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    W e - Re vi s ta S OC I OD I AL E TO www.socio ia et o.com. rBacharelado e Licenciatura em Letras UEMS/Campo GrandeM e s t r a d o e m L e t r a s U E M S / C a m p o G r a n d e

    I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 V o l u m e 3 N m e r o 9 m a r o 2 0 1 3E d i o E s p e c i a l H o m e n a g e a d a

    PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA

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    A VARIAO LINGUSTICA EM LIVROS DIDTICOS DE

    LNGUA PORTUGUESA

    Franciele Marques da Silva*[email protected]

    Marilda Alves Ado Carvalho (UEG-Quirinpolis)[email protected]

    RESUMO: Este artigo que se fundamenta nos constructos tericos da Sociolingustica, especialmente daSociolingustica Variacionista, numa interface com a teoria Sociointeracionista, traz luz umainvestigao focada em dois livros didticos de lngua portuguesa 9 ano: Ararib Portugus, obracoletiva, e Viva Portugus, de Elizabeth Marques Campos et al., ambos indicados pelo Programa nacionaldo Livro Didtico PNLD, com o objetivo de averiguar como esses livros tratam o fenmeno davariao lingustica. Para tanto, buscou-se construir um quadro terico capaz de dar conta de configurar alngua em sua natureza heterognea, bem como estritamente relacionada a aspectos socioculturais,voltando-se o olhar ao tratamento dessa natureza da lngua nos Parmetros Curriculares Nacionais - PCNs(BRASIL, 2000). Utilizou-se, portanto, para o trabalho, a pesquisa bibliogrfica e documental; quanto aosobjetivos, a pesquisa descritiva, de cunho qualitativo e quanto perspectiva terica, a pesquisa aplicada.Para anlise dos livros, foram selecionados de "Ararib Portugus" quatro textos, seguidos de suas

    respectivas atividades, e uma atividade de gramtica, enquanto que do livro "Viva Portugus",selecionou-se apenas um exerccio. Essas selees foram feitas tendo em vista referncias variaolingustica nos textos e atividades que, aps analisados, permitiram confirmar a hiptese do trabalho: oestudo da variao lingustica no privilegiado nos livros didticos de forma significativa.PALAVRAS-CHAVE: Sociolingustica; variao lingustica; livro didtico.

    ABSTRACT: This article is based on the theoretical constructs of Sociolinguistics, especiallySociolinguistics Variationist, an interface with the theory social interactionist, it brings to light aninvestigation focused on two textbooks Portuguese Language - 9th grade: Ararib Portuguese, collectivework and Viva Portuguese , Elizabeth Campos Marques et al., both appointed by National Textbook

    program - PNLD, with the aim to ascertain how these books deal with the phenomenon of linguisticvariation. For both, we sought to build a theoretical framework able to realize configure the language in

    their heterogeneous nature, as well as closely related to socio-cultural aspects, turning his gaze to thetreatment of this kind of language in the National Curriculum Guidelines- PCNs (BRAZIL, 2000). Weused, therefore, to task, to bibliographic and documentary, about the aims, descriptive research, aqualitative and theoretical perspective as to, applied research. For analysis of the books were selected"Ararib Portuguese" four texts, followed by their activities, and an activity grammar, while the book"Viva Portuguese" was selected only an exercise. These selections were made in view of references tolinguistic variation in the texts and activities that, after analysis, the confirmation of the hypothesis of thestudy: the study of linguistic variation is not privileged in textbooks significantly.KEYWORDS: Sociolinguistics, linguistic variation; textbook.

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    Graduada do Curso de Letras da UEG - Quirinpolis.

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    INTRODUO

    A democratizao do ensino, ocorrida nos anos 80, trouxe, conforme aponta a

    bibliografia consultada, uma mudana considervel no ensino - aprendizagem da lngua,

    visto que at ento, as implicaes de natureza social no uso da lngua modalidade no

    eram levadas em conta. A escola, em sendo de pertencimento de indivduos

    elitizados, tinha por dever a propagao de uma lngua homognea, uniforme e, por

    que no dizer, uma lnguaprpria para caracterizar e distinguir a classe de prestgio.A ideologia dos livros didticos era tambm, por sua vez, de elitizao da

    lngua portuguesa e, por isso, esses livros fundamentavam/fundamentam-se numa

    abordagem eminentemente estruturalista, para a qual as lnguas apresentavam/

    apresentam uma estrutura nica e fixa, sem qualquer tratamento s situaes reais de

    fala e/ou comunicao, pois se vale/valia somente da lngua enquanto sistema. Os livros

    didticos, em se prestando, portanto, a uma clientela favorecida social e culturalmente,

    priorizavam/priorizam a arte do bem falar e do bem escrever, ou seja, a gramtica

    normativa.

    Quando se afirma, pois, que a democratizao do ensino implicou em mudana

    no ensino-aprendizagem da lngua, essa mudana ocorreu em razo de a escola no mais

    se voltar to somente elite da sociedade, mas tambm classe popular que, desprovida

    de situaes lingusticas prprias da escolarizao e/ou do mundo letrado, mescla os

    traos lingusticos prprios de sua realidade, de sua cultura aos traos lingusticos

    daqueles da elite. Esses traos, embora tomados preconceituosamente como erros ou

    desvios da norma de prestgio, nada mais so que variedades lingusticas, cuja

    existncia se funda e fundamenta-se na natureza multiforme, heterognea da lngua.

    Com o processo de heterogeneizao da clientela escolar, escola e professor,

    especificamente, de lngua portuguesa, veem-se s voltas com um novo modo de se

    conceber a lngua, tendo-se, portanto, no s de acolherem ou aceitaremos distintos

    traos lingusticos dos alunos, como tambm de cederem espao para a incluso da

    diversidade da lngua no processo ensino e aprendizagem, privilegiando, assim, esses

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    distintos traos lingusticos dos aprendizes, muito embora sem lhes negar o acesso

    variedade preconizada como de prestgio.

    O momento e a prpria situao implicam, desse modo, na quebra de

    centralizao do modelo estrutural no ensino da lngua, tornando-se inegvel a

    contribuio de novos estudos lingusticos, dentre os quais os da Sociolingustica que,

    ao estudar a relao lngua,sociedade, possibilitou/possibilita uma prtica pedaggica

    norteada por discursos variados, bem como numa viso de lngua multiforme, s

    possvel de ser analisada em situaes de uso.

    Os Parmetros Curriculares Nacionais de Lngua Portuguesa - PCNs (BRASIL,

    2000), documento de suma importncia no que se refere inovao do ensino-

    aprendizagem da lngua materna, isso por estar em consonncia com as pesquisas

    lingusticas, ao se remeterem aos estudos sociolingusticos na sala de aula, reforam a

    importncia e necessidade dos mesmos, a fim de propiciar a professor e aluno reflexes

    sobre o funcionamento da lngua sob as diferentes esferas de circulao.

    Frente, pois, s vastas contribuies advindas de estudos lingusticos e dos

    prprios PCNs de lngua portuguesa, pergunta-se: E o livro didtico? Ele se configura

    como um documento e/ou material que segue ou se adequa s inovaes lingusticas,

    contribuindo com o trabalho do professor? Que concepo ou viso de lngua ele

    veicula? Essas indagaes se fazem por se acreditar que, ao se colocar a escola e,

    obviamente, o professor de lngua portuguesa como responsveis pelo ensino-

    aprendizagem da lngua numa viso multifacetada, varivel, no se pode deixar de

    considerar o papel do LD, ou mesmo, como os contedos so nele configurados, em

    especfico, a variao da lngua. No um fato novidadeiro dizer que, em meio a tantas

    obras e tantos outros meios de o professor lanar mo para preparar suas aulas, o LD se

    caracteriza e/ou se constitui como o principal veculo nessa tarefa.

    Muitas vezes, observa-se ser ele (o LD), o nico material utilizado pelo

    professor em sala de aula, e esse material, como qualquer outro, no capaz de dar

    sustentao terica e metodolgica, na sua totalidade, prtica pedaggica docente. Ele

    apresenta lacunas, cancelamentos que necessitam ser preenchidos com a utilizao de

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    outros recursos, bem como traz silenciamentos que precisam ser transformados em

    vozes discursivas.

    Assim sendo, este artigo, que se fundamenta nos constructos tericos da

    Sociolingustica Variacionista, numa interface com a teoria Sociointeracionista, tem

    como objetivo geral averiguar como o livro didtico trata o fenmeno da variao da

    lngua. Esse objetivo propiciar, pois, o reconhecimento e compreenso do lugar

    ocupado pela fala e, logo, pela Sociolingustica nas aulas de lngua portuguesa, isso em

    virtude de se levar em conta o lcus privilegiado dos contedos inscritos no LD na

    prtica do professor.

    2. PRESSUPOSTOS TERICOS

    2.1 As implicaes sociais no uso da lngua/ da linguagem

    O aspecto social da lngua fato j bastante colocado em discusso e em debate

    por estudos lingusticos, de tal forma a facultar a compreenso de as relaes do homem

    com seu universo de vida, com sua realidade e, essencialmente, com o outro s se

    construrem por meio do trabalho, da ao da linguagem e pelo uso que se faz da lngua.

    Desse modo, pensar nos usos lingusticos pelo homem implica pensar os espaos sociais

    em que ele est inserido ou se insere, ideia essa corroborada por Soares (2009, p. 65) ao

    afirmar que [...] no se pode considerar a lngua fora do contexto social, na medida em

    que sua funo seria no apenas transmitir informaes, como tambm estabelecer e

    manter contatos sociais entre os falantes [...].

    No que tange s implicaes sociais no uso da lngua, se se tomar a postulao

    de Saussure (2006, p. 17) para o qual a lngua um produto social da (...) linguagem e

    um conjunto de convenes necessrias, adotadas pelo corpo social para permitir o

    exerccio dessa faculdade nos indivduos, entende-se esse fato social no em funo de

    ele estar interrelacionado lngua, mas por consider-lo como independente do

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    indivduo e a ele imposto. Social porque pertence a todos e por tratar a lngua como

    sistema convencional adquirido pelos indivduos no convvio em sociedade.

    Todavia, contrapondo-se a essa viso estrutural de linguagem e de lngua, em

    que ambas so excludas de contingncias scio-histricas, culturais e ideolgicas,

    busca-se na teoria sociointeracionista uma nova/outra dimenso para se caracterizar a

    lngua(gem) como fato social. Isso se faz no somente por compreender a lngua e a

    linguagem como meios de comunicao, mas tambm de interao e como prticas que

    propiciam ao homem o agir social. Segundo Maingueneau (1996, p.19), [...] a

    linguagem no mais concebida como meio de os locutores exprimirem seus

    pensamentos ou at transmitirem informaes, mas antes como uma atividade que

    modifica uma situao [...].

    Para Orlandi (1996, p. 82) A linguagem est estendida como mediao

    necessria, no instrumento, mas ao que transforma. Desse modo, no podemos

    estud-la fora da sociedade [...]. E, nesse sentido, em sendo o homem um ser social e a

    sociedade constituda por diferentes comunidades, classes de pessoas, diferentes sero

    seus usos lingusticos. Para Sapir (1969, p. 26), a lngua , antes de tudo, um produto

    cultural, ou social, e assim deve ser entendida. J para Bakhtin (2006) a lngua

    constituda por signos ideolgicos, construidos scio-historicamente e que refletem as

    mudanas ocorridas na sociedade. Razo de lngua, linguagem e sociedade serem

    inseparveis.

    Logo, ao se atribuir relevncia relao entre lngua e sociedade, toma-se como

    necessrio um ensino-aprendizagem que prime por essa relevncia, bem como se espera

    que o livro didtico contribua com professor e aluno nessa viso de lngua e na

    construo do sujeito social.

    2.3 Concepes de linguagem e de lngua

    Ao se discutir e analisar em como o livro didtico trata a questo da

    variabilidade lingustica, acredita-se ser de suma importncia voltar tambm o olhar

    para a concepo de lngua e linguagem que o norteia, pois conforme elucida Travaglia

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    (2008 p. 21) (...)o modo como se concebe a natureza fundamental da lngua altera em

    muito o como se estrutura o trabalho com a lngua em termos de ensino. A concepo

    de linguagem to importante quanto postura que se tem relativamente educao.

    Portanto, o professor precisa estar atento e aberto ao desenvolvimento dos estudos

    lingusticos para que possa, ento, alterar e/ou mudar o seu trabalho com a lngua,

    optando-se no pela concepo que melhor lhe convm, mas por aquela que responda,

    satisfatoriamente, ao desenvolvimento da competncia comunicativa do aluno.

    Desta feita, dentre as trs concepes, toma-se aqui a concepo de linguagem

    como expresso do pensamento, a qual trata a lngua como um sistema idealizado, de

    forma tal a privilegiar o ensino da gramtica normativa e conceber que as leis da lngua

    so regidas pelas leis do pensamento. Sobre isso, afirma Travaglia (2008, p.21) a

    expresso se edifica no interior da mente e sua exteriorizao funciona como uma

    espcie de traduo do pensamento.

    Nesse modelo terico, no h espao para a interao entre os indivduos por

    meio da lngua(gem), e assim, ela refletida por meio da enunciao monolgica,

    concordando com Bakhtin (2006, p. 114), ao postular que a lngua se apresenta como

    um ato puramente individual, como uma expresso da conscincia individual, de

    seus desejos, suas intenes, seus impulsos criadores, seus gostos, etc.

    Contrapondo-se em partes a essa concepo, tem-se a concepo de linguagem

    como instrumento de comunicao que toma a lngua(gem) como um objeto autnomo,

    pois ignora o papel dos interlocutores, o processo de produo da lngua, bem como os

    fatores de ordem scio-histricos, culturais e ideolgicos indissociveis da mesma. A

    indissociabilidade acontece para privilegi-la como um sistema de cdigos imutveis que

    transmite mensagens de um emissor para um receptor, todavia, tomando a lngua

    isolada de suas situaes de uso. A funo da lngua , por conseguinte, to somente de

    prestar-se como meio de comunicao entre os indivduos.

    Diferentemente das outras duas concepes, tem-se a concepo de linguagem

    como interao, a qual se volta interao humana, ao dilogo, visto que a lngua(gem)

    tem natureza interacional e dialgica. De acordo com o PCN de lngua portuguesa do

    Ensino Mdio (BRASIL, 2000, p. 5) no h linguagem no vazio, seu grande objetivo

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    a interao, a comunicao com o outro, dentro de um espao social [...].Assim, o

    indivduo, no processo de comunicao, no s transmite uma mensagem a ser

    decodificada/decifrada pelo interlocutor, mas, principalmente, age, atua sobre ele, em

    busca da interao comunicativa, o que faculta entender que a concepo de linguagem

    constitui-se por prticas scio-cognitivo-interativas.

    No ensino da lngua fundamentado nessa concepo, no h anulao do ensino

    gramatical, ao contrrio, abre-se, por meio da leitura e da escrita reflexo sobre os

    fatos gramaticais e/ou lingusticos, de forma a privilegiar a lngua(gem) com toda sua

    diversidade. Entra-se, ento, em cena o estudo das variedades lingusticas, e o

    indivduo, de um estado de passividade frente s questes de lngua(gem), passa a um

    estado de atividade. Tem agora, independncia intelectual e, ao mesmo tempo, seus

    conhecimentos de mundo passam a ser valorizados.

    Reportando-se valorizao dos conhecimentos de mundo do indivduo,

    reconhece-se que o fundamento da concepo de linguagem como interao encontra-

    se, justamente, numa abordagem dialtica de produo do conhecimento, pois com o

    dilogo, com a interao, os sujeitos se constroem, constroem suas vises de mundo,

    seus conhecimentos. Por isso, a lngua(em) caracteriza-se como social, visto ser

    resultante de uma construo coletiva e por estar intrinsecamente relacionada a fatores

    extralingusticos.

    Nesse sentido, considerar o escopo social dessa concepo de linguagem,

    implica considerar que os usos lingusticos do homem so inegavelmente influenciados

    pela sociedade.

    2.4 A Sociolingustica e seu objeto de estudo

    Contrariamente, aos princpios do Estruturalismo de Saussure e do Gerativismo

    de Chomsky que concebem a lngua como realidade abstrata, independente de fatores

    extralingusticos, nasce, na dcada de 60, nos Estados Unidos, a Sociolingustica, tendo

    como representante de expresso William Labov. Sobre essa corrente lingustica, afirma

    Mollica e Braga (2008. P. 9) A Sociolingustica (...) estuda a lngua em uso no seio das

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    comunidades de fala, voltando a ateno para um tipo de investigao que correlaciona

    aspectos lingusticos e sociais.

    A Sociolingustica, ao se ater relao lnguasociedade, volta-se,

    consequentemente, aos usos lingusticos de falantes em distintos contextos sociais e

    situaes. Para Bagno (2007, p. 38), o objetivo central da Sociolingustica, como

    disciplina cientfica, precisamente relacionar a heterogeneidade lingustica com a

    heterogeneidade social. Lngua e sociedade esto indissoluvelmente entrelaadas [...].

    Todavia, o objeto de estudo da Sociolingustica so as variaes ocorrentes na lngua

    falada que, diferentemente da tica estruturalista e gerativa, tomada como entidade

    concreta, heterognea, na relao com seus usurios no contexto geogrfico, social e

    interacional.

    Ressalta-se que a heterogeneidade da lngua somente adquiriu status cientfico, a

    partir de pesquisas desenvolvidas por Labov, em 1963, na Ilha de MarthasVineyard,

    no estado de Massachussets, Estados Unidos, onde estudou o ingls ali falado e, em

    1964, na cidade de Nova York, com o estudo da estratificao social do ingls falado

    nessa cidade. Com esses estudos, Labov consegue comprovar a variao de usos da

    lngua em funo da variao social e, define a lngua falada como escopo da

    Sociolingustica. Surge, ento, a Sociolingustica Variacionista, com que se firma a

    variao da lngua, porque estritamente associada a fenmenos ou aspectos

    extralingusticos.

    Negar, portanto, essa realidade lingustica, significa neg-la como um fato

    social, bem como um organismo vivo que est em constante movimento. A variao

    lingustica, para Mollica e Braga (2008) entendida pela Sociolingustica como um

    princpio geral e universal passvel de anlise e descrio cientfica, como tambm um

    fenmeno presente em todas as lnguas naturais.

    Nessa linha de pensamento, h muito no se pode mais aceitar e utilizar-se de

    uma prtica pedaggica que anula os conceitos sociolingusticos, pois, em assim sendo,

    o professor favorece no s o desconhecimento da influncia sociocultural na lngua,

    mas tambm favorece a discriminao, o preconceito e, acima de tudo, a excluso social

    com a lngua e pela lngua. Pergunta-se, por conseguinte: O livro didtico contribui com

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    para abortar a excluso social mediante os contedos propostos ao professor e ao

    aluno?

    2.4.1 Variao lingustica

    De conformidade com as consideraes j apresentadas nesse artigo, desde a

    concepo de lngua(gem) como interao at abordagem dos pressupostos da

    Sociolingustica, o esforo tem se voltado apresentao da lngua como um processo e

    produto social, uma construo coletiva. Nesse sentido, ao assim apresent-la, o esforo

    converge necessidade de apresent-la como um fenmeno varivel, intrinsecamente

    relacionado s necessidades de comunicao e interao dos indivduos.

    A lngua s ganha forma, ou seja, s se materializa por meio de seus usurios, os

    quais so influenciados, de forma consubstancial, por aspectos socioculturais. Por isso,

    sua variao decorre do nvel de escolaridade do falante, do lugar geogrfico em que ele

    se acha inserido, de sua faixa etria, contexto situacional em que se encontra e outros

    fatores.

    Uma das caractersticas da lngua mesmo a dinamicidade, a multiformidade,

    determinadas por fatores de ordem estrutural e social, esta reconhecida como varivel

    extralingustica e aquela, lingustica. As escolhas lingusticas do falante so feitas,

    portanto, de acordo com suas necessidades, com suas convenincias e, diferentemente

    do que muitos pensam, no causam a deteriorao, o aviltamento da lngua. Na verdade,

    a riqueza, a preciosidade da lngua reside nas suas nuances, nas suas peculiaridades, as

    quais identificam o indivduo e o faz igual na diferena e diferente na igualdade.

    A negao a de modos distintos de se usar a lngua no passa de uma atitude

    preconceituosa que, tal como j referenciado, se d em virtude de, historicamente, ter-se

    construdo a norma padro, referenciada pelas gramticas normativas, como

    privilegiada socialmente, embora todas as variantes lingusticas tenham prestgio em

    seus contextos de uso, assim como estrutura e funcionamento.

    O ensino da lngua portuguesa, de acordo com os PCNs (BRASIL, 2000),

    responsabiliza-se pelo pleno desenvolvimento da competncia comunicativa do aluno,

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    de forma a convergir essa competncia ao pleno domnio e uso da lngua(gem) nas

    modalidades oral e escrita. Logo, quando se remete a esse pleno domnio e uso da

    lngua(gem), especialmente, na modalidade oral, o documento se reporta ao estudo das

    variaes lingusticas, o que significa anulao do ensino essencialmente tradicional, no

    qual a lngua(gem) esvaziada como meio de interao.

    Corroborando os pressupostos tericos da Sociolingustica, percebe-se que o

    documento em pauta combate veementemente o preconceito lingustico, porque aborda

    no haver o certo ou errado na lngua, mas sim, o adequado e o inadequado situao

    comunicativa. Coloca-se, desse modo, do lado de um ensino mais produtivo, mais

    inclusivo e mais democrtico da lngua. Os LDs, essencialmente, os adotados como

    corpusda pesquisa, contribuem para esse tipo de ensino?

    A bem da verdade, as variaes lingusticas so o reflexo mais genuno da

    identidade do indivduo. Neg-las significa, pois, negar ao homem o direito de dizer a

    lngua, bemcomo de ser e estar no mundo por meio da palavra. Fica-se aqui mais

    uma indagao: O LD contribui com esse direito de o indivduo dizer a lngua e com

    sua afirmao no mundo como sujeito?

    3. PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

    O fato de se eleger o livro didtico como objeto de anlise se deu em funo de

    ele, conforme apresentado no corpo terico deste artigo, caracterizar-se como um

    instrumento didtico que exerce grande influncia na prtica pedaggica de professores,

    chegando-se ao ponto de o que ensinar e o como ensinar ser por ele determinado.

    Essa escolha do objeto de anlise influenciou tambm, de modo significativo, no

    perfil da pesquisa que, por se fundamentar em pesquisas j realizadas e em autores que

    estudam a variao lingustica, bem como sobre o modo que esse assunto tratado no

    livro didtico de lngua portuguesa, caracteriza-se como, essencialmente, bibliogrfica e

    documental. Nesse ltimo caso, dado ao carter escrito e visual do LD, carter esse que

    possibilita compreend-lo como um documento.

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    Para tanto, inicialmente, foram definidos os LDs de lngua portuguesa a serem

    analisados, quando se escolheu os do 9 ano do Ensino Fundamental. A escolha da srie

    se fez em virtude de se compreender que, em estando o aluno no final do Ensino

    Fundamental, de suma importncia um estudo e conhecimento mais amplo sobre a

    natureza heterognea da lngua, visto ele, na atual conjuntura poltico-econmica do

    pas, j caminhar para o mercado de trabalho e at mesmo para uma participao social

    mais intensa, o que, sem dvida nenhuma, demanda competncia comunicativa.

    Quanto escolha dos dois LDs em que se props a analisar a variao

    lingustica, deu-se pelo conhecimento de esses livros serem indicados pelo Programa

    Nacional do livro Didtico PNLD e terem sido adotados no ano de 2011, em escolas

    de Santa Helena-Gois, cidade em que reside a pesquisadora.

    No que se trata dos objetivos, a pesquisa caracteriza como descritiva, de cunho

    qualitativo, pois, primeiramente, procedeu-se a escolha dos livros didticos de lngua

    portuguesa e, somente depois do conhecimento desses, foram escolhidas as partes a

    serem analisadas, sempre com os olhos voltados aos postulados tericos da presente

    investigao, tal como postulado por Barros e Lehfeld (1990).

    A opo pelos livros, Viva Portugus e Ararib Portugus, de autores diferentes,

    deu-se com o propsito de se observar e analisar a existncia ou no de diferenas de

    viso dos autores sobre a lngua e a linguagem e se, mesmo que hipoteticamente, esses

    autores se atentam para o desenvolvimento dos estudos lingusticos, principalmente,

    sobre a variao lingustica.

    Para a coleta e anlise dos dados, a perspectiva terica adotada foi a pesquisa aplicada

    que, para Lakatos e Marconi (2006) caracteriza-se em razo de seu carter prtico, o que

    significa aplicar os resultados na resoluo de problemas. Ressalta-se que a anlise do

    livro Ararib Portugusse deu tendo por princpio quatro textos, seguidos de algumas

    questes e uma atividade de gramtica, escolhidos em razo de serem motivadores para

    um amplo estudo sobre a heterogeneidade da lngua. Para o livro Viva Portugus

    selecionou-se apenas um exerccio, o nico do livro que trata do fenmeno da variao,

    contudo, aberto a um estudo de maior complexidade sobre o assunto.

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    4. A VARIAO LINGUSTICA NOS LIVROS DIDTICOS

    Considerando-se que o objetivo deste trabalho o de analisar o trabalho com a

    variao lingustica em dois livros do 9 ano, opta-se, portanto, por apresentar, no

    primeiro momento, aps a identificao de cada um dos livros, os textos e/ou atividades

    selecionadas para o estudo, se for o caso e, no segundo momento, os comentrios e/ou

    anlise.

    4.1. Livro didtico Ararib Portugus

    Texto 1 (p.90)

    Me disseram...

    Disseram-me.

    Hein?

    O correto "disseram-me". No "me disseram".

    Eu falo como quero. E te digo mais... Ou "digo-te?- O qu?

    Digo-te que voc...

    O "te" e o "voc" no combinam.

    Lhe digo?

    Tambm no. O que voc ia me dizer?

    Que voc est sendo grosseiro, pedante e chato. E que eu vou te partir a

    cara. Lhe partir a cara. Partir a sua cara. Como que se diz?

    Partir-te a cara.

    Pois . Parti-la hei de, se voc no parar de me corrigir. Ou corrigir-me.

    para o seu bem.

    LUS FERNANDO VERSSSIMOPapos. Comdias para se ler na escola

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    Rio de janeiro. Objetiva. 2001. (Fragmento)

    Qual o motivo da discusso entre as duas pessoas?

    A pessoa que corrige a outra defende que variedade lingustica?

    Em um contexto informal, como o da crnica que voc leu, que frase voc

    diria, mais frequentemente: me disseram ou disseram-me?

    Texto 2 (p. 94)

    Por uma destas coincidncias fatais, vrias personalidades brasileiras, entre civis

    e militares, esto no avio que comea a cair. No h possibilidade de se salvarem. O

    avio se espatifar - e, levando-se em considerao o carter dos seus passageiros,

    "espatifar" o termo apropriado - no cho. Nos poucos instantes que lhes restam de

    vida, todos rezam, confessam seus pecados, em verses resumidas, e entregam sua alma

    providncia divina. O avio se espatifa no cho.

    So Pedro os recebe de cara amarrada. O porta-voz do grupo se adianta e, j

    esperando o pior, comea a explicar quem so e de onde vm.

    LUS FERNANDO VERSSSIMOHbito nacional. Comdia para se ler na escola.

    Rio de janeiro: Objetiva, 2001. p. 8586. (Fragmento.)

    a)Na linguagem informal, no Brasil, a prclise muito mais frequente que a nclise.

    Identifique nessa crnica dois exemplos de emprego da prclise no lugar da nclise.

    b)Se escrita de acordo com as regras de colocao pronominal da variedade padro,

    como ficaria a orao O avio se espatifar no cho?

    c)Que efeito a frase que voc escreveu provocaria no texto?

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    Texto 3 (p. 96)

    a)Reescreva o primeiro balo da tira de acordo com a variedade padro da lngua.

    b)Que frase da tira confirma a observao de Eddie Sortudo?

    Texto 4 (p. 149)

    ltimo acorde do violino solitrio

    Nada sei sobre a vidinha do

    Pernilongo que mato indiferente

    Na parede.

    Mas desconfio que era a nica

    Que ele tinha

    ULISSES TEIXEIRACaindo na real. So Paulo. Brasiliense. 1984

    O autor empregou a regncia de um verbo de acordo com o uso coloquial e no

    de acordo com a variedade padro. Copie o trecho do poema em que isso

    acontece.

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    Atividade de n 6 (idem)

    Assinale a nica orao que est de acordo com a variedade padro em relao

    regncia verbal.

    Esqueci de que voc est me devendo dinheiro.

    Ele no me pagou a quantia de que me devia.

    O aluno visou ao gol e chutou forte.

    Prefiro acima de tudo sua amizade do que qualquer vantagem material.

    4.1 Anlise

    No livro didtico Ararib Portugus, constatou-se, por meio das atividades

    selecionadas, sejam elas relacionadas ou no aos textos, que, muito embora, os autores

    faam referncia variao lingustica, objetivam to s trabalhar contedos

    gramaticais (nem podendo falar em anlise lingustica), tendo em vista a aprendizagem

    de regras ditadas pela gramtica normativa.

    No h, em toda a obra, nenhum estudo voltado propriamente Sociolingustica.

    As referncias feitas heterogeneidade da lngua no LD so, portanto, no plano

    superficial e sem qualquer aluso s situaes ou contextos de uso da lngua tal como se

    encontram nos textos e na atividade sobre regncia verbal.

    No texto de n 1, observa-se que uma das personagens da narrao toma, numa

    atitude preconceituosa, como errada a fala da outra e, na atividade proposta, no se

    discute a concepo do certo e do errado na lngua, dando-se a impresso de que os

    autores do LD tambm concebem como erro o que est fora da variedade culta. Na

    verdade, o foco se d na lngua enquanto sistema, tal como concebida pelo

    Estruturalismo lingustico e reforadas pelas concepes de lngua/linguagem como

    expresso do pensamento e instrumento de comunicao, sinalizando e/ou

    referindo-se de forma tmida concepo sociointeracionista.

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    No geral, o que se tem de estudo sobre a variao lingustica no livro Ararib

    Portugus no contribui para que o aluno compreenda e tome a lngua como um ato

    social, pois como postula Hudson (1996, p. 43) [...] estudar a fala sem referncia

    sociedade que a usa excluir a possibilidade de encontrar explicaes sociais para as

    estruturas que esto sendo usadas.

    Prevalecem no LD atividades mecnicas, tais como de reescritura de trechos na

    variedade padro; de assinalar a alternativa em que a regncia verbal tambm

    correspondente a essa variedade, de forma a tolher ou anular a possibilidade de o aluno

    refletir os usos da colocao pronominal e da regncia verbal, de conformidade com

    outras variedades da lngua. Reportando-se a essa ideia, Dionsio (2008) [...] seria mais

    eficaz se ao invs da simples reescritura na norma padro, fosse apresentada ao aluno

    uma situao em que ele pudesse confrontar as formas do padro com as formas do no-

    padro e chegar a formular as regras que norteiam as variedades da lngua (p. 83).

    Nessa acepo, compreende-se no estar o LD em anlise totalmente em sintonia

    com os estudos lingusticos ou neles fundamentados, especialmente, com os

    sociolingusticos, assim como se destoa tambm, dos pressupostos tericos dos PCNs e

    de um dos objetivos definidos no Guia do PNLD ( MINISTRIO DA EDUCAO,

    2010, p. 22), no qual se l abordar os diferentes tipos de conhecimentos lingusticos em

    situaes de uso, articulando-os com a leitura, a produo de textos e o exerccio da

    linguagem oral.

    4.2 Livro didtico Viva Portugus

    Exerccios de fixao (p. 231)

    1. Observe a concordncia verbal nas frases e, no caderno, escreva:

    1. Se apenas a primeira estiver adequada.

    2. Se apenas a segunda estiver adequada.

    3. Se as duas estiverem adequadas.

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    a) Gregrio e Jlia discutiam o artigo.

    Ele e eu discutimos o artigo

    b) Quem vocs?

    Quem so vocs?

    c) Tudo eram esperanas.

    Tudo eram esperanas.

    d) Falam muito sobre esses assuntos.

    Fala-se muito sobre esses assuntos.

    e) Faz tempo que isso aconteceu.

    H tempo que esse assunto preocupao de vrias pessoas.

    f) Esse assunto desagradar muitas pessoas.

    Esses assuntos desagradaro muitas pessoas.

    2. Justifique os problemas de concordncia verbal encontrados na atividade anterior de

    acordo com as regras estudadas.

    3. Explique por que as demais frases esto de acordo com as normas urbanas de

    prestgio da lngua.

    O Guia de livros didticos: PNLD 2011 (MINISTRIO DA EDUCAO,

    2010), na parte em que se refere aos volumes em que se insere o livro didtico em

    questo, ao apresentar uma viso geral dos volumes, esclarece que O trabalho com os

    conhecimentos lingusticos intensivo em todos os volumes e contempla os contedos

    da gramtica normativa. A oralidade contemplada com um conjunto limitado de

    atividades ldicas e prticas (p. 147148).

    Desse modo, mediante o estudo que se fez do livro didtico Viva Portugus

    9 ano, em busca de nele se analisar o trabalho com a variao lingustica, constatou-se

    um silenciamento das autoras e logo, do prprio livro, no que se trata de estudos

    voltados Sociolingustica, isso em favor de uma focalizao ou prioridade do estudo

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    da lngua no plano estrutural e fundamentado nas concepes de lngua/linguagem

    como expresso do pensamento e instrumento de comunicao.

    A relevncia do estudo da gramtica normativa e logo, da variedade culta da

    lngua to intensa no LD em anlise que, conforme se nota no exerccio de n 1, fala-

    se de frases adequadas, sem se mencionar a que variedade da lngua, mas, est

    transparente que se refere adequao variedade culta. Julga-se fosse essencial um

    trabalho e/ou abordagem do tem ou se entende por certo/errado, adequado e inadequado

    na lngua.

    No exerccio de n 2, confirma-se o pressuposto anterior e, quando se fala em

    problemas de concordncia verbal em relao s regras estudadas, cria-se j um

    estigma, um preconceito velado s formas que no so as ditadas pela gramtica

    normativa.

    O preconceito, se antes velado, torna-se transparente no exerccio de n 3, ao se

    colocar determinadas normas como de prestgio, pois no h nenhuma discusso ou

    proposta de atividade que permita ao aluno chegar concluso do porqu de a variedade

    que se chamam de culta ser caracterizada como tal. Da forma como se trabalhada essa

    questo no LD, se no bem enfatizado pelo professor, refora-se o preconceito

    lingustico, tal como inibe o aluno que tem seus usos lingusticos distintos das normas

    tidas como de prestgio.

    Diante dessas consideraes, ao se remeter ao objetivo estabelecido pelo Guia

    do PNLD 2011, j referenciado no trabalho, tem-se que o livro Viva Portugus, o qual

    se enquadra nesse guia, no responde a esse objetivo, visto no haver articulao dos

    conhecimentos lingusticos s possveis variaes da lngua em contextos ou situaes

    distintos.

    5. CONCLUSO

    Desde a democratizao do ensino, ocorrida nos anos 80, houve avano no

    ensino de lngua portuguesa, pois a classe popular adquiriu direito de escolarizao e

    trouxe para a sala de aula domnios distintos da lngua(gem). Esses domnios

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    demandaram da escola passar de um ensino da lngua estritamente normativo para um

    ensino em que se cruzam/entrecruzam distintos falares, distintos discursos,

    intencionando dotar o aluno de capacidade para a comunicao e a interao em

    situaes e contextos vrios, de tal modo a compreender o outro e fazer-se

    compreendido em meio diversidade lingustica.

    Todavia, nesse artigo, conclui-se que, no raro, em funo de o professor se

    apoiar demasiadamente no livro didtico, o qual muitas vezes cancela ou superficializa

    contedos que no mais podem ser negligenciados na sala de aula, porque de relevncia

    para a formao do aluno e para sua participao social com/pela lngua, seu discurso

    (do professor) continua inalterado ou sem profundidade terico-prtica, em detrimento

    das contribuies das teorias lingusticas h muito vigentes,, dentre essas, a teoria da

    variao lingustica.

    O LD, conforme se viu, mesmo indicado pelo PNLD, contraria os prprios

    objetivos definidos pelo programa para o ensino da lngua e, portanto, a razo de ele

    somente no sustentar a prtica pedaggica do professor, o qual deve se responsabilizar

    de ser sempre um estudioso, um pesquisador das questes lingusticas, a fim de ser

    capaz de ir muito alm do que lhe proposto pelo LD no processo de ensino da lngua

    portuguesa.

    Nessa perspectiva, remetendo-se aos livros didticos escolhidos para observao

    e anlise de como neles trabalhada a variao lingustica, pode-se constatar uma

    realidade surpreendente na atual conjuntura, na qual pesquisas e mais pesquisas

    lingusticas so feitas e divulgadas: a concepo de lngua/linguagem neles presente no

    se distancia das concepes como expresso do pensamento e instrumento de

    comunicao, o que exclui, portanto, as propostas dos PCNs e mesmo do PNLD, nos

    quais a ideia geradora a de um ensino de lngua que privilegie as situaes de uso.

    Entende-se a estar o porqu de o aluno que opta pelo curso de Letras tanto estranhar, ao

    chegar Universidade, o discurso no qual se enfatiza que no existe o certo e errado na

    lngua, e mesmo o fato de no se ensinar a gramtica como ele pensava e esperava

    estudar.

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    Nesse sentido, se o professor de lngua portuguesa do Ensino Fundamental no

    redimensionar sua prtica pedaggica para alm do LD, bem como lanar novos olhares

    para o que se tem de estudos desenvolvidos sobre a lngua/linguagem, comprometer os

    conhecimentos do aluno, conhecimentos muitas vezes necessrios para o seu agir social.

    A ideia , pois, compreender o LD no como o nico objeto norteador da prtica

    docente, mas como um deles, e assim, ser capaz de preencher as lacunas nele existentes,

    lacunas essas encontradas nos dois livros que se prestaram como objetos de anlise

    nesta pesquisa.

    Desse modo, comprovou-se, por meio das anlises, que a variao lingustica

    recebe nos livros didticos Ararib Portugus e Viva Portugus um tratamento

    superficial, vago, para dar nfase norma padro, gramtica normativa, o que feito

    de tal maneira a no aperfeioar ou acrescer os conhecimentos lingusticos do aluno, a

    fim de ele poder us-los adequadamente em seus atos comunicativos e interativos.

    Essa anulao e/ou silenciamento dos LDs quanto pluralidade da lngua

    acabam por no contribuir para o desenvolvimento da competncia comunicativa do

    aluno, competncia relacionada ao conhecimento e domnio de uma multiplicidade de

    discursos, com todas suas peculiaridades. E no sendo desenvolvida sua competncia, o

    indivduo no s deixar de compreender a interrelao lngua e sociedade, mas tambm

    sentir dificuldades em estabelecer interao com o outro.

    Para concluir de fato este trabalho, toma-se aqui as palavras de Da Silva (2006,

    p. 153) que assim diz Os professores e os autores de livros precisam de bom senso, um

    pouco de capacidade de observao e disposio para no levar adiante idias puristas

    em relao lngua.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

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    W e - Re vi s ta S OC I OD I AL E TO www.socio ia et o.com. rBacharelado e Licenciatura em Letras UEMS/Campo GrandeM e s t r a d o e m L e t r a s U E M S / C a m p o G r a n d e

    I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 V o l u m e 3 N m e r o 9 m a r o 2 0 1 3E d i o E s p e c i a l H o m e n a g e a d a

    PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA

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    Recebido Para Publicao em 28 de fevereiro de 2013.

    Aprovado Para Publicao em 14 de maro de 2013.