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1 OS EFEITOS DA NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL PELA PERDA DE CHANCE EM PROPRIEDADE INTELECTUAL THE EFFECTS OF THE LEGAL AND CIVIL RESPONSABILITY FOR LOSS OF CHANCE IN INTELLECTUAL PROPERTY LES EFFETS DE LA NATURE JURIDIQUE DE LA RESPONSABILITÉ CIVILE PAR LA PERTE D’UNE CHANCE DANS LE PROPRIÉTÉ INTELLECTUELLE *Charlene Maria C. de Ávila Plaza 1 **Maria Cristina Vidotte Tarrega 2 ***Eriberto Francisco Bevilaqua Marin 3 RESUMO O presente artigo tem como objetivo analisar os argumentos e discussões a respeito da perda de chance em propriedade intelectual no ordenamento jurídico pátrio. Muito embora incipiente o instituto no direito nacional, vimos que seus preceitos estão cada vez mais sendo aceitos e recepcionados pela maioria dos Tribunais. A teoria pela perda de chance constitui uma nova roupagem para o estudo de alguns requisitos da responsabilidade civil, bem como uma análise mais acurada de seu tratamento específico e distinto quando se refere à Lei de Propriedade Intelectual (Lei 9.279/96). O maior enfoque se concentrará em abordar o Direito Marcário e os casos de uso indevido e desautorizado de marcas e o dever de indenização tanto patrimonial quanto extra patrimonial pelo agente transgressor, destacando algumas jurisprudências que estão contribuindo de forma significativa para diminuir e coibir atos considerados ilegais desta estirpe. Palavras-chave: danos, responsabilidade, indenização, propriedade intelectual, marcas. ABSTRACT This article aims to analyze the arguments and discussions about the loss of chance in intellectual property inside the legal planning home. Although nascent the institute in national law, we saw that their provisions are increasingly being accepted and approved 1 * Mestre em Direito na área de Integração e Relações Empresariais pela Universidade de Ribeirão Preto/ UNAERP-SP. Professora da Universidade Paulista UNIP. Pesquisadora do Núcleo de Patentes e Transferência de Tecnologia-NUPATTE-GO e da Rede Ibero Americana de Propriedade Intelectual e Gestão da Inovação – RIAPIGI-GO-Universidade Católica de Goiás. Pesquisadora do CNPq em transferência de tecnologia e propriedade intelectual. Advogada do Escritório Carraro S.S-GO. Endereço: Rua C-257, n. 80, Edifício Suíça Park, Bairro Nova Suíça, Goiânia-GO, cep: 74.280-200. E.mail: [email protected] . ou [email protected] 2 **Pós-doutoranda em Direito da Universidade de Coimbra. Professora Doutora UFG/UCG-GO. E.mail: [email protected] . 3 ***Doutor em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Minas Gerais. Diretor e Professor adjunto da Universidade Federal de Goiás-GO. E.mail: [email protected]

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OS EFEITOS DA NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL PELA PERDA DE CHANCE EM PROPRIEDADE INTELECTUAL

THE EFFECTS OF THE LEGAL AND CIVIL RESPONSABILITY FOR LOSS OF CHANCE IN INTELLECTUAL PROPERTY

LES EFFETS DE LA NATURE JURIDIQUE DE LA RESPONSABILITÉ CIVILE PAR LA PERTE D’UNE CHANCE DANS LE PROPRIÉTÉ INTELLECTUELLE

*Charlene Maria C. de Ávila Plaza1 **Maria Cristina Vidotte Tarrega2

***Eriberto Francisco Bevilaqua Marin3

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar os argumentos e discussões a respeito da perda de chance em propriedade intelectual no ordenamento jurídico pátrio. Muito embora incipiente o instituto no direito nacional, vimos que seus preceitos estão cada vez mais sendo aceitos e recepcionados pela maioria dos Tribunais. A teoria pela perda de chance constitui uma nova roupagem para o estudo de alguns requisitos da responsabilidade civil, bem como uma análise mais acurada de seu tratamento específico e distinto quando se refere à Lei de Propriedade Intelectual (Lei 9.279/96). O maior enfoque se concentrará em abordar o Direito Marcário e os casos de uso indevido e desautorizado de marcas e o dever de indenização tanto patrimonial quanto extra patrimonial pelo agente transgressor, destacando algumas jurisprudências que estão contribuindo de forma significativa para diminuir e coibir atos considerados ilegais desta estirpe. Palavras-chave: danos, responsabilidade, indenização, propriedade intelectual, marcas. ABSTRACT

This article aims to analyze the arguments and discussions about the loss of chance in intellectual property inside the legal planning home. Although nascent the institute in national law, we saw that their provisions are increasingly being accepted and approved

1* Mestre em Direito na área de Integração e Relações Empresariais pela Universidade de Ribeirão Preto/ UNAERP-SP. Professora da Universidade Paulista UNIP. Pesquisadora do Núcleo de Patentes e Transferência de Tecnologia-NUPATTE-GO e da Rede Ibero Americana de Propriedade Intelectual e Gestão da Inovação – RIAPIGI-GO-Universidade Católica de Goiás. Pesquisadora do CNPq em transferência de tecnologia e propriedade intelectual. Advogada do Escritório Carraro S.S-GO. Endereço: Rua C-257, n. 80, Edifício Suíça Park, Bairro Nova Suíça, Goiânia-GO, cep: 74.280-200. E.mail: [email protected]. ou [email protected] 2 **Pós-doutoranda em Direito da Universidade de Coimbra. Professora Doutora UFG/UCG-GO. E.mail: [email protected]. 3***Doutor em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Minas Gerais. Diretor e Professor adjunto da Universidade Federal de Goiás-GO. E.mail: [email protected]

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by most courts. The theory for the loss of chance is a new-style for the study of some requirements on civil liability, as well as a more accurate analysis of their specific and separate treatment in relation to Intellectual Property Law (Law 9.279/96). The greater focus will concentrate on addressing the Trademark’s Law and on cases of unauthorized and improper use of trademarks and duty of compensation patrimonial and also extra-patrimonial by the offender agent, highlighting some Law cases witch are contributing significantly to reduce and curb acts considered illegal of this strain. Key-words: damage, liability, compensations, intellectual property, trademarks.

RESUMÉ

Le présent article analyser les arguments et les discussions concernant la perte de chance dans le propriété intellectuelle dans l'ordre juridique originaire. Bien que naissant l'institut dans le droit national, nous avons vu que leurs règles sont de plus en plus en être acceptées par à la majorité des Tribunaux. La théorie par la perte de chance constitue un nouveau habillement pour l'étude de quelques conditions de la responsabilité civile, ainsi qu'une analyse plus approfondie de son traitement spécifique et distinct quand il se rapporte à la Loi de Propriété Intellectuelle (Loi 9,279/96). Plus le plus grand approche se concentrera à aborder le Droit Marcário et les cas d'utilisation indue et décréditée de marques et le devoir d'indemnisation de telle façon patrimoniale combien extra patrimoniale par l'agent transgressif, en détachant quelques jurisprudences qui contribuent de forme significative pour diminuer et contrôler des actes considérés illégaux de cette lignée. Mots Clés: dommages, responsabilité, indemnisation, propriété intellectuelle, marques.

SUMÁRIO

Resumo. Abstract. Introdução. 1. As correntes antagônicas sobre a natureza jurídica da perda de chance. 1.1 A teoria da equivalência das condições na perda de chance. 1.2 A teoria da causalidade adequada. 1.3 A teoria do dano direto e imediato. 1.4 O dano e a teoria da perda de chance. 2. O dano e sua especificidade na Lei de propriedade intelectual. 3. Considerações sobre dano e suas espécies em propriedade intelectual. 3.1 Do dano emergente ou positivo e lucro cessante. 3.2. Das marcas: sanções civis e penais. 3.3. Do dano moral e a pessoa jurídica. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.

INTRODUÇÃO

Diferentemente do que ocorre em outros países, como França, Inglaterra e

outros, o ordenamento jurídico brasileiro ainda é incipiente quando se trata da natureza

jurídica das chances perdidas, espécie peculiar de dano. Muito embora o mesmo estudo

tenha passado despercebido pelas decisões jurisprudenciais de alguns países, o fato é

que, em muitos outros foi decisiva.

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No direito brasileiro a doutrina e jurisprudência afirmam que para que haja

uma reparação o dano deverá ser certo e o prejuízo não eventual e hipotético. Mas

quando se trata da seara da perda de chance, esse paradigma torna-se um obstáculo,

principalmente sobre questões de propriedade intelectual que se admite a presunção de

dano, vez que a perda de chance sempre foi tratada dogmaticamente como um problema

de certeza.

Longe da defesa da adoção da teoria da presunção do dano em direito marcário

que em tese, constitui a regra, nota-se que o comando genérico que norteia a matéria e

por que não, na maioria das questões de propriedade intelectual, ainda assim é pela

sistemática da mencionada teoria, salvo algumas exceções.

A presunção em casos de uso indevido e desautorizado de marca está também

intimamente ligada à evolução do entendimento sobre a prova do dano moral, vez que

esse por ser um dano imaterial é difícil de ser demonstrado, além do fato de ser a marca

um bem móvel, de natureza imaterial, sendo difícil de provar sua lesão.

Logicamente que com a crescente tendência de aplicação da teria do dano

presumido em propriedade intelectual em nossos Tribunais, o julgador deverá observar

as circunstâncias de cada caso concreto, embasado no principio da proporcionalidade,

não ignorando que o direito tem nos fatos sociais a sua fonte mais direta além do que

trata com complexos e probalísticos conflitos dos fenômenos sociais que devem

considerar a incerteza como parte integrante das soluções jurídicas.

O estudo sobre a perda de chance aponta diversas teorias sobre a natureza

jurídica do instituto na seara da responsabilidade civil. Essas teorias ao longo do tempo

foram forçadas a acompanhar as mudanças sociais, ideológicas e econômicas, fazendo

com que o eixo da responsabilização, antes calcada na culpabilidade do agente, hoje,

seja construído na reparação do dano perpetrado em face da vítima.

Essa concepção contemporânea de visualizar o dano em sua forma mais ampla

demonstra que na produção das provas, o elemento culpa vem se mostrando cada vez

mais descipiendo para se chegar à indenização mais ampla possível dos prejuízos

sofridos pela vítima.

A mudança de paradigma quanto à ampliação do conceito de dano indenizável

transmuta o instituto da culpa para a reparação do dano que até então alguns não

indenizáveis por serem incertos intangíveis ou com efeitos puramente emocionais,

passam a ser reparados.

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As precisas palavras de Jourdain (1992, p.102), vêm a calhar com os preceitos

hoje utilizados tanto pela jurisprudência quanto pela doutrina pátrias que muito embora

grande parte dos tribunais nacionais desconhecerem a teoria da perda de chance

ultrapassa barreiras sistemáticas, aplicando a teoria aos mais variados casos.

Dans ce type de situation um aléa existe puisque par hypothéses lês

chances sont aléatoires; mais il n’est pás lá um obstacle à l’existence

d’um préjudice, bien au contraire, puisque c’est la disparition –

certanine- de cet aléa, de ces chances de gain, qui constitue lê

préjudice, lequel ne se confond évidemment pás avec la perte de

l’avantage espere don’t l’incertitude interdit toute indemnisation.

O presente artigo está dividido em três tópicos. O primeiro tópico discute as

diversas teorias e a natureza jurídica da perda de chance; o segundo aborda o dano e sua

especificidade na lei de propriedade intelectual fazendo uma analise comparativa no

tocante a comprovação dos danos para efeito de indenização entre a lei especial

9.279/96 e o Código Civil e, o terceiro tópico segue com algumas considerações sobre

as espécies de dano na seara dos direitos de exclusiva, em específico o direito marcário.

Para maior compreensão e desenvolvimento do artigo será feito com relação

aos tópicos elencados um estudo analítico através da pesquisa bibliográfica e

documental entre o Direito Civil – responsabilidade civil e o Direito Marcário – Lei de

Propriedade Intelectual referentes à perda de chance e a sua competente reparação dos

danos.

Como pesquisa teórica realizamos revisão bibliográfica a partir de material

constituído principalmente de livro e revistas especializadas no assunto e outros meios

disponíveis com intuito de avaliar criticamente o quadro teórico de referência

esperando oferecer contribuições originais.

1. AS CORRENTES ANTAGÔNICAS SOBRE A NATUREZA JURÍDICA DA PERDA DE CHANCE

O paradigma liberal do século XIX contido nos Códigos Latinos se assentava

em um modelo de responsabilidade civil subjetiva, baseada na culpa, do individualismo

exacerbado, sendo o “indivíduo culpado e responsável” por uma causa

comprovadamente imputável. Assim sendo, os danos advindos pelo “acaso” eram

totalmente suportados pela vítima.

Benabent em seu estudo la chance et le Droit (1973, p.06) afirmava que o

Estado liberal do século XIX, preteriu o dano advindo do acaso, adotando uma postura

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de “ignorance-exclusion”, tanto que no campo dos contratos a cláusula rebus sic

standibus, que visava modificar uma obrigação que havia perdido o sinalagma funcional

premida por situações imprevistas, não eram aceitos em vários ordenamentos jurídicos,

sito o Direito Francês. 4

A responsabilidade contratual estava firmemente atrelada ao princípio pacta

sunt servanda, fundada no respeito à palavra empenhada bem como a responsabilidade

civil relacionada com a questão moral repreensível, atrelava-se a culpa com a conduta

do responsável pelo dano.

Nesse raciocínio, na seara da responsabilidade civil a presença da ilicitude era

fundamental, pois somente quem agisse com imprudência, negligência e imperícia

poderiam ser de fato censuradas moral e civilmente.

Posteriormente, no século XX que adentrava na sua condição de era industrial

e progresso tecnológico marcado pela forte presença estatal nas relações privadas,

houve a necessidade de abandono do enfoque com que o Direito enfrentava as questões

da reparação dos danos diretos e tangíveis, para se moldar de acordo com o Estado

Social que por sua própria essência, englobava os danos intangíveis e as meras

expectativas.

Essa nova atitude nada mais foi do que a aceitação de como o direito lida com

questões dos conflitos sociais e, portanto, passando a considerar a incerteza como parte

integrante das soluções jurídicas.

Dessa forma, o papel de Estado Social, principalmente no campo privado

exerceu forte influência, pois possibilitou critérios mais amplos, como o da

responsabilidade objetiva, relativizando a responsabilidade civil subjetiva –

individualista, inclusive com relação aos danos, tendo em vista que o peso da reparação

não cairia exclusivamente sobre o patrimônio do agente responsável.

Pela teoria objetiva, o autor de uma atividade de risco responde pelos danos

dela advindos, independente de culpa, desta feita se demonstra que a responsabilidade

civil preocupa-se com a reparação do dano e não somente em encontrar o elemento da

culpa na conduta do agente.

4 O Código Civil Francês de 1804 consubstanciou regra que passaria a ser, até os dias de hoje, a grande arma dos que se opõem à teoria da imprevisão. Trata-se do dispositivo no artigo 1.134, que afirma “les

conventions légalement formées tiennent lieu de loi à ceux que les ont faites. Elles ne peuvent être

révoquées que de leur consentement mutuel, ou pour lês causes que la loi autoris. A posição contrária fundamentada pela Corte de Cassação, sustenta a sua não aceitação por basear-se no princípio da vinculatividade dos contratos, decorrente do princípio da autonomia da vontade.

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Dias (1997, p.11) ao discorrer sobre o próprio obsoletismo do termo

“responsabilidade civil” face às novas formas de sua interpretação, apregoa que:

Filosoficamente, não é possível conceber responsabilidade sem culpa. A obrigação civil decorrente de responsabilidade civil, se, sacrificados à tirania das palavras, quisermos guardar significação rigorosa do termo, só pode ser entendida como conseqüência da conjugação destes elementos: imputabilidade mais capacidade. É disso que se aproveitam os partidários mais ardorosos da doutrina da culpa, esquecidos de que, na verdade, já não é de responsabilidade civil que se trata, se bem que haja conveniência em conservar o nomen júris, imposto pela semântica: o problema transbordou desses limites. Trata-se, como efeito, de reparação de dano.

A grande mudança de paradigma no que concerne a passagem de um contexto

individualista – responsabilidade subjetiva para um prisma solidário – responsabilidade

objetiva é a mudança de análise dos elementos nexo de causalidade e do dano face à

nova realidade social, econômica e tecnológica.

A relativização da culpa, a massificação social vem embasando utilizações

alternativas do nexo de causalidade, (COUTO E SILVA, 1997). Em alguns casos os

danos são produzidos de maneira ta rápida ou obscura que não se sabe precisar o seu

real causador, (DELLA GIUSTINA, 1991) ou os autores do dano são conhecidos, mas

não se pode precisar a participação de cada um no prejuízo final, (COUTO E SILVA,

1997). Essa utilização diferenciada da causalidade já originou algumas figuras típicas,

como a responsabilidade civil dos grupos, na qual certa presunção causal é utilizada

para condenar o membro anônimo de um grupo determinado, (VINEY, GENEVIÉVE,

1998).

O aparecimento do instituto perda de chance na responsabilidade civil remonta

o Código Francês, bem como no Direito do Common Law. Sua importância verifica-se a

fertilidade com que se podem analisar todos os requisitos da responsabilidade civil de

maneira menos ortodoxa do nexo de causalidade, ora se manifestando em forma de

causalidade parcial, ora em forma de presunção de causalidade, nos moldes da

responsabilidade coletiva ou grupal e na maioria das vezes, constitui perfeito exemplo

de ampliação do conceito de dano reparável mantendo a aplicação do nexo causal.

Atualmente, a utilização da teoria da perda de chance é observada tanto nos

danos advindos do inadimplemento contratual, quanto naqueles gerados pelos ilícitos

absolutos, assim como nas hipóteses regidas pela responsabilidade subjetiva e objetiva.

Comparativamente aos sistemas alienígenas que apresentam grande evolução

da teoria da perda de chance, no sistema brasileiro essa questão é recente e, por vezes,

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com decisões pelos nossos tribunais bem paradigmáticas. Possivelmente, uma das

causas mais emblemáticas quanto a nossa jurisprudência incipiente sobre a matéria vem

ser a escassa produção doutrinária capaz de orientar na produção de modelos

preceptivos e ao fato do nosso Código Civil, segundo Couto e Silva (1997, p. 222)

abarcar uma enumeração casuística de bens protegidos (artigos 1.537 a 1.554) que

limita a criação de novas espécies de reparação.

1.1 A teoria da equivalência das condições na perda de chance

Por essa teoria, o nexo causal é um dos requisitos fundamentais para o pleito

indenizatório, tanto no Direito brasileiro como em outros ordenamentos do sistema

romano-germânico. Como demonstra Pereira (1993, p. 95), este nexo deve ser certo,

pois a mera coincidência entre a ação e omissão, não é suficiente como pressuposto de

culpa ou de risco para a imputação da responsabilidade.

Originária da doutrina alemã do século XIX, a teoria da equivalência das

condições pressupõe que todos os eventos são considerados para a ocorrência do dano

como causas equivalentes e que a condição necessária ou conditio sine qua non se

apresenta como requisito necessário.

Desse modo, se abre um imenso leque de causas, algumas absolutamente

remotas5, pois possui em seu bojo o mérito da simplicidade e favorecimento da vítima.

Todavia, a aplicação ipsi literis dos pressupostos desta teoria, poderá causar

sérias injustiças em relação ao caso concreto, motivo pela qual a doutrina e

jurisprudência vêm abandonando-a no âmbito da responsabilidade civil.

1.2 A Teoria da causalidade adequada

Representativa de considerável avanço em relação à teoria da equivalência de

condições, a teoria da causalidade adequada teve como precursores os alemães Von

Kries e Rumelin no final do século XIX.

5 Como exemplo a teoria da equivalência das condições supõe-se um motorista de táxi que, devido à sua falha, faz com que um passageiro se atrase é perca o avião. O passageiro forçosamente embarca em outro avião, que acaba caindo, causando a morte de todos. Neste caso, não há dúvidas de que a falha do motorista de táxi representa conditio sine qua non para o aparecimento do dano, visto que o atraso não tivesse ocorrido o passageiro teria embarcado no avião que alcançou, incólume, o seu destino. A condenação do motorista de táxi pela morte de seu passageiro demonstra a flagrante iniqüidade patrocinada por essa teoria. (COUTO e Silva, 1997, p. 194).

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A grande inovação trazida por essa teoria refere-se às causas, que além de

necessárias, devem estar revestidas de um critério adequação, isto é, buscam-se entre as

diversas causas do dano, aquelas que apresentam a “possibilidade objetiva do

resultado”, o que Rumelin chamava de “prognóstico objetivo retrospectivo” para poder

se afirmar que existia a possibilidade objetiva de um determinado fato, em regra, tivesse

sido o causador do prejuízo (LE TOURNEAU, 1998, p. 269).

Dessa maneira, por essa teoria, as probabilidades encontram-se sua

fundamentação, ou seja, somente são consideradas adequadas às condições necessárias

que em regra, poderiam causar determinado dano, observados em face da situação

concreta e não de maneira abstrata.

1.3 A Teoria do dano direto e imediato

Para alguns autores pátrios como Couto e Silva (1997), Cavalieri (2003), Pereira

(1993), a teoria do dano direito e imediato é abarcada por nosso direito positivado, bem

como o Supremo Tribunal Federal em seus diversos julgados, apresenta indícios de

englobar a tal teoria. De acordo com o recurso extraordinário n. 130.764-1/PR de 1992

o Ministro Moreira Alves manifestou que:

Em nosso sistema jurídico, como resulta do disposto no artigo 1.060 do CC, a teoria adotada quanto ao nexo de causalidade é a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal. Não obstante aquele dispositivo da codificação diga respeito à impropriadamente denominada responsabilidade contratual, aplica-se ele também à responsabilidade extracontratual, inclusive a objetiva, até por ser aquela que, sem quaisquer considerações de ordem subjetiva, agasta os inconvenientes das outras duas teorias existentes: a da equivalência das condições e da causalidade adequada.

Tal assertiva encontrou á época respaldo no artigo 1.060 e, atualmente no artigo

403 do novel Código Civil que reza “ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor,

as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela

direito e imediato (grifo nosso), sem prejuízo do disposto na lei processual”.

A grande parte da discussão sobre a teoria da perda de chance se centra na

problemática da causalidade intimamente vinculada às hipóteses de causalidade

múltipla ou concausas que podem ser sucessivas ou concomitantes, sendo que os danos

sucessivos, o último dos quais só se aplica pelos seus antecedentes e as concomitantes

que se aplica a um só dano ocasionado por mais de uma causa.

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Com efeito, tanto as concausas concomitantes quanto as sucessivas se

enquadram faticamente no preceito do artigo 942 do Código Civil onde “os bens dos

responsáveis pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do

dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor todos responderão solidariamente

pela reparação”. (grifo nosso).

Nesse caso, aplica-se a responsabilidade solidária entre os agentes do dano,

ficando a vítima na faculdade de escolher qual dos autores do dano irá executar, e o

executado, por sua vez, terá ação de regresso contra os outros, na medida de suas

“culpas”.

Entretanto, vale lembrar que a regra geral deste artigo deve ser relativizada

quando se tratar de responsabilidade contratual, tendo em vista que a solidariedade não

se presume, ficando cada um dos devedores responsável por sua cota.

1.4 O Dano e a teoria da perda de chance

A ciência do Direito no decorrer dos tempos e mais particularmente o instituto

da responsabilidade civil foi impelida a ampliar, identificar e quantificar a gama de

danos reparáveis advindos das mudanças tecnológicas e epistemológicas, que são

indissociáveis, em específico com relação à teoria da perda de chance.

A doutrina e a jurisprudência são unânimes em afirmar que o dano passível de

reparação do prejuízo, não deverá ser eventual e hipotético. Desta feita, o principal

respaldo legislativo quanto ao caráter da condição de certeza encontra-se nos artigos

402 e 403 do Código Civil.

Ao artigo 402 do CC coube a abrangência dos lucros cessantes e danos

emergentes, preceituando que “salvo as exceções expressamente previstas em lei, as

perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu o que

razoavelmente deixou de lucrar” e por extensão ao preceito o artigo 403 acresce as

conseqüências diretas e imediatas do dano a se reparar, discorrendo que “ainda que a

inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos e os

lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do dispositivo na lei

processual”.

Os dois dispositivos assinalam rigoroso critério ao magistrado, pois não

impossibilita à condenação do agente a reparação dos danos que não estejam

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devidamente provados, além de que no artigo 403 faz com que o estudo da certeza do

dano perpasse, inexoravelmente, pela análise do nexo causal.

As situações aleatórias e o acaso foram desmistificados, pois o principal fator

aceitável da teoria da perda de chance esta justamente em considerar as probabilidades,

onde a simples chance tem valor pecuniário, assim como a perda dessa mesma chance

pode acarretar prejuízo extrapatrimonial.

Assim, além da chance perdida ter todas as condições para ser considerada como

dano quantificável e amplamente provável, também não se encontra dificuldade para

demonstrar o nexo de causalidade certo e direto entre a conduta do agente e a perda de

chance.

Neste sentido, Martins Costa (2003, p.362) diz que “muito embora a realização

da chance nunca seja certa, a perda da chance pode ser certa, portanto sem óbices a

aplicação da teoria”.

O que de fato o artigo 403 do CC afasta é o dano meramente hipotético, contudo,

se a vítima provar a adequação do nexo causal entre a ação culposa e ilícita do lesante e

o dano sofrido, isto é, as perdas da probabilidade séria e real, configurados estarão os

pressupostos do dever de indenizar.

2. O DANO E SUA ESPECIFICIDADE NA LEI DE PROPRIEDADE INTELECTUAL

Importante e necessário quando se interpreta a teoria do dano em propriedade

intelectual o comento entre os artigos 402 e 403 do Código Civil e os artigos 208, 209 e

210 da Lei n. 9. 279/96 no tocante a sua comprovação para efeito de indenização do

lesado.

O Código Civil em seus artigos supra mencionado, prevê expressamente que só

haverá o dever de indenizar desde que tenha sido efetivado algum dano e, para tanto se

utiliza das palavras “efetivos e efetivamente” para demonstrar a não incidência do dano

presumido.

Assim temos no artigo 402 a noção legal de que “salvo as exceções

expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do

que efetivamente perdeu o que razoavelmente deixou de lucrar” e, segue no artigo 403”

ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos, só incluem os

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prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo

do disposto na lei processual”.

Tais preceitos, porém, não foram adotados na Lei de propriedade intelectual

em seus artigos 208, 209 e 210 e incisos, como se pode conferir na leitura abaixo:

Art. 208. A indenização será determinada pelos benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não teria ocorrido.

Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízo causados por ato de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nessa Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.

§ 1° Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou e difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória.

§ 2° Nos casos de reprodução ou imitação flagrante de marca registrada, o juiz poderá determinar a apreensão de todas as mercadorias, produtos, objetos, embalagens, etiquetas e outros que contenham a marca falsificada ou imitada.

Art. 210. Os lucros cessantes serão determinados pelo critério mais favorável ao prejudicado, dentre os seguintes:

I- os benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido; ou

II- os benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito; ou

III- a remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse legalmente explorar o bem.

Da leitura dos artigos 208, 209 e 210 da LPI (Lei de propriedade industrial) e

seus incisos denota-se que o artigo 208 restou completamente inútil e descartável em

virtude do prescrito no artigo 210, inciso I da mesma lei, pois há repetição da norma

contida no artigo 208, no inciso I do artigo 210. Parece óbvio que o “benefício”

constante no artigo 208, em razão da locução verbal “teria auferido” expressa nesta

norma. Dessa maneira, torna o artigo 208 redundante perante o artigo 210, I da LPI.

Seguindo a análise, os artigos da Lei especial de propriedade intelectual,

também não cogitam a comprovação dos danos efetivos no que concerne a indenização

e, nem a pretensão do réu em se locupletar ou não da marca violada afasta a regra geral

da legislação comum contida nos artigos 402 e 403 do Código Civil.

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No entanto, há de considerar que as marcas além de possuir características e

peculiaridades que lhes são próprias por ser consideradas bens intangíveis, à matéria de

indenização por violação marcária é extremamente difícil de provar “efetivamente” a

lesão, fazendo com que as decisões que se norteiam pela Lei comum, isto é, contrárias à

presunção de dano, se tornem equivocadas.

Além de que o dever de indenizar por uso indevido de marca só restasse

comprovado mediante algum dano efetivo nos artigos concernentes a indenização na

Lei especial (Lei 9.279/96), estariam estes, condenados a receber a adjetivação de “letra

morta”.

Sublinhe-se que há décadas atrás, sob a égide da legislação da época, um dos

maiores mestres em propriedade intelectual, preceituava que:

A simples violação do direito obriga a satisfação do dano, na forma do artigo 159 do CC, não sendo, pois, necessário, a nosso ver, que o autor faça prova dos prejuízos no curso da ação. Verificada a infração, a ação deve ser julgada procedente, condenando-se o réu a indenizar os danos emergentes e os lucros cessantes (CC do art. 1.059), que se apurarem na execução. E não havendo elementos que bastem para se fixar o quantum dos prejuízos sofridos, a indenização deverá ser fixada por meio de arbitramento, de acordo com o artigo 1.553 do CC. (CERQUEIRA, 1982) – Resp. n. 101.059 – RJ (96.0044000-0) 4° Turma do STJ. Rel. Min. Ruy Rosado Aguiar (DJ de 07/04/97) – JSTJ e TRF. Vol 96/229.

Em um mesmo entendimento relativo à matéria a Egrégia 18° Câmara Cível do TJ-RJ

na Apelação Cível n. 2414/99, relator Des. Jorge Luiz Habib, decidiu que:

A simples comercialização de produtos contrafeitos caracteriza, obriga à indenização da parte lesada, em danos materiais e imateriais, nestes compreendidos o da imagem, independente da prova de culpa do contrafrator, sendo certo afirmar, que a existência do prejuízo causado pelo contrafator de marca notoriamente conhecida é presumida.

(...) Também não tem razão a ré apelante no que tange a alegação de que inexiste dano, por não estar comprovado o prejuízo, posto que tal condenação está amparada em legislação especial, qual seja a Lei 9.279 de 14 de maio de 1996, que em seu artigo 210 que dispõe acerca dos critérios de composição dos danos relativos aos lucros cessantes no caso de violação de marcas, conforme transcrição abaixo:

Art. 210 (...) Frise-se que, não há como se admitir, via de regra, que a prática da contrafação não gere danos de toda ordem ao titular da marca violada. (grifos nossos).

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13

Em contrapartida, o Superior Tribunal de Justiça, em um julgado mais recente,

tendo como relator o Ministro Castro Filho, retorna ao texto de Cerqueira, apregoando

que:

Cumpre ter-se em conta, entretanto, que o referido tratadista não sustentou que haveria de reparar o dano quando esse não existisse. Por isso, sem embargo de adotar, em linhas gerais, o posicionamento do renomado jurista, a egrégia Quarta Turma deste Sodalício tem deixado claro não poder dispensar a prova de existência do dano. (...) No presente caso, verifica-se que não houve a comprovação de qualquer prejuízo para autora. Consignou-se na sentença que teria havido prejuízo, mas esse não foi vinculado a qualquer prova de perda sofrida pela recorrente. Oras, perdas e danos são o que efetivamente se perdeu e o que razoavelmente se deixou de ganhar, qual definição dada pelo artigo 1.059 do anterior Código Civil. Pressupõe, elas, de parte do devedor, culpa ou mora, e, de parte do credor, prejuízo. Nos termos do acórdão recorrido, não houve comprovação de qualquer efetivo dano material. Se não se comprovou o dano, ou o prejuízo, quid júris? Não há como remeter à liquidação aquilo que, no processo de conhecimento, não teve sua existência reconhecida. Nessas condições, mantenho a orientação predominante, pois não existe peculiaridade nos autos que justifique dela me afaste. (resp n. 613.376-SP – 200301217521-6).

Barbosa (2008, p. 14), discorrendo sobre a inaceitabilidade do dano material

fictício, diz que “a observação de Gama, assim, em tudo se distancia da tese de lesão

presumida pela simples violação. O que se pode presumir, segundo seu magistério, é

que algum dano se presume de azo a prosseguir no feito até o arbitramento”.

Sem embargos das ponderações explicitadas, seja sob a égide da Lei ordinária,

seja pela Lei Especial, ambas combinadas com a Constituição Federal, considera-se que

a regra, ressalvadas as exceções, é a teoria da presunção de dano embasado no simples

uso indevido e desautorizado da marca.

Não cabe mais, em tese, a exigência da prova do “dano efetivo”, sendo a regra

a teoria da presunção do dano, até mesmo porque se leva em conta a interpretação

teleológica do artigo 210 da Lei de propriedade intelectual, bem como a natureza

imaterial das marcas e sua conseqüente dificuldade na comprovação dos prejuízos

causados em virtude de seu uso desautorizado. Porém, sempre tendo em mente os

princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, vez que, “os direitos raramente são

absolutos; o âmbito é normalmente limitado e o exercício submete-se a condições

diversas”, (OLIVEIRA apud PLANIOL, 2000).

Tem-se aqui que os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade estão

limitados a condições diversas, premidos pela realidade do mundo social, histórico e

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14

particular, além de que, possuem valoração e critérios axiológicos que deverão ser

levados em conta, sem se descartar todas as possibilidades fáticas e as limitações reais.

Assim, a presunção de dano em matéria marcaria dever ser regra em casos de

sua violação, não convém ser aplicada indistintamente em todos os casos, pois não se

fará jus aos princípios apregoados por Recaséns Siches, se forem desprezadas as

circunstâncias fáticas que cada situação se impõe em casos concretos.

3. CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ESPÉCIES DE DANO EM PROPRIEDADE INTELECTUAL

Cavalhieri Filho (2000, p. 71) nos diz que o dano material ou patrimonial é

aquele “que atinge os bens integrantes do patrimônio da vítima, entendendo-se como tal

o conjunto de relações jurídicas de uma pessoa apreciáveis em dinheiro”, que é

subdividido em danos emergentes e lucros cessantes.

A ocorrência de lesão tanto é possível acontecer a um bem patrimonial, quanto

ao não patrimonial como o dano moral em resultado de ofensa a bem material.

No âmbito do direito marcário, o dano patrimonial verifica-se oriundo do uso

indevido e desautorizado da marca, seja pela reprodução ou imitação desta, ensejadora

de diminuição das vendas do titular da marca, como também, o desvio de clientela e a

não auferição de royalties que se fazem pertinentes, pelo licenciamento de sua marca.

A principal função do instituto da responsabilidade civil é fazer com que

através da indenização, a vítima volte ao status quo antes do evento danoso,

preceituando em seu artigo 944 do CC pátrio que “a indenização mede-se pela extensão

do dano”.

Acontece que a quantificação dos danos em decorrência da perda de chance é

bastante tormentosa na jurisprudência pátria, principalmente quando nos reportamos ao

ressarcimento do prejuízo em bens imateriais.

Tal situação se torna mais agravante em virtude dos grandes números de

decisões judiciais que se manifestam pela quantificação do dano em procedimento de

liquidação de sentença.

Barbosa (2008, p. 10-11) nos diz sobre a dificuldade de apuração exata dos

danos em se tratando de violação de direitos relativos à propriedade intelectual:

A prova dos prejuízos, nas ações de perdas e danos, merece, entretanto, especial referência. Essa prova, geralmente difícil nos casos de violação de direitos relativos à propriedade intelectual, é particularmente espinhosa quando se trata de infração de registro de

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marcas, não podendo os juízes exigi-la com muita severidade. Os delitos de contrafação de marcas registradas lesam forçosamente o patrimônio do seu possuidor, constituindo uma das formas mais perigosas da concorrência desleal, tanto que as leis, em todos os países, destacam-na como delito específico. Freqüentemente, porém, verifica-se que, não obstante a contrafação, os lucros do titular da marca não diminuem, mantendo-se no mesmo nível ou na mesma progressão, não sendo raros os casos em que se verifica o seu aumento. Não se deve concluir, entretanto, só por esse fato, que a contrafação não tenha causado prejuízos, porque estes não se revelam, necessariamente, na diminuição dos lucros ou na sua estabilização em determinado nível. O que o bom-senso indica é que o dono da marca realizaria lucros ainda maiores, se não sofresse a concorrência criminosa do contrafator. É preciso ter em vista que, reproduzindo ou imitando a marca legítima, o contrafator, graças à confusão criada para iludir o consumidor, consegue vender os seus produtos, o que leva à presunção de que as vendas por ele realizadas teriam desfalcado o montante das vendas do dono da marca. Por outro lado, o titular do registro vê-se obrigado a tomar providências especiais para neutralizar os efeitos da concorrência criminosa, prevenindo a sua clientela intensificando a propaganda dos seus artigos, dispensando maiores cuidados ao setor ameaçado de sua indústria ou comércio. Mas, se pelas suas oportunas medidas, ou pela sua diligência e trabalho, consegue atenuar ou mesmo anular os prejuízos resultantes da contrafação, esse fato não deve ser interpretado em benefício do infrator, para prová-lo de responsabilidade, sob o especioso fundamento de não ter havido prejuízos, permitindo-lhe, ainda, locupletar-se com os frutos de sua ação criminosa. (BARBOSA apud CERQUEIRA).

Enfatiza dessa maneira Barbosa (2008, p. 11-12) seguindo análise de

Cerqueira é que se deve haver ponderação quanto à complexa natureza dos danos

efetivos da violação da exclusiva para que seja apurada na oportunidade do

arbitramento, mesmo sendo estes de difícil apuração, vez que a dificuldade não deve

frustrar a justa pretensão, desde que não seja desmetida e sem base e muito menos em se

punir tendo em conta danos materiais. Além de que, ao presumir a existência de dano

dado à violação da marca, tais danos não se resumem ao que o titular deixa diretamente

de auferir.

Continua o autor (2008, p. 12) que “além da simples presunção – devem-se

impor ao violador pagamentos de danos materiais além da lesão, como punição ou

exemplo. O autor, escrevendo muito antes da atual construção dos danos morais em

nosso Direito, afirma que só se devem indenizar os danos materiais real e efetivamente

apurados” e “verificada a violação, haja a condenação – ainda que apenas na

sucumbência”.

Tratando-se de atos de concorrência desleal suscetíveis de causar de prejuízos, deve a ação ser julgada procedente, com a condenação do

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réu ao pagamento de, pelo menos, dos honorários do advogado do autor e das despesas judiciais e extrajudiciais. Não se concebe, realmente, que provada a existência do ato ilícito, o réu se livre de condenação, alegando que seus atos não causaram prejuízo, ou que o autor não conseguiu prova-los, ou ainda, que o dano eventual não é ressarcível. (Tratado da propriedade industrial, vol. 2, pp. 1.287/1.288).

Ressalta-se ainda, que é incompatível e inaceitável para as jurisdições de

tradição românica a pretensão civil de caráter punitivo, especialmente para efeitos de

perdas e danos materiais. Tal preceito também segue em matéria de propriedade

intelectual por duas razões importantes:

A primeira porque a aceitação dessa pretensão na legislação ordinária ou na

prática tribunalícia, desafiaria o princípio do artigo 5°, LIV, (BARBOSA, 2008, p. 07)

e, o sistema punitivo, especialmente quando a pena verte ao patrimônio do credor, viola

a regra que veda o enriquecimento sem causa do artigo 884 do Código Civil,

(BARBOSA, 2008, p. 07).

Na mesma linha de raciocínio segue Andrade (2006, p. 55-69) afirmando que:

No nosso sistema jurídico e nos da grande maioria dos países integrantes da família do civil law, a aplicação da indenização punitiva encontra obstáculos de difícil superação. O primeiro é falta de regra expressa a contemplar essa modalidade de sanção no âmbito do dano material. O segundo é a existência da tradicional regra de que a indenização se mede pela extensão do dano (aplicável somente ao dano material, uma vez que o dano moral não tem como ser economicamente mensurado).

3.1 Do dano emergente ou positivo e lucro cessante

O dano emergente nada mais é do que aquele que de forma imediata e em

razão do ato ilícito atinge o patrimônio presente da vítima. Segue que a Lei de

propriedade intelectual não se encontra norma expressa referente ao dano emergente,

optando o legislador a considerar enfaticamente o lucro cessante, vez que no âmbito

marcário é mais fácil de constatar do que o dano emergente, propriamente dito.

Pela simples leitura dos artigos 208, 209 e 210 e seus incisos, da Lei de

propriedade intelectual, se constata a assertiva, isto é, a não previsão e tampouco a

exigência do dano emergente.

Entretanto apesar de não constar norma expressa sobre o dano emergente na

LPI, poderá ser caracterizado sobre tudo ao dano à imagem da marca, exsurgindo um

dano patrimonial indireto, sendo este, atualmente, um dos maiores danos que pode vir a

sofrer a marca, vez que sua importância é relevante como elemento na competitividade

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17

econômica porque as empresas antes de vender seus produtos, vendem marcas (Aaker,

1998, p.15).

Os lucros cessantes dizem respeito aos reflexos futuros que sobrevirão por

causa do ato ilícito cometido, consistente na elisão de uma expectativa de lucrar, na

diminuição patrimonial da vítima.

Na violação ao direito marcário, como dito anteriormente, o lucro cessante é

de mais fácil constatação que o dano emergente. Assim, sendo conferida a exclusividade

do uso da marca em todo território nacional (artigo 129 da LPI), entende-se que a regra,

excetuada exceções, é que “provado o simples uso indevido e desautorizado da marca,

obrigado estará o infrator a indenizar o titular da marca”.

A obrigação de indenizar de acordo com o artigo 210, incisos I, II e III da LPI

deverá ao menos ser lastreada nos lucros cessantes seja:

► por aquilo que teria a sociedade proprietária da marca auferido caso o ilícito

não se concretizasse (inciso I, art. 210, LPI) compreendendo tanto o lucro cesssante

quanto o dano emergente;

► pelos lucros auferidos pelo infrator do direito marcário (inciso II, artigo

210, LPI) que seria um enriquecimento sem causa – positivo ou negativo;

► pelos royalties que teria sido pago o infrator ao titular da marca pela

concessão de uma licença de uso da mesma (inciso III, artigo 210, LPI), isto é, um

hipotético ganho resultante do jus fruendi.

Seguindo os preceitos do artigo 208 da LPI, necessário inicialmente saber

“quais benefícios que o prejudicado teria auferido, não houvesse a violação. Benefícios

não se resumem aos lucros; perda de oportunidade6, vantagens estratégicas e outros

6 Uma recente e importante variação dos lucros cessantes é a perda de oportunidade, hipótese em que se frustra uma hipótese de ganho, computada como lucro cessante apenas na proporção da álea da ocorrência da oportunidade. Responsabilidade civil. Perda de uma chance. Probabilidade séria e real. Situação de vantagem. Violação da boa-fé objetiva. Nexo de causalidade. Extinção da oportunidade. Dever de reparação. Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG. Número do processo: 1.oo24.05.700546-4/001. Relator: Selma Marques. Data do julgamento: 17/09/2008. Data da publicação: 09/10/2008. Inteiro teor: Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL. PERDA DE UMA CHANCE. PROBABILIDADE SÉRIA E REAL. SITUAÇÃO E VANTAGEM. VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA. NEXO DE CAUSALIDADE. EXTINÇÃO DE OPORTUNIDADE. DEVER DE REPARAÇÃO. PROBABILIDADE DE CONFIGURAÇÃO DA SITUAÇÃO VANTAJOSA. Independentemente da certeza em relação à concretização da chance, sua perda, quando configurar em si mesma uma probabilidade séria de ser obtida uma situação de vantagem, implica numa propriedade integrante da esfera jurídica de seu titular, passível, portanto, quando presentes os demais, requisitos da responsabilidade civil, de ser indenizada. Havendo nexo de causalidade entre conduta afrontosa ao princípio da boa-fé objetiva e a dissipação da oportunidade de ser obtida uma situação vantajosa pela outra parte contratante resta constituída a responsabilidade civil pela perda de uma chance. O quantum indenizatório na responsabilidade civil pela perda de uma chance deve ser fixado em percentual que incidindo sobre o total da vantagem que poderia ser auferida, represente de forma razoável a

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benefícios contextuais a cada caso serão igualmente consideradas e computadas”.

(BARBOSA, 2008, p. 26-27)

Importante salientar que para haja a indenização dos lucros cessantes, deve

prevalecer o entendimento que a mera possibilidade de dano não é bastante, muito

embora não se exija em contrapartida, a certeza absoluta, (FISCHER, apud STOCO,

1999, p. 654).

3.2 Das marcas: sanções civis e penais

A Lei 9.279/96 ao preceituar em seus artigos 189 e 190 sobre os crimes de

registro de marcas diz que:

Comete crime contra registro de marca quem: Art. 189: I- reproduz, sem autorização do titular, no todo ou em parte, marca registrada, ou imita-a de modo que possa induzir confusão; ou II- altera marca registrada de outrem já aposta em produto colocado no mercado. Pena – Detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Art. 190: I- produto assinalado com marca ilicitamente reproduzida ou imitada, de outrem, no todo ou em parte, ou II- produto de sua indústria ou comércio, contido em vasilhame, recipiente ou embalagem que contenha marca legítima de outrem.

Quando tratamos de crimes de contrafação de marcas a ação judicial diz

respeito tanto à seara civil quanto a penal. Na seara civil, deverá ser levada em conta a

reparação de perdas e danos, sendo irrelevante as questões sobre ignorância, a boa ou

má-fé do contrafator, importando a apuração dos possíveis prejuízos materiais e

imateriais sofridos pelo proprietário da marca e os possíveis consumidores alcançados

pelo ato vicioso.

A respeito das sanções penais em matéria de marcas a Lei 9.279/96 em seus

artigos supra mencionados aponta como crimes a utilização indevida no todo ou em

parte, quem importa, exporta, vende, oferece ou expõe a venda e, inclusive oculta ou

tem em estoque.

Pontes de Miranda (1983, p. 243) ao discorrer sobre a utilização indevida

mesmo que parcial das marcas, diz que:

probabilidade de ser configurada às expectativas da parte lesada, não podendo, contudo, em qualquer hipótese, ser confundida com a própria vantagem que poderia ser obtida.

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Se há reprodução, não precisa apurar se pode haver a erro ou confusão. Toda cópia servil tem tal conseqüência. Se se trata de expressão nominativa, há reprodução, ainda que se escreva ou grave com caracteres diferentes que lhe juntem alguns dizeres ou elementos. O que se precisa copiar para que haja reprodução é o bem incorpóreo do registro, não há imitação, mas sim reprodução, embora cercada de elementos de alterações não essenciais ou parciais. Daí a lei ter firmado que a reprodução parcial é crime. Se houve reprodução ainda que só em parte, que se tem como essencial ao bem incorpóreo, é de reprodução, e não de imitação que se trata. Não cabe verificação se houve induzimento em erro ou confundibilidade.

No entanto, não é fácil caracterizar o delito na prática, principalmente quando

há indícios de dolo, porque o contrafator poderá dissimular os vestígios de seu ato

criminoso.

Para tanto é de suma importância distinguir “reprodução” da “imitação” para

configurar o delito em que pese às controvérsias quanto à classificação da imitação em

total e parcial. Bastos (1997) comenta que a reprodução se constata mais facilmente

porque há uma coincidência com marca anterior e, por sua vez, a imitação há o

elemento da sutileza na fraude, ainda que fiquem evidenciadas certas diferenças.

3.3 Do dano moral e as pessoas jurídicas

Décadas atrás quando a jurisprudência não havia consolidado a respeito da

vinculação do instituto do dano moral perpetrado contra pessoa jurídica, era

completamente inconcebível a indenização a título de reparação do ilícito. A defesa a tal

procedimento aceitável à época foi devido a vários entendimentos de que em se tratando

de pessoa jurídica, dificilmente a lesão moral não acarrete prejuízo material e

econômico, vinculando a existência ou não dos prejuízos materiais ao dano moral para a

sua configuração, além de que, a existência do dano moral estaria atrelada aos “danos da

alma” advindos da capacidade afetiva e sensitiva do ser humano.

Ainda assim, mesmo que o entendimento seja considerado um equívoco,

muitas decisões posteriores ao advento da Constituição Federal de 1988 continuavam a

exercer tais preceitos, como se demonstra no Acórdão do 4° Gr. Cs., TJRJ em sede de

embargos infringentes julgado em 24/04/94, tendo como relator o Desembargador

Miguel Pachá:

A pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo de dano moral. O elemento característico do dano moral é a dor em sentido mais amplo, abrangendo todos os sofrimentos físicos ou morais, só possível de ser verificada nas pessoas físicas. O ataque injusto ao conceito de pessoa

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jurídica só é ser reparado na medida em que ocasiona prejuízo e ordem patrimonial.

No entanto, atualmente se tem constatado o fortalecimento jurisprudencial no

sentido de se admitir o dano moral vinculado a pessoa jurídica, preceito que é

confirmado pela Súmula 227 do Supremo Tribunal de Justiça: “a pessoa jurídica pode

sofrer dano moral”, mesmo porque o entendimento prevalecente afirma o dever de se

analisar os efeitos decorrentes da lesão sofrida e não a natureza do bem jurídico

atingido.

Consubstanciado na admissão desse preceito o STJ, 4° Turma, RESP n.

60.033-2, decidiu que:

Quando se trata de pessoa jurídica, o tema da ofensa à honra propõe uma distinção inicial: a honra subjetiva, inerente à pessoa física, que está no psiquismo de cada um e pode ser ofendido com atos que atinjam a sua dignidade, respeito próprio, atuo-estima, etc., causadores de dor, humilhação, vexame, a honra objetiva, externa ao sujeito, que consiste no respeito, admiração, apreço, consideração que os outros dispensam a pessoa. Por isso ser a injúria um ataque à honra subjetiva, a dignidade da pessoa, enquanto a difamação é ofensa à reputação que o ofendido goza no âmbito social onde vive. A pessoa jurídica, criação de ordem legal, não tem capacidade de sentir emoção e dor, estando por isso desprovida de honra subjetiva e imune à própria injúria. Pode padecer, porém, de ataque à honra objetiva, pois goza de uma reputação junto a terceiros, passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo civil ou comercial onde atua. Essa ofensa pode ter seu efeito limitado à diminuição do conceito público de que goza no seio da comunidade, sem repercussão direta e imediata sobre o seu patrimônio. Assim, embora a lição contrária de inúmeros doutores (Horácio Ritman e Ramon Daniel Pizarro, El dano moral y l apersona jurídica, RDPC, p. 215, trata-se de verdadeiro dano extrapatrimonial, que existe e pode ser mensurado através de arbitramento). É certo, que, além disso, o dano à reputação da pessoa jurídica pode causar-lhe dano patrimonial, através do abalo de crédito, perda efetiva de chances de negócios e de celebração de contratos, diminuição de clientela, etc., donde concluo que as duas espécies de danos podem ser cumulativas, não excludentes.

Na área do Direito da Propriedade Industrial, já se abordou o tema

concretamente, conforme o excerto abaixo destacado, referente à Apelação Cível n.º

63.084-1 (In "JTJ", vol. 191/172), 2ª Câmara Cível do TJSP (votação unânime), Rel.

Des. J. Roberto Bedran, julgada em 17/09/1996, in verbis:

Afinal, o nome comercial, na sua dúplice função subjetiva e objetiva, projetando a própria identidade da empresa, influencia sobremaneira no público consumidor em geral, na medida em que a torna imediatamente conhecida, bem assim aos seus produtos e serviços, ‘firmando a reputação, o crédito, o conceito e a fama da empresa,

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21

impondo à confiança e à preferência do consumidor os produtos que vende ou fabrica... O que a lei visa a proteger, portanto, através da proteção do nome comercial, é a própria atividade da empresa, considerada como o complexo de meios idôneos, materiais e imateriais, pelos quais o comerciante explora determinada espécie de comércio. Entre esses meios imateriais compreende-se o elemento MORAL, a que no início nos referimos, isto é, o crédito, a reputação, a preferência e o favor público, o renome do estabelecimento e a notoriedade dos produtos... Esse complexo de elementos que formam a reputação do comerciante, do estabelecimento e dos produtos, assegurando a probabilidade de se conservar a clientela habitual e de atrair novos compradores, é obra do tempo, do esforço diligente do comerciante, da honestidade de seus métodos de comércio, da qualidade e seleção de seus produtos, e, também, do favor público, constituindo, no dizer de CARVALHO DE MENDONÇA, o índice da prosperidade e da potência do estabelecimento comercial’ (JOÃO DA GAMA CERQUEIRA, ‘Tratado da Propriedade Industrial", vol. 2/1. 162-1. 163, n. 780, Editora Revista dos Tribunais, 2ª ed.).

(...) Tem procedência, também, o pedido de indenização por perdas e danos, que resultam inegavelmente do simples EMPREGO INDEVIDO E DESAUTORIZADO do nome comercial e DA MARCA, a caracterizar usurpação parcial, suscetível de gerar confusão no público em geral. Para tanto, não seria mister apurar-se, concretamente, se a autora deixou de lucrar com tal expediente, e nem, tampouco, se a ré experimentou vantagens. O DANO, com a prática ilícita, até mesmo de natureza imaterial, pela afetação do elemento MORAL da empresa titular, está in re ipsa, lesando forçosamente o seu patrimônio, no mínimo, como alegado no libelo, pela falta de retribuição desse uso, a exemplo do que se passaria num contrato de licenciamento, possibilitando ao infrator um locupletamento indevido e injusto." (grifos nossos; ver, também, Ap. n.º 121.908-1, julgada em 26/04/90, 5ª C. TJSP, Rel. Des. Márcio Bonilha, in "JTJ", vol. 129/225)

Além dos entendimentos jurisprudenciais a respeito da matéria, a Lei

9279/1996, manifesta claramente no art. 209 que:

Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento e prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previsto nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais, prestadores de serviço, ou entre produtos e serviços postos no comércio.

Cumpre enfim, mencionar a Constituição Federal, particularmente os incisos

V e X do art. 5o., que prescrevem:

V – É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem. X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

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22

No preceito do artigo 5°, inciso V da Constituição Federal o dano à imagem

pode ser considerado como uma espécie de dano moral. Em específico no direito

marcário em que as marcas identificam produtos ou serviços fabricados e

comercializados por uma empresa ou pessoa física de direito privado a luz da tese do

princípio da identidade ocorrerá o dano à imagem pelo seu uso indevido e

desautorizado.

Por outro lado, haverá todo um reflexo danoso a empresa com relação a sua

clientela, a qualidade de seus serviços, ao renome do estabelecimento que constituem o

elemento moral que englobam tanto os bens materiais quanto aos imateriais quando

existirem conflitos de nomes empresariais, preconizado pelo artigo 5°, inciso XXIX da

Constituição Federal. Diz Barbosa (2008, p. 01) que a “natureza desses direitos é o

monopólio – ou uso privativo do mercado – e, assim, tal natureza se expressa num

poder de proibir terceiros de usar o nome empresarial (...) independente de qualquer

dano, lesão, culpa, boa ou má-fé”.

O que nos parece é que caracterizado estará a existência do dano moral e a

imagem quando se verificar conflitos de nomes empresariais, gerando confusão, dúvida

engano para a clientela, como também suas respectivas marcas, quando contrafeitas e

usurpadas, utilizando-se a teoria da presunção do dano.

Há uma estreita ligação entre os danos moral e a imagem, um não excluindo o

outro, sendo o segundo, uma espécie do primeiro, vez que o dano à imagem é uma

violação ao direito da personalidade, que atinge um bem imaterial, de natureza não

pecuniária.

Pela forte correlação entre o dano moral e o direito à imagem da pessoa

jurídica que se exterioriza pela sua marca e pelos produtos, verificadas as hipóteses das

lesões perpetradas, configurados estarão o dever de indenizar patrimonialmente.

Assim, os casos acima mencionados geram para o lesante o dever de indenizar

em casos de uso indevido e desautorizado de marcas, provado o simples uso desta, seja

pela exposição em qualquer veículo informativo, seja pelo assinalamento de produtos,

instituído está o dever de indenizar, tanto patrimonialmente fulcrado nos lucros

cessantes, como pelo dano moral, sendo, via de regra a presunção de dano, esta com

relação ao dano patrimonial baseado nos royalties não recebidos pelo titular da marca e,

com relação ao dano moral, pela diluição da marca, que afeta o nome e o conceito do

titular.

Page 23: 315DICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL PELA PERDA DE …

23

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve como principal objetivo analisar a perda de chance no

que concerne ao Direito Marcário na Lei 9.279/96. Em sendo Lei especial e, portanto

distinta dos preceitos adotados no Código Civil, afere-se que o simples uso da marca –

que é o fato da violação – gera o dever de indenizar, isto é, ficam sujeitos à indenização

os casos que houver o uso indevido e desautorizado de marca, aplicando-se a teoria do

dano presumido.

Certo que, como exposto no artigo, quando se verificar a possibilidade da

aplicação da teoria do dano presumido, o magistrado deverá ter em conta se não há uma

onerosidade excessiva ou utilidade duvidosa dela em casos com repercussões ínfimas

para o titular da marca e, em contrapartida, de grandes repercussões para o infrator.

Portanto, é de bom alvitre sempre observar o princípio da proporcionalidade, analisando

o caso concreto.

Por outro lado, é importante a teoria da presunção do dano para se coibir a

violação de marcas, combatendo a pirataria e falsificação que continuam a crescer em

virtude da impunidade e não responsabilização dos infratores.

Somente assim, adotando como regra a teoria do dano presumível, ter-se-á a

eficácia da proteção dos direitos marcários, posto que a premissa atual dos Tribunais

quanto à prevenção e repressão ao uso indevido e desautorizado de marcas, irá

desestimular e punir os infratores da prática futura de atos semelhantes.

Importante também destacar que a teoria do dano presumido abarcará tanto os

danos patrimoniais, quanto os morais e a imagem. Nos casos de uso indevido e

desautorizado de marcas, provado o simples uso desta, seja pela sua exposição em

qualquer veiculo informativo, seja pelo assinalamento de produtos, instituído está o

dever de indenizar, tanto patrimonialmente, fulcrado principalmente nos lucros

cessantes, como pelo dano moral que afeta o nome e o conceito de seu titular.

Dessa maneira, o papel da jurisprudência será decisivo para consolidar uma

atitude mais diligente, prudente e honesta do empresariado, já que estarão cientes da não

aquiescência dos tribunais e do recrudescimento dos julgados para com os atos que

infrinjam a marca registrada de terceiros.

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