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TERCEIRA TURMA
RECURSO ESPECIAL N2 11.678-0 - SP
(Registro n2 91.0011340-9)
Relator: O Sr. Ministro Cláudio Santos
Recorrente: Armando Bertone - espólio
Recorrido: Antonio Perlis - espólio
Advogados: José Ratto Filho e outro, e David Zadra Barroso
EMENTA: Civil. Cláusula de inalienabilidade. Alienação. Nulidade.
Não tem valor jurídico a compra e venda de coisa gravada com a cláusula de inalienabilidade.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira Thrma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento. Votaram com o Relator os Ministros Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro. Ausente, justificadamente, o Ministro Waldemar Zveiter.
Brasília, 13 de março de 1995 (data do julgamento).
Ministro CLÁUDIO SANTOS, Relator e Presidente.
Publicado no DJ de 03-04-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Cuida a espécie de ação declaratória de nulidade de ato jurídico, um contrato de compromisso de compra e venda de imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade, cumulada com ação de reintegração de posse. Em reconvenção o réu pretende a rescisão do contrato cumulada com perdas e danos.
Nas instâncias ordinárias ambas as ações foram julgadas improcedentes, daí o manejo do presente recurso especial, com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional, no qual se alega a violação ao art. 1.676 e 69 do Código Civil bem como dis-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 179
sídio jurisprudencial, sustentandose a nulidade do contrato de promessa de compra e venda, cujo objeto é bem gravado com a inalienabilidade vitalícia, não obrigando, destarte, aos herdeiros o seu cumprimento, posto que nulo o ajuste.
Os autos foram encaminhados à Procuradoria Geral da República em 18.12.91, retornando ao meu gabinete em 05.12.94, com parecer no qual opina o representante do parquet favoravelmente ao êxito da insurgência.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Dispõe o art. 1.676 do Código Civil que "a cláusula de inalienabilidade temporária ou vitalícia imposta aos bens pelos testadores ou doadores, não poderá, em caso algum, salvo os de expropriação por necessidade ou utilidade pública, e de execução por dívidas provenientes de impostos relativos aos respectivos imóveis, ser invalidada ou dispensada por atos judiciais de qualquer espécie, sob pena de nulidade".
A cláusula de inalienabilidade é a disposição imposta pelo autor de uma liberalidade que o beneficiário não pode dispor da coisa recebida, de sorte que o domínio que o beneficiário recebe é um domínio limitado, pois, embora tenha ele a prerrogativa de usar, gozar e reivindicar a coisa falta-lhe o direito de dela dispor. ... Na liberalidade, entretanto, tal-
vez se justifique a cláusula de inalienabilidade. O doador, por exemplo, transmite ao donatário apenas o direito vitalício de usar, gozar e reivindicar a coisa doada, ficando em suspenso o direito de alienar, só exercitável pelos herdeiros do donatário, após a cessação da incidência da cláusula". Este o escólio de Silvio Rodrigues (Direito Civil, Direito das Sucessões, voI. VII, 16!! ed., ed. Saraiva, pág. 141).
A sentença embora reconheça que "a doutrina e a jurisprudência são pacíficas quanto ao reconhecimento da nulidade das alienações feitas com violação ao art. 1.676 do Código Civil, considera que a hipótese sub judice não se enquadra nesta restrição.
Aponta o d. julgador de 1~ grau que "de acordo com o contrato de compromisso de compra e venda ficou ajustado entre as partes que o vendedor possuía imóvel "inteiramente livre e desembaraçado de ônus e impostos", que o contrato é feito "em caráter irrevogável, obrigando-se até final cumprimento também os herdeiros e sucessores das partes ora contraentes".
Ao prometer vender o imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade, em tese, estava o donatário praticando ilícitos civil e penal, estando o comprador de boa-fé, que é presumida, e não poderá ser premiado péla prática dos ilícitos, pois isto constituiria flagrante contra o réu." (fls. 87/88).
Thdavia, inobstante tais considerações a ação de nulidade foi decla-
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rada improcedente, confirmando-se, tal julgado, no Tribunal recorrido.
Estou em que a solução acolhida nas instâncias ordinárias reclama reparos, eis que a ofensa à cláusula de inalienabilidade torna nulo e ineficaz o ato de disposição.
Demais disso, consoante bem assinalado pelo d. representante do Ministério Público "o que há de concreto é que a coisa era inalienável, logo a alienação não tem valor jurídico, porque feita por quem não tinha a sua livre disposição.
Mais, a cláusula de inalienabilidade estava inscrita no registro de imóveis, logo não era lícito ao pretenso adquirente ignorá-la, pelo contrário, o que consta no registro de imóveis tem efeito erga omnes, e tanto o sabia o adquirente que nunca pretendeu haver escritura pública da sua "aquisição" enquanto o pretenso alienante estava vivo" (fls. 272).
Demais disso, o art. 1.676 fulmina de nulidade os atos que procurem ilidir sua incidência. Na espécie, tem-se que o donatário do bem gravado com cláusula de inalienabilidade, desconsiderando as limitações impostas ao seu domínio celebrou compromisso de compra e venda, sendo, portanto, imperiosa a decretação da nulidade do ato jurídico em questão, em atendimento ao preceito legal enunciado.
E nem se argumente que a desoneração do bem oneroso se aperfeiçoaria com a sub-rogação do vínculo, eis que tal hipótese não se verificou no caso dos autos.
Isto posto, conheço do recurso e dou-lhe provimento a fim de julgar a ação procedente, para declarar nulo o ato atacado, reintegrar o Espólio autor na posse do imóvel, invertidos os ônus da sucumbência.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N!! 15.078-0 - RJ
(Registro n!! 91.0019838-2)
Relator: O Sr. Ministro Cláudio Santos Recorrentes: L.S.A. Empreendimentos e Participações e outros Recorrida: União Federal Advogados: Luiz Fernando de Freitas Santos e outros
EMENTA: Comercial. Cisão de sociedade. Notificação. A notificação de que trata o parágrafo único do art. 233 da lei das sociedades por ações pode ser feita judicial ou extrajudicialmente. Prazo decadencial afastado ante a demora do próprio aparelho judicial.
R. Sup. 'frib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 181
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Thrceira 'furma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Votaram com o Relator os Ministros Costa Leite, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter.
Brasília, 13 de março de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro CLÁUDIO SANTOS, Relator.
Publicado no DJ de 08-05-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Contém os autos uma ação declaratória de inexistência de relação jurídica, onde se pretende o reconhecimento da ineficácia de notificação ofertada, com fundamento no parágrafo único do art. 233 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei n~ 6.404/ 76), para o fim de opor-se a ré à operação de cisão de companhias com exclusão de solidariedade por obrigações de companhias cindidas.
Julgada improcedente a ação nas instâncias ordinárias, as autoras manifestam recurso especial, interposto de decisão proferida em embargos infringentes, sustentando negativa de vigência ao parágrafo único do art. 233 da Lei n~ 6.404/76.
Na origem o apelo foi deferido.
Em 14.11.91 foram os presentes autos encaminhados à Procuradoria Geral da República, retornando os mesmos, com parecer, em 07.12.94, pelo não conhecimento do recurso especial.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): O tema em debate radica na possibilidade de exercício da faculdade de oposição à exclusão da solidariedade por obrigação da companhia cindida, via notificação, de que trata o parágrafo único do art. 233 da Lei das Sociedades Anônimas.
Sustentam as recorrentes que tal faculdade não foi exercida a tempo, decaindo, portanto, a parte contrária do direito de impugnar a operação de exclusão de solidariedade, eis que a notificação se verificou após o lapso temporal de 90 (noventa) dias previstos na lei respectiva.
Diverso, todavia, foi o entendimento consagrado no acórdão recorrido que, confirmando o pensamento majoritário expressado na decisão proferida em grau de apelação, pronunciou-se no sentido da inocorrência da alegada decadência. Confirase o fundamento lançado no aresto recorrido:
"Não se discute que as mesmas regras que regem a citação são válidas não só para a intimação, como também para o protesto, a interpelação e a notificação. Reconheça-se que são eles atos que se
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distinguem entre si, mas as diferenças não são de tal ordem a ponto de afastar a aplicação do princípio da simetria.
Convém, nesse passo, referir o voto condutor do acórdão embargado que assim se pronunciou:
"Publicada a ata da AGE no "Jornal do Comércio" e no "Diário Oficial" de 01.02.83, o prazo se encerraria em 02.05.83.
A notificação judicial da SUNAMAM, foi distribuída em 21.04.83 e despachada em 29.04.83, quando o MM. Juiz determinou a citação através de Carta Precatória. Alegam as apelantes que só foram notificadas em 18.05.83, e que, sendo o prazo decadencial, não se produziram os efeitos legais.
Sustenta, entretanto, José Carlos Barbosa Moreira, em "O Novo Processo Civil Brasileiro", que "a interrupção do prazo prescricional ou extintivo porém, remonta ao próprio instante do despacho liminar, desde que o autor promova a citação nos dez dias subseqüentes; admite-se a prorrogação até o máximo de 90 dias, contanto que o autor a requeira nos 5 dias seguintes ao termo final do decêndio. Caso não se efetue a citação com observância desses prazos, a prescrição não se terá por interrompida (ou a extinção do direito)" ...
E não se diga que tal regra não se aplica às intimações,
pois Pontes de Miranda, comentando o art. 219 do CPC, já salientava que as intimações se submetem às regras jurídicas da citação.
Acrescente-se, ainda que na própria notificação a SUNAMAM já requerera a prorrogação do prazo por 90 dias para intimação, o que foi deferido pelo Juiz (fls. 77).
Não se pode, portanto, afirmar que a oposição feita pela SUNAMAM tenha sido extemporânea.
E tal oposição era primordial, haja vista que o débito da Libra com o Fundo Nacional da Marinha Mercante era, à época, no valor de Cr$ 1.508.854.576,03 (Hum milhão, quinhentos e oito milhões, oitocentos e cinqüenta e quatro mil, quinhentos e setenta e seis cruzeiros e três centavos). Na ocasião, transferiu para as sociedades oriundas da cisão as parcelas de capital social de Cr$ 535.991.480,70 e Cr$ 671.221.814,90, reduzindo o seu capital social de Cr$ 2.151.265.034,81 para Cr$ 944.051.739,21.
Não se pode dizer que o fato do débito estar garantido pela hipoteca dos navios seja suficiente, considerando-se que os navios tendem a diminuir o seu valor real, com o correr dos anos. Em conseqüência, o fato desses navios continuarem no patrimônio da Libra não é o bastante para garantir o crédito do Fundo de Marinha Mercante.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 183
Quanto ao argumento das apelantes de que o pedido constante na notificação (no sentido de que o crédito ficasse garantido pelo patrimônio das empresas oriundas da cisão, como se esta não tivesse ocorrido) está em desacordo com o art. 233 da Lei das S.A., não pode prosperar. Poder-se-ia até criticar a forma de redação, mas jamais negar que o pedido real é a solidariedade entre as empresas, para garantir o cumprimento da obrigação." (fls. 210/ 212).
Considero acertada a decisão hostilizada. Com efeito, inexiste no parágrafo único do citado art. 233 da Lei das S.A. qualquer vedação a que a parte interessada em opor a estipulação consistente na exclusão da solidariedade proceda à notificação
judicial, cabendo à notificante a escolha da via que melhor lhe aprouver.
Outrossim, impende ressaltar que a lição da abalizada doutrina colacionada pelas recorrentes não infirma a solução consagrada nas instâncias recorridas. De fato, embora se possa dizer que as notificações, via de regra, não possuem caráter contencioso, sendo medida meramente conservativa de direitos, não se incluindo tecnicamente entre as medidas cautelares, nada obsta que se proceda à notificação judicial, aplicando-se então as regras procedimentais do Código de Processo Civil, aliás previstas no art. 867 e seguintes.
Ante o exposto, não vislumbrando a alegada negativa de vigência, não conheço do recurso.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N2 34.751-1- MA
(Registro n2 93.0012262-2)
Relator: O Sr. Ministro Cláudio Santos Recorrente: Banco da Amazônia S/A Recorrido: Banco Mercantil de São Paulo S/A Advogados: Adalberto Ribamar Barbosa Gonçalves e outros, e José Cal
das Góis
EMENTA: Exclusão da penhora subordinada a registro notarial. O bem alienado fiduciariamente, por não integrar o acervo patrimonial do devedor, não poderá ser objeto de penhora em processo de execução desde que registrado no competente assento notarial. Recurso não conhecido.
184 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
ACÓRDÃO
Vistos relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Thrceira 'lbrma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Votaram com o Relator os Ministros Costa Leite, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter.
Brasília, 04 de abril de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro CLÁUDIO SANTOS, Relator.
Publicado no DJ de 15-05-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: 'frata-se de recurso especial interposto com fundamento no art. 105, III, alíneas a e c da Constituição Federal, onde se alega contrariedade aos arts. 57 e 59 do DecretoLei 413/69.
Banco da Amazônia S/A - BASA, ora recorrente, apresentou embargos de terceiro à penhora efetuada nos autos da execução forçada proposta pelo Banco Mercantil de São Paulo, ora recorrido.
O v. acórdão recorrido restou assim ementado:
"Contrato entre o apelante e Indústria de Calçados Sá Ltda., com cláusula de alienação fiduciá-
ria sem o assentamento notarial obrigatório. Penhora dos bens resultantes desse contrato, em execução promovida pelo executado. Inconformação do Banco da Amazônia, rejeitada unanimemente pelo intransponível do art. 129, § 5~, da Lei 6.015/75, nos termos do parecer do M. Público."
Ao recurso foi negado seguimento.
Provi, entretanto, agravo de ins-trumento para melhor exame.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): A questão fundamental colocada nos autos alude à ausência de registro notarial do contrato de alienação fiduciária.
Com efeito, é inquestionável que o bem alienado fiduciariamente não integra o acervo patrimonial do devedor-executado, por ser de propriedade do credor, não podendo, destarte ser objeto de penhora. No entanto, a oponibilidade da alienação fiduciária fica subordinada à anotação no registro competente.
Nesse sentido o art. 1~ do Dec-Iei n~ 911/69, que ao dar nova redação ao art. 66, da Lei n. 4.728/65, é taxativo ao dispor que:
"§ 1~ A alienação fiduciária somente se prova por escrito e seu instrumento, público ou particular, qualquer que seja o seu valor, será obrigatoriamente arquivado, por cópia ou microfilme, no Registro de Títulos e Documentos do
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 185
domicílio do credor, sob pena de não valer contra terceiros, e conterá, além de outros dados, os seguintes:
a) o total da dívida ou sua estimativa;
b) o local e a data do pagamento;
c) a taxa de juros, as comissões cuja cobrança for permitida e, eventualmente, a cláusula penal e a estipulação de correção monetária, com indicação dos índices aplicáveis;
d) a descrição do bem objeto da alienação fiduciária e os elementos indispensáveis à sua identificação."
Entendo, pois, incabível a pretensão do recorrente, eis que a mera alienação fiduciária, desacompanhada da respectiva anotação notarial não há que ser oposta a fim de desconstituir a constrição judicial.
Ante o exposto, não conheço do apelo.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N~ 37.500-2 - MG
(Registro n~ 93.0021677-5)
Relator Originário: O Sr. Ministro Cláudio Santos
Relator Designado: O Sr. Ministro Nilson Naves
Recorrente: José Maria Soares
Recorrido: Michel Blinder
Advogados: Drs. Solange Diniz Junqueira Cunha e Beatriz Vargas Ramos G. de Rezende e outro
EMENTA: Responsabilidade civil. Morte de filho de tenra idade (8 anos). De acordo com a orientação da 2~ Seção do STJ, a indenização, em caso tal, dura até quando a vítima completaria vinte e cinco (25) anos. 1. Valor da pensão. Matéria de prova, tornando-se, portanto, questão de fato, e não questão de direito. Súmula 7.
2. Recurso especial conhecido pelo dissídio em relação ao primeiro ponto, mas não provido.
186 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira 'furma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e, por maioria, negar-lhe provimento. Vencido o Sr. Ministro-Relator. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Nilson N aves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Costa Leite (§ 22,
art. 162, RISTJ).
Brasília, 15 de dezembro de 1994 (data do julgamento).
Ministro EDUARDO RIBEIRO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator designado.
Publicado no DJ de 20-02-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Ao admitir este recurso especial, assim expôs a Vice-Presidência da Corte local:
"Com suporte no permissivo do art. 105, inciso 111, alíneas a e c da Carta Constitucional, José Maria Soares oferece o presente recurso especial contra julgado da ego Quinta Câmara Civil deste 'Ih.bunal, apontando negativa de vigência dos artigos 159, do CC e 602, § 12, inciso 11, do CPC.
A 'furma Julgadora acolheu parcialmente o apelo do recorrido pa-
ra, reformando-se em parte a sentença monocrática, reduzir a pensão a 1/3 do sálario mínimo e limitá-la à data em que a vítima completaria 25 anos de idade. Reduziu, outrossim, a verba honorária para 10%.
Assevera o recorrente que "a redução do salário mínimo em 2/3 (dois terços) é ato perverso e transforma a condenação em prêmio para o recorrido." (fls. 134)
Sustenta, ainda, que "não existe nenhum embasamento que dê sustentação à presunção de que aos vinte e cinco anos de idade, a vítima não mais auxiliaria materialmente ao seu pai, prestandolhe alimentos" (fls. 136).
Argumenta, também, com divergência jurisprudencial.
O recurso oferece condições de procedibilidade" (fi. 156).
No final da decisão, fez seu prolator esta anotação:
"Impende registrar, ainda, recente decisão do excelso STJ, que firma entendimento contrário ao esposado pelo aresto impugnado.
Com efeito, "após inicial divergência, veio a consolidar na Turma o entendimento no sentido de considerar a presumida sobrevida da vítima, como termo final do pagamento da pensão, tomando-se por base a idade provável de sessenta e cinco (65) anos, haja vista não se poder presumir que a vítima, aos vinte e cinco (25) anos deixará de ajudar seus familiares, prestando-lhes alimentos.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 187
Para o cálculo indenizatório, tem-se levado em consideração o período que vai da data do evento até a data do falecimento dos seus pais ou a data em que a vítima completaria sessenta e cinco (65) anos.
Não correspondendo a contribuição dos filhos, para o custeio da casa dos seus pais, à totalidade do seu salário, afigura-se razoável e justo, em linha de princípio, fixar a indenização no percentual de dois terços (2/3) daquele. (REsp 28.861-PR, in DJU de 08.03.93, pág. 3.123)."
Admito, pois, o recurso, determinando a sua remessa imediata ao excelso Superior Tribunal de Justiça". (fi. 157).
O recorrente pleiteia o restabelecimento da sentença.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): O dissídio jurisprudencial está caracterizado em relação ao limite de idade de sobrevida da vítima tanto quanto ao período de ajuda do membro da família ao conjunto, e bem assim tocante ao valor da pensão e sua fixação baseada no salário-mínimo.
Reúne, pois, condições de ser conhecido.
A decisão monocrática condenou o réu, ora recorrido, ao pagamento de um salário-mínimo até a data em que a vítima completaria 25 anos e
daí em diante 1/2 salário até o dia em que alcançaria 65 anos de idade.
Por outro lado, está aquela decisão lastreada em vasta jurisprudência inclusive desta Corte Superior, como se constata de sua parcial transcrição:
"Definida a responsabilidade culposa do R. no evento danoso, cumpre apreciar o quantum da indenização e os respectivos termos.
A este respeito, tem sido assim a manifestação da jurisprudência:
"Inclina-se, em corrente majoritária, a jurisprudência pelo cálculo da vida média do brasileiro em sessenta e cinco anos para o fim da reparação de dano no qual decorre o evento morte." (STJ -RE 3.023-SC - Rev. Julg. TAMG - 40/324)
"Idade provável da vítima -Ao contrário do estabelecido na decisão local, o STJ tem fixado a idade provável da vítima em 65 anos, período em que a pensão é devida." (STJ - RE 13.806-SP -DJMG - 26.06.92, pág. 04)
Se o termo final aponta a idade de 65 anos resta definir o inicial.
O menor faleceu aos 08 anos de idade e ainda, não trabalhava. Entretanto, é oriundo de família pobre, sendo o pai biscateiro, situação esta que altera substancialmente a posição do filho no contexto familiar.
188 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
As Ementas sobre a matéria assim afirmam:
"Nos lares desprovidos de maiores recursos, a colaboração dos filhos menores dá-se bem cedo antes da época em que poderiam exercer legalmente o trabalho remunerado. Constituem eles fatos econômicos, cuja perda autoriza a reparação. Pensionamento devido, pois, desde a data do falecimento da vítima. Precedente do STF.
Recurso especial conhecido e provido." (STJ - REsp 5.612-RJ - Rev. do STJ 24/407)
"A morte de filho menor, ainda que não exerça atividade remunerada enseja indenização, não havendo, pois, necessidade de prova de ganho real" (TAMG - Ap 46.953/2 - R. Julg. 43/73).
É de se frisar, não ter sido a condição de pobresa do A. contestada ou contrariada, tornando-se assim fato incontroverso e, nos termos do art. 334, In do CPC, não carece prová-la.
No que pertine à idade núbil e as conseqüências que resultam do casamento, também deve ser ponderada cum grano salis. A estrutura familiar brasileira, apesar de bastante desfigurada e violentada pelos modernismos e amoralidade, ainda mantém laços estreitos, mormente entre as classes economicamente desfavorecidas. O filho ou filha que se casa, continua tendo para com os pais atenção e desvelo, chegando até ao auXIlio material, partilhando mesmo o pouco que têm.
Assim, não é aceitável que, entendendo ter-se chegado à idade núbil, cesse a ajuda material prestada, vindo a Justiça de 2~ e 3~ graus afirmando que:
"Não é dado presumir que a VÍtima aos vinte e cinco anos, deixaria de auxiliar sua mãe, prestando-lhe alimentos. Manutenção do limite da pensão tal como fixada nas instâncias ordinárias, ou seja, na data em que o falecido completaria 60 anos." (STJ - RE 3.581-SC - Rev. Julg. TAMG 40/322)
"Tratando-se de vítima com 19 anos de idade, que já efetivamente trabalhava, dando ajuda ao lar paterno, não é razoável presumir que aos 25 anos de idade cessasse tal auxílio. Código de Processo Civil, art. 602 e parágrafos: Código Civil art. 1.537; RE n. 100.127 (RTJ 123/1.065) RE n. 1.999.
Pagamento de pensão conforme a sentença e o acórdão até os 25 anos; de pensão com menor expressão pecuniária, a partir de então e até a data do falecimento dos autores ou até a data em que a VÍtima completaria 65 anos, prevalecendo o termo que primeiro ocorrer." (STJ - RE 3.732-SPLex 26/107)
Por outro lado, a fixação em termos de salário mínimo, não fere disposição legal vigente vez que, há evidente caracterização alimentar na pensão indenizatória fixada nestes casos.
Outrossim, a manifestação do Juízo Criminal in casu, não ilide
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 189
a apreciação do fato no cível, a uma porque o procedimento sequer chegou a tramitar como ação penal, sendo arquivado por insuficiência de provas; a duas porque, ainda que fosse absolvido no campo da responsabilidade penal, esta absolvição não representaria definição no campo da responsabilidade civil onde os parâmetros de julgamento são bem outros e, a três, não houve manifestação da jurisdição penal quanto à inexistência do fato danoso.
Os juros e a correção monetária inicidentes na hipótese destes autos, têm o seguinte entendimento:
"Compreendendo a expressão "delito" constante do art. 962 do Código Civil o ato ilícito, os juros de mora contam-se desde à época do evento." (STJ - RE 3.000-SP - Rev. Julg. TAMG 40/330)
"Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo." (Súmula 43 - STJ - in DJMG-18.06.92 - pág. 13)
Ex positis, julgo procedente a presente ação e condeno o R., Michel Blinder, qualificado nos autos, no pagamento de pensão indenizatória ao autor, José Maria Soares, também nos autos qualificados, ex vi do art. 159 do Cód. Civil, pensão esta que fixo em um sálario mínimo mensal a partir da data do evento, mantendo-se nes-
te patamar até quando a vítima completaria 25 anos de idade. A partir desta data, a pensão se reduzirá à metade do sálario mínimo, assim se mantendo até quando completaria 65 anos de idade, sendo certo que, ocorrendo o óbito do A., a pensão não se estenderá a herdeiros ou qualquer outra pessoa, sendo pessoal do A. e intransferível." (fls. 87/90).
Na realidade, o que ficou decidido na sentença encontra ressonância na jurisprudência deste 'fribunal Superior, e, por isso, sendo possível, parcialmente, o conhecimento do recurso pelo dissídio, consoante evidenciado, de início, dou provimento ao recurso para estabelecer o termo final do pensionamento na data em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos, mantido o valor da pensão e a sucumbência.
É o voto.
VOTO - VISTA
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: De acordo com os fundamentos da sentença
"O menor faleceu aos 08 anos de idade e ainda não trabalhava. Entretanto, é oriundo de família pobre, sendo o pai biscateiro, situação esta que altera substancialmente a posição do filho no contexto familiar.
As ementas sobre a matéria assim afirmam:
'N os lares desprovidos de maiores recursos, a colaboração
190 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
dos filhos menores dá-se bem cedo antes da época em que poderiam exercer legalmente o trabalho remunerado. Constituem eles fatos econômicos, cuja perda autoriza a reparação. Pensionamento devido, pois, desde a data do falecimento da vítima. Precedente do STF.
Recurso especial conhecido e provido.' (STJ - REsp 5.612-RJ - Rev. do STJ 24/407)
'A morte de filho menor, ainda que não exerça atividade remunerada enseja indenização, não havendo, pois, necessidade de prova de ganho real' (TAMG - Ap 46.953/2 - R. Julg. 43/73)."
Daí ter o Dr. Juiz condenado o réu a pagar ao autor
" ... pensão esta que fixo em um salário mínimo mensal a partir da data do evento, mantendo-se neste patamar até quando a vítima completaria 25 anos de idade. A partir desta data, a pensão se reduzirá à metade do sálario mínimo, assim se mantendo até quando completaria 65 anos de idade, sendo certo que, ocorrendo o óbito do A., a pensão não se estenderá a herdeiros ou qualquer outra pessoa, sendo pessoal do A., e intransferível."
Porém o acórdão deu provimento em parte à apelação do réu
" ... para, reformando em parte a r. decisão de primeiro grau,
reduzir a pensão a 1/3 (um terço) do salário mínimo e limitá-la à data em que a vítima completaria 25 (vinte e cinco) anos. Com efeito, reduz-se a verba honorária a 10%, arcando as partes com as despesas do processo, à razão de 50% pelo apelante e 50% pelo autor, ficando isento esse último por achar-se amparado pelos benefícios da assistência judiciária."
N a petição do recurso especial, pede o autor seja reformado o acórdão "no que diz respeito a fixação do valor da pensão alimentícia e ampliada a idade-limite para sessenta e cinco anos. Para tanto, deverá pois, ser restaurada a r. sentença de primeiro grau, ... ".
O Sr. Ministro Cláudio Santos está restabelecendo "o termo final do pensionamento na data em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos, mantido o valor da pensão e a sucumbência".
Pedi vista para examinar aquele ponto do recurso, que S. Exa. está adotando.
De acordo com a pesquisa, pude verificar que a 2~ Seção foi por duas vezes chamada a se pronunciar a respeito do limite de idade. A saber, qual seria a duração da indenização. No REsp 19.829, de minha relatoria, cuidava-se de morte de filho menor. Nesse caso, fora afixada a indenização da seguinte forma: entre o evento e os 12 anos, em 1 salário mínimo; entre os 12 e os 65 anos, em 2/3 do salário mínimo. Foi a decisão 10-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 191
cal por nós reformada, e eu escrevi para o acórdão essa ementa: "Responsabilidade civil. Morte de filho menor. Indenização. É indenizável o acidente, limitada porém a indenização até a data em que o menor completaria 25 anos de idade. Recurso especial conhecido em parte, pelo dissídio, e assim provido" (DJ de 29.3.93). Nos EREsp 28.861, o menor acidentado e falecido tinha 19 anos. Nesses embargos, para os quais foi designado relator o Sr. Ministro Dias 'IHndade, placitamos o acórdão embargado, para o qual o pensionamento haveria de ir até a data em que a vítima completaria 65 anos. Eis a sua ementa: "Civil. Responsabilidade. Pensão. Duração. A indenização, em forma de pensão, em caso de dano material, perdura até a expectativa de vida da vítima" (DJ de 28.02.94).
Quando do julgamento dos EREsp 28.861, afirmou o Sr. Ministro Barros Monteiro, em seu voto:
"No tocante ao merecimento, já se estabeleceu nesta 2"! Seção uma distinção quando a vítima é menor de tenra idade, caso em que a reparação tem sido concedida mais a título de dano moral. N essa hipótese, o limite iria até os vinte e cinco anos, data em que, presumivelmente, a vítima se casana.
'lenho, em mãos dois precedentes, um de que foi Relator o Sr. Ministro Dias 'IHndade - Recurso Especial n 2 28.902-0IPR, no qual S. Exa. na ementa registrou: (lê)
'A indenização pela morte de filho de tenra idade, fixada em forma pensional, dura até quando a vítima atingiria vinte e cinco anos.'
o outro julgado, da Quarta Turma, o Recurso Especial n 2
32.573, de que fui Relator, porta a seguinte ementa na parte em que ora interessa: (lê)
'Tratando-se de vítima com tenra idade, o pensionamento limita-se até a data em que o menor completaria vinte e cinco anos.'
Não é o de que se cogita nestes autos, porque a espécie é de menor já com uma certa idade; só que não trabalhava."
E o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo afirmou o seguinte, em seu voto:
"Ainda em relação aos filhos, os precedentes desta Corte vinham fixando como tempo provável de vida da vítima a idade de 65 anos (neste sentido, dentre outros, os REsps 1.999-SP, 3.581-SC e 28.861-0-PR. Nesses referidos precedentes, as vítimas contavam com 27, 17 e 16 anos, respectivamente. A partir do REsp 19.829-PR, por outro lado, julgado na 2"! Seção e relatado pelo Sr. Ministro Nilson Naves, o Sr. Ministro Athos Carneiro buscou traçar, consoante anotou o Sr. Ministro Barros Monteiro no REsp
192 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
32.573-4-ES, 'u'a distinção entre a hipótese em que a Vítima é de tenra idade e aquela em que o ofendido, já mais crescido, contribui real e efetivamente para a manutenção de sua família. Neste último caso, admissível o limite de 65 anos'. E com base nessa orientação foi que a 4~ Thrma, neste último REsp, em que a vítima tinha apenas sete (7) anos, ementou no que aqui interessa:
'1. Tratando-se de vítima de tenra idade, o pensionamento limita-se até a data em que o menor completaria 25 anos de idade'.
Isto, evidentemente, se a indenização, calcada no dano moral, não tiver sido fixada em valor certo, segundo a orientação já mencionada."
o caso dos presentes autos, enquadra-se no que ficou decidido lá na 2~ Seção, no REsp 19.829. Trata-se de vítima de tenra idade (8 anos, naquele trágico momento), motivo pelo qual a responsabilidade pela indenização irá até os 25 anos. Incensurável, pois, o acórdão local.
Peço vênia para negar provimento ao recurso especial.
RECURSO ESPECIAL N~ 45.672-0 - MG
(Registro n~ 94.0007924-9)
Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves
Recorrentes: Maria Thófila Martins Alvim e outro
Recorrido: Dirceu José Quadros
Advogados: Drs. Marcelo Cássio Amorim Rebouças e outros, e José Antônio dos Santos e outro
EMENTA: Procedimento sumaríssimo. Prova testemunhal. Prazo para o seu requerimento. É de quarenta e oito (48) horas, segundo o art. 278, § 22. Perdido o prazo, não se admite ao réu a apresentação do rol respectivo, em caso onde a audiência houver sido anulada (na hipótese, foi anulada pela falta de intimação do representante do Ministério Público). O depósito em cartório há de ser em data anterior ("antes da audiência", conforme o texto de lei). Caso em que se operou a preclusão. Recurso especial não conhecido.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 193
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Terceira 'Thrma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, não conhecer do recurso especial. Vencidos os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro e Costa Leite. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro. Waldemar Zveiter, Cláudio Santos e Costa Leite.
Brasília, 13 de dezembro de 1994 (data do julgamento).
Ministro EDUARDO RIBEIRO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.
Publicado no DJ de 13-03-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: 'frata-se de causa de reparação de dano em acidente de veículos. Foi o pedido julgado procedente. Apelaram os réus, e o Tribunal acolheu preliminar, que porém não fora suscitada nas razões da apelação, nos termos seguintes:
"Este feito, Sr. Presidente, de conformidade com a nulidade apontada pela douta Procuradoria Geral de Justiça e agora da 'fribuna, pelo patrono dos apelantes, clama por decretação de nulidade. Foi ferida regra fundamental de convocação do Ministério Público para
intervir no feito que envolve interesses patrimoniais do menor.
Assim nessa esteira, anulo o feito a partir da audiência, inclusive, a fim de que seja o Ministério Público intimado para o ato e para todos os atos subseqüentes, atento, o Meritíssimo Juiz, à preclusão ocorrida quanto à prova testemunhal, a teor do artigo 278, § 2~ do Código de Processo Civil."
Vieram aos autos embargos de declaração, onde os embargantes, alegaram em resumo:
"Todo o processo foi anulado (desde a audiência de instrução e julgamento, inclusive) para que o Ministério Público fosse convocado a integrar o processo.
Contudo, malgrado a anulação, os apelantes, réus, não poderiam produzir prova testemunhal, sob o fundamento de que a oportunidade para tanto se encontraria preclusa.
Ora, apesar de ter sido mencionado expressamente o art. 278, § 2~, do Código de Processo Civil, venia permissa, para efeito do devido prequestionamento, na forma como vêm exigindo tanto o STF quanto o STJ, a questãonecessariamente - haveria de ser enfocada sob um outro aspecto ... "
Foram os embargos rejeitados, verbis:
"Conheço do recurso e lhe nego provimento, pois precluso está o
194 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
direito de os embargantes arrolarem testemunhas, à vista de tal ter, como termo determinante a audiência de conciliação, instrução e julgamento de que os acionados têm ciência com a citação nos processos sumaríssimos.
Em razão da estabilidade processual, que impede seja a inicial modificada pela efetiva citação ocorrida, desde que com o acórdão as partes simplesmente serão intimadas para audiência, perdido está o prazo do artigo 278, § 2~, porque perfeita e acabada a citação.
Desacolho os embargos."
Inconformados, Maria 'Thófila Martins Alvim e outro, réus, movimentaram o especial em torno do art. 278, § 2~, do Cód. de Pro Civil, recurso que foi admitido e a respeito do qual o Dr. Humberto Agrícola Barbi, Subprocurador-Geral da República, emitiu este parecer:
"3 - O v. acórdão recorrido, parece-nos, violou o art. 278, § 2~ do Código de Processo Civil, uma vez que anulando todo o processo, a partir da citação, conseqüentemente anulada ficou a audiência de instrução. Se, em decorrência do provimento judicial, não mais existe a audiência, que deverá ser repetida, agora com a presença do órgão do Ministério Público, não há que se falar em preclusão. Reaberta a fase instrutória tem o réu o direito de amplamente se defender, requerendo depoimento
pessoal do autor e apresentado rol de testemunhas. Em suma, abrese amplamente o direito de defesa nessa fase processual que .foi anulada totalmente.
A hipótese aqui versada é diferente daquela em que há apenas continuação de audiência anterior, quando não se admite a apresentação posterior do rol de testemunhas.
Ao impedir que os recorrentes ofertem rol de testemunhas antes da audiência de instrução e julgamento, que será feita em substituição à anterior anulada, o v. acórdão recorrido, a nosso ver, negou vigência ao dispositivo legal apontado, ensejando o conhecimento do recurso e seu provimento.
4 - O dissídio pretoriano não está demonstrado, o que impede o conhecimento do recurso pela letra c do permissivo constitucional."
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): A nulidade decretada foi a partir, e inclusive, da audiência de instrução e julgamento, e não a partir da citação, como pareceu à Subprocuradoria Geral da República. Cumpre saber se, dando por preclusa a produção de provas pelos réus, o acórdão teria ofendido o § 2~ do art. 278 segundo o qual "Se o réu
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pretender produzir prova testemunhal, depositará em cartório, quarenta e oito (48) horas antes da audiência, o rol respectivo".
Estou com o acórdão, donde repelir a alegação, formulada pelos recorrentes, de ofensa a esse texto processual.
O direito que o réu tem de produzir prova, no procedimento sumaríssimo, termina quarenta e oito (48) horas antes da audiência. Vale dizer, o direito há de ser exercido nesse prazo, com o depósito em cartório do rol das testemunhas. No caso presente, o juiz despachara assim, ao designar a audiência para o dia 21.9.92: "Cite-se a ré para comparecimento pessoal em juízo, ocasião em que poderá produzir defesa, através de advogado e produzir provas, cientificando-a do disposto no parágrafo segundo do artigo 278 do CPC. Intime-se o autor. Div. 11.08.92". No referido 21, dia da audiência, cuja nulidade foi proclamada, anotou o juiz: "Os réus deixaram transcorrer in albis o prazo legal previsto para a apresentação do rol de testemunhas, sujeitando-se pois aos efeitos da preclusão". Ora, a nulidade, que o acórdão pronunciou, alcança, a meu ver, os atos processuais realizados a partir e inclusive do aludido dia 21. Não, e certamente que não, dos atos anteriores, realizados ou não realizados. Cabia ao réu arrolar as testemunhas antes do dia 21, a saber, no dia 18, 17, 16, etc. Por isto é que o seu direito precluiu. Acertadamente, conforme o proclamou a instância ordinária.
Ver, por sua ementa, o REsp-6.247 de minha relatoria: "Procedimento sumaríssimo. Rol de testemunhas. Prazo de depósito em cartório. Art. 278, § 22• É de quarenta e oito horas antes da audiência de instrução e julgamento. Perdido o prazo, não se admite a apresentação posterior do rol, no caso de nova audiência em continuação da anterior suspensa pelo não comparecimento do advogado do réu. Recurso especial conhecido pela alínea a e provido." (in DJ de 04.02.91)
Do recurso não conheço.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Srs. Ministros, fiquei vencido no precedente citado pelo eminente Ministro-Relator.
Entendo que a apresentação no rol de testemunhas, com a antecedência prevista em lei, tem uma só finalidade: permitir à parte contrária conhecê-lo, para possíveis impugnações. Se outra audiência vai ser realizada, o depósito oportuno não trará qualquer prejuízo à parte contrária e atenderá às finalidades da lei. Embora haja um precedente da Thrma, continuo fiel a esse entendimento.
Conheço do recurso e dou-lhe provimento.
VOTO - VISTA
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Colho do voto do Senhor
196 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
Ministro-Relator, Nilson Naves, os tópicos seguintes que bem espelham a hipótese, assim redigidos:
"A nulidade decretada foi a partir, e inclusive, da audiência de instrução e julgamento, e não a partir da citação, como pareceu à Subprocuradoria Geral da República. Cumpre saber se, dando por preclusa a produção de prova pelos réus, o acórdão teria ofendido o § 22 do art. 278 segundo o qual "Se o réu pretender produzir prova testemunhal, depositará em cartório, quarenta e oito (48) horas antes da audiência, o rol respectivo".
Estou com o acórdão, donde repelir a alegação, formulada pelos recorrentes, de ofensa a esse texto processual."
"Ver, por sua ementa, o REsp n2 6.247-0-MG de minha relatoria: "Procedimento sumaríssimo. Rol de testemunhas. Prazo de depósito em cartório. Art. 278, § 22• É de quarenta e oito horas antes da audiência de instrução e julgamento. Perdido o prazo, não se admite a apresentação posterior do rol, no caso de nova audiência em continuação da anterior suspensa pelo não comparecimento do advogado do réu. Recurso especial conhecido pela alínea a e provido." (in DJ de 4.2.91)
Do recurso não conheço."
Desse entendimento, divergiu o Senhor Ministro Eduardo Ribeiro nos seguintes termos:
"Senhores Ministros, fiquei vencido no precedente citado pelo Eminente Ministro-Relator.
Entendo que a apresentação no rol de testemunhas, com antecedência prevista em lei, tem uma só finalidade: permitir à parte contrária conhecê-lo para possíveis impugnações quando tomarlhes os depoimentos.
Desse modo, se outra audiência vai ser realizada, o depósito oportuno não trará qualquer prejuízo à parte contrária e atenderá às finalidades da lei. Embora haja um precedente da Turma, continuo fiel a esse entendimento.
Conheço do recurso e dou-lhe provimento."
Solicitei Vista dos autos para conferir o Voto que proferi no REsp n2
6.247-0-MG, e peço licença para reproduzi-lo:
"Senhor Presidente, também tenho como os Eminentes Ministros Eduardo Ribeiro e Dias 'frindade, uma posição bastante liberal nesta circunstância, mas penso, data venia, que, neste caso, a razão está com Vossa Excelência, porque, em verdade, o que houve foi que o nobre patrono da parte deixou exaurir o prazo para apresentação do rol. Este é um fato incontroverso e sobre o qual, inclusive, a 'furma não diverge. A questão é do enfoque ou ângulo de visão jurídica em que se dê a hipótese em julgamento. Neste ponto
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 197
estou vendo a questão como Vossa Excelência vê. Não entro em considerações se este atestado foi um expediente usado pelo nobre advogado para procurar superar o aspecto preclusivo ou não. Vejo o fato antecedente: não foi apresentado o rol na oportunidade própria.
Quanto a esta questão, não havendo divergência, acompanho Vossa Excelência. Peço vênia aos Eminentes Ministros Eduardo Ribeiro e Dias Trindade."
Não vejo razões para modificar esse entendimento. Por isso solicito vênia ao Sr. Ministro Eduardo Ribeiro para, mantendo-o, acompanhar o Sr. Ministro-Relator.
VOTO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE: Sr. Presidente, não se pode cogitar de indenização por dano moral se o pedido abrange apenas o dano material. Rogando vênia ao eminente Relator, acompanho o voto de V. Exa.
VOTO DESEMPATE
O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Sr. Presidente, discute-se nesta oportunidade, nos autos, sobre a possibilidade de a parte perdedora do prazo para apresentar o seu rol de testemunhas no procedimento sumaríssimo fazê-lo em face do adiamento da audiência.
O Sr. Ministro-Relator não conheceu do recurso, confirmando a deci-
são do Tribunal local, que não admitiu a apresentação do rol, e o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro dissentiu. O Sr. Ministro Nilson Naves cita precedente relativo ao julgamento do Recurso Especial n!! 6.247, do qual S. Exa. foi Relator, onde, também ocorreu desarmonia manifestada pelo Eminente Ministro Eduardo Ribeiro. No precedente, ao proferir meu voto, acompanhando o Sr. Ministro-Relator, explicitei o seguinte:
"É relevante a preocupação do Eminente Ministro Eduardo Ribeiro com a busca da verdade no processo, mas, no caso, tratandose de direitos disponíveis, - decorrentes de acidente de veículos -, o êxito dependerá do interesse das partes na produção das provas, sem maiores inquietações para o Juiz.
Por isso, ao Eminente Ministro Eduardo Ribeiro e ao Eminente Ministro Dias Trindade peço vênia para, também, acompanhar o relator, e, inclusive, lembrar que há sobre esta questão jurisprudência firme e remansosa dos Tribunais Estaduais. Na verdade, ressalvado o aspecto importante que o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro salientou, não se pode deixar margem a um expediente que se apresenta com todas as características de protelatório.
Com a devida vênia, acompanho o Eminente Ministro-Relator."
Thmbém neste caso, peço vênia ao Sr. Ministro Eduardo Ribeiro para acompanhar o voto do Sr. Ministro Nilson Naves.
198 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL N!< 45.672-0 - MG
(Registro n!< 94.0007924-9)
Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves
Embargantes: Maria 'IMfila Martins Alvim e outro
Embargado: O V. Acórdão de {l. 186
Partes: Maria Teófila Martins Alvim e outro, e Dirceu José Quadros
Advogados: Drs. Marcelo Cássio Amorim Rebouças e outros, e José An-tônio dos Santos e outro
EMENTA: Recurso especial previsto na alínea a do art. l05-ID da Constituição. Julgamento. ''No julgamento do recurso especial, verificar-se-á, preliminarmente, se o recurso é cabível. Decidida a preliminar pela negativa, a Turma não conhecerá do recurso; se pela afirmativa, julgará a causa, aplicando o direito à espécie" (Regimento, art. 257). Na hipótese da alínea a, o STJ só conhece do recurso se for para provê-lo, caso em que a decisão recorrida tenha contrariado tratado ou lei federal, ou lhe tenha negado a vigência. Se não for para dar provimento, o STJ deixa de conhecer do recurso, simplesmente. Nessa última hipótese, não se justifica conhecer (juízo de admissibilidade) e não prover (juízo de mérito), pois a técnica de julgamento do recurso extraordinário lato sensu (extraordinário e especial) é diversa da do recurso ordinário. 2. Embargos de declaração onde suscitado esse tema, que a Turma rejeitou.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira Thrma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, rejeitar os embargos de declaração, com correção de erro material de voto-vogal do Sr. Ministro Costa Leite. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter, Cláudio Santos e Costa Leite.
Brasília, 24 de abril de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.
Publicado no DJ de 28-08-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: 'frata-se de embargos de declaração, oferecidos por Maria Teófila
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 199
Martins Alvim e outro, recorrentes (réus), dando pela existência de obscuridade e contradição no acórdão desta 3~ 'lbrma, consoante estas alegações, em resumo:
"1. Ainda não sendo a hora de entrarmos em outras considerações, um particular aspecto dos votos vencedores, permissa venia, nos chama a atenção, notadamente quando assim se fez consignar no voto do nobre MinistroRelator Nilson Naves:
"Cumpre saber se, dando por preclusa a produção de prova pelos réus, o acórdão teria ofendido o par. 2!! do art. 278 ... "
2. É que, em verdade, apesar da parte conclusiva do voto proferido pela douta Relatoria afirmar que não estaria a conhecer do Recurso, no que era seguido pelos não menos ilustres Ministros Waldemar Zveiter e Cláudio Santos, nota-se que a matéria tratada no Especial (ou ele próprio) deveria ser (ou efetivamente foi) objeto de conhecimento por parte da Colenda 'lbrma Julgadora.
3. Thnto assim o é, que se permitiu a formação de determinado convencimento - por maioria -quanto à impossibilidade de ser oferecido novamente o rol de testemunhas.
4. Justamente por isso, na realidade preenchidos todos os requisitos de admissibilidade do Recurso, quais sejam, ele é próprio (interposto contra decisão última de
Tribunal Estadual onde se alega negativa ou afronta a texto de lei federal), tempestivo (protocolado dentro do qüindicídio), e a espécie da qual tratou foi devidamente prequestionada na instância ordinária (prequestionamento explícito), impunha-se seu conhecimento.
5. E conhecido porque, insistimos, satisfeitos seus pressupostos de admissibilidade.
Depois, frise-se bem, depois, haveria de ser ele julgado quanto ao seu provimento - ou improvimento.
6. Aliás, é o que prevê o art. 257 do Regimento Interno deste Egrégio Superior Tribunal:
'No julgamento do recurso especial, verificar-se-á, preliminarmente, se o recurso é cabível. Decidida a preliminar pela negativa, a Th.rma não conhecerá do recurso; se pela afirmativa, julgará a causa, aplicando o direito à espécie'.
Em outras palavras: Se o Re-curso é cabível, se se encontram preenchidos seus pressupostos de admissibilidade, é ele conhecido, decidindo-se o mérito do recurso. Se incabível, não é conhecido simplesmente.
7. A respeito do tema, pedimos venia para, nessa oportunidade, trazermos à colação o ensinamento de José Carlos Barbosa Moreira quando leciona: ... "
200 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
"10. Por outro lado, quanto ao r. voto vencido proferido pelo eminente Ministro Costa Leite, parece-nos tenha ocorrido - venia data - equívoco quanto ao que ali foi objeto de pronunciamento.
Isto porque, pelos termos do que ali - a título de fundamentação - foi lançado (c •.. não se pode cogitar de indenização por dano moral se o pedido abrange apenas o dano material .... '), pode-se constatar que a matéria tratada no r. voto não diz respeito ao que é discutido neste Apelo.
Com toda certeza que, embora vencido, a apreciação do tema em debate pelo sempre brilhante Ministro Costa Leite jamais poderia ser desprezada, mormente pelos relevantes subsídios que S. Exa. - com toda certeza - traria para o devido desate deste recurso, observando-se, uma vez mais, o que reza o art. 165, c/c o art. 458, II e 11I, do CPC.
11. Finalmente, devemos sublinhar que a questão aqui versada, permissa venia, apesar de aproximar-se do precedente citado pela nobre Relatoria, dele se distancia fundamentalmente, ao passo que aqui todo o processo, desde a audiência, foi anulado, enquanto lá tratava-se de simples continuação de audiência anteriormente suspensa."
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Louvando-se na lição de José Carlos Barbosa Moreira, que distingue, no julgamento do recurso especial, relativamente ao fundamento da alínea a, o juízo de admissibilidade do juízo de mérito, quer o embargante que este Tribunal, a propósito do recurso interposto, diga que ele conheceu, quanto à admissibilidade, embora possa dizer que o tenha improvido (ou, que lhe negou provimento), quanto ao mérito.
Não me parece cuidar-se de questão própria dos embargos de declaração, porque, ao que penso, a questão suscitada não se enquadra nos incisos I e 11 do art. 535, do Cód. de Pro Civil. Por ter o acórdão declarado que não conhecia do recurso, quanto ao seu fundamento da alínea a, art. 105-111 da Constituição (sobre fundamento da alínea c, nada foi alegado), nele não se encontra, ao adotar esse procedimento no atinente ao exame do especial, obscuridade, dúvida ou contradição (inciso 1), nem ele omitiu ponto a respeito do qual devia se pronunciar (inciso 11).
Reconheço autoridade de José Carlos Barbosa Moreira, em lição tão magistral e tão facinante, mas, é bom que se sublinhe, no julgamento do recurso dito extraordinário não é essa a técnica seguida por esse llibunal, nem pelo Supremo Tribunal Federal, de há muitos anos. Aliás, se acolhida a lição do mestre, o recurso extraordinário em gênero, de que
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 201
são espécies o extraordinário (matéria constitucional) e o especial (materia infraconstitucional), transformar-se-ia em recurso ordinário, simplesmente. O Superior Tribunal de Justiça não daria conta dos processos (aliás, já não vem dando conta!), tal a facilidade para a interposição do especial. Em conseqüência, o recurso perderia a nobreza e o motivo de sua criação. Enfim, o Tribunal deixaria de cumprir a sua missão constitucional (a de guarda das leis e dos tratados federais, a de manter a sua supremacia, o seu primado, ou a sua unidade, ou a de assegurar, por esta Federação afora, "a inteireza positiva, a validade, a autoridade e a uniformidade de interpretação ... das leis federais"), e estaríamos precisando talvez de um Superior em cada Estado-membro e, depois e acima deles, de um outro 'I'ribunal.
"N o julgamento do recurso especial, " - dispõe o art. 257 do Regimento Interno - "verificar-se-á, preliminarmente, se o recurso é cabível. Decidida a preliminar pela negativa, a Turma não conhecerá do recurso;
se pela afirmativa, julgará a causa, aplicando o direito à espécie". Na hipótese da alínea a, não constatadas, no julgamento do especial, a contrariedade ou a negativa de vigência de tratado ou de lei federal, cumpre ao Tribunal declarar que não conhece do recurso, somente e somente.
Quanto ao pronunciamento do Sr. Ministro Costa Leite, se algum equívoco houve, tal não influiu no resultado final do julgamento. Erro material corrigível por S. Exa., a qualquer momento.
Rejeito os embargos.
VOTO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE: Sr. Presidente, estou de inteiro acordo com o eminente Relator. Apenas esclareço que deve ter havido equivoco quanto às notas taquigráficas. Em verdade, os fundamentos do meu voto estão completamente divorciados da matéria que se examinou. São eles os mesmos que constam do voto do eminente Ministro Eduardo Ribeiro, ao qual aderi.
RECURSO ESPECIAL N~ 45.727-0 - MG
(Registro n~ 94.0008021-2)
Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves
Recorrentes: Leonel Raimundo de Oliveira e cônjuge
Recorrido: Banco do Brasil S/A
Advogados: Drs. Marcelo Arantes Komel, e Lincoln de Souza Chaves e outros
202 R. Sup. 'lrib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
EMENTA: Penhora sobre bens de terceiro, por iniciativa do oficial de justiça. Procedência dos embargos. Honorários advocatícios. Por eles não responde o embargado, à míngua de objetiva derrota, ou porque, em tal espécie, não dá causa ao processo. Recurso especial conhecido pelo dissídio, mas não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira 'furma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial, mas negar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter, Cláudio Santos e Costa Leite.
Brasília, 28 de novembro de 1994 (data do julgamento).
Ministro EDUARDO RIBEIRO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.
Publicado no DJ de 13-02-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: É deste teor o acórdão recorrido, segundo o voto do Juiz José Marrara, do 'fribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais:
"Cuida-se de um recurso de apelação, interposto pelos recorrentes contra a sentença de fls. 83-85-TA, dos autos dos embargos de terceiro, que, embora desse pe-
la procedência dos embargos, deixou de condenar o apelado no ônus da sucumbência processual.
Recurso adequado, tempestivo e preparado em tempo oportuno, dele se conhece, mas para lhe negar provimento.
Com efeito, em princípio, em toda a demanda vige o entendimento de que o derrotado na demanda deve suportar o ônus da sucumbência, com base na teoria da sucumbência objetiva de Giuseppe Chiovenda, que foi encampada pelo nosso direito processual civil. Dentro dessa linha, a sentença não poderia deixar de condenar o apelado em tal ônus.
Acontece que cada caso deve ser examinado e ponderado cum grano salis, como é o caso de embargos de terceiro.
Ora, vê-se dos autos da execução que interferência alguma teve o apelado na indevida penhora de parte dos bens, que pertenciam aos apelantes, tendo esta penhora se efetivado por iniciativa única e exclusiva do meirinho.
Em determinados casos, não encontrando o meirinho bens a serem penhorados, ele efetiva a penhora em bens indicados pelo cre-
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dor ou exeqüente, como, aliás, é de determinação legal, fato que, ocorrendo, evidente fica a responsabilidade do exeqüente por uma penhora indevida, sobre bens de terceiro.
Mas este não é, evidentemente, o caso dos autos, porque, na presente espécie, a penhora de bens de terceiro se deu por iniciativa única e exclusiva do meirinho, sem a mínima participação do apelado que, por sinal, não contestou a pretensão dos apelantes em tentar, pelos embargos, a liberação de sua parte no imóvel penhorado, pelo contrário, com ela concordou expressamente, apenas argumentou que não teve a mínima participação na penhora indevida.
Parece-me, portanto, plenamente aplicável à espécie a lição de Humberto Theodoro Júnior -Curso de Direito Processual Civil - voI. IH - ~ edição - n!! 1.441 - pág. 1.826:
'Se, porém, nenhuma oportunidade se deu ainda ao embargado para conhecer do ato realizado por iniciativa apenas do Oficial de Justiça, sem nomeação ou mesmo sem ciência do exeqüente, e este, logo ao tomar conhecimento da medida impugnada, através dos embargos, reconhece prontamente o direito do embargante e pede o levantamento da penhora, não é justo imputar ao primeiro, nessa circunstância, o ônus da
sucumbência, porquanto o incidente decorreu de um ato judicial que não lhe pode ser atribuído a título algum. A falha, in casu, seria apenas do aparelhamento judiciário e só o Poder Público haverá de responder por suas conseqüências'.
No mesmo sentido, a lição de Ernane Fidelis dos Santos -Manual de Direito Processual Civil - volume 4 - Ed. Saraiva 1988 - n!! 1.560 - pág. 132:
'Se o interessado não tiver nenhuma participação no ato judicial (como seria a hipótese de penhora ou arresto feitos pelo oficial de justiça, sem a indicação específica do exeqüente ou arrestante) e também não contestar, não fica sujeito a custas e honorários de advogado, sendo o ônus do Estado, apurável em ação própria'.
Assim, embora a matéria não seja pacífica, como se vê da Revista de Processo, 29/161; da RTJ, voI. 80/800 e Adcoas n!! 100.911, pág. 83, permito-me ficar com as lições dos eminentes processualistas mineiros, ao induvidoso convencimento de que participação alguma teve o apelado na penhora indevida de bens dos apelantes, devendo responder pela sucumbência o Poder Público, em ação adequada.
A sentença é, pois, benemérita de confirmação, razão pela qual é
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mantida, negando-se provimento à apelação."
Rejeitados os embargos de apelação, sobreveio a petição do recurso especial, apresentada pelos embargantes, dando por contrariados os arts. 20 e 26 do Cód. de Pro Civil e apresentando dissídio jurisprudencial.
Foi o recurso assim admitido:
"Sustentam os recorrentes que, in casu, 'inquestionável a obrigação do recorrido em arcar com o pagamento das verbas relativas às custas e honorários advocatícios, que decorreram, neste processo, da sucumbência, tendo em vista ter sido o mesmo derrotado na presente demanda.'
Assevera, também, que, tendo em vista o reconhecimento por parte do recorrido, do pedido deduzido na peça inaugural, caberia a ele o pagamento das despesas e honorários advocatícios, 'não se admitindo, conforme inserto no v. acórdão qualquer discussão acerca de culpa desse ou daquele litigante.' (fls. 188)
Argumentam, outrossim, com dissídio jurisprudencial.
O recurso oferece condições de procedibilidade.
Com efeito, a argumentação recursal trouxe razoável dúvida sobre a incidência ou não das normas que invoca.
Demais disso, rebatendo as conclusões do acórdão o peticioná-
rio, a par de argumentar com as ofensas legais, alinha arestos de outros Tribunais que firmam entendimento aparentemente contrário à tese esposada pelo acórdão impugnado.
Acresça-se que trata-se de matéria discutível, questão federal cuja relevância está a merecer decisão definitiva do tribunal constitucionalmente investido na função de tutelar a autoridade e unidade do direito federal, consubstanciado na lei comum.
Admito, destarte, o recurso especial, determinando a sua remessa imediata ao excelso Superior Tribunal de Justiça."
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): De que decorre a obrigação de pagar despesas e honorários advocatícios pelo pedido de tutela jurisdicional, a saber, pela utilização do processo? Decorreria da sucumbência, puramente, segundo o brocardo romano victus victori expensas condenatur (confira-se entre outras a RTJ-99/1.172). Por isso assim ementei o REsp-26.926: "Ação rescisória. Despesas e honorários de advogado. Julgada procedente a ação, cabe condenar-se o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Cód. de Pro Civil, art. 20. Recurso especial conhecido e provido"
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(DJ de 09.5.94). Decorreria da causalidade, que não seria estranho a Chiovenda, segundo o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, que assim ementou os REsp's 7.570 e 39.462: "Extinção do processo por desaparecimento do objeto - Honorários. Deverá o Juiz pesquisar se havia o interesse, quando do ajuizamento da demanda, o motivo por que desapareceu e se a pretensão era fundada. Verificará assim, quem deu causa, de modo objetivamente injurídico, à instauração do processo, devendo arcar, em conseqüência, com custas e honorários" (RSTJ - 21.498); "As despesas processuais serão suportadas por quem houver dado causa, de modo objetivamente injurídico, à instauração do processo. Thr-se-á de pesquisar, por conseguinte, se fundada a pretensão" (Sessão de 19.4.94).
Seja lá qual for o melhor princípio para justificar deva "o vencido pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advotacícios", não creio tenha neste caso o soi-disant embargado que responder pelos honorários advocatícios dos soi-disant embargantes. No que tange às custas, a verba não vem a propósito, uma vez que o juiz, quando julgou os embargos de declaração, concluiu desta forma: "Custas, ex lege, pelos cofres do Estado", fl. 85. Não creio deva responder, porque o caso não comporta se fale a seu respeito que houve derrota, objetivamente, ou porque não é certo tenha o Banco do Brasil S.A. dado causa ao processo.
É de se notar ter o acórdão recorrido afirmado que a penhora se efe-
tivara por iniciativa única e exclusiva do meirinho, ou que o então apelado não tivera participação alguma na penhora indevida de bens do então apelante. 'lanto que o juiz se limitou, após a audiência do Banco (e este reclamara do procedimento do oficial, "desatento ao seu mister, procedeu penhora de bens pertencentes a terceiros"), a decidir assim:
"I) Verifica-se que, realmente, o Sr. Oficial de Justiça procedeu a penhora de bens de terceiros, com o que concorda plenamente a instituição Embargada e Exeqüente;
H) Declaro pois, nula a penhora de fls. 34 e 35 dos autos principais, determinando pois, que seja expedido novo mandado de penhora;
IH) Após procedida a nova penhora, nomeio como depositária, a Sra. Arlete Helena Aquino Batista;
IV) Após, vista geral;
V) Cumpra-se incontinenti."
E por ocasião dos embargos de declaração, concluindo desta maneira:
"Diante do exposto e ainda, sugando a seiva de tudo que foi narrado no decorrer do presente processado, mantenho a teor da modesta decisão de fls. 69-v, para, em conseqüência, conceder aos Embargantes, a posse definitiva do imóvel penhorado irregularmente, na parte que lhes perten-
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ce, julgando procedente os Embargos Declaratórios em parte, deixando de condenar a instituição Embargada nos ônus da sucumbência, já que o equívoco partiu de um agente do Estado e a Embargada em nada contribuiu para tal procedimento equivocado.
Expeça-se o competente mandado em favor dos Embargantes, assegurando aos mesmos a posse do imóvel supra, na parte que lhes pertence.
Custas, ex lege, pelos cofres do Estado."
Do contexto, não houve nem vencido nem vencedor, logo à espécie não tem aplicação o aludido art. 20, e também não se aplica o art. 26, por não ser caso de processo terminado por desistência ou reconhecimento. Inviável, pois, o recurso pelo fundamento da alínea a.
Do recurso, no entanto, conheço pelo fundamento da alínea c, parecendo-me quantum satis configurada a divergência. Nego-lhe, porém, provimento. Entendo exata a posição do acórdão recorrido, que se ajusta a precedentes desta 3!! 'lbrma do Superior 'fribunal de Justiça, tais acima declinados.
Conheço pelo dissídio, mas nego provimento.
VOTO - VISTA
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Reside a questão em saber
quem haverá de arcar com os honorários do advogado do embargante quando este não teve participação no ato de penhora nem se opôs a seu desfazimento.
A aplicação, sem outras indagações, do princípio da sucumbência, levaria à condenação do embargado. No tema, entretanto, não se pode deixar de considerar que a justificativa daquele princípio está na causalidade. Esse o entendimento que conduziu ao julgamento do recurso especial, de que fui relator, citado no voto que me precedeu.
No caso, o acórdão recorrido deixou expresso que o apelado não teve participação alguma na penhora. Há de entender-se que nem mesmo por omissão concorreu para o ato que atingiu bens do ora recorrente.
Em tais circunstâncias, o prejuízo sofrido pelo embargante, com a contratação de advogado, será suportado por quem lhe deu causa, como decidiu o julgado em exame.
Acompanho o Relator.
VOTO - VISTA
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuida-se de Embargos de 'Ierceiros para desconstituição de penhora em bens que não do executado.
Discute-se a pretensão dos Embargantes na condenação da verba honorária a conta dos Embargados.
Os doutos votos que me precederam tiveram-na como incabíveis na espécie.
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Assim decidiu a Sentença:
"I) Verifica-se que, realmente, o Sr. Oficial de Justiça procedeu a penhora de bens de terceiros, com o que concorda plenamente a instituição Embargada e Exeqüente;
lI) Declaro pois, nula a penhora de fls. 34 e 35 dos autos principais, determinando pois, que seja expedido novo mandado de penhora;
IlI) Após procedida a nova penhora, nomeio como depositária, a Sra. Arlete Helena Aquino Batista;
IV) Após, vista geral;
V) Cumpra-se incontinenti."
E por ocasião dos embargos de declaração, concluindo desta maneira:
''Diante do exposto e ainda, sugando a seiva de tudo que foi narrado no decorrer do presente processado, mantenho o teor da modesta decisão de fls. 69-v, para, em conseqüência, conceder aos Embargantes, a posse defmitiva do imóvel penhorado irregularmente, na parte que lhes pertence, julgando procedente os Embargos Declaratórios em parte, deixando de condenar a instituição Embargada nos ônus da sucumbência, já que o equívoco partiu de um agente do Estado e a Em-
bargada em nada contribuiu para tal procedimento equivocado.
Expeça-se o competente mandado em favor dos Embargantes assegurando aos mesmos a posse do imóvel supra, na parte que lhes pertence.
Custas, ex lege, pelos cofres do Estado."
E ao concluir seu voto o Sr. Ministro Nilson Naves dispôs:
"Do contexto, não houve nem vencido nem vencedor, logo à espécie não tem aplicação o aludido art. 20, e também não se aplica o art. 26, por não ser caso de processo terminado por desistência ou reconhecimento. Inviável, pois, o recurso pelo fundamento da alínea a.
Do recurso, no entanto, conheço pelo fundamento da alínea c, parecendo-me quantum satis configurada a divergência. Porém lhe nego provimento, entendo exata a posição do acórdão recorrido, que se ajusta a precedentes desta 3!! 'furma do Superior 'fribunal de Justiça, tais acima declinados.
Conheço pelo dissídio, mas nego provimento."
Em face da peculiaridade do caso, como se extrai desse voto, acompanho o nobre Relator.
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RECURSO ESPECIAL N2 54.494-7 - SP
(Registro n2 94.0029234-1)
Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Ricci e Associados Engenharia e Comércio Ltda.
Recorrida: Sociedade Imobiliária Arujá Ltda.
Interessado: Fernandes Mera Negócios Imobiliários S I C Ltda.
Advogados: Drs. Osvaldo Jorge Minatti e outro, Pedro Ercilio Strafac-ci e outros, e Israel Norberto Peixoto
EMENTA: Civil - Ação ordinária - Marca - Nome comercial -Denominação - Fantasia - Registro.
I - O emprego de nomes e expressões marcárias semelhantes -quer pela grafia, pronúncia, ou qualquer outro elemento, capazes de causar dúvida ao espírito dos possíveis adquirentes de bens exibidos para comércio - deve ser de imediato afastado.
U - A proteção legal à marca (Lei ne 5.772/77, art. 59), tem por escopo reprimir a concorrência desleal, evitar a possibilidade de confusão ou dúvida, ou locupletamento com esforço e labor alheios. A empresa que insere em sua denominação, ou como nome de fantasia, expressão peculiar, passa, a partir do registro respectivo, a ter legitimidade para adotar referida expressão como sinal externo distintivo e característico e impedir que outra empresa que atue no mesmo ramo comercial como tal a utilize. Preceden.tes do STJ.
UI - Recurso não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira 'furma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Cláudio Santos, Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro.
Brasília, 04 de abril de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente e Relator.
Publicado no DJ de 15-05-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuida-se de Ação Ordiná-
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ria proposta por Sociedade Imobiliária Arujá Ltda. contra Fernandes Mera Negócios Imobiliários S/C Ltda. e Ricci e Associados Engenharia e Comércio Ltda., objetivando ver as rés compelidas a abster-se do uso da expressão marcária "Arujá" e, ainda, a excluírem de seus impressos, cartazes e propagandas em geral; bem como ressarcimento por concorrência desleal por parte das demandadas.
Julgada improcedente a ação (fls. 269/276), apelou a autora (fls. 284/ 322), tendo a Quinta Câmara Civil do Colendo Tribunal de Justiça de São Paulo, à unanimidade, dado provimento ao apelo para julgar procedente o pedido, impedindo-se o uso pelas apeladas da expressão Arujá 5 como nome de fantasia do loteamento em propaganda e impressos, pena do pagamento de multa, conforme requerido (fls. 349/358).
Rejeitados os Embargos Declaratórios (fls. 3741376), interpôs Ricci e Associados Engenharia e Comércio Ltda. Recurso Especial, fundado no art. 105, IH, a e c, da Constituição, alegando negativa de vigência dos artigos 65, n~ 9; 70 e 72, da Lei n~ 5.772/71, na medida em que considerou a ocorrência de violação aos direitos da marca (fls. 381/389).
Com contra-razões (fls. 392/398), o eminente Thrceiro Vice-Presidente daquele Tribunal o admitiu (fls. 400/402).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): Cuida-se de
Ação Ordinária objetivando abstenção de uso de expressão marcária e ressarcimento por danos ocasionados, segundo entende a demandante, por concorrência desleal de empresa estabelecida no mesmo ramo de seu negócio.
Afirma a ora recorrida:
" ... que tem personalidade jurídica de sociedade por cotas de responsabilidade limitada, com existência legal desde 3 de dezembro de 1949; atua no ramo de compra de loteamento e venda de imóveis próprios, conhecida por expressão característica, ou sej a, Aruj á. É detentora dos registros de marcas nominativas Arujá e Arujazinho, para os serviços das classes 37.05, 37.40 e 40.10, a saber, serviços de engenharia e arquitetura, serviços de construção e reparação de obras civis, serviços de administração, locação e auxiliares ao comércio de bens imóveis, nos últimos incluídos serviços de loteamento, incorporação e vendas de imóveis, administração de condomínios e de imóveis em geral etc.; goza do uso exclusivo das mesmas, na forma do disposto no art. 59, da Lei n~ 5.772, de 21 de dezembro de 1971, Código da Propriedade Industrial, inclusive no que tange à denominação social. Lançou no início da década de 50, no Município de Arujá, loteamento denominado Arujazinho 1; qual seguiram-se os loteamentos chamados Arujazinho 2, Arujazinho 3 e Arujazinho 4; expressões fortemente associadas à apelante e fazendo com que o público estabeleça rela-
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ção de precedência de loteamentos. De seu turno as apeladas, comercializaram no mesmo local do dito município, loteamento denominado Arujá 5, fazendo constar em seus impressos a expressão marcária e da denominação social, ambas de uso exclusivo da apelante ... " (fls. 353/354).
A sentença entendeu inocorrência do uso do nome comercial ou utilização de expressão marcária "de vez que os registros apresentados se referem a marcas de serviços; e o emprego feito pelas apeladas da palavra Arujá, deu-se como denominação de loteamento sito no Município do mesmo nome, sendo que as marcas de serviço constantes para o conhecimento público e vendas são Ricci, para engenharia e Fernandez Mera, para negócios imobiliários. Nenhum impedimento será visto no uso do nome Arujá 5 para o loteamento, considerando-se a sua localização".
O Acórdão a reformou, concluindo pela procedência da ação para impedir o uso da expressão Arujá 5, como nome de fantasia do loteamento em propaganda e impressos; pena de multa, conforme requerido.
Daí a insurgência.
A pretensão, contudo, não vinga.
Os elementos probatórios coligidos nos autos, convencem que a ora recorrente, realmente, praticou a concorrência desleal; lesando direitos alheios, fraudando as marcas registradas e efetivamente usadas pela recorrida.
Diz expressamente o art. 59, do Código de Propriedade Industrial:
"Será garantida no território nacional a propriedade da marca e o uso exclusivo àquele que obtiver o registro de acordo com o presente código, para distinguir seus produtos, mercadorias ou serviços, de outros idênticos ou semelhantes, na classe correspondente à sua atividade".
Com base neste dispositivo legal, procedeu a autora recorrida ao registro das marcas nominativas Arujá e Arujazinho, inclusive, tocante à denominação social.
Assentado na jurisprudência do Supremo 'fribunal Federal e orientação no sentido de que:
"O direito à exclusividade do nome decorre do princípio da novidade, segundo o qual devem ser evitados aqueles que possam determinar engano de terceiros, concorrência desleal, ou confusões prejudiciais ao que já usava por primeiro."
No caso, é evidente que o procedimento da recorrente poderá causar confusões entre as duas empresas, possibilitando o desvio da clientela, falsa idéia ou noção equivocada sobre a propriedade ou identidade de sua concorrente, ora recorrida.
Consoante anotara o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, em precedente de sua relatoria - REsp n2 30.636-3-SC:
"A Empresa que insere em sua denominação, ou como nome de fantasia, expressão peculiar, ma-
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nifestando, assim, inequívoco desejo de que sirva a identificá-la perante a generalidade das pessoas, passa, a partir, do registro respectivo, a ter legitimidade para adotar referida expressão como sinal externo distintivo e característico e impedir que outra empresa que atue no mesmo ramo de comércio como tal a utilize." (RSTJ 53/225).
Por isso que, ao contrário do que se alega, não se configura qualquer ofensa aos dispositivos legais, eis que o Acórdão, ante as circunstâncias e fatos carreados aos autos, deu correta aplicação do direito à espécie harmonizando-se, inclusive, com a orientação consolidada nos Tribunais Superiores. De seu teor, merece destaque os seguintes tópicos (fls. 356/358):
"Firme é a jurisprudência ensinando que o emprego de nomes e expressões marcárias semelhantes - quer pela grafia, pronúncia, ou qualquer outro elemento, capazes de levar dúvida ao espírito dos possíveis adquirentes dos bens exibidos para comércio - deve ser prontamente desestimulado.
O caso ora em estudo mostra a apelante estabelecida em vendas de loteamentos, os quais guardam forte entrelaçamento através das denominações com que vieram a lume e são conhecidos; bem indicados os empreendimentos estampando nome especial, ou seja, Arujazinho, seguido de número para dar cronologia à ordem dos lançamentos.
As apeladas no empreendimento que implantaram no mesmo município e nas proximidades daqueles da apelante, utilizaram-se do nome Arujá 5, em tudo parecido e capaz de estabelecer na inteligência dos possíveis compradores ligação com os anteriores da apelante, propiciando confusão e permitindo imaginar-se origem e seqüência. Reforçam a idéia supra-mencionada afirmando nos prospectos de comercialização que o Plantão de Vendas encontra-se em frente aos Arujazinhos 1, 2, 3 e 4.
Quanto ao uso de nomes geográficos o registro pode ser admitido (e, via de conseqüência exclusividade de uso) desde que usado como nome de fantasia. É exatamente a hipótese dos loteamentos da apelante, que fez da expressão nome de fantasia.
'lenha-se em contra não se objetivar produto, no sentido de criação ou fabricação pela apelante, mas de loteamento de bem imóvel. E em tal caso, somente se pode admitir uso como nome de fantasia. Parece certo que o disposto nos arts. 65, n~ 9, 70, 71 e 72, da Lei n~ 5.772, de 21 de dezembro de 1971 (Código de Propriedade Industrial) não se ajustam à hipótese dos autos.
Prevalece sempre visível que a expressão Arujá 5 liga-se intimamente às denominações Arujazinho 1, 2, 3 e 4, reforçando o ·ambiente de continuidade, uma só origem, como que integrando única constelação determinando certas qualidades de forma a permi-
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tir idéia falsa junto ao público em geral.
O que configura ilicitude.
Por outro lado, a prática destacada potencialmente capaz de confundir os empreendimentos acima mencionados, especialmente pelo uso do nome, estampa concorrência desleal. Reafirma-se que os loteamentos Arujazinho aparecem em seqüência definida, com uso prolongado, que os tornam distintos e conhecidos, individuados e englobados numa só tessitura."
Nesse mesmo sentido foi a orientação adotada no precedente de minha relatoria, quando do julgamento do REsp n 2 12.694-0-SP, cujo Acórdão, por sua ementa, dispôs:
"Assim, vigente lei especial, o INPI é o órgão onde, registrada a marca, se lhe atribui validade erga omnes da propriedade. Quanto ao nome comercial, sua validade e publicidade são requisitos conferidos pela Junta Comercial, por isso que ambos os titulares (Marca e nome comercial) têm legitimidade, cada qual no seu campo específico de atividade, para utilizá-los, evitando que o nome comercial resulte em instrumento de captação de clientela, deslealmente aplicado no ramo explorado pela Marca." (DJ de 02.12.91)
Conforme leciona Rubens Requião, citado nesse precedente:
''No direito brasleiro, verificouse profunda alteração do sistema. No Código anterior o registro não atribuía o direito de propriedade da marca, mas apenas o reconhecia, o declarava. Esse direito preexistia à lei. Então podíamos repetir com Roubier, professor da Faculdade de Direito de Lion, que "a propriedade da marca pertence ao primeiro ocupante, isto é, aquele que dela fez o primeiro uso." E tanto esse entendimento era procedente, no que diz respeito ao direito brasileiro, que o artigo 78 do Código Revogado dispunha que "não será ainda registrada a marca que constituir reprodução ou imitação da marca de terceiro, ainda que registrada, mas em uso comprovado no Brasil, desde que o respectivo utente ofereça impugnação válida".
Esse preceito não foi repetido pelo atual Código (Lei n2 5.772, de 21.12.1971). O art. 78 do Código de 1969 não tem correspondente no Código vigente.
Isso nos leva a afirmar que modificados profundamente o sistema, passando a adotar o atributivo ou constitutivo. O registro, e não a ocupação ou uso anterior, é que constitui o direito à propriedade da marca. É titular do direito, conseqüentemente, o primeiro a registrá-la." (Curso de Direito Comercial, 14!! ed., 1984, pág. 174).
De igual, em outro precedente da 'numa, relatado pelo eminente Ministro Costa Leite, onde se consignou:
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"Não há negar que marca e nome comercial são coisas distintas, mas, dada a relação existente entre elas no universo mercantil, perfeitamente viável, em nosso ordenamento jurídico a pretensão de abstenção de uso da expressão designativa da marca em nome comercial, gozando aquela da proteção não só em razão da Convenção da União de Paris como pela anterioridade do registro do INPI. Cumpre verificar se há possibilidade de confusão." (DJ de 19.12.94)
E, assim, também, entende a Quarta Thrma, conforme Aresto proferido no REsp n!! 9.142-0-SP, Relator eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, cuja ementa dispôs:
"Direito Comercial. Marca e nome comercial. Colidência. Registro. Classe de atividade. Princípio da especificidade (art. 59 da Lei n!! 5.772/71). Interpretação lógicosistemática. Recurso conhecido e provido.
I - Não há confundir-se marca e nome comercial. A primeira, cujo registro é feito junto ao INPI, destina-se a identificar produtos, mercadorias e serviços. O nome comercial, por seu turno, identifica a própria empresa, sendo bas-
tante para legitimá-lo e protegêlo, em âmbito nacional e internacional, o arquivamento dos atos constitutivos no Registro do Comércio.
II - Sobre eventual conflito entre uma e outro, tem incidência, por raciocínio integrativo, o princípio da especificidade, corolário do nosso direito marcário. Fundamental, assim, a determinação dos ramos de atividade das empresas litigantes. Se distintos, de molde a não importar confusão, nada obsta possam conviver concomitantemente no universo mercantil."
Com efeito, o comportamento da recorrente induz, efetivamente, a clientela à confusão, ultrapassa o limite do direito ao nome, de fantasia que pretende ostentar como direito comercial, invadindo, ainda, a esfera da marca alheia; e tal não é permitido pelo ordenamento jurídico.
Ao demais, tocante à boa ou má exegese que se pretende tenha o Acórdão dado os termos dos dispositivos apontados, implicaria em reexaminar matéria de fato e provas, inclusive pericial, defeso na via do Especial (Súmula n!! 07, do STJ).
Ante o exposto, não conheço do recurso.
RECURSO ESPECIAL N!! 55.915-4 - DF
(Registro n!! 94.0032028-0)
Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Maracy Pinheiro Guimarães
214 R. Sup. 'Ii:ib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
Recorrido: Herald Thbb de Moraes - espólio
Advogados: Drs. Maurílio Moreira Sampaio e Domeciano de Sousa Medeiros
EMENTA: Civil - Responsabilidade por acidente de trânsito -Vítima associada ao sistema previdenciário ou de seguro.
I - A jurisprudência do STJ consolidou entendimento no sentido de que apurada a responsabilidade decorrente de acidente automobilístico ou outro evento danoso, o causador há de reparar o dano (culpa aquiliana) com supedâneo no direito comum e inviável é compensar tal reparação com a que a vítima há de perceber em decorrência de sua vinculação a sistema previdenciário ou securitário.
11 - Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira 'furma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Cláudio Santos, Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro.
Brasília, 25 de abril de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente e Relator.
Publicado no DJ de 21-08-95. Republicado no DJ de 11-09-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Nos autos da ação de re-
paração de danos intentada por Maracy Pinheiro Guimarães contra Herald Thbb de Moraes (Espólio), o autor, ora recorrente, interpõe ao acórdão (embargos infringentes) recurso especial (art. 105, 111, a e c, do permissivo constitucional).
O acórdão recorrido, mantendo o entendimento do voto majoritário, concluiu que a indenização conseqüente à culpa deve se restringir a uma justa reparação, sob pena de se degenerar em fonte de enriquecimento sem causa (fls. 263), dela deduzindo-se o que perceber a vítima em decorrência de sua vinculação a sistema previdenciário ou securitário.
Na insurgência, sustenta-se que o aresto teria vulnerado os arts. 159 e 1.539 do Código Civil e discrepado da jurisprudência colacionada às fls. 285/286.
Por despacho de fls. 295, indeferiu-se o prosseguimento do recurso,
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atendendo-se a que o dissídio jurisprudencial não restou configurado, enquanto que, de outro modo, pela letra a, os artigos ditos violados foram bem aplicados, eis que espelham os fatos da causa.
'lbdavia, improvido o Agravo de Instrumento, reconsiderei-me provendo Agravo Regimental deferi a subida dos autos a esta Corte, para melhor exame da matéria suscitada (fls. 297).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): Examino o apelo pelo dissídio.
A fundamentação que levou o em. Relator à conclusão do voto majoritário, ao depois confirmado pelos Infringentes improvidos, assentou-se totalmente nos fatos e provas da demanda, por isso que com supedâneo no art. 159, do Código Civil.
Alguns trechos dessa decisão demonstram como deduziu a hipótese o em. Prolator (fls. 207/210):
"A responsabilidade do Réu na provocação do grave acidente decorreu de perícia oficial, produzida pelo Instituto de Criminalística, da SSPIDF.
O Réu tentou desmerecer o exame oficial pela oferta de parecer particular, elaborado por Técnico, mas que integra o escritório de advocacia de seu patrono. Thm-
bém por isso que esse parecer não mereceu avaliação positiva do MM. Juiz autor da sentença.
Sustento que a responsabilidade do Réu e o seu dever de indenizar os prejuízos do Autor foram bem julgados na instância regular.
No que tange à fixação dos diversos itens indenizatórios postulados na inicial, entendo que o MM. Juiz não se houve com acerto em todos eles, como procurarei demonstrar.
Os documentos de fls. 28/34 provam, sim, despesas realizadas pela esposa do Autor para contratação de empregado doméstico que lhe prestou serviço necessário de remoção de seu marido da cama para a cadeira de rodas e vice-versa e para colocá-lo em veículos, uma vez que, em razão do acidente, se tornou paraplégico. O acidente ocorreu em 8 de fevereiro de 1986 e referido empregado foi contratado de janeiro a julho de 1987 quando a esposa do Autor passou a revelar problemas de coluna pelo esforço inusitado e excessivo para o deslocamento de seu marido.
O MM. Juiz também não divisou por perspectiva adequada as despesas que o Autor suportou, com seu tratamento, e que foram objeto de glosa pela Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, consoante se encontra assinalados nos documentos de fls. 61/8. As quantias ali in-
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dicadas como "glosas ou exclusões" tiveram que ser mesmo pagas pelo Autor, daí que devem ser compostas pelo Réu. A prova neste particular é suficiente e incontendível.
O último ponto a merecer reparo na ilustrada sentença diz com o fato de se ter reconhecido o direito de o Autor perceber a pensão fixada até apenas os sessenta e cinco anos de idade. Porém o direito do Autor deverá viger enquanto vida tiver. Se porventura vier a falecer antes de completar 65 anos, seus herdeiros lhe sucederão no direito à pensão pelo tempo que faltar para completarse a idade referida; se morrer depois dos 65 anos, nenhum direito assistirá a seus herdeiros.
Fora do que anotei, reconheço que a ilustrada sentença se houve com todo acerto, inclusive no que concerne à condenação para ressarcimento do dano moral, que sempre sustentei reclamável e sobre o que se afastou toda a dúvida a partir da vigente Constituição Federal, que consagrou o direito (CF, art. 5~, item V).
Desejo, ainda, manifestar-me sobre o ponto da apelação do Autor que revela inconformidade com a sentença por lhe ter arbitrado a pensão apenas na diferença entre o que o Autor receberia na atividade e o que já percebe como compensação previdenciária oficial e privada.
Não estou de acordo com os precedentes jurisprudenciais cola-
cionados nas razões do apelo. Adicionar ao ressarcimento previdenciário uma pensão judicial, resultante desta demanda, equivalente ao que o Autor perceberia se em atividade estivesse, significaria transformar o infortúnio numa fonte de enriquecimento, fato que se mostraria repudiável no âmbito do direito e também da moral. A pensão não pode exceder o limite do que renderia a atividade do Autor, do contrário parte do ressarcimento não teria causa. Argumentar-se com o fato de constituir-se em benefício para o Réu ter que resgatar apenas a diferença entre o ganho da atividade e o da aposentadoria do Autor é olvidar que aquele poderá, eventualmente, ser acionado para recompor o Instituto de Previdência Social e a Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil das quantias por eles gastas com a aposentadoria de seu segurado.
Duas as parcelas indenizatórias indicadas na inicial estarão sujeitas a liquidação: a que se refere ao dano estético ou moral e a concernente à atualização da pensão mensal pelas promoções do Autor, por antigüidade, até o último posto efetivo da carreira.
Quanto ao dano moral, declaro que ele deverá ser calculado por arbitramento.
Sobre a atualização da pensão, declaro que ela deverá ser apurada, desde logo, pela média dos valores que o Autor obteria com as
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promoções, por antigüidade, a partir do ato de sua aposentadoria até o final da carreira, se permanecesse na atividade."
Aderindo-se a esses lineamentos, e afastando a tese da reformatio in pejus levantada pelo recorrente, à unanimidade, improveram-se os Infringentes, deduzindo-se (fls. 268/ 269):
"Entende o Embargante que, pelo teor do voto vencedor, houve reformatio in pejus no que respeita ao cálculo da pensão mensal, uma vez que na sentença recorrida ficou estabelecido que a pensão seria correspondente à diferença entre o que receberia o Embargante se em atividade estivesse, computadas as promoções por antigüidade até a última referência da carreira efetiva e o que vem recebendo como aposentado do INPS e da Caixa de Previdência do Banco do Brasil. Aduz que, no apelo, sustentou, apenas, que o cálculo da pensão deveria corresponder aos vencimentos integrais que receberia como funcionário do Banco do Brasil, computadas as promoções, sem levar em consideração o que recebe como aposentado. Assim, o critério pela média dos valores, adotado no voto vencedor, não foi objeto da apelação do Autor-Embargante nem do Réu-Embargado, logo, sua adoção não constitui ofensa ao art. 512, do C.P.C.
Sem razão o Embargante. Nas razões do recurso interposto pelo
Embargado, insurgiu-se este quanto ao critério adotado na sentença recorrida para o pagamento da pensão, verbis: "A parte da sentença que condenou o réu/apelante ao pagamento da pensão mensal correspondente à diferença entre o valor que estiver recebendo e o que receberia se estivesse em atividade, computadas as promoções por merecimento até (s-12), é incompatível com o bom direito e justiça, visto que a referida promoção não ocorre simultânea e antecipadamente, obedece critérios rigorosos estabelecidos pelo Banco do Brasil entre seus milhares de funcionários que concorrem à eventual e incerta promoção que, no caso em questão, não pode tornar certa e antecipada em razão do acidente ... ".
Não há pois, como se negar que a matéria foi impugnada pela parte.
Quanto ao ressarcimento das despesas com o tratamento da VÍ
tima e pleiteado com fundamento nos documentos juntados aos autos, fls. 35/47, 49/51 e 53/60, temos que, tanto a sentença quanto o voto vencedor repeliram tal pretensão, eis que os documentos referidos não se constituem em prova suficiente para embasar o ressarcimento.
Assim, creio, data venia, que há de prevalecer o voto majoritário que merece subsistir pelos seus próprios fundamentos, por isso que a indenização conseqüen-
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te à culpa deve se restringir a uma justa reparação, sob pena de se degenerar em fonte de enriquecimento sem causa."
Do exposto, deduz-se que o decisum é a manifestação plena do que se dessume da matéria fática da lide, o que tornaria inviável sua reavaliação em sede de Especial, a teor do que promana do verbete 07, do STJ.
'Ibdavia um aspecto que ressuma manifesto no decisum vem destoar de tese juridica, de há muito, já acolhida pela Corte.
Trata-se do critério com que se aplicou a indenização.
O certo é que o recorrente, funcionário do Banco do Brasil S/A, filiado de sistema de previdência e Caixa de Assistência, veio a sofrer, em acidente rodoviário, danos físicos os quais lhe deixaram paraplégico, resultando comprovadamente definida a culpa aquiliana - art. 159, do Código Civil - do causador.
O ponto relevante da questão que aqui se afIora é o fato de as Instâncias ordinárias não terem se apercebido de que, na hipótese, necessário se fazia, a partir do dano, distinguir a responsabilidade, no caso, aquiliana, derivada de texto inserto no estatuto civil (art. 159) da obrigação contratual da que promana no sistema previdenciário ou securitário a que filiado a vítima, por força de sua condição profissional.
Daí já se percebe que duas e distintas hão de ser as fontes de onde
devem derivar as devidas reparações.
A jurisprudência do STJ, em caso que tal, tem entendido assim.
De minha relatoria, no REsp n~ 35.120, à unanimidade, concluiu a Terceira Thrma que a indenização acidentária não obsta a de direito comum, quando o empregado incorre em culpa grave, nem a da incapacidade para o trabalho e a da depreciação sofrida excluem a devida em razão do dano estético e, enfim, do valor da indenização comum não se deduz a recebida em razão da legislação infortunística.
Além de outras razões, no caso, alinha-se a de que, na previdência ou seguro, tem-se como escopo uma indenização de natureza obrigacional, contra-prestacional, o que é diferente do caso da responsabilidade advinda da culpa aquiliana, extracontratual.
No precedente n~ 43.692-3, reI. o em. Min. Sálvio de Figueiredo, o tema vem bem exposto, como assim:
"Por primeiro, é de assinalarse, a obrigação de índole previdenciária possui natureza securitária, contratual, sujeitando-se ao regime da responsabilidade objetiva, bastando ao obreiro evidenciar o nexo causal entre a debilidade sofrida e o desempenho de sua atividade laboral para fazer jus ao benefício.
De salientar-se, ademais, que o chamado seguro de acidentes do trabalho era custeado, segundo o que dispunha a Lei 6.367/76, vi-
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gente à época do acidente, com recursos que provinham em parte do próprio segurado (art. 15), disso resultando evidenciado o caráter também contraprestacional do benefício previdenciário concedido em casos de infortúnio laboral, assemelhado, em grande medida, ao previsto nos contratos de seguro (de risco) privado.
J á o dever reparatório imposto com base no disposto no art. 159, CC, encontra fundamento na responsabilidade aquiliana (extracontratual) e subjetiva, comente respondendo o empregador pela indenização a esse título se comprovado haver agido com dolo ou culpa. E, anote-se, tal responsabilidade lhe é carreada não em razão do vínculo empregatício mantido com o lesado, mas sim em função do prejuízo que com sua conduta causou a outrem.
Dessa distinção já resulta um dos fundamentos que autorizam a cumulabilidade.
Mutatis mutandis e guardadas as devidas proporções, não se conceberia, exempli gratia, isentar um homicida de responder pelos danos materiais e morais ocasionados aos familiares e dependentes da pessoa cuja vida tenha sido por ele eliminada apenas pelo fato de possuir essa pessoa cobertura securitária para caso de morte.
Por outro lado, o benefício previdenciário nem sempre representa restitutio in integrum, sen-
do exemplificativa a espécie de que se cuida, em que o autor, no exercício das funções de carpinteiro, veio a ser atingido na cabeça por uma peça de madeira, causando-lhe paralisia dos membros superiores e inferiores. Ainda que a aposentadoria por invalidez permanente paga pelo INSS tenha sido concedida de molde a garantir-lhe a percepção dos mesmos rendimentos que auferia em atividade, é certo que não lhe compensou a dor experimentada, a diminuição da sobrevida, as dificuldades decorrentes da perda dos movimentos e a impossibilidade de progredir profissional e economicamente.
Seja como for, o fato é que o recebimento do benefício previdenciário não é impeditivo do pleito para obtenção da reparação de direito comum.
Em alguns casos, é certo, o valor recebido a título de seguro pela vítima é compensado, é abatido do montante indenizatório devido pelo responsável culposo ou doloso, tal como ocorre, v.g., nas hipóteses de seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores.
Nem mesmo essa compensação, no entanto, se mostra admissível na espécie. E não se mostra admissível, a uma, porque, como visto, o seguro de acidentes do trabalho era, na época do sinistro (1981), custeado também pelo segurado; a duas, de forma mais
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ampla, em virtude de toda a nova sistemática, instituída pela Lei 6.637/76, que não mais permitiu tal compensação segundo reiterado entendimento jurisprudencial, sustentado inclusive pelo Supremo.
A esse respeito, apropriado citar artigo doutrinário de Humberto Theodoro Júnior, em que o seguro processualista mineiro, historiando a evolução do Direito brasileiro no que diz com a responsabilidade em tema de acidentes do trabalho, estabelece, com precisão, o marco a partir do qual não mais se admitiu fosse o beneficio acidentário concedido pelo órgão previdenciário abatido, a título de compensação, do montante indenizatório devido pelo empregador:
"Até o advento da nova Carta, longa foi a evolução da responsabilidade civil em concorrência com a responsabilidade acidentária. Inicialmente, negava-se qualquer cumulação, por se entender que o seguro acidentário exonerava o patrão de qualquer risco no âmbito do trabalho. Mais tarde, o DL 7.036/44 veio abrir ensejo para uma reparação civil complementar da indenização proveniente do acidente laboral, na hipótese de dolo do empregador ou de seus prepostos (art. 31).
A jurisprudência, em seguida, equiparou a culpa grave ao dolo (Súmula 229 do STF). Mas
a indenização civil não era completa, pois apenas compreendia a parte em que a indenização acidentária fosse menor do que a reparação comum do ato ilícito.
Com a superveniência da Emenda Constitucional de 1969 e da Lei 6.367/76, deu-se a completa transformação do seguro de acidentes do trabalho em seguro social, ou seja, o acidente foi totalmente absorvido como risco acobertado pela Previdência Social.
A partir de então, firmou-se a jurisprudência pelo STF no sentido de que a responsabilidade civil comum não mais seria simples complemento da acidentária, mas gozaria de completa autonomia, passando o acidentado a merecer por inteiro as duas indenizações, porque cada uma delas teria causa própria e distinta. Continuou-se, todavia, a exigir, para esse cúmulo indenizatório, a ocorrência de dolo ou culpa grave do patrão (RE 94.429-0, in Lex-jur., STF 68/101; TJSP, Uno Jur., Ap 38.705-1, in RTJESP, 92/405; TJMG, Ap 67.638, in Humberto Theodoro Júnior, Acidente do Trabalho e REsp Civ. Comum, S. Paulo, Saraiva, 1987, pág. 301; TJSP, Ap 255.374, in RT, 537/105; TJMG Ap 64.554, in Humberto Theodoro Júnior, ob. cit., pág. 328; 1~ TARJ, Ap n~ 10.239/78, in RT, 530/217). Ver nosso "Aci-
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dente do Trabalho na Nova Constituição" in Revista Jurídica, vol. 141/5 e Síntese Trabalhista, vol. 4/28).
Agora, a Constituição de 1988, além de manter o regime de seguro previdenciário pra o acidente do trabalho, deu o passo final para separar, total e definitivamente, o regime da infortunística do regime da responsabilidade civil.
Com efeito, ao enumerar os direitos sociais dos trabalhadores, a nova Carta, no art. 7?, XXVIII, arrola o "seguro contra acidente de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa."
Esse dispositivo trouxe uma grande e fundamental inovação, pois, com ele, a responsabilidade civil do patrão caiu totalmente no regime do Código Civil. Não se cogita mais do tipo de culpa para impor o dever de reparar o dano regulado pelo Direito Comum. Qualquer que seja, portanto, o grau de culpa, terá o empregador de suportar o dever indenizatório, segundo as regras do Direito Civil, sem qualquer compensação com a reparação concedida pela Previdência Social" ("A Nova Constituição e o Direito
Civil", Revista Jurídica n? 148, fevereiro/1990, pág. 12/13).
Há, portanto, in casu, indiscutível possibilidade de cumulação das obrigações previdenciárias (a cargo do INSS) e de direito comum (a cargo do empregador), não havendo que se falar sequer em compensação."
Forte nessas razões, conheço do recurso pelo dissídio e cassando no ponto o Acórdão lhe dou provimento na forma requerida, mantendo-se, no mais o Aresto.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: 'renho alguma dúvida sobre a matéria. Salienta-se que se trata de pagamentos com diferentes origens, fundados em títulos distintos. Cumpre lembrar, entretanto, que uma delas corresponde a contraprestação do que foi pago, ao menos em parte, pelo empregador. Ademais, o fato de serem diversos os títulos não afasta o fundamental: o dano a ressarcir é um só.
Como a matéria já está julgada e havendo o Relator esclarecido que a egrégia Quarta Turma vem decidindo no mesmo sentido, vou apenas consignar essas observações.
Acompanho a Turma.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
RECURSO ESPECIAL N~ 56.545-6 - CE
(Registro n~ 94.0033909-7)
Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Condomínio Edifício Villa Borguese
Recorrido: Célio José Maia Melo
Advogados: Drs. Kennedy Reial Linhares e outro, e Adriano Veríssimo Pouchain
EMENTA: Civil - Condomínio - Quorum para alteração de fração ideal - Necessidade do consenso de todos os condôminos - Matéria de fato.
I - Doutrina e jurisprudência são acordes no entendimento de que, no quorum para alteração de fração ideal, necessário se faz o consenso de todos os condôminos e, até mesmo nos casos em que a Assembléia ou a Convenção autoriza a estimativa das cotas, a votação há de ser unânime.
H - Matéria de fato não se reexamina em Especial (Súmula n 2
07-STJ).
IH - Recurso não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Thrceira Thrma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do Recurso Especial. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Cláudio Santos, Costa Leite, Nilson N aves e Eduardo Ribeiro.
Brasília, 17 de abril de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente e Relator.
Publicado no DJ de 22-05-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Trata-se de ação de cobrança intentada contra o condomínio do Edifício Villa Borguese pelo Síndico deste, ao escopo de recolher taxas e encargos condominiais atrasados.
O acórdão impugnado concluiu (fls. 100):
"O condômino está obrigado a concorrer apenas com as despesas necessárias à efetiva manutenção do condomínio, ainda que não utilize sua unidade habitacional,
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desde que tais despesas tenham sido aprovadas pela Assembléia Geral.
As despesas com obras ou aquisições que apenas acrescentem utilidade ao condomínio somente serão rateadas entre aqueles que as aprovaram.
A correção da fração ideal do terreno em que se acha encravado o edifício possuído em comunhão, relativa a um ou a vários dos condôminos, somente pode ser feita pela assembléia geral, à vista de elementos técnicos incontestáveis."
Inconformado com esta conclusão, o Condomínio autor e ora recorrente, interpõe, contra o decisum, Recurso Especial, onde, com arrimo na alínea a do permissivo constitucional, alega feridos os ditames legais insertos nos arts. 1f?, 9f?, §§ 1f? e 2f?; 12, §§ 1f?, 4f? e Sf?; 20 e 21; 24, §§ 1f?, 2f? e 3f?; e 2S, da Lei nf? 4.S91 /64.
O despacho de fls. 124, deferiu a ascensão do apelo a esta Corte, ao fundamento de que a questão remanescente, a qual se refere à fixação de cotas, transparece suscetível de controvérsia.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): O eminente Relator do aresto recorrido, deduziu (fls. 101/103):
"O apelante se insurge contra a cobrança que lhe é feita de contribuições condominiais, sob cor como visto no relatório, de ter sido alterada sua fração ideal do terreno em que se acha encravado o edifício possuído em comunhão, do que resultou incremento de cerca de 50% (cinqüenta por cento) no valor de sua cota.
É esse o cerne da questão, decorrendo os demais pontos do que sobre isso for decidido.
Proprietário de uma das unidades condominiais - um apartamento de cobertura - o recursante teve sua fração ideal do terreno modificada, por assembléia geral do Condomínio, de, 4,16% para 6,16%, sem que se adotasse qualquer procedimento técnico conducente a essa conclusão.
É evidente que um leigo, razoavelmente instruído em matemática, poderá, à vista da planta do edifício, retificar, se for o caso, qual a fração que cabe a cada condômino. Esse procedimento, no entanto, não é de ser aceito para o fim de que se cuida, face aos direitos envolvidos na questão.
O que se não há de admitir, portanto, é que, sem a participação do interessado e sem procedimento técnico conveniente, se altere, por simples e desassistida deliberação da maioria dos comunheiros, a fração do condômino.
A alteração, por envolver interesse juridicamente protegido do interessado, é de ser precedida de
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laudo pericial, e elaborada com a participação daquele a quem a modificação afeta, que poderá acompanhá-la por si ou por técnico habilitado.
Somente a partir daí é que as novas contribuições podem ser reclamadas do apelante.
Bem é de ver, nesse ponto, que, nos termos da Lei, cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na convenção a cotaparte que lhe couber em rateio.
Note-se, por oportuno, que as únicas despesas a que está o condomínio obrigado a arcar, são aquelas necessárias à manutenção do condomínio. 'Ibdas as outras, por mais úteis que sejam, não obrigam à totalidade dos comunheiros. Dê-se, como exemplo, a aquisição de um terreno apegado àquele em que se ergue o edifício possuído em comunhão. Tal compra, a toda evidência, valoriza o bem. No entanto, não é, de modo algum, necessária ao condomínio, não sendo, por essa só razão, de necessário rateada entre todos os condôminos, mas somente entre aqueles que aprovaram a aquisição, os quais, ou se tornam proprietários exclusivos da nova parcela de terreno ou o incorpora, por liberalidade, ao condomínio, sem que possam, repita-se, exigir dos demais a participação na aquisição do novo imóvel. Nesse sentido é o julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, assim ementado: "Alteração ou modificação no pla-
no original da construção reclama a.unçmimidade das frações ideais. No caso, por se tratar de um conjunto de edificações (dois blocos), e pelo fato de ser o Condomínio um só, qualquer alteração do projeto dependerá da unanimidade dos condôminos dos dois blocos. Esses princípios se aplicam ao Condomínio por força do critério genérico inserto no art. 43, IV, c/c o art. 10 da Lei n!! 4.591/64. Essa tese foi, ainda, consagrada pela 1~ Câmara do TJSC". (Cf. Ementário Forense, v. 319, julho de 1975, ano XXVII).
É que o pagamento das despesas do Condomínio repousa em um princípio: o princípio do direito correlativo ao gozo. Isto pressupõe que o condômino que não se utiliza de um determinado serviço não está obrigado a contribuir para as despesas de sua realização e/ou manutenção. Esse o entendimento que da Lei específica emana encontrando apoio unÍssono na doutrina e na jurisprudência dos nossos Tribunais.
Noutro torneio frasal, pode-se dizer que quanto à obra ou serviço incompatível com a categoria do prédio, ou muito dispendiosa, é perfeitamente razoável que o condômino a ela se oponha, ficando o rateio a ser feito apenas entre aqueles que pretendem sua realização. A mesma posição poderá ser tomada em relação a obras desnecessárias, ou voluptuárias, ou aquelas benéficas a apenas uns. O que se rateia, obric
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gatoriamente, são as despesas necessárias à conservação do edifício, que tragam vantagens relativas ao uso e gozo do prédio pelos condôminos.
Dessarte, as modificações que se pretendem fazer no condomínio hão de obedecer a esse critério, se o seu custo há de ser rateado entre todos os condôminos."
Fazendo reservas a algumas das assertivas nele contidas; afigura-se, contudo, no ponto, como correto o Acórdão recorrido tendo presente que o Condomínio foi constituído sob a égide da Lei nó! 4.591/64 (fls. 24). As frações ideais correspondentes às unidades autônomas foram previamente estabelecidas no memorial de incorporação por isso que consignados na escritura de convenção do condomínio (fls. 14) e a correspondente ao apartamento do recorrido encontra-se devidamente registrado no Registro de Imóveis como se vê do documento de fls. 46.
Assim a alegada alteração promovida por maioria dos Condôminos, ainda que por 2/3 é írrita no que diz com a alteração da fração ideal do recorrido, após doze anos da instalação do Condomínio. Isso porque consoante entendimento da doutrina, mesmo nos casos em que a Assembléia de Condôminos tem o poder de alterar a estimativa das frações a votação há de ser unânime "pois que o efeito da deliberação repercute na esfera jurídica de todos e de cada um, reduzindo os encargos de alguém em prejuízo de outrem e afastando a
distribuição do valor das cotas individuais de cada comunheiro no valor global do edifício", conforme lição do autor da lei que regula a espécie, Professor Caio Mário da Silva Pereira (Condomínio e Incorporações, Forense, 3"! ed., 1976, n 2 45, pág. 101).
E assim é porque, ainda na afirmação do mesmo tratadista "a fração ideal no condomínio sobre o terreno e partes comuns do edifício ... resulta da fusão indissociável da propriedade exclusiva do apartamento" (mesma obra, n 2 43, pág. 97).
Tal entendimento, diga-se, não discrepa do Pretoriano como se extrai do Acórdão proferido no RE nó! 96.409-6-RJ, Relator o Senhor Ministro N ery da Silveira, que embora não conhecendo do Extraordinário deixou consignado em sua ementa:
"Ementa: Condomínio. Fixação da fração ideal do terreno correspondente a cada unidade na convenção condominial. A alteração excepcional da fração depende de consenso de todos os condôminos. Construção no fundo do terreno de novas unidades. Hipótese em que não houve autorização de todos os condôminos. Ação declaratória julgada procedente. Exame de cláusulas contratuais e análise de prova. Sua inviabilidade, no recurso extraordinário, em face das Súmulas n!& 454 e 279. Diante das Súmulas n!2.ô. 282, 356 e 454, não há reconhecer ofensa ao art. 153, §§ 2ó!, 3ó! e 22, da Consti-
226 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
tuição, ou negativa de vigência dos arts. 572 e 1.056, do CCB. Incidência, no caso, também, da Súmula n~ 283. Recurso Extraordinário não conhecido." (DJ de 14.3.86)
De igualo Senhor Ministro Barros Monteiro, ao definir a inteligência do art. 628, do Código Civil, na ementa escrita para o Acórdão proferido no REsp n~ 3.234-0-RJ:
"Condomínio. Alteração de coisa comum. Quorum necessário para a deliberação.
Não se cuidando de modificação que importe em transformação da substância ou destino da coisa, prescindível {o consenso unânime dos condôminos. Inteligência do art. 628 do. Código Civil.
Recurso Especial não conhecido." (DJ de 22.10.90)
Lembrando-se que na hipótese vertente, alterar a fração correspondente à unidade autônoma implica, necessariamente, na alteração da substância do direito de propriedade do titular, como, mesmo antes da edição da Lei de Incorporação e Condomínio, já deixara assente o Egrégio Supremo Tribunal Federal em
Acórdão unânime liderado pelo Senhor Ministro Antônio Neder na expressiva ementa do Acórdão conforme RTJ 71 /425:
"1. Incorporação. Condomínio. Decreto n~ 5.481/28. Para modificar ou afrontar direito de cada condômino sobre as coisas comuns, alterar o destino de fração autônoma do prédio não basta o voto da maioria, mas necessário é o assentimento de todos os consortes.
2. Recurso Extraordinário provido."
Thnto não fosse dessume-se ainda que a conclusão do Julgado é reflexo direto dos aspectos concretos configuradores da hipótese, até, acenando, por outro lado, a necessidade de exame de fatos da causa, Atas de Assembléia Geral, Convenção de Condomínio, Registros de Imóveis e demais elementos de provàs.
'!rata-se, à toda evidência, de matéria de fato, essa em que se assenta a conclusão do decisum hostilizado e seu revolvimento em sede de Especial é inviável, a teor do que promana do verbete n~ 07, do STJ.
Por tais fundamentos, não conheço do recurso.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 227
RECURSO ESPECIAL N2 57.364-5 - MG
(Registro n2 94.0036385-0)
Relator: O Sr. Ministro Costa Leite
Recorrente: Banco do Estado de Minas Gerais S/A - BEMGE
Recorridos: Moris Simão Tuma e outros
Advogados: Drs. José Augusto Lopes Neto e outros, e João José dos Santos
EMENTA: Embargos de terceiro. Impenhorabilidade.
Embargos de terceiro opostos por quem é parte no processo em que ocorreu a constrição judicial. A impenhorabilidade do bem, em face da Lei n e 8.009/90, é tema estranho à equiparação legal (§ 22 do art. 1.046 do CPC). Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira Thrma do Superior Tribunal de Justiça, em conformidade com os votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos.
Brasília, 10 de outubro de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro COSTA LEITE, Relator.
Publicado no DJ de 13-11-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE: A espécie foi assim sumariada no acórdão de fls. 44/50:
"O Banco do Estado de Minas Gerais S.A. promove execução por quantia certa contra diferentes coobrigados cambiais, objetivando constrangê-los ao pagamento do principal e acessórios da nota promissória exeqüenda.
Recaindo a penhora sobre prédio residencial dos avalistas-apelantes, estes aviaram embargos de terceiro, ao fundamento de que o imóvel constritado, por constituir bem de família, seria impenhorável, ex vi da Lei 8.009/90.
Solucionando a espécie, o MM. Juiz a quo rejeitou liminarmente os embargos, basicamente porque:
a) a penhora foi efetivada antes da edição do invocado diploma legal, pelo que não poderia ser alcançada por suas disposições;
228 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
b) tendo figurado como litisconsorte passivo na ação de execução, o casal embargante não seria terceiro para os fins de que se trata."
Decidindo, a e. Terceira Câmara do 'lribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, por maioria, deu provimento à apelação, determinando que se prosseguisse no processo.
Opostos embargos infringentes, foram rejeitados, daí o recurso especial do embargado, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, em que alega negativa de vigência ao art. 1.046 do CPC e dissídio com julgados de outros tribunais.
Processado e admitido o recurso, subiram os autos. É o relatório, Senhor Presidente.
VOTO
O SR MINISTRO COSTA LEITE (Relator): Como filtra do relatório, a execução foi movida também contra os avalistas, pelo que inadmissíveis os embargos por eles opostos, pois figurando no pólo passivo da relação processual não se qualificam como terceiros, nem mesmo em razão do que dispõe o § 2~ do art. 1.046 do CPC, porquanto a impenhorabilidade do bem objeto da constrição judicial, em face da Lei n~ 8.009/90, é tema estranho à equiparação legal. Em verdade, constitui matéria deduzível incidentemente no processo de execução.
Conhecendo do recurso, dou-lhe provimento, para cassar o acórdão e restabelecer a solução da sentença de primeiro grau, sem prejuízo de que a questão venha a ser suscitada na forma antes indicada.
É como voto, Senhor Presidente.
RECURSO ESPECIAL N~ 57.592-3 - RS
(Registro n~ 94.0037143-8)
Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrido: Antônio Carlos Veiras Martins
Advogados: Drs. Acélio Jacob Roehrs e outros, e Aires Roberto Véiras Martins e outros
EMENTA: Deflator - Lei 8.177/91, artigo 27.
Impossibilidade de interpretá-lo como incidindo relativamente a obrigações assumidas em período posterior à vigência da Lei ou da Medida Provisória que a precedeu. Além de conflitar abertamen-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 229
te com seu texto, não teria sentido estabelecer aquele mecanismo para deflacionar contratos a serem feitos no futuro. Se se entender que a disposição conflita com norma superior, sua não aplicação condiciona-se ao reconhecimento da inconstitucionalidade, com observância do procedimento próprio, o que, entretanto, não fez o julgado recorrido.
Precedentes do Superior Tribunal de Justiça negando a existência do pretenso vício.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Cláudio Santos, Costa Leite e Nilson Naves.
Brasília, 24 de abril de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
Publicado no DJ de 22-05-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A Egrégia Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por maioria, deu provimento à apelação interposta pelo Banco do Brasil S/A no processo em
que litiga com Antônio Carlos Veiras Martins.
Interpostos embargos infringentes, foram acolhidos em decisão assim ementada.
"Embargos Infringentes.
Plano Collor 11.
CDB - Certificado de Depósito Bancário. Contrato por prazo determinado. Inaplicabilidade da deflação prevista no artigo 26 da Medida Provisória 294/91, por se tratar de contrato perfeito e acabado, vedada a retroatividade da lei superveniente.
Embargos acolhidos.
Votos vencidos."
Inconformado, o banco utilizou-se dos recursos extraordinário e especial. Nesse, sustentou negativa de vigência ao art. 27 da Lei 8.117/91 bem como divergência com julgados deste Tribunal.
O especial foi admitido, negandose seguimento ao extraordinário.
É o relatório.
230 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): O acórdão recorrido, não pode haver dúvida, negou aplicação ao disposto no artigo 27 da Lei 8.177/91. Aquele dispositivo é de clareza solar ao estabelecer que o deflator se aplicaria às obrigações constituídas anteriormente a sua vigência e à da Medida Provisória que a antecedeu. Nem seria imaginável um deflator a incidir para o futuro. Só tem sentido em virtude da modificação nas taxas de inflação previstas quando se contratou. Se se entende que o disposto em lei conflita com a norma superior que estabelece a irretroatividade, poder-se-ia deixar de aplicá-la, proclamando sua inconstitucionalidade, com observância do procedimento previsto na própria Constituição. Não foi isso, entretanto, o que fez o julgado recorrido.
Esse 'Ihbunal, aliás, já proclamou, em diversas oportunidades, não existir o pretenso vício na chamada "tablita". A propósito proferi voto de que transcrevo o trecho seguinte:
"'!rata-se, no caso, de obrigação de pagar quantia certa, dentro de um certo prazo. Ocorre que, no curso desse, verificou-se intervenção governamental na economia,
consistente, dentre outras medidas, em congelamento de preços. É evidente que os termos da equação foram sensivelmente alterados. Ao contratarem, as partes tinham em vista determinada conjuntura e, atentas a ela, estabeleceram quanto seria devido, ao final do prazo convencionado. Claro que poderiam equivocar-se, acrescendo-se as vantagens de uma em detrimento da outra. São riscos normais do negócio. Não era previsível, entretanto, e não se pode ter como considerada pelos contratantes, a modificação introduzida. O que o dispositivo em exame visou foi resguardar a realidade do negócio efetuado, mantendo as partes na situação em que estariam, caso não tivessem sido tomadas as apontadas medidas interventivas.
Dentro desse quadro, não me parece tenha havido ilegítima retroatividade. O legislador estabeleceu, de logo, norma objetiva para adequar os contratos à nova realidade, como o poderiam fazer os juízes com base na teoria da imprevisão."
Conheço do recurso e dou-lhe provimento para julgar improcedente a ação. Custas e honorários pelo autor, arbitrados esses em dez por cento sobre o valor da causa.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 231
RECURSO ESPECIAL N!! 66.249-4 - RS
(Registro n!! 95.0024224-9)
Relator: O Sr. Ministro Costa Leite
Recorrente: Organização Imobiliária Princesa do Lar S/A
Recorrida: Leni Beatriz Schmitz
Advogados: Drs. Sônia Wildt do Canto e outros, e Nelson Carvalho Vasconselos
EMENTA: Processo Civil. Liquidação de sentença. Perdas e danos. Dano moral.
A liquidação deve ater-se ao decidido no processo de conhecimento. A responsabilidade por perdas e danos do litisdenunciado pressupõe o reconhecimento do prejuízo suportado pelo litisdenunciante. Sendo incontroverso que não só a sentença liquidanda não fez referência a prejuízo de ordem moral como nada se alegou nesse sentido quando da denunciação da lide, determinando o conteúdo da demanda principal tão-só o ressarcimento dos prejuízos de ordem material suportados pelo litisdenunciante, impende reconhecer a violação ao art. 610 do CPC, em decorrência de inclusão de indenização por dano moral. Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira Thrma do Superior 'fribunal de Justiça, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos.
Brasília, 15 de agosto de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro COSTA LEITE, Relator.
Publicado no DJ 13-11-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE: Julgada procedente a ação reivindicatória proposta por Oldenir Antônio Thrqueti e Cônjuge contra Leni Beatriz Schmitz, a sentença declarou a responsabilidade da litisdenunciada, Organização Imobiliária Princesa do
232 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
Lar S/A, por perdas e danos, postulando a litisdenunciante, no procedimento liquidatório, a reparação do dano moral.
Acolhida a postulação em primeiro grau, a e. Sétima Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, por maioria de votos, reformou o capítulo pertinente da sentença de liquidação, a teor destes fundamentos sintetizados na ementa do acórdão:
"A existência do prejuízo deve ser demonstrada no processo de conhecimento e não na liquidação. Nesta se apura apenas o quantum desse prejuízo. Dano moral não argüido na ação e que não foi objeto de condenação não pode ser deferido na liquidação."
Em sede de embargos infringentes, prevaleceu o voto vencido, apresentando-se assim exteriorizado o acórdão do e. Quarto Grupo Cível daquela Corte:
"Embargos infringentes.
O recurso se submete ao art. 530 do CPC.
Conhecimento de parte do recurso.
Condenação a perdas e danos em ação de conhecimento.
Liquidação de sentença.
Não constitui exegese inadequada o entendimento de que o dano moral esteja embutido na expressão perdas e danos.
Dano moral como lesão de interesses. Lição de Maria Helena Diniz e de Antunes Varela.
Critério fixado em 50% sobre o valor do dano patrimonial.
Recurso conhecido em parte e dado provimento".
Manifestado recurso especial, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, em que se alega contrariedade ao art. 610 do CPC, porquanto no processo de conhecimento não se decidiu sobre a reparação de dano moral, mesmo porque não se formulou pedido a respeito, sobreveio juízo negativo de admissibilidade, fundado na falta de prequestionamento. Provi o agravo de instrumento e determinei a conversão prevista no art. 544, § 32, do CPC.
É o relatório, Senhor Presidente.
VOTO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE (Relator): Para o efeito de prequestionamento, não se faz mister expressa referência ao dispositivo legal. Importa é que a questão sej a ventilada no acórdão. No caso dos autos, verifica-se que a questão em que se funda a alegação de contrariedade ao art. 610 do CPC foi longamente debatida nas instâncias ordinárias, sendo examinada tanto no julgamento da apelação como no dos embargos infringentes, não calhando, assim, o fundamento em que se estabeleceu o juízo negativo de admissibilidade na origem.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 233
Controverte-se a respeito da reparação do dano moral, sob o prisma da adequação da sentença de liquidação ao decidido no processo de conhecimento, sustentando a recorrente que o julgado do e. Quarto Grupo Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul extrapolou os termos da decisão liquidanda.
A sentença de liquidação entendeu devida aquela reparação, com base nestes fundamentos:
"Perdas e danos enseja a reparabilidade do prejuízo de natureza material e moral, posto que humanamente impossível repassar-se a evolução histórica do fato que responsabiliza a ré pelas perdas e danos, apenas dando expressão para as perdas representativas de valores materiais, conquanto é certo que por tudo que passou a autora sofreu diversificadas pressões morais que significam perdas e prejuízos, ou melhor, um indivíduo com vinte e sete anos, vende seu imóvel para adquirir um melhor e, não só o perde, como também é responsabilizado a indenizar todo o prejuízo daquele que lhe vendeu o imóvel porque terceiro, a ré, através de seu empregado, intermediou ilicitamente o negócio. 'lbdo, transcorrendo por quase dez anos de litígio, posto que o cálculo da condenação foi homologado em 23/12/82 (fls. 310v.). Portanto, é tempo em que à autora lhe foi retirada a tranqüilidade do seu exercício regular de um projeto de vida realizável. Admissível jurispruden-
cialmente a cumulação dos danos moral e material.
Deve arcar a ré com a indenização do dano moral que, para ressarcimento, se liquida desde logo, em valor equivalente a um salário mínimo por mês, desde o início da litigiosidade envolvendo o imóvel (fls. 31 - 14/11/73) até a data da sentença homologatória do cálculo do processo n!! 01176009932 (fls. 310v. - 23/12/82); e, do ajuizamento da presente ação até seu trânsito em julgado."
Em sede de apelação, reformou-se esse capítulo da sentença, a teor dos seguintes fundamentos do voto condutor do acórdão:
"Em se tratando de liquidação de sentença, não se pode descurar que a existência do prejuízo deve ser demonstrada no processo de conhecimento, e não na liquidação, onde apenas se apura o quantum desse prejuízo. Nem a sentença, nem o acórdão, faz referência à existência de danos morais que tenham sido alegados e provados pela denunciante. Admiti-los como devidos, por compreendidos na expressão perdas e danos, seria ampliar os termos do julgado e ter como comprovada indenização que sequer foi pedida. Se desassiste razão ao recorrente em afirmar que o dano emergente deve ser limitado ao quantum inquestionavelmente pago pela apelada -descabendo a perícia - razão lhe assiste quanto à indispensabilida-
234 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
de da prova da existência do dano. Esta deveria ter sido reconhecida na sentença que ora se liquida, o que não ocorreu. A sentença de liquidação extrapolou o julgado, embutindo no valor parcela não prevista e que não foi condenada à denunciante a pagar ao autor da ação principal. Dano moral não argüido na ação e que não foi objeto de condenação do denunciante a pagamento ao autor da ação principal não pode ser objeto de liquidação por arbitramento promovida pelo denunciante contra o denunciado."
Ficou vencido o culto Juiz Antonio Janyr Dall'Agnol Júnior. Relançando em seu voto os termos da sentença, que subscreveu no essencial, argumentou:
"De outro lado, ao reconhecer a r. sentença (fls. 24/30) e o v. acórdão (fls. 10115) que a confirmou a responsabilização por perdas e danos em absoluto os restringiu aos danos materiais, ou estritamente patrimoniais, data venia. Pelo contrário, a mim se afigura mais exata a conclusão de que, não distinguindo, permitiu amplitude de limites à indenização: não apenas ressarcir (os danos materiais), mas também reparar (os danos morais)."
Esta a tese que prevaleceu no julgamento dos infringentes. 'lenho, porém, que o acórdão proferido na apelação deu correta solução à controvérsia.
As perdas e danos abrangem os danos emergentes e os lucros cessan-
tes, segundo a lei civiL Não se nega, evidentemente, que nos danos emergentes inclui-se o dano moral. Não se nega, por igual, que o ilícito perpetrado pelo preposto da recorrente possa ter acarretado dano moral. Mas aqui desloca-se o eixo da questão para o plano processual. A responsabilidade por perdas e danos do litisdenunciado pressupõe o reconhecimento do prejuízo suportado pelo litisdenunciante. É incontroverso, que no caso dos autos, não só a sentença liquidanda não fez referência a prejuízo de ordem moral como nada se alegou nesse sentido quando da denunciação da lide, determinando o conteúdo da demanda principal tão-só o ressarcimento dos prejuízos de ordem material suportados pelo litisdenunciante, pelo que impende reconhecer a violação do disposto no art. 610, do CPC, em decorrência de inclusão de indenização por dano moraL
This as circunstâncias, conheço do recurso e lhe dou provimento, para restabelecer a solução do acórdão proferido na apelação. É o meu voto, Senhor Presidente.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Esclareceu o eminente Ministro Relator que de danos morais não se cogitou no processo de conhecimento, não podendo a liquidação contemplar seu ressarcimento. Eventualmente, em outra demanda se poderá pleitear condenação a esse título, quiçá existentes.
Acompanho o Relator.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 235
RECURSO ESPECIAL N!! 71.059-9 - PR
(Registro n!! 95.0037626-1)
Relator: O Sr. Ministro Costa Leite
Recorrente: Irmãos Linero Ltda.
Recorridos: Zacharias Emiliano Seleme e cônjuge
Advogados: Drs. Luiz Fernando Kuster e outros, e Antônio Carlos Thques de Macedo
EMENTA: Promessa de compra e venda. Indenização. Prescrição.
A prescrição passa a fluir do momento em que nasceu o direito a exigir a outorga da escritura de compra e venda, correspondendo ao da integralização do preço, na medida em que as perdas e danos operam em substituição à obrigação originária. Recurso não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 'Ierceira fuma do Superior llibunal de Justiça, em conformidade com os votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Nilson N aves, Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos.
Brasília, 11 de setembro de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro COSTA LEITE, Relator.
Publicado no DJ de 09-10-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE: 'frata-se de recurso especial manifes-
tado por Irmãos Linero Ltda., com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão da e. Quarta Câmara Cível do llibunal de Justiça do Estado do Paraná, assim exteriorizado:
"Compromisso de compra e venda - Ação adjudicatória - Ação indenizatória - Prescrição - O promissário comprador, quitando todas as prestações, só dispõe de uma ação, a de adjudicação compulsória, que se resolve em perdas e danos quando materialmente impossível a adjudicação, por isso que a indenitária é apenas alternativa. Daí por que o prazo de vinte anos da prescrição começa a fluir da data do último pagamento, nos termos do artigo 177 do Código Civil."
Alega-se negativa de vigência aos arts. 159 e 177 do Código Civil, eis
236 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
que os promitentes vendedores cometeram ato ilícito, pelo que estão obrigados a reparar o dano, contando-se o prazo prescricional, segundo o princípio da actio nata, da venda dos lotes a terceiros. Sustenta-se, ainda, que, ao reconhecer a prescrição, o acórdão dissentiu do acórdão da Segunda Turma deste Superior Tribunal de Justiça no REsp n2 3.345-GO.
Processado e admitido o recurso, subiram os autos.
É o relatório, Senhor Presidente.
VOTO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE (Relator): Pretende-se que o prazo prescricional corra da venda dos lotes a terceiro, pois só aí configurouse a lesão ao direito, segundo o recorrente.
'Ibdavia, não lhe assiste razão. O acórdão definiu com exatidão o momento em que passou a fluir o prazo para o exercício da ação, à luz do princípio da actio nata. Em verdade, corresponde àquele em que nasceu o direito a exigir a outorga da
escrita de compra e venda, ou seja, ao da integralização do preço, na medida em que as perdas e danos operam em substituição à obrigação originária.
Consoante realçou o acórdão recorrido, este Superior Tribunal já apreciou a questão controvertida, ao julgar o REsp n2 939-GO. Da lavra do eminente Ministro Eduardo Ribeiro, o acórdão respectivo apresenta-se assim exteriorizado:
"Promessa de compra e venda - Prescrição.
Decorrido o prazo de vinte anos, do pagamento integral do preço, prescreve, o direito de exigir o cumprimento da obrigação. Prescrito este, o mesmo sucederá com o direito a indenização, fundado em que o promitente vendedor tornou impossível o adimplemento do avençado."
Assim, e não caracterizado o dissídio, porquanto o acórdão trazido a confronto não cuidou do tema específico, não conheço do recurso. É como voto, Senhor Presidente.
RECURSO ESPECIAL N2 74.212-0 - GO
(Registro n2 95.0045716-4)
Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro Recorrentes: Adão Francisco de Paula e outros Recorridos: Jonas Machado Valadão e cônjuge
Advogados: Drs. Cleomar de Barros Loyola e outros, e Elísio de Assis Costa
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996. 237
EMENTA: Registro Torrens.
A falta de contestação ou impugnação não leva necessariamente ao acolhimento do pedido, pois existem matérias que podem ser conhecidas de ofício.
A circunstância de não haver oferecido contestação, o que se apresenta como interessado, não o impede de recorrer. Outra questão está em saber quais as matérias que podem ser utilmente deduzidas na apelação, tema de que, no momento, não se há de cuidar.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da 'Thrceira 'furma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Cláudio Santos, Costa Leite e Nilson Naves.
Brasília, 9 de outubro de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
Publicado no DJ de 20-11-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Jonas Machado Valadão e sua mulher requerem se procedesse à inscrição de determinado imóvel no Registro 'lbrrens. Citaram-se os
confrontantes relacionados pelos requerentes e publicou-se edital, não sendo oferecida contestação. O pedido foi acolhido, determinando-se o registro, por sentença datada de 07 de junho de 1965.
Em 17 de dezembro de 1980, Adão Francisco de Paula e outros apelaram daquela sentença. Alegaram que o prazo de recurso, para o terceiro prejudicado, era o mesmo das partes. E para essas não começara sequer a fluir, pois não efetuadas as intimações, entre elas a do Ministério Público. O recurso não foi conhecido, pelas razões expostas na seguinte ementa:
((Registro Torrens - Procedimento edital - Recurso - Sentença preclusiva. A matrícula no Registro 'lbrrens se rege pelo procedimento edital, forma de processo pelo qual são convocados os interessados no imóvel a virem, em forma de contestação, opor-se ao pedido. Não havendo oposição, defere-se a matrícula, ficando definitiva e inescusavelmente solucionadas as questões atinentes ao
238 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 177-243, fevereiro 1996.
domínio, acarretando a irrecorribilidade da sentença aos que não contestaram, no prazo preclusivo do edital."
Os apelantes apresentaram recurso especial, alegando nulidade, por falta de intimação do Ministério Público, para dizer sobre a sentença e sobre o recurso interposto. Sustentam, mais, que se negou vigência ao artigo 322 do Código de Processo Civil, assegurando ao revel intervir em qualquer fase do processo, bem como ao artigo 287 da Lei 6.015/73 que admite apelação da sentença que deferir ou negar o pedido. Alegou-se, ainda, dissídio com julgado do Supremo Tribunal Federal.
Não admitido o recurso, apresentou-se agravo a que dei provimento, para melhor exame, convolando-o em especial.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): A única questão submetida a este Tribunal é a pertinente ao não conhecimento da apelação. Desse modo, não há cogitar de possíveis nulidades do processo.
Como visto da ementa transcrita no relatório, o fundamento acolhido pelo acórdão, para não conhecer da apelação, resumiu-se ao fato de não ter havido contestação ao pedido de registro. Com a devida vênia, malgrado tenha como exata a caracterização jurídica do processo em ques-
tão, parece-me que daí não se haverão de retirar as conseqüências que levaram o julgado a concluir nos termos em que o fez.
Cumpre desfazer um possível equívoco. O § ~ do artigo 463 do Código de 39, vigente à época da sentença, estabelecia, à semelhança do que dispõe o § 2~ do artigo 285 da Lei de Registros Públicos, que, não havendo contestação, ou não sendo recebida a apresentada, o juiz ordenaria a matrícula. O dispositivo, entretanto, não comportava exegese literal. Havia, como há, matérias de que o juiz deveria conhecer de ofício e, desse modo, o pedido poderia ser negado, ainda não houvesse contestação ou impugnação do Ministério Público. Compreende-se o motivo da redação aparentemente peremptória do dispositivo. Supõe que o juiz, ao mandar lavrar os editais, já houvesse examinado tudo aquilo que poderia, independentemente de contestação, conduzir ao indeferimento do pedido. Sucede, entretanto, que isso não ocorre necessariamente. As questões não estavam preclusas, já que sujeitas a exame de ofício, podendo o juiz, encontrando óbice, negar o pedido, mesmo à míngua de qualquer tipo de impugnação.
Se assim é, não se pode negar o direito ao recurso, por parte de interessado, para que se corrija o eventual equívoco do juiz, consistente em abster-se de reconhecer a existência de obstáculo à pretensão, o que deveria fazer mesmo sem provocação. Tais empeços podiam consistir na falta de apresentação dos documen-
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tos relacionados no artigo 459 do Código de 39, ou na sua inexatidão.
Vale notar, a propósito, que uma das exigências é a indicação dos nomes, não só dos confrontantes, como de quaisquer interessados, que deverão ser notificados. Se isso, por exemplo, não se fez, não há como negar o recurso a quem deveria ser notificado e não o foi.
Considero, pois, que, comprovado o legítimo interesse de recorrer, será, em tese, admissível a apelação.
Outra questão, de que aqui não se haverá de cuidar, por não ter sido objeto de consideração no Tribunal de Justiça de origem, diz com as matérias que poderão ser, utilmente, deduzidas no recurso. Quanto a isso decidirá aquela Corte.
Tenho como violada a disposição legal indicada, razão por que conheço e dou provimento ao especial para que, superada a preliminar tida como obstativa do conhecimento da apelação, prossiga o egrégio Tribunal no seu exame.
RECURSO ESPECIAL N~ 74.376-0 - RJ (Registro n~ 95.0046406-3)
Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro Recorrente: Warner Chappell Edições Musicais Ltda. Recorrida: Casas da Banha Comércio e Indústria S/A Advogados: Drs. Eduardo Alberto Sussekind e outros, e Joaquim B. Dru
mond Alves e outro
EMENTA.: Tratado internacional - Lei ordinária - Hierarquia.
O tratado internacional situa-se formalmente no mesmo nível hierárquico da lei, a ela se equiparando. A prevalência de um ou outro regula-se pela sucessão no tempo.
Direito de autor.
A obrigação assumida pelo Brasil de proteção do direito autoral, no campo internacional, não significa deva ser outorgada aquela que tem o autor em seu país, mas que será dispensado o mesmo tratamento concedido aos sob sua jurisdição.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira 'furma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade
dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter,
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Cláudio Santos, Costa Leite e Nilson Naves.
Brasília, 9 de outubro de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
Publicado no DJ 27-11-95.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Warner Chappell Edições Musicais Ltda. ajuizou ação, objetivando a condenação de Casas da Banha Com. e Ind. S/A a pagar-lhe indenização, em virtude de ter-se utilizado, sem autorização, da obra musical Happy Birthday 1b Thu, de cujos direitos se afirmou titular. A ação foi julgada improcedente, mantida a sentença em segundo grau.
Fundou-se essa decisão em que, consoante a lei brasileira, a proteção dos direitos patrimoniais estende-se por sessenta anos, a partir de primeiro de janeiro do ano seguinte à morte do autor, incumbindo a quem se pretenda titular do direito o ônus da prova de que subsiste. Demonstrou a ora recorrente que o falecimento de Patty S. Hill, autora dos versos daquela obra, deu-se em 26 de maio de 1946. Nenhuma prova trouxe, entretanto, quanto à data do falecimento de Mildred J. Hill, autora da melodia. E como o litígio prendia-se apenas ao uso dessa - não
dos versos - não ficara evidenciado tivesse a autora o alegado direito.
A vencida apresentou embargos declaratórios. Afirmou que Patty e Mildred eram co-autoras de música e letra, sendo a obra indivisível. Desse modo, tendo em vista o disposto no artigo 43 da Lei n. 5.998/73 e a data da morte da primeira, ainda não se escoara o prazo, findo o qual a obra cai no domínio público. Acrescentou que o acórdão se teria omitido na apreciação do fato de que a obra se encontra protegida nos Estados Unidos da América. Desse modo, em razão dos tratados internacionais, a cujo cumprimento o Brasil se obrigou, a mesma proteção haveria de ser-lhe aqui outorgada.
Os embargos foram rejeitados. Salientou-se que possível erronia no exame da prova não seria sanável por pedido de declaração. De qualquer sorte, não teria havido o apontado equívoco. Nem relevaria a alegada existência de tratados internacionais, pois não poderia o Judiciário brasileiro abster-se de aplicar a legislação nacional.
Interpôs a autora recurso especial. Afirma que os tratados e convenções, uma vez publicados, adquirem força de lei, tornando-se obrigatória sua aplicação pelos órgãos judiciais, certo que, pela Convenção de Viena, não pode um Estado invocar o direito interno para deixar de fazê-lo. Prossegue, afirmando que os direitos sobre a obra em questão continuam resguardados nos Esta-
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dos Unidos e, em conseqüência, também o estariam entre nós. Invoca, especificamente, o artigo IX da Convenção de Washington.
Assevera a recorrente que, negando aplicação aos tratados, o julgado desatendeu ao disposto no artigo r~, § I!! da Lei 5.988/73, assim como ao que se contém no item lU do artigo 48 da mesma Lei.
Sustenta, mais, que negada vigência ao Decreto 75.699/75 que promulgou a Convenção de Berna. É que a canção, a cujo propósito' se 'litiga, constitui obra em colaboração, daí resultando a indivisibilidade material e moral, tendo os colaboradores direito sobre sua totalidade, sem relevo que o uso não autorizado refirase à letra ou à melodia. Ademais, nos termos da Convenção de Berna, o prazo há de contar-se da morte do último co-autor sobrevivente, sem distinção quanto à divisibilidade da obra.
O recurso não foi admitido. Dei, entretanto, provimento ao agravo apresentado pela recorrente, para melhor exame, convertendo-o em especial.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Sabidamente controvertida a questão relativa à existência ou não de hierarquia entre a lei ordinária e o tratado. O melhor entendimento, consoante nossa ordem constitucional, é o de que não
se situam em níveis distintos. Incide, desse modo, no direito interno, a regra de que a lei posterior revoga a anterior. Questão diversa é a respons~bilidade internacional, derivada do descumprimento·do compromisso a que o país se vinculou. Essa a doutrina acolhida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 80.004, e sustentada por Francisco Rezek em seu Direito dos Tratados (Forense - 1984 - págs. 464 e seguintes).
Esse entendimento de nenhum modo é incompatível com o invocado artigo 27 da Convenção de Viena. Aí se cuida também do ilícito internacional, resultante do descumprimento de tratado. Nem se poderia, aliás, mediante uma convenção, modificar a hierarquia que, no direito interno, tenha essa fonte normativa.
N o caso em exame, entretanto, a questão é, em verdade, destituída de maior relevo, como se passa a mostrar.
Funda-se a recorrente em que a obra se encontra protegida nos Estados Unidos, onde produzida. Assim, também no Brasil haveria de gozar de proteção, nos mesmos termos, tendo em vista a norma citada da Convenção de Washington.
Considero que há um equívoco. Pelo dispositivo invocado, os Estados se obrigam a conferir proteção à obra registrada em outro Estado contratante, sem necessidade de qualquer formalidade. Isso não negou o acórdão. O Brasil há de outorgar proteção ao direito. Não, entre-
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tanto, nos mesmos termos em que o faz o Estado em que efetuado o registro. O direito será reconhecido e protegido, dando-se-lhe o mesmo tratamento que se dispensa aos autores sob jurisdição brasileira. Dentro desse espírito a disposição do artigo 48, lU da Lei 5.988/73. Note-se, ainda, que a autora é sediada no Brasil.
Outro ponto do recurso diz com a afirmada indivisibilidade da obra. Vale assinalar que essa circunstância só veio a ser colocada, pela primeira vez, nos embargos declaratórios ao acórdão. E o foi para contestar a assertiva de que música e letra teriam autoras distintas. Pretendeuse, com base em documentos relativos ao registro, que se trataria de obra em colaboração, participando as duas igualmente de sua criação.
Ora, saber se isso ocorreu diz com a prova e não pode a matéria ser objeto de reexame no especiaL O certo é que, apreciando o pedido de declaração, reiterou, a Câmara que "a in-
formação efetivamente trazida aos autos foi no sentido de que uma das irmãs elaborou os versos e a outra a música da referida canção".
Igualmente matéria vinculada aos fatos, e não ao direito aplicável, a que se refere à indissociabilidade de música e letra, no caso concreto. N otese, ademais, que ao cogitar da circunstância de existir versão brasileira dos versos, a ora recorrente apoiouse em um parecer de Ascensão no sentido de que, na composição lítero-musical, em parceira, letra e música são obras perfeitamente distintas (fi. 72).
Pretende a recorrente haja ocorrido violação do artigo 7-bis da Convenção de Berna, promulgada pelo Decreto 75.699/75. A alegação surgiu apenas no especial. Manifesto faltar o prequestionamento.
Em vista do exposto, não conheço do recurso, malgrado o inegável brilho com que elaborado.
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