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LETRAS CLÁSSICAS, n. 4, p. 63-76, 2000. ARISTÓTELES E SEUS PRECURSORES. PARA UMA ARQUEOLOGIA DO DISCURSO DELIBERATIVO LAURENT PERNOT* Université de Strasbourg II (Strasbourg, França) RESUMO: Estudam-se aqui as origens da classificação dos gêneros de dis- curso (gênero deliberativo, gênero judiciário, gênero epidítico) tal como a apre- senta Aristóteles na Retórica, e particularmente o que concerne à definição do gênero deliberativo em relação aos outros gêneros. Para esse fim são exami- nados textos de Tucídides, Platão, Isócrates e da Retórica a Alexandre, nos quais aparecem classificações e critérios que prefiguram os de Aristóteles. Essa investigação permite reconstituir o contexto intelectual da Retórica e compreender melhor a maneira como Aristóteles trabalhou para compor esse tratado, operando uma sistematização a partir de noções e de problemas preexistentes. PALAVRAS-CHAVE: gêneros de discurso; gênero deliberativo; Retórica de Aristóteles. Aristóteles, na Retórica, conceptualizou a deliberação, apresentando-a sob o nome de “gênero deliberativo” (sumbouleutiko\ n ge/ noj), como uma classe de dis- cursos retóricos, distinta das outras classes e definida por características técnicas. Nas páginas que seguem, trata-se, a partir do texto aristotélico, de remontar no tempo e de localizar os afloramentos de uma conceptualização análoga à de Aristóteles em textos anteriores a este. O objetivo desta pequena investigação não é procurar fontes, mas tentar compreender como Aristóteles trabalhou na Retórica, como ele construiu uma classificação nova sobre a base de elementos que preexistiam no pensamento grego dos Vº-IVº séculos a. C. Tentaremos fazer de certo modo uma arqueologia da conceptualização aristotélica. Dada a dimensão deste artigo, a investigação será limitada e terá por objeto somente uma seleção de textos que apresentam uma relação com a retórica e que

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    ARISTTELES E SEUS PRECURSORES.PARA UMA ARQUEOLOGIA DO DISCURSO

    DELIBERATIVO

    LAURENT PERNOT*Universit de Strasbourg II

    (Strasbourg, Frana)

    RESUMO: Estudam-se aqui as origens da classificao dos gneros de dis-curso (gnero deliberativo, gnero judicirio, gnero epidtico) tal como a apre-senta Aristteles na Retrica, e particularmente o que concerne definiodo gnero deliberativo em relao aos outros gneros. Para esse fim so exami-nados textos de Tucdides, Plato, Iscrates e da Retrica a Alexandre, nosquais aparecem classificaes e critrios que prefiguram os de Aristteles.Essa investigao permite reconstituir o contexto intelectual da Retrica ecompreender melhor a maneira como Aristteles trabalhou para compor essetratado, operando uma sistematizao a partir de noes e de problemaspreexistentes.PALAVRAS-CHAVE: gneros de discurso; gnero deliberativo; Retricade Aristteles.

    Aristteles, na Retrica, conceptualizou a deliberao, apresentando-a sob onome de gnero deliberativo (sumbouleutiko\n ge/noj), como uma classe de dis-cursos retricos, distinta das outras classes e definida por caractersticas tcnicas. Naspginas que seguem, trata-se, a partir do texto aristotlico, de remontar no tempo e delocalizar os afloramentos de uma conceptualizao anloga de Aristteles em textosanteriores a este. O objetivo desta pequena investigao no procurar fontes, mastentar compreender como Aristteles trabalhou na Retrica, como ele construiu umaclassificao nova sobre a base de elementos que preexistiam no pensamento gregodos V-IV sculos a. C. Tentaremos fazer de certo modo uma arqueologia daconceptualizao aristotlica.

    Dada a dimenso deste artigo, a investigao ser limitada e ter por objetosomente uma seleo de textos que apresentam uma relao com a retrica e que

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    datam do fim do V e do IV sculo, concentrao que apresenta a vantagem deconstituir um corpus coerente e prximo, intelectualmente e cronologicamente, daRetrica de Aristteles. No esqueamos, para tanto, que a deliberao foi analisadatambm, entre outras, nas obras dos poetas (picos, trgicos, cmicos) e nas obrasfilosficas (por exemplo, por Aristteles mesmo na tica a Nicmaco, III, 5, e VI, 10),e que ela foi uma prtica poltica e institucional amplamente difundida. A dificuldadede pensar retoricamente a deliberao, para Aristteles como para seus precursores,consistia precisamente em reduzir a uma anlise simples um fenmeno onipresente,multiforme e j abundantemente discutido.

    Aristteles

    Admite-se geralmente que a Retrica foi composta no curso do segundo terodo IV sculo. No incio do tratado (I, 3), Aristteles traa uma diviso dos discursosretricos em trs gneros: o deliberativo, o judicirio, o epidtico. Cada um dessesgneros definido por uma srie de critrios: o ouvinte ao qual ele se dirige, seu con-tedo, o tempo que ele tem em vista, o seu fim. Mais adiante (III, 12) acrescentadauma definio segundo o estilo. Procedendo por raciocnios e afirmaes, Aristtelesconstri um sistema tripartite, acompanhado de uma terminologia, com tal rigor que aclassificao pode ser resumida por um quadro (cf. infra).

    Esse sistema, muito ambicioso, j que reduz somente a trs categorias todos osdiscursos possveis, veio a conhecer um imenso sucesso e a servir de referncia universalpara a classificao dos gneros oratrios durante a Antigidade. Ora, da maneira comoAristteles a apresenta, a classificao aparece como dada logo primeira, sem refern-cia a nenhuma doutrina anterior sobre a questo. O autor expe o seu pensamento comofilsofo, em nome de uma anlise terica das condies da persuaso, tal como esta seexerce no quadro dos usos e das instituies. Poder-se-ia ter, pois, a impresso, ao ler aRetrica, de que a tripartio dos gneros uma inovao radical, nascida inteiramentearmada da cabea do Estagirita. Nossa hiptese de que as coisas no se passaram assim o que no diminui de modo algum o mrito de Aristteles e de que o quadro aristotlicohavia sido preparado pelas reflexes de pensadores anteriores.

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    Tucdides

    No livro III de Tucdides, a clebre antilogia que ope Cleo e Didoto apresentaum grande interesse no somente para a histria das idias polticas e para a histriasimplesmente, mas tambm para a histria da retrica. Em 427 a. C., aps uma pri-meira assemblia que havia decidido castigar duramente os mitilenenses, culpados dese terem rebelado contra a dominao ateniense, a questo foi reexaminada no diaseguinte numa segunda assemblia, durante a qual Cleo se pronunciou pela manu-teno do castigo decidido, Didoto, ao contrrio, por um abrandamento da pena.Didoto venceu e os atenienses enviaram logo a Mitilene uma trirreme para anular aordem de condenao morte notificada na vspera. Esse episdio constitui, ao ver deTucdides, a matria de uma reflexo implcita sobre o que deve ser a deliberaopoltica. O processo de Mitilene oferece o exemplo de uma deliberao pervertida, quese ope particularmente ao exemplo de boa deliberao, esclarecida por bonsconselheiros, que dado no livro I, 139-145, por ocasio do debate, conduzido porPricles, sobre a resposta a dar ao ultimato espartano.

    No caso do debate sobre Mitilene, em lugar de vermos jogar somente os meca-nismos da inteligncia e da previdncia (gnw/mh, pro/noia), assistimos a umdesencadeamento de paixes: clera, ardor durante a primeira assemblia (36, 2:o)rgh/, o(rmh/), depois arrependimento a partir do dia seguinte (36, 4: meta/noia).Exercem-se influncias exteriores, com as presses dos embaixadores mitilenenses edos seus partidrios atenienses. Enfim o resultado mesmo do debate submetido ao

    papel do ouvinte(a)kroath/j)

    contedo tempoconsiderado(xro/noj)

    fim(te/loj)

    estilo(le/cij)

    gnero deliberativo(sumbouleutiko\nge/noj)

    chamado para decidir;por exemplo, membroda Assemblia(krith/j, oi(=one)kklhsiasth/j)

    exortao /dissuaso(protroph/ /a)potroph/)em carterprivado ou emcarter pblico(i)di/# / koin$=)

    futuro(me/llwn)

    til / nocivo(sumfe/ron /blabero/n)

    estilo dosdebates(a)gwnistikh/)

    gnero judicirio(dikaniko\n ge/noj)

    chamado para decidir;por exemplo, membrodo tribunal(krith/j, oi(=ondikasth/j)

    acusao /defesa(kathgori/a /a)pologi/a)

    passado(geno/menoj)

    justo / injusto(di/kaion /a)/dikon)

    estilo dosdebates(a)gwnistikh/)

    gnero epidtico(e)pideiktiko\nge/noj)

    espectador(qewro/j)

    elogio / censura(e)/painoj /yo/goj)

    propriamente opresente(kuriw/tatoj o(parw/n)

    belo / feio(kalo/n /ai)sxro/n)

    estilo doescrito(grafikh/)

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    acaso (49, 4: tu/xh), pois o segundo navio, portador da contra-ordem, deveu au-sncia de vento contrrio a possibilidade de compensar o seu atraso sobre o primeiro ede chegar antes que a ordem de condenao morte tivesse comeado a ser executa-da. Tudo acabou como devia, no sentido de que a segunda deciso pde ser aplicada;Atenas (e Mitilene) haviam somente roado a catstrofe; mas se a haviam roado, porque a deliberao havia sido mal conduzida.

    Ora, a essa demonstrao implcita se acrescentam reflexes explcitas, conti-das nas palavras de Cleo e de Didoto diante da segunda assemblia. Os oradorescomentam o debate do qual participam e definem a direo que deve tomar segundoeles a deliberao, empenhando-se em distinguir o discurso deliberativo das formasoratrias concorrentes.

    Cleo ope a verdadeira deliberao a uma prtica ateniense que no senoum simulacro de deliberao: um debate (a)gw/n), mas para exibio, no qual os ouvin-tes so espectadores de palavras (qeatai\ tw=n lo/gwn),

    a(plw=j te a)koh=j h(don$= h(ssw/menoi kai\ sofistw=n qeatai=je)oiko/tej kaqhme/noij ma=llon h)\ peri\ po/lewj bouleuome/noij(III, 38, 7)

    numa palavra, pessoas dominadas pelo prazer de escutar, semelhantes aum pblico posto l mais para o espetculo de sofistas do que comocidados que deliberam sobre a sua cidade.

    Seguramente, essas palavras so perfeitamente cnicas e relevam de uma ttica decircunstncia. Descontente de ver ser recolocada na ordem do dia uma questo jresolvida, Cleo critica as deliberaes atenienses em geral, porque no queria queessa deliberao particular acontecesse; e ele no hesita em formular suas censurascontra os sofistas em um estilo eminentemente sofstico, de maneira a utilizar emproveito prprio a arte de agradar que ele repreende nos outros. Entretanto, paraalm dos mveis circunstanciais do demagogo, a opinio expressa importante. Cleodenuncia a irresponsabilidade popular, que transforma o debate poltico em exibiosofstica. Ele denuncia a poltica-espetculo, por assim dizer, e para esse fim ope odiscurso deliberativo ao discurso sofstico, tomando como critrio principal o papeldo ouvinte, que num caso delibera (bouleu/esqai) e no outro espectador(qeath/j).

    Didoto, de sua parte, ope deliberao e julgamento, para indicar que o deba-te em curso no deve tomar a forma de um debate judicirio. Operando uma espcie

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    de sobrelano no realismo, em relao ao discurso de Cleo, Didoto quer ter em vistaapenas a utilidade, com excluso de qualquer outra considerao. No se trata, pois,de julgar os mitilenenses em nome do direito, mas de tomar um partido vantajoso a seurespeito. Com uma formidvel insistncia de vocabulrio, Didoto sublinha que osdebates judicirios tm como objeto o justo e o injusto, os crimes (a)diki/a, a)dikei=n),ao passo que a presente deliberao deve ter em vista a utilidade (cumfe/ron):

    (Hmei=j de\ ou) dikazo/meqa pro\j au)tou/j, w(/ste tw=n dikai/wndei=n, a)lla\ bouleuo/meqa peri\ au)tw=n, o(/pwj xrhsi/mwje(/cousin (III, 44, 4)

    Ns no movemos um processo contra eles, e no nos importamos comargumentos de direito: ns deliberamos sobre eles, querendo que elesnos sejam teis.

    Quando atentamos para as duas passagens, vemos, ento, a deliberao se opor,de um lado, ao discurso dos sofistas, de outro, ao debate judicirio. Mesmo se os doisoradores se afrontam e rivalizam, a antilogia tomada em seu conjunto sugere umatripartio coerente, e essa tripartio evoca fortemente a tripartio aristotlica dosgneros de discurso, ainda mais que ela se apia sobre critrios (papel do ouvinte, fimdo discurso) e sobre uma terminologia que se reencontram em Aristteles. Certamen-te, as duas classificaes no coincidem exatamente: em particular, o discurso sofsticoconsiderado por Cleo corresponde apenas parcialmente ao gnero epidtico deAristteles, pois faltam na definio de Cleo as noes de elogio e de censura que soessenciais para Aristteles. No entanto impressionante a semelhana nas grandeslinhas.

    Como apreciar essa constatao? preciso nos preservarmos do raciocnioanacrnico que revestiria com o esquema aristotlico o texto de Tucdides. De fato,no se trata de compreender os textos tucididianos por meio de Aristteles, mas, aocontrrio, de compreender Aristteles por meio dos textos tucididianos. Pode-se, apartir da, concluir que o sistema aristotlico teve prdromos e que a idia de umaclassificao dos gneros oratrios, tendente a uma tripartio, em funo de diferen-tes critrios, existia em Atenas desde a poca de Tucdides, mesmo se se tratasse ento,certamente, apenas de uma classificao entre outras. A data de referncia imposs-vel de fixar: talvez 427, se tais discursos foram efetivamente realizados por Cleo eDidoto, ou ento a virada do V e do IV sculo, se foram introduzidos por Tucdidesna sua reescritura dos discursos.

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    Plato

    Numerosos so os textos de Plato que propem divises das formas de discur-sos, da mesma maneira que, noutros lugares, o filsofo esboa, por exemplo, divisesdas formas poticas. Como justamente observou A. Hellwig, Plato, nesse caso, noprocura preparar classificaes exaustivas, mas se contenta em distinguir os elementosteis para a sua demonstrao do momento. Entre esses esboos de taxinomia, umexcerto do Fedro merece ser examinado em relao com o sistema aristotlico.

    Na parte final do dilogo, dedicada s relaes entre retrica e filosofia, Scratesprope uma definio da retrica:

    )=Ar )ou)=n to\ me\n o(/lon h( r(htorikh\ a)\n ei)/h te/xnh yuxagogi/atij dia\ lo/gwn, ou) mo/non e)n dikasthri/oij kai\ o(/soi a)/lloidhmo/sioi su/llogoi, a)lla\ kai\ e)n i)di/oij [...]; (261 a)

    No seria a retrica em geral uma psicagogia uma arte de conduzir asalmas que se exerce pela palavra, no somente nos tribunais e em todasas outras assemblias pblicas, mas ainda nas reunies privadas [...]?

    Nessa definio, o gnero judicirio est bem isolado, ao passo que as outras situaesde fala esto reunidas, sem especificao, sob a qualificao de assemblias pblicas,o que pode incluir tanto os discursos dirigidos Assemblia e ao Conselho quanto osdiscursos fnebres pronunciados no Cermico. Mas o interesse particular desse textoest em que ele introduz, ao lado das alocues pblicas, discursos pronunciados numespao privado.

    Scrates postula uma unidade fundamental da retrica e afirma que esta per-manece fundamentalmente a mesma, que ela se exerce em carter privado ou pblico,ou ainda (isso acrescentado nas linhas seguintes) que ela tem como objeto pequenosou grandes assuntos, assuntos srios ou assuntos fteis. Quintiliano, leitor atento dePlato, viu bem qual era o acento da passagem:

    In Phaedro palam non in iudiciis modo et contionibus, sed in rebus etiampriuatis ac domesticis rhetoricen esse demonstrat (Instituio oratria, II,21, 4)

    No Fedro, ele [Scrates] mostra abertamente que a retrica no inter-vm somente no tribunal e nas assemblias, mas tambm nos processosprivados e domsticos.

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    Pode-se, ento, estabelecer uma aproximao entre o texto platnico e as passagensem que Aristteles indica, a propsito do gnero deliberativo, que a retrica se dirigequer a um pblico coletivo, quer a um nico ouvinte.

    Essa aproximao completada por um outro tema, que aparece na respostade Fedro a Scrates:

    Ma/lista me/n pwj peri\ ta\ j di/kaj le/getai/ te kai\gra/fetai te/xn$: le/getai de\ kai\ peri\ dhmhgori/aj: e)pi\ple/on de\ ou)k a)kh/koa (261 b)

    sobretudo nos processos que a fala e o escrito se fundam numa arte;entretanto, fala-se tambm nas assemblias do povo. Mas eu no ouvidizer que essa arte se estendesse mais longe.

    Graas a essa rplica, a classificao dos discursos se enriquece com um critrio suple-mentar: o uso do oral ou do escrito. Para Fedro, a demegoria se define como discursooral, ao passo que o discurso judicirio oral ou escrito. Ora, Aristteles utiliza essemesmo critrio no livro III da Retrica (captulo 12). Aparentemente, a aplicao docritrio no a mesma nos dois casos, j que em Plato o escrito mencionado apropsito do gnero judicirio, ao passo que no sistema aristotlico o epidtico que do domnio do escrito, competindo o deliberativo e o judicirio ao estilo dos debates.Entretanto, se examinamos o texto aristotlico mais de perto, percebemos que o autortraa uma gradao nuanada entre o estilo das demegorias, que pertence puramenteao debate, e o estilo judicirio, que admite mais exatido (a)kri/beia) e se aproximado estilo escrito. A concordncia entre Plato e Aristteles, sobre esse ponto, vai, pois,mais longe do que parece primeira vista. De resto, essas indicaes esto em confor-midade com as realidades materiais e institucionais da Atenas clssica, na qual osdiscursos de assemblia foram rara e tardiamente submetidos escrita, ao passo que osdiscursos judicirios, seria apenas por causa da prtica da logografia, necessitavammais freqentemente da redao de um texto.

    Fedro precisa que o que ele a relata, ele ouviu dizer (a)kh/koa). Ele se referea doutrinas existentes, s Artes de retrica (Te/xnai) do fim do V e do incio do IVsculo, tais como so descritas um pouco mais adiante no dilogo (266 d 267 d). Asindicaes de Plato no so pura inveno, mas se apiam sobre pesquisas de retorese de sofistas, pesquisas que Tucdides, pode-se suspeitar, tambm conhecia, e queAristteles, autor da Compilao das Artes (Sunagwgh\ Te/xnwn), no ignorar.Uma arqueologia da Retrica de Aristteles deve levar em conta a existncia dessasTe/xnai hoje desaparecidas.

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    Se o texto do Fedro no isola o gnero deliberativo como tal, ele utiliza,ento, critrios e enuncia distines que se reencontram em Aristteles a propsito datripartio dos gneros e do gnero deliberativo em particular (e que no so os mes-mos critrios e distines que figuram em Tucdides). Ainda aqui, pode-se falar depreparao e de prdromos da sistematizao aristotlica. Ainda aqui, a datao incerta, pois varia conforme relacionamos os discursos realizados data dramtica dodilogo (418-416 a. C.) ou sua data de composio (por volta de 370 a. C.).

    A convergncia entre Plato e Aristteles ainda mais significativa diantedo fato de que, sob outro aspecto, a passagem platnica obedece a objetivos especfi-cos, ligados problemtica mesma do Fedro: a saber, a reivindicao da conversa priva-da (e portanto do dilogo) em benefcio da verdadeira retrica e a reflexo sobreoralidade e escrita. A classificao dos gneros de discurso como um substrato retricono mtodo filosfico do Fedro.

    Iscrates

    Durante uma longa vida dedicada eloqncia, Iscrates efetuou uma espciede percurso atravs das formas retricas, definindo sucessivamente diferentes catego-rias de discurso e posicionando-se em relao a elas. A histria desse percurso, que foicomplexo, est por escrever. Seria uma contribuio considervel para o conhecimen-to, no somente do pensamento de Iscrates, mas ainda da histria da retrica no IVsculo. Contentemo-nos aqui em marcar algumas balizas.

    Aps haver praticado a eloqncia judiciria, Iscrates a abandonou em pro-veito dos grandes temas helnicos e polticos. Ele explicou, no Panegrico, uma formaoratria que consistia em conselhos baseados no elogio e formulados num estilo rebus-cado. Paralelamente prova suplementar de seu interesse pela teoria dos gnerosretricos , traou uma demarcao entre elogio e apologia (Elogio de Helena) e intro-duziu o elogio de contemporneo em prosa (Evgoras). Enfim, no ltimo perodo desua vida, defendeu uma nova concepo do conselho, que tendia a desligar este doelogio, da epideixis e do belo estilo, em nome da eficcia, e que pela mesma razoprivilegiava o conselho endereado a um destinatrio nico, a um soberano, por exem-plo, de preferncia ao conselho endereado ao povo. A oposio entre este conselhopuro, sbrio e individualizado e o conselho encomistico, ornado e coletivo de outrora resumida pela diferena que separa o Felipe do Panegrico. Fazendo ressaltar os planosda deliberao poltica tradicional, concebida como a desenrolar-se numa assemblia,Iscrates havia outrora, poca do Panegrico, proposto um debate ampliado, tencio-

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    nando agir sobre a opinio; presentemente, com o Felipe, ele propunha um debaterestrito, querendo fazer-se o conselheiro do prncipe. Nesta ltima etapa, Iscratesisolou o conselho com uma nitidez que faz eco definio aristotlica do gnerodeliberativo.

    Essa evoluo pode ter sido determinada, entre outras, pelas crticas que ti-nham sido formuladas contra o Panegrico, para censur-lo como um discurso intil eque valia unicamente pela forma. Essas crticas no foram conservadas: ainda aqui, hque se tomar conscincia da existncia de balizas perdidas na reflexo sobre os gnerosoratrios.

    Menos conhecida que o Felipe, e anterior a ele em dez anos, mas igualmentereveladora, uma passagem da Carta IX, A Arquidamo (356 a. C.), que apresenta amesma doutrina. Endereando-se a Arquidamo, Iscrates indica que seria fcil louv-lo, a ele e a seus antepassados e, dizendo isso, faz-lhe um cumprimento no despro-vido de elegncia. Mas, prossegue, tal no o caminho que ele escolheu nessa carta:

    Ka)kei=no gignw/skwn, prw=ton me\n o(/ti r(#=o/n e)sti peri\ tw=ngegenhme/nwn eu)po/rwj e)pidramei=n h)\ peri\ tw=n mello/ntwnnou=n e)xo/ntwj ei)pei=n, e)/peiq ) o(/ti pa/ntej a)/nqrwpoi plei/wxa/ rin e)/xousi toi=j e)painou=sin h)\ toi=j sumbouleu/ousin, [...]a)ll ) o(/mwj [...] h(gou/menoj dei=n tou\j e)pieikei/aj kai\ fronh/sewja)mfisbhtou/ntaj mh\ tou\j r(#/stouj proairei=sqai tw=n lo/gwn,a)lla\ tou\j e)rgwdesta/touj, mhde\ tou\j h(di/stouj toi=ja)kou/ousin, a)ll ) e)c w(=n w)felh/sousin kai\ ta\j po/leij ta\jau(tw=n kai\ tou\j a)/llouj (/Ellhnaj ( 6-7)

    Eu reconhecia, antes de mais nada, que mais fcil expor abundante-mente o passado que falar razoavelmente do futuro, e, depois, que todoo mundo sabe melhor graas aos autores de elogios que aos distribuido-res de conselhos [...]; no entanto, a meu ver, aqueles que pretendempossuir qualidades morais e inteligncia, devem escolher, no os discur-sos mais fceis, seno que os mais dificultosos, no os mais agradveisaos ouvintes, mas aqueles pelos quais eles prestaro servio sua ptriae ao resto da Grcia.

    Nesse texto, o conselho se ope ao elogio como a dificuldade facilidade, a utilidadeao prazer, o futuro ao passado. As idias e a terminologia podem ser aproximadasdaquelas de Aristteles.

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    Mais prxima ainda da Retrica de Aristteles uma frase do Sobre a paz,datada igualmente de 356 a. C., em que se reencontram exatamente trs termos queserviro para designar os trs gneros:

    )Ana/gkh de\ to\n e) /cw tw=n ei)qisme/nwn e)pixeirou=ntadhmhgorei=n [...] ta\ me\n a)namnh=sai, tw=n de\ kathgorh=sai,ta\ d ) e)paine/sai, peri\ de\ tw=n sumbouleu/sai ( 27)

    Necessariamente, quem tenta falar ao povo numa linguagem fora deseus hbitos [...] deve [...] ora lembrar as coisas, ora acusar, ora louvar,ora aconselhar.

    A tripartio aqui muito clara, com a reserva, todavia, de que um quarto elementoest presente a mais (a recordao, a)namnh=sai), e, sobretudo, de que os elemen-tos enumerados no constituem gneros de discurso, mas formas internas ao discurso.

    A Retrica a Alexandre

    Assinalaremos enfim, sem poder examin-lo em detalhe, o tratado pseudo-aristotlico intitulado Retrica a Alexandre, que apresenta um sistema estreitamentesemelhante ao da Retrica de Aristteles:

    Tri/a ge/nh tw=n politikw=n ei)si lo/gwn, to\ me\n dhmhgoriko/n,to\ de\ e)pideiktiko/n, to\ de\ dikaniko/n. Ei)/dh de\ tou/twn e(pta/, protreptiko/n, a)potreptiko/n, e)gkwmiastiko/n, yektiko/n, kathgoriko/n, a)pologiko\n kai\ e)cetastiko/n, h)\ au)to\ kaq) au(to\ h)\ pro\j a)/llo. Ta\ me\n ou)=n ei)/dh tw=n lo/gwn tosau=taa)riqm%= e)sti, xrhso/meqa de\ au)toi=j e)/n te tai=j koinai=jdhmhgori/aij kai\ tai=j peri\ ta\ sumbo/laia dikaiologi/aijkai\ tai=j i)di/aij o(mili/aij. [...] Kai\ prw=ton me\n ta\ jprotropa\j kai\ a)potropa/j, e)pei/per e)n tai=j i)di/aijo(mili/aij kai\ tai=j koinai=j dhmhgori/aij e)n toi=j ma/listaau)tw=n xrh=si/j e)sti, die/lqwmen (1, 1-2)

    H trs gneros de discursos polticos: o demegrico, o epidtico, o judi-cirio. Suas espcies so sete: exortao, dissuaso, elogio, censura, acu-sao, defesa e exame, seja por si mesmo, seja referido a uma outraespcie. A est, pois, o nmero das espcies de discursos: empreg-los-

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    emos nas demegorias pblicas, nos discursos em justia relativos aoscontratos e nas conversas privadas. [...] E tratemos, primeiramente, dasexortaes e dissuases, j que o seu emprego dos mais freqentes nasconversas privadas e nas demegorias pblicas.

    A conformidade com a doutrina aristotlica estreita, tanto para a definio dos trsgneros quanto para a incluso de uma forma privada na definio do conselho. Todaa dificuldade saber como interpretar essa conformidade. Os eruditos estimaram oraque a Retrica a Alexandre era anterior Retrica de Aristteles, ora que lhe era poste-rior, ora que a composio das duas obras, mais ou menos estendida no tempo, haviaacontecido durante um mesmo perodo; ora que a Retrica a Alexandre havia sidoinfluenciada pela Retrica, ora que era independente dela, e at que podia ter havido ainfluncias recprocas. O texto mesmo que nos interessa foi suspeitado pelos editores,que pensaram que ele havia sido alinhado ao de Aristteles e que era preciso, parareencontrar o estado original, seja atetizar toda referncia aos trs gneros e conservarapenas a lista de sete espcies (Fuhrmann), seja atetizar a meno do gnero epidticoe corrigir tri/a em du/o a fim de conservar apenas dois gneros (Spengel).

    Sobre a classificao dos gneros, a Retrica a Alexandre levanta mais questesdo que resolve. Fora mant-la margem da investigao, malgrado a tenhamos,porque ela autoriza concluses contraditrias segundo a maneira como a interpreta-mos e eventualmente como a corrigimos.

    O problema colocado pela Retrica a Alexandre e o desaparecimento de nume-rosos textos devem incitar prudncia. No se pode afirmar, como F. Solmsen fezantigamente sem prova coerciva, que a tripartio dos gneros existia antes de Aristtelese que este nada fez seno imp-la com sua autoridade. Mas nos preservaremos igual-mente de acreditar, como o caso de numerosos intrpretes, que Aristteles inventouessa tripartio inteiramente.

    De fato, os textos que examinamos sugerem uma concluso diferente. Elesconvidam a deixar de lado, como simplista, a pesquisa de um primeiro inventor, e aexaminar antes a maneira como Aristteles trabalhou. Percebemos, ento, queAristteles operou ao mesmo tempo uma sntese e uma sistematizao, propondo umareclassificao das noes e dos critrios que haviam sido debatidos em Atenas duran-te pelo menos duas geraes. Para compreender bem a Retrica, necessrio reconstituiresse contexto intelectual, de que a exposio do Estagirita, ao contrrio, faz maisfreqentemente abstrao.

    Essa concluso particular conduz a implicaes metodolgicas mais amplas.Ela mostra que a Retrica de Aristteles era um resultado tanto como uma criao, e,

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    para alm de Aristteles, que a teoria retrica do meio e do fim do IV sculo, longe deconstituir uma novidade radical, inscrevia-se num processo de elaborao gradual enum sistema de ecos e de debates que remontava ao incio do IV sculo e muitoprovavelmente j ao fim do V. Para quem se interroga sobre o desenvolvimento daretrica grega, o exemplo do gnero deliberativo esclarecedor. Ele mostra que asnoes de inveno e de inovao no do conta de todos os aspectos, que no con-vm exagerar a parte das rupturas e que preciso procurar, a cada momento, retraaro encaminhamento dos problemas, em sua continuidade e complexidade: numa pala-vra, que convm considerar a retrica na sua plena evoluo histrica.

    Traduo integral

    MARCELO VIEIRA FERNANDES**Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas

    da Universidade de So Paulo

    NOTAS

    * Professor Doutor de Lngua e Literatura Grega da Universit de Strasbourg II e Diretordo Instituto de Grego Marc Bloch.

    ** Mestrando em Latim do Programa de Ps-Graduao em Letras Clssicas da FFLCH-USP.

    1 Ver a esse respeito F. RUZE, Dlibration et pouvoir dans la cit grecque de Nestor Socrate,Paris, 1997. Salvo meno contrria, remetemos, para os diferentes autores antigos,ao texto e traduo (ligeiramente modificada em certos pontos) da Collection desUniversits de France. A questo que nos interessa aqui no tratada nas dissertaesclssicas de J. KLEK, Symbuleutici qui dicitur sermonis historia critica, Kirchhain N.-L.,1919; I. BECK, Untersuchungen zur Theorie des Genos symbuleutikon, Hambourg, 1970.

    2 Ver G. A. KENNEDY, Aristotle On Rhetoric, New York Oxford, 1991, Apndice II A, p.299-305.

    3 Podemos deixar de lado os assuntos, lugares, planos e tipos de argumentos prprios acada gnero, dos quais Aristteles faz o exame detalhado na seqncia do tratado.

    4 Uma anlise esclarecedora desse captulo complexo foi apresentada recentemente porM. S. CELENTANO, Oralit, scrittura e modalit espressive (Aristotele, Rhetorica, III,12), comunicao no seminrio Pour une nouvelle traduction de la Rhtorique dAristote,Paris, E.N.S., 19 de maio de 2000 (a publicar).

    5 Cf. L. PERNOT, La rhtorique de lloge dans le monde grco-romain, Paris, 1993, p. 25-42.

  • LETRAS CLSSICAS, n. 4, p. 63-76, 2000.

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    6 Ver em geral F. FRAZIER, Runion et dlibration. La reprsentation des assembleschez Thucydide, Ktma, 22, 1997, p. 239-255.

    7 Uma idia semelhante aparecer em DEMSTENES, Prlogos, 33 (34), 2. Ver tambmEmbaixada, 217; Coroa, 226.

    8 H igualmente diferenas no que concerne ao critrio do tempo que cada tipo de discursotem em vista.

    9 Ver, para as formas de discurso, Grgias, 452 d-e; Repblica, II, 365 d; Sofista, 222 c-d. Aalgumas passagens do Fedro e do Sofista possvel aproximar ALCIDAMANTE, Sobre osdiscursos escritos, 9-10.

    10 Untersuchungen zur Theorie der Rhetorik bei Platon und Aristoteles (Hypomnemata, 38),Gttingen, 1973, p. 116.

    11 Sobre a retrica no Fedro, ver, entre uma abundante bibliografia, vrios artigos no importantevolume Understanding the Phaedrus (Proceedings of the Second Symposium Platonicum),ed. L. ROSSETTI, Sankt Augustin, 1992.

    12 Retrica, I, 3, 1358 b 9-10: Tanto aqueles que do um conselho em prol dum interesseparticular quanto aqueles que discursam para povo em prol dum interesse comum (kai\oi( i)di/# sumbouleu/ontej kai\ oi( koin$= dhmhgorou=ntej); II, 18, 1391 b 8ss.Sobre os problemas colocados pelas categorias do privado e da conversa em retrica(i)/dioj, o(mili/a, prosomilhtikh/), ver as atas da mesa-redonda Rhtoriques de laconversation, ed. L. PERNOT, Rhetorica, 11, 1993, n. 4 (p. 428-429 para os nossoscomentrios sobre os textos de Plato).

    13 Retrica, III, 12, 1414 a 8-19.

    14 Para essas datas, ver L. BRISSON, Platon, Phdre, Paris, 1989, p. 32-34.

    15 Sobre esse percurso de Iscrates, ver principalmente Elogio de Helena, 14-15; Panegrico, 1-18, 187-189; Evgoras, 5-11; Felipe, 1-18, 27-28; Panatenaico, 1-4, 263, 271; Cartas, I, 6; II,1-2; VI, 6.

    16 Cf. Troca, 62; Felipe, 4.

    17 Levando em conta as presentes observaes sobre a classificao dos gneros, importante,nessa passagem, traduzir kathgorhsai por acusar (termo judicirio), e no por censurar[N.T.: blmer], como fez G. Mathieu na Collection des Universits de France (C.U.F.).

    18 Texto de M. FUHRMANN, Anaximenis ars rhetorica quae vulgo fertur Aristotelis ad Alexandrum(Bibliotheca Teubneriana), Leipzig, 1966; a traduo nossa.

    19 Para essas atteses, ver o prefcio da ed. FUHRMANN, p. XL-XLI.

    20 The Aristotelian Tradition in Ancient Rhetoric, AJPh, 62 (1941), p. 42-43 e 180-181.Solmsen baseava-se particularmente em Digenes Larcio, III, 93, que atribui a Platouma diviso dos discursos oratrios em seis espcies (exortao-dissuaso, acusao-defesa,elogio-censura); mas nenhuma passagem do corpus platnico apresenta essa diviso, e ofiador citado por Digenes no outro seno... Aristteles (de fato Pseudo-Aristteles).Sobre a dvida que convm observar com relao reconstruo apresentada por DigenesLarcio, ver a introduo de L. BRISSON ao livro III em Diogne Larce, Vies et doctrines des

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    philosophes illustres, dir. M.-O. GOULET-CAZE, Paris, 1999, p. 382-386. Quintiliano escreveque os autores que se contentaram com a diviso em trs gneros (isto , quase todos),fizeram-no seguindo Aristteles (Aristotelen secuti: Istituio oratria, III, 4, 1). Essaexpresso no um posicionamento sobre a questo de saber se Aristteles era original ouno. Ela significa simplesmente que Quintiliano estava na mesma situao que ns e noconhecia texto anterior a Aristteles em que aparecesse a tripartio dos gneros tal comoa apresenta Aristteles.

    21 Reclassificao trabalhada pela problemtica filosfica, em torno das noes de privado ede pblico, de tempo, de fim, em torno da definio da felicidade, da poltica... Mas essa uma outra histria.

    PERNOT, Laurent. Aristote et ses devanciers. Pour une archologie dudiscours dlibratif.RSUM: On tudie ici les origines de la classification des genres de discours(genre dlibratif, genre judiciaire, genre pidictique) telle que la prsenteAristote dans la Rhtorique, et particulirement ce qui concerne la dfinitiondu genre dlibratif par rapport aux autres genres. A cette fin sont examinsdes textes de Thucydide, Platon, Isocrate et de la Rhtorique Alexandre,dans lesquels apparaissent des classements et des critres qui prfigurent ceuxdAristote. Cette enqute permet de reconstituer le contexte intellectuel de laRhtorique et de mieux cerner la manire dont Aristote a travaill pourcomposer ce trait, oprant une systmatisation partir de notions et deproblmes prexistants.MOTS-CLEFS: genres de discours; genre dliberatif; Rhtorique dAristote.