuração ou deterioração global dos pavimentos e passeios. · Insuficiente secção transversal da via. · Obstrução ou inexistência do sistema de drenagem. · Deterioração dos guarda-corpos metálicos ou de alvenaria. · Obstrução da linha de água. · Existência de vegetação ou detritos nos passeios e pavimentos. · Deterioração de muros de contenção.

Figura 7: Exemplos de anomalias funcionais 2.3. Principais metodologias de intervenção Após a identificação e registo das anomalias existentes através da realização de uma Inspecção à obra e eventual realização de ensaios expeditos, torna-se necessário definir quais as necessárias e melhores técnicas de intervenção a executar na ponte, podendo as mesmas ser de manutenção, conservação ou reabilitação e reforço. a) Intervenções de manutenção e conservação As acções de manutenção realizadas atempadamente são imprescindíveis para assegurar a longevidade de uma estrutura, reduzindo significativamente o surgimento de anomalias graves que podem comprometer a sua eficiência e cuja reparação poderá revelar-se mais significativa e dispendiosa. Assim, a manutenção das pontes poderá ser encarada como uma das mais importantes actividades na conservação de uma rede de infra-estruturas, compreendendo todas as operações que sirvam para manter a estrutura existente em bom estado de serviço e prolongar ao máximo a sua vida útil e tendo como principais objectivos garantir a sua integridade e segurança estrutural, assegurar a funcionalidade e o conforto de exploração e preservar o seu valor patrimonial de todos os pontos de vista. As acções de manutenção decorrem normalmente das Inspecções de Rotina podem-se traduzir essencialmente em trabalhos de limpeza geral dos paramentos das pontes, limpeza e desobstrução dos órgãos de drenagem, limpeza de passeios e vias, limpeza de taludes e supressão de vegetação indesejável, desobstrução da linha de água nas imediações da ponte, limpeza, pintura e reparações localizadas de guarda-corpos e outros equipamentos da ponte, reparações pontuais de alvenarias degradadas, preenchimento ou selagem de juntas desguarnecidas, reparação de pavimentos e colmatação de pequenas cavidades ou erosões nas fundações. No entanto, nem sempre os trabalhos de manutenção permitem colmatar todas as anomalias existentes, principalmente se estas forem de índole estrutural, havendo assim a necessidade de intervir de forma mais específica em termos de reabilitação. b) Intervenções de reabilitação e reforço As intervenções a nível de reabilitação e reforço a efectuar numa ponte deverão ser sempre escolhidas tendo em referência o seu comportamento estrutural, tanto antes como depois das intervenções, e as anomalias existentes e suas causas prováveis para melhor se concluir sobre os mais eficazes métodos e soluções a aplicar. As intervenções a realizar deverão ser, sempre que possível escolhidas de forma a não descaracterizar esteticamente a ponte e a manter a sua integridade física e funcional.

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De entre os vários tipos de trabalhos de reabilitação e reforço aplicáveis a pontes de alvenaria, podem-se considerar mais comuns na intervenção em pontes com valor patrimonial o refechamento de juntas de alvenaria, a aplicação de tirantes e pregagens, a injecção do enchimento dos cofres da ponte, a impermeabilização do tabuleiro a consolidação e reforço de fundações e o desmonte e/ou reconstrução de elementos em ruína. Importa referir que alguns dos trabalhos acima referenciados deverão apenas ser executados quando de necessidade imperiosa, uma vez que poderão conduzir a alterações mais ou menos significativas na estética da ponte e no seu funcionamento estrutural. Salienta-se ainda a importância da utilização de materiais o mais parecidos com os originalmente usados na sua construção e compatíveis com os materiais constituintes. 3. OBRAS CLASSIFICADAS DE ALVENARIA NO PATRIMÓNIO DA EP 3.1. O Sistema de Gestão de Obras de Arte da EP (SGOA) O Sistema de Gestão de Obras de Arte implementado na EP consiste numa ferramenta de apoio à decisão implementada com o principal objectivo de definir prioridades nas intervenções, com análise de custo/benefício, proporcionando aos técnicos envolvidos na gestão do Património de Obras de Arte da EP a possibilidade da tomada consistente e estruturada de decisões relativas à sua conservação e manutenção. Para o conhecimento efectivo do património, este deve estar devidamente identificado, quer em termos administrativos (jurisdição, localização, etc.), quer técnicos no que se refere à sua caracterização geral e condicionantes, e ainda de constituição que respeita aos levantamentos dos diversos componentes constituintes da obra de arte. No final de 2011 encontravam-se inventariadas cerca de 5029 obras de arte pertencentes ao património da EP, excluindo as obras de arte pertencentes a Concessionárias, cerca de 4557 sob gestão directa da EP e cerca de 472 obras de arte com interferência directa nas suas vias. Das 5029 obras de arte actualmente inventariadas, cerca de 1099 são pontes totalmente construídas em alvenaria, traduzindo-se numa percentagem de 22% do total de obras inventariadas. Dessas 1099 pontes, apenas 11 se encontram classificadas ou em vias de classificação e sob gestão directa da EP. 3.2. Breve descrição das obras de arte classificadas existentes Apesar de se tratar de estruturas únicas, de tipologias e épocas diferentes, estas onze obras de arte apresentam características comuns entre si. Umas de raiz romana, outras de raiz medieval, todas estas obras de arte sofreram ao longo dos anos várias obras de reparação e beneficiação.

a) b) c) d)

e) f) g)

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h) i) j) k)

Figura 8: Obras de arte classificadas sob gestão directa da EP: a) Ponte da Pedra; b) Ponte da Barca; c) Ponte Velha de Ponte de Lima; d) Ponte do Cavez; e) Ponte do Prado; f) Ponte de Caldelas; g) Ponte Romana do Porto;

h) Ponte Romana de Vila Formosa; i) Ponte de Góis; j) Ponte D. Zameiro; k) Ponte Filipina Com tabuleiros em perfil longitudinal horizontal ou em cavalete, estas obras de arte são constituídas por arcos de volta inteira ou quebrados em cantaria de granito reforçados por talha-mares. Na seguinte tabela apresentam-se algumas características das onze obras de arte classificadas sob jurisdição da EP.

Tabela 1 - Obras de arte classificadas – algumas características

Designação Extensão Largura N.º arcos Ponte da Pedra s/ Rio Tuela 69m 6.20m 6 Ponte da Barca s/ Rio Lima 177m 5.45m 10

Ponte Velha de Ponte de Lima 378m 4.73m 22 Ponte de Cavez s/ Rio Tâmega 79m 8.25m 5 Ponte do Prado s/ Rio Cávado 200m 5.70m 9

Ponte de Caldelas s/ Rio Homem 30m 3.60m 3 Ponte Romana do Porto 166m 3.50m 12

Ponte Romana de Vila Formosa 69m 6.70m 6 Ponte de Góis s/ Rio Ceira 38m 4.83m 3

Ponte D. Zameiro e Azenhas 119m 4.13m 8 Ponte Filipina 81m 4.66m 4

Estas obras de arte encontram-se maioritariamente distribuídas pelo norte de Portugal, sendo que apenas a Ponte Romana de Vila Formosa se encontra localizada a sul do país. Das onze pontes classificadas sob gestão directa da EP, oito delas encontram-se classificadas como Monumento Nacional, uma está classificada como Imóvel de Interesse Público e duas encontram-se em vias de classificação.

Tabela 2 - Obras de arte classificadas – localização e categoria de protecção

Designação Estrada Distrito Categoria de Protecção Ponte da Pedra s/ Rio Tuela EN206 Bragança Monumento Nacional Ponte da Barca s/ Rio Lima EN101 V. Castelo Monumento Nacional

Ponte Velha de Ponte de Lima EN201 V. Castelo Monumento Nacional Ponte de Cavez s/ Rio Tâmega EN206 Braga Monumento Nacional Ponte do Prado s/ Rio Cávado EN201 Braga Monumento Nacional

Ponte de Caldelas s/ Rio Homem EN308 Braga Monumento Nacional Ponte Romana do Porto ER205 Braga Monumento Nacional

Ponte Romana de Vila Formosa EM369 Portalegre Monumento Nacional Ponte de Góis s/ Rio Ceira EN342 Coimbra Imóvel de Interesse Público

Ponte D. Zameiro e Azenhas EN306 Porto Em vias de Classificação Ponte Filipina EN232 Guarda Em vias de Classificação

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3.3. Actual ponto de situação das obras de arte classificadas A análise efectuada aos resultados das Inspecções Principais realizadas às obras de arte acima referidas, tendo em atenção as principais anomalias nelas detectadas, sendo que a maioria se enquadra nas anomalias comuns a este tipo de estruturas (juntas desguarnecidas, fendas nos arcos e apoios, destacamento e deterioração de elementos pétreos, infra-escavações, etc.), permitiu definir a prioridade das intervenções a efectuar, bem como a tipologia de trabalhos a executar (manutenção, conservação, reabilitação e reforço).

Tabela 3 - Obras de arte classificadas – ponto de situação e previsão de conclusão das empreitadas

Designação Situação Previsão de Conclusão Ponte da Pedra s/ Rio Tuela Sem encaminhamento definido Manutenção Ponte da Barca s/ Rio Lima Projecto terminado 1.º Sem 2013

Ponte Velha de Ponte de Lima Projecto lançado 1.º Sem 2014 Ponte de Cavez s/ Rio Tâmega Projecto terminado 1.º Sem 2013 Ponte do Prado s/ Rio Cávado Empreitada concluída ---

Ponte de Caldelas s/ Rio Homem Projecto em curso 2.º Sem 2013 Ponte Romana do Porto Projecto lançado 1.º Sem 2014

Ponte Romana de Vila Formosa Empreitada concluída (Ponte

transferida para a C.M.) ---

Ponte de Góis s/ Rio Ceira Projecto em curso 1.º Sem 2013 Ponte D. Zameiro e Azenhas Empreitada concluída ---

Ponte Filipina Projecto em curso 1.º Sem 2013 Da análise efectuada à tabela anterior pode-se observar que três das obras de arte se encontram com empreitadas concluídas, a Ponte da Pedra apenas necessita de trabalhos de manutenção atendendo ao seu bom estado de conservação, a realizar no âmbito do contrato de conservação corrente plurianual e as restantes sete obras de arte apresenta uma previsão de conclusão das suas empreitadas no espaço de um a dois anos, prazos compatíveis com o tipo de anomalias detectadas e os seus estados de conservação. 4. GESTÃO DOS PROCESSOS DE INTERVENÇÃO EM PONTES CLASSIFICADAS Tratando-se estas pontes de património classificado ou em vias de classificação, apesar de dependerem directamente da EP para a sua operação e conservação, qualquer acto ou intenção quanto a uma intervenção de reabilitação destas estruturas requer parecer e autorização das entidades que detêm competências neste domínio, neste caso as Direcções Regionais de Cultura (adiante designadas de DRC). Neste sentido, a realização prévia de reuniões com essas entidades torna-se uma etapa de extrema importância na definição da estratégia e filosofia de projecto e intervenção. 4.1. Âmbito dos estudos e condicionamentos de projecto – O papel da EP O comportamento estrutural único de cada uma destas pontes de alvenaria associado à sua representatividade no universo de obras de arte da EP e ao seu valor patrimonial obrigaram a uma preocupação distinta quanto aos seus métodos de diagnóstico, filosofias de projecto e metodologias de intervenção. Assim, o processo inicia-se com a definição, por parte dos técnicos da EP, dos trabalhos a realizar no âmbito do contrato do estudo de reabilitação e reforço da obra de arte, que constam normalmente dos seguintes:

· Trabalhos auxiliares – Estes trabalhos apresentam como principal objectivo a caracterização da obra de arte existente, tanto em termos de características geométricas e físicas como em termos de anomalias existentes, estando incluídas actividades como o levantamento topográfico e de pormenor da ponte, levantamento de serviços afectados, realização de inspecção principal e subaquática (quando aplicável),

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realização de campanha de prospecção geológico-geotécnica e de ensaios de caracterização dos materiais (quando necessário).

· Projecto de intervenção – Nesta fase inclui-se as actividades de realização de um relatório de caracterização e avaliação do interesse patrimonial da obra, elaboração do estudo prévio contendo vários cenários possíveis de intervenção na obra de arte, incluindo uma comparação em termos económicos e estruturais das várias opções de reabilitação e reforço e a elaboração do projecto de execução propriamente dito, que servirá de base à empreitada, no qual deverão ser desenvolvidas as soluções aprovadas em fase de estudo prévio. É nesta fase de projecto de execução que todos os trabalhos, materiais, condicionamentos e processos construtivos deverão ser correctamente e exaustivamente definidos.

Após a adjudicação do estudo e previamente à elaboração do Estudo Prévio, é feita uma reunião preliminar com o adjudicatário de sensibilização do mesmo para o tipo de estrutura a intervencionar, bem como para disponibilização de informação relevante ao desenvolvimento do referido estudo, fornecida pelas DRC ou já existente na EP, atendendo a experiencias em projectos anteriores. Tendo por base a inspecção realizada no âmbito do projecto e as anomalias aí detectadas, é determinado o tipo de intervenção a desenvolver em fase de projecto, o qual poderá ser de simples reabilitação ou, no caso da existência de graves anomalias de índole estrutural, de reabilitação e reforço estrutural. Essa decisão deverá ser sempre tomada tendo presente não só as preocupações estéticas e arqueológicas, como também as preocupações estruturais e de segurança rodoviária das estruturas. O processo de desenvolvimento do estudo completo é sempre coordenado pela EP e acompanhado pelas DRC, sendo que todas as considerações feitas por essas entidades são transmitidas ao adjudicatário e analisadas em conjunto de forma a este proceder às adaptações necessárias ao seu projecto. 4.2. A interface com as Direcções Regionais da Cultura (DRC) Conforme anteriormente exposto, à luz da legislação em vigor, qualquer tipo de intervenção de conservação, manutenção ou reabilitação/reforço que se pretenda efectuar em pontes classificadas tem de ser analisada e submetida a autorização/aprovação por parte das DRC. Neste sentido, e de forma a sensibilizar essas entidades para a necessidade dessas intervenções, é realizada uma reunião prévia ao lançamento do estudo ou logo após a sua adjudicação nos casos em que se justifique o célere lançamento desse estudo. O seguinte esquema apresenta o circuito normal da interacção entre a EP e as DRC.

Figura 9: Esquema de interacção entre a EP e as DRC

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Da análise efectuada ao esquema acima representado pode-se observar que o processo de aprovação dos estudos de obras de arte classificadas e consequentemente do início dos trabalhos de intervenção pode-se tornar bastante complexo uma vez que nem sempre as soluções preferíveis do ponto de vista patrimonial são as desejáveis do ponto de vista estrutural, podendo ter como consequências o aumento do custo das empreitadas e, em casos extremos, o encerramento das obras de arte e de estradas nacionais, podendo-se traduzir em situações de desconforto dos seus utilizadores e consequências económicas à escala local. Assim, o desejável será um aproximar de pontos de vista a nível patrimonial e estrutural, já que se tratam de obras de arte com dupla função. 5. ACTUAIS DESENVOLVIMENTOS Atendendo ao vasto património de obras de arte em alvenaria sob gestão da EP, julga-se do maior interesse um maior conhecimento das técnicas a utilizar na sua manutenção, em especial naquelas que constituem o património classificado. Assim, e atendendo ao complexo processo de autorização prévia por parte das DRC quando se pretende levar a efeito intervenções de manutenção neste tipo de obras de arte, sendo estas precisamente de pequena tecnicidade, mas fundamentais para a segurança rodoviária e durabilidade das estruturas, entendeu a EP dotar a empresa de um documento técnico, designado de “Manual de Manutenção de Pontes Históricas em Alvenaria de Pedra”, elaborado através de uma prestação de serviços externa à empresa com a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, tendo por base as características das obras classificadas sob gestão da EP, que fosse aceite pelo IGESPAR e pelas DRC, permitindo assim a agilização dos processos de autorização de intervenções de manutenção. Essa prestação de serviços engloba ainda a realização de um estudo do comportamento estrutural de uma ponte classificada, através da sua modelação numérica de forma a permitir um melhor entendimento e conhecimento deste tipo de estruturas. Esse estudo permitirá ainda definir os métodos a adoptar em futuras inspecções a realizar a este tipo de estruturas, bem como das suas necessidades específicas, para uma correcta manutenção e conservação, integrando-os na actividade de Conservação Corrente da EP. 6. AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer à empresa EP – Estradas de Portugal, S.A. pela disponibilização dos elementos necessários à elaboração do presente artigo. 7. REFERÊNCIAS [1] EP – Estradas de Portugal, S.A. – Sistema de Gestão de Conservação de Obras de Arte da EP. Almada. [2] RODRIGUES, Neuza (2008) – Reabilitação de Pontes Históricas de Alvenaria. Dissertação de Mestrado para Obtenção de grau de Mestre em Engenharia de Estruturas. IST/UTL, Lisboa. [3] RODRIGUES, Neuza e RAMOS, A. Pinho (2011) – Gestão de Pontes Classificadas de Alvenaria inseridas na Rede Rodoviária Nacional. ASCP’2011 – 2.º Congresso Nacional sobre Segurança e Conservação de Pontes. UC, Coimbra, Junho/Julho de 2011.