12 Catequese do ano da Fé

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    AUDINCIA GERAL

    Sala Paulo VI

    Quarta-feira, 9 de Janeiro de 2013

    Fez-se homem

    Queridos irmos e irms,

    Neste tempo natalcio, voltamos a meditar mais uma vez sobre o grande mistrio deDeus que desceu do seu Cu para entrar na nossa carne. Em Jesus, Deus encarnou-se,tornou-se homem como ns e assim abriu-nos o caminho para o seu Cu, rumo plenacomunho com Ele.

    Nestes dias, nas nossas igrejas ressoou inmeras vezes o termo Encarnao de Deus,para expressar a realidade que celebramos no Santo Natal: o Filho de Deus fez-sehomem, como recitamos no Credo. Mas o que significa esta palavra central para a fcrist? Encarnao deriva do latim incarnatio. Santo Incio de Antioquia no finaldo primeiro sculo e, acima de tudo, santo Ireneu, utilizaram este termo, meditandoacerca do Prlogo do Evangelho de so Joo, de modo particular sobre a expresso: OVerbo fez-se carne (Jo 1, 14). Aqui, a palavra carne, em conformidade com o usohebraico, indica o homem na sua integridade, o homem todo, mas precisamente sob oaspecto da sua caducidade e temporalidade, da sua pobreza e contingncia. Isto, paranos dizer que a salvao trazida por Deus que se fez carne em Jesus de Nazar atinge ohomem na sua realidade concreta e em qualquer situao em que se encontre. Deusassumiu a condio humana para a purificar de tudo aquilo que a separa dele, para nos

    permitir cham-lo, no seu Filho Unignito, com o nome Ab, Pai e assim serverdadeiramente filhos de Deus. Santo Ireneu afirma: Este o motivo pelo qual oVerbo se fez homem, e o Filho de Deus, Filho do homem: para que o homem, entrandoem comunho com o Verbo e recebendo assim a filiao divina, se tornasse filho deDeus (Adversus haereses, 3, 19, 1: PG 7, 939; cf. Catecismo da Igreja Catlica, n.460).

    O Verbo fez-se carne uma daquelas verdades com as quais estamos to habituadosque j quase no nos impressiona pela grandeza do acontecimento que ela exprime. Eefectivamente neste perodo natalcio, durante o qual tal expresso volta com frequnciana liturgia, s vezes prestamos mais ateno aos aspectos exteriores, s cores da festa,

    do que ao corao da grandiosa novidade crist que celebramos: algo absolutamenteimpensvel, que s Deus podia realizar, e no qual podemos entrar s mediante a f. OLogos, que est em Deus, o Logos que Deus, o Criador do mundo (cf. Jo 1, 1), porQuem foram criadas todas as coisas (cf. 1, 3), que acompanhou e acompanha os homensna histria com a sua luz (cf. 1, 4-5; 1, 9), torna-se um no meio dos outros, adquiremorada entre ns, torna-se um de ns (cf. 1, 14). O Conclio Ecumnico Vaticano IIafirma: O Filho de Deus... Trabalhou com mos humanas, pensou com umainteligncia humana, agiu com uma vontade humana, amou com um corao humano.

    Nascido da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de ns, semelhante a ns emtudo, excepto no pecado (Constituio Gaudium et spes, 22). Ento, importanterecuperar a reverncia diante deste mistrio, deixar-se envolver pela grandeza deste

    acontecimento: Deus, o Deus verdadeiro, Criador de tudo, percorreu como homem asnossas estradas, entrando no tempo do homem, para nos comunicar a sua prpria vida

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    (cf. 1 Jo 1, 1-4). E f-lo no com o esplendor de um soberano que com o seu podersubmete o mundo, mas com a humildade de um menino.

    Gostaria de frisar um segundo elemento. No Santo Natal geralmente trocamos algunsdons com as pessoas mais prximas. s vezes pode ser um gesto feito por conveno,

    mas em geral exprime carinho, um sinal de amor e de estima. Na orao sobre oofertrio da Missa da noite da solenidade do Natal, a Igreja reza assim: Aceitai, Pai,a nossa oferta nesta noite de luz, e atravs deste misterioso intercmbio de dons,transformai-nos em Cristo vosso Filho, que elevou o homem ao seu lado na glria. Porconseguinte, o pensamento da doao est no centro da liturgia e na nossa conscinciaevoca o dom originrio do Natal: naquela noite santa Deus, fazendo-se carne, quisentregar-se pelos homens, doou-se a si mesmo por ns; Deus ofereceu-nos o seu nicoFilho, assumiu a nossa humanidade para nos conferir a sua divindade. Este o grandedom. Tambm no nosso doar no importante que um presente seja caro ou no; quemno consegue doar um pouco de si mesmo, doa sempre muito pouco; alis, s vezes

    procura-se precisamente substituir o corao e o compromisso de doao de si mesmo

    com o dinheiro, com coisas materiais. O mistrio da Encarnao indica que Deus nofez assim: no concedeu algo, mas doou-se a si mesmo no seu Filho Unignito.Encontremos aqui o modelo do nosso doar, a fim de que os nossos relacionamentos,especialmente os mais importantes, sejam guiados pela gratuidade do amor.

    Gostaria de oferecer uma terceira reflexo: o acontecimento da Encarnao, de Deusque se faz homem como ns, que nos mostra o realismo inaudito do amor divino. Comefeito, o agir de Deus no se limita s palavras, alis, poderamos dizer que Ele no secontenta com falar, mas insere-se na nossa histria e assume sobre si a dificuldade e o

    peso da vida humana. O Filho de Deus fez-se verdadeiramente homem, nasceu daVirgem Maria, numa poca e num lugar determinados, em Belm, durante o reino doimperador Augusto, sob o governador Quirino (cf. Lc 2, 1-2); cresceu no seio de umafamlia, teve amigos, formou um grupo de discpulos, instruiu os apstolos para darcontinuidade sua misso e terminou o curso da sua vida terrena na cruz. Este modo deagir de Deus um forte estmulo a interrogar-nos sobre o realismo da nossa f, que nose deve limitar esfera do sentimento, das emoes deve entrar no concreto da nossaexistncia, ou seja, deve referir-se nossa vida de todos os dias e orient-la inclusive demodo prtico. Deus no se limitou s palavras, mas indicou-nos como viver,compartilhando a nossa prpria experincia, excepto no pecado. O Catecismo de so PioX, que alguns de ns estudaram quando eram jovens, com a sua essencialidade,

    pergunta: O que devemos fazer para viver segundo Deus?, d esta resposta: Para

    viver segundo Deus, devemos acreditar nas verdades reveladas por Ele e observar osseus mandamentos com a ajuda da sua graa, que se obtm mediante os sacramentos e aorao. A f tem um aspecto fundamental, que diz respeito no s mente e aocorao, mas nossa vida inteira.

    Proponho um ltimo elemento vossa reflexo. So Joo afirma que o Verbo, oLogos,estava em Deus desde o princpio, e que tudo foi feito atravs do Verbo e nada do queexiste foi criado sem Ele (cf. Jo 1, 1-3). O evangelista alude claramente narrao dacriao, que se encontra nos primeiros captulos do Livro do Gnesis, relendo-o luz deCristo. Este um critrio fundamental na leitura crist da Bblia: o Antigo e o NovoTestamento devem ser lidos sempre juntos, e a partir do Novo que se revela o sentido

    mais profundo tambm do Antigo. Aquele mesmo Verbo que existe desde sempre emDeus, que Ele mesmo Deus e por meio do qual e em vista do qual tudo foi criado (cf.

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    Cl1, 16-17), fez-se homem: o Deus eterno e infinito imergiu-se na finitude humana, nasua criatura, para reconduzir a Ele o homem e a criao inteira. O Catecismo da IgrejaCatlica afirma: A primeira criao encontrou o seu sentido e apogeu na nova criaoem Cristo, cujo esplendor ultrapassa o da primeira (n. 349). Os Padres da Igrejacompararam Jesus com Ado, a ponto de o definir segundo Ado, ou o Ado

    definitivo, a imagem perfeita de Deus. Com a Encarnao do Filho de Deus tem lugaruma nova criao, que oferece a resposta completa interrogao: Quem ohomem?. S em Jesus se manifesta completamente o desgnio de Deus sobre o serhumano: Ele o homem definitivo, segundo Deus. O Conclio Vaticano II reitera comvigor: Na realidade, s no mistrio do Verbo Encarnado que se esclareceverdadeiramente o mistrio do homem... Cristo, novo Ado, na prpria revelao domistrio do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a sua vocaosublime (Constituio Gaudium et spes, 22; cf. Catecismo da Igreja Catlica, n. 359).

    Naquele menino, o Filho de Deus contemplado no Natal, podemos reconhecer averdadeira face, no apenas de Deus, mas o rosto autntico do ser humano; e sabrindo-nos aco da sua graa e procurando segui-lo todos os dias, realizamos o

    desgnio de Deus sobre ns, sobre cada um de ns.

    Caros amigos, neste perodo meditemos sobre a grande e maravilhosa riqueza doMistrio da Encarnao, para permitir que o Senhor nos ilumine e nos transforme cadavez, imagem do seu Filho que por ns se fez homem.