AS INTERFERÊNCIAS DO TRABALHO NA QUALIDADE DE VIDA:...
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FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS, ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA
FACEF
AS INTERFERÊNCIAS DO TRABALHO NA QUALIDADE DE VIDA: um estudo com executivos, empregados de uma
empresa familiar de Franca
VÂNIA LEMOS ZAMBONI
FRANCA 2001
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS, ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA
FACEF
AS INTERFERÊNCIAS DO TRABALHO NA QUALIDADE DE VIDA: um estudo com executivos, empregados de uma
empresa familiar de Franca
VÂNIA LEMOS ZAMBONI Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, para obtenção do título de Mestre em Administração, área de concentração Gestão Empresarial, sob orientação da Profa. Dra. Maria Zita Figueiredo Gera.
FRANCA 2001
Z27i
Zamboni, Vânia Lemos As interferências do trabalho na qualidade de vida: um estudo com executivos, empregados de uma empresa familiar de Franca. / Vânia Lemos Zamboni. / Franca, (SP): 2001.
111 p. il. Orientadora: Maria Zita Figueiredo Gera Dissertação de Mestrado – FACEF Programa de Mestrado em Gestão Empresarial
1. Administração de empresas – Recursos Humanos 2. Gestão de Pessoas 3. Qualidade de vida .
CDD 658.8
CURRICULUM VITAE
VÂNIA LEMOS ZAMBONI
Data de Nascimento: 25/12/l958 RG 9797940 Email [email protected]
1982 Graduada em Psicologia. UEL-Universidade Estadual de
Londrina.
1982 a 1988 Docente de Psicologia Geral e Social, do
Desenvolvimento e da Aprendizagem.
Colégio Objetivo – Londrina.
1988 Psicóloga de Recursos Humanos
Hospital Evangélico de Londrina.
1985 a 1990 Psicóloga de Recursos Humanos
Rebouças Indústria de Plásticos Ltda.
1990 Docente de estágio supervisionado em Psicologia
Organizacional. UEL - Universidade Estadual de
Londrina.
1999 Pós-Graduação. Lato Sensu em Psicodrama.
Universidade de Franca / Celeiro / Febrap.
1993 a 2001 Gerente de Recursos Humanos e de Qualidade.
Amazonas Prod. Calçados Ltda. Divisão Quimicam.
2001 Pós-Graduação Strito Sensu – Mestrado em
Administração. Área de Concentração: Gestão
Empresarial. FACEF.
Banca Examinadora: Presidente: ___________________________ Profa. Dra. Maria Zita Figueiredo Gera Membro: _____________________________ Prof. Dr. Membro: _____________________________ Prof. Dr.
Ao Daniel, Mateus, Bruna e Caio, meus sobrinhos e afilhados queridos, filhos que não tive e a quem pertence o futuro. Na esperança que tenham uma melhor qualidade de vida do que nós!
Agradecimentos
À Mamãe e Papai, pelo exemplo de qualidade de vida que são, pois sabem dar e praticar o que ainda estou aprendendo. Ao João, pelo bom humor, pela leveza e pelo amor. À Martha Figueiredo minha terapeuta e companheira de jornada na busca da cura. Às minhas amigas do coração Stella e Beth pelos dramas e alegrias compartilhados. Aos batataenses de fato ou de coração: Maria Zita, Nono, Nona, tias Ernesta, Beatriz e Marina, que são fontes de inspiração cultural. À Quimicam, por reembolsar metade do meu mestrado, por servir de inspiração e por permitir minha pesquisa; na pessoa do Baldoino que tem sido além de chefe, amigo e incentivador do meu crescimento. Aos meus parceiros de jornada, Berteli, Daniel, Edmilson, Eliseu, Geraldo, Mário, Mariano, Paulo e Rodrigues; que a gente consiga juntos, ter uma qualidade de vida melhor.
ÍNDICE
LISTA DE FIGURAS 09
LISTA DE QUADROS 10
LISTA DE TABELAS 11
RESUMO 12
ABSTRACT 13
RESUMEN 14
INTRODUÇÃO 15
1 UMA VIAGEM PELO MUNDO DO TRABALHO. 201.1 Trabalho, emprego, desemprego e
aposentadoria................................................... 271.2 O futuro do trabalho e dos empregos............ 32
2 OS PAPÉIS................................................................... 352.1 Contaminação ou cristalização do papel
profissional....................................................... 392.2 A des-cristalização de papéis ......................... 442.3 O papel das lideranças em Recursos
Humanos.......................................................... 49
3 TRABALHO E QUALIDADE DE VIDA DO TRABALHADOR........................................................ 543.1 Os efeitos do muito trabalhar na qualidade
de vida das pessoas.......................................... 593.2 A qualidade de vida no trabalho..................... 63
4 METODOLOGIA........................................................ 714.1 Delineamento.................................................... 714.2 Universo e sujeitos da pesquisa...................... 724.3 O “locus” da pesquisa...................................... 734.4 Coleta de dados e análise dos dados............... 75
5 ANÁLISE DOS DADOS............................................. 775.1 Perfil da população.......................................... 785.2 Categorias de análise....................................... 815.2.1 Conceitos sobre trabalho e qualidade de vida. 825.2.2 Interferências do trabalho na qualidade de
vida.................................................................... 85
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................... 101
BIBLIOGRAFIA................................................................... 106
ANEXOS ............................................................................... 112
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1- Idade da população......................................... 79 FIGURA 2- Tempo de empresa.......................................... 80 FIGURA 3- Escolaridade da população............................. 81
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - Conceitos dos diferentes papéis.................. 38 QUADRO 2 - Mitos e realidades sobre RH....................... 50 QUADRO 3 - Capacidades requeridas pelo gestor/líder... 52 QUADRO 4 - Conceitos de Qualidade de Vida no
Trabalho...................................................... 67 QUADRO 5 - Ações e programas de Qualidade de Vida
no Trabalho nas empresas brasileiras......... 69
LISTA DE TABELAS
TABELA 1- Perfil da população ...................................... 78 TABELA 2- Qualidade de vida como escolha.................. 84 TABELA 3- Interferências do trabalho na qualidade de
vida............................................................... 86 TABELA 4- Distribuição do tempo semanal em horas p/
os diferentes papéis e atividades................... 90 TABELA 5- Papéis mais lembrados.................................. 94 TABELA 6- Interferências do papel profissional.............. 96 TABELA 7- Satisfação em relação à distribuição do
tempo............................................................ 97 TABELA 8- Onde gostariam de dedicar mais do seu
tempo............................................................ 98 TABELA 9- Preparação p/ o futuro (trabalho ou p/ o
“não trabalho”)............................................. 99
RESUMO
Trata-se de uma pesquisa com homens, provedores de suas
famílias, com cargos gerenciais de uma indústria química, fabricante de
adesivos em Franca, São Paulo. O objetivo da mesma é conhecer a relação
entre trabalho e a qualidade de vida de executivos na atualidade, segundo a
ótica do equilíbrio entre o trabalho e as demais atividades desempenhadas e
identificar a relação do papel profissional com outros papéis que são
desempenhados. Partimos dos seguintes pressupostos: o trabalho interfere
significativamente na qualidade de vida das pessoas; o trabalho excessivo traz
um sofrimento psíquico que priva os homens de uma melhor qualidade de
vida; os homens não estão encontrando tempo para refletir sobre os diferentes
papéis que desempenham uma vez que o papel profissional parece impedir o
exercício pleno dos outros papéis; considerando o sentido que o trabalho tem
na sociedade atual, os homens não estão preparados para o "não trabalho". A
pesquisa de campo é de caráter exploratório, e a população alvo constituiu-se
de um grupo de executivos, atual liderança da empresa, responsável pelas
equipes e pelos resultados em diferentes departamentos da mesma. Foi
realizada em Franca, entre dezembro de 2000 e maio de 2001, sendo
utilizadas entrevistas semi-estruturadas para a coleta de dados. Procedemos a
uma análise quantitativa e alguns dados foram avaliados na perspectiva
qualitativa, tendo os pressupostos como base.
Palavras-chave: trabalho; gestão de pessoas; recursos humanos; papéis; qualidade de vida; equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
ABSTRACT
This study deals with men, caretakers of their families, with
managerial posts of a chemical industry, manufacturer of adhesives in Franca,
São Paulo. The goal of this study is to understand the relationship between
work and the quality of life of executives today, according to the view of
equilibrium between work and other activities and identify the relation of the
professional role with the other roles being performed. We begin with the
following assumption: work interferes significantly with the quality of life of
people; excessive work brings a psychic suffering that deprives men of a
better quality of life; men are not finding time to reflect over the different
roles that they perform, given that the professional role hinders the full
practice of the other roles; taking into account the meaning of work in today´s
society, men are not prepared for unemployment. This research had an
explorative character; the target population was a group of executives, leaders
of their business, responsible for their staff and results in different
departments of the firm. The study took place in Franca, in December of
2000 and May of 2001, using semi-structured interviews for data collection.
We proceeded with a quantitative analysis and some of the information was
assessed with a qualitative perspective, having the assumptions as a base.
Key words: work; management of people; human resources; roles; quality of life; balance between personal and professional life.
RESUMEN
Trata-se de una pesquisa con hombres, jefes de familia, con
cargos de administración en una industria química, fabricante de adhesivos en
Franca, São Paulo. El objetivo de la pesquisa es de conocer la relación entre el
trabajo e la calidad de vida de los ejecutivos en la actualidad, según la ótica de
lo equilibrio entre el trabajo e las demás actividades desempeñadas e
identificar la reacción del papel profesional con los otros papeles que son
ejercidos. Empezamos con las siguientes presuposiciones: el trabajo interfiere
significativamente en la calidad de vida de las personas; el trabajo excesivo
trae un sufrimiento psíquico que priva los hombres de una mejor calidad de
vida; los hombres no están hallando tiempo para reflejar sobre los diferentes
papeles que ejercen, una vez que el papel profesional parece impedir el
ejercicio pleno de los otros papeles; considerando el sentido que el trabajo
tiene en la sociedad actual, los hombres no están preparados para el
desempleo. El tipo de la pesquisa fue de carácter exploratorio, e la
populación blanco el grupo de ejecutivos, actual liderato de la empresa,
responsables por los equipos e por los resultados en diferentes departamentos
de la compañía. Fué realizada en Franca, entre diciembre de 2000 e mayo de
2001, siendo utilizada entrevistas semi-estructuradas para la colecta de datos.
Procedemos una análisis cuantitativa e algunos datos fueran justipreciados en
una perspectiva cualitativa, teniendo las presuposiciones como base.
Palabras-llave: trabajo; gestión de personas; recursos humanos; papeles; calidad de vida; equilibrio entre vida personal e profesional.
15
INTRODUÇÃO
Com todas as mudanças desta virada de século na vida das
pessoas, na dinâmica familiar, nas empresas, no trabalho, no mercado, nossos
valores se confundem, se perdem na agitação, no ritmo alucinado destas
mudanças que chegam a se inverter. Os valores que norteiam a vida atual não
estão invertidos? Valores como família, saúde física e mental, afeto, descanso
e lazer. O equilíbrio de tempo, energia e dedicação ao trabalho, estudo,
carreira, família, lazer e outras atividades que assumimos ao longo de nossa
vida adulta. Trata-se de uma preocupação do mundo moderno.
Chegamos a extremos a partir dos quais, fica inevitável a
pergunta: trabalhar para viver ou viver para trabalhar?
O trabalho não deveria ser um meio para a sobrevivência, para a
realização, para a vida, e não um fim em si mesmo? Como explicar as
dimensões que o trabalho e o papel profissional tomaram a ponto de sobrar
pouco na vida das pessoas além do trabalho? Vivemos trabalhando, correndo,
cumprindo agendas, compromissos, muitas vezes superficialmente, fugazes,
sem vínculos afetivos, sem sentido, sem realização, sem plenitude, sem
limites.
Considerando estas questões, é de suma importância que se
conheça em profundidade maior esta problemática. A partir delas construímos
os pressupostos norteadores desta pesquisa que serão apresentados a seguir.
1. O trabalho interfere significativamente na qualidade de vida
das pessoas.
16
2. O trabalho excessivo traz um sofrimento psíquico que priva os
homens de uma melhor qualidade de vida.
3. Os homens não estão encontrando tempo para refletir sobre os
diferentes papéis que desempenham uma vez que o papel profissional
parece impedir o exercício pleno dos outros papéis.
4. Considerando o sentido que o trabalho tem na sociedade atual,
os homens não estão preparados para o "não - trabalho".
Vivemos milhões de anos sem a indústria. Com o aparecimento
desta, altera-se totalmente o cenário e a sociedade, a ponto de ser referência
para um momento histórico: a era industrial.
Atualmente, o mundo modifica-se com o aparecimento da
tecnologia e da informação. Não estamos mais na era industrial vivemos uma
fase de transição, não sabemos ainda que era é esta. Alguns, chamam de era
da informação outros, de era do conhecimento, outros ainda de era pós-
industrial.
Por todos os avanços tecnológicos, pela globalização da
economia, dos mercados e da informação, pelas descobertas da engenharia
genética e da medicina, altera-se profundamente o estilo de vida das pessoas.
Dois fatores destas mudanças são essenciais às nossas reflexões:
o futuro do trabalho e o aumento da expectativa de vida do homem.
Pelas estatísticas atuais, sabemos que viveremos mais e que o
modelo atual de trabalho, com carteira assinada, salário fixo por horas
trabalhadas, com todos os benefícios que geram encargos financeiros que
elevam os custos das empresas, profissionais que fazem suas carreiras e se
aposentam numa mesma empresa, serão cada vez mais escassos. Fatores
como estes levarão nossas vidas a outras dimensões e interferirão na
qualidade desta?
17
A escolha do tema e da população a ser analisada, se deu por
fazer parte do nosso dia-a-dia, onde presenciamos e compartilhamos
constantemente destas questões. Daí ficarmos sensibilizados em aprofundar e
conhecer melhor este assunto. Como profissional de Recursos Humanos de
uma indústria química, tendo seu efetivo contratado como horistas ou
mensalistas, pessoas que vivem do trabalho nesta empresa, cumprindo no
mínimo, 220 horas mensais, deparamo-nos constantemente com as
interferências do trabalho na vida pessoal dos funcionários.
Nas empresas, os profissionais de Recursos Humanos são vistos
com o dever de policiar as políticas, bem como patrulhar pela saúde e
felicidade das pessoas, mas estas são funções de todos os gerentes e liderança
para não perder de vista as pessoas, já que são por elas e para elas que as
empresas e os negócios existem.
O fato é que, como psicóloga e como profissional de Recursos
Humanos, temos por missão e por princípio apontar e intervir no meio em
que atuamos.
A área de Recursos Humanos nas empresas também vem
sofrendo profundas transformações acompanhando as mudanças no mundo do
trabalho, do emprego e dos negócios. Atualmente, além das atividades usuais
como recrutamento, seleção, treinamento, avaliação de desempenho, plano de
carreira, cargos e salários, rotinas trabalhistas, atuamos junto às estratégias do
negócio, ampliando o campo de atuação e as exigências e competências dos
profissionais da área.
A mudança é global, mas nosso campo de atuação é local,
portanto, é oportuno refletirmos sobre / para:
os rumos de nossas vidas em conseqüência das mudanças no emprego e
nas formas de trabalho;
a profundidade das conseqüências e das interferências que o trabalho tem
sobre a qualidade de vida dos empregados;
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as escolhas que fazem quanto ao equilíbrio do papel profissional e dos
outros papeis que exercem;
o sofrimento psíquico que as empresas causam quando colocam o homem a
serviço da produtividade, como uma peça da engrenagem, exigem mais e
mais sem se dar conta de seu papel social ou até mesmo do real motivo que os
negócios são criados ou existem. Acredita-se que esses visam facilitar a vida
do homem para satisfazer suas necessidades – para ele e não por ele ou até
apesar dele;
um despertar da humanização no trabalho, portanto, o mais longe possível
da violência que é o trabalho sem sentido, o sofrimento físico, mental e
afetivo propiciando um caráter reducionista do homem e reducionista da vida.
Fala-se muito em qualidade de vida no trabalho (QVT);
investimentos e projetos são realizados acreditando-se que, encontrando
maneiras de melhorar as condições de trabalho, melhora-se a produtividade.
Poucos são aqueles que realmente preocupam-se com o homem.
Por entender que o homem é um ser inteiro, não fragmentado,
devemos enxergá-lo como um todo. Tudo o que acontece na sua vida
profissional, reflete na sua vida de modo geral.
Como o trabalho é parte integrante da vida do homem, sua
qualidade influenciará em outras dimensões de sua vida.
Desta maneira, os objetivos desta pesquisa são:
Objetivo Geral
Conhecer a relação entre trabalho e a qualidade de vida de
executivos na atualidade.
Objetivos Específicos
1. Conhecer a qualidade de vida dos executivos segundo a ótica
do equilíbrio entre o trabalho e as demais atividades que desempenham.
2. Identificar a relação do papel profissional com outros papéis
19
que são desempenhados.
Metodologia
Efetuamos uma pesquisa exploratória e tomamos como técnica
de coleta de dados a entrevista semi-estruturada. Os dados foram
quantificados, traduzidos em tabelas e analisados em termos de freqüência e
porcentagem, enquanto alguns mais subjetivos, foram analisados
qualitativamente, com base no método acima citado, buscando uma
compreensão mais acurada dos sentimentos dos participantes da pesquisa.
A pesquisa de campo foi realizada em Franca, Estado de São
Paulo, sendo que a coleta de dados foi feita entre dezembro de 2000 e maio de
2001, tendo sido entrevistados gerentes de uma empresa familiar que
desenvolve, industrializa e comercializa produtos químicos (adesivos e
solventes) para calçados, móveis, automóveis, construção civil, embalagens e
gráficas.
Este trabalho foi organizado em capítulos para apresentação do
tema proposto. No primeiro capítulo buscamos conhecer a história do trabalho
e suas nuances até a atualidade. No segundo capítulo exploramos a formação
dos papéis que o homem desempenha na vida e como o papel profissional
interfere nos outros papéis. No terceiro, relacionamos o trabalho e a qualidade
de vida do trabalhador com ênfase naquele que é empregado, com
responsabilidades gerenciais e por resultados sendo também provedor da
família o que exige muita dedicação à vida profissional para manutenção de
seu emprego. Em seguida relatamos a metodologia utilizada e os resultados
obtidos com a pesquisa no quarto e quinto capítulos respectivamente e
apresentamos ainda algumas considerações finais.
Esperamos que nossa contribuição seja no sentido de resgatar as
dimensões humanas muitas vezes esquecidas pelas organizações e pelos
administradores e que esta possa ser uma oportunidade para fazê-lo.
20
1 UMA VIAGEM PELO MUNDO DO TRABALHO
Neste capítulo, percorreremos o caminho do trabalho na vida dos
homens. Partiremos dos primeiros registros sobre o trabalho e do significado
deste em cada uma das eras de nossa civilização. Passaremos então, para a
atualidade e tentaremos compreender como as inovações deste novo tempo
interferem na vida do trabalhador. Terminaremos com uma projeção para o
futuro, numa tentativa de antecipar os prováveis impactos que as mudanças do
trabalho causarão na vida daqueles que trabalham ou deixarão de trabalhar.
No livro mais antigo e duradouro que se tem notícia, a Bíblia, o
trabalho aparece em diversas situações e com diferentes roupagens. Em
Gênesis, na criação do mundo, quando tudo começou, aparecem as primeiras
responsabilidades do homem. Moisés escreve assim:
“Criou Deus, pois o homem à sua imagem... E Deus os
abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos,
enchei a terra e sujeitai-a... E disse Deus ainda: Eis
que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se
acham na superfície de toda terra, e todas as árvores
em que há fruto que dê semente; isso vos será para
mantimento. E a todos os animais da terra, e a todas as
aves dos céus e a todos os répteis da terra, em que há
fôlego de vida, toda erva verde lhes será para
mantimento. E assim se fez”. (Gen.1, 27 a 30).
21
São estas as primeiras tarefas que Deus incumbe o homem.
Coloca-o soberano, com toda criação a seu favor e domínio, para servi-lo.
Outras formas de trabalho aparecem em seguida: “Tomou, pois o
Senhor Deus ao homem e o colocou no Jardim do Éden para cultivar e o
guardar”. (Gen.2, 15).
Ou ainda,
“Havendo, pois, o Senhor Deus, formado da terra
todos os animais do campo, e todas as aves dos céus,
trouxeram-nos ao homem, para ver como este lhes
chamaria; e o nome que o homem desse a todos os
seres viventes, esse seria o nome deles” (Gen.2, 19).
Assim era o paraíso, ainda hoje sonhado por todos nós, até que o
homem rompe este estado de tranqüilidade. O capítulo 3, intitulado A queda
do homem, narra que depois de comer o fruto proibido, e de ser expulso do
paraíso, o Senhor diz ao homem: “Visto que atendeste a voz de tua mulher, e
comeste da árvore que eu ordenara não comesses: maldita é a terra por tua
causa; em fadigas obterás dela o teu sustento durante todos os dias de tua
vida”.
E à mulher diz: “Multiplicarei sobremodo os sofrimentos da tua
gravidez; em meio de dores darás à luz filhos; o teu desejo será para o teu
marido, e ele te governará” (Gen.3, 16 e 17). Até hoje, em diferentes línguas,
fala-se em trabalho de parto.
A partir daí, o trabalho toma outro significado; o de sofrimento,
de dor, penúria e castigo.
Observe a etimologia da palavra trabalho, do latim, tripalium,
que significa instrumento de tortura utilizado para punir criminosos que ao
perderem a liberdade, eram submetidos a trabalho forçado. (Bom Sucesso,
22
1998). Ou, labor; esforço penoso. Ou ainda, negócio como negação do ócio.
Nesta origem o trabalho é concebido como algo humilhante e desqualificante.
Na antiguidade, trabalhar não era atividade digna, não era
considerado nobre. Aos nobres cabia apenas a atividade contemplativa.
(Huberman, 1986).
No provérbio 6, Salomão, faz uma advertência contra a preguiça:
“Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera seus
caminhos, e sê sábio. Não tendo ela chefe, nem oficial,
nem comandante, no esteio prepara seu pão, na saga
ajunta o seu mantimento. Ó preguiçoso, até quando
ficará deitado? Quando te levantarás de teu sono?”
(Prov. 6, 6 a 9).
Sugere um equilíbrio, que parece justo e saudável: “Um pouco
para dormir, um pouco para toscanejar, um pouco para encruzar os braços
em repouso, assim sobreviverá a tua pobreza...” (Prov.6, 10 a 11).
Ainda como castigo e ameaça, aparece em Eclesiastes 3, 26:
“porque Deus dá sabedoria; conhecimento e prazer ao homem que lhe
agrada; mas ao pecador dá trabalho, para que ele ajunte e amontoe, a fim de
dar àquele que agrada a Deus”.
Ou como vaidade e inutilidade: “Porque há homem cujo
trabalho é feito com sabedoria, ciência e destreza; contudo deixará o seu
ganho como porção a quem por ele não se esforçou; isto também é vaidade e
grande mal”. (Ecl.2,21)
Ecl.1, 3 pergunta: “Que proveito tem o homem de todo o seu
trabalho, com que se afadiga debaixo do sol?”. E responde: “Porque todos
os seus dias são dores, e o seu trabalho desgosto; até de noite não descansa o
seu coração; também isto é vaidade”.
Por outro lado, o trabalho aparece também com outro significado,
23
mais nobre, bem diferente do que inicialmente parece. É citado como dom,
benção, recompensa e prazer: “... que é dom de Deus que possa o homem
comer, beber e desfrutar de todo o seu trabalho” (Ecl. 3,13).
“Vai, pois, come com alegria o teu pão e bebe gostosamente o
seu vinho, pois Deus já de antemão se agrada das tuas obras” (Ecl.3; 9,10).
Trabalhar e ter o descanso merecido. Considerar criação como
trabalho são indicativos indiscutíveis já que o próprio Criador, em seis dias
criou tudo o que há no mundo e descansou no sétimo dia. “... E havendo Deus
terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia... E
abençoou Deus o dia sétimo, e o santificou; porque nele descansou de toda
obra que, como Criador fizera”. (Gen.2, 2 e 3).
Antes mesmo do momento em que o homem esticou o braço para
pegar uma fruta ou quando caçou o primeiro bisão, ele trabalha, como diz
Mota (1997, p.5): “Tudo aquilo que conhecemos como civilização está
fundado no trabalho humano”.
Como vimos, o sentido dado ao trabalho vai de um extremo a
outro: de castigo, algo penoso e doloroso a prazer, benção e realização.
Percorrer este caminho nos levará às mais diferentes dimensões que o
trabalho assume na vida das pessoas.
Trabalho, além de sobrevivência incorpora busca de significado e
sentido: “Está aí um primeiro paradoxo do trabalho: ele nos forma, com ele
cumprimos uma vocação, mas não deixamos de sentir que a vida, a
verdadeira vida, está fora do trabalho” (Cohem, 1999, p.110).
Com base nesta visão, aparece o paradigma maniqueísta do
emprego: “...as pessoas acordam, efetivamente para ganhar o pão de cada
dia e fazer o patrão mais rico” (Vianna, 1997, p.18).
Ou ainda uma visão reducionista do trabalho questionado e
criticado na poesia eloqüente e amarga de Zola (in Freitas, 2000):
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“Pão! Pois é bastante isso, suas bestas? Aí está, ele
comia, e, contudo morria a fogo lento de sofrimento. O
seu lar devastado, toda a sua vida magoada lhe subiam
à garganta num ímpeto de morte. Nem por haver pão
as coisas corriam às mil maravilhas. Quem era o idiota
que punha a felicidade deste mundo na partilha da
riqueza? Esses revolucionários, esses visionários
podiam à vontade demolir a sociedade e construir
outra a que não acrescentariam uma onça de alegria à
Humanidade, e nem um dissabor lhe tirariam contando
a cada um a sua fatia. Aumentaria mesmo a desgraça
da terra, fariam um dia uivar de desespero os próprios
cães quando os arrancassem à tranqüila satisfação dos
instintos para elevá-los aos instanciados das paixões.
Não, o único bem era o ser, e sendo, ser a árvore, ser a
pedra, menos ainda, o grão de areia...” (Zola, in
Freitas, 2000 p.10).
O texto nos traz uma questão filosófica muito discutida porque
questiona nossos valores, numa sociedade capitalista onde o ser confunde-se
com o ter e aponta ainda a esperança de haver uma sociedade mais justa que
divida melhor seus bens para que estes não sirvam como diferencial entre as
pessoas.
O trabalho foi concebido de diferentes formas ao longo do
desenvolvimento das sociedades, mas foi somente na era industrial e pós-
industrial que adquiriu um significado mais profundo capaz de propiciar ao
homem uma identidade (Oliveira, 1994).
Constitui-se, portanto, o trabalho em um ponto central na vida do
homem e qualquer análise acerca do comportamento humano que ignore as
condições de produção material da vida, será no mínimo incompleta diz
Freitas (2000, p. 31) e completa: “nesta perspectiva, o conceito de trabalho
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está intimamente relacionado à satisfação de necessidades, de realização e
desenvolvimento do potencial humano”.
Sociedade, economia e trabalho estão intimamente ligados de tal
forma que alterações em uma destas instâncias afeta as outras duas. Tanto é
assim que, estudiosos como Huberman (1986) e Rifikin (1995) dividem a
história da humanidade e da civilização em: era agrícola, era industrial e pós-
industrial como veremos nos exemplos a seguir.
“Desde seu início, a civilização tem se estruturado, em
grande parte, em função do conceito do trabalho. Do
caçador/colhedor paleolítico e fazendeiro neolítico, ao
artesão medieval e operário de linha de montagem do
século atual, o trabalho tem sido parte integral da
existência diária” (Rifikin, 1995 p.75).
Na Idade Média, a sociedade feudal consistia de três classes:
sacerdotes, guerreiros e trabalhadores, sendo que esta última era a única que
produzia e as faziam para as duas outras classes. Era o trabalho agrícola, e os
trabalhadores eram chamados de camponeses. (Huberman, 1986).
Na obra História da Riqueza do Homem, o mesmo autor comenta
que assim como nos filmes e novelas, nos livros da Idade Média, as pessoas
viviam em castelos esplêndidos, com armaduras brilhantes e com fartura de
comida e bebida, mas que não há indícios que tais coisas tinham que ser
produzidas e cuidadas com os poucos recursos da época.
Para Toffler (1996), as mudanças significativas no mundo
acontecem em ondas. A primeira onda de mudança corresponde à era
agrícola, a segunda onda à industrial e a terceira que é a atual a do
conhecimento. Drucker (1997) também nomeia esta última era de pós -
industrial como preferem alguns outros autores, como De Masi (2000).
A primeira grande onda de mudança a que Toffler (1996) refere-
26
se é de 10.000 anos atrás e diz respeito à transição da caça e coleta das
sociedades camponesas.
A segunda onda de mudança deu origem a uma nova civilização.
Sociedades baseadas na agricultura transformam-se em sociedades baseadas
na indústria. A revolução industrial há mais de 200 anos, afeta a Europa e se
expande para o mundo. As invenções do tear mecânico e da máquina a vapor
são decisivas no momento em que a produção artesanal é substituída pelo
sistema fabril de larga escala, provocando profundas transformações
econômicas e sociais. A Revolução Industrial gerou muito desemprego e
exploração da força de trabalho e, em conseqüência, a eclosão da consciência
sindical, do pensamento socialista e de inúmeros movimentos de
trabalhadores.
Já a terceira onda de mudança, baseia-se na substituição dos
músculos para um poder mental na economia: é a onda chamada por Toffler
(1996), do conhecimento.
Com o advento da globalização, com a queda do muro de Berlim
no final da década de 80, que virou símbolo da queda das barreiras comerciais
e econômicas, altera-se também o mercado de trabalho e o emprego em todo o
mundo, principalmente na Europa e nos países do terceiro mundo, nos quais
incluí-se o Brasil.
Para os que criticam a globalização, Mota (1997) diz que o
mercado pode ser a melhor forma de produzir riquezas, mas não de criar uma
sociedade!
Na medida em que, no mundo globalizado, os governos nacionais
vão cedendo às megaempresas a responsabilidade de determinar seus
destinos, acaba a comunidade arcando com os custos do desemprego, das
desigualdades sociais e da deterioração da qualidade de vida.
27
Todas estas transições são acompanhadas por uma dolorosa série
de mudanças culturais, institucionais, morais e políticas, concorda De Masi
(2000).
1.1 Trabalho, emprego, desemprego e aposentadoria
Trabalho e emprego não têm o mesmo sentido.
As pessoas podem trabalhar sem ser empregadas, terem
ocupações autônomas, temporárias ou voluntárias sem vínculos empregatícios
que são caracterizados por contratos de trabalho sujeitos à legislações
vigentes.
No Brasil, ter emprego significa, ter a carteira de trabalho
assinada e estar sujeito à CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas. Existe
um vínculo entre empregado e empregador definidos em contrato. Ao
empregado cabe o cumprimento de jornadas de trabalho que variam na grande
maioria, de 40 a 44 horas semanais. E ao empregador cabe o pagamento deste
trabalho cujos parâmetros são fixados em contrato, bem como fornecer
benefícios, alguns definidos em convenções coletivas, outros propostos
espontaneamente como forma de atrair e reter talentos.
Para Drucker (1997), empregado por definição é alguém que é
pago para trabalhar.
Até pouco tempo atrás era comum as empresas oferecerem a seus
funcionários carreiras longas e estáveis em troca da “fidelidade” do
profissional. O vínculo era baseado mais na confiança do que propriamente na
competência. Com as fortes mudanças no mercado de trabalho este vínculo
altera-se drasticamente e as relações ficam estremecidas exigindo nova
postura de ambas as partes.
28
Para Bordin (2000, p. 50),
“a estabilidade em cargos e no emprego auxilia as
pessoas a serem mais flexíveis para mudar rotinas e
procedimentos obsoletos, e a melhor aceitarem os
riscos...” mas também adverte: “esse grau de
segurança não pode engessar a empresa... A segurança
exacerbada pode conduzir à conformidade e ao
imobilismo” .
Sennett (1999) atribui ao capitalismo flexível - sistema que é
uma variação sobre o velho tema, que ataca as formas rígidas e também os
males da rotina cega - o bloqueio à estrada reta da carreira.
Sugere que esta flexibilidade está mudando o próprio significado
do trabalho, bem como as palavras que empregamos para ele, carreira, por
exemplo, que do inglês significa estrada para carruagens e para o trabalho,
como um canal para as atividades econômicas de alguém durante a vida
inteira e afirma que o capitalismo flexível bloqueou esta estrada.
"É bastante natural que a flexibilidade cause ansiedade: as
pessoas não sabem que riscos serão compensados, que caminhos seguir"
(Sennett, 1999, p.9).
Presenciamos situações de pessoas que viram suas carreiras
interrompidas pela demissão ou pela aposentadoria e que perderam totalmente
o referencial de suas vidas já que provavelmente o emprego era o único.
Citaremos aqui alguns casos vividos e pesquisados por Schirato
(1999) ao longo de sua vida como consultora e pesquisadora, que como ela
mesma diz, beiram o surreal. Num dos exemplos ela comenta a fala do ex-
funcionário: “trabalho há dezoito anos no desenvolvimento do avião tal, e
quando sair daqui não tenho nada a oferecer, pois só sei fazer isso”. O
profissional não sabia mais o ofício que tinha, identificava-se apenas com o
29
produto. Um outro caso do confeiteiro que trabalhava há vinte anos numa
organização e quando chamado para ser comunicado de sua demissão diz que
tudo bem, mas que precisaria voltar ao trabalho para terminar de bater o
chantilly para o café que o presidente tanto gostava. O gerente do Recursos
Humanos diz que ele não precisa mais fazer aquilo, que poderia ir para casa e
ele insiste argumentando que era o único que sabia qual era o ponto do
chantilly que o presidente tanto gostava e que estava quase na hora do seu
café.
Outro exemplo citado pela referida autora é de um ex-funcionário
que mesmo demitido continuava indo toda manhã até o local do trabalho onde
um segurança o acompanha, pega o jornal e dirige-se até o banheiro, pois
alega que não consegue fazer suas necessidades fisiológicas em outro
banheiro que não seja o daquela empresa.
Surpreendente também é a história de um rapaz que mesmo
demitido deixa a esposa dando à luz, a gêmeos, numa situação complicada
para ir até a empresa dar uma idéia que acabara de ter para salvá-la de
dificuldades financeiras. Ele não conseguiu audiência!
Igualmente intrigante é o caso do sujeito que após 19 anos de
empresa, na homologação de sua demissão, solicita ao juiz se poderia levar a
cadeira do escritório para casa, pois não seria capaz de sentar em outra.
Pessoalmente, presenciamos o desenrolar de três casos similares.
Um deles diz respeito a um demitido, que no dia seguinte à sua demissão, no
início do expediente fica por uma hora andando na frente da empresa de uma
esquina a outra fumando e quando perguntado por alguém desavisado o que
ele estaria fazendo lá fora, este responde que também não sabe, e que não
tinha para onde ir. O segundo refere-se a um funcionário que após a demissão
pega uma estrada, de carro, chora por mais de uma hora até estar sentindo-se
em condições de voltar para casa e contar o fato à esposa. E o terceiro, e mais
grave, foi o de um gerente de desenvolvimento que trabalhou uma semana
30
inteira indo diariamente ao local de trabalho mesmo sendo lembrado pelos
colegas da demissão, mas que acionou a negação como mecanismo de defesa.
Já com complicações devido ao alcoolismo, entrou em depressão e veio a
falecer dois anos depois, sozinho, de cirrose hepática antes de completar 60
anos.
Sérios impactos sociais e psicológicos afetam pessoas sem
emprego ou sem condição de trabalhar, na medida que o trabalho passa a ser a
razão da existência humana.
“Um problema que vem causando desarranjos na vida
das pessoas, submetendo-as às angústias de estar sem
teto e sem o chão de seu próprio ser” e acusa que “os
dramas pessoais que surgem com o desemprego não
são analisados e nem considerados pelas estatísticas,
porém são tão graves e freqüentes quanto os números
apresentados em pesquisas desta natureza”. (Freitas,
2000 p.41)
Talvez, a ameaça e a possibilidade de se perder o emprego
causam stress e sofrimento suficientes para fazer o empregado submeter-se
mais e mais às empresas, às tarefas, ao chefe e a trabalhar mais horas
privando-se do convívio com a família, do descanso, do lazer e de coisas que
valoriza.
Caldas (1998) cita o caso do “seu” Juvêncio, funcionário de uma
indústria açucareira que foi desligado após uma reengenharia. Ele era um
homem de quase 60 anos, trabalhava há mais de 35 na empresa. Era
orgulhoso e dedicadíssimo, responsável por uma seção de Controle
Administrativo, extinta no processo de reengenharia. “Seu” Juvêncio conhecia
as regras do jogo: sabia que perderia o emprego, mas que não seria o fim do
mundo. Sabia que era o melhor para a empresa no momento, e que em breve
31
se aposentaria. Porém, decidiu investigar porque todo o seu departamento
tinha sido eliminado. Depois de muito perguntar, finalmente soube que a
reengenharia tinha descoberto que o seu departamento “não agregava valor” à
organização. O que mais o afetou, o que maior impacto provocou em “seu”
Juvêncio foi saber que o seu departamento não perdera o valor por novas
tecnologias ou por mudanças no mercado. A empresa concluíra que a
atividade nunca tinha agregado valor à organização. “Seu” Juvêncio, desde
então se tornou amargurado. No fundo era um homem empenhado em buscar
um sentido para as coisas; buscar sentido para toda a sua dedicação, para o
seu sacrifício e de toda sua família, os finais de semana, as horas extras... Ser
dispensado porque não era mais útil já era ruim; descobrir que nunca tinha
sido realmente útil, era um pouco demais!
Robert Reich, ministro do trabalho dos EUA, em 1997,
costumava dizer que os trabalhadores mais velhos são confiáveis, constantes e
leais, combinando conhecimento com experiência – o que constitui um
valioso capital para as empresas. Infelizmente ele ainda não conseguiu
convencer o mercado de sua assertiva. (in Pastore, 1997).
Para Dejours (1988), quanto mais rígida é a organização do
trabalho, menores são seus conteúdos significativos, aumentando assim o
sofrimento patogênico.
O mesmo autor (in Chanlat, 1993) coloca que para o trabalho
deixar de provocar sofrimento patogênico e constituir-se no sofrimento
criativo seria preciso duas articulações por parte do sujeito: a ressonância
simbólica e o espaço público. A ressonância simbólica acontece quando o
sujeito consegue integrar ao trabalho a sua história, a sua subjetividade,
quando a situação de trabalho torna-se um veículo para o engajamento de suas
relações sociais e afetivas. O espaço público seria a reconstituição do espaço
da palavra na organização, um lugar de transparência , onde o sujeito toma
conhecimento do trabalho dos demais e do processo como um todo; também
32
lugar de um certo exibicionismo de seu trabalho. Este é um espaço de trocas e
negociações dentro do trabalho, o qual suscita a solidariedade. A criação
coletiva de defesas contra o sofrimento, através das trocas intersubjetivas,
propicia a significação do sofrimento e possivelmente sua passagem do
patogênico ao criativo.
Casos de insucessos após a aposentadoria são freqüentes. A consultora
de Recursos Humanos, Lessa (1996) da Price Waterhouse, chama este
processo de morte social: o aposentado perde o referencial – ele já não é mais
o “fulano da empresa tal” e também não consegue se reintegrar à família e a
novos grupos sociais. Todo este sofrimento vem do pensar em trabalho como
o grande objetivo da vida.
Aposentadoria... prêmio após uma vida de trabalho... É chegada a
hora de descansar, de usufruir, do tempo livre. Tempo para dedicar-se àquilo
que se tem prazer, hobbies, família, amigos e ao ócio: dormir mais, descansar,
não ter horários rígidos, desenvolver novos interesses.
Não é isto que temos visto acontecer, sobretudo no Brasil, onde o
problema se agrava já que o modelo de Previdência Social enfrenta grandes
dificuldades, não cumprindo seu papel de forma satisfatória para a população.
Uma aposentadoria digna, coerente com as contribuições que os
idosos fazem ao longo de sua vida ativa está longe de ocorrer neste país.
“A medicina prolonga a vida, a tecnologia eleva a
produtividade, mas os homens param de trabalhar cedo – sobrando para a
sociedade a tarefa de encontrar apoio para uma velhice mais longa”
(Pastore, 1997 p. 187).
Com a expectativa de vida aumentando, enfrentar a
aposentadoria significa 20 ou 30 anos a mais nesta condição.
33
1.2 O futuro do trabalho e dos empregos
Com os últimos acontecimentos e mudanças no mundo, dá para
perceber as profundas alterações no campo do trabalho. Alguns estudiosos
exercitam sua capacidade de fazer previsões sobre novos acontecimentos
neste cenário fatos que estão afetando nossas vidas e nos dão o alerta para
estarmos melhor preparados para enfrentar o futuro que desponta.
De Masi (2000) é um deles, pois, além de se dedicar ao estudo
do tema e a editar livros tem proferido palestras no mundo todo, o que indica
uma preocupação e um interesse pelo futuro do trabalho.
Estarmos melhor preparados para as mudanças evita sofrimentos
de ordem financeira, familiar e profissional preservando o equilíbrio
emocional e a qualidade de vida de todos os envolvidos.
Reunindo outros colaboradores, De Masi (2000) faz publicações
dos principais pontos do trabalho que irão sofrer estas transformações: muda-
se o local de trabalho, menos pessoas terão que ir até a empresa para
trabalhar; com o auxílio da tecnologia à comunicação é totalmente viável à
distância, este aspecto afeta as relações familiares já que muitos não
precisarão sair de suas casas, afeta também as relações com os colegas de
trabalho e com a própria organização já que os encontros serão mais escassos.
Tudo isso, por um lado é positivo, pois amplia a possibilidade do
trabalhador estar mais perto do cônjuge, dos filhos e da ambiente doméstico.
Por outro lado, a maior presença no lar fatalmente provocará mudanças e
essas alterações na dinâmica familiar exigirá de todos os envolvidos uma
grande energia no sentido de reorganizarem-se e readaptarem-se a esta nova
realidade.
34
O mesmo acontece com as relações com as organizações, a
distância priva os trabalhadores de participarem da dinâmica dos negócios,
das decisões, alterando inclusive a cultura da empresa.
Além do espaço, o tempo é outra dimensão afetada pelas
mudanças que já se anunciam:
“Ao longo da História, os seres humanos vêm
trabalhando cada vez menos. Entre os meados do
século XIX e o início dos anos 80, o tempo trabalhado
por uma pessoa, durante toda a sua carreira, diminuiu
em média, de 125 mil horas para 69 mil. Foi uma
redução fantástica. Hoje em média, é bem provável que
a referida redução esteja próxima de 50 por cento”
(Pastore, 1997 p. 163).
Os historiadores descobriram que os serem humanos estão
parando de trabalhar mais cedo. Na Inglaterra, por exemplo, a proporção de
pessoas com 65 anos e que ainda estão na ativa é de menos 10 %. Em 1881, a
proporção era de 73 %. No mundo inteiro, a população que mais cresceu foi a
dos velhos. (Johnson in Pastore, 1997 p. 187).
Conforme apontamos neste capítulo, “o referencial de vida da
pessoa é ditado pelo trabalho, aprende-se a dar sentido à vida segundo o
‘papel’ representado em uma determinada profissão. Daí, que na perda do
trabalho, perde-se inclusive o sentido da vida” . (Freitas, 2000 p. 43).
A seguir, no capítulo 2, buscamos compreender o significado e a
importância dos papéis na vida das pessoas, sobretudo, o papel profissional e
a interação deste com os demais papéis.
35
36
2 OS PAPÉIS
Através do trabalho, exercitamos nosso papel profissional mas
este não é o único papel que temos ou podemos exercer na sociedade. Outros
são exigidos, escolhidos e desempenhados.
Considerando que o homem vive em coletividade, este é um ser
social. Tal concepção, na visão de Moreno (1972) entende que o indivíduo se
realiza pelo desempenho de papéis na sociedade.
Para compreensão desta teoria, é importante conhecermos
Moreno, psiquiatra romeno, com formação em Viena, contemporâneo de
Freud e que portanto, viveu em uma época de efervescência intelectual,
trazendo grande contribuição para as descobertas de alguns dos mistérios da
mente e da Psicologia do homem. Criador do Psicodrama, da Psicoterapia de
Grupo, do Sociodrama, da Sociometria, da Socionomia e do Teatro
Espontâneo, Moreno passa a ser então, referência neste capítulo.
O enfoque de que o existir humano é viver em coletividade e que
a realização do indivíduo se dá pelo desempenho de seus papéis na sociedade,
para Moreno (1972, p.81) se funda no princípio de que o homem tem um
papel a desempenhar. “Cada indivíduo se caracteriza por uma variedade de
papéis que regem seu comportamento e que cada cultura se caracteriza por
uma série de papéis que, com maior ou menor êxito, impõe a todos os
membros da sociedade.”
Para as Ciências Sociais, segundo Rubini (1995), o enfoque dado
ao tema, cria uma classificação de papéis, que no caso específico trata-se de
37
papel social, que pode ser definido como um padrão determinado de
comportamento que reflete e caracteriza uma posição especial do indivíduo
dentro do grupo social a que pertence.
Moreno (1975) defende que o desempenho de papéis é anterior
ao surgimento do eu e que é necessário que se desenvolvam gradualmente
vínculos entre os papéis sociais, psicológicos e fisiológicos para se identificar
e experimentar após sua unificação, aquilo que chamamos de eu.
Considerando que o corpo, a psique e a sociedade são partes intermediárias e
integrantes do eu total (biopsicossocial), o eu, é portanto resultado dos
diferentes papéis que desempenhamos ao longo de nossa existência.
Neste sentido, assim argumenta Fromm (1969, p.80):
“o homem não só tem uma mente e necessita de um
sistema de orientação que permita compreender e
estruturar o mundo que o rodeia , ele tem um coração e
um corpo que precisam ser ligados emocionalmente ao
mundo – ao homem e à natureza”.
Para Bernhoeft, (1985), podemos ver os efeitos diretos desta
estruturação baseada no desempenho dos diferentes papéis sobre nossas vidas,
ao analisarmos de que maneira cada um de nós estrutura seu tempo.
“Muitos executivos aceitam o clichê de que o sucesso
exige sempre um preço, e este preço consiste,
geralmente, na deterioração da vida privada. Contudo,
este clichê nem sempre reflete a realidade - alguns
executivos parecem estar excluídos. O que distingue um
alto preço profissional por seu sucesso daqueles que
são capazes de manter e desenvolver vidas privadas
gratificantes?” (Bartomé & Evans in Bernhoeft, 1985,
p.21)
38
Através de pesquisas realizadas com duas mil pessoas (gerentes e
suas mulheres), os autores acima citados, concluem que a principal
determinante do impacto do trabalho sobre a vida privada consiste no fato de
os sentimentos emocionais surgidos no trabalho serem ou não extravasados na
família e no tempo de lazer.
Considerando o homem como ser integral, é ilusória a idéia do
homem que ao chegar ao trabalho afirma ter deixado em casa os problemas
pessoais e vice-versa. Mesmo combinando com os colegas de trabalho, para
não falarem sobre o serviço em encontros sociais, Bernhoeft (1985), afirma
que não é preciso falar para estar em mente e que o simples fato de se
avistarem já desperta em cada um sentimentos que remetem à empresa e ao
trabalho. Acreditando que o papel profissional tem um peso muito grande do
ponto de vista quantitativo e qualitativo na vida destes profissionais, sabe não
ser o único. E mais, propõe uma análise da estruturação do tempo com base
nos papéis que desempenhamos na vida, partindo da premissa de que o
homem é um ser integral:
“Cada um de nós desempenha inúmeros papéis na
sociedade. Assim sendo, temos que destinar tempo,
esforço e atenção para cada um deles, que são: papel
profissional, papel conjugal, papel familiar, papel
social, papel educacional e papel recreacional”
(Bernhoeft, 1985, p.22).
O quadro 1 apresenta as definições de Bernhoeft, para cada um
dos papéis a desempenhar:
39
QUADRO 1 – Conceitos dos diferentes papéis
Papel Profissional Refere-se a toda atividade que se relaciona com sua imagem e atuação profissional.
Papel Conjugal Envolve a destinação do tempo, em caráter exclusivo, à esposa/marido ou a alguém que tenha significativo valor dentro de uma concepção de afetividade e estima.
Papel Familiar Refere-se aos compromissos com o círculo familiar (pais, filhos, irmãos, etc.) excluída a esposa/marido previstos no papel conjugal.
Papel Social Trata da parcela de tempo utilizada para a manutenção do círculo de relacionamentos com amigos, colegas e outras figuras que constem da sua lista de relações sociais.
Papel Educacional Diz respeito a tudo aquilo que envolva seu autodesenvolvimento. Não está restrito aos sistemas convencionais de ensino. Considere o tempo que emprega em leituras, assistir palestras, manter-se atualizado e cuidar do desenvolvimento intelectual no sentido mais amplo.
Papel Recreacional Refere-se ao tempo que você utiliza para o lazer ou recreação pessoal. São aquelas atividades que você faz porque lhe dão prazer e satisfação. Pode ser isolado ou em grupo, mas a decisão de fazê-la é sua.
Fonte: Bernhoeft, 1985, p. 23.
Bernhoeft (1985, p.30) analisando os dados da referida pesquisa
com executivos, revela que “a própria vida pessoal dos homens com forte
identidade organizacional sofre muito por aquilo que podemos chamar de
contaminação dos papéis e pela forte dependência que ele desenvolve em
relação à organização”.
Tendo em vista a importância deste aspecto para esta pesquisa, a
seguir abordaremos a questão da contaminação dos papéis bem como a
cristalização do papel profissional.
40
2.1 Contaminação ou cristalização do papel profissional
Os filhos de Adão e Eva, são citados na Bíblia assim: Abel, foi
pastor de ovelhas e Caim, lavrador. Observe que, o que os caracteriza são seus
ofícios. Não aparecem suas características físicas, se são loiros ou morenos,
altos ou baixos, gordos ou magros, fortes ou fracos, ou ainda, alguma
característica de personalidade, mas por suas profissões.
Por contaminação de papéis Bernhoeft (1985) considera, por
exemplo, o papel social afetado pelo profissional quando grande parte das
pessoas mantém um círculo de amigos provenientes da atividade profissional.
Desta maneira, sua família é inevitavelmente forçada a conviver com assuntos
e pessoas do trabalho. Outro exemplo dado pelo autor, são as pessoas que
mantém relacionamentos com profissionais da mesma área, engenheiros com
engenheiros, profissionais de Recursos Humanos com seus pares, perdendo
ótimas oportunidades de ampliar suas visões e perspectivas e desperdiçando
as chances de interagir com outras concepções e abordagens.
Bustos (1979) desenvolveu o conceito de papel gerador de
identidade, caracterizado como aquele que, dentro de um repertório de papéis
de um adulto, predomina como um ponteiro positivo indicador do indivíduo.
Afirma que todas as pessoas têm um papel central e predominante que
impregna os demais, auxilia a cimentar a identidade, que dá autoconfiança.
Constitui-se em eixo predominante que funciona como defensivo em
situações de conflito.
O psicodramatista, Tiba (1998), criou o personagem
Astrogúmene para mostrar o risco de se ter um único papel contaminado e
cristalizado bem como suas conseqüências:
41
“Astrogúmene é um sujeito que sabia tudo sobre
astrologia.
Seu interesse pelos astros começou já na infância,
quando se apaixonou pelo astrolábio. Tendo ele
recebido nome tão ímpar e pitoresco quanto o do
aparelho, resolveu orientar as pessoas em seus
momentos mais escuros.
Quando conhecia alguém, já dizia: ‘Muito prazer!
Qual é o dia de seu nascimento mesmo? Sabe a hora e
o local do nascimento?’ Fazia previsões sobre
casamentos, negócios, sentimentos, doenças (...)
(...) Astrogúmene, que de nada necessitava além de sua
auto - satisfação em demonstrar tudo quanto sabia.
Portanto, amigos ele não tinha e sua própria família
acabou se afastando dele. Amigos são humanos e
querem humanidade, e família quer convivência (...)
Diferentemente de uma fonte que jorra para a natureza
ficar mais bela, Astrogúmene era uma fonte que se
nutria de seu próprio jorro (...)
A vida humana é como a mão que tem a palma como
personalidade e os dedos como seus papéis.
Astrogúmene tinha apenas um imenso dedo, os outros
eram atrofiados. Sua personalidade era seu papel.”
(Tiba, 1998, p. 47).
Tiba (1998) conclui dizendo que a vida humana é tanto mais rica
quanto mais relacionamentos saudáveis a pessoa tiver. Com um único dedo,
sobrevive-se, mas para viver bem todos os dedos são necessários.
Assim como ele, quantos de nós estamos com um único dedo
enorme? Sobrevivendo, mas muito longe de estarmos bem, saudáveis ou
felizes.
Bernhoeft (1985) apresenta os resultados de estudos que realizou
42
com executivos brasileiros mostrando que em média o papel profissional
representa de 45 a 60% do tempo consumido ao longo da semana.
Considerando que dormimos em média 30% do tempo e que a semana de
trabalho no Brasil para esta categoria de profissionais é de cinco dias úteis,
sobra muito pouco para os outros papéis. Até o papel recreacional tem caráter
aparente pois o que existe muitas vezes é o compromisso com o “status” ou
necessidades de relacionamentos como por exemplo o executivo que adora
uma pelada mas para mudar a imagem ou facilitar e estreitar relações com o
chefe sente-se na obrigação de jogar tênis, muitas vezes impondo uma
despesa extra e até expondo a família a situações desconfortáveis o que pelo
caráter de obrigatoriedade, deixa de ser recreação.
Waldroop (2001), psicólogo americano, professor de Harvard e
sócio de uma consultoria voltada para aconselhamento de profissionais
executivos de alto escalão, em entrevista à Revista Veja batiza de:
“‘o herói’- um tipo de profissional que se esforça
compulsivamente para atingir metas ambiciosas. O
patrão acha isso maravilhoso até notar que muitas
pessoas que trabalham sob a chefia de ‘o herói’
pediram demissão. Querem afastar-se. Isso porque
desejam ver mais seus filhos, passar a noite com eles
de tempo em tempo, ter um casamento e não um
divórcio” (Waldroop, 2001 p.15).
Quantos profissionais, pessoas de negócios que fizeram suas
carreiras na empresa e provedores de suas famílias, encontram-se na mesma
condição? Será que eles sofrem? Como será sua qualidade de vida?
Interagir é necessário, para ativar a sensibilidade, para a captação
dos sentimentos das outras pessoas; uma verdadeira afinação entre as pessoas
é indispensável para a saúde física e mental.
43
Para agir de modo espontâneo, precisamos nos deter em nosso
próprio estado e disposição numa dada situação. É preciso que nos
entendamos conosco e com o outro.
Com o passar do tempo a espontaneidade vai se tornando menos
desenvolvida possivelmente por uma questão de desuso em uma sociedade
presa à repetição. A isto denominamos cristalização, segundo Moreno
(1975).
Waldroop (2001) afirma que ser produtivo é uma das qualidades
essenciais aos profissionais em qualquer ramo de trabalho e define que:
“produtividade é igual à inteligência multiplicada pelo
esforço. Então, é preciso ser inteligente, esforçar-se e
também ser capaz de trabalhar bem com os outros,
aceitar os pontos de vista de outras pessoas, usar o
poder com autoridade de maneira confortável e
eficiente. Isso exige que se desenvolva um senso de si
próprio que seja positivo , que seja uma auto-estima”
(Waldroop, 2001, p.15).
Em contrapartida afirma também que reservar um tempo para
não trabalhar é importante não só para ter uma vida melhor mas também para
ser mais produtivo: “se você não tem tempo para fazer nada a não ser
trabalhar, não renderá tanto, pois lhe faltarão alguns elementos
fundamentais do que significa ser humano” (Waldroop, 2001, p.14).
Cuschnir (1995), psicodramatista e especialista em grupos que
discute o papel masculino na sociedade atual, publica um poema de um
cliente de um grupo terapêutico de gênero – Flávio Del Nero Gomes, sobre
os diferentes papéis que ele vive – talvez menos Astrogúmene que nós:
“Hoje acordei amante, cheio de trejeitos, olhares
44
estudados, frases feitas, sereno nas desfeitas, conselhos
equilibrados, princípios perfeitos. Hoje acordei
amante.
Hoje acordei paizão, cheio de paciência, tolerante,
brincalhão, jogando botão, batendo figurinha, voltando
à minha infância. Hoje acordei paizão.
Hoje eu acordei solitário, cheio de faltas, pleno de
ausências, cara amarrada, fala cortada, muitas
carências. Hoje acordei solitário.
Hoje acordei criança, cheio de cores. Muita esperança.
Meio manhoso. Querendo um colo, querendo consolo.
Hoje acordei criança.
Hoje acordei executivo, cheio de idéias, todo agitado,
já meio estressado, todo janota, esbanjando
arrogância. Hoje acordei executivo.
Hoje acordei marido, cheio de penitência, total
dedicação, feira, supermercado, compras da estação,
carinhos trocados, jantar a dois. Hoje acordei marido.
Hoje acordei confuso, cheio de medo, todo cercado
pelos meus personagens, que no meu senso difuso, não
sei se por miragens, mas, por certo, do meu eu são
imagens. Hoje acordei confuso.
Hoje acordei eu mesmo. Um pouco estudado, também
brincalhão, muita carência, bastante esperança, todo
agitado, só paciência, cheio de medo. Hoje acordei eu
mesmo” (Gomes in Cuschnir, 1995, p.23 ).
Não encontramos nas empresas, nas escolas, nem mesmo nas
famílias, lugar para falar, refletir, enfim para dividir com alguém questões
como estas. Em muitos casos, não temos consciência destes diferentes papéis.
Essa situação, muitas vezes, nos leva a angústias,
descompensações, sentimento de incompletude, desamparo e solidão. Longe
45
do ser inteiro que somos. “Um estudo médico feito na Inglaterra mostrou que o
excessivo envolvimento e o esforço realizado no
trabalho têm limitações. A partir de um certo limite
existe um decréscimo na produtividade e na qualidade
de vida do ser humano. A forte identificação com o
papel organizacional apresenta problemas ao nível
psicossomático.
... Uma última observação do relatório médico inglês
faz referência à grande proporção de enfartes do
miocárdio que apresentam entre os dirigentes de
empresas, em boa parte devido às condições de vida a
que são submetidos” (Bernhoeft, 1985, p.30).
O psicodrama, com suas técnicas de dramatizações e no palco,
se constitui numa forma de possibilitar ao indivíduo encontrar-se com seus
papéis imaginários ou correspondentes a funções assumidas dentro da
realidade social, e de favorecer a recuperação de sua capacidade de realizar
transformações autênticas em sua vida, nas relações e no meio onde vive. As
organizações precisam descobrir o valor desta ferramenta para o
desenvolvimento de seus funcionários.
2.2 A des-cristalização de papéis
A fim de melhor compreender a questão da descristalização de
papéis analisaremos o exemplo da formiga Z no filme de Steven Spielberg
(1999). Trata-se de um desenho animado que traz a problemática dos
46
adultos. Com um grande elenco de vozes: Wood Allen faz o operário Z;
Sharon Stone, a princesa Bala e Silvester Stalone, seu amigo soldado. A
história se passa dentro de um formigueiro. Mostra o funcionamento do
sistema com cada elemento desempenhando seu papel na colônia até que esta
é ameaçada pelos cupins e o exército se mobiliza para defendê-la. Enquanto
isso, mostra seus personagens e suas problemáticas. O filme circula sempre
entre o individual e o coletivo.
Filme profundo e bem humorado, inicia com Z, uma formiga
operária, no divã do analista com uma queixa parecida com a de tantos
homens, que nos possibilita vários insights:
“Toda minha vida eu só vivi e trabalhei em cidade
grande...
De repente isto é um problema já que não me dou tão
bem com multidões...
Eu tenho este medo de lugares fechados, sinto-me
encurralado o tempo todo.
Eu sempre digo a mim mesmo: deve haver algum lugar
melhor lá fora.
Sou muito ansioso, desde pequeno minha mãe nunca
teve tempo para mim...
Quando se é o filho do meio de uma família de 5
milhões ... não te dão atenção.
Como é possível?
Sempre tive este trauma de abandono me afligindo...
Meu pai era só um zangão... e me largou quando eu
ainda era apenas uma larva.
E meu trabalho...melhor nem falar... me chateia
demais.
Eu não nasci para ser operário.
Sinto-me fisicamente inadequado. Nunca na vida fui
47
capaz de levantar um peso 10 vezes maior que o meu
próprio corpo.
E cá entre nós, mexer com terra... arrq... minha mão
suja... esta não é a idéia que eu fazia de uma carreira
promissora.
E esta coisa toda de “super – organismo”, eu não
entendo, eu tento, mas não consigo.
Tenho que fazer tudo pela colônia?
E as minhas necessidades?
E eu?
Eu quero acreditar que deve haver algum lugar melhor
que este!
Senão, só me restará sentar e chorar.
O sistema todo faz me sentir insignificante!
- Excelente! Você fez uma grande descoberta, diz o
analista.
- Fiz?! Pergunta Z.
- Sim, VOCÊ REALMENTE É INSIGNIFICANTE!”
(Z in Formiga’Z, 1999)
Seria triste se não fosse cômico, mas nos faz rir e pensar.
Quantas pessoas (formigas que são) estão em crise questionando seus papéis,
insatisfeitas com suas vidas e com sua insignificância, sua impotência.
A troca de papéis de Z, a formiga operária com seu amigo, a
formiga soldado, nos dá uma visão clara da importância de olhar com os olhos
do outro, da flexibilidade que gera sairmos de um único papel e
experimentarmos mais.
Quantas formigas invejam a rainha; no entanto esta fala da
dificuldade que é procriar sem parar. Ou a princesa, que também insatisfeita,
questiona sua futura função de rainha, e o relacionamento com o noivo
prometido.
48
A dificuldade do noivo que é general e tem seu papel
cristalizado: mesmo na hora de assumir o papel de noivo só consegue ser o
“general” e a frustração da princesa que ao procurar encontrar um noivo só
encontra o militar.
O filme mostra bem que não há papel ou cargo privilegiado,
todos temos questionamentos, insatisfações e missões a serem cumpridas.
Fala da insignificância de cada um isoladamente e da importância da colônia,
da rede, do todo. Nossas vidas tomam sentido e só fazemos a diferença
quando enxergamos nosso papel no grupo, na interligação, na rede.
Neste sentido, Moreno (in Bustos, 1999) já dizia que por ele já
nasceríamos grupo porque ao contrário do nascimento, não estaremos mais
sozinhos em nada e em momento algum. Somos parte de grupos, somos elos
das redes e integrantes nas relações que fazemos ao longo da vida.
- Deve haver algum lugar melhor fora daqui ... diz Z ao seu
analista, inconformado com sua insignificância de operário, com sua rotina,
com sua impotência, com a mesmice de sua vida sem perspectiva.
Um velho operário, considerado senil e maluco, ouvindo Z
indignado com a falta de perspectiva, fala de Insetópia, uma cidade além do
rio, onde a vida pode ser diferente. Z ousa e sai dos limites seguros de sua
colônia e se aventura até a “terra prometida”. Descobre coisas antes
inimagináveis: a liberdade total, sem regras ou disciplina do formigueiro, tudo
novo e em abundância. Mas ali descobre também os perigos e o desamparo de
estar longe dos seus, de estar só com outras espécies diferentes da sua.
Na intenção de impressionar a princesa, Z pede para seu amigo
soldado trocar de papel com ele e ter a possibilidade de revê-la. Nesta troca
muitas coisas acontecem aos dois, as possibilidades se multiplicam, todas elas
associadas aos papéis.
O soldado forte e bem preparado não tem dificuldade alguma em
cavar, no entanto desequilibra a ordem, pois os companheiros operários
49
queixam-se do padrão de produtividade que acaba se elevando e exigindo
mais e mais deles. Este passa a ter a chance de estar com as garotas operárias,
o que facilita o namoro dificultado no papel de soldado, um grupo
exclusivamente masculino.
Z, no papel de soldado, faz amizade com um veterano e vê as
atrocidades da guerra, a morte rondando, o medo, a dor e a impotência frente
à perda do amigo querido.
Com este filme, tomamos consciência da importância do grupo,
de como sair de uma postura individualizada, onde o indivíduo só enxerga
seu próprio umbigo, como Z no início do filme com sua queixa, passando pela
inquietação de encontrar algo melhor, mais interessante e criativo, com mais
liberdade. Vemos que é preciso ir atrás de nossa crença, de nosso sonho, e
descobrir nosso papel como agente de mudanças grupais, como Moreno foi, e
como através destas descobertas, pretendemos ser.
Passamos aqui de um estágio a outro de consciência mais
elevada; de um mundinho muito particular e empobrecido para um mundo
muito mais amplo, com muitas possibilidades. Do cosmo, onde vivemos,
onde estamos inseridos, da “nossa colônia”, para a existência de um mundo
melhor lá fora, Insetópia, ou melhor, “Humantópia”. E isto flexibiliza e
amplia imensamente nossos papéis e nossa responsabilidade como criadores e
criaturas deste Universo.
Para Moreno (in Rubini, 1995) a realização da verdadeira ação
espontânea equivale à criação de desempenho de papéis que correspondem a
modelos próprios da existência. A dimensão do homem criativo/ espontâneo
se contrapõe continuamente com a conserva da estrutura social, com os papéis
que aprisionam a modelos e padrões, normas, status, rótulos pré-
determinados. O psicodrama possibilita ao indivíduo utilizar seu potencial
imaginativo/criativo para transformar a realidade, retomando papéis sociais
instituídos, cristalizados e conservados, para recriá-los modificando-os,
50
reinventando-os na vivência das relações em que se encontra envolvido e
implicado. Uma vez que a proposta psicodramática é resgatar o homem
espontâneo/criativo preso nas amarras da conserva cultural, pode-se dizer que
a criatividade é aquilo que o indivíduo faz para recriar o seu eu com
espontaneidade através do conjunto de papéis que desempenha no jogo da
vida.
2.3 O papel das lideranças em Recursos Humanos
Ainda hoje, algumas empresas adotam o modelo de gestão cuja
função de “cuidar das pessoas” fica a cargo do Departamento de Recursos
Humanos. Porém, numa visão mais contemporânea com uma nova realidade,
bem mais competitiva, cabe a todos da liderança da empresa este papel de
defensores da competitividade e para tanto, num esforço conjunto
construirmos organizações mais eficientes e não só confortáveis como sugere
Ulrich (1998).
Alguns mitos ainda norteiam a visão da função de Recursos
Humanos nas empresas. Vejamos alguns deles resumidos no quadro a seguir,
onde são apontados diferentes aspectos da nova realidade.
51
QUADRO 2 – Mitos e realidades sobre RH. Antigos mitos Novas realidades
. As pessoas ingressam na área de RH por gostarem de pessoas.
. Os departamentos de RH não se destinam a fornecer terapia empresarial ou a ser retiros sociais ou de saúde e felicidade. Os profissionais de RH devem criar as práticas que tornem os funcionários mais competitivos, e não mais satisfeitos.
. Qualquer um pode ser da área.
. As atividades de RH baseiam-se em teoria e pesquisa. Os profissionais de RH precisam dominar tanto a teoria quanto a prática.
. O RH lida com o lado maleável de uma empresa e, portanto, não é responsável.
. O impacto das práticas de RH sobre os resultados empresariais podem e devem ser mensurados. Os profissionais de RH precisam aprender como traduzir seu trabalho em desempenho financeiro.
. O RH se concentra em custos, que precisam ser controlados.
. As práticas de RH precisam criar valor pelo incremento do capital intelectual da empresa. Os profissionais de RH precisam adicionar valor, e não reduzir custos.
. A missão do RH deve ser a de polícia política e patrulha da saúde e felicidade.
. Não cabe à função de RH obediência e sim aos gerentes. As práticas de RH não existem para fazer os funcionários felizes, mas para ajudá-los a se envolverem. Os profissionais de RH devem ajudar os gerentes a envolver os funcionários e a administrar políticas.
. O RH está cheio de modismos.
. As práticas de RH evoluíram com o tempo. Os profissionais de RH precisam encarar seu trabalho corrente como parte de uma cadeia evolutiva e explicá-lo com menor jargão e mais autoridade.
. O RH é ocupado por pessoas simpáticas.
. Às vezes as práticas de RH devem forçar debates vigorosos. Os profissionais de RH devem ser provocadores e desafiadores e, ao mesmo tempo, encorajadores.
. RH é função de RH. . O trabalho de RH é tão importante aos gerentes de linha quanto o são as finanças, a estratégia e outros domínios empresariais. Os profissionais de RH devem se unir aos gerentes no desbravamento de questões de RH.
Fonte: Ulrich (1998, p. 35).
52
Tendo em vista os apontamentos do autor no Quadro 2, não
concordamos com o ponto de vista de que os profissionais de RH devam criar
práticas que tornem os funcionários mais competitivos e não mais satisfeitos.
Como se satisfação e competitividade fossem incompatíveis e mais, que a
satisfação do funcionário não é problema nosso ou que ela não leva ao
envolvimento ou ao êxito do negócio. Acreditamos que é necessário olharmos
o homem como a razão de ser dos negócios – dele e para ele.
Concordamos com os autores como Vieira & Oliveira (1999, p.
248), quando afirmam,
“há necessidade de cada vez mais se valorizar os
recursos humanos da empresa, pois qualidade e
produtividade só podem ser conseguidas com pessoas
satisfeitas, alocadas nos cargos de acordo com as suas
capacidades e potencialidades e sendo bem
remuneradas”.
Cabe então a toda a liderança olhar para que o funcionário tenha
condições de ser uma pessoa inteira, desempenhando todos os seus papéis em
sua plenitude. Até porque, como resultado teremos profissionais mais
capazes, mais produtivos e mais preparados para enfrentar a competitividade
que estamos enfrentando no mundo contemporâneo.
Como vimos, a área de recursos humanos está passando por grandes
mudanças. Nesse sentido, Guest & Hoque (1994, p. 44) advertem:
“a administração de RH deve estar ajustada às
estratégias do negócio, as políticas de pessoal devem
estar integradas entre si e os valores dos gerentes de
linha devem estar suficientemente integrados e
alinhados com a filosofia de pessoal para assegurar
53
que eles implementarão as políticas e práticas de
pessoal”.
Outro autor que sugere modificações na postura da área é,
Connock (1992), que indica algumas ações que precisam ser tomadas pelos
profissionais de Recursos Humanos para que tenham sucesso, entre elas,
desenvolver respeito e confiança entre os indivíduos e preocuparem-se com o
crescimento e melhoria das pessoas na organização.
Vergara (2000) adota a nomenclatura de gestão de pessoas e
atribui também aos líderes este papel e sintetiza as capacidades requeridas
pelo gestor/líder, no quadro a seguir:
QUADRO 3 - Capacidades requeridas pelo gestor/líder . Compartilhar visão, missão, objetivos, metas, estruturas, tecnologia e estratégias . Perscrutar, monitorar o ambiente externo . Contribuir na formação de valores e crenças dignificantes . Ter habilidade na busca de clarificação de problemas . Ser criativo . Fazer da informação sua ferramenta de trabalho . Ter iniciativa, comprometimento, atitude sinérgica, ousadia . Visualizar o sucesso . Construir formas de auto-aprendizado . Conhecer os pontos fortes e fracos . Ouvir e ser ouvido . Reconhecer que todo o mundo tem alguma coisa com que pode contribuir . Viabilizar a comunicação . Pensar globalmente e agir localmente . Reconhecer o trabalho das pessoas . Ter energia radiante . Ser ético
Fonte: Vergara, 2000 p. 97.
Podemos observar que muitas destas capacidades são necessárias
para a gestão de pessoas e, atualmente, é atribuída ao líder e não só ao
recursos humanos, como era o modelo anterior. Para tanto, exige-se muito
mais do líder atual. Além de responsabilizar-se pelo setor e resultados, é seu
54
papel gerir também, as pessoas, pois são delas que vêm as idéias, as soluções
e os resultados almejados. Para a autora,
“a liderança requerida nesses novos tempos é um
processo de construção do ser, e essa construção é de
responsabilidade de cada pessoa. Quando ela opta por,
simplesmente , viver sua vida, expressando-se com
plenitude e dignidade, suas ações ganham valor. E ela
torna-se líder.” Vergara, (2000 p.104).
Esta nova exigência nos faz refletir inclusive sobre a formação
dos administradores na atualidade. Cabe às escolas estarem conectadas a estes
conceitos e propiciar ao aluno uma formação mais voltada para as pessoas e
não só a finanças, processos, métodos, estruturas e tecnologia. A formação
deste novo profissional exige segundo Vergara (2000), auto-conhecimento,
compreensão de teorias da personalidade, motivação, frustração, mecanismos
de defesa, jogos de poder, intuição, funcionamento de grupos, aprendizagem e
formação de equipes. Esta reflexão nos transporta para novas dimensões dos
papéis da escola, dos gestores e dos negócios que este novo século nos impõe.
Para quem tem então, o papel desafiador de gerir pessoas,
Vergara (2000) diz ser necessário: identificar a complexidade do mundo
contemporâneo, o contexto e o ambiente que o negócio está inserido e as
habilidades que esse mundo requer do gestor; aceitar questões relativas à
motivação, liderança, poder e trabalho em equipe como essenciais à
compreensão das pessoas e a sua gestão; obter informações acerca de
contribuições teóricas e apreciá-las criticamente, em face das características
do novo ambiente de negócios; identificar novas tendências; estabelecer a
ponte entre construções teóricas e sua prática cotidiana; desenvolver
competências gerenciais; desenvolver visão holística e visão de totalidade.
55
56
3 TRABALHO E QUALIDADE DE VIDA DO TRABALHADOR
Embora nossa fonte de inspiração para este trabalho não fosse o
ponto de vista da empresa e sim o interesse em refletir sobre o homem que é
parte desta empresa, tendo como exemplo nossos companheiros de trabalho,
sabemos que faz-se necessário situar o contexto atual onde as ações se
desenvolvem, não só no âmbito nacional como mundial: as organizações
estão passando por importantes e interessantes processos de mudanças, nem
sempre iniciados dentro da própria estrutura, mas forçadas pela necessidade
de competir e sobreviver (Neri, 1993).
Competitividade e produtividade são então, condições de
sobrevivência das empresas. Estas mudanças organizacionais, nos processos,
bem como no quadro de pessoas, que são promovidas em busca de melhor
posicionamento no mercado e para não extinguir-se, estão deflagrando
alterações comportamentais via mudanças rápidas de contingências.
Não raro estas mudanças trazem insegurança a seus funcionários,
mas também, uma procura por um ambiente de criação e valorização do
homem como diferencial competitivo.
“A necessidade imperiosa de flexibilidade das
organizações para se adaptar às exigências do
mercado exigiu uma estrutura empresarial mais leve,
as pressões por qualidade impulsionaram
investimentos na melhoria da qualidade de vida
57
pessoal do trabalhador e as preocupações ecológicas
levaram a iniciativas de melhoria de qualidade de vida
de quem faz produtos e serviços” (Neri, 1993, p.2).
Portanto, tratar de qualidade de vida, passa a ser também uma
questão de sobrevivência da empresa. Não é possível estudar relações de
trabalho sem associar à vida das pessoas e os reflexos de uma sobre a outra.
“A satisfação com o trabalho é o suporte básico para a qualidade de vida...”
diz, Bom Sucesso (1998).
Considerando que, segundo Neri (1993), os produtos e serviços
de uma empresa refletem a qualidade de vida de quem os produziu, estamos
todos, no mundo, de uma forma ou de outra, sujeitos a estas questões, seja no
papel de produtor ou de consumidor.
A escola francesa, através de Dejours, estuda os aspectos
patológicos advindos da carga psíquica que o trabalho produz. Partiremos de
três questões sobre a relação homem-trabalho segundo o referido autor:
“1. o organismo do trabalhador não é um ‘motor
humano’, na medida em que é permanentemente objeto
de excitações;
2. o trabalhador não chega a seu local de trabalho
como uma máquina nova. Ele possui uma história
pessoal que se concretiza por uma certa qualidade de
suas aspirações, de seus desejos, de suas motivações,
de suas necessidades psicológicas, que integram sua
história passada. Isso confere a cada indivíduo
características únicas e pessoais;
3. o trabalhador, enfim, em razão de sua história,
dispõe de vias de descarga preferenciais que não são
as mesmas para todos e que participam na formação
58
daquilo que denominamos estrutura de
personalidade”. (Dejours,1994, p.24).
Considerando estas questões, podemos perceber o impacto do
trabalho na vida do homem e vice-versa. A carga psíquica pode ser segundo
Dejours (1994), positiva e negativa. Classifica dois tipos de trabalho, o
fatigante e o equilibrante.
Ao trabalho equilibrante atribui uma diminuição da carga
psíquica e ao fatigante, o que se opõe a esta diminuição.
O trabalho fatigante envolve a carga psíquica negativa à qual se
associa a fonte de tensão e desprazer, a fadiga, a astenia e leva à patologia.
Ao contrário, um trabalho livremente escolhido e livremente
organizado, com vias de descargas que levam ao relaxamento, de modo que
uma vez terminada a tarefa, o executante sente-se melhor do que antes de
começa-lo é o que Dejours (1994) denomina: equilibrante. Ele cita o
pesquisador como um dos exemplos de profissional que executa este tipo de
trabalho.
França (1996) faz uma abordagem psicossomática de algumas
doenças mais freqüentes no ambiente de trabalho, tais como síndrome da
fadiga, distúrbios do sono e exaustão emocional que são sintomas de stress –
uma das causas mais freqüentes de queixas nas consultas médicas. Discute
ainda a preservação da saúde como resultado do desenvolvimento da auto-
estima e da realização pessoal e profissional, em compatibilidade com a
cultura da empresa.
Sennett (1999) nomeia de corrosão do caráter, a um fenômeno
contemporâneo, decorrente das novas formas de trabalho do capitalismo
flexível: trabalhos temporários, por projetos ou com duração curta, onde não
há tempo suficiente para formação de vínculos.
59
“O que é singular na incerteza hoje é que ela existe
sem qualquer desastre histórico iminente; ao
contrário, está entremeada nas práticas cotidianas de
um vigoroso capitalismo. A instabilidade pretende ser
normal... Talvez a corrosão de caracteres seja uma
conseqüência inevitável. “Não há mais longo prazo”
desorienta a ação a longo prazo, afrouxa os laços de
confiança e compromisso e divorcia a vontade do
comportamento” (Sennet, 1999, p. 33).
O autor descreve como exemplo deste fenômeno, a história de
dois sujeitos de sua pesquisa sobre trabalhadores nos Estados Unidos: Enrico
e Rico; pai e filho, e suas respectivas carreiras e famílias.
Enrico foi faxineiro e passara a vida toda limpando banheiros e
lavando chão. Seu trabalho tinha um único objetivo: servir à família. Sua
esposa, Flávia, trabalhava como passadeira numa lavanderia. Ambos nunca se
queixavam, mas também não se entusiasmavam com o Sonho Americano da
época. Economizaram dinheiro durante 15 anos para comprar a casa própria,
no subúrbio, que acreditavam ser melhor para os filhos. Também fizeram
economias para bancar a faculdade dos dois filhos homens.
Para Enrico e sua geração o tempo era linear em suas vidas: seu
trabalho era previsível, assim como seus dias, sua poupança e até o tempo que
viveria, era previsível. Ele sabia quando ia aposentar-se e o pecúlio que teria.
Era respeitado e considerado, pela vizinhança, um vencedor, digno das
conquistas que obterá ao longo de toda a vida de trabalho duro.
Seu filho, Rico, estudou, fez curso de engenharia elétrica, depois
foi para uma escola de comércio em Nova York; é um executivo bem
sucedido, já mudou de cidade e emprego quatro vezes apesar de ter apenas 14
anos de formado. Casou-se com uma colega que também foi preparada para
freqüentes mudanças, inclusive uma delas motivada pela carreira dela. O casal
60
tem dois filhos, o que concretizou o desejo paterno de mobilidade ascendente.
Apesar disto, rejeita o estilo dos pais, desprezando o “conformismo” deles e
acreditando que ao contrário, deva correr riscos e manter-se aberto às
mudanças para ter garantido o sucesso.
O jovem executivo, deveria considerar-se protagonista de uma
história feliz, mas não é assim que se sente. Sobretudo, no que diz respeito à
educação dos filhos e aos valores que tenta transmitir a eles. Rejeita os
valores dos pais, é pouco participante da vida dos filhos, queixa-se de só
receber notícias passadas, pois, nunca está presente nos acontecimentos.
Mas não fala do conflito conhecido entre os profissionais da
atualidade, entre o tempo para o trabalho e o tempo para a família, mas de
uma preocupação mais profunda de não poder oferecer aos filhos a vida de
trabalho como exemplo, pois, sabe que as qualidades do bom trabalho não são
necessariamente as mesmas do bom caráter.
Teme perder o controle de suas vidas, e de que as medidas que
precisava tomar e a maneira que precisava viver para sobreviver no mercado
atual, houvessem posto sua vida emocional e interior à deriva: “... não
imagina como me sinto idiota quando falo em compromissos mútuos com
meus filhos. Para eles, é uma virtude abstrata; não a vêm em parte alguma.”
Sennett (1999 p.26).
O autor, em toda sua obra nos faz refletir sobre a seguinte
questão: “ como pode um ser humano desenvolver uma narrativa de
identidade e história de vida numa sociedade composta de episódios e
fragmentos?” (Sennett, 1999 p. 27) e afirma que profissionais como Rico,
são homens ao mesmo tempo, bem sucedidos e confusos, e que o dilema
deles, é em função do capitalismo de curto prazo, capaz de corroer o caráter,
“sobretudo aquelas qualidades de caráter que ligam os seres humanos uns
aos outros, e dão a cada um deles o senso de identidade sustentável.”
(Sennett, 1999, p.27).
61
3.1 Os efeitos do muito trabalhar na qualidade de vida das pessoas
“O que vai ser primeiro: a úlcera, o ataque cardíaco ou o
divórcio?” pergunta, Leite, (in Wood Júnior, 1998). Ele faz a pergunta aos
colegas executivos, consultores e professores universitários. Este é o preço
que muitos pagam por este comportamento de trabalhar horas seguidas,
priorizando o trabalho acima de tudo.
O muito trabalhar, de 12 a 16 horas por dia ou até a exaustão tem
sido comuns em algumas culturas ou em algumas categorias de trabalho,
mesmo que a tendência dos tempos atuais, comparados com os da
antiguidade, esteja sendo a de se trabalhar menos.
No Japão, este fenômeno chama-se Karooshi, definição dada
pelo National Institute of Public Health – morte por excesso de trabalho
(Masiero, 1998). A explicação dada é que em países asiáticos o crescimento
econômico deve ser buscado a qualquer preço.
O autor relata o documentário da televisão americana, veiculada
em 1990, denominado: Rich Japan, poor japonese e a reportagem de dois
jornalistas da Business Week em 1996 que descreveram as condições de
trabalho no sudeste asiático. Segundo eles, as horas extras são obrigatórias.
Alguns trabalhadores desmaiam por excesso de trabalho. O castigo para as
faltas consiste em humilhações. Um trabalhador que abandonou o posto de
trabalho em um domingo, para cuidar da sua esposa e filhos doentes, foi
obrigado a limpar banheiros e logo depois foi demitido. Uma operária teve
que correr ao redor da fábrica porque o calçado que havia produzido possuía
defeitos, o que causou polêmica e grande constrangimento nacional.
Por que os japoneses trabalham até morrer? Por que não param e
descansam um pouco? O relatório do National Defense Counsel,publicado em
1990 pela Mado-sha no Japão diz que a resposta reside menos na
62
personalidade individual dos japoneses e mais na maneira de operar das
empresas (Masiero, 1998).
Algumas vezes esta não é uma escolha, como nos casos acima
mas em outras é . Diversos autores têm mostrado como, para alguns, o
trabalho pode se tornar um vício, uma muleta para as inseguranças e medos
(Oates, Macholowitz & Pages in Caldas, 1998):
“também discutem esse tipo de dependência em busca
de respostas que a empresa de fato não pode dar, o
indivíduo pode deixar-se controlar pela carreira nas
organizações, que passam a deter o domínio sobre sua
esfera psíquica. Em última instância, o indivíduo pode
passar a depender dessa ligação, tal qual muitas
pessoas dependem mortalmente de um vício”.
Pessoas com este vício, são usualmente chamadas de
workaholics. Elas tem grande propensão ao movimento e quase nenhum
espaço para a reflexão.
Para Caldas (1998), na ânsia de “não ficar pra trás”, passamos da
emoção à ação, sem a mediação da razão. E que na correria, os detalhes nos
escapam como as nuances entre o certo e o errado, o saudável e o doente,
entre o urgente e o necessário. A ética do workaholics segundo o autor, não é
a de trabalhar para viver, mas viver para trabalhar. Sua carreira é sua vida, seu
culto. Diz mais, que como o sucesso é um destino hipotético, a carreira
moderna e a obsessão destas pessoas é uma corrida que não tem fim, nem
ponto de chegada – condenado a vencer e isso convenceria o ser humano a
renunciar a si próprio (Pages in Caldas, 1988).
As organizações acabam por beneficiar-se deste tipo de relação,
conclui o autor, exigindo do indivíduo a comunhão total da carreira de forma
impiedosa e este círculo é reforçado pela sociedade que enaltece o sucesso, o
63
trabalho, a abnegação à carreira pois segundo Fromm (in Caldas, 1998), a
sociedade moderna acaba medindo o valor das pessoas como seres humanos
em termos de seu sucesso ou fracasso no trabalho.
Basta lembrar situações sociais em que, logo após o nome, a
próxima pergunta que vem é: - o que você faz? Ou ao telefone, quando
perguntam: - é o fulano de onde? Como quem diz, de que instituição? Porque,
o indivíduo sozinho não basta, tem que carregar consigo o “sobrenome” ou
pior, a “quem pertence”.
Um outro termo empregado atualmente para identificar pessoas
que trabalham em excesso é o burnout, lançado por Freudenberger e seguido
de Maslach (in Rodrigues, 1998). Este termo tem como foco principal a
exaustão emocional, a fadiga e a frustração profissionais decorrentes do
desgaste resultante do contato com pessoas ou da não satisfação das
expectativas e projetos que o indivíduo tem em relação à profissão.
Para estes estudiosos, o burnout é um estado que vai corroendo
progressivamente a relação do sujeito com sua atividade profissional e vem
tomando um caráter insidioso na atualidade. E é visto como o preço que o
profissional paga, pela sua dedicação ao cuidar de outras pessoas ou da luta
para alcançar uma grande realização.
O burnout seria a resposta emocional à exposição ao stress
crônico, em função de relações intensas, em situações de trabalho, ou de
grandes expectativas que profissionais apresentam em relação aos seus
desenvolvimentos profissionais e dedicação à carreira. Suas trajetórias
tornam-se turbulentas e o resultado é uma queda dos recursos individuais e
um comprometimento de suas habilidades.
A percepção destes profissionais quanto às gratificações ou
retorno pelo esforço empregado é sempre menor do que se espera e esta
também é uma das causas do burnout.
Esta síndrome segundo Maslach (in Rodrigues, 1998) é
64
caracterizada por três aspectos básicos: 1. exaustão emocional, 2.
despersonalização, 3. redução da realização pessoal e profissional.
Os autores atribuem a exaustão emocional, à pouca energia frente
ao dia seguinte de trabalho e ao esgotamento. O profissional sente-se menos
capacitado a atender as exigências do cargo e as relações com o trabalho e
com a vida são vividas como insatisfatórias e pessimistas. Esses profissionais
têm a impressão que não terão como recuperar ou reabastecer as energias para
enfrentar o próximo dia de trabalho ou as tarefas que os esperam.
À despersonalização atribuem o distanciamento emocional que se
exacerba com frieza, indiferença frente às necessidades dos outros e a
insensibilidade. O profissional assume uma atitude desumanizada, deixando
de perceber-se e de perceber o outro. Através de um mecanismo psicológico,
é como se eliminasse o ser humano e como resultado, perdesse a capacidade
de identificação e empatia com as pessoas. Tende a ver seu trabalho e as
pessoas como transtornos e um problema a ser resolvido o incomoda e
perturba. Em decorrência deste quadro aparecem sintomas de intolerância,
irritabilidade e exacerbação de aspectos onipotentes da personalidade. O
profissional acredita que, ninguém mais além dele, terá capacidade de
resolver as coisas e assume papel de salvador ou de vítima.
Conseqüentemente, a redução da realização pessoal e
profissional fica comprometida, com a sensação de “correr atrás do vento”, ou
de “dando murro em ponta de faca” ou ainda que “andam, andam e não saem
do lugar”. O sentimento dia após dia é de decepção e frustração.
Todos estes estudos nos alertam e demonstram as tendências e
conseqüências do trabalho do mundo moderno, sobretudo em algumas
categorias de trabalho, como é o caso de executivos ou de pessoas que têm
que se relacionar com muitas pessoas.
65
3.2 A qualidade de vida no trabalho
Qualidade de vida e qualidade de vida no trabalho se
complementam como propõe Witmer e Sweeney (in Neri, 1998).
Apesar de QVT ser parte integrante da QV das pessoas,
principalmente para empregados que dedicam-se ao trabalho, este não é o
foco desta dissertação e será citado apenas para situar o leitor no contexto da
empresa em estudo.
Para profissionais de Recursos Humanos, estes programas já
fazem parte de sua rotina, embora a organização deva ter este tema como
política e prática constantes.
Sabemos que não são todos os empresários que têm esta visão
apesar de que, Bom Sucesso (1998) e Neri (1993), atribuem ao tema um dos
fatores de diferencial e sobrevivência entre as empresas na atualidade.
Segundo Montana e Charnow (1998), a exemplo do modelo
japonês adotado após a Segunda Guerra Mundial , a Teoria Z , que William
G. Ouchi, teórico e consultor americano de administração denominou e
adotou como uma extensão dos métodos de administração que McGregor
chamou de Teoria X e a Teoria Y. Esta teoria, tem suas raízes filosóficas nos
costumes e cultura japonesa, sendo uma coleção de técnicas práticas de
administração em torno de grupos de trabalho, sustentando a participação de
todos no acesso a informações, solução de problemas e nas tomadas de
decisões. Este modelo foi divulgado no Brasil principalmente pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), através da Fundação
Cristhiano Ottoni (FCO), na pessoa de Vicente Falconi de Campos um
entusiasta do Gerenciamento pela Qualidade Total (GQT) que a empresa foco
deste estudo, a Quimicam também adotou e adaptou com a consultoria
daquela instituição desde 1995 até culminar na certificação da ISO 9001 em
66
1998.
Qualidade de vida no trabalho, neste sentido, vem então como
um desdobramento do modelo acima citado e na sua essência, constitui-se de
grande progresso para as relações de trabalho no Brasil (Campos, 1992).
No sentido legal, até a Constituição coloca como condição o
direito à vida e à saúde. É consenso a necessidade de proporcionar ao
trabalhador estas condições. Porém, na prática, observa-se que no país ainda
há pessoas que exercem funções insalubres, com jornadas de trabalho que
lembram o início da Revolução Industrial, em que os turnos de 15 horas eram
comuns.
“Num futuro próximo, comportamentos saudáveis também serão
aspectos a ser avaliados na ascensão profissional” diz De Marchi, em
palestra de 1998. De acordo com o médico, quando se está cansado e com
pouca energia, os erros são mais freqüentes, o trabalho não rende, o desgaste é
maior e problemas de saúde tornam-se freqüentes. Aprender a gerenciar o
próprio estilo de vida diminui os riscos de saúde, aumenta a disposição e
estabilidade emocional e a auto-estima.
O “modus operandi” dos programas de QVT, tem sido o de
facilitar as mudanças no estilo de vida, muitas vezes causadas ou exigidas
pela própria empresa e em outras, por características individuais.
A idéia segundo o autor, é combinar programas educacionais
para aumentar a conscientização e mudanças de comportamentos dos
envolvidos bem como a criação de ambientes que facilitem e apóiem práticas
saudáveis.
Slogan como “funcionário feliz, empresa produtiva”, são
premissas para a introdução do tema nas empresas.
Os programas de qualidade chegam à vida do funcionário,
promovendo seu bem-estar e saúde, dentro e fora da empresa, além de deixar
67
mais saudável o caixa das corporações, é a chamada da matéria de capa da
revista Controle de Qualidade de janeiro de 2000.
Considerando a complexidade e a amplitude do tema,
profissionais de diferentes formações e abordagens estão envolvidos com esta
forma de gestão nas empresas.
Neri (1998) através de aspectos conceituais e metodológicos, nos
faz refletir: Qualidade de Vida no Trabalho e não apesar do trabalho. O
descuido conceitual pode fazer com que as empresas se envolvam com
aspectos meramente compensatórios.
“Acreditamos que o trabalho deva ser o principal
motor da cidadania e da melhoria da qualidade
pessoal dos trabalhadores. Alertamos para um fato
cultural que se fortalece frente as grandes pressões
pela competitividade nos dias de hoje: em algumas
empresas percebemos que a cultura emite sinais dúbios
permitindo aos trabalhadores entenderem que lá não
basta trabalhar, é preciso sofrer para mostrar
dedicação e comprometimento” Neri (1998)
Outros aspectos abordados pelo autor são: QVT objetiva e a QVT
percebida. Se todos os esforços não forem reconhecidos pelo trabalhador, de
pouco adianta. E ainda QVT concedida ou QVT conseguida. A preocupação é
metodológica e não semântica: envolver os trabalhadores nos processos de
busca e delimitação de referenciais, compartilhar soluções para melhoria
contínua seguem a mesma trilha de programas de sucesso no país.
Na empresa, alvo desta pesquisa, foi adotado desde 1997,
programa de Qualidade de Vida no Trabalho e uma das primeiras fases foi
definir o termo que desse significado para todos além de ser coerente com a
política adotada.
68
A seguinte definição passou então, a ser adotada:
“Qualidade de vida no trabalho, para a Quimicam,
significa ter:
Segurança, saúde, integridade física e mental, salários
compatíveis com o mercado, lazer e descansos
necessários, oportunidades de aprendizagem,
desenvolvimento profissional e pessoal, mantendo boas
relações com colegas e chefias, tendo oportunidades de
trocas, inclusive de afeto”
Fonte: Recursos Humanos – Quimicam, 2000
Baseando-nos em conceitos de Qualidade de Vida no Trabalho
que foram adotados por diferentes autores – Quadro 4 (in França, 1996, p.9),
acrescentamos a definição da Quimicam* para facilitar o comparativo.
QUADRO 4 - Conceitos de Qualidade de Vida no Trabalho.
69
Autor Definição Ênfase Drucker, 1981 Avaliação qualitativa da qualidade relativa
das condições de vida, incluindo-se atenção aos agentes poluidores, barulho, estética, complexidade etc.
Responsabilidade social da empresa nos movimentos sociais, culturais e políticos.
Walton, 1973 Atendimento de necessidades e aspirações humanas, calcado na idéia de humanização e responsabilidade social da empresa.
Humanização e responsabilidade social, com foco no poder da empresa.
Fernandes, 1992 Conjunto de fatores que, quando presentes numa situação de trabalho, tornam os cargos mais satisfatórios e produtivos, incluindo atendimento de necessidades e aspirações humanas.
Humanização do cargo.
Werther & Davis, 1983
Esforços para melhorar a qualidade de vida, procurando tornar os cargos mais produtivos e satisfatórios.
Valorização dos cargos, mediante análise de elementos organizacionais, ambientais e comportamentais.
Nadler e Lawler, 1983
Maneira de pensar a respeito das pessoas, participação na resolução de problemas, enriquecimento do trabalho, melhoria no ambiente de trabalho.
Visão humanista no ambiente de trabalho.
Neri, A. M, 1992 Atendimento das expectativas quanto a se pensar a respeito de pessoas, trabalho e organização, de forma simultânea e abrangente.
Visão holística.
Lippitt, 1978 Oportunidade para o indivíduo satisfazer a grande variedade de necessidades pessoais.
Trabalho, crescimento pessoal, tarefas completas, sistemas abertos.
Berlanger, 1992 Melhorar as condições de trabalho, de modo a proporcionar aos indivíduos melhores condições de vida e cargos mais satisfatórios para a própria pessoa, com reflexos na produtividade.
Condições de vida e cargos mais satisfatórios.
Ginzberg et alii, 1979
Experiências de humanização do trabalho sob dos aspectos: reestruturação do emprego e grupos semi-autônomos.
Posto individual de trabalho e processo decisório.
Bergeron, 1982 Aplicação concreta de uma filosofia humanista pela introdução de métodos participativos.
Mudança e participação com foco sociotécnico.
Camacho, 1995 Classificação de programas: orientação familiar, saúde, ambiente, contato e convívio, evolução/desenvolvimento, cultura e desligamento.
Foco motivacional: sobrevivência com dignidade, segurança, participação, auto-realização e perspectiva de futuro.
Dantas, 1996 Gerência pela Qualidade Total – CGT: Utilização de 5s, diagrama de causa e efeito e procedimentos da Qualidade Total nos programas de saúde.
Foco: promoção da saúde: controle do colesterol, capacidade física e aeróbica, doenças coronárias.
Quimicam* Qualidade de vida no trabalho, para a Quimicam, significa ter: Segurança, saúde, integridade física e mental, salários compatíveis com o mercado, lazer e descansos necessários, oportunidades de aprendizagem, desenvolvimento profissional e pessoal, mantendo boas relações com colegas e chefias, tendo oportunidades de trocas, inclusive de afeto.
Saúde, segurança, educação e desenvolvimento,lazer e relacionamentos.
Fonte: in França, 1996, p.9 adaptado pela autora.
Preocupadas com a melhoria da saúde e bem-estar de seus
70
funcionários, empresas como a Quimicam, adotam: projetos ergonômicos,
ginástica laboral, exames médicos periódicos, monitoramento de peso e
pressão arterial, campanhas de vacinação e de conscientização e cuidados
com a saúde, campanhas contra o fumo e uso de drogas, integração das
famílias à vida da empresa, com visitas às fábricas, trabalhos sociais como
clube dos aposentados, projetos com crianças, filhos dos funcionários,
campanhas do agasalho e outras campanhas envolvendo a comunidade em
que estão inseridas.
Ações que melhoram o ambiente de trabalho, abrem espaço para
potencializar os talentos que toda organização possui. Permitem inclusive
refletir sobre a organização e por isso são fundamentais. Mas devemos ser
criteriosos com o que se define e adota para a qualidade de vida, alertam os
especialistas. Projetos, programas e outras atividades isoladas, podem ser
inócuas, ou até prejudiciais se não estiverem em consonância com as metas e
sinergia da organização.
Exemplos de programas de QVT em empresas no Brasil, estão
demonstrados em quadro a seguir: - Quadro 5 (in França, 1996, p.33).
Acrescentou-se o exemplo da Quimicam* para facilitar um comparativo entre
elas.
QUADRO 5 - Ações e programas de Qualidade de Vida no Trabalho nas empresas brasileiras
71
Empresas Atividades Foco Fonte Banco de Boston Ações de QVT promovidas pela
associação de funcionários com apoio de RH: estilo de vida, mini check-up, relaxamento, teatro, passeio ciclístico
Lazer, realização no trabalho, saúde e segurança
Messohn, M. M., Silva, M. P> , jun. 1994.
Banco do Brasil, Banerj, Multibrás, Goodyear, Mercedes Benz
Programa de assistência e conscientização contra a AIDS
Atendimento clínico e educação para saúde
Revista Isto é. Patrão eu tenho AIDS, (1994: 104-105).
Ciba-Geigy Química
Atividades diversas em prevenção de acidentes em parceria com o departamento médico
Saúde e segurança Corrêa, G. De M., Silveira, A. L. F., jun. 1994.
Cindumel – Cia Ind. De Metais Laminados
Limpeza da empresa, visando a integração dos funcionários
Higiene e integração no Programa de Qualidade Total
Nomura, P. M., Zacharauskas, I., jun. 1994.
Copesul Parte do Programa de Qualidade e Produtividade e ações no ambiente particular e familiar
Qualidade de Vida no Trabalho e na Vida de forma ampla
Jornal de Recursos Humanos, 1992, p. 6.
Copesp Levantamento e diagnóstico através de questionário específico
Satisfação dos funcionários
Pires, P. P. P., jun. 1994.
Credicard Pesquisas sobre clima organizacional, que envolveu condições de trabalho
Satisfação dos funcionários
Costa, A. C. , Figueiredo, B., jun. 1994.
Dow-Química Saúde & Qualidade de Vida: alimentação, antifumo, ginástica, patrocínio educacional
Saúde, treinamento e desenvolvimento de pessoal, ética
Relatório específico da empresa, fev., 1996.
Du Pont Comitê de segurança Segurança e Proteção Ambiental
To, R. K., Nishiwaki, M. K., jun. 1994. Informe Du Pont, 26.05.94.
Fast-Food Estudo sobre a percepção de Qualidade de Vida, do ponto de vista dos funcionários e gerentes
Problemas de QVT no ambiente de Qualidade Total em Serviços
Moraes, M., 1994.
Fundação Cesp Treinamento de especialistas Conceitos e planos de ação em qualidade de Vida no Trabalho - QVT
Atividade de Campo, 1994.
IBM Projeto IBM & Gente (ver quadro específico, nos anexos), Política de Porta Aberta
Atividades assistenciais, saúde e segurança, organização de RH, satisfação com a empresa
Texto Interno: IBM & Gente, 1995, Fernandes, 1988:7.
Impressoras Rima Campanha de saúde e qualidade de vida
Stress e qualidade de vida
Atividade de campo, 1993
Ishikawajima Qualidade de vida dentro e fora do ambiente de trabalho
Promoção da saúde Revista Exame. É melhor prevenir do que remediar, 1992: 44-45.
Kodak – São José dos Campos
Programa para gestantes Kanban – saúde
Atendimento materno-infantil
Revista Exame. É melhor prevenir do que remediar, 1992: 44-45.
Metal leve, Pernambucanas, Freudemberg, ICI, Copagaz
Atendimento psicológico Assistência psicológica
Revista Exame. Operários à beira de um ataque de nervos, 1991: 72-75.
Continuação do Quadro 5 METRÔ – São Paulo
Pesquisa e Sipat – Levantamento e Apresentação de Dados
Indicadores QVT através da satisfação
Atividade de Campo, 1995
72
individual OESP Integração empresa-família, clima
organizacional, pesquisa junto a clientes.
Qualidade Total (QGP)
Franco, F., Segouras, H., jun. 1994.
Philips Programa piloto de saúde física e mental
Promoção da saúde Revista Exame: ë melhor prevenir do que remediar, 1992:73.
Philips-Walita Promoção da saúde, ergonomia, segurança, assistência social. (ver quadros e anexos)
Segurança, higiene, e medicina, serviço social e manutenção social
Texto Interno – fev./1996
Refinações de Milho Brasil
Prevenção à AIDS e programas de saúde eventuais
Medicina do trabalho
Nagasawa, J. M., jun. 1994.
Riocell Ações diversas não totalmente delineadas visando à simbiose entre empresa e empregados
Produtividade, redução de acidentes e do absenteísmo
Jornal de Recursos Humanos, 1992
Schering-Plough Campanha de qualidade de vida Saúde Jornal Gazeta Mercantil, 31/5/95.
Schulumberger Semana de qualidade e saúde Preservação do meio ambiente
Ativação de Campo, 1993
Shell Programa VIVA, assistência a aidéticos, diagnóstico clínico sistemático, pós-trabalho
Saúde e integração social
Material institucional de 1993.
StihlTIHL Moto Serras Ltda.
Diagnóstico de satisfação em QVT, baseado nos critérios de Walton
Satisfação pessoal Jornal de Recursos Humanos, 1992.
Telebrás Treinamento conceitual e comportamental
Stress e qualidade de vida no trabalho
Atividade de campo.
Tenenge Estrutura e gestão de Saúde e Segurança voltados para QVT
Saúde e Segurança Relatório específico da empresa.
Translor Remuneração, alimentação, boa tarde Translor, Rádio Translor
Relacionamento e integração
Coelho, R. M. H., Chun, Y. Y., jun. 1994.
Unilever Entrevistas pessoais sobre efeitos da reestruturação nas expectativas e comportamento das pessoas.
Efeitos da reestruturação na qualidade de vida das pessoas na empresa.
Puglia, D., Sícoli, D. L., jun. 1994.
Quimicam* Programa de QVT Saúde, segurança, educação, desenvolvimento e treinamento, envolvimento das famílias, lazer e clube dos aposentados
Relatório da empresa com resultados da pesquisa de satisfação dos funcionários.
Fonte: in França, 1996, p 33 adaptado pela autora
73
4 METODOLOGIA
“... Em tese, pesquisa é a atitude de ‘aprender a aprender’, e,
como tal, faz parte de todo o processo educativo e emancipatório” (Demo,
1993, p. 128).
4.1 Delineamento
Trata-se de um estudo de caso, que pode ser definido como:
“um conjunto de dados que descrevem uma fase ou a
totalidade do processo social de uma unidade, em suas
várias relações internas e nas suas fixações culturais,
quer seja essa unidade uma pessoa, uma família, um
profissional, uma instituição social, uma comunidade
ou uma nação” (Young in Gil, 1991, p.59).
Sua maior utilidade, é verificada nas pesquisas exploratórias,
acrescenta o autor.
Escolher como delineamento o estudo de caso tem suas
vantagens e limitações descritas por Gil (1991). Principais vantagens: o
74
estímulo a novas descobertas, a ênfase na totalidade e a simplicidade de
procedimentos. E como limitações, a mais grave refere-se à dificuldade de
generalização dos resultados obtidos.
O critério adotado para classificar esta pesquisa como
exploratória, deu-se por ter como objetivo maior a familiaridade com o
problema para torná-lo mais explícito ou para construir hipóteses, cujo
objetivo principal segundo Gil (1991), é o aprimoramento de idéias ou a
descoberta de intuições.
“A pesquisa exploratória , categoria na qual se situa o
estudo de caso, propõe uma busca e não uma
verificação de informações. Seu objetivo maior é a
descoberta de idéias que sejam úteis e norteadoras de
novas atitudes em relação ao mundo” (Diniz, 1994,
p.32).
4.2 Universo e sujeitos da pesquisa
O procedimento inicial é delimitar a unidade que constitui o caso
em estudo. “Conceituando, universo ou população é o conjunto de seres
animados ou inanimados que apresentam pelo menos uma característica em
comum” (Lakatos & Marconi, 1992, p.108). Para este estudo, delimitamos
como sujeitos os executivos de uma instituição empresarial que está
localizada em Franca, Estado São Paulo. Optamos por pesquisar 100% da
população já que trata-se de 10 gerentes, atual liderança dos seguintes setores:
Diretoria, Administração de Vendas, Comercial, Produção, Manutenção e
75
Desenvolvimento. No entando, de toda a estrutura da empresa ficaram fora da
pesquisa o setor de Recursos Humanos por estar sob responsabilidade da
autora desta pesquisa e o Administrativo e Financeiro que respondem a
Holdding e são comuns a outras empresas do grupo. Solicitamos junto aos
responsáveis a autorização para a realização da pesquisa e divulgação dos
dados obtidos (Anexo 1). A escolha deste universo deu-se por fazer parte do
dia-a-dia da autora e pela inquietação em testemunhar o cotidiano de seus
colegas homens.
4.3 O “locus” da pesquisa
A Amazonas Produtos para Calçados Ltda é uma empresa
familiar com sede em Franca – SP., com 53 anos no mercado, sendo que de
1978 a 2000 foi desmembrada em empresa autônoma, dando origem assim à
Quimicam que voltou a ser unificada conforme tendência atual tornando-se
uma divisão a partir de 2001 (Folder - Anexo 2).
A marca Amazonas tem conceito no mercado de seriedade,
solidez e tem sido referência nacional além de exportar para a América
Latina. Investe em tecnologia e no desenvolvimento das pessoas.
A Quimicam é certificada pela ISO 9001 desde 1998 e o
faturamento anual é de R$ 60 milhões.
O ramo de atuação desta indústria química é a de adesivos
(colas) e solventes. Atua nos mercados: calçadista, moveleiro,
automobilístico, construção civil, embalagens e gráficas e é líder no mercado
de adesivos em solução.
76
O tipo de propriedade é de capital privado, com sociedade por
cotas de responsabilidade limitada.
A Quimicam conta atualmente com 132 funcionários, sendo que
17 estão no depósito de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, e outros 4
em centros de atuação como São Paulo, Jaú, Birigui, Nova Serrana e o
restante em Franca (Organograma - Anexo 3).
A linha de produtos é composta por: adesivos à base de
solventes, adesivos à base de água, adesivos não – solventes : poliamidas,
hot–melts, cola branca (PVA) e solventes.
Trata-se de uma indústria altamente automatizada, com contrato
de tecnologia alemã.
Tem como características ser de um setor de atuação altamente
competitivo, com produtos commodities sendo que o diferencial são os
serviços e atendimento como entrega e assistência técnica.
As empresas que saem na frente com produtos inovadores podem
ganhar mercado até que os concorrentes “copiem” o produto e começa então a
guerra de preços. Atualmente com a abertura de mercado os concorrentes
internacionais ameaçam os nacionais.
Outra característica importante é a aquisição das matérias-primas,
70% são importadas e portanto sujeitas às flutuações do dólar e com a
necessidade de se ter estoques altos por sofrer influência das importações,
embarque, greves em portos, desembaraços e legislação.
Os principais desafios atuais desta empresa, são:
Proporcionar qualidade de vida a seus funcionários e comunidade a que
está inserida.
Desenvolver e reter seus talentos.
Investir nas pessoas que neste tipo de negócio são o diferencial
competitivo (através dos serviços e atendimento) já que os produtos são
muito parecidos.
77
Promover a formação de líderes como legítimos gestores de pessoas.
Ter agilidade no lançamento de produtos – quem sai na frente ganha
mercado, portanto, o desenvolvimento tem papel diferencial.
Oferecer não só produtos mas soluções inovadoras para o cliente já que o
principal cliente é a indústria e não o consumidor final.
Ser competitivo para enfrentar os concorrentes internacionais que com a
abertura de mercado vêm ameaçando.
Fazer parcerias com grandes fornecedores que garantam entrega e preços
competitivos (basicamente são os mesmos para todos).
4.4 Coleta de dados e procedimentos
Gil (1991) descreve que a coleta de dados no estudo de caso é
feita mediante diversos procedimentos entre eles, a observação, a análise de
documentos, a entrevista e a história de vida.
Foi utilizado como fonte de coleta de dados, neste estudo,
entrevistas semi-estruturadas.
As entrevistas seguiram um roteiro (Anexo 4) e foram realizadas
entre dezembro de 2000 e maio de 2001 sendo que foi feito um pré-teste com
um funcionário da empresa e após a verificação da eficácia, do modelo
adotado foi aplicado toda a população. As entrevistas foram realizadas
individualmente, nas dependências da empresa, em horário de expediente,
com prévio agendamento e a autorização da direção. A duração média de cada
entrevista foi de uma hora e meia, sem interrupções e em sala apropriada que
garantiu o clima adequado preservando o sigilo e a comodidade das pessoas.
Os nomes dos entrevistados foram mantidos em sigilo para preservá-los,
78
deixá-los mais à vontade para expressar suas opiniões e sentimentos e estes
serão identificados por número. As respostas foram gravadas com autorização
dos entrevistados e posteriormente transcritas para serem analisadas
Os sujeitos que participaram da pesquisa consideraram a
entrevista um espaço para reflexão sobre o assunto.
Tendo em vista os objetivos desta pesquisa procedemos a uma
análise quantitativa dos dados construindo tabelas e gráficos sendo que
aspectos mais subjetivos das falas foram analisados na perspectiva qualitativa,
o que possibilitou uma compreensão mais aprofundada do universo de
significados que os entrevistados manifestaram em suas falas.
“... é bom que se recorde que a pesquisa qualitativa
pode pressupor em alguma medida a quantitativa, O
fato de ser qualitativa não implica a descaracterização
ou exclusão da modalidade. Por isso é que podemos até
ter uma pesquisa qualitativa que decorra de uma
quantitativa” (Martinelli, 1994, p.16).
79
5 ANÁLISE DOS DADOS
Este capítulo destina-se à analise dos dados da pesquisa.
“Os dados não são coisas isoladas, acontecimentos
fixos, captados em um instante de observação. Eles se
dão em um contexto fluente de relações: são
'fenômenos' que não se restringem às percepções
sensíveis e aparentes, mas se manifestam em uma
complexidade de oposições, de revelações e de
ocultamentos. É preciso ultrapassar sua aparência
imediata para descobrir sua essência” (Chizzoti,
2000, p.84).
Inicialmente descreveremos a população traçando o perfil do
grupo pesquisado. Em seguida, partindo do entendimento dos entrevistados
sobre a importância do trabalho, sobre qualidade de vida e escolha,
procedemos então a análise das interferências do trabalho na qualidade de
vida dos pesquisados, que será apresentada através de duas categorias de
análise, sendo que esta última foi desdobrada em três subcategorias. São elas:
1. Trabalho e qualidade de vida.
2. Interferências do trabalho na qualidade de vida.
O trabalho excessivo e o sofrimento psíquico.
Os diferentes papéis que são desempenhados.
80
O futuro e o não preparo para o "não trabalho".
5.1 Perfil da população
Os entrevistados são empregados, com cargos gerenciais em uma
empresa familiar de Franca, fabricante de produtos químicos (adesivos e
solventes) para os mercados de calçados, móveis, construção civil,
embalagens e gráficas. Foram entrevistadas 10 pessoas, 100% da população,
ou seja, toda a liderança da empresa participou da pesquisa, o que
consideramos, um número significativo.
Os dados referentes ao perfil foram colocados numa única
Tabela, e quando se fez necessário foram apresentados em forma de gráficos
conforme veremos à seguir.
TABELA 1 - Perfil da população
• Sexo: 100% homens
• Estado civil: 100% casados
• Cargo: 100% com cargos de liderança
• 100% com filhos
• 100% provedores de suas famílias
• Idade : ver figura 1
• Tempo de empresa: ver figura 2
• Escolaridade: ver figura 3
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa.
Quanto à idade, a população encontra-se com idades entre 32 e
54 anos, como veremos na Figura à seguir:
81
37
42
43
48
50
51
52
54
32
0 10 20 30 40 50 60
10%
20%
10%
10%
10%
ANOS
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa FIGURA 1 - Idade da população
Podemos dizer que a população é madura, estando 20% na faixa
dos 30/39 anos, 30% na faixa dos 40/49 anos e a outra metade 50% na faixa
dos 50/54 anos. A maioria está no topo de suas carreiras e 50% já recebem
aposentadoria por tempo de serviço, mas ainda exercem suas funções.
Em relação ao tempo na empresa, como veremos na Figura a
seguir, trata-se de uma população com longo tempo de casa, que permanece
na empresa grande parte dos anos de suas vidas, o que para o mercado de
trabalho atual tem sido incomum.
82
4,5
13
14
22
23
29
31
1,5
0 5 10 15 20 25 30 35
10%10%10%10%10%10%10%30%
ANOS
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa FIGURA 2 – Tempo de empresa
Observa-se através da Figura 2 que apenas 20% tem menos de 10
anos de empresa, sendo que os outros 80% variam entre 13 a 31 anos. Trata-
se portanto, de uma população estável.
Os dados permitiram concluir que 80% da população fizeram
carreira nesta mesma empresa conforme veremos nos dados da entrevista,
chegando à liderança. Apenas 20% já foram contratados para o cargo que
ocupam atualmente, sendo também os mais novos da empresa.
Em relação à escolaridade e a formação da população pesquisada,
os dados encontram-se a seguir:
83
70%
30%
3º grau completo
3o grau incompleto
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
FIGURA 3 - Escolaridade da população
Quanto à formação escolar da população, obtivemos os seguintes
dados:
• 50% - Administração de Empresas, sendo que um deles não completou o
curso.
• 30% - Química, sendo um deles, em nível de 3º grau e os outros dois
completaram cursos de 2º grau.
• 30% - Pós – graduação
• 40% - têm mais de um curso superior
Trata-se de uma população qualificada para os cargos que
ocupam, embora para a política atual de Recursos Humanos da empresa, a
exigência mínima para contratação ou promoção para cargos de liderança é de
3º grau completo.
5.2 Categorias de análise
Na construção da análise apresentada a seguir, remetemo-nos aos
objetivos propostos, organizando os dados colhidos em categorias de análise,
conforme foi apontado anteriormente.
84
5.2.1 Trabalho e qualidade de vida
Para a análise desta categoria, partimos do entendimento sobre
qualidade de vida para cada respondente visando compreender o significado
do tema para cada um já que o termo qualidade, por si só é subjetivo,
podendo variar de pessoa para pessoa e buscamos saber, ainda, se acreditam
que qualidade de vida seja uma questão de escolha; por fim foram
pesquisadas as idéias sobre a importância do trabalho em suas vidas,
conforme veremos a seguir.
Sobre a importância do trabalho para a população alvo,
obtivemos as seguintes respostas, que nos ajudam a compreender o peso que
este tem na vida de cada um dos entrevistados:
• 100% dos entrevistados reconhecem o trabalho como sendo de muita
importância.
• Fazem comentários como:
“O trabalho para mim é tudo!” E2 e E9.
“Não dá para viver sem ele” E8.
“Só a família é mais importante” E10.
"Nem consigo ficar 15 dias de férias” E1.
“Nunca vou parar de trabalhar” E7.
85
“Não consigo ficar parado nem nos finais de semana” E4.
• Consideram que o trabalho é importante para: o sustento, para ter
tranqüilidade, para produzir, para realizar sonhos, para auto-realização,
para preencher a vida, para dar contribuição, para ter a mente ocupada,
para manter a família, para a comunidade, para ser criativo, para ser útil,
para ensinar as pessoas e para preencher o dia.
Quanto ao entendimento do que é qualidade de vida:
• 50% dos entrevistados fazem uma inter-relação entre trabalho e família.
como se qualidade de vida dependesse destas duas variáveis. É necessário
estar bem em ambas para se ter qualidade de vida.
• 40% dos entrevistados referem-se ao equilíbrio entre vida profissional,
familiar e pessoal.
• 20% dos entrevistados consideram as duas coisas: inter-relação e
equilíbrio.
• 30% falam que ter qualidade de vida é ser feliz, embora alguns não
definam com clareza o que seja felicidade.
• 20% consideram o dinheiro como fator determinante para se ter ou não
qualidade de vida.
• 20% consideram não ser o dinheiro fator determinante da qualidade de
vida e sim outras variáveis como equilíbrio entre trabalho e vida pessoal e
ser feliz.
• 20% citam ser o emprego como fator determinante de qualidade de vida.
• 10% consideram a saúde como fator determinante de qualidade de vida.
De acordo com levantamento coordenado por Betânia Tanure (in
Veja, 2001, p.99), da Fundação Dom Cabral, em um universo de 1000
86
profissionais entrevistados, “25,5% afirmaram que o que mais lhes tira o
sono é equilibrar o trabalho e a vida familiar. A possibilidade de demissão
vem em segundo lugar, com 22,1%”.
Segundo Hirschfeld (2000), em 1979, uma pesquisa nos EUA
constatou que somente 12% dos pais sentiam-se estressados ao tentar
equilibrar trabalho e família; em 1989, esse número subiu para 72% e em
2000 este índice deve ter aumentado significativamente apesar de todo
esforço e tecnologia à disposição destes profissionais. Esta também foi uma
preocupação da população pesquisada neste trabalho, já que 100% tem filhos.
A pergunta sobre o fato de ser a qualidade de vida uma questão
de escolha foi incluída na pesquisa para verificar a coerência das respostas e
da relação que os pesquisados fazem entre o que é qualidade de vida para eles
e o acesso ou controle que têm sobre a mesma. Sugere também uma reflexão
sobre o fato de a empresa poder impor algumas condições na distribuição do
tempo semanal dedicado ao trabalho mas também que muitas das escolhas
estão na mão de cada um como admitiram 70% dos entrevistados. Apenas
30% não consideram qualidade de vida como uma questão de escolha, como
veremos na tabela à seguir.
TABELA 2 – Qualidade de vida como escolha
f %
. Acreditam que qualidade de vida é uma questão de escolha 05 50
. Qualidade de vida é em parte uma questão de escolha 02 20
. Não acreditam que qualidade de vida é uma questão de escolha 03 30
TOTAL: 10 100
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
87
Observa-se que 50% da população acreditam que qualidade de
vida é uma questão de escolha, 20% acreditam que é em parte uma questão de
escolha e 30% não acreditam ser questão de escolha.
Um dos entrevistados que não considera qualidade de vida como
sendo escolha, atribui qualidade de vida à saúde e acredita que esta depende
de escolha. Outro, atribui a Deus como determinante da saúde embora
reconheça que depende dele parar de fumar por exemplo. Ou seja, existem
algumas incoerências nas respostas e estas ficaram claras no decorrer da
entrevista o que propiciou que os sujeitos puderam refletir melhor sobre o
assunto.
5.2.2 Interferências do trabalho na qualidade de vida
O trabalho interfere significativamente na qualidade de vida das
pessoas. Esta foi uma questão fundamental proposta aos entrevistados.
Veremos as respostas obtidas, a seguir:
• 100% dos entrevistados, reconhecem que há interferências diretas do
trabalho na qualidade de vida, sendo que, 60% citam que o trabalho
interfere tanto de forma positiva quanto de forma negativa; 20% citam que
as interferências do trabalho são positivas, 20% citam que as interferências
do trabalho são negativas conforme pode ser visto na tabela abaixo.
Um dos entrevistados, no dia da entrevista comunicou seu pedido
de demissão para ir para uma empresa concorrente. Sua principal queixa era a
interferência negativa do trabalho no seu humor, disposição física e no
88
aspecto financeiro. Relatou que ultimamente a empresa tem exigido mais do
que dado recursos para que ele pudesse executar bem sua função e que,
portanto, vinha sentindo que estava dando mais do que recebendo.
TABELA 3 – Interferências do trabalho na qualidade de vida
f %
Reconhecem que a interferência é tanto positiva quanto negativa 6 60
Citam as interferências só positivas 2 20
Citam as interferências só negativas 2 20
TOTAL 10 100
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
O trabalho excessivo e o sofrimento psíquico
Quanto ao pressuposto de que o trabalho excessivo traz
sofrimento psíquico o que priva os homens de uma melhor qualidade de vida,
observamos pelos relatos, insatisfações, frustrações, cobranças por parte da
família ou mesmo a autocobrança quanto à dedicação ao trabalho versus
dedicação à família ou a outras atividades de ordem pessoal. Citações dos
entrevistados como:
“O trabalho tem interferências que não são
muito positivas, exemplo: distância da família
acarretada pelas viagens freqüentes que o
trabalho exige – em média semana sim, semana
não. Viajo desde 1986 e não acompanho o
desenvolvimento dos meus filhos, apesar de ter
aceito esta condição pois foi a opção que tive
89
na época. Outra interferência foi no estudo:
tive que parar de estudar pelas freqüentes
mudanças e viagens. Acho que me acomodei
nesta situação” E2.
Este relato transmitiu um profundo sofrimento e pesar por não
desempenhar o papel de pai em sua plenitude bem como por não ter tido
oportunidade de investir em seu autodesenvolvimento. Este sujeito é o que
mais horas dedica à atividade profissional conforme será visto adiante quando
os entrevistados distribuíram seu tempo semanal em termos de dedicação a
cada papel desempenhado (Tabela 4). E2 tem consciência de que fez uma
opção embora fale como se fosse a única. Deixa bem clara sua insatisfação:
“...Os outros papéis por descuido meu, estão
falhos...Não estou satisfeito! Gostaria de ter
mais tempo para lazer e também para a
família. Pretendo procurar este tempo
repensando as atividades profissionais, que é
de onde preciso tirar. Penso muito no trabalho:
acordo pensando, tomo banho pensando”.
Este entrevistado pareceu-nos profundamente sofrido e pesaroso,
além de inseguro quanto ao futuro dele e dos filhos. Em alguns momentos a
entrevista passa a ser uma espécie de desabafo (referindo-se ao trabalho):
“...Rouba energia, exige muito, algumas
áreas ficam prejudicadas. Não aprendi a
dosar bem. Atualmente ando questionando se
90
compensa já que a saúde não é a mesma em
função do ritmo de vida. Tenho dúvidas” E3.
O sofrimento deste sujeito tem um tom de cansaço quanto às
formas adotadas que escolheu para viver. A dúvida aparece denotando uma
crise existencial, quanto a tudo que fez, no que investiu, no que acreditou e
escolheu, se valeu a pena.
O entrevistado E4, fala de um sentimento de dívida em relação à
esposa:
“...fazendo estas contas é que você vê que está
em débito”.
Estar devendo algo é uma situação de desconforto principalmente
quando se trata de uma dívida não material e sem nenhuma chance de resgatá-
la. O entrevistado E8 também cita o sentimento de quem está devendo:
“...poderia dedicar mais aos meus filhos,
participar das lições, ensinar, embora minha
esposa tenha prazer em fazer isso; precisava
dividir esta tarefa com ela”
Tem também o depoimento do E9 que demonstra um profundo
pesar e um sentimento de quem nunca vai se perdoar por não ter podido estar
com a esposa por ocasião do nascimento de suas filhas uma vez que estava
viajando:
“...O meu cargo, por ser viajante, me faz ficar
ausente. Sinto até hoje em dívida com a minha
91
mulher por não ter estado com ela no
nascimento das minhas duas filhas. Não sei se
é débito mas não me perdôo por isso”.
A própria insatisfação quanto à forma de administrar o tempo
entre os diferentes papeis que exercem, conforme mostra a Tabela 4
(apresentada na análise da subcategoria a seguir), também denota sofrimento
já que insatisfação não é um sentimento agradável embora algumas vezes útil
para gerar mudanças.
Estamos falando aqui de sentimentos profundos e que causam
dor e sofrimento muitas vezes difíceis de transmitir e dimensionar, porém
contamos com a empatia do leitor capaz de identificar-se com os
entrevistados que se desnudaram e reviveram situações dolorosas para
contribuírem com este estudo.
Os diferentes papéis que são desempenhados
Os homens não estão encontrando tempo para refletir sobre os
diferentes papéis que desempenham uma vez que o papel profissional
parece impedir o exercício pleno dos outros papéis. Este pressuposto foi
confirmado, considerando a distribuição de tempo semanal que os
entrevistados apresentaram para o desempenho das diferentes atividades que
fazem, dados apresentados na Tabela 4.
A média dedicada ao trabalho é de 54 horas, 10 horas a mais do
que a legislação determina que é de 44 horas. Levando-se em conta que cada
mês tem em média 4,5 semanas, temos ao mês 45 horas excedentes que
poderiam “teoricamente” ser dedicadas a outras atividades. Estamos falando
em média, já que se formos considerar os sujeitos que estão na faixa superior
92
de tempo dedicado ao trabalho temos o exemplo de um entrevistado com 77
horas semanais de trabalho, excedendo em 33 horas, o que não representa a
maior parte da população embora cada caso isoladamente merecesse
tratamento exclusivo. O tempo dedicado ao estudo, está intimamente ligado à
atividade profissional já que o auto-desenvolvimento é parte integrante da
vida do trabalhador na atualidade pelas possibilidades de melhorar a carreira
bem como para a manutenção do cargo. A atualização e qualificação têm sido
exigências naturais do mercado competitivo a que estão todos expostos.
TABELA 4 – Distribuição do tempo semanal em horas p/ os diferentes papéis e atividades
E1 E2 E3 E4 E5 E6 E7 E8 E9 E10 X
Profissional 50 77 60 55 50 53 50 55 52 45 54
Marido 14 18 15 16* 53 16 15 17,5 30 10 20,5
Pai 59* 29 5 16* 5 40* 25* 33* 6* 25* 24,3
Sono 35 35 50 42 51 42 46 49 44 50 44,5
Lazer _ * 06 11 15* 08* 10* 16* 06 10* 9
Estudo 07 02 07 08 04 10 08 08 07 02 6,3
Atividade física 05 06 05 02 0 0 05 7,5 02 02 3,5
Espiritualidade 02 01 02 3,5 0,5 1,5 02 1,5 02 02 1,8
Tempo livre (ócio) 03 0 03 07 02 3,5* 08 0 0 0 2,6
Outros _ _ 04* _ 11* _ _ _ _ _ _
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
Obs.: O asterisco (*) é a sinalização de que os entrevistados fizeram observações que não
podem ser desconsideradas para melhor entendimento da distribuição de tempo dos
mesmos.
* E1 - O entrevistado 1 considera 59 horas como pai incluindo o
lazer e a companhia da esposa.
* E2 – O entrevistado 2 considera que as horas de lazer estão
incluídas com o papel de pai e de marido.
93
* E3 – O entrevistado 3, inclui uma outra categoria como sonhar
e gasta 4 horas para tal.
* E4 – O entrevistado 4 considera 16 horas exclusivamente como
marido e comenta:
“fazendo estas contas é que você vê que está
em débito”.
Além das outras 16 horas como pai, conta mais 17 horas como
pai e marido em conjunto.
*E5 – O entrevistado 5 cita que o tempo de lazer e as atividades
sociais são compartilhadas com esposa e filhos. Considera como outros:
serviços domésticos, Rotary e Maçonaria.
*E6 – O entrevistado 6 cita que as 8 horas de lazer são
compartilhadas com esposa e filhos. Considera as 3,5 horas de ócio como
“tempo perdido”.
*E7- Os entrevistados 7e 8 compartilham o tempo de lazer com
a esposa e filhos e o tempo com os filhos, também com a esposa.
*E9 – O entrevistado 9 aponta que as horas com os filhos são
também compartilhadas com a esposa.
*E10 – O entrevistado 10 ressalta que o tempo de lazer – 10
horas, é dividido com a esposa, parte com os filhos e parte só dele.
Bustos (1979) desenvolveu o conceito de papel gerador de
identidade, caracterizado como aquele que, dentro de um repertório de papéis
de um adulto, predomina como um ponteiro positivo indicador do indivíduo.
Afirma que todas as pessoas têm um papel central e predominante que
impregna os demais, auxilia a cimentar a identidade, constituindo auto-
confiança. Constitui-se em eixo predominante que funciona como defensivo
94
em situações de conflito. Neste caso, o papel central e predominante da
população é o profissional.
Alguns itens da Tabela 4 nos chamam a atenção, como o pouco
tempo dedicado exclusivamente ao papel de marido, que normalmente está
dividido com os filhos e/ou com o lazer. Quanto ao lazer, não temos
parâmetros para avaliar o tempo dedicado a esta forma de atividade, apenas
concluímos que esta é uma atividade compartilhada com a família e
normalmente praticada nos finais de semana. Ou ainda, o tempo de ócio que
para 40% da população é inexistente e que provavelmente seria uma
oportunidade para reflexão ou para criação, ou ainda para sonhar como citou
um dos entrevistados. O tempo dedicado à espiritualidade, neste momento não
propicia considerações já que não temos parâmetros para discuti-lo. O tempo
dedicado ao sono parece de modo geral, atender às necessidades diárias da
população que dorme em média 7,5 horas por noite.
Não estamos considerando aqui a qualidade destes tempos e sim
a quantidade e distribuição dos mesmos. Quanto ao tempo destinado à
atividade física, já que esta interfere significativamente na saúde das pessoas
nesta pesquisa, demonstra que os entrevistados praticam em média 3,5 horas
semanais de algum tipo de atividade física o que é considerado o mínimo
necessário. Apontamos dados de duas pesquisas apresentadas na Revista
Melhor que referendam os dados coletados. Serrano (in Melhor, 2001 p. 33),
médico do Instituto do Coração (Incor) revela que “o ideal é que a pessoa
caminhe 150 minutos por semana, podendo ser no mínimo 30 minutos
diários”. Considerando a idade, o tipo de trabalho sedentário que a população
exerce, e os relatos de que são atletas-de-fim-de-semana, eles podem ser alvo
de doenças como revela a pesquisa realizada pela Vita Check-Up Center, em
1999 e 2000, e publicada na referida revista com 260 executivos com média
de idade de 44 anos. Os resultados mostraram que 54% eram sedentários,
95
56% estavam acima do peso ideal, 24% eram hipertensos (a média costuma
ser de 10% nessa faixa etária) e 65% estavam com elevada taxa de colesterol.
Scheurmann (s.d.), recolheu comentários escritos por Tuiàvii,
chefe da tribo Tiavéa nos mares do sul em sua estada na Europa sobre o modo
de vida dos brancos que este chama de Papalagui. Sobre a profissão, escreve:
“é difícil dizer o que é profissão, mas todo Papalagui
tem uma. É uma coisa que deve ter muita alegria ao
fazer, mas raramente isto acontece. Ter profissão
significa fazer sempre a mesma coisa, uma só coisa,
tantas vezes que se conseguir fazê-la de olhos fechados
e sem esforço algum...O Grande Espírito (Deus) nos
deu as mãos para colhermos as frutas das árvores,
para apanharmos os caroços de taro nos pântanos,
para proteger-nos o corpo contra todos os inimigos.
Deu-nos as mãos para nos divertirmos, dançando e
brincando, folgando de todos os modos. Não as deu
para construirmos apenas cabanas, apenas colhermos
frutas ou caroços; mas, sim, para nos servirem, para
nos defenderem em todos os momentos, em todas as
ocasiões. Mas que a sua atividade é errada, errada
mesmo, contra todos os mandamentos do Grande
Espírito, nós o percebemos pelo seguinte: é que existem
brancos que já não podem correr pois criam muita
gordura no ventre, como os porcos porque têm de estar
sempre parados, obrigados pela profissão; já não
podem levantar e lançar um dardo pois suas mãos
estão muito habituadas a segurar osso que lhes serve
para escrever e eles estão sempre sentados à sombra,
só escrevendo, não são capazes de dominar um cavalo
selvagem porque estão sempre ocupados em olhar para
as estrelas ou inventar idéias.
96
È raro ver um Papalagui que ainda salte, que pule
como criança, depois que fica adulto. Pelo contrário,
quando anda, arrasta o corpo, como se alguma coisa
entrevasse seu movimento. O Papalagui disfarça, nega
esta fraqueza, dizendo que correr, saltar não são
decentes para um homem importante. Hipocrisia: é que
seus ossos estão duros, sem movimento e seus músculos
não têm mais animação porque a profissão os fez
sonolentos e mortos” (Scheurmann, [s.d.], p. 72).
Quanto aos papéis mais lembrados que desempenham na vida, os
dados estão na Tabela 5 apresentada a seguir.
TABELA 5 – Papéis mais lembrados
f %
• Pai 10 100
• Profissional e líder 9 90
• Marido 8 80
• Amigo, companheiro 6 60
• Social (na comunidade) 5 50
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
Obs.: os dados da tabela excedem o número total da população por ser dado a eles mais de
uma opção de resposta.
Observamos que o papel de pai foi o mais lembrado, por 100%
da população, o que é coerente com o perfil da população pois todos têm
filhos e é um indicador positivo considerando que muitos pais biológicos não
se fazem realmente pais. Em segundo lugar aparece o papel profissional o
mais lembrado e em terceiro o papel de marido, reforçando a preocupação
com o equilíbrio entre trabalho e família. Estes foram ao parâmetros que a
97
maioria citou quando foi pedido a eles um conceito de qualidade de vida. Este
dado demonstra assim, coerência entre as respostas.
Esta preocupação parece ser atual e citaremos aqui a exemplo de
uma empresa, liderada pelo seu executivo número um a Marriot International,
rede de hotéis, cujo Projeto Paternidade incentiva a participação de seus
executivos na educação e na vida de seus filhos. J.W. Marriot definiu sua
decisão assim para a revista Forbes:
“Tenho quatro filhos e onze netos. A paternidade não é
uma questão de equilíbrio, mas sim de prioridade. A
paternidade é o trabalho número um, e não permito
que ninguém interfira. Temos muitas mulheres
trabalhando para nós, e elas nos diziam que tinham
muitos problemas em casa por não ter apoio suficiente
por parte dos maridos. Por esse motivo demos início ao
Projeto Paternidade em que oferecemos aos nossos
executivos workshops sobre educação de filhos, que
ajuda os pais a avaliarem seus relacionamentos e
participarem mais na vida dos filhos.” (in Hirschfeld,
2000, p. 218).
Para Hirschfeld (2000), os homens de negócios, para
sobreviverem profissionalmente têm que trabalhar cada vez mais arduamente,
mais horas e às vezes até mais longe, mesmo com toda tecnologia à
disposição. Reconhece que este aumento da carga, as ameaças constantes
pairando sobre suas cabeças, as viagens, os horários malucos e o estresse ,
tudo vale a pena porque fazem pelos seus filhos. Lembra também, que até os
anos 60, um bom pai de família desempenhava basicamente dois papéis: o de
provedor e o de disciplinador e que a mãe cuidava do resto.
98
O autor acima citado, relata o caso de Jeffrey Welch, um
executivo da área financeira, frustrado pela dificuldade em obter êxito no
trabalho e na tarefa de pai, em entrevista a Bussiness Week de outubro de
1998, cujo subtítulo é: “Os homens enfrentam maiores expectativas em casa,
mas o trabalho não lhes dá a folga de que precisam”. Relata ainda:
“Eu gostaria de participar mais das atividades
escolares ou ao ar livre, mas não consigo organizar
meu horário de modo a tornar isso possível. Abri mão
de tudo, exceto os exercícios no fim de semana... Quero
ser um pai que meus filhos lembrem daqui a trinta
anos, de ter sido parte importante de suas vidas. E,
nesse momento, não é o que estou fazendo.”
(Hirschfeld, 2000, p. 13).
Quanto às interferências do papel profissional nos outros papéis,
os entrevistados posicionam-se da seguinte maneira:
• 100% dos entrevistados reconhecem que o papel profissional interfere nos
outros papéis, alguns citam que esta interferência é positiva, outros, que é
negativa e a maioria reconhece que existe interferências tanto positivas
como negativas, como veremos na Tabela 6, apresentada abaixo.
TABELA 6 – Interferências do papel profissional f %
Positivas e negativas 4 40
Só positivas 3 30
Só negativas 2 20
Neutro (só disse que interferia, mas não especificou) 1 10
TOTAL: 10 100
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
99
O entrevistado E1, fala das interferências positivas e negativas
que o papel profissional exerce sobre os outros papéis, porém neste caso
especificamente, as interferências negativas pesaram mais pois pediu
demissão e foi trabalhar na concorrência. Diz que decepcionou-se com a
empresa ao descobrir que apesar de todo esforço e dedicação à empresa não
era reconhecido pela holding e tomou uma decisão de dedicar-se mais a
família e menos ao trabalho até encontrar a alternativa de demitir-se.
A Tabela 7, apresentada a seguir, mostra os percentuais de
satisfação/insatisfação em relação a distribuição de tempo para os diferentes
papéis que os entrevistados citam na pesquisa. Podemos inferir que os que
estão satisfeitos dificilmente alterarão algo na sua rotina pois a inquietação, a
insatisfação é um fator motivador para a mudança, enquanto os que não estão
satisfeitos provavelmente pensarão em algumas alternativas para mudanças.
TABELA 7 – Satisfação em relação a distribuição do tempo f %
Estão satisfeitos 5 50
Não estão satisfeitos 5 50
TOTAL: 10 100
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
Dois dos entrevistados que estão satisfeitos, mudaram
recentemente seu estilo de vida após refletirem sobre suas vidas e sobre a
equação trabalho/família. Chegaram à conclusão que deveriam dedicar-se
mais a família e às coisas que dão prazer em detrimento de horas envolvidas
com o trabalho e com a empresa. A empresa, por um lado, perdeu – em
quantidade mas não sabemos se a qualidade do envolvimento e dos resultados
melhoraram.
100
Dos que não estão satisfeitos, 80% pretendem dedicar mais
tempo à família, 60% gostariam de ter mais tempo exclusivo para si, 40%
pretendem dedicar-se à coisas que lhes dão prazer e 20% querem tempo para
fazer mais atividades físicas, conforme demonstra a Tabela abaixo:
TABELA 8 – Onde gostariam de dedicar mais do seu tempo
f %
. Família 04 80
. Lazer 03 60
. Exclusivo para mim 03 60
. Fazer coisas que dão prazer 02 40
. Atividades físicas 01 20
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
Obs: os dados da tabela excedem o número total da população por ser dado a eles mais de
uma opção de resposta
O futuro e o não preparo para o “não trabalho”
Considerando o sentido que o trabalho tem na sociedade atual,
acreditamos que os homens não estão preparados para o "não trabalho".
Questionados sobre esta questão obtivemos dos entrevistados a confirmação
dessa pressuposição.
Nenhum dos entrevistados admitiu estar preparado para o “não
trabalho”, apenas citaram ações para um futuro que parece ser remoto,
conforme a Tabela a seguir.
101
TABELA 9 – Preparação p/ o futuro (trabalho ou p/ o “não trabalho”) f %
. Estão se preparando para o futuro 07 70
. Não estão se preparando para o futuro 03 30
TOTAL: 10 100
Fonte: dados coletados pela autora durante a pesquisa
Para os que estão se preparando para o futuro, falam em
preparação psicológica. Falam também em ter reservas financeiras para terem
segurança material na ausência do emprego. Outros admitem que nunca vão
parar de trabalhar mesmo que seja em atividades não remuneradas ou negócio
próprio. Falam de trabalhar até morrer ou até não poderem mais o que
também é coerente com as respostas dadas sobre a importância do trabalho
em suas vidas:
“O trabalho para mim é tudo!” E2 e E9.
“Não dá para viver sem ele” E8.
“Só a família é mais importante” E10.
“Nem consigo ficar 15 dias de férias” E1.
“Nunca vou parar de trabalhar” E7.
“Não consigo ficar parado nem nos finais de
semana” E4.
Em suma, a pesquisa mostrou que o trabalho está interferindo na
102
qualidade de vida dos executivos, envolvendo-os a maior parte de seu tempo,
não permitindo, em muitos casos, que consigam equilibrar, de forma
satisfatória, o tempo entre carreira e vida pessoal.
103
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tomando como cenário a virada do século e o conjunto de
mudanças que o acompanha, o trabalho parece ser base fundamental para a
existência do homem, portanto suas interferências merecem um olhar
cuidadoso e crítico.
Os objetivos desta pesquisa, conhecer a relação entre trabalho e a
qualidade de vida de executivos na atualidade, segundo a ótica do equilíbrio
entre o trabalho e as demais atividades desempenhadas e identificar a relação
do papel profissional com outros papéis que são desempenhados foram
alcançados, na medida que os dados coletados proporcionaram um desvelar
da relação e das interferências do trabalho no estilo e na qualidade de vida da
população. Assim, foi possível com esta pesquisa aprofundarmos a reflexão
sobre o tema proposto.
A importância do trabalho foi enfaticamente citada bem como
suas interferências nos papéis desempenhados.
Mesmo em se tratando de empregados de uma empresa familiar,
líder de mercado e situada no interior do estado, ainda assim, estes trabalham
muitas horas seguidas e pudemos observar homens insatisfeitos em busca de
um equilíbrio melhor entre vida profissional e pessoal aspecto que era uma de
nossas inquietações que originaram este estudo.
Desta forma acreditamos ser necessário um olhar mais profundo
sobre a relação empresa/empregado no que tange às responsabilidades sobre a
104
qualidade de vida, que em parte é determinada pela empresa, cargo ou tipo de
negócio ao qual o trabalhador está inserido. Porém, parece que quem deve
escolher ou decidir em última instância, é cada um de nós nos diversos
momentos que a vida nos impõe optar. Optar por qual profissão ou carreira
seguiremos, pelo tamanho da família que teremos, por quanto investiremos no
corpo, mente e espírito, deve depender de opção, já que estas instâncias estão
intimamente ligadas à existência e muitas vezes são dimensões esquecidas
pelas lideranças administradoras das organizações.
Ainda hoje, algumas empresas adotam o modelo de gestão cuja
função de “cuidar das pessoas” fica a cargo do Departamento de Recursos
Humanos. Porém, numa visão mais contemporânea com uma nova realidade
bem mais competitiva, cabe a toda a liderança da empresa este papel de
defensor da competitividade e para tanto, num esforço conjunto de construir
organizações mais eficientes e não só confortáveis como sugere Ulrich
(1998).
Considerando que as lideranças das empresas imprimem seu
estilo nos rumos que dão aos negócios, e o modo como administram seus
setores, suas equipes e suas vidas, faz com que o modelo adotado seja
reproduzido. E esta pretende ser uma das contribuições deste trabalho, já que
o efeito cascata é inevitável, que seja em prol de uma vida com mais
qualidade para todos.
Como vimos, a área de recursos humanos está passando por grandes
mudanças. Nesse sentido, Guest e Hoque (1994) advertem que a
administração de Recursos Humanos deve estar ajustada às estratégias do
negócio, assim como as políticas de pessoal devem estar integradas entre si e
os valores dos gerentes de linha devem estar integrados e alinhados com a
filosofia de pessoal para assegurar que eles implementarão as políticas e
práticas de pessoal.
Exige-se muito mais do líder atual, que além de responsabilizar-
105
se pelo setor e resultados, é seu papel gerir também as pessoas pois são delas
que vem as idéias, as soluções e os resultados almejados. Para Vergara
(2000), a liderança que os novos tempos requerem, é um processo de
construção do ser, e essa construção é de responsabilidade de cada pessoa.
Quando ela opta por, simplesmente , viver sua vida, expressando-se com
plenitude e dignidade, suas ações ganham valor e aí sim ele torna-se um líder
legítimo.
Esta nova exigência nos faz refletir inclusive sobre a formação
dos administradores na atualidade. Cabe às escolas estarem conectadas a estes
conceitos e propiciar ao aluno uma formação mais voltada para as pessoas e
não só a finanças, processos, métodos, estruturas e tecnologia. A formação
destes novos profissionais, exige segundo Vergara (2000), auto-
conhecimento, compreensão de teorias da personalidade, motivação,
frustração, mecanismos de defesa, jogos de poder, intuição, funcionamento de
grupos, aprendizagem e formação de equipes. Esta reflexão nos transporta
para novas dimensões dos papéis da escola, dos gestores e dos negócios que
este novo século nos impõe.
Como a população pesquisada é de administradores, sendo 50%
por formação e 100% por função, cabe a estes profissionais o desafio de
administrarem seu tempo e criar espaços de maneira a conquistar uma
qualidade de vida melhor, mais equilibrada, mais saudável e mais plena. Que
este trabalho possa contribuir para tal, já que os dados desta pesquisa não
devem permanecer intactos nesta dissertação mas deverão ser centelhas para
novas reflexões e quem sabe novas posturas no trabalho e na vida e como
psicóloga e profissional de recursos humanos, possamos abrir frentes
contribuindo neste sentido junto a estas lideranças em busca de uma empresa
mais humanizada e mais feliz, o que é um dos desejos da Quimicam,
conforme política adotada e veiculada.
Para quem tem, então, o papel desafiador de gerir pessoas, é
106
necessário identificar a complexidade do mundo contemporâneo, o contexto
do ambiente de negócios e as habilidades que esse mundo requer do gestor; é
igualmente importante aceitar questões relativas à motivação, liderança, poder
e trabalho em equipe como essenciais à compreensão das pessoas e a sua
gestão; obter informações acerca de contribuições teóricas e apreciá-las
criticamente, em face das características do novo ambiente de negócios;
identificar novas tendências; estabelecer a ponte entre construções teóricas e
sua prática cotidiana; desenvolver competências gerenciais; desenvolver visão
holística; visão de totalidade.
Como vimos, os pressupostos que se constituíram em objeto de
estudo desta pesquisa, foram comprovados, conforme mostraram os dados da
pesquisa. Daí a necessidade de se abrir espaço para maiores reflexões e
possíveis tomadas de decisão no sentido de que todos na empresa possam ter
uma vida de melhor qualidade.
Recomendações
Presumimos ser interessante a discussão dos dados desta
pesquisa com a empresa em estudo e suas lideranças no sentido de primeiro
dar um retorno como forma de devolver a eles um pouco do que ofereceram e
também para juntos encontrarmos alternativas e soluções melhores para todos
os envolvidos.
Acreditamos ser necessário olharmos o homem como a razão de
ser dos negócios – dele e para ele. Cabe então a toda a liderança olhar para
que o funcionário tenha condições de ser uma pessoa inteira, desempenhando
todos os seus papéis em sua plenitude. Até porque, como resultado, teremos
profissionais mais capazes, mais produtivos e mais preparados para enfrentar
a competitividade que estamos vivendo no mundo contemporâneo e quem
sabe assim possam ser mais felizes!
Uma possibilidade é criar um grupo de qualidade de vida na
107
empresa envolvendo familiares e profissionais da equipe multidisciplinar que
os auxiliem neste objetivo de encontrar uma melhoria em suas vidas e quem
sabe para o futuro possam ser desenvolvidas novas pesquisas ou estudos que
envolvam a família, esposas e filhos para se ter dados mais completos de
maneira a compreender os reflexos do trabalho e do estilo de vida adotado
pelos executivos sobre os outros membros de suas famílias para quem sabe
juntos encontrarem alternativas mais saudáveis.
E o nosso desejo é que, talvez um dia, toda a humanidade
cansada de seus equívocos, possa conquistar uma melhor qualidade de vida ou
opte por viver a vida como ela é: simples, descomplicada, plena e divina.
E que esta centelha divina que existe dentro de cada um de nós
incendeie para nos aproximarmos do Criador, para compreendermos então,
que somos também criadores da nossa felicidade.
108
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ANEXO 1
ANEXO 2
Qualidadee Rec. Humanos
Gerênciade
Produção
Gerência de Materiais
Gerência ComercialCalçados
Diretoria
DesenvolvimentoBase Solvente
Gerência Comercial
Móveis
Gerência ComercialNovos Neg
Gerência Administr.Comercial
Gerência Comercial
Sul
SupervisãoProd.
Soluções
SupervisãoExpediçãoAlmoxarif.
SupervisãoManuten-
ção
SupervisãoProd.
Polímeros
SupervisãoVendas
SupervisãoAssist.Técnica
SupervisãoVendas
SupervisãoAssist.
Técnica
SupervisãoVendas
GerênciaAplicação
Não Solvente
Desenvolvimento Não Solvente
ORGANOGRAMA - QUIMICAM
Out./1998
AN
EX
O 3
ANEXO 4
ROTEIRO DA ENTREVISTA
I. Identificação do entrevistado: (o nome será mantido em sigilo)
Idade:
Escolaridade:
Tempo de empresa:
Carreira na empresa:
Estado Civil:
No de filhos:
II. Questões:
1. O que é qualidade de vida para você?
2. Fale sobre a importância do trabalho para você.
3. Você acha que o trabalho que exerce tem interferências na sua Qualidade
de Vida? Se sim, como?
4. Quais os papéis que você reconhece que desempenha na vida atualmente?
5. Como o papel profissional interfere nos outros papeis?
6. Quanto do seu tempo semanal você se dedica a (o) em horas:
Trabalho ( ) Esposa ( ) Filhos ( ) Lazer ( ) Sono ( )
Atividade física ( ) Estudar ( ) Tempo livre (Ócio) ( )
Espiritualidade ( ) Outros, quais? .........................................
7. Você está satisfeito com esta distribuição? Se não, o que pretende fazer?
8. Você tem se preparado para o futuro (mudanças no tipo de contrato ou
aposentadoria)? Como?
9. Você acha que ter qualidade de vida é uma questão de escolha?